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                          APOSTILA = 05


           DIDÁTICA DO ENSINO
               SUPERIOR




                                   BRASÍLIA
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              APRESENTAÇÃO GERAL DO CURSO


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                                 SUMÁRIO



  CAPÍTULO I
  A DIDÁTICA DO ENSINO SUPERIOR
  1. PRELÚDIO METODOLÓGICO
  2. BASE DA DIDATICA

  CAPÍTULO II
  DIDÁTICAS ESPECÍFICAS E CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO PROFISSIONAL
  1. FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL
  2. O PAPEL DA DIDÁTICA NA FORMAÇÃO
  3. O PROBLEMA E UMA POSSÍVEL SOLUÇÃO
  4. ATIVIDADES DE FORMAÇÃO ORIENTADAS
  5. O PROFESSOR E A COMPETÊNCIA

  CAPÍTULO III
  A EDUCAÇÃO E AS RELAÇÕES DE PODER
  1. AS RELAÇÕES DE PODER
  2. RELAÇÕES DE PODER NO COTIDIANO DAS INSTITUIÇÕES
  3. PARA ALÉM DO PODER DISCIPLINAR E BIOPODER
  4. DIFERENÇA ENTRE PODER E SABER

  CAPÍTULO IV
  O PODER COMO IDEAL NARCÍSICO NA RELAÇÃO EDUCATIVA

  CAPÍTULO V
  O PROFESSOR COMO INTELECTUAL NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA

 REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICAS
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                                  CAPÍTULO I
               A DIDÁTICA DO ENSINO SUPERIOR


 1. PRELÚDIO METODOLÓGICO



     A disciplina de Didática do Ensino Superior pretende contribuir para formação do
 professor e pesquisador, mediante a compreensão das especificidades do trabalho
 docente, na situação institucional formativa e curricular do ensino superior.

      Supõe compreender o trabalho docente, tanto na perspectiva da construção de
 saberes sociais, pedagógicos e docentes tácitos, construídos nas diversas relações
 pedagógicas no contexto da sociedade, bem como no sentido da sua formalização,
 através da Didática.

       Entende-se esta disciplina, como campo de estudo sistematizado, intencional, de
 investigação e de prática, na ótica do ensino, numa perspectiva contextualizada que
 considere a historicidade dos fatores condicionantes econômicos, sócio-culturais,
 políticos e educacionais contemporâneos, como também, as influências das diversas
 subjetividades individuais e coletivas envolvidas numa determinada prática
 pedagógica.

      Esta proposta elege a sala de aula, como núcleo de referência da Didática, e
 enseja a análise de práticas pedagógicas docentes concretas, com o objetivo de
 apreender as suas relações (professor-aluno, ensino-apredizagem, ensino-pesquisa,
 teoria-prática, conteúdo-forma, educação-sociedade) e os seus significados
 ideológico-políticos, sócio-culturais e pedagógico-didáticos.

      Espera-se assim, que a disciplina venha oferecer elementos teórico-práticos que
 possibilitem condições para (re)significar práticas pedagógicas no ensino superior,
 apontando alternativas de atuação que se voltem para sinalização de uma nova
 prática, na perspectiva da formação de um homem pensante (crítico, independente,
 autônomo), criativo (sensível) e comprometido ética e politicamente com as mudanças
 na sociedade contemporânea.

     A maioria dos professores do ensino superior teve uma formação pautada por
 preceitos da ciência moderna, influenciando seu modo de ver o mundo e marcando
 suas relações com o conhecimento e com os alunos.

     No entanto, percebemos hoje um mundo globalmente interligado, sendo preciso
 uma mudança nas percepções e concepções diante da realidade, do ser, da
 educação. Assim, a Didática do Ensino Superior passa necessariamente pela reflexão
 sobre o papel e os novos paradigmas que a ciência vem desenvolvendo e sua
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 interferência nas concepções educacionais.



  2. BASE DA DIDATICA



     O professor precisa dispor de conhecimentos e habilidades pedagógicas, que
 podem ser obtidas e aperfeiçoadas mediante leituras e cursos específicos. Estes
 conhecimentos e habilidades podem ser definidos como requisitos técnicos e
 envolvem:

      a) Estrutura e Funcionamento do Ensino Superior — O professor deve ser capaz
 de estabelecer relações entre o que ocorre em sala de aula com processos e
 estruturas mais amplas. Isto implica a análise dos objetivos a que se propõe o ensino
 universitário brasileiro, bem como dos problemas que interferem em sua
 concretização. E exige conhecimentos relativos à evolução histórica das instituições e
 à legislação que as rege.

     b) Planejamento de Ensino — A eficiência na ação docente requer planejamento.
 O professor precisa ser capaz de prever as ações necessárias para que o ensino a
 ser ministrado por ele atinja os seus objetivos. Isto exige a cuidadosa preparação de
 um plano de disciplina e de tantos planos de unidade quantos forem necessários.

      c) Psicologia da Aprendizagem — O que o professor espera de seus alunos é
 que aprendam o conteúdo da disciplina que pretende lecionar. Neste sentido
 conhecimentos de Psicologia poderão ser muito úteis, pois esclarecem acerca dos
 fatores facilitadores da aprendizagem.

     d) Métodos de Ensino — A moderna Pedagogia dispõe de inúmeros métodos de
 ensino. Convém que o professor conheça as vantagens e limitações de cada método
 para utilizá-los nos momentos e sob as formas mais adequadas.

     e) Técnicas de Avaliação — Não se pode conceber ensino sem avaliação. Não
 apenas a avaliação no final do curso, mas também a avaliação formativa, que se
 desenvolve ao longo do processo letivo e que tem por objetivo facilitar a
 aprendizagem. Assim, o professor universitário e pesquisador precisa estar
 capacitado para elaborar instrumentos para a avaliação dos conhecimentos e também
 das habilidades e atitudes dos alunos.

     Outro fator a ser vislumbrado é o domínio cognitivo, o qual envolve seis
 categorias:

     1. Memorização — Evocação de algo que tenha sido aprendido. Os objetivos
 desta categoria podem ser expressos pelos verbos: citar, identificar, listar, definir etc.
 Por exemplo: “Definir o conceito de Administração Científica”.

      2. Compreensão — Reafirmação do conhecimento sob novas formas. Neste
 nível, o indivíduo conhece o que está sendo comunicado e pode fazer uso do
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 respectivo material ou idéia. Não se torna, porém, capaz de relacioná-lo a outro
 material ou de perceber suas implicações mais complexas. Os objetivos desta
 categoria podem ser expressos pelos verbos: ilustrar, exemplificar, traduzir etc.

     3. Aplicação — Uso de abstrações em situações particulares e concretas. As
 abstrações podem apresentar-se sob a forma de idéias gerais, princípios técnicos ou
 regras de procedimento que devam ser aplicadas. Os objetivos desta categoria
 podem ser expressos pelos verbos: aplicar, demonstrar, usar, inferir etc.

     4. Análise — Separação de um todo em partes componentes. Em sua forma mais
 elementar, a análise envolve uma simples relação de elementos. Num nível mais
 elevado implica determinar a natureza do relacionamento entre esses elementos. Os
 objetivos desta categoria podem ser expressos pelos verbos: analisar, distinguir,
 categorizar, discriminar etc.

     5. Síntese — Combinação conjunta de certo número de elementos para formar
 um todo coerente. Envolve o processo de trabalhar com peças, partes ou elementos,
 dispondo-os de forma a constituir um padrão ou estrutura que antes não estava
 evidente. Os objetivos desta categoria podem ser expressos pelos verbos: resumir,
 compor, formular, deduzir etc.

      6. Avaliação — Julgamento acerca do valor do material e dos métodos para
 propósitos determinados. Esta categoria constitui o mais alto nível da taxionomia no
 domínio cognitivo. Seus objetivos podem ser expressos pelos verbos: avaliar, criticar,
 julgar, decidir etc.

     No que se refere ao domínio afetivo, vale mencionar que este envolve cinco
 categorias:

     1. Receptividade — Disposição para tomar consciência de um fato e de prestar
 atenção ao mesmo. Esta categoria constitui o nível mais baixo da taxionomia, e seus
 objetivos podem ser expressos pelos verbos: escutar, atender, perceber, aceitar etc.

     2. Resposta — Reação a um fato. Neste nível o estudante vai além da simples
 receptividade; ele está disposto a receber o estímulo dado, não o evitando. Os
 objetivos desta categoria podem ser expressos pelos verbos: concordar, acompanhar,
 responder etc.

     3. Valorização — Reconhecimento do valor de uma coisa, fenômeno ou
 comportamento. Dentre os verbos que expressam objetivos desta categoria estão:
 reconhecer, apreciar, aceitar etc.

      4. Organização — Organização de valores num sistema. Quando o estudante
 encontra mais de um valor relevante para uma situação, ele os organiza, determina a
 inter-relação e aceita um como o dominante. Os verbos organizar, pesar, formar,
 desenvolver e discutir são utilizados para expressar objetivos desta categoria.

     5. Caracterização por um valor ou complexo de valores — Neste nível, que é o
 mais elevado do domínio afetivo, o estudante age firmemente de acordo com os
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 valores que aceita, tornando-se este comportamento parte de sua personalidade. Os
 verbos revisar, mudar, rejeitar e acreditar expressa objetivos desta categoria.




                                 CAPÍTULO II
      DIDÁTICAS ESPECÍFICAS E CONSTRUÇÃO DO
            CONHECIMENTO PROFISSIONAL



 1. FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL



     Nos últimos anos, nas Ciências da Educação, tem-se afirmado a importância do
 papel do professor como educador, permanentemente atento às necessidades e ao
 desenvolvimento dos seus alunos, e como membro da comunidade escolar,
 empenhado na construção do projeto educativo da escola.

      Em contrapartida, ocupar-se da Didática e preocupar-se com o ensino de
 disciplinas específicas chega a ser visto com desconfiança, como se se tratasse de
 algo do passado que nada de importante teria para trazer à formação de professores.

      No entanto, a aprendizagem de conhecimentos, o desenvolvimento de
 capacidades, atitudes e valores de ordem disciplinar e a organização por áreas do
 saber marca decisivamente a vida escolar. Os programas de formação (tanto inicial
 como contínua) que não tenham em conta esta realidade conduzem necessariamente
 os seus formandos à frustração e ao desencanto quando se confrontam com as
 situações da prática.

      Os jovens professores sofrem então o efeito do processo de socialização
 profissional, que acaba por constituir um segundo momento de formação
 (normalmente de “sinal contrário” ao da formação inicial), com força mais do que
 suficiente para exercer um efeito dominante nas suas concepções e práticas
 profissionais.

      Os professores não podem exercer o seu papel com competência e qualidade
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 sem uma formação adequada para lecionar as disciplinas ou saberes de que estão
 incumbidos, sem um conjunto básico de conhecimentos e capacidades profissionais
 orientados para a sua prática letiva.

      Não negando a importância das outras vertentes da formação, há que continuar a
 valorizar a formação didática, que apóia o ensino de saberes específicos. É
 importante fazê-lo de modo convergente com os restantes domínios e objetivos da
 formação e com o que se sabe acerca do desenvolvimento profissional dos
 professores.

      A formação dos professores é o problema-chave do sistema educativo. Ela
 influencia a orientação da escola não apenas no plano de transmissão dos
 conhecimentos, mas também no das normas e valores, constituindo um lugar de forte
 concentração ideológica. No discurso de crise crônica que desde há muito se instalou
 na área educativa, a formação de professores aparece frequentemente como solução
 que, uma vez posta em prática, permitiria resolver de uma só vez todos os problemas.

      Devemos ter, no entanto, uma clara noção das suas possibilidades e limites. A
 formação não permite ultrapassar todas as dificuldades. A formação de professores só
 pode influenciar as suas práticas em determinadas condições e dentro de
 determinados limites. O que não quer dizer que não seja essencial e não mereça por
 isso o melhor da nossa atenção.

      Diversos modelos têm sido propostos para a formação de professores. Num
 trabalho que marcou toda uma época, Marcel Lesne contrasta diversos grandes
 modos de trabalho de formação sob o ponto de vista da natureza do ato pedagógico,
 tendo em conta o processo de socialização que lhes está associado.

      Na formação de tipo transmissivo (que corresponde a uma orientação normativa),
 a pessoa em formação é, sobretudo, considerada como objeto de socialização, ou
 seja, é um produto social.

     Na formação de tipo incitativo (onde sobressai uma orientação pessoal), a
 pessoa em formação é considerada, sobretudo sujeito da sua própria socialização,
 determinando-se e adaptando-se de forma ativa aos diferentes papéis sociais.

      Finalmente, na formação de tipo apropriativo (centrada na inserção social do
 indivíduo), o formando é considerado como agente de socialização, simultaneamente
 determinado e determinante. É possível considerar igualmente diversos modelos
 teóricos, tendo por referência não os propósitos nem os objetivos da formação, nem a
 estrutura do dispositivo, nem a natureza dos conteúdos, mas o tipo de processos e a
 sua dinâmica formativa. Distingue assim um modelo de formação centrado nas
 aquisições, outro na experimentação e outro ainda na análise.

      Um tema que tem marcado profundamente as discussões mais recentes sobre a
 formação é o do professor reflexivo. A sua origem deve-se, sobretudo a Donald Schön
 (1983) que sublinha a importância da reflexão na ação e da reflexão sobre a ação,
 como dois dos traços distintivos mais importantes dos profissionais competentes. A
 reflexão respeita, sobretudo, aos processos e capacidades de pensamento do
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 professor.

      No entanto, para ensinar, não basta saber pensar bem, é preciso um vasto
 conjunto de saberes e competências, que podemos designar por conhecimento
 profissional. Reagindo contra as tendências que proclamavam o primado da vertente
 pedagógica na formação de professores, Shulman (1986) chama a atenção para a
 necessidade que o professor tem de conhecer bem os conteúdos que ensina.

      Para ele, o professor não tem de conhecer estes conteúdos do mesmo modo que
 o cientista, mas de um modo diferente. Muito em especial tem de conhecer as boas
 maneiras de torná-los compreensíveis e relevantes para os alunos.

     Na verdade, podemos dizer que o conhecimento profissional do professor inclui
 uma parte fundamental que intervém diretamente na prática letiva. Trata-se de um
 conhecimento essencialmente orientado para a ação e que se desdobra por quatro
 grandes domínios:

      (1) o conhecimento dos conteúdos de ensino, incluindo as suas interrelações
 internas e com outras disciplinas e as suas formas de raciocínio, de argumentação e
 de validação;

     (2) o conhecimento do currículo, incluindo as grandes finalidades e objetivos e a
 sua articulação vertical e horizontal;

      (3) o conhecimento do aluno, dos seus processos de aprendizagem, dos seus
 interesses, das suas necessidade e dificuldades mais freqüentes, bem como dos
 aspectos culturais e sociais que podem interferir positiva ou negativamente no seu
 desempenho escolar;

      (4) o conhecimento do processo instrucional, no que se refere à preparação,
 condição e avaliação da sua prática letiva. Este conhecimento, longe de estar isolado,
 relaciona-se de um modo muito estreito com diversos aspectos do conhecimento
 pessoal e informal do professor da vida quotidiana como o conhecimento do contexto
 (da escola, da comunidade, da sociedade) e o conhecimento que ele tem de si
 mesmo.

     Um outro tema que tem emergido nas discussões sobre a formação é o do
 desenvolvimento pessoal, profissional e organizacional do professor. Nóvoa (1991),
 um dos autores portugueses que melhor tem abordado esta questão, sublinha a
 importância da noção de desenvolvimento pessoal, na dupla valência de investir a
 pessoa e a sua experiência e investir a profissão e os seus saberes.

      Indica que a formação contínua deve estimular os professores a apropriarem-se
 dos seus próprios dos saberes, no quadro duma autonomia contextualizada e
 interativa, trabalhando-os de um ponto de vista teórico e conceptual. Sublinha que
 cabe ao desenvolvimento pessoal produzir a vida do professor e para isso é preciso
 estimular uma perspectiva crítico-reflexiva, que lhe forneça os meios de um
 pensamento autônomo e facilite as dinâmicas de autoformação participada.
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      Este mesmo autor critica as práticas de formação contínua organizadas em torno
 dos professores individuais, que favorecem o isolamento e reforçam uma imagem dos
 professores como transmissores de um saber exterior, e endossa as práticas que
 tomam como referência as dimensões coletivas. Subscreve também a posição de
 Schön, segundo a qual a prática docente implica a resolução de situações
 problemáticas, o que exige capacidades de autodesenvolvimento reflexivo aos
 professores.

     Reclama a dinamização de dispositivos de investigação-ação e investigação-
 formação, conjugando uma formação de tipo clínico com uma formação de tipo
 investigativo, afirmando que a formação não se faz antes da mudança, mas sim
 durante a mudança.

      Finalmente, Nóvoa sublinha a importância do desenvolvimento organizacional.
 Para ele, “não basta mudar o [professor], é preciso mudar também os contextos em
 que ele intervém”. Isto significa, nomeadamente, que a formação deve ser concebida
 como um processo permanente, integrada no dia-a-dia dos professores e das
 escolas. Ele sublinha a importância da noção de participação, indicando que os
 professores têm de ser protagonistas ativos na concepção, realização e avaliação da
 formação.

     Aponta a necessidade de criar uma nova cultura da formação de professores, da
 qual participem as escolas e as instituições de ensino superior, no quadro de
 colaborações que caracteriza como de “partenariado pela positiva”.



 2. O PAPEL DA DIDÁTICA NA FORMAÇÃO



     A Didática, no Brasil, tem tido um estatuto de menoridade relativamente a outras
 áreas da educação. Para isso concorre certamente a perspectiva, ainda hoje
 dominante em muitos sectores da sociedade (incluindo os professores universitários
 das diversas disciplinas ditas “científicas” e, muitas vezes, os próprios docentes das
 áreas “generalistas” das Ciências da Educação) que a Didática não é mais do que um
 repositório de receitas sobre os modos de transmitir o conhecimento disciplinar,
 resultantes da acumulação da experiência de longos anos de vida profissional.

      A Didática, hoje em dia, é mais do que um simples domínio da prática
 profissional. Ela constitui um campo científico, onde se realiza trabalho de
 investigação e de produção de novo conhecimento. Como em todo o campo científico,
 na Didática reconhecem-se duas características: um objeto bem definido e uma
 metodologia de trabalho própria.

     Como refere Isabel Alarcão (1989), o objeto da Didática é o conjunto dos
 fenômenos de ensino-aprendizagem das várias disciplinas e dos vários níveis de
 ensino, com o objetivo último de contribuir para a melhoria do processo educativo.
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      O seu método de investigação corresponde a um modo de trabalho sistemático
 que inclui numerosas variantes, desde a investigação de cunho quantitativo baseada
 em procedimentos de análise estatística e outros processos de modelação
 matemática, à investigação de cunho qualitativo que inclui estudos de caso,
 entrevistas clínicas e estudos etnográficos e, cada vez mais, estudos de investigação-
 ação, que envolvem processos colaborativos onde se implicam docentes e
 investigadores de diferentes instituições.

      Assim, enquanto que o conhecimento didático (dos professores) se desenvolve
 de modo natural na formação inicial e na prática profissional, a Didática (como
 domínio científico) desenvolve-se através duma prática deliberada de investigação
 teórica e empírica.

      As fronteiras entre os dois domínios não são muitas vezes claras, já que o
 principal propósito da Didática é informar e estimular o crescimento do conhecimento
 didático e a própria Didática precisa do conhecimento didático como ponto de
 referência fundamental para o seu desenvolvimento. Nesta perspectiva, a Didática
 assume-se como um saber científico que, numa lógica que Boaventura Sousa Santos
 (1987) designa por pós-moderna, procura constituir-se como senso comum
 profissional.

     A Didática não assume, nesta perspectiva, um cunho estritamente normativo.
 Antes desempenha o papel de ferramenta conceptual para a análise de situações de
 ensino-aprendizagem (Alarcão, 1989). Constitui um domínio de teorização,
 investigação empírica e reflexão que se debruça sobre a natureza do saber próprio de
 cada disciplina ou área de conhecimento, sobre os seus objetivos, métodos e
 conteúdos enquanto saber escolar, bem como sobre a dinâmica do processo de
 ensino-aprendizagem e a sua avaliação.

      O seu objeto é irredutivelmente complexo, relacionando-se com um domínio de
 prática, o conhecimento profissional a ele associado (o conhecimento didático) e os
 numerosos fatores que com eles interagem diretamente. Por isso, a Didática de uma
 disciplina específica necessita de recorrer ao concurso de múltiplas disciplinas e
 domínios6 e daí o seu forte caráter interdisciplinar.

      A Didática constitui um campo científico emergente que tem percorrido um
 caminho semelhante ao de outras áreas científicas que estudam fenômenos
 transversais ou sociais (Alarcão, 1989).

      Ela começou por ser uma simples disciplina aplicada (principalmente da
 Pedagogia e da Psicologia), para se tornar depois num campo pluridisciplinar. Estuda
 uma variedade de questões diretamente associadas ao ensino-aprendizagem, como a
 elaboração dos currículos e materiais, os processos de construção dos saberes, a
 influência dos fatores contextuais, incluindo as representações sociais da escola e do
 conhecimento científico, a influência dos sistemas de avaliação, etc.

     A Didática, como campo científico, envolve trabalho empírico (uma perspectiva
 experimental e uma íntima ligação com a prática) e teórico (os estudos sobre a
 natureza do conhecimento e a aprendizagem, as interações e grupos humanos), ao
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 mesmo tempo em que assume como referência permanente os grandes valores e
 objetivos da educação e uma forte preocupação de auto-análise.



 3. O PROBLEMA E UMA POSSÍVEL SOLUÇÃO



     Verificamos assim que, por um lado, o processo de formação de professores, nos
 seus diversos níveis (formação inicial, formação contínua, formação especializada) é,
 sobretudo um processo de desenvolvimento profissional, que segue necessariamente
 o seu ritmo e dinâmica próprios. O processo formativo envolve o progressivo
 desenvolvimento das potencialidades de cada professor, a construção de novos
 saberes, sendo fortemente marcado pelas dinâmicas sociais e coletivas.

      Por outro lado, a Didática tem contributos essenciais a dar à atividade profissional
 de cada professor. Ela sugere conceitos centrais para fazer uma leitura das situações
 de ensino-aprendizagem, e fornece também pistas e orientações para a atuação do
 professor.

      Ignorar a natureza dos processos de desenvolvimento profissional do professor
 leva facilmente a conceber programas de formação de tipo escolar, procurando impor
 conceitos, práticas e teorias de que o professor não sente necessidade ou para os
 quais o seu interesse não está desperto. É o que faz muita da formação (inicial e
 contínua) que continuamos a praticar no nosso país.

      Ignorar os contributos da Didática, significa pôr de parte um conjunto de
 perspectivas poderosas para o ensino de cada disciplina e um conjunto de conceitos
 fundamentais para analisar e intervir nas situações de prática. É desbaratar um
 importante capital de experiência e de investigação que poderia ser desde já investido
 na formação e na prática profissional.

     O problema consiste, então, no modo de articular a Didática com o
 desenvolvimento profissional. Como tirar partido da primeira numa lógica que não
 contrarie a natureza dos processos próprios do segundo.

     Este problema, aparentemente, é impossível. Trata-se de movimentos que
 evoluem em sentidos opostos, um de dentro para fora, outro de fora para dentro. No
 entanto, este problema tem muitas soluções, desde que haja capacidade de
 compreender as escalas de tempo em que pode ser abordado ou, noutros termos,
 desde que identifique o que pode ser o contributo específico de cada momento
 formativo para o desenvolvimento do professor.

     Ele pode ser abordado, por exemplo, do ponto de vista que as pessoas
 aprendem a partir da sua atividade e da reflexão sobre a sua atividade, uma
 perspectiva defendida, por exemplo, pela escola vygostkiana sobre a aprendizagem
 conhecida por “Teoria da Atividade”.
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      E também pela perspectiva subscrita por autores da Psicologia cultural que
 sustentam que o conhecimento profissional dos professores se forma através da
 participação nas práticas educacionais. De acordo com estas perspectivas, um aluno
 aprende Matemática trabalhando em tarefas matemáticas que define para si próprio
 ou que lhe são propostas pelo professor e falando sobre elas com os seus colegas ou
 refletindo sobre os seus raciocínios e os seus resultados. Do mesmo modo um aluno
 aprende Ciências, Francês, História ou Geografia.

     Também os professores e os futuros professores aprendem, sobretudo a partir da
 sua atividade e da reflexão sobre a sua atividade realizada num contexto de práticas
 enquadradas numa cultura profissional bem definida. No entanto, neste caso o objeto
 da atividade do professor não é a Matemática, o Francês, a História ou a Geografia,
 mas a atividade dos alunos em tarefas e em reflexões sobre essas disciplinas.

     Ou seja, os professores (e futuros professores) aprendem por processos
 basicamente análogos aos processos usados pelos alunos. O que é muito diferente é
 o objeto fundamental da sua atividade.

     Esta perspectiva sugere a importância da presença da prática nos processos de
 formação. Mas a presença da prática, só por si, não é garantia de qualidade de
 formação. É preciso saber de que modos a prática está presente e qual o papel que
 pode desempenhar.



  4. ATIVIDADES DE FORMAÇÃO ORIENTADAS



     Tem-se procurado encontrar formas de lidar com este problema num curso de
 formação contínua para professores de Matemática. O grande objetivo do curso é
 proporcionar aos participantes uma experiência de realização de um projeto orientado
 para a realização de atividades de investigação matemática pelos alunos na sala de
 aula.

     Estabelece-se assim um paralelo entre o trabalho investigativo que se propõe
 para os alunos (que irão explorar situações e relações matemáticas) e os professores
 (que irão explorar modos de fazer investigação sobre a sua própria prática).

     A realização de trabalho investigativo pelos alunos dos diversos níveis de ensino
 é uma das orientações atuais mais importantes na Didática da Matemática. A reflexão
 sobre a Epistemologia da Matemática e as investigações na Psicologia da
 aprendizagem trouxe para o primeiro plano a importância da atividade criativa na
 resolução de problemas, na elaboração e reformulação das teorias e na aplicação de
 conceitos matemáticos a novas situações.

      A atividade de investigação matemática envolve tipicamente a definição de uma
 situação a explorar, a formulação de questões para responder, a produção de
 conjecturas, o seu teste e, caso estes testes se revelem positivos, a procura de uma
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 demonstração convincente. No decurso deste processo é muitas vezes redefinida a
 situação a investigar, são reformuladas as questões de interesse e são
 experimentadas diversas estratégias de elaboração de conjecturas.

      Com as atividades de investigação pretende-se que os alunos contatem de algum
 modo com os aspectos mais genuínos da experiência matemática, tal como ela é
 vivida pelos investigadores profissionais e por aqueles que usam criativamente esta
 ciência na sua atividade profissional.

      O curso destina-se a professores do 2º e 3º ciclo do ensino básico e do ensino
 secundário com os mais diversos níveis de experiência. Procura-se ter como público-
 alvo professores que manifestem abertura para a reflexão e desejo de
 aperfeiçoamento das suas práticas letivas. É dado a conhecer com clareza aos
 possíveis candidatos os objetivos do curso de modo a que as suas expectativas não
 venham a ser defraudadas, porque afinal o que pretendiam era algo de muito
 diferente.

     O trabalho a realizar divide-se em seis fases principais. Primeiro, é feito um ponto
 da situação sobre as atuais orientações curriculares para o ensino da disciplina, com
 especial incidência na resolução de problemas e na realização de atividades de
 investigação matemática.

      É igualmente traçado um quadro do que é um projeto educativo e são
 apresentados alguns exemplos. Alternam-se as introduções de natureza teórica, as
 atividades de natureza prática (realizadas em pequeno grupo) e as discussões
 coletivas. Na maior parte do tempo, os formadores desempenham aqui o papel
 “clássico” de introduzir novas perspectivas e sugerir tarefas para realizar nas próprias
 sessões.

      Numa segunda fase são definidos e programados os temas a trabalhar pelos
 professores. A homogeneidade dos grupos que se constituem em termos de anos
 letivos e matérias que lecionam tem-se revelado uma condição importante. Elaboram-
 se as tarefas a apresentar, os respectivos suportes, etc.

      Ainda nesta fase é feita uma abordagem ao que podem ser os processos de
 recolha de dados a usar no decurso de um projeto educativo desta natureza. Aqui o
 trabalho é realizado principalmente em grupo, embora uma vez ou outra se façam
 introduções de natureza teórica em trabalho coletivo. Na maior parte do tempo, os
 formadores retiram-se para a retaguarda.

     Trabalham à vez com cada um dos grupos, colocando questões, indicando
 possíveis fontes de material a consultar, sugerindo novas possibilidades, mas
 vincando sempre que a responsabilidade das decisões cabe agora aos grupos.

      Numa terceira fase, os diversos grupos apresentam uns aos outros os seus
 projetos. São discutidos aspectos relacionados, sobretudo com os objetivos a que se
 propõem e as tarefas a apresentar aos alunos. São ponderadas alternativas
 relativamente aos processos de recolha de dados. Discute-se em coletivo. Os
 formadores participam nas discussões em pé de igualdade com os formandos.
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     A quarta fase é a de realização. Os grupos ultimam a escolha dos métodos de
 recolha de dados (que pode incluir observação, entrevistas, questionários escritos,
 trabalho escrito dos alunos, registros vídeo e áudio, etc.). As tarefas são realizadas,
 normalmente nas turmas de todos ou quase todos os professores. São feitas
 observações de aulas e recolhidos dados, etc. Os professores fazem uma forte
 assistência mútua uns aos outros. De novo, o grupo de trabalho constitui a unidade
 fundamental, desempenhando nesta fase os formadores essencialmente o papel de
 “consultores”.

       Surge então a quinta fase, que corresponde à análise de dados. Esta fase
 prolonga-se sempre por muito mais tempo do que o inicialmente previsto pelos
 grupos. É iniciada nas sessões de trabalho na Faculdade, mas acaba por ter de
 continuar em sessões extra programadas pelos próprios grupos. Os formadores
 apóiam naturalmente o trabalho, mas não interferem nas conclusões que são
 retiradas pelos professores.

      Finalmente, tem lugar a fase de apresentação que é feita primeiro oralmente nas
 últimas sessões da ação e depois por escrito, num relatório final da ação. A esta fase
 pode ainda seguir-se uma outra de divulgação da experiência em artigos ou encontros
 de professores ou de definição de novos projetos, agora completamente a cargo dos
 participantes.

     Este trabalho evidencia usualmente aspectos que, muito embora não constituam
 novidade para os investigadores, representam muitas vezes significativas
 aprendizagens para os participantes. Por exemplo:

       1 - a importância de definir bem os objetivos; os professores aprendem à sua
 custa que definir muitos objetivos de forma vaga e imprecisa torna extremamente
 difícil a reflexão e avaliação final do trabalho feito;

     2 - não interessa ter muitos meios de recolha de dados; interessa ter alguns
 meios bem escolhidos que permitam responder aos objetivos propostos;

     3 - as tarefas de investigação para os alunos não precisam ser demasiado
 “complicadas”; muitas vezes, em investigação, a simplicidade nos objetivos e nos
 processos é uma importante virtude;

     1. o modo como a tarefa é apresentada tem uma enorme influência na relação
 que os alunos estabelecem com ela e com o ambiente de trabalho que se cria; trata-
 se de uma fase da aula é que requer um particular cuidado;

      2. estimulados por tarefas interessantes, os alunos ultrapassam com freqüência e
 largamente as nossas expectativas;

      3. diferentes tipos de alunos reagem a este tipo de trabalho por vezes de modo
 muito diferente – variando da grande adesão e entusiasmo ao cepticismo e reserva –
 e isso impõe, naturalmente, a necessidade de estratégias diferenciadas da sua parte.

      Do ponto de vista dos modelos teóricos é possível colocar muitas questões e este
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 tipo de trabalho de formação. Não estaremos a determinar muito os objetivos? Do
 ponto de vista do desenvolvimento profissional dos professores estamos a
 proporcionar uma primeira experiência de trabalho investigativo (pelos menos para a
 grande maioria dos participantes trata-se de uma primeira experiência).

     Do ponto de vista da Didática, os objetivos enquadram-se nas suas perspectivas
 atuais, ou seja, constituem parte importante daquilo que a Didática tem a dizer
 presentemente aos professores.

      O curso determina de maneira muito estrita a natureza do trabalho a realizar? Por
 outras palavras, trata-se do problema da maior ou menor estrutura de uma ação desta
 natureza. Nas primeiras vezes que o curso funcionou, a estrutura era menor. Os
 professores eram menos orientados quanto à natureza das tarefas a realizar com os
 alunos e quanto às démarches a realizar no processo investigativo.

      Embora mais perto de alguns dos modelos teóricos de formação mais
 interessantes, esse tipo de trabalho não resultava com alguns dos professores, que
 se sentiam perdidos e acabavam por aproveitar relativamente pouco das experiências
 realizadas. Ao proporcionar uma maior estrutura a formação procura dar um passo no
 sentido certo. Não pretende percorrer de uma só vez todo o caminho necessário para
 se alcançar a plena autonomia profissional.

      Estamos a trabalhar para um público-alvo muito restrito? A adequação entre o
 público-alvo e os objetivos é uma das principais condições de sucesso de uma ação
 de formação. Não pretendemos oferecer este modelo como o mais indicados para
 todos os tipos de público. Pretendemos ilustrar como ele se adequa a um público que
 existe, pelo menos na disciplina de Matemática, e que tem as suas necessidades
 específicas de formação.

       Uma outra situação que gostaria de referir corresponde ao trabalho feito na
 disciplina de Ações Pedagógicas de Observação e Análise do curso de formação
 inicial de professores de Matemática. Os objetivos da disciplina são

     1. desenvolver nos alunos a capacidade de observação da realidade escolar (e
 em particular a realidade do ensino da sua disciplina), proporcionando-lhes os
 necessários instrumentos conceptuais de análise;

      2. levar os alunos a desenvolver a sua sensibilidade para a natureza e a
 diversidade dos problemas com que o professor se confronta no seu dia a dia
 profissional; e

     3. levar os alunos a compreender o ciclo de concepção, execução e reflexão
 pedagógica, através da realização de pequenas atividades de ensino, integrando
 conhecimentos e capacidades educativas de ordem muito diversa.

      Os alunos desta disciplina – futuros professores – vão realizando numerosas
 atividades ao longo do ano, que incluem a discussão da problemática da observação
 e uma abordagem muito geral ao processo de investigação educacional, a realização
 de observações sobre determinados aspectos da vida das escolas, incluindo o
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 funcionamento dos seus órgãos de gestão, os sistemas de apoios pedagógicos e
 materiais aos alunos, e as diversas facetas do trabalho dos professores da sua área
 disciplinar.

     No caso da Matemática observam aulas, sessões de apoio pedagógico
 acrescido, o funcionamento de clubes de Matemática e participam em realizações
 como o dia ou a semana da Matemática, etc. Todas estas atividades de observação
 são objeto de discussão em sessões que se realizam na Faculdade.

      Já perto do fim do ano letivo, organizados em grupos de 3 ou 4 alunos cada, eles
 prepararam – em articulação com o respectivo professor cooperante – um conjunto de
 aulas a lecionar numa turma, constituindo, tanto quanto possível uma unidade
 didática. Trata-se, não só de lecionar um conjunto de aulas, mas também de as
 analisar em profundidade, tentando perceber quais os fenômenos educativos que se
 evidenciaram, qual a correspondência entre os objetivos propostos e os resultados
 conseguidos e qual a origem de eventuais dificuldades.

      Esta atividade constitui para os futuros professores o ponto culminante de todo o
 trabalho realizado ao longo do ano, sendo motivo de grande investimento e de grande
 entusiasmo. De tal modo eles a levam a sério que as restantes disciplinas se
 começaram a ressentir (em termos de assiduidade e de preparação das tarefas
 propostas para casa), que se decidiu concentrar este trabalho numa única semana
 em que são suspensas as atividades letivas usuais.

      Nas semanas seguintes as experiências realizadas pelos alunos são objeto, em
 cada turma de APOA (constituída em regra por 12 a 16 alunos), de cuidada discussão
 e reflexão. Para além disso, realiza-se uma sessão coletiva com todos os alunos e
 professores do curso, onde se faz um balanço da atividade e se discutem aspectos
 relacionados com as suas preocupações relativas ao seu próximo ingresso na vida
 profissional.

      Este trabalho envolve um contacto com a prática profissional altamente
 significativo para os futuros professores. O trabalho de preparação das aulas e
 realização de uma aula constitui para eles um forte incentivo que proporciona uma
 intensa situação de aprendizagem.

      As múltiplas instâncias em que este trabalho é preparado e discutido — no grupo,
 na turma, pelos professores cooperantes, por todo o curso, pelo conjunto dos
 professores do curso — proporcionam momentos de reflexão e análise que fazem
 igualmente parte integrante da experiência formativa.

       No caso da APOA, a Didática está presente pela forte relação que esta disciplina
 tem com a Metodologia do Ensino da Matemática (muitos dos assuntos tratados em
 MEM são retomados pela APOA). As experiências a realizar pelos futuros professores
 devem ter em consideração as orientações gerais da Didática, proporcionando tarefas
 de aprendizagem válidas, criando um adequado ambiente de aprendizagem e
 utilizando os materiais e recursos adequados tanto aos objetivos e conteúdos como
 às características dos alunos.
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      Além disso, a Didática oferece importantes instrumentos de análise para o que se
 passa nestas aulas, evidenciando a importância de ter em atenção a natureza do
 discurso dos diversos atores, os processos de comunicação e de construção dos
 significados e a adequada combinação de modos de trabalho dos alunos (em
 situações de trabalho coletivo, em grupos, pares ou trabalho individual).

     Este trabalho coloca, também, as suas questões. Levar os futuros professores a
 fazer uma investigação, mesmo incipiente, sem conhecer os instrumentos e os
 procedimentos do ofício não envolve muitas armadilhas? Não há o perigo de
 assumirem uma postura negativista em relação aos professores cooperantes?

      O paralelo entre o trabalho investigativo que se propõe para os alunos
 (explorando situações e relações matemáticas) e dos futuros professores (explorando
 modos de fazer investigação sobre a sua própria prática) não será demasiado
 simplista, tendo em conta a natureza muito diferente do saber matemático e do saber
 profissional dos professores? A verdade é que o exemplo das investigações
 matemáticas – mais facilmente interiorizável pelos futuros professores – pode servir
 de modelo contrastante que em vez de dificultar, ajuda a compreender o que é uma
 investigação no terreno educativo.

     Em ambos os casos os formandos formam-se participando em práticas sociais –
 que se estabelecem de novo, segundo o dispositivo formativo no primeiro exemplo,
 que são em grande medida preexistentes, no segundo exemplo. Em ambos os casos
 os formandos aprendem a partir da sua atividade e da sua reflexão sobre essa
 mesma atividade.

      Estes dois exemplos permitem-me ilustrar dois aspectos:

     •       tanto na formação inicial como na formação contínua a Didática pode
 constituir um conteúdo simultaneamente orientador e problematizador;

     •      tanto na formação inicial como na formação contínua, o trabalho de
 natureza investigativa encerra grandes as possibilidades formativas.

      A Didática dá um contributo, fornecendo orientações, mas não se apresenta
 fechada, com “certezas” ou receitas. Fornece um quadro geral onde se evidenciam
 diversas propostas abertas, cuja concretização precisa sempre de ser
 cuidadosamente estudada em função das condições concretas, para além de
 proporcionar um conjunto de ferramentas conceptuais para analisar o processo de
 ensino-aprendizagem.

     A forma de trabalhar é investigativa, inquiridora e reflexiva. Existe uma
 permanente abertura para questionar os grandes objetivos, os objetivos específicos,
 os meios e as técnicas a utilizar. Procura-se questionar uma coisa de cada vez, cada
 coisa no seu tempo e no seu lugar.

     Na verdade, não serve de muito estar todo o tempo a questionar os grandes
 objetivos e, por falta de atenção aos meios, avançar para uma prática desastrada. Tal
 como não adianta muito avançar com meios e técnicas muito aperfeiçoadas para a
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 concretização de objetivos que, pensando bem, deveríamos recusar.



  5. O PROFESSOR E A COMPETÊNCIA



      Um professor é um profissional multifacetado que tem de assumir competências
 em diversos domínios. Não basta possuir conhecimentos na sua área disciplinar,
 dominar duas ou três técnicas para transmiti-los a uma classe e ter um bom
 relacionamento com os alunos.

      Um professor tem de ter conhecimentos na sua área de especialidade e
 conhecimentos e competências de índole educacional. Tem de ser capaz de conceber
 projetos e artefatos — nomeadamente, aulas e materiais de ensino. Tem de ser capaz
 de identificar e diagnosticar problemas — tanto problemas de aprendizagem de
 alunos e grupos e de alunos, como problemas organizacionais e de inserção da
 escola na comunidade.

     A atividade do professor requer uma combinação de conhecimentos científicos e
 acadêmicos de base na sua especialidade com conhecimentos de ordem
 educacional. Requer também o desenvolvimento da capacidade de análise e de
 concepção, realização e avaliação de soluções de ordem prática. O professor é
 chamado a desenvolver uma atividade muito específica, onde há um tempo para
 planear e refletir, mas onde também há um tempo onde é preciso agir e tomar
 decisões sobre os acontecimentos, muitas vezes com conseqüências irreversíveis.
 Parece-me, por isso, pertinente sublinhar duas idéias fundamentais:

      1. a importância de uma boa relação com os conteúdos de ensino por parte dos
 professores;

     2. a interiorização do processo investigativo como componente fundamental da
 formação (inicial e contínua) do professor.

     Os professores têm de dominar perfeitamente as matérias que ensinam. Uma
 boa relação com os conteúdos de ensino não se consegue, na minha perspectiva,
 com “muita” matéria, mas com “boa” matéria. É preciso que o trabalho de formação
 não destrua o gosto pela disciplina, antes o desenvolva e o ajude a amadurecer.

     É importante que as instituições do ensino superior, para além de transmitirem
 conhecimento, ensinem os grandes valores das diversas disciplinas e ensinem a
 produzir novo conhecimento.

      A afirmação do processo investigativo na formação inicial e contínua de
 professores é bastante problemática. Ela contraria as expectativas relativamente à
 formação da generalidade dos formandos e implica mudanças significativas nas
 práticas das instituições de ensino superior e dos próprios centros de formação. Um
 jovem biólogo, químico, psicólogo ou sociólogo completa o seu curso e conhece o
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 essencial do processo de investigação na sua área.

      O mesmo não acontece, de um modo geral, com o jovem professor. Por vezes
 existem disciplinas de métodos e técnicas de investigação nos cursos de formação de
 professores, mas centra-se habitualmente muito mais na parte instrumental do que no
 significado do que é investigar em educação. Ensinados de modo escolar e
 desenquadrados das necessidades e interesses dos formandos, são um bom meio de
 conseguir que eles jamais se venham a interessar pela investigação.

      Mas o que é, afinal, investigar?

     Tal como em Matemática, em educação investigar começa por ser definir
 questões de interesse e elaborar conjecturas preliminares que irão sendo
 sucessivamente modificadas com o decurso do processo investigativo. Novas
 questões podem ser introduzidas e as questões iniciais podem ser reformuladas.

      Finalmente, há um momento em que é preciso sistematizar os resultados obtidos,
 relacioná-los com o conhecimento existente, e fazer uma avaliação geral do trabalho
 feito. Os métodos e as técnicas são a parte menos interessante. Temos de ir à
 procura deles no momento próprio, quando são necessários e aí, sim, é preciso saber
 escolher.

      De uma maneira geral, a investigação é um trabalho feito de modo sistematizado
 e rigoroso, com o objetivo de resolver um dilema ou responder a uma questão
 pessoalmente significativa. Os investigadores profissionais procuram produzir
 conhecimentos gerais, organizados e transmissíveis no âmbito de uma dada disciplina
 científica ou área do saber. No entanto, não é nesta perspectiva que os professores
 têm interesse em se envolver em trabalho investigativo, pois o seu principal objetivo é
 resolver problemas de natureza local, modificar aspectos concretos da sua situação
 de trabalho, da sua prática, ou dos seus resultados.

      Ao debater esta questão, Perrenoud (1993) chama a atenção para dois sentidos
 muito diferentes da noção de investigação: como processo cognitivo e como prática
 social. Como processo cognitivo (sentido usado, por exemplo, por Piaget), investigar é
 procurar conhecer: “... a investigação é uma seqüência de dese-seqüências e
 equilíbrios, de desorganizações e reestruturações, de momentos de generalização, de
 diferenciação, de coordenação dos conhecimentos e dos esquemas de pensamento
 adquiridos”.

      Como prática social, a investigação envolve um processo complexo de produção
 e validação, que exige a indicação dos pressupostos e dos procedimentos envolvidos,
 a apresentação pormenorizada de evidência obtida, e a apresentação nos fóruns
 próprios de debate da comunidade investigativa (encontros, revistas).

     Não se deve confundir a investigação enquanto processo cognitivo de todo o ser
 humano com a investigação como prática social numa comunidade científica. Numa
 aula ou numa situação de formação, pode-se ir buscar à investigação como prática
 social certas características que dão sentido, finalidade, enquadramento e métodos a
 uma atividade de investigação enquanto processo cognitivo.
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      Entre a investigação mais sofisticada e a reflexão mais informal existe todo um
 continuum que envolve níveis diversos de preocupações metodológicas. A
 investigação usada como estratégia formativa, procura tomar como referência muito
 mais os processos cognitivos utilizados no processo investigativo do que os rituais
 próprios da construção e validação do conhecimento nas comunidades acadêmicas.

      Podemos agora sistematizar diversas razões que justificam a integração da
 investigação na formação de professores. Em primeiro lugar, a investigação é
 importante porque ajuda a construir conhecimento relevante do ponto de vista da
 prática profissional na medida em que obriga a manusear conceitos, variáveis e
 hipóteses de uma maneira mais profunda e mais exigente do que noutro tipo de
 trabalho e ajuda a perceber o valor da investigação produzida nas diversas
 disciplinas.

      Só compreendendo a sua própria aprendizagem, investigando sobre ela, se pode
 compreender esses processos nos próprios estudantes. Também neste caso se
 aprende fazendo — os conhecimentos profissionais constroem-se na ação e na
 interação e só são realmente úteis se forem mobilizáveis na ação.

     Em segundo lugar, a prática da investigação é importante para desenvolver
 competências e valores decisivos ao professor, como seja o espírito crítico e a
 autonomia dos professores face ao discurso das Ciências Humanas, incentivando
 uma atitude exigente e pragmática relativamente às investigações em educação e
 para desenvolver as competências profissionais dos professores com mais segurança
 e mais possibilidade de se tornarem eficazes nas situações de prática.

     E, em terceiro lugar, a investigação é deve ser valorizada porque se trata de um
 paradigma de trabalho que pode servir de base a uma prática refletida.

     Finalmente, há que apontar pistas sobre o modo como a investigação pode estar
 presente nos programas de formação. Apresentei dois exemplos, mas,
 evidentemente, muitos mais são possíveis. Na linha do que referi ao longo desta
 conferência, gostaria de sugerir quatro princípios fundamentais:

      1. a investigação não é a recusa da teoria, mas a busca de uma permanente
 articulação entre teoria e prática;

     2. no trabalho investigativo, é decisivo dar especial atenção às fases mais
 conceptuais e não aos métodos e técnicas;

      3. a própria experiência de investigação deve ser transformada em objeto de
 análise e de reflexão;

      4. a investigação não deve ser encarada, ela própria, como a solução universal
 para a formação dos docentes, mas como uma peça de um dispositivo de formação
 multifacetado e dinâmico.

      Tem-se falado e escrito muito sobre formação. No entanto, tem-se feito
 relativamente pouca investigação associada a processos concretos de formação
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 inicial e contínua. Não é possível terminar esta intervenção sem sugerir que uma
 formação mais marcada pela investigação coloca também uma forte responsabilidade
 aos formadores, enquanto investigadores.

      Há também aqui um paralelo que não será inútil salientar. A reduzida presença da
 investigação educacional na formação inicial e contínua está provavelmente
 relacionada com a reduzida atenção que, como objeto de estudo, os próprios
 investigadores em Ciências de Educação têm dedicado ao fenômeno formativo, um
 terreno de trabalho inegavelmente difícil, tanto em termos empíricos como teóricos.

     Mas promover essa ligação é a única forma do discurso e da prática formativa
 assumirem toda a sua coerência. É um passo que é necessário dar, não só para
 favorecer o desenvolvimento profissional dos professores, mas para promover o
 desenvolvimento das próprias Ciências de Educação.




                                 CAPÍTULO III
         A EDUCAÇÃO E AS RELAÇÕES DE PODER



  1. AS RELAÇÕES DE PODER



     No contexto da escola pública de ensino fundamental, desenrolam-se relações de
 poder, às vezes inconscientes e subliminares, sob a forma do poder simbólico de
 Bourdieu, outras vezes claramente identificadas, como o poder formal e impessoal,
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 como o poder legal, como o uso da força ou como a influência social, política ou
 ideológica abordados por Weber.

      Instância onde a circulação de capital econômico e social é restrita e cuja
 exigência do capital cultural é menor do que em outros níveis e ambientes, a escola
 pública de séries iniciais do ensino fundamental de periferia é um lugar no qual se
 travam lutas pelo poder e se fazem relações de poder, de forma clara e, às vezes, até
 mesmo impositiva.

      Para Weber (1984), o conceito de poder é sociologicamente amorfo, havendo
 uma série de circunstâncias que colocam uma pessoa na posição de impor sua
 vontade devendo, portanto, o conceito de dominação ser mais preciso: dominação é a
 probabilidade de que um mandado seja obedecido. Segundo ele, o poder é a
 possibilidade de que um homem, ou um grupo de homens, realize sua vontade
 própria numa ação comunitária, até mesmo contra a resistência de outros que
 participam da ação. (Weber, 1982)

     Ao analisar o poder nas estruturas políticas, Weber enfatiza o uso da força,
 comum a todas elas, diferindo apenas a forma e a extensão como a empregam contra
 outras organizações políticas.

      Analisa o clientelismo, o nepotismo e a influência social, política ou ideológica
 exercida pelos detentores do poder econômico e político. O poder na sociedade de
 classes é analisado a partir da concepção de ordem jurídica, cuja estrutura influi,
 diretamente, na distribuição do poder econômico, ou de qualquer outro, dentro de
 uma comunidade.

     O poder econômico distingue-se do poder como tal, podendo ser conseqüência
 ou causa do poder existente por outros motivos. Para Weber (1982), as classes têm
 sua oportunidade determinada pela existência ou não de maior ou menor poder para
 dispor de bens ou habilidades em seu próprio benefício.

      O poder na burocracia é abordado a partir da consideração de que,
 tecnicamente, a burocracia é o meio de poder mais altamente desenvolvido nas mãos
 do homem que o controla.

      Weber a considera como o modo mais racional de exercer o poder, servindo a
 interesses políticos, econômicos ou de qualquer outra natureza. Analisa as
 características da burocracia, onde é exercido um poder formal e impessoal.

      Bourdieu aborda a questão do poder a partir da noção de campo, considerando o
 campo do poder como um "campo de forças" definido em sua estrutura, pelo estado
 de relação de forças entre formas de poder ou espécies de capital diferentes.

      É um campo de lutas pelo poder, entre detentores de poderes diferentes; um
 espaço de jogo, onde agentes e instituições, tendo em comum o fato de possuírem
 uma quantidade de capital específico (econômico ou cultural especialmente)
 suficiente para ocupar posições dominantes no seio de seus respectivos campos,
 afrontam-se em estratégias destinadas a conservar ou a transformar essa relação de
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 forças.

      Segundo ele, o poder exercido no Sistema de Ensino é o poder simbólico. Poder
 invisível que só pode se exercer com a cumplicidade daqueles que não querem saber
 que a ele se submetem ou mesmo que o exercem.

      Para ele, este poder é quase mágico, na medida em que permite obter o
 equivalente ao que é obtido pela força, graças ao efeito específico de mobilização.
 Todo poder simbólico é um poder capaz de se impor como legítimo, dissimulando a
 força que há em seu fundamento e só se exerce se for reconhecido.

     Ao contrário da força nua, que age por uma eficácia mecânica, todo poder
 verdadeiro age enquanto poder simbólico. A ordem torna-se eficiente porque aqueles
 que a executam, com a colaboração objetiva de sua consciência ou de suas
 disposições previamente organizadas e preparadas para tal, a reconhecem e crêem
 nela, prestando-lhe obediência.

      O poder simbólico é, para Bourdieu, uma forma transformada, irreconhecível,
 transfigurada e legitimada das outras formas de poder. As leis de transformação que
 regem a transmutação de diferentes espécies de capital em capital simbólico e, em
 particular, o trabalho de dissimulação e transfiguração que assegura uma verdadeira
 transformação das relações de força, transformam essas forças em poder simbólico,
 capaz de produzir efeitos reais, sem gasto aparente de energia.



  2. RELAÇÕES DE PODER NO COTIDIANO DAS INSTITUIÇÕES



      Aliar o poder simbólico ao poder formal e impessoal das organizações
 burocráticas pode parecer, à primeira vista, uma tarefa impossível. No entanto, foi
 esta a realidade detectada nas escolas analisadas, nas relações do dia-a-dia: os
 atores interagem sob o comando do diretor, cujas decisões ou são colegiadas ou são
 referendadas pelo Colegiado.

      Enquanto autoridade maior e presidente do Colegiado, o diretor exerce um poder
 simbólico, reconhecido por todos e vivenciado sem muitos questionamentos. As
 resistências e antagonismos naturais existem, é claro, mas não se manifestam no dia-
 a-dia ou, pelo menos, não se opõem em situações de embate ou luta aberta pela
 imposição de idéias ou pontos de vista.

     Existem hierarquias a serem respeitadas, tarefas a serem executadas, regras a
 serem cumpridas e todo um aparato burocrático, definido em estatutos e regimento,
 que norteiam as ações e interações dos atores dentro da Instituição Escolar.

     Desde o momento em que entram na escola até a hora da saída, são submetidos
 a uma série de regras para o exercício de suas atividades, as quais acatam, em sinal
 de conivência com a ordem estabelecida, mesmo que não se conformem muito com
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 ela.

      Nesta rotina, os chefes colocam a responsabilidade pelas inconveniências das
 ordens que emitem sempre na autoridade mais distante. Por exemplo: o professor
 exige dos alunos e pais porque recebeu orientação do supervisor, este exige do
 professor porque tem que prestar contas ao diretor que, por sua vez, recebeu ordens
 da Secretaria de Educação, por intermédio do Inspetor Escolar.

      E, nesta cadeia hierárquica, onde todos têm um ponto de origem da exigência
 fora de sua própria pessoa, é exercido um poder aparentemente impessoal, apoiado
 nas normas regimentais, nas leis e nas ordens vindas dos órgãos administrativos do
 sistema de ensino.

      Todos são bons, compreensivos e gostariam de colaborar, mas não podem,
 porque a ordem vem de cima; todos são funcionários e estão no mesmo barco,
 sujeitos ao mesmo estatuto e aos mesmos órgãos administrativos. Internamente, os
 arranjos e acordos são feitos, na medida do possível, desde que não firam as normas
 estabelecidas.

     Além disso, todos estão envolvidos em um processo educativo, em torno do qual
 há uma mobilização dos atores, em uma prática do poder simbólico, reconhecido, não
 conhecido como arbitrário, exercido com a conivência de todos.

     Alguns momentos críticos, vividos pela Instituição, revelam todas as
 incompatibilidades e divergências entre os atores e desvendam o poder que, ao invés
 de existir em sua forma simbólica do dia-a-dia, torna-se manifesto e revelado
 expressando-se nas lutas pela imposição de idéias, que não se travam mais nos
 bastidores, mas abertamente.

      Em tais, lutas, o uso da força, o apelo à legitimidade jurídica, a utilização das
 situações e habilidade em benefício próprio e a influência social, política ou ideológica
 colocadas por Weber substituem o poder do dia-a-dia, ao mesmo tempo formal,
 impessoal e simbólico. Foram identificados três momentos críticos: o movimento
 grevista, a eleição de diretores e a extensão de séries.

      A escola, pelo que observamos, nem sempre, ou diria, raramente, é pautada pelo
 princípio de que deva ser governada por interesses dos que estão envolvidos. Será
 que existe, na verdade, interesse em uma gestão democrática? Qual seria então o
 papel da democracia na escola?

       Dentro de um contexto da rede pública, observa-se pelo que tenho notado, que o
 gestor ou diretor escolar assume uma nova centralidade organizacional, sendo o que
 deve prestar contas pelos resultados educacionais conseguidos, transformando-se no
 principal responsável pela efetiva concretização de metas e objetivos, quase sempre
 centrais e hierarquicamente definidos.

      Neste sentido, esta concepção de gestão introduz uma nova nuance na
 configuração das relações de poder e autoridade nos sistemas educativos. Trata-se
 de uma autoridade cuja legitimidade advém agora da revalorização neoliberal do
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 “direito a gerir” — direito este, por sua vez, apresentado como altamente convergente
 com a idéia neoconservadora que vê a gestão ao serviço de uma nova ordem social,
 política e econômica, com formas de avaliação que facilitam a comparação e o
 controle de resultados, embora no primeiro modelo se exija sempre a sua divulgação
 pública e no outro essa prestação de contas se faça diretamente às hierarquias de
 topo da administração.

       Democracia refere-se à “forma de governo” ou a “governo da maioria”; então,
 torna-se claro, que as relações cotidianas no âmbito escolar, deveriam explicitar esta
 linha de ação, porém sabendo-se que toda gestão, pressupõe uma AÇÃO e a palavra
 ação é justamente o oposto da inércia, do comodismo, espera-se do gestor
 educacional atitudes compromissadas de construir, de fazer e o que observa-se são
 atitudes autoritárias, seguindo diria, uma linha horizontal, onde os princípios
 democráticos não se inserem; visto que a escola deve ser vista como um lugar
 privilegiado para a construção do conhecimento e como eixo base das relações
 humanas, viabilizando não só a produção de conhecimentos como também de
 atitudes necessárias à inserção neste novo mundo com exigências cada vez maiores
 de cidadãos participativos e criativos,

      Seria para muitos, um exagero em considerar a gestão escolar na esfera pública,
 autoritária. Porém, partindo-se que o autoritarismo está ligado a práticas
 antidemocráticas e anti-sociais e estas, permeiam sutilmente a gestão das escolas
 públicas, creio sim, que este termo não estaria sendo utilizado aqui, neste artigo, de
 forma errada, a afrontar a administração pública.

      A questão do controle, do poder aprisionado nas mãos de diretores e superiores
 ainda é prática constante. Administrar escolas é tarefa árdua, porém, dentro dos
 moldes do autoritarismo, legitima-se então, traumas antigos em que a sociedade se
 mostra ainda fragilizada, com medo, sem liberdade de se expressar e covardemente
 cedendo lugar às ideologias.

      Percebe-se na gestão educacional, uma administração voltada com ações na
 verdade, reprodutoras de uma sociedade infelizmente alienada e passiva, ditando
 regras e não estabelecendo uma relação dialógica ideal      com os envolvidos,
 estabelecendo meramente uma transmissão de ordens, alegando na maioria das
 vezes cumprirem determinações que lhes vem de cima não proporcionando assim,
 momentos para discussão.

      Todas as iniciativas de política educacional, apesar de sua aparente autonomia,
 têm um ponto em comum: o empenho em reduzir custos, encargos e investimentos
 públicos, buscando senão transferi-los e/ou dividi-los, com a iniciativa privada e
 organizações não governamentais.

       A participação é muitas vezes, limitada, controlada e puramente formal. A
 estrutura técnica se sobrepõe aos indivíduos envolvidos e o poder e a autoridade
 (leia-se: autoridade : como não prática social- sem visão crítica) se instalam de forma
 sutil , com obediência, dentro de uma perspectiva clássica de administração que
 repudia a participação, o compartilhar idéias, a liberdade para expressar-se , a
 deliberação de decisões e o respeito às iniciativas.
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      A questão do controle ainda é muito forte e mesmo sabendo que o poder e a
 autoridade são necessários em muitos momentos dentro de várias organizações,
 intermediando e viabilizando ações criativas para melhora, observa-se ainda um
 controle rígido, um descompromisso e muito pouca participação da comunidade
 escolar como um todo (professores, pais, funcionários, lideranças de bairro) no
 processo da gestão escolar, causando assim automaticamente uma acomodação, em
 que as pessoas não se mobilizam para nada e ficam alheias, esperando sempre
 serem orientadas ou então aceitando passivamente tudo que venha das “autoridades
 competentes”, sem quer que seja , nenhum questionamento crítico construtivo.

     As atuais discussões sobre gestão escolar têm como dimensão e enfoque de
 atuação: a mobilização, a organização e a articulação das condições materiais e
 humanas para garantir o avanço dos processos socio-educacionais, priorizando o
 conhecimento e as relações internas e externas da escola.

     No contexto das instituições escolares, o mecanismo de disciplina produz um tipo
 de máquina, que se organiza como uma pirâmide e opera como uma rede com sua
 forma hierarquizada, contínua e funcional. Para Foucault, a vigilância também
 estabelece uma simetria crescente ente poder e produção, poder e saber.

     No contexto escolar, os dispositivos disciplinares são sanções normalizadoras.
 Nele funciona um pequeno mecanismo penal. O castigo tem a função de reduzir os
 desvios, ele é corretivo.

      Na medida em que a visibilidade constante dos indivíduos e a invisibilidade
 permanente do poder disciplinar fazem com que os indivíduos se adestrem, se
 ajustem e se corrijam inicialmente por motor próprio, pode-se afirmar que a vigilância
 substitui a violência e a força. Sem essas, passa a ser ainda possível se falar em um
 adestramento ou readestramento espiritual, das almas, e não dos corpos.

      Para Pogrebinschi (2004) a escola é o espaço onde as relações de poder são
 nítidas, embora não represente o próprio poder: Com a vigilância, o poder discipilinar
 torna-se um sistema integrado, converte-se no conceito de diagrama. Não há um
 centro, não há um chefe no topo da forma piramidal desse poder: a engrenagem
 como um todo produz poder. Trata-se de um poder em essência relacional.

       O psicanalista J. Lacan ,observou que a partir do momento em que alguém se vê
 "rei", ele muda sua personalidade. Um cidadão qualquer quando sobe ao poder, altera
 seu psiquismo. Seu olhar sobre os outros será diferente; admita ou não ele olhará "de
 cima" os seus "governados", os "comandados", os "coordenados", enfim, os demais.

       Estar no poder, diz Lacan, "dá um sentido interiormente diferente às suas
 paixões, aos seus desígnios, à sua estupidez mesmo". Pelo simples fato de agora ser
 "rei", tudo deverá girar em função do que representa a realeza. Também os
 "comandados" são levados pelas circunstâncias a vê-lo como o "rei do pedaço".

     La Boétie parecia indignado em perceber o quanto o lugar simbólico de poder faz
 o populacho se oferecer a uma certa "servidão voluntária". Bourdieu chama-nos
 atenção para a força que o símbolo exerce sobre os indivíduos e grupos. Antes de
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 ocupá-lo, o poder atrai e fascina; depois de ocupado tende a colar a alguns como se
 lhes fossem eterno. Aí está a diferença entre um Fidel Castro e um Nelson Mandela.

     O primeiro e a maioria dos ditadores pretendem se eternizar no poder, o
 segundo, mais sábio, toma-o como transitório, evitando ser possuído pelo próprio.
 ("Possuído", sim, pois o poder tem algo de diabólico, que tenta, que corrompe, etc).

      Uma vez no poder, o sujeito precisará de personas (máscaras) e molduras de
 sobrevivência. A persona serve para enganar a si e aos outros. A moldura, é algo
 necessário para delimitar simbolicamente a ação dele enquanto representante do
 poder. A ausência de moldura ou o seu mau uso fará irromper a força pulsional do
 sujeito que anseia por mais e mais poder, podendo vir a se tornar uma patologia
 psíquica. A história coleciona exemplos: Hitler, Stalin, Mobutu, Collor de Melo, Pol Pot,
 Idi Amim, etc.

       O poder faz fronteira com a loucura, afirma Lima (2002). Não é sem motivo que
 muitos loucos se julgam Napoleão ou o Rei Luis XV. Parece que há algo de "loucura
 narcísica" nas pessoas que anseiam chegar ao poder político (governante de uma
 cidade, estado ou país, ministro, membro do secretariado local), ou ao poder de uma
 instituição, empresa, departamento, pequeno setor de uma organização qualquer ou
 grupo qualquer.

     O narcisismo de quem ocupa o poder, revela-se na auto-admiração (o amor a si e
 aos seus feitos), na recusa em aceitar o que vem dos outros e no gozo que ele extrai
 do poder, que, levado ao extremo poderia revelar loucura. R. Kurz, é direto ao
 declarar que "o poder torna as pessoas estúpidas e muito poder, torna-as
 estupidíssimas".

     No contexto da instituição escolar e nas instâncias superiores que controlam o
 processo, é bem visível essa manifestação medíocre de poder.

     O sociólogo M. Tragtenberg certa vez observou como muitos intelectuais
 discursam uma preocupação pelo "social", mas estão mesmo preocupados com a
 sua "razão do poder". Há uma espécie de "gozo louco" pelo poder, que faz subir a
 cabeça dos que estão jogando para ganhá-lo um dia.

      Os sujeitos quando no poder protege-se da crítica reforçando pactos de auto-
 engano com seus colegas de partido. Reforçam a crença de que representam o Bem
 contra o Mal, recusam escutar o outro que lhe faz crítica e que poderia norteá-lo para
 corrigir seus erros e ajudar a superar suas contradições.

     Se entrincheirarem no grupo narcísico, o discurso político tornar-se-á dogmático,
 duro, tapado, e podemos até prever qual será o seu futuro se tomar o caminho de
 também eliminar os divergentes internos e fazer mais ações de governo contra o
 povo, "em nome do povo".

     Infelizmente assim é o poder: seduz, corrompe, decepciona e faz ponto cego e
 surdo nos seus ocupantes temporários.
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  3. PARA ALÉM DO PODER DISCIPLINAR E BIOPODER



            O conceito de poder foucaultiano se situa, entretanto, em algum lugar
 entre o direito e a verdade. Foucault quer estudar o modo pelo qual o poder se
 exerce, o “como do poder”, conforme ele mesmo explica – em outras palavras, isso
 equivale a compreender os mecanismos do poder balizados entre os limites impostos
 de um lado pelo direito, com suas regras formais delimitadoras, e de outro pela
 verdade, cujos efeitos produzem, conduzem eeconduzem novamente ao poder.

      É nesse sentido que Foucault menciona a relação triangular que se estabelece
 entre esses três conceitos: poder, direito e verdade.

     Como bem observa Habermas, o que se passa é que Foucault torna a verdade
 dependente do poder – invertendo uma relação que, no âmbito da filosofia do sujeito,
 supostamente se exerceria no sentido contrário.

      O poder, portanto, institucionaliza a verdade. Ou, ao menos, ele institucionaliza a
 busca da verdade ao institucionalizar seus mecanismos de confissão e inquirição. A
 verdade se profissionaliza, pois, afinal, no seio daquela relação triangular, a verdade é
 a norma: nesse sentido, e antes de mais nada, são os discursos verdadeiros que
 julgam, condenam, classificam, obrigam, coagem, trazendo sempre consigo efeitos
 específicos de poder.

      Na visão de Pogrebinschi (2004): “O poder produz: ele destrói e reconstrói, ele
 transforma, acrescenta, diminui, modifica a cada momento e em cada lugar a si
 mesmo e a cada coisa com a qual se relacione em uma rede múltipla, móvel,
 dinâmica, infinita... o poder é produção em ato, é a imanência da produtividade”.

       A questão aqui, neste trabalho é relacionar as relações de poder no âmbito das
 instituições escolares as quais produzem um sintoma inconsciente ou não que
 culminam na repulsa pela ordem e pela disciplina por parte de alguns alunos e até
 mesmo dos professores.

      O poder como modo de disciplinar o sujeito seja em todas as esferas sociais
 nasceu com o próprio sujeito que experimenta uma posição superior em relação aos
 outros, evoluindo conforme exigências dos novos tempos.

      Fazendo uma análise de Foucault, Pogrebinschi (2004) questiona sobre as
 transformações ocorridas nas relações de poder: “Ao longo dos séculos XVII e XVIII
 portanto, no que tange às relações de poder, muitas transformações passam a ser
 operadas. A mais importante delas consiste certamente na constatação foucaultiana
 de que o poder da soberania é substituído gradativamente pelo poder disciplinar e,
 por conseguinte, as monarquias soberanas se convertem aos poucos em verdadeiras
 sociedades disciplinares.
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     Mas a que se deve esta transformação longo desses dois séculos, multiplicaram-
 se por todo o corpo social verdadeiras instituições de disciplina, tais como as oficinas,
 as fábricas, as escolas e as prisões – que passam a constituir seu objeto de
 investigação em Vigiar e punir.

            Nino, afirma Foucault (2001): “o poder disciplinar é com efeito um poder
 que, em vez de se apropriar e retirar, tem como função, maior adestrar, ou sem dúvida
 adestrar para retirar e se apropriar ainda mais e melhor”.

      Para compreensão da noção de poder disciplinar, que nos leva à vigilância
 constante, Foucault (1999) utilizou o conceito de panoptismo O termo “panóptico” foi
 sugerido pelo filósofo e jurista inglês Jeremy Bentham. Em uma prisão que possui
 uma arquitetuta que permite aos guardas verem continuamente o que se passa no
 interior de cada cela, o panóptico é a torre de observação central. Os presos não
 podem ver se estão ou não sendo observados dessa torre. Essa incerteza faz com
 que eles mesmos se disciplinem.

      Foucault observou que os séculos XVII e XVIII também assistiram a uma efusão
 de dispositivos disciplinares ao longo de toda a extensão da estrutura da
 sociedade. Mas em que consistem esses dispositivos disciplinares? Em que consiste,
 afinal, a disciplina? A disciplina é uma tecnologia específica do poder, ela é “um tipo
 de poder, uma modalidade para exercê-lo, que comporta todo um conjunto de
 instrumentos, de técnicas, de procedimentos, de níveis de aplicação, de alvos; ela é
 uma física ou uma anatomia do poder, uma tecnologia”.

       Na medida em que o poder disciplinar é uma modalidade de poder múltipla,
 relacional, automática e anônima, a disciplina, por sua vez, também faz crescer e
 multiplicar aquilo e aqueles que estão a ela submetidos.

      Nesse sentido, pode-se dizer que a disciplina é uma técnica que fabrica
 indivíduos úteis. A disciplina faz crescer e aumentar tudo, sobretudo a produtividade.
 E aqui se fala em produção não apenas em um sentido econômico. Além de ampliar a
 produtividade dos operários nas fábricas e oficinas, a disciplina faz aumentar a
 produção de saber e de aptidões nas escolas, de saúde nos hospitais e de força no
 exército, por exemplo.

       São por esses motivos, principalmente, que Foucault fala em um triplo objetivo da
 disciplina: ela visa tornar o exercício do poder menos custoso – seja econômica ou
 politicamente –, busca estender e intensificar os efeitos do poder o máximo possível
 e, ao mesmo tempo, tenciona ampliar a docilidade e a utilidade de todos os indivíduos
 submetidos ao sistema.

     Quanto aos dispositivos disciplinares, ou instrumentos do poder disciplinar,
 também são em número de três os seus principais, quais sejam: o olhar hierárquico, a
 sanção normalizadora e o exame. O olhar hierárquico consiste antes na idéia mais
 ampla de vigilância.

      A vigilância é a mais importante máquina, a principal engrenagem do poder
 disciplinar: ela contribui para automatizar e desindividualizar o poder, ao passo que
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 contribui para individualizar os sujeitos a ele submetidos. Ao mesmo tempo, a
 vigilância produz efeitos homogêneo de poder, generaliza a disciplina, expandindo-a
 para além das instituições fechadas. Nesse sentido, pode-se dizer que ela assegura,
 como explica Foucault, uma distribuição infinitesimal do poder.

      O poder disciplinar, portanto, passa, a partir da segunda metade do século XVIII,
 a ser complementado pelo biopoder. Complementado porque não se opera
 efetivamente uma substituição, mas apenas uma pequena modificação - ou
 adaptação –, e jamais uma exclusão. Em outras palavras, o biopoder implanta-se de
 certo modo no poder disciplinar, ele embute e integra em si a disciplina,
 transformando-a ao seu modo.

      O biopoder “não suprime a técnica disciplinar simplesmente porque é de outro
 nível, está noutra escala, tem outra superfície de suporte e é auxiliada por
 instrumentos totalmente diferentes”. Ambas as espécies de poder passam assim,
 portanto, a coexistir no mesmo tempo e no mesmo espaço.

      São muitas as variações, entretanto, encontradas entre as duas mecânicas de
 poder em questão. Ao passo que o poder disciplinar se faz sentir nos corpos dos
 indivíduos, o biopoder aplica-se em suas vidas. Enquanto a disciplina promove a
 individualização dos homens, o biopoder acarreta uma massificação, tendo em vista
 que ele se dirige não aos indivíduos isolados, mas à população.

     Daí que os efeitos do biopoder se fazem sentir sempre em processos de
 conjunto, coletivos, globais... processos esses que fazem parte da vida, da vida de
 uma população: os nascimentos, as doenças e as mortes constituem exemplos
 desses processos. E o biopoder trata exatamente do conjunto desses processos de
 natalidade, longevidade e mortalidade, seja comparando a proporção dos
 nascimentos e dos óbitos, seja verificando a taxa de fecundidade de uma população.
 Enfim, são vários os exemplos cedidos por Foucault para explicar essa modalidade de
 poder.

     O que é importante perceber é que em todos esses processos nos quais se
 exerce o biopoder há concomitantemente uma extensa produção de saber. Entram
 em campo as ciências exatas e biológicas: a Estatística e a Biologia, principalmente,
 passam a ser extremamente importantes nesse momento em que se necessitam de
 demografias, políticas de natalidade, soluções para endemias, entre outras coisas
 mais.

      Há, portanto, um elemento em comum que transita entre o poder disciplinar e
 biopoder, entre a disciplina e a regulamentação, e que possibilita a manutenção do
 equilíbrio entre a ordem disciplinar do corpo e a ordem aleatória da população. Esse
 elemento é a norma, “que pode tanto se aplicar a um corpo que se quer disciplinar
 quanto a uma população que se quer regulamentar”.

     A norma da disciplina e a norma da regulamentação dão origem ao que Foucault
 chama de sociedade de normalização, uma sociedade regida por essa norma
 ambivalente, na qual coexistem indivíduo e população, corpo e vida, individualização
 e massificação, disciplina e regulamentação.
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      Foucault teceu para compreender historicamente o poder tal como ele se
 manifestou ao longo dos séculos (estamos falando, evidentemente, do poder
 disciplinar e do biopoder) e o significado do conceito de poder, este apenas em forma
 abstrata, que criou para lograr opor-se às teorias tradicionais do poder e, assim,
 promover a limpeza de terreno necessária para colocar em prática a sua analítica –
 ou genealogia – do poder.

      O poder disciplinar e o biopoder, portanto, assim como o poder da soberania,
 operam como categorias historicamente constituídas, ou melhor, são chaves de
 análise e interpretação do poder tal como ele se manifestou através de seus efeitos
 na história da sociedade ocidental. Enquanto categorias analíticas, descritivas,
 contudo, o poder disciplinar e o biopoder servem como instrumentos para que
 Foucault crie ainda uma nova categoria; na verdade, um novo conteúdo, um novo
 significado para o conceito de poder.

      Pode-se pensar, por conseguinte, que, com Foucault, o conceito de poder passa
 a ganhar um sentido emancipatório, libertador, ao liberar-se do estigma, do falso
 estigma, da repressão. Ao emancipar-se desse falso atributo e passar a conter em si
 mesmo o ideal de emancipação, o poder, agora visto como algo positivo, irrompe
 também como pura e plena produtividade.



  4. DIFERENÇA ENTRE PODER E SABER



      Foucault reconhece a diferença entre poder e saber, mesmo referindo-se sempre
 às suas interconexões. Distancia esses conceitos das concepções correntes, nas
 quais o poder funciona apenas de forma negativa e a verdade ou o saber podem
 inverter, apagar ou desafiar a dominação do poder repressivo. Quem de nós não
 viveu essa concepção negativa de poder dos movimentos sociais do passado, como o
 movimento estudantil, e que ainda se mantém viva até hoje entre muitos teóricos e
 ativistas?

     A relação entre poder e saber encontra-se em muitos dos discursos educacionais
 que se reconhecem radicais; segundo o que acreditam,através do processo de
 conscientização e educação, os poderes dominantes podem ser desmascarados para
 revelar "a verdade" e assim, aumentar o potencial para derrubar o "sistema": o saber
 serve de contra-ataque aos males do poder.

     Foucault utiliza-se da expressão poder/ saber - para deixar claro a relação entre
 ambos - a qual desafia a suposição de que alguma verdade não-distorcida pode ser
 alcançada:

       O poder não é necessariamente repressivo; ele incita, induz, seduz, torna mais
 fácil ou mais difícil, amplia ou limita, torna mais provável ou menos provável. O poder
 é exercido ou praticado em vez de possuído e, assim, circula, passando através de
 toda força a ele relacionada. Gore diz que na educação o poder não está apenas ao
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 alcance dos professores, mas os pais, os estudantes, os administradores e o governo
 exercem poder nas escolas.

       Outro conceito na obra de Foucault importante de ser considerado nessa
 discussão sobre educação diz respeito a governo. Gore (1994) retoma a visão de
 governo do século XVI a qual se refere tanto às estruturas políticas e à administração
 dos estados, como à forma pela qual a conduta dos indivíduos ou grupos podia ser
 dirigida; governar seria, pois, estruturar o campo possível de ação dos outros.
 Existiria, pois, o governo das crianças, das almas, das comunidades, das famílias, dos
 doentes, entre outras formas.

     Sobre isso, Foucault na obra Vigiar e Punir mostra que as formas modernas de
 governo mudaram passando do poder soberano – aberto, visível e localizado na
 monarquia - para o poder disciplinar, exercido de modo a não aparecer.

      Quando levadas para as reflexões do contexto escolar, esta idéia de poder
 disciplinar possibilita a explicação sobre a auto-regulação dos estudantes em muitas
 situações de sala de aula.

      Para Foucault, as escolas e a educação formal exercem um papel importante no
 poder disciplinar. É o que ele trata pormenorizadamente em "Vigiar e punir", na parte
 referente à disciplina, ao descrever as inovações pedagógicas iniciais e o modelo que
 elas forneceram para a economia, a medicina e a teoria militar do século XVIII. É
 importante destacar que, para ele, as relações de poder se referem aos mecanismos
 que constroem instituições e experiências institucionais, e não às pessoas no interior
 dessas instituições, como comumente se pensa nesse poder exterior ao indivíduo.

      Em relação à educação, o processo pedagógico corporifica relações de poder
 entre professores e aprendizes - e não apenas alunos, já que não se trata apenas de
 relações escolares, mas educacionais de modo geral, que ocorrem em outros
 espaços.

      A pedagogia se baseia em técnicas particulares de governo, e produz e reproduz,
 em diferentes momentos, regras e práticas particulares; cada vez mais tem enfatizado
 o autodisciplinamento, pelo qual os estudantes devem conservar a si e aos outros sob
 controle; principalmente no ensino das séries iniciais esses mecanismos são mais
 claros. Na Universidade, são camuflados pela autonomia e liberdade que "são dadas"
 e reforçadas por muitos professores.

       As técnicas/práticas que induzem a esse comportamento são denominadas por
 Foucault de tecnologias do eu, as quais agem sobre o corpo: olhos, mãos, boca,
 movimento. Diz Gore (1994), que as pedagogias produzem regimes corporais
 políticos particulares e funcionam como regimes de verdade. As relações disciplinares
 de poder-saber são fundamentais aos processos da pedagogia, sejam elas impostas
 pelos professores, auto-impostas, ou impostas sobre os professores.

      O mais interessante para nós, em termos de perspectivas de compreensão e
 interpretação do fazer pedagógico é a defesa foucaultiana de que os discursos
 radicais e emancipatórios não estão isentos dessa análise.
FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional
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                                      instituições.

     Nos séculos XIX e XX, o projeto do progresso universal através da educação foi
 pensado por filantropos, igrejas e governos progressistas, no sentido de transformar
 as pessoas em cidadãos moral e politicamente úteis. Neste sentido, foi fundamental a
 contribuição de ciências emergentes como a Psicologia, Sociologia e Ciência Política,
 as quais desenharam as metodologias empíricas e cientificamente verificáveis que
 possibilitariam identificar de modo objetivo sistemas sociais mais racionais, mais de
 acordo com a modernidade.

      Predominava uma visão utilitária de educação e os governos progressistas da
 Europa e dos Estados Unidos se responsabilizaram pela administração das escolas e
 das universidades, fazendo com que alguns pensadores da época considerassem
 benevolência desinteressada a educação patrocinada por um Estado racional, "não
 permitindo o mal que seria uma multidão vagando pelas ruas numa ignorância pouco
 iluminada.

      A visão da educação como benevolência desinteressada foi ampliada pelos
 teóricos coletivistas liberais e socialistas, para os quais a educação era uma questão
 de eficiência nacional e uma preocupação nacional assumida no interesse de uma
 comunidade como um todo" (Jones, 1994).

      A ciência educacional imaginava uma educação científica que transformaria o
 capital humano; essa é a visão iluminista de Kant, influência direta do Emílio de
 Rousseau: "uma educação corretamente ordenada revelaria ou recuperaria a
 natureza verdadeira do homem e criaria em todo indivíduo a capacidade latente para
 a liberdade moral" (Jones, 1994).




                                 CAPÍTULO IV
    O PODER COMO IDEAL NARCÍSICO NA RELAÇÃO
                   EDUCATIVA



     A educação deve levar à supremacia da razão sobre os impulsos, em detrimento
 do recalque, isto é, ajudar o homem a vencer a ilusão – reforçada pela religião – e o
 recalque, possibilitando um pensamento racional livre, que funcione como juízo
 consciente.
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  • 2. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. APRESENTAÇÃO GERAL DO CURSO [Escrever um prefácio geral, para todos os módulos do curso]
  • 3. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. SUMÁRIO CAPÍTULO I A DIDÁTICA DO ENSINO SUPERIOR 1. PRELÚDIO METODOLÓGICO 2. BASE DA DIDATICA CAPÍTULO II DIDÁTICAS ESPECÍFICAS E CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO PROFISSIONAL 1. FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL 2. O PAPEL DA DIDÁTICA NA FORMAÇÃO 3. O PROBLEMA E UMA POSSÍVEL SOLUÇÃO 4. ATIVIDADES DE FORMAÇÃO ORIENTADAS 5. O PROFESSOR E A COMPETÊNCIA CAPÍTULO III A EDUCAÇÃO E AS RELAÇÕES DE PODER 1. AS RELAÇÕES DE PODER 2. RELAÇÕES DE PODER NO COTIDIANO DAS INSTITUIÇÕES 3. PARA ALÉM DO PODER DISCIPLINAR E BIOPODER 4. DIFERENÇA ENTRE PODER E SABER CAPÍTULO IV O PODER COMO IDEAL NARCÍSICO NA RELAÇÃO EDUCATIVA CAPÍTULO V O PROFESSOR COMO INTELECTUAL NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICAS
  • 4. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. CAPÍTULO I A DIDÁTICA DO ENSINO SUPERIOR 1. PRELÚDIO METODOLÓGICO A disciplina de Didática do Ensino Superior pretende contribuir para formação do professor e pesquisador, mediante a compreensão das especificidades do trabalho docente, na situação institucional formativa e curricular do ensino superior. Supõe compreender o trabalho docente, tanto na perspectiva da construção de saberes sociais, pedagógicos e docentes tácitos, construídos nas diversas relações pedagógicas no contexto da sociedade, bem como no sentido da sua formalização, através da Didática. Entende-se esta disciplina, como campo de estudo sistematizado, intencional, de investigação e de prática, na ótica do ensino, numa perspectiva contextualizada que considere a historicidade dos fatores condicionantes econômicos, sócio-culturais, políticos e educacionais contemporâneos, como também, as influências das diversas subjetividades individuais e coletivas envolvidas numa determinada prática pedagógica. Esta proposta elege a sala de aula, como núcleo de referência da Didática, e enseja a análise de práticas pedagógicas docentes concretas, com o objetivo de apreender as suas relações (professor-aluno, ensino-apredizagem, ensino-pesquisa, teoria-prática, conteúdo-forma, educação-sociedade) e os seus significados ideológico-políticos, sócio-culturais e pedagógico-didáticos. Espera-se assim, que a disciplina venha oferecer elementos teórico-práticos que possibilitem condições para (re)significar práticas pedagógicas no ensino superior, apontando alternativas de atuação que se voltem para sinalização de uma nova prática, na perspectiva da formação de um homem pensante (crítico, independente, autônomo), criativo (sensível) e comprometido ética e politicamente com as mudanças na sociedade contemporânea. A maioria dos professores do ensino superior teve uma formação pautada por preceitos da ciência moderna, influenciando seu modo de ver o mundo e marcando suas relações com o conhecimento e com os alunos. No entanto, percebemos hoje um mundo globalmente interligado, sendo preciso uma mudança nas percepções e concepções diante da realidade, do ser, da educação. Assim, a Didática do Ensino Superior passa necessariamente pela reflexão sobre o papel e os novos paradigmas que a ciência vem desenvolvendo e sua
  • 5. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. interferência nas concepções educacionais. 2. BASE DA DIDATICA O professor precisa dispor de conhecimentos e habilidades pedagógicas, que podem ser obtidas e aperfeiçoadas mediante leituras e cursos específicos. Estes conhecimentos e habilidades podem ser definidos como requisitos técnicos e envolvem: a) Estrutura e Funcionamento do Ensino Superior — O professor deve ser capaz de estabelecer relações entre o que ocorre em sala de aula com processos e estruturas mais amplas. Isto implica a análise dos objetivos a que se propõe o ensino universitário brasileiro, bem como dos problemas que interferem em sua concretização. E exige conhecimentos relativos à evolução histórica das instituições e à legislação que as rege. b) Planejamento de Ensino — A eficiência na ação docente requer planejamento. O professor precisa ser capaz de prever as ações necessárias para que o ensino a ser ministrado por ele atinja os seus objetivos. Isto exige a cuidadosa preparação de um plano de disciplina e de tantos planos de unidade quantos forem necessários. c) Psicologia da Aprendizagem — O que o professor espera de seus alunos é que aprendam o conteúdo da disciplina que pretende lecionar. Neste sentido conhecimentos de Psicologia poderão ser muito úteis, pois esclarecem acerca dos fatores facilitadores da aprendizagem. d) Métodos de Ensino — A moderna Pedagogia dispõe de inúmeros métodos de ensino. Convém que o professor conheça as vantagens e limitações de cada método para utilizá-los nos momentos e sob as formas mais adequadas. e) Técnicas de Avaliação — Não se pode conceber ensino sem avaliação. Não apenas a avaliação no final do curso, mas também a avaliação formativa, que se desenvolve ao longo do processo letivo e que tem por objetivo facilitar a aprendizagem. Assim, o professor universitário e pesquisador precisa estar capacitado para elaborar instrumentos para a avaliação dos conhecimentos e também das habilidades e atitudes dos alunos. Outro fator a ser vislumbrado é o domínio cognitivo, o qual envolve seis categorias: 1. Memorização — Evocação de algo que tenha sido aprendido. Os objetivos desta categoria podem ser expressos pelos verbos: citar, identificar, listar, definir etc. Por exemplo: “Definir o conceito de Administração Científica”. 2. Compreensão — Reafirmação do conhecimento sob novas formas. Neste nível, o indivíduo conhece o que está sendo comunicado e pode fazer uso do
  • 6. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. respectivo material ou idéia. Não se torna, porém, capaz de relacioná-lo a outro material ou de perceber suas implicações mais complexas. Os objetivos desta categoria podem ser expressos pelos verbos: ilustrar, exemplificar, traduzir etc. 3. Aplicação — Uso de abstrações em situações particulares e concretas. As abstrações podem apresentar-se sob a forma de idéias gerais, princípios técnicos ou regras de procedimento que devam ser aplicadas. Os objetivos desta categoria podem ser expressos pelos verbos: aplicar, demonstrar, usar, inferir etc. 4. Análise — Separação de um todo em partes componentes. Em sua forma mais elementar, a análise envolve uma simples relação de elementos. Num nível mais elevado implica determinar a natureza do relacionamento entre esses elementos. Os objetivos desta categoria podem ser expressos pelos verbos: analisar, distinguir, categorizar, discriminar etc. 5. Síntese — Combinação conjunta de certo número de elementos para formar um todo coerente. Envolve o processo de trabalhar com peças, partes ou elementos, dispondo-os de forma a constituir um padrão ou estrutura que antes não estava evidente. Os objetivos desta categoria podem ser expressos pelos verbos: resumir, compor, formular, deduzir etc. 6. Avaliação — Julgamento acerca do valor do material e dos métodos para propósitos determinados. Esta categoria constitui o mais alto nível da taxionomia no domínio cognitivo. Seus objetivos podem ser expressos pelos verbos: avaliar, criticar, julgar, decidir etc. No que se refere ao domínio afetivo, vale mencionar que este envolve cinco categorias: 1. Receptividade — Disposição para tomar consciência de um fato e de prestar atenção ao mesmo. Esta categoria constitui o nível mais baixo da taxionomia, e seus objetivos podem ser expressos pelos verbos: escutar, atender, perceber, aceitar etc. 2. Resposta — Reação a um fato. Neste nível o estudante vai além da simples receptividade; ele está disposto a receber o estímulo dado, não o evitando. Os objetivos desta categoria podem ser expressos pelos verbos: concordar, acompanhar, responder etc. 3. Valorização — Reconhecimento do valor de uma coisa, fenômeno ou comportamento. Dentre os verbos que expressam objetivos desta categoria estão: reconhecer, apreciar, aceitar etc. 4. Organização — Organização de valores num sistema. Quando o estudante encontra mais de um valor relevante para uma situação, ele os organiza, determina a inter-relação e aceita um como o dominante. Os verbos organizar, pesar, formar, desenvolver e discutir são utilizados para expressar objetivos desta categoria. 5. Caracterização por um valor ou complexo de valores — Neste nível, que é o mais elevado do domínio afetivo, o estudante age firmemente de acordo com os
  • 7. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. valores que aceita, tornando-se este comportamento parte de sua personalidade. Os verbos revisar, mudar, rejeitar e acreditar expressa objetivos desta categoria. CAPÍTULO II DIDÁTICAS ESPECÍFICAS E CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO PROFISSIONAL 1. FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL Nos últimos anos, nas Ciências da Educação, tem-se afirmado a importância do papel do professor como educador, permanentemente atento às necessidades e ao desenvolvimento dos seus alunos, e como membro da comunidade escolar, empenhado na construção do projeto educativo da escola. Em contrapartida, ocupar-se da Didática e preocupar-se com o ensino de disciplinas específicas chega a ser visto com desconfiança, como se se tratasse de algo do passado que nada de importante teria para trazer à formação de professores. No entanto, a aprendizagem de conhecimentos, o desenvolvimento de capacidades, atitudes e valores de ordem disciplinar e a organização por áreas do saber marca decisivamente a vida escolar. Os programas de formação (tanto inicial como contínua) que não tenham em conta esta realidade conduzem necessariamente os seus formandos à frustração e ao desencanto quando se confrontam com as situações da prática. Os jovens professores sofrem então o efeito do processo de socialização profissional, que acaba por constituir um segundo momento de formação (normalmente de “sinal contrário” ao da formação inicial), com força mais do que suficiente para exercer um efeito dominante nas suas concepções e práticas profissionais. Os professores não podem exercer o seu papel com competência e qualidade
  • 8. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. sem uma formação adequada para lecionar as disciplinas ou saberes de que estão incumbidos, sem um conjunto básico de conhecimentos e capacidades profissionais orientados para a sua prática letiva. Não negando a importância das outras vertentes da formação, há que continuar a valorizar a formação didática, que apóia o ensino de saberes específicos. É importante fazê-lo de modo convergente com os restantes domínios e objetivos da formação e com o que se sabe acerca do desenvolvimento profissional dos professores. A formação dos professores é o problema-chave do sistema educativo. Ela influencia a orientação da escola não apenas no plano de transmissão dos conhecimentos, mas também no das normas e valores, constituindo um lugar de forte concentração ideológica. No discurso de crise crônica que desde há muito se instalou na área educativa, a formação de professores aparece frequentemente como solução que, uma vez posta em prática, permitiria resolver de uma só vez todos os problemas. Devemos ter, no entanto, uma clara noção das suas possibilidades e limites. A formação não permite ultrapassar todas as dificuldades. A formação de professores só pode influenciar as suas práticas em determinadas condições e dentro de determinados limites. O que não quer dizer que não seja essencial e não mereça por isso o melhor da nossa atenção. Diversos modelos têm sido propostos para a formação de professores. Num trabalho que marcou toda uma época, Marcel Lesne contrasta diversos grandes modos de trabalho de formação sob o ponto de vista da natureza do ato pedagógico, tendo em conta o processo de socialização que lhes está associado. Na formação de tipo transmissivo (que corresponde a uma orientação normativa), a pessoa em formação é, sobretudo, considerada como objeto de socialização, ou seja, é um produto social. Na formação de tipo incitativo (onde sobressai uma orientação pessoal), a pessoa em formação é considerada, sobretudo sujeito da sua própria socialização, determinando-se e adaptando-se de forma ativa aos diferentes papéis sociais. Finalmente, na formação de tipo apropriativo (centrada na inserção social do indivíduo), o formando é considerado como agente de socialização, simultaneamente determinado e determinante. É possível considerar igualmente diversos modelos teóricos, tendo por referência não os propósitos nem os objetivos da formação, nem a estrutura do dispositivo, nem a natureza dos conteúdos, mas o tipo de processos e a sua dinâmica formativa. Distingue assim um modelo de formação centrado nas aquisições, outro na experimentação e outro ainda na análise. Um tema que tem marcado profundamente as discussões mais recentes sobre a formação é o do professor reflexivo. A sua origem deve-se, sobretudo a Donald Schön (1983) que sublinha a importância da reflexão na ação e da reflexão sobre a ação, como dois dos traços distintivos mais importantes dos profissionais competentes. A reflexão respeita, sobretudo, aos processos e capacidades de pensamento do
  • 9. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. professor. No entanto, para ensinar, não basta saber pensar bem, é preciso um vasto conjunto de saberes e competências, que podemos designar por conhecimento profissional. Reagindo contra as tendências que proclamavam o primado da vertente pedagógica na formação de professores, Shulman (1986) chama a atenção para a necessidade que o professor tem de conhecer bem os conteúdos que ensina. Para ele, o professor não tem de conhecer estes conteúdos do mesmo modo que o cientista, mas de um modo diferente. Muito em especial tem de conhecer as boas maneiras de torná-los compreensíveis e relevantes para os alunos. Na verdade, podemos dizer que o conhecimento profissional do professor inclui uma parte fundamental que intervém diretamente na prática letiva. Trata-se de um conhecimento essencialmente orientado para a ação e que se desdobra por quatro grandes domínios: (1) o conhecimento dos conteúdos de ensino, incluindo as suas interrelações internas e com outras disciplinas e as suas formas de raciocínio, de argumentação e de validação; (2) o conhecimento do currículo, incluindo as grandes finalidades e objetivos e a sua articulação vertical e horizontal; (3) o conhecimento do aluno, dos seus processos de aprendizagem, dos seus interesses, das suas necessidade e dificuldades mais freqüentes, bem como dos aspectos culturais e sociais que podem interferir positiva ou negativamente no seu desempenho escolar; (4) o conhecimento do processo instrucional, no que se refere à preparação, condição e avaliação da sua prática letiva. Este conhecimento, longe de estar isolado, relaciona-se de um modo muito estreito com diversos aspectos do conhecimento pessoal e informal do professor da vida quotidiana como o conhecimento do contexto (da escola, da comunidade, da sociedade) e o conhecimento que ele tem de si mesmo. Um outro tema que tem emergido nas discussões sobre a formação é o do desenvolvimento pessoal, profissional e organizacional do professor. Nóvoa (1991), um dos autores portugueses que melhor tem abordado esta questão, sublinha a importância da noção de desenvolvimento pessoal, na dupla valência de investir a pessoa e a sua experiência e investir a profissão e os seus saberes. Indica que a formação contínua deve estimular os professores a apropriarem-se dos seus próprios dos saberes, no quadro duma autonomia contextualizada e interativa, trabalhando-os de um ponto de vista teórico e conceptual. Sublinha que cabe ao desenvolvimento pessoal produzir a vida do professor e para isso é preciso estimular uma perspectiva crítico-reflexiva, que lhe forneça os meios de um pensamento autônomo e facilite as dinâmicas de autoformação participada.
  • 10. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. Este mesmo autor critica as práticas de formação contínua organizadas em torno dos professores individuais, que favorecem o isolamento e reforçam uma imagem dos professores como transmissores de um saber exterior, e endossa as práticas que tomam como referência as dimensões coletivas. Subscreve também a posição de Schön, segundo a qual a prática docente implica a resolução de situações problemáticas, o que exige capacidades de autodesenvolvimento reflexivo aos professores. Reclama a dinamização de dispositivos de investigação-ação e investigação- formação, conjugando uma formação de tipo clínico com uma formação de tipo investigativo, afirmando que a formação não se faz antes da mudança, mas sim durante a mudança. Finalmente, Nóvoa sublinha a importância do desenvolvimento organizacional. Para ele, “não basta mudar o [professor], é preciso mudar também os contextos em que ele intervém”. Isto significa, nomeadamente, que a formação deve ser concebida como um processo permanente, integrada no dia-a-dia dos professores e das escolas. Ele sublinha a importância da noção de participação, indicando que os professores têm de ser protagonistas ativos na concepção, realização e avaliação da formação. Aponta a necessidade de criar uma nova cultura da formação de professores, da qual participem as escolas e as instituições de ensino superior, no quadro de colaborações que caracteriza como de “partenariado pela positiva”. 2. O PAPEL DA DIDÁTICA NA FORMAÇÃO A Didática, no Brasil, tem tido um estatuto de menoridade relativamente a outras áreas da educação. Para isso concorre certamente a perspectiva, ainda hoje dominante em muitos sectores da sociedade (incluindo os professores universitários das diversas disciplinas ditas “científicas” e, muitas vezes, os próprios docentes das áreas “generalistas” das Ciências da Educação) que a Didática não é mais do que um repositório de receitas sobre os modos de transmitir o conhecimento disciplinar, resultantes da acumulação da experiência de longos anos de vida profissional. A Didática, hoje em dia, é mais do que um simples domínio da prática profissional. Ela constitui um campo científico, onde se realiza trabalho de investigação e de produção de novo conhecimento. Como em todo o campo científico, na Didática reconhecem-se duas características: um objeto bem definido e uma metodologia de trabalho própria. Como refere Isabel Alarcão (1989), o objeto da Didática é o conjunto dos fenômenos de ensino-aprendizagem das várias disciplinas e dos vários níveis de ensino, com o objetivo último de contribuir para a melhoria do processo educativo.
  • 11. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. O seu método de investigação corresponde a um modo de trabalho sistemático que inclui numerosas variantes, desde a investigação de cunho quantitativo baseada em procedimentos de análise estatística e outros processos de modelação matemática, à investigação de cunho qualitativo que inclui estudos de caso, entrevistas clínicas e estudos etnográficos e, cada vez mais, estudos de investigação- ação, que envolvem processos colaborativos onde se implicam docentes e investigadores de diferentes instituições. Assim, enquanto que o conhecimento didático (dos professores) se desenvolve de modo natural na formação inicial e na prática profissional, a Didática (como domínio científico) desenvolve-se através duma prática deliberada de investigação teórica e empírica. As fronteiras entre os dois domínios não são muitas vezes claras, já que o principal propósito da Didática é informar e estimular o crescimento do conhecimento didático e a própria Didática precisa do conhecimento didático como ponto de referência fundamental para o seu desenvolvimento. Nesta perspectiva, a Didática assume-se como um saber científico que, numa lógica que Boaventura Sousa Santos (1987) designa por pós-moderna, procura constituir-se como senso comum profissional. A Didática não assume, nesta perspectiva, um cunho estritamente normativo. Antes desempenha o papel de ferramenta conceptual para a análise de situações de ensino-aprendizagem (Alarcão, 1989). Constitui um domínio de teorização, investigação empírica e reflexão que se debruça sobre a natureza do saber próprio de cada disciplina ou área de conhecimento, sobre os seus objetivos, métodos e conteúdos enquanto saber escolar, bem como sobre a dinâmica do processo de ensino-aprendizagem e a sua avaliação. O seu objeto é irredutivelmente complexo, relacionando-se com um domínio de prática, o conhecimento profissional a ele associado (o conhecimento didático) e os numerosos fatores que com eles interagem diretamente. Por isso, a Didática de uma disciplina específica necessita de recorrer ao concurso de múltiplas disciplinas e domínios6 e daí o seu forte caráter interdisciplinar. A Didática constitui um campo científico emergente que tem percorrido um caminho semelhante ao de outras áreas científicas que estudam fenômenos transversais ou sociais (Alarcão, 1989). Ela começou por ser uma simples disciplina aplicada (principalmente da Pedagogia e da Psicologia), para se tornar depois num campo pluridisciplinar. Estuda uma variedade de questões diretamente associadas ao ensino-aprendizagem, como a elaboração dos currículos e materiais, os processos de construção dos saberes, a influência dos fatores contextuais, incluindo as representações sociais da escola e do conhecimento científico, a influência dos sistemas de avaliação, etc. A Didática, como campo científico, envolve trabalho empírico (uma perspectiva experimental e uma íntima ligação com a prática) e teórico (os estudos sobre a natureza do conhecimento e a aprendizagem, as interações e grupos humanos), ao
  • 12. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. mesmo tempo em que assume como referência permanente os grandes valores e objetivos da educação e uma forte preocupação de auto-análise. 3. O PROBLEMA E UMA POSSÍVEL SOLUÇÃO Verificamos assim que, por um lado, o processo de formação de professores, nos seus diversos níveis (formação inicial, formação contínua, formação especializada) é, sobretudo um processo de desenvolvimento profissional, que segue necessariamente o seu ritmo e dinâmica próprios. O processo formativo envolve o progressivo desenvolvimento das potencialidades de cada professor, a construção de novos saberes, sendo fortemente marcado pelas dinâmicas sociais e coletivas. Por outro lado, a Didática tem contributos essenciais a dar à atividade profissional de cada professor. Ela sugere conceitos centrais para fazer uma leitura das situações de ensino-aprendizagem, e fornece também pistas e orientações para a atuação do professor. Ignorar a natureza dos processos de desenvolvimento profissional do professor leva facilmente a conceber programas de formação de tipo escolar, procurando impor conceitos, práticas e teorias de que o professor não sente necessidade ou para os quais o seu interesse não está desperto. É o que faz muita da formação (inicial e contínua) que continuamos a praticar no nosso país. Ignorar os contributos da Didática, significa pôr de parte um conjunto de perspectivas poderosas para o ensino de cada disciplina e um conjunto de conceitos fundamentais para analisar e intervir nas situações de prática. É desbaratar um importante capital de experiência e de investigação que poderia ser desde já investido na formação e na prática profissional. O problema consiste, então, no modo de articular a Didática com o desenvolvimento profissional. Como tirar partido da primeira numa lógica que não contrarie a natureza dos processos próprios do segundo. Este problema, aparentemente, é impossível. Trata-se de movimentos que evoluem em sentidos opostos, um de dentro para fora, outro de fora para dentro. No entanto, este problema tem muitas soluções, desde que haja capacidade de compreender as escalas de tempo em que pode ser abordado ou, noutros termos, desde que identifique o que pode ser o contributo específico de cada momento formativo para o desenvolvimento do professor. Ele pode ser abordado, por exemplo, do ponto de vista que as pessoas aprendem a partir da sua atividade e da reflexão sobre a sua atividade, uma perspectiva defendida, por exemplo, pela escola vygostkiana sobre a aprendizagem conhecida por “Teoria da Atividade”.
  • 13. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. E também pela perspectiva subscrita por autores da Psicologia cultural que sustentam que o conhecimento profissional dos professores se forma através da participação nas práticas educacionais. De acordo com estas perspectivas, um aluno aprende Matemática trabalhando em tarefas matemáticas que define para si próprio ou que lhe são propostas pelo professor e falando sobre elas com os seus colegas ou refletindo sobre os seus raciocínios e os seus resultados. Do mesmo modo um aluno aprende Ciências, Francês, História ou Geografia. Também os professores e os futuros professores aprendem, sobretudo a partir da sua atividade e da reflexão sobre a sua atividade realizada num contexto de práticas enquadradas numa cultura profissional bem definida. No entanto, neste caso o objeto da atividade do professor não é a Matemática, o Francês, a História ou a Geografia, mas a atividade dos alunos em tarefas e em reflexões sobre essas disciplinas. Ou seja, os professores (e futuros professores) aprendem por processos basicamente análogos aos processos usados pelos alunos. O que é muito diferente é o objeto fundamental da sua atividade. Esta perspectiva sugere a importância da presença da prática nos processos de formação. Mas a presença da prática, só por si, não é garantia de qualidade de formação. É preciso saber de que modos a prática está presente e qual o papel que pode desempenhar. 4. ATIVIDADES DE FORMAÇÃO ORIENTADAS Tem-se procurado encontrar formas de lidar com este problema num curso de formação contínua para professores de Matemática. O grande objetivo do curso é proporcionar aos participantes uma experiência de realização de um projeto orientado para a realização de atividades de investigação matemática pelos alunos na sala de aula. Estabelece-se assim um paralelo entre o trabalho investigativo que se propõe para os alunos (que irão explorar situações e relações matemáticas) e os professores (que irão explorar modos de fazer investigação sobre a sua própria prática). A realização de trabalho investigativo pelos alunos dos diversos níveis de ensino é uma das orientações atuais mais importantes na Didática da Matemática. A reflexão sobre a Epistemologia da Matemática e as investigações na Psicologia da aprendizagem trouxe para o primeiro plano a importância da atividade criativa na resolução de problemas, na elaboração e reformulação das teorias e na aplicação de conceitos matemáticos a novas situações. A atividade de investigação matemática envolve tipicamente a definição de uma situação a explorar, a formulação de questões para responder, a produção de conjecturas, o seu teste e, caso estes testes se revelem positivos, a procura de uma
  • 14. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. demonstração convincente. No decurso deste processo é muitas vezes redefinida a situação a investigar, são reformuladas as questões de interesse e são experimentadas diversas estratégias de elaboração de conjecturas. Com as atividades de investigação pretende-se que os alunos contatem de algum modo com os aspectos mais genuínos da experiência matemática, tal como ela é vivida pelos investigadores profissionais e por aqueles que usam criativamente esta ciência na sua atividade profissional. O curso destina-se a professores do 2º e 3º ciclo do ensino básico e do ensino secundário com os mais diversos níveis de experiência. Procura-se ter como público- alvo professores que manifestem abertura para a reflexão e desejo de aperfeiçoamento das suas práticas letivas. É dado a conhecer com clareza aos possíveis candidatos os objetivos do curso de modo a que as suas expectativas não venham a ser defraudadas, porque afinal o que pretendiam era algo de muito diferente. O trabalho a realizar divide-se em seis fases principais. Primeiro, é feito um ponto da situação sobre as atuais orientações curriculares para o ensino da disciplina, com especial incidência na resolução de problemas e na realização de atividades de investigação matemática. É igualmente traçado um quadro do que é um projeto educativo e são apresentados alguns exemplos. Alternam-se as introduções de natureza teórica, as atividades de natureza prática (realizadas em pequeno grupo) e as discussões coletivas. Na maior parte do tempo, os formadores desempenham aqui o papel “clássico” de introduzir novas perspectivas e sugerir tarefas para realizar nas próprias sessões. Numa segunda fase são definidos e programados os temas a trabalhar pelos professores. A homogeneidade dos grupos que se constituem em termos de anos letivos e matérias que lecionam tem-se revelado uma condição importante. Elaboram- se as tarefas a apresentar, os respectivos suportes, etc. Ainda nesta fase é feita uma abordagem ao que podem ser os processos de recolha de dados a usar no decurso de um projeto educativo desta natureza. Aqui o trabalho é realizado principalmente em grupo, embora uma vez ou outra se façam introduções de natureza teórica em trabalho coletivo. Na maior parte do tempo, os formadores retiram-se para a retaguarda. Trabalham à vez com cada um dos grupos, colocando questões, indicando possíveis fontes de material a consultar, sugerindo novas possibilidades, mas vincando sempre que a responsabilidade das decisões cabe agora aos grupos. Numa terceira fase, os diversos grupos apresentam uns aos outros os seus projetos. São discutidos aspectos relacionados, sobretudo com os objetivos a que se propõem e as tarefas a apresentar aos alunos. São ponderadas alternativas relativamente aos processos de recolha de dados. Discute-se em coletivo. Os formadores participam nas discussões em pé de igualdade com os formandos.
  • 15. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. A quarta fase é a de realização. Os grupos ultimam a escolha dos métodos de recolha de dados (que pode incluir observação, entrevistas, questionários escritos, trabalho escrito dos alunos, registros vídeo e áudio, etc.). As tarefas são realizadas, normalmente nas turmas de todos ou quase todos os professores. São feitas observações de aulas e recolhidos dados, etc. Os professores fazem uma forte assistência mútua uns aos outros. De novo, o grupo de trabalho constitui a unidade fundamental, desempenhando nesta fase os formadores essencialmente o papel de “consultores”. Surge então a quinta fase, que corresponde à análise de dados. Esta fase prolonga-se sempre por muito mais tempo do que o inicialmente previsto pelos grupos. É iniciada nas sessões de trabalho na Faculdade, mas acaba por ter de continuar em sessões extra programadas pelos próprios grupos. Os formadores apóiam naturalmente o trabalho, mas não interferem nas conclusões que são retiradas pelos professores. Finalmente, tem lugar a fase de apresentação que é feita primeiro oralmente nas últimas sessões da ação e depois por escrito, num relatório final da ação. A esta fase pode ainda seguir-se uma outra de divulgação da experiência em artigos ou encontros de professores ou de definição de novos projetos, agora completamente a cargo dos participantes. Este trabalho evidencia usualmente aspectos que, muito embora não constituam novidade para os investigadores, representam muitas vezes significativas aprendizagens para os participantes. Por exemplo: 1 - a importância de definir bem os objetivos; os professores aprendem à sua custa que definir muitos objetivos de forma vaga e imprecisa torna extremamente difícil a reflexão e avaliação final do trabalho feito; 2 - não interessa ter muitos meios de recolha de dados; interessa ter alguns meios bem escolhidos que permitam responder aos objetivos propostos; 3 - as tarefas de investigação para os alunos não precisam ser demasiado “complicadas”; muitas vezes, em investigação, a simplicidade nos objetivos e nos processos é uma importante virtude; 1. o modo como a tarefa é apresentada tem uma enorme influência na relação que os alunos estabelecem com ela e com o ambiente de trabalho que se cria; trata- se de uma fase da aula é que requer um particular cuidado; 2. estimulados por tarefas interessantes, os alunos ultrapassam com freqüência e largamente as nossas expectativas; 3. diferentes tipos de alunos reagem a este tipo de trabalho por vezes de modo muito diferente – variando da grande adesão e entusiasmo ao cepticismo e reserva – e isso impõe, naturalmente, a necessidade de estratégias diferenciadas da sua parte. Do ponto de vista dos modelos teóricos é possível colocar muitas questões e este
  • 16. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. tipo de trabalho de formação. Não estaremos a determinar muito os objetivos? Do ponto de vista do desenvolvimento profissional dos professores estamos a proporcionar uma primeira experiência de trabalho investigativo (pelos menos para a grande maioria dos participantes trata-se de uma primeira experiência). Do ponto de vista da Didática, os objetivos enquadram-se nas suas perspectivas atuais, ou seja, constituem parte importante daquilo que a Didática tem a dizer presentemente aos professores. O curso determina de maneira muito estrita a natureza do trabalho a realizar? Por outras palavras, trata-se do problema da maior ou menor estrutura de uma ação desta natureza. Nas primeiras vezes que o curso funcionou, a estrutura era menor. Os professores eram menos orientados quanto à natureza das tarefas a realizar com os alunos e quanto às démarches a realizar no processo investigativo. Embora mais perto de alguns dos modelos teóricos de formação mais interessantes, esse tipo de trabalho não resultava com alguns dos professores, que se sentiam perdidos e acabavam por aproveitar relativamente pouco das experiências realizadas. Ao proporcionar uma maior estrutura a formação procura dar um passo no sentido certo. Não pretende percorrer de uma só vez todo o caminho necessário para se alcançar a plena autonomia profissional. Estamos a trabalhar para um público-alvo muito restrito? A adequação entre o público-alvo e os objetivos é uma das principais condições de sucesso de uma ação de formação. Não pretendemos oferecer este modelo como o mais indicados para todos os tipos de público. Pretendemos ilustrar como ele se adequa a um público que existe, pelo menos na disciplina de Matemática, e que tem as suas necessidades específicas de formação. Uma outra situação que gostaria de referir corresponde ao trabalho feito na disciplina de Ações Pedagógicas de Observação e Análise do curso de formação inicial de professores de Matemática. Os objetivos da disciplina são 1. desenvolver nos alunos a capacidade de observação da realidade escolar (e em particular a realidade do ensino da sua disciplina), proporcionando-lhes os necessários instrumentos conceptuais de análise; 2. levar os alunos a desenvolver a sua sensibilidade para a natureza e a diversidade dos problemas com que o professor se confronta no seu dia a dia profissional; e 3. levar os alunos a compreender o ciclo de concepção, execução e reflexão pedagógica, através da realização de pequenas atividades de ensino, integrando conhecimentos e capacidades educativas de ordem muito diversa. Os alunos desta disciplina – futuros professores – vão realizando numerosas atividades ao longo do ano, que incluem a discussão da problemática da observação e uma abordagem muito geral ao processo de investigação educacional, a realização de observações sobre determinados aspectos da vida das escolas, incluindo o
  • 17. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. funcionamento dos seus órgãos de gestão, os sistemas de apoios pedagógicos e materiais aos alunos, e as diversas facetas do trabalho dos professores da sua área disciplinar. No caso da Matemática observam aulas, sessões de apoio pedagógico acrescido, o funcionamento de clubes de Matemática e participam em realizações como o dia ou a semana da Matemática, etc. Todas estas atividades de observação são objeto de discussão em sessões que se realizam na Faculdade. Já perto do fim do ano letivo, organizados em grupos de 3 ou 4 alunos cada, eles prepararam – em articulação com o respectivo professor cooperante – um conjunto de aulas a lecionar numa turma, constituindo, tanto quanto possível uma unidade didática. Trata-se, não só de lecionar um conjunto de aulas, mas também de as analisar em profundidade, tentando perceber quais os fenômenos educativos que se evidenciaram, qual a correspondência entre os objetivos propostos e os resultados conseguidos e qual a origem de eventuais dificuldades. Esta atividade constitui para os futuros professores o ponto culminante de todo o trabalho realizado ao longo do ano, sendo motivo de grande investimento e de grande entusiasmo. De tal modo eles a levam a sério que as restantes disciplinas se começaram a ressentir (em termos de assiduidade e de preparação das tarefas propostas para casa), que se decidiu concentrar este trabalho numa única semana em que são suspensas as atividades letivas usuais. Nas semanas seguintes as experiências realizadas pelos alunos são objeto, em cada turma de APOA (constituída em regra por 12 a 16 alunos), de cuidada discussão e reflexão. Para além disso, realiza-se uma sessão coletiva com todos os alunos e professores do curso, onde se faz um balanço da atividade e se discutem aspectos relacionados com as suas preocupações relativas ao seu próximo ingresso na vida profissional. Este trabalho envolve um contacto com a prática profissional altamente significativo para os futuros professores. O trabalho de preparação das aulas e realização de uma aula constitui para eles um forte incentivo que proporciona uma intensa situação de aprendizagem. As múltiplas instâncias em que este trabalho é preparado e discutido — no grupo, na turma, pelos professores cooperantes, por todo o curso, pelo conjunto dos professores do curso — proporcionam momentos de reflexão e análise que fazem igualmente parte integrante da experiência formativa. No caso da APOA, a Didática está presente pela forte relação que esta disciplina tem com a Metodologia do Ensino da Matemática (muitos dos assuntos tratados em MEM são retomados pela APOA). As experiências a realizar pelos futuros professores devem ter em consideração as orientações gerais da Didática, proporcionando tarefas de aprendizagem válidas, criando um adequado ambiente de aprendizagem e utilizando os materiais e recursos adequados tanto aos objetivos e conteúdos como às características dos alunos.
  • 18. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. Além disso, a Didática oferece importantes instrumentos de análise para o que se passa nestas aulas, evidenciando a importância de ter em atenção a natureza do discurso dos diversos atores, os processos de comunicação e de construção dos significados e a adequada combinação de modos de trabalho dos alunos (em situações de trabalho coletivo, em grupos, pares ou trabalho individual). Este trabalho coloca, também, as suas questões. Levar os futuros professores a fazer uma investigação, mesmo incipiente, sem conhecer os instrumentos e os procedimentos do ofício não envolve muitas armadilhas? Não há o perigo de assumirem uma postura negativista em relação aos professores cooperantes? O paralelo entre o trabalho investigativo que se propõe para os alunos (explorando situações e relações matemáticas) e dos futuros professores (explorando modos de fazer investigação sobre a sua própria prática) não será demasiado simplista, tendo em conta a natureza muito diferente do saber matemático e do saber profissional dos professores? A verdade é que o exemplo das investigações matemáticas – mais facilmente interiorizável pelos futuros professores – pode servir de modelo contrastante que em vez de dificultar, ajuda a compreender o que é uma investigação no terreno educativo. Em ambos os casos os formandos formam-se participando em práticas sociais – que se estabelecem de novo, segundo o dispositivo formativo no primeiro exemplo, que são em grande medida preexistentes, no segundo exemplo. Em ambos os casos os formandos aprendem a partir da sua atividade e da sua reflexão sobre essa mesma atividade. Estes dois exemplos permitem-me ilustrar dois aspectos: • tanto na formação inicial como na formação contínua a Didática pode constituir um conteúdo simultaneamente orientador e problematizador; • tanto na formação inicial como na formação contínua, o trabalho de natureza investigativa encerra grandes as possibilidades formativas. A Didática dá um contributo, fornecendo orientações, mas não se apresenta fechada, com “certezas” ou receitas. Fornece um quadro geral onde se evidenciam diversas propostas abertas, cuja concretização precisa sempre de ser cuidadosamente estudada em função das condições concretas, para além de proporcionar um conjunto de ferramentas conceptuais para analisar o processo de ensino-aprendizagem. A forma de trabalhar é investigativa, inquiridora e reflexiva. Existe uma permanente abertura para questionar os grandes objetivos, os objetivos específicos, os meios e as técnicas a utilizar. Procura-se questionar uma coisa de cada vez, cada coisa no seu tempo e no seu lugar. Na verdade, não serve de muito estar todo o tempo a questionar os grandes objetivos e, por falta de atenção aos meios, avançar para uma prática desastrada. Tal como não adianta muito avançar com meios e técnicas muito aperfeiçoadas para a
  • 19. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. concretização de objetivos que, pensando bem, deveríamos recusar. 5. O PROFESSOR E A COMPETÊNCIA Um professor é um profissional multifacetado que tem de assumir competências em diversos domínios. Não basta possuir conhecimentos na sua área disciplinar, dominar duas ou três técnicas para transmiti-los a uma classe e ter um bom relacionamento com os alunos. Um professor tem de ter conhecimentos na sua área de especialidade e conhecimentos e competências de índole educacional. Tem de ser capaz de conceber projetos e artefatos — nomeadamente, aulas e materiais de ensino. Tem de ser capaz de identificar e diagnosticar problemas — tanto problemas de aprendizagem de alunos e grupos e de alunos, como problemas organizacionais e de inserção da escola na comunidade. A atividade do professor requer uma combinação de conhecimentos científicos e acadêmicos de base na sua especialidade com conhecimentos de ordem educacional. Requer também o desenvolvimento da capacidade de análise e de concepção, realização e avaliação de soluções de ordem prática. O professor é chamado a desenvolver uma atividade muito específica, onde há um tempo para planear e refletir, mas onde também há um tempo onde é preciso agir e tomar decisões sobre os acontecimentos, muitas vezes com conseqüências irreversíveis. Parece-me, por isso, pertinente sublinhar duas idéias fundamentais: 1. a importância de uma boa relação com os conteúdos de ensino por parte dos professores; 2. a interiorização do processo investigativo como componente fundamental da formação (inicial e contínua) do professor. Os professores têm de dominar perfeitamente as matérias que ensinam. Uma boa relação com os conteúdos de ensino não se consegue, na minha perspectiva, com “muita” matéria, mas com “boa” matéria. É preciso que o trabalho de formação não destrua o gosto pela disciplina, antes o desenvolva e o ajude a amadurecer. É importante que as instituições do ensino superior, para além de transmitirem conhecimento, ensinem os grandes valores das diversas disciplinas e ensinem a produzir novo conhecimento. A afirmação do processo investigativo na formação inicial e contínua de professores é bastante problemática. Ela contraria as expectativas relativamente à formação da generalidade dos formandos e implica mudanças significativas nas práticas das instituições de ensino superior e dos próprios centros de formação. Um jovem biólogo, químico, psicólogo ou sociólogo completa o seu curso e conhece o
  • 20. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. essencial do processo de investigação na sua área. O mesmo não acontece, de um modo geral, com o jovem professor. Por vezes existem disciplinas de métodos e técnicas de investigação nos cursos de formação de professores, mas centra-se habitualmente muito mais na parte instrumental do que no significado do que é investigar em educação. Ensinados de modo escolar e desenquadrados das necessidades e interesses dos formandos, são um bom meio de conseguir que eles jamais se venham a interessar pela investigação. Mas o que é, afinal, investigar? Tal como em Matemática, em educação investigar começa por ser definir questões de interesse e elaborar conjecturas preliminares que irão sendo sucessivamente modificadas com o decurso do processo investigativo. Novas questões podem ser introduzidas e as questões iniciais podem ser reformuladas. Finalmente, há um momento em que é preciso sistematizar os resultados obtidos, relacioná-los com o conhecimento existente, e fazer uma avaliação geral do trabalho feito. Os métodos e as técnicas são a parte menos interessante. Temos de ir à procura deles no momento próprio, quando são necessários e aí, sim, é preciso saber escolher. De uma maneira geral, a investigação é um trabalho feito de modo sistematizado e rigoroso, com o objetivo de resolver um dilema ou responder a uma questão pessoalmente significativa. Os investigadores profissionais procuram produzir conhecimentos gerais, organizados e transmissíveis no âmbito de uma dada disciplina científica ou área do saber. No entanto, não é nesta perspectiva que os professores têm interesse em se envolver em trabalho investigativo, pois o seu principal objetivo é resolver problemas de natureza local, modificar aspectos concretos da sua situação de trabalho, da sua prática, ou dos seus resultados. Ao debater esta questão, Perrenoud (1993) chama a atenção para dois sentidos muito diferentes da noção de investigação: como processo cognitivo e como prática social. Como processo cognitivo (sentido usado, por exemplo, por Piaget), investigar é procurar conhecer: “... a investigação é uma seqüência de dese-seqüências e equilíbrios, de desorganizações e reestruturações, de momentos de generalização, de diferenciação, de coordenação dos conhecimentos e dos esquemas de pensamento adquiridos”. Como prática social, a investigação envolve um processo complexo de produção e validação, que exige a indicação dos pressupostos e dos procedimentos envolvidos, a apresentação pormenorizada de evidência obtida, e a apresentação nos fóruns próprios de debate da comunidade investigativa (encontros, revistas). Não se deve confundir a investigação enquanto processo cognitivo de todo o ser humano com a investigação como prática social numa comunidade científica. Numa aula ou numa situação de formação, pode-se ir buscar à investigação como prática social certas características que dão sentido, finalidade, enquadramento e métodos a uma atividade de investigação enquanto processo cognitivo.
  • 21. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. Entre a investigação mais sofisticada e a reflexão mais informal existe todo um continuum que envolve níveis diversos de preocupações metodológicas. A investigação usada como estratégia formativa, procura tomar como referência muito mais os processos cognitivos utilizados no processo investigativo do que os rituais próprios da construção e validação do conhecimento nas comunidades acadêmicas. Podemos agora sistematizar diversas razões que justificam a integração da investigação na formação de professores. Em primeiro lugar, a investigação é importante porque ajuda a construir conhecimento relevante do ponto de vista da prática profissional na medida em que obriga a manusear conceitos, variáveis e hipóteses de uma maneira mais profunda e mais exigente do que noutro tipo de trabalho e ajuda a perceber o valor da investigação produzida nas diversas disciplinas. Só compreendendo a sua própria aprendizagem, investigando sobre ela, se pode compreender esses processos nos próprios estudantes. Também neste caso se aprende fazendo — os conhecimentos profissionais constroem-se na ação e na interação e só são realmente úteis se forem mobilizáveis na ação. Em segundo lugar, a prática da investigação é importante para desenvolver competências e valores decisivos ao professor, como seja o espírito crítico e a autonomia dos professores face ao discurso das Ciências Humanas, incentivando uma atitude exigente e pragmática relativamente às investigações em educação e para desenvolver as competências profissionais dos professores com mais segurança e mais possibilidade de se tornarem eficazes nas situações de prática. E, em terceiro lugar, a investigação é deve ser valorizada porque se trata de um paradigma de trabalho que pode servir de base a uma prática refletida. Finalmente, há que apontar pistas sobre o modo como a investigação pode estar presente nos programas de formação. Apresentei dois exemplos, mas, evidentemente, muitos mais são possíveis. Na linha do que referi ao longo desta conferência, gostaria de sugerir quatro princípios fundamentais: 1. a investigação não é a recusa da teoria, mas a busca de uma permanente articulação entre teoria e prática; 2. no trabalho investigativo, é decisivo dar especial atenção às fases mais conceptuais e não aos métodos e técnicas; 3. a própria experiência de investigação deve ser transformada em objeto de análise e de reflexão; 4. a investigação não deve ser encarada, ela própria, como a solução universal para a formação dos docentes, mas como uma peça de um dispositivo de formação multifacetado e dinâmico. Tem-se falado e escrito muito sobre formação. No entanto, tem-se feito relativamente pouca investigação associada a processos concretos de formação
  • 22. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. inicial e contínua. Não é possível terminar esta intervenção sem sugerir que uma formação mais marcada pela investigação coloca também uma forte responsabilidade aos formadores, enquanto investigadores. Há também aqui um paralelo que não será inútil salientar. A reduzida presença da investigação educacional na formação inicial e contínua está provavelmente relacionada com a reduzida atenção que, como objeto de estudo, os próprios investigadores em Ciências de Educação têm dedicado ao fenômeno formativo, um terreno de trabalho inegavelmente difícil, tanto em termos empíricos como teóricos. Mas promover essa ligação é a única forma do discurso e da prática formativa assumirem toda a sua coerência. É um passo que é necessário dar, não só para favorecer o desenvolvimento profissional dos professores, mas para promover o desenvolvimento das próprias Ciências de Educação. CAPÍTULO III A EDUCAÇÃO E AS RELAÇÕES DE PODER 1. AS RELAÇÕES DE PODER No contexto da escola pública de ensino fundamental, desenrolam-se relações de poder, às vezes inconscientes e subliminares, sob a forma do poder simbólico de Bourdieu, outras vezes claramente identificadas, como o poder formal e impessoal,
  • 23. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. como o poder legal, como o uso da força ou como a influência social, política ou ideológica abordados por Weber. Instância onde a circulação de capital econômico e social é restrita e cuja exigência do capital cultural é menor do que em outros níveis e ambientes, a escola pública de séries iniciais do ensino fundamental de periferia é um lugar no qual se travam lutas pelo poder e se fazem relações de poder, de forma clara e, às vezes, até mesmo impositiva. Para Weber (1984), o conceito de poder é sociologicamente amorfo, havendo uma série de circunstâncias que colocam uma pessoa na posição de impor sua vontade devendo, portanto, o conceito de dominação ser mais preciso: dominação é a probabilidade de que um mandado seja obedecido. Segundo ele, o poder é a possibilidade de que um homem, ou um grupo de homens, realize sua vontade própria numa ação comunitária, até mesmo contra a resistência de outros que participam da ação. (Weber, 1982) Ao analisar o poder nas estruturas políticas, Weber enfatiza o uso da força, comum a todas elas, diferindo apenas a forma e a extensão como a empregam contra outras organizações políticas. Analisa o clientelismo, o nepotismo e a influência social, política ou ideológica exercida pelos detentores do poder econômico e político. O poder na sociedade de classes é analisado a partir da concepção de ordem jurídica, cuja estrutura influi, diretamente, na distribuição do poder econômico, ou de qualquer outro, dentro de uma comunidade. O poder econômico distingue-se do poder como tal, podendo ser conseqüência ou causa do poder existente por outros motivos. Para Weber (1982), as classes têm sua oportunidade determinada pela existência ou não de maior ou menor poder para dispor de bens ou habilidades em seu próprio benefício. O poder na burocracia é abordado a partir da consideração de que, tecnicamente, a burocracia é o meio de poder mais altamente desenvolvido nas mãos do homem que o controla. Weber a considera como o modo mais racional de exercer o poder, servindo a interesses políticos, econômicos ou de qualquer outra natureza. Analisa as características da burocracia, onde é exercido um poder formal e impessoal. Bourdieu aborda a questão do poder a partir da noção de campo, considerando o campo do poder como um "campo de forças" definido em sua estrutura, pelo estado de relação de forças entre formas de poder ou espécies de capital diferentes. É um campo de lutas pelo poder, entre detentores de poderes diferentes; um espaço de jogo, onde agentes e instituições, tendo em comum o fato de possuírem uma quantidade de capital específico (econômico ou cultural especialmente) suficiente para ocupar posições dominantes no seio de seus respectivos campos, afrontam-se em estratégias destinadas a conservar ou a transformar essa relação de
  • 24. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. forças. Segundo ele, o poder exercido no Sistema de Ensino é o poder simbólico. Poder invisível que só pode se exercer com a cumplicidade daqueles que não querem saber que a ele se submetem ou mesmo que o exercem. Para ele, este poder é quase mágico, na medida em que permite obter o equivalente ao que é obtido pela força, graças ao efeito específico de mobilização. Todo poder simbólico é um poder capaz de se impor como legítimo, dissimulando a força que há em seu fundamento e só se exerce se for reconhecido. Ao contrário da força nua, que age por uma eficácia mecânica, todo poder verdadeiro age enquanto poder simbólico. A ordem torna-se eficiente porque aqueles que a executam, com a colaboração objetiva de sua consciência ou de suas disposições previamente organizadas e preparadas para tal, a reconhecem e crêem nela, prestando-lhe obediência. O poder simbólico é, para Bourdieu, uma forma transformada, irreconhecível, transfigurada e legitimada das outras formas de poder. As leis de transformação que regem a transmutação de diferentes espécies de capital em capital simbólico e, em particular, o trabalho de dissimulação e transfiguração que assegura uma verdadeira transformação das relações de força, transformam essas forças em poder simbólico, capaz de produzir efeitos reais, sem gasto aparente de energia. 2. RELAÇÕES DE PODER NO COTIDIANO DAS INSTITUIÇÕES Aliar o poder simbólico ao poder formal e impessoal das organizações burocráticas pode parecer, à primeira vista, uma tarefa impossível. No entanto, foi esta a realidade detectada nas escolas analisadas, nas relações do dia-a-dia: os atores interagem sob o comando do diretor, cujas decisões ou são colegiadas ou são referendadas pelo Colegiado. Enquanto autoridade maior e presidente do Colegiado, o diretor exerce um poder simbólico, reconhecido por todos e vivenciado sem muitos questionamentos. As resistências e antagonismos naturais existem, é claro, mas não se manifestam no dia- a-dia ou, pelo menos, não se opõem em situações de embate ou luta aberta pela imposição de idéias ou pontos de vista. Existem hierarquias a serem respeitadas, tarefas a serem executadas, regras a serem cumpridas e todo um aparato burocrático, definido em estatutos e regimento, que norteiam as ações e interações dos atores dentro da Instituição Escolar. Desde o momento em que entram na escola até a hora da saída, são submetidos a uma série de regras para o exercício de suas atividades, as quais acatam, em sinal de conivência com a ordem estabelecida, mesmo que não se conformem muito com
  • 25. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. ela. Nesta rotina, os chefes colocam a responsabilidade pelas inconveniências das ordens que emitem sempre na autoridade mais distante. Por exemplo: o professor exige dos alunos e pais porque recebeu orientação do supervisor, este exige do professor porque tem que prestar contas ao diretor que, por sua vez, recebeu ordens da Secretaria de Educação, por intermédio do Inspetor Escolar. E, nesta cadeia hierárquica, onde todos têm um ponto de origem da exigência fora de sua própria pessoa, é exercido um poder aparentemente impessoal, apoiado nas normas regimentais, nas leis e nas ordens vindas dos órgãos administrativos do sistema de ensino. Todos são bons, compreensivos e gostariam de colaborar, mas não podem, porque a ordem vem de cima; todos são funcionários e estão no mesmo barco, sujeitos ao mesmo estatuto e aos mesmos órgãos administrativos. Internamente, os arranjos e acordos são feitos, na medida do possível, desde que não firam as normas estabelecidas. Além disso, todos estão envolvidos em um processo educativo, em torno do qual há uma mobilização dos atores, em uma prática do poder simbólico, reconhecido, não conhecido como arbitrário, exercido com a conivência de todos. Alguns momentos críticos, vividos pela Instituição, revelam todas as incompatibilidades e divergências entre os atores e desvendam o poder que, ao invés de existir em sua forma simbólica do dia-a-dia, torna-se manifesto e revelado expressando-se nas lutas pela imposição de idéias, que não se travam mais nos bastidores, mas abertamente. Em tais, lutas, o uso da força, o apelo à legitimidade jurídica, a utilização das situações e habilidade em benefício próprio e a influência social, política ou ideológica colocadas por Weber substituem o poder do dia-a-dia, ao mesmo tempo formal, impessoal e simbólico. Foram identificados três momentos críticos: o movimento grevista, a eleição de diretores e a extensão de séries. A escola, pelo que observamos, nem sempre, ou diria, raramente, é pautada pelo princípio de que deva ser governada por interesses dos que estão envolvidos. Será que existe, na verdade, interesse em uma gestão democrática? Qual seria então o papel da democracia na escola? Dentro de um contexto da rede pública, observa-se pelo que tenho notado, que o gestor ou diretor escolar assume uma nova centralidade organizacional, sendo o que deve prestar contas pelos resultados educacionais conseguidos, transformando-se no principal responsável pela efetiva concretização de metas e objetivos, quase sempre centrais e hierarquicamente definidos. Neste sentido, esta concepção de gestão introduz uma nova nuance na configuração das relações de poder e autoridade nos sistemas educativos. Trata-se de uma autoridade cuja legitimidade advém agora da revalorização neoliberal do
  • 26. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. “direito a gerir” — direito este, por sua vez, apresentado como altamente convergente com a idéia neoconservadora que vê a gestão ao serviço de uma nova ordem social, política e econômica, com formas de avaliação que facilitam a comparação e o controle de resultados, embora no primeiro modelo se exija sempre a sua divulgação pública e no outro essa prestação de contas se faça diretamente às hierarquias de topo da administração. Democracia refere-se à “forma de governo” ou a “governo da maioria”; então, torna-se claro, que as relações cotidianas no âmbito escolar, deveriam explicitar esta linha de ação, porém sabendo-se que toda gestão, pressupõe uma AÇÃO e a palavra ação é justamente o oposto da inércia, do comodismo, espera-se do gestor educacional atitudes compromissadas de construir, de fazer e o que observa-se são atitudes autoritárias, seguindo diria, uma linha horizontal, onde os princípios democráticos não se inserem; visto que a escola deve ser vista como um lugar privilegiado para a construção do conhecimento e como eixo base das relações humanas, viabilizando não só a produção de conhecimentos como também de atitudes necessárias à inserção neste novo mundo com exigências cada vez maiores de cidadãos participativos e criativos, Seria para muitos, um exagero em considerar a gestão escolar na esfera pública, autoritária. Porém, partindo-se que o autoritarismo está ligado a práticas antidemocráticas e anti-sociais e estas, permeiam sutilmente a gestão das escolas públicas, creio sim, que este termo não estaria sendo utilizado aqui, neste artigo, de forma errada, a afrontar a administração pública. A questão do controle, do poder aprisionado nas mãos de diretores e superiores ainda é prática constante. Administrar escolas é tarefa árdua, porém, dentro dos moldes do autoritarismo, legitima-se então, traumas antigos em que a sociedade se mostra ainda fragilizada, com medo, sem liberdade de se expressar e covardemente cedendo lugar às ideologias. Percebe-se na gestão educacional, uma administração voltada com ações na verdade, reprodutoras de uma sociedade infelizmente alienada e passiva, ditando regras e não estabelecendo uma relação dialógica ideal com os envolvidos, estabelecendo meramente uma transmissão de ordens, alegando na maioria das vezes cumprirem determinações que lhes vem de cima não proporcionando assim, momentos para discussão. Todas as iniciativas de política educacional, apesar de sua aparente autonomia, têm um ponto em comum: o empenho em reduzir custos, encargos e investimentos públicos, buscando senão transferi-los e/ou dividi-los, com a iniciativa privada e organizações não governamentais. A participação é muitas vezes, limitada, controlada e puramente formal. A estrutura técnica se sobrepõe aos indivíduos envolvidos e o poder e a autoridade (leia-se: autoridade : como não prática social- sem visão crítica) se instalam de forma sutil , com obediência, dentro de uma perspectiva clássica de administração que repudia a participação, o compartilhar idéias, a liberdade para expressar-se , a deliberação de decisões e o respeito às iniciativas.
  • 27. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. A questão do controle ainda é muito forte e mesmo sabendo que o poder e a autoridade são necessários em muitos momentos dentro de várias organizações, intermediando e viabilizando ações criativas para melhora, observa-se ainda um controle rígido, um descompromisso e muito pouca participação da comunidade escolar como um todo (professores, pais, funcionários, lideranças de bairro) no processo da gestão escolar, causando assim automaticamente uma acomodação, em que as pessoas não se mobilizam para nada e ficam alheias, esperando sempre serem orientadas ou então aceitando passivamente tudo que venha das “autoridades competentes”, sem quer que seja , nenhum questionamento crítico construtivo. As atuais discussões sobre gestão escolar têm como dimensão e enfoque de atuação: a mobilização, a organização e a articulação das condições materiais e humanas para garantir o avanço dos processos socio-educacionais, priorizando o conhecimento e as relações internas e externas da escola. No contexto das instituições escolares, o mecanismo de disciplina produz um tipo de máquina, que se organiza como uma pirâmide e opera como uma rede com sua forma hierarquizada, contínua e funcional. Para Foucault, a vigilância também estabelece uma simetria crescente ente poder e produção, poder e saber. No contexto escolar, os dispositivos disciplinares são sanções normalizadoras. Nele funciona um pequeno mecanismo penal. O castigo tem a função de reduzir os desvios, ele é corretivo. Na medida em que a visibilidade constante dos indivíduos e a invisibilidade permanente do poder disciplinar fazem com que os indivíduos se adestrem, se ajustem e se corrijam inicialmente por motor próprio, pode-se afirmar que a vigilância substitui a violência e a força. Sem essas, passa a ser ainda possível se falar em um adestramento ou readestramento espiritual, das almas, e não dos corpos. Para Pogrebinschi (2004) a escola é o espaço onde as relações de poder são nítidas, embora não represente o próprio poder: Com a vigilância, o poder discipilinar torna-se um sistema integrado, converte-se no conceito de diagrama. Não há um centro, não há um chefe no topo da forma piramidal desse poder: a engrenagem como um todo produz poder. Trata-se de um poder em essência relacional. O psicanalista J. Lacan ,observou que a partir do momento em que alguém se vê "rei", ele muda sua personalidade. Um cidadão qualquer quando sobe ao poder, altera seu psiquismo. Seu olhar sobre os outros será diferente; admita ou não ele olhará "de cima" os seus "governados", os "comandados", os "coordenados", enfim, os demais. Estar no poder, diz Lacan, "dá um sentido interiormente diferente às suas paixões, aos seus desígnios, à sua estupidez mesmo". Pelo simples fato de agora ser "rei", tudo deverá girar em função do que representa a realeza. Também os "comandados" são levados pelas circunstâncias a vê-lo como o "rei do pedaço". La Boétie parecia indignado em perceber o quanto o lugar simbólico de poder faz o populacho se oferecer a uma certa "servidão voluntária". Bourdieu chama-nos atenção para a força que o símbolo exerce sobre os indivíduos e grupos. Antes de
  • 28. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. ocupá-lo, o poder atrai e fascina; depois de ocupado tende a colar a alguns como se lhes fossem eterno. Aí está a diferença entre um Fidel Castro e um Nelson Mandela. O primeiro e a maioria dos ditadores pretendem se eternizar no poder, o segundo, mais sábio, toma-o como transitório, evitando ser possuído pelo próprio. ("Possuído", sim, pois o poder tem algo de diabólico, que tenta, que corrompe, etc). Uma vez no poder, o sujeito precisará de personas (máscaras) e molduras de sobrevivência. A persona serve para enganar a si e aos outros. A moldura, é algo necessário para delimitar simbolicamente a ação dele enquanto representante do poder. A ausência de moldura ou o seu mau uso fará irromper a força pulsional do sujeito que anseia por mais e mais poder, podendo vir a se tornar uma patologia psíquica. A história coleciona exemplos: Hitler, Stalin, Mobutu, Collor de Melo, Pol Pot, Idi Amim, etc. O poder faz fronteira com a loucura, afirma Lima (2002). Não é sem motivo que muitos loucos se julgam Napoleão ou o Rei Luis XV. Parece que há algo de "loucura narcísica" nas pessoas que anseiam chegar ao poder político (governante de uma cidade, estado ou país, ministro, membro do secretariado local), ou ao poder de uma instituição, empresa, departamento, pequeno setor de uma organização qualquer ou grupo qualquer. O narcisismo de quem ocupa o poder, revela-se na auto-admiração (o amor a si e aos seus feitos), na recusa em aceitar o que vem dos outros e no gozo que ele extrai do poder, que, levado ao extremo poderia revelar loucura. R. Kurz, é direto ao declarar que "o poder torna as pessoas estúpidas e muito poder, torna-as estupidíssimas". No contexto da instituição escolar e nas instâncias superiores que controlam o processo, é bem visível essa manifestação medíocre de poder. O sociólogo M. Tragtenberg certa vez observou como muitos intelectuais discursam uma preocupação pelo "social", mas estão mesmo preocupados com a sua "razão do poder". Há uma espécie de "gozo louco" pelo poder, que faz subir a cabeça dos que estão jogando para ganhá-lo um dia. Os sujeitos quando no poder protege-se da crítica reforçando pactos de auto- engano com seus colegas de partido. Reforçam a crença de que representam o Bem contra o Mal, recusam escutar o outro que lhe faz crítica e que poderia norteá-lo para corrigir seus erros e ajudar a superar suas contradições. Se entrincheirarem no grupo narcísico, o discurso político tornar-se-á dogmático, duro, tapado, e podemos até prever qual será o seu futuro se tomar o caminho de também eliminar os divergentes internos e fazer mais ações de governo contra o povo, "em nome do povo". Infelizmente assim é o poder: seduz, corrompe, decepciona e faz ponto cego e surdo nos seus ocupantes temporários.
  • 29. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. 3. PARA ALÉM DO PODER DISCIPLINAR E BIOPODER O conceito de poder foucaultiano se situa, entretanto, em algum lugar entre o direito e a verdade. Foucault quer estudar o modo pelo qual o poder se exerce, o “como do poder”, conforme ele mesmo explica – em outras palavras, isso equivale a compreender os mecanismos do poder balizados entre os limites impostos de um lado pelo direito, com suas regras formais delimitadoras, e de outro pela verdade, cujos efeitos produzem, conduzem eeconduzem novamente ao poder. É nesse sentido que Foucault menciona a relação triangular que se estabelece entre esses três conceitos: poder, direito e verdade. Como bem observa Habermas, o que se passa é que Foucault torna a verdade dependente do poder – invertendo uma relação que, no âmbito da filosofia do sujeito, supostamente se exerceria no sentido contrário. O poder, portanto, institucionaliza a verdade. Ou, ao menos, ele institucionaliza a busca da verdade ao institucionalizar seus mecanismos de confissão e inquirição. A verdade se profissionaliza, pois, afinal, no seio daquela relação triangular, a verdade é a norma: nesse sentido, e antes de mais nada, são os discursos verdadeiros que julgam, condenam, classificam, obrigam, coagem, trazendo sempre consigo efeitos específicos de poder. Na visão de Pogrebinschi (2004): “O poder produz: ele destrói e reconstrói, ele transforma, acrescenta, diminui, modifica a cada momento e em cada lugar a si mesmo e a cada coisa com a qual se relacione em uma rede múltipla, móvel, dinâmica, infinita... o poder é produção em ato, é a imanência da produtividade”. A questão aqui, neste trabalho é relacionar as relações de poder no âmbito das instituições escolares as quais produzem um sintoma inconsciente ou não que culminam na repulsa pela ordem e pela disciplina por parte de alguns alunos e até mesmo dos professores. O poder como modo de disciplinar o sujeito seja em todas as esferas sociais nasceu com o próprio sujeito que experimenta uma posição superior em relação aos outros, evoluindo conforme exigências dos novos tempos. Fazendo uma análise de Foucault, Pogrebinschi (2004) questiona sobre as transformações ocorridas nas relações de poder: “Ao longo dos séculos XVII e XVIII portanto, no que tange às relações de poder, muitas transformações passam a ser operadas. A mais importante delas consiste certamente na constatação foucaultiana de que o poder da soberania é substituído gradativamente pelo poder disciplinar e, por conseguinte, as monarquias soberanas se convertem aos poucos em verdadeiras sociedades disciplinares.
  • 30. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. Mas a que se deve esta transformação longo desses dois séculos, multiplicaram- se por todo o corpo social verdadeiras instituições de disciplina, tais como as oficinas, as fábricas, as escolas e as prisões – que passam a constituir seu objeto de investigação em Vigiar e punir. Nino, afirma Foucault (2001): “o poder disciplinar é com efeito um poder que, em vez de se apropriar e retirar, tem como função, maior adestrar, ou sem dúvida adestrar para retirar e se apropriar ainda mais e melhor”. Para compreensão da noção de poder disciplinar, que nos leva à vigilância constante, Foucault (1999) utilizou o conceito de panoptismo O termo “panóptico” foi sugerido pelo filósofo e jurista inglês Jeremy Bentham. Em uma prisão que possui uma arquitetuta que permite aos guardas verem continuamente o que se passa no interior de cada cela, o panóptico é a torre de observação central. Os presos não podem ver se estão ou não sendo observados dessa torre. Essa incerteza faz com que eles mesmos se disciplinem. Foucault observou que os séculos XVII e XVIII também assistiram a uma efusão de dispositivos disciplinares ao longo de toda a extensão da estrutura da sociedade. Mas em que consistem esses dispositivos disciplinares? Em que consiste, afinal, a disciplina? A disciplina é uma tecnologia específica do poder, ela é “um tipo de poder, uma modalidade para exercê-lo, que comporta todo um conjunto de instrumentos, de técnicas, de procedimentos, de níveis de aplicação, de alvos; ela é uma física ou uma anatomia do poder, uma tecnologia”. Na medida em que o poder disciplinar é uma modalidade de poder múltipla, relacional, automática e anônima, a disciplina, por sua vez, também faz crescer e multiplicar aquilo e aqueles que estão a ela submetidos. Nesse sentido, pode-se dizer que a disciplina é uma técnica que fabrica indivíduos úteis. A disciplina faz crescer e aumentar tudo, sobretudo a produtividade. E aqui se fala em produção não apenas em um sentido econômico. Além de ampliar a produtividade dos operários nas fábricas e oficinas, a disciplina faz aumentar a produção de saber e de aptidões nas escolas, de saúde nos hospitais e de força no exército, por exemplo. São por esses motivos, principalmente, que Foucault fala em um triplo objetivo da disciplina: ela visa tornar o exercício do poder menos custoso – seja econômica ou politicamente –, busca estender e intensificar os efeitos do poder o máximo possível e, ao mesmo tempo, tenciona ampliar a docilidade e a utilidade de todos os indivíduos submetidos ao sistema. Quanto aos dispositivos disciplinares, ou instrumentos do poder disciplinar, também são em número de três os seus principais, quais sejam: o olhar hierárquico, a sanção normalizadora e o exame. O olhar hierárquico consiste antes na idéia mais ampla de vigilância. A vigilância é a mais importante máquina, a principal engrenagem do poder disciplinar: ela contribui para automatizar e desindividualizar o poder, ao passo que
  • 31. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. contribui para individualizar os sujeitos a ele submetidos. Ao mesmo tempo, a vigilância produz efeitos homogêneo de poder, generaliza a disciplina, expandindo-a para além das instituições fechadas. Nesse sentido, pode-se dizer que ela assegura, como explica Foucault, uma distribuição infinitesimal do poder. O poder disciplinar, portanto, passa, a partir da segunda metade do século XVIII, a ser complementado pelo biopoder. Complementado porque não se opera efetivamente uma substituição, mas apenas uma pequena modificação - ou adaptação –, e jamais uma exclusão. Em outras palavras, o biopoder implanta-se de certo modo no poder disciplinar, ele embute e integra em si a disciplina, transformando-a ao seu modo. O biopoder “não suprime a técnica disciplinar simplesmente porque é de outro nível, está noutra escala, tem outra superfície de suporte e é auxiliada por instrumentos totalmente diferentes”. Ambas as espécies de poder passam assim, portanto, a coexistir no mesmo tempo e no mesmo espaço. São muitas as variações, entretanto, encontradas entre as duas mecânicas de poder em questão. Ao passo que o poder disciplinar se faz sentir nos corpos dos indivíduos, o biopoder aplica-se em suas vidas. Enquanto a disciplina promove a individualização dos homens, o biopoder acarreta uma massificação, tendo em vista que ele se dirige não aos indivíduos isolados, mas à população. Daí que os efeitos do biopoder se fazem sentir sempre em processos de conjunto, coletivos, globais... processos esses que fazem parte da vida, da vida de uma população: os nascimentos, as doenças e as mortes constituem exemplos desses processos. E o biopoder trata exatamente do conjunto desses processos de natalidade, longevidade e mortalidade, seja comparando a proporção dos nascimentos e dos óbitos, seja verificando a taxa de fecundidade de uma população. Enfim, são vários os exemplos cedidos por Foucault para explicar essa modalidade de poder. O que é importante perceber é que em todos esses processos nos quais se exerce o biopoder há concomitantemente uma extensa produção de saber. Entram em campo as ciências exatas e biológicas: a Estatística e a Biologia, principalmente, passam a ser extremamente importantes nesse momento em que se necessitam de demografias, políticas de natalidade, soluções para endemias, entre outras coisas mais. Há, portanto, um elemento em comum que transita entre o poder disciplinar e biopoder, entre a disciplina e a regulamentação, e que possibilita a manutenção do equilíbrio entre a ordem disciplinar do corpo e a ordem aleatória da população. Esse elemento é a norma, “que pode tanto se aplicar a um corpo que se quer disciplinar quanto a uma população que se quer regulamentar”. A norma da disciplina e a norma da regulamentação dão origem ao que Foucault chama de sociedade de normalização, uma sociedade regida por essa norma ambivalente, na qual coexistem indivíduo e população, corpo e vida, individualização e massificação, disciplina e regulamentação.
  • 32. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. Foucault teceu para compreender historicamente o poder tal como ele se manifestou ao longo dos séculos (estamos falando, evidentemente, do poder disciplinar e do biopoder) e o significado do conceito de poder, este apenas em forma abstrata, que criou para lograr opor-se às teorias tradicionais do poder e, assim, promover a limpeza de terreno necessária para colocar em prática a sua analítica – ou genealogia – do poder. O poder disciplinar e o biopoder, portanto, assim como o poder da soberania, operam como categorias historicamente constituídas, ou melhor, são chaves de análise e interpretação do poder tal como ele se manifestou através de seus efeitos na história da sociedade ocidental. Enquanto categorias analíticas, descritivas, contudo, o poder disciplinar e o biopoder servem como instrumentos para que Foucault crie ainda uma nova categoria; na verdade, um novo conteúdo, um novo significado para o conceito de poder. Pode-se pensar, por conseguinte, que, com Foucault, o conceito de poder passa a ganhar um sentido emancipatório, libertador, ao liberar-se do estigma, do falso estigma, da repressão. Ao emancipar-se desse falso atributo e passar a conter em si mesmo o ideal de emancipação, o poder, agora visto como algo positivo, irrompe também como pura e plena produtividade. 4. DIFERENÇA ENTRE PODER E SABER Foucault reconhece a diferença entre poder e saber, mesmo referindo-se sempre às suas interconexões. Distancia esses conceitos das concepções correntes, nas quais o poder funciona apenas de forma negativa e a verdade ou o saber podem inverter, apagar ou desafiar a dominação do poder repressivo. Quem de nós não viveu essa concepção negativa de poder dos movimentos sociais do passado, como o movimento estudantil, e que ainda se mantém viva até hoje entre muitos teóricos e ativistas? A relação entre poder e saber encontra-se em muitos dos discursos educacionais que se reconhecem radicais; segundo o que acreditam,através do processo de conscientização e educação, os poderes dominantes podem ser desmascarados para revelar "a verdade" e assim, aumentar o potencial para derrubar o "sistema": o saber serve de contra-ataque aos males do poder. Foucault utiliza-se da expressão poder/ saber - para deixar claro a relação entre ambos - a qual desafia a suposição de que alguma verdade não-distorcida pode ser alcançada: O poder não é necessariamente repressivo; ele incita, induz, seduz, torna mais fácil ou mais difícil, amplia ou limita, torna mais provável ou menos provável. O poder é exercido ou praticado em vez de possuído e, assim, circula, passando através de toda força a ele relacionada. Gore diz que na educação o poder não está apenas ao
  • 33. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. alcance dos professores, mas os pais, os estudantes, os administradores e o governo exercem poder nas escolas. Outro conceito na obra de Foucault importante de ser considerado nessa discussão sobre educação diz respeito a governo. Gore (1994) retoma a visão de governo do século XVI a qual se refere tanto às estruturas políticas e à administração dos estados, como à forma pela qual a conduta dos indivíduos ou grupos podia ser dirigida; governar seria, pois, estruturar o campo possível de ação dos outros. Existiria, pois, o governo das crianças, das almas, das comunidades, das famílias, dos doentes, entre outras formas. Sobre isso, Foucault na obra Vigiar e Punir mostra que as formas modernas de governo mudaram passando do poder soberano – aberto, visível e localizado na monarquia - para o poder disciplinar, exercido de modo a não aparecer. Quando levadas para as reflexões do contexto escolar, esta idéia de poder disciplinar possibilita a explicação sobre a auto-regulação dos estudantes em muitas situações de sala de aula. Para Foucault, as escolas e a educação formal exercem um papel importante no poder disciplinar. É o que ele trata pormenorizadamente em "Vigiar e punir", na parte referente à disciplina, ao descrever as inovações pedagógicas iniciais e o modelo que elas forneceram para a economia, a medicina e a teoria militar do século XVIII. É importante destacar que, para ele, as relações de poder se referem aos mecanismos que constroem instituições e experiências institucionais, e não às pessoas no interior dessas instituições, como comumente se pensa nesse poder exterior ao indivíduo. Em relação à educação, o processo pedagógico corporifica relações de poder entre professores e aprendizes - e não apenas alunos, já que não se trata apenas de relações escolares, mas educacionais de modo geral, que ocorrem em outros espaços. A pedagogia se baseia em técnicas particulares de governo, e produz e reproduz, em diferentes momentos, regras e práticas particulares; cada vez mais tem enfatizado o autodisciplinamento, pelo qual os estudantes devem conservar a si e aos outros sob controle; principalmente no ensino das séries iniciais esses mecanismos são mais claros. Na Universidade, são camuflados pela autonomia e liberdade que "são dadas" e reforçadas por muitos professores. As técnicas/práticas que induzem a esse comportamento são denominadas por Foucault de tecnologias do eu, as quais agem sobre o corpo: olhos, mãos, boca, movimento. Diz Gore (1994), que as pedagogias produzem regimes corporais políticos particulares e funcionam como regimes de verdade. As relações disciplinares de poder-saber são fundamentais aos processos da pedagogia, sejam elas impostas pelos professores, auto-impostas, ou impostas sobre os professores. O mais interessante para nós, em termos de perspectivas de compreensão e interpretação do fazer pedagógico é a defesa foucaultiana de que os discursos radicais e emancipatórios não estão isentos dessa análise.
  • 34. FATBI- Faculdade Teológica Bereana Internacional www.fatbi.com.br Este material é de uso exclusivo da FATBI/PROEAD – não podendo ser usado por outras instituições. Nos séculos XIX e XX, o projeto do progresso universal através da educação foi pensado por filantropos, igrejas e governos progressistas, no sentido de transformar as pessoas em cidadãos moral e politicamente úteis. Neste sentido, foi fundamental a contribuição de ciências emergentes como a Psicologia, Sociologia e Ciência Política, as quais desenharam as metodologias empíricas e cientificamente verificáveis que possibilitariam identificar de modo objetivo sistemas sociais mais racionais, mais de acordo com a modernidade. Predominava uma visão utilitária de educação e os governos progressistas da Europa e dos Estados Unidos se responsabilizaram pela administração das escolas e das universidades, fazendo com que alguns pensadores da época considerassem benevolência desinteressada a educação patrocinada por um Estado racional, "não permitindo o mal que seria uma multidão vagando pelas ruas numa ignorância pouco iluminada. A visão da educação como benevolência desinteressada foi ampliada pelos teóricos coletivistas liberais e socialistas, para os quais a educação era uma questão de eficiência nacional e uma preocupação nacional assumida no interesse de uma comunidade como um todo" (Jones, 1994). A ciência educacional imaginava uma educação científica que transformaria o capital humano; essa é a visão iluminista de Kant, influência direta do Emílio de Rousseau: "uma educação corretamente ordenada revelaria ou recuperaria a natureza verdadeira do homem e criaria em todo indivíduo a capacidade latente para a liberdade moral" (Jones, 1994). CAPÍTULO IV O PODER COMO IDEAL NARCÍSICO NA RELAÇÃO EDUCATIVA A educação deve levar à supremacia da razão sobre os impulsos, em detrimento do recalque, isto é, ajudar o homem a vencer a ilusão – reforçada pela religião – e o recalque, possibilitando um pensamento racional livre, que funcione como juízo consciente.