1. Os primeiros estudos de comunicação na América Latina se limitavam à documentação descritiva da imprensa, mas começaram a ganhar impulso nas décadas de 1930 e 1950 com a criação de cursos de graduação em Jornalismo.
2. Os principais centros de pesquisa em comunicação foram o Ciespal na década de 1960, que inicialmente adotou perspectivas norte-americanas mas posteriormente passou a incorporar enfoques latino-americanos, e o CEREN no Chile na década de 1970, que promoveu
Tema de redação - As dificuldades para barrar o casamento infantil no Brasil ...
Os estudos de comunicação na america latina
1. UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO
COMUNICAÇÃO SOCIAL
HENRIQUE PINHEIRO
JÚLIO FILGUEIRAS
KEVEN
PAULO SERGIO
RIVERLAN MACEDO
VIRGINIA COSTA
Os estudos da comunicação na América Latina: Teorias da
comunicação
São Luís
2012
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2. HENRIQUE PINHEIRO
JÚLIO FILGUEIRAS
KELVEN
PAULO SERGIO
RIVERLAN MACEDO
VIRGINIA COSTA
Os estudos da comunicação na América Latina: Teorias da
comunicação
Trabalho apresentado à disciplina Teorias da Comunicação,
para obtenção de nota parcial.
Professor (a): Flávia Moura
São Luís
2012
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3. Sumário
1. Introdução...........................................................................................................4
2. Os primeiros passos..........................................................................................5
3. Os centros de pesquisa na América Latina .....................................................6
4. Crise econômica e democratização..................................................................10
5. Desafios do novo século.....................................................................................10
6. O culturalismo....................................................................................................11
7. Considerações finais..........................................................................................13
8. Referências.........................................................................................................14
3
4. 1. Introdução
Desde sua gênese, a comunicação social se instaurou como um saber orientado
ao estudo dos meios de comunicação e a influência que exercem na cultura de uma
sociedade. A sociedade moderna se vê cercada pelos mais variados sistemas de
comunicação, desta forma, conhecer e dominar os sistemas de informação e da
comunicação é indispensável no mundo globalizado.
Logo, para que seja possível ter um domínio sobre as novas tecnologias da
informação, é necessário investigar e conhecer a história do pensamento
comunicacional, bem como a maneira que pesquisadores traçavam seus planos de
estudos.
Neste trabalho, elaborado em períodos, frisaremos o desenvolvimento dos
estudos de comunicação na América Latina, visto que, mais do que inquietações
científicas, são demandas políticas e sociais que impulsionam a produção de
conhecimento em comunicação latino-americana. No primeiro período discorreremos
acerca das primeiras escolas de estudo comunicacional, marcadas por estudos históricos
e documentais. No segundo serão abordados os principais centros de pesquisa em
comunicação na América Latina. O terceiro é voltado para os aspectos da pesquisa de
comunicação em meio à crise econômica e democratização. No quarto o foco são os
desafios do novo século. Por fim, será traçado um paralelo onde serão discutidas as
influências teóricas das tendências culturalistas.
Diante disto, ansiamos contribuir para reforço do conhecimento, a quem surtir
interesse a cerca do cenário do estudo em comunicação na América Latina, marcado
pela dependência estrutural norte-americana e européia.
4
5. 2. Os primeiros passos
No final do século XIX e no inicio do XX, a pesquisa na área da comunicação
limitava-se, na América Latina, à documentação descritiva das principais atividades da
imprensa. Foi somente a partir da década de 1930, com a criação dos primeiros cursos
de graduação em Jornalismo e Propaganda, que a atividade começou, lentamente, a
ganhar algum impulso e organização. As primeiras instituições que se implantam
correspondem às demanda sociais emergentes nas empresas jornalísticas, cujo processo
de estruturação industrial reclama profissionais qualificados para o exercício da
comunicação de atualidades.
Na medida em que a imprensa se renova no continente e as emissoras de
radiodifusão começam a se proliferar, sintonizadas com fluxo desenvolvimentista que se
inicia no pós-guerra, multiplicam-se as instituições dedicadas a formar especialistas
para os meios de comunicação. No início dos anos 50 existiam 13 escolas na América
Latina, localizadas precisamente na Argentina, Brasil, Colômbia, Cuba, Equador,
México, Peru e Venezuela. Dez anos depois, esse número havia triplicado, indicando a
presença de escolas em 2/3 dos países da região. Nas duas últimas décadas manteve-se o
mesmo ritmo de crescimento, porém com menor intensidade: a cada década nota-se uma
duplicação do número de instituições. Trata-se, em verdade, de um crescimento
espantoso, que corresponde em parte à extensão do ensino superior no continente, mas
reflete também o impacto gerado pelos processos de comunicação de massa em nossas
sociedades, seduzindo contingentes de jovens que desejam atuar na televisão, na
publicidade, no jornalismo.
Joaquin Sanchez, presidente da FELAFACS, atribui essa expansão vertiginosa a
dois fatores: o modismo da comunicação e o mercantilismo das entidades universitárias.
“O crescimento acelerado de Faculdades de Comunicação responde basicamente a um
incremento de número de estudantes que terminam o ensino secundário. Isso se volta
contra a Universidade que não tem possibilidade de atender a tantos estudantes, de tal
maneira que se criam faculdades para das oportunidades àqueles que queiram seguir
carreira universitária; também se explica por uma certa moda de estudar a carreira e de
manejar os meios e comunicação, e por um propósito de algumas entidades
universitárias de abrir programas não com um critério acadêmico sério, mas com um afã
comercial de graduar profissionais e de melhorar seu rendimentos.”
O que realmente deu impulso à pesquisa comunicacional latino-americana,
contudo, foi a dinâmica das transformações históricas que, em meados do século XX,
começavam a redesenhar a organização – mas não a estrutura – da sociedade de
diversos países da América Latina. A partir da Segunda Guerra Mundial, os principais
países do continente passaram por um acelerado processo de industrialização e
urbanização, que levou para as cidades grandes contingentes populacionais oriundos de
uma zona rural pobre, sem tecnologia e completamente marginalizada do sistema
econômico mundial. Ao mesmo tempo em que a sociedade de consumo começava a
tomar forma em centros urbanos como Cidade do México, São Paulo, Rio de Janeiro,
Buenos Aires, Santiago e Lima, intensificavam-se as diferenças sociais.
5
6. Os rumos que a pesquisa seguiria ao longo dos anos seguintes, eram moldados
pelos fenômenos da comunicação massiva latino-americana: nos centros urbanos, a
população pobre, majoritariamente analfabeta e até então isolada dos principais
acontecimentos do mundo, passou a ter contato diário com o rádio e, em seguida, com a
televisão, que catalisou o fortalecimento de uma indústria cultural calcada em grande
parte no american way of life.
3. Os centros de pesquisa na América Latina
O Ciespal – Centro Internacional de Estudos Superiores de Comunicação para a
América Latina – foi fundado na conjuntura desenvolvimentista. A hegemonia norte-
americana na América Latina, viabilizada depois do reordenamento da economia
mundial, no pós-guerra, criou expectativas de transformações estruturais para lograr o
avanço do capitalismo nas zonas rurais e nas cidades. Tal projeto de modernização das
sociedades situadas ao sul do Rio Grande, seja para produzir com eficácia os gêneros
alimentícios indispensáveis ao consumo das populações do norte, seja para incrementar
a compra de bens manufaturados pelas fábricas transplantadas para o sul, exigia o
respaldo dos meios massivos de comunicação. Mas seu funcionamento adequado
dependia de recursos humanos especializados e da definição de estratégias persuasivas
para a mudança de comportamento dos consumidores.
Criado em 1959, com o apoio da Unesco, da Organização dos Estados
Americanos (OEA) e do governo do Equador, o Ciespal se instala em Quito, oferecendo
cursos para o aperfeiçoamento de profissionais que atuam em comunicação de massa na
região. Paralelamente, verificou-se que o funcionamento das novas tecnologias de
reprodução simbólica – off-set, videoteipe, super-8 e depois os satélites e os
computadores – acarretava o melhor conhecimento do panorama continental dos meios
e seus efeitos diferenciados nas culturas nacionais ou locais. Imediatamente, são
realizadas pesquisas e seminários, bem como o primeiro estudo do perfil morfológico e
de conteúdo dos grandes jornais – Duas semanas na Imprensa da América Latina
(1967) –, com pesquisadores reconhecidos, como Wilbur Schramm, Raymond Nixon,
John McNelly, Jacques Kayser e Joffre Dumazedier, marcando tanto os temas
escolhidos – comunicação e modernização, rádio e teleeducação, liderança de opinião -,
como as metodologias – pesquisa quantitativa e análise de conteúdo -, além da formação
das primeiras gerações de pesquisadores.
Diz Beltrán: “As áreas que recebem influência mais direta da orientação norte-
americana, são a difusão de inovações na agricultura, a estrutura e função dois meios
impressos e eletrônicos, as experiências de comunicação educativa, os programas
especiais de educação rural” (1976). A avaliação feita por Javier Esteinou, Madri –
Ciespal e a ciência da comunicação, Chasqui (011): 20-27 – indica os seguintes “frutos
culturais”:
1. “O Ciespal atuou durante mais de duas décadas como o principal elo de
ligação entre os especialistas, as escolas e os diversos centros de reflexão da
informação. Converteu-se no sistema nervoso mais importante que nutriu com sangue
novo as múltiplas células de comunicação dispersas por todos os extremos do
6
7. continente. Desta maneira, reduziu substancialmente o grande fosso incomunicante que
sempre nos isolou como profissionais da comunicação na região.”
2. “Com a difusão de suas publicações, o Ciespal iniciou e manteve um
importatíssimo esforço de reflexão original sobre os problemas da comunicação latino-
americana. Tal iniciativa contribuiu bastante para criar uma nova ciência da
comunicação regional. Pode-se dizer, inclusive, que sem a presença ativa do Ciespal
nesse contexto, o desenvolvimento da ciência da comunicação latino-americana teria
retardado a linha de evolução, que atingiu recentemente, na zona central e sul do
hemisfério.”
3. “Através da monumental tarefa de edição de livros e da formação do
seu centro de documentação especializado, o Ciespal contribui a maior memória
histórica sobre os meios de informação de que se tem conhecimento na área latino-
americana. Assim sendo, contribui para fincar as bases de uma identidade ideológica
própria em matéria de comunicação.”
4. “O Ciespal acrescentou um pequeno grão de areia para produzir as
rupturas teóricas no espaço da comunicação, de acordo com as expectativas de vôo
independente do pensamento latino-americano. Desta maneira, a instituição lançou
frestas de luz que iluminam as reflexões nacionais sobre os problemas da
comunicação.”
Em um seminário na Costa Rica, em 1973, que marcou a produção teórica na
região, pois foi o primeiro encontro organizado entre pesquisadores latino-americanos, o
Ciespal foi avaliado e redirecionado. Conta Beltrán, sobre as críticas ao Centro:
Primeiro, que lhe falta um marco conceitual próprio; segundo, que a adoção de deu sem
juízo crítico; terceiro, que lhe falta um mínimo de sistematização; quarto, que há uma
ênfase exagerada no descritivo e quantitativo com exclusão de uma visão qualitativa
profundo; quinto, que se prefere analisar fenômenos de comunicação fora do contexto
das variáveis políticas, sociais, econômicas e culturais; sexto, que há uma preferência
por temas limitados de pesquisa e uma excessiva concentração em meios massivos e
especialmente na imprensa; sétimo, que há uma ausência total de políticas e planos para
orientar a pesquisa em geral, ou seja, a pesquisa é acidental, não e racional; oitavo; que
há uma falta de coordenação que tem como resultado o desconhecimento, a duplicação
de esforços, o desaproveitamento de experiências e a perda de sentido; e, em nono, que
se trabalha, de preferência, de forma não interdisciplinar mas em enclausuramento de
disciplinas (1981).
O documento final afirmava:
Com uma metodologia esboçada por latino-americanos para América Latina, com um
instrumento de trabalho muito mais depurado e crítico, se deve chegar ao descobrimento
de toda a inter-relação econômica, política, social e cultural que configura as estruturas
de dominação e poder que, muitas vezes, condicionam e determinam os sistemas de
comunicação imperantes. Estes critérios não traduzem uma ótica regionalista ou
localizada, ao contrário, sinalizam dimensões básicas para o progresso da ciência da
comunicação. Neste sentido, o contexto atual das sociedades chamadas do Terceiro
Mundo pode contar com a possibilidade privilegiada de desenvolver novos caminhos,
tanto teóricos como metodológicos (apud Beltrán, ibidem).
7
8. É a partir desta avaliação, crítica e ambiciosa, que o Ciespal busca raízes na
América Latina, introduzindo em seus cursos a preocupação pela comunicação popular,
pela pesquisa participante, substituindo os professores estrangeiros por argentinos
(Daniel Prietto), chilenos (Eduardo Contreras Budge), brasileiros (Luiz Gonzaga Mota),
com a intenção de propiciar uma compreensão mais afinada com a realidade da região.
Enquanto o Ciespal atuava como agência de difusão do pensamento hegemônico
e da metodologia corrente no mundo acadêmico dos Estados Unidos e da Europa
Ocidental, surgia no Chile, no início dos anos 1970, um núcleo de estudos que
desempenhou papel importante na promoção das tendências contra-hegemônicas da
pesquisa da comunicação e da cultura, disseminadas principalmente pelos intelectuais
da Europa Latina. Durante o governo Allende, é criado o CEREN (Centro de Estudos da
Realidade Nacional), vinculado à Universidade Católica do Chile, coordenado por
Armand Mattelart e integrado por Héctor Schmucler, Hugo Assmann, Michele
Mattelart, Mabel Piccini e Ariel Dorfman. Este centro terá uma importância
fundamental na região por realizar pesquisas sobre o domínio das multinacionais na
comunicação latino-americana, desde uma perspectiva marxista, introduzindo conceitos
como ideologia, relações de poder, conflitos de classe.
Esta perspectiva, inaugurada no Chile da Unidade Popular, já vinha sendo
ensaiada pelo grupo desde 1965, com pesquisas
antropológicas/demográficas/comunicacionais, e contava, também, com a participação
de Paulo Freire. A influência daquele pequeno centro “chileno” propagou-se em todo
continente e marcou politicamente a fisionomia da ciência latino-americana da
comunicação. Sua disseminação cultural encontrou terreno fértil na resistência aos
governos autoritários que dominaram vários países da América Latina nas últimas
décadas. Devido a sua atuação, os fenômenos da comunicação popular, antes ignorados
pelos pesquisadores acadêmicos, passaram a ter presença no contexto das pesquisas
universitárias.
Dois outros centros nacionais, dotados de menor projeção regional que o Ciespal
e o CEREN no mesmo período, devem ser incluídos no panorama pioneiro. Trata-se do
ININCO, na Venezuela, e do ICINFORM, no Brasil.
O Instituto de Pesquisas da Comunicação – ININCO – foi criado pela
Universidade Central da Venezuela, em 1973, que terá por objetivo: “a pesquisa da
comunicação social ou de massas, que compreendo tanto o estudo teórico e
metodológico dos problemas da comunicação, como a análise permanente dos
diferentes meios de sua incidência no âmbito nacional” (Aguirre,1981). Com pesquisas
feitas por cientistas como Antonio Pasquali, Hector Mújica, Marta Colomina, Eleazar
Dias Rangel e Ludovico Silva, esta equipe suscita reflexões, resgatando, pó um lado, a
vertente crítica da Escola de Frankfut, e, por outro lado o referencial analítico do
marxismo-leninismo. Sua produção acadêmica é autodenominada “pesquisa-denúncia”,
levando em conta as escassas possibilidades que o grupo descortinava para influir na
transformação da estrutura oligárquica dos meios de comunicação de massa no país.
Ciespal expandindo, na primeira fase, sua perspectiva desenvolvimentista por toda
região e ININCO dando guarida à preocupação pela introdução acrítica das novas
tecnologias, aprofundando, assim, as raízes da dependência.
8
9. O Instituto de Ciências da Informação – ICINFORM – foi fundado em Recife,
Brasil, em 1963, por Luiz Beltrão, dentro da Universidade Católica de Pernambuco,
idealizado para ser à imagem e semelhança do Ciespal, e também influenciado pelo
esforço desenvolvimentista que ocorria no Nordeste brasileiro, na primeira metade dos
anos sessenta. Vivendo numa região estigmatizada pela miséria e pela pobreza, Luiz
Beltrão pretendia inserir os meios de informação coletiva nas tarefas de
desenvolvimento econômico, cultural e educativo, sem, contudo, descartar e desfigurar
os meios tradicionais de comunicação usados pelo povo. Ele propõe uma linha de
pesquisa denominada “folk-comunicação”, destinada a aprofundar o conhecimento
sobre as leituras, feitas pelas maiorias camponesas e operárias, das mensagens
transmitidas coletivamente pela imprensa, rádio, televisão e cinema. Tratava-se de
identificar, na América Latina, as conseqüências culturais e políticas do “two-step-
flow”, tipificado por Lazarsfeld na sociedade norte-americana. Depois do golpe militar
de 1964, Luiz Beltrão transfere a sede do ICINFORM para a Universidade de Brasília e
cria núcleos de difusão dos trabalhos e do pensamento desse centro “nordestino” foi a
revista Comunicações & Problemas, que circulou 1969, ano do endurecimento do
regime militar no Brasil e do desaparecimento de inúmeras atividades intelectuais
independentes. Em seguida à marginalização de Luiz Beltrão da vida universitária
brasileira, pois foi demitido, por razões políticas, do cargo de diretor da Faculdade de
Comunicação da Universidade de Brasília, o ICINFORM se reestruturou como entidade
civil autônoma, mas foi perdendo as condições de aglutinação científica, em face do
obscurantismo intelectual que marcou a história nacional na década de setenta. De
qualquer maneira, as contribuições do ICINFORM se projetaram depois em vários
grupos universitários e nos trabalhos de comunicação popular e participativa
patrocinados pela Igreja Católica e pelas agências nacionais e regionais de fomento à
difusão de inovações tecnológicas na agricultura.
Os desdobramentos dessa fase deixaram clara a divisão entre a escola empírica,
de inspiração norte-americana e calcada em técnicas de pesquisa de audiência e de
análise de conteúdo, e a escola crítica de base européia, que partia da investigação da
estrutura e do conteúdo ideológico da mídia para abordar temas como o imperialismo
cultural, a formação de monopólios, a comunicação popular e alternativa e a
transnacionalização da cultura. (HERSCOVITZ, 1995, p. 117)
4. Crise econômica e democratização
Falência de bancos no México (1982), moratória da divida externa do Brasil
(1985), grandes mobilizações populares que exigiam a volta da democracia e fim dos
regimes militares em diversos países do continente, são os ingredientes que resultariam
naquilo que pode ser chamado de terceira fase da pesquisa comunicacional latino-
americana, fundamenta em três linhas de estudo: a comunicação transnacional, a
comunicação popular e alternativa e a ideologia presente nos meios massivos.
No balanço de Marques de Melo, o saldo dessa trajetória foi positivo, já que
permitiu a passagem de um estágio de completa dependência teórica e metodológica em
9
10. relação aos Estados Unidos e à Europa para um outro, no qual a consciência dessa
subordinação aos modelos externos permitiu o fortalecimento de um processo que
levaria à tentativa de uma autonomização investigativa tendo como ponto de partida a
nossa própria realidade. (GOMES, 1995, p. 25)
Dessa forma, os estudos latino-americanos em comunicação se multiplicaram e
se diversificaram, a partir de 1980, na esteira de transformações que levaram, em vários
países, à retomada das eleições diretas, ao restabelecimento da liberdade de imprensa,
ao crescimento da indústria da comunicação dirigida por companhias privadas, à adoção
de uma economia de mercado fortemente apoiada em vínculos internacionais (inclusive
dentro do próprio continente) e ao uso de novas e sofisticadas tecnologias nos meios de
comunicação. Logo, muitos pesquisadores, fortalecidos pelos programas de pós-
graduação das universidades e organizados em entidades fomentadora do debate como a
Alaic, a Felafacs e a Intercom, passaram então a propor a substituição do radicalismo
retórico do passado por uma linguagem menos agressiva, capaz de refletir contradições
e respeitar diferenças.
5. Os desafios do novo século
Nesse cenário de mais liberdade política e menos luta ideológica, no final da
década de 1980, ganhou força no continente a tendência de se abordar a comunicação a
partir das práticas culturais, através de uma combinação de teorias e métodos que
atestam o caráter híbrido dos estudos latino-americanos e onde ganham destaque o
deslocamento dos meios às mediações (Jesús Martin Barbero) e os processos de
hibridização cultural (Néstor García Canclini).
Embora os estudos culturais não sejam nenhuma novidade, já que eram
realizados desde a década de 1950 pelos culturalistas ingleses, essa opção metodológica
na comunicação pode ser classificada como uma contribuição essencialmente latino-
americana ao campo, que entra no século XXI defrontando-se com o desafio de buscar
caminhos metodológicos que consigam sistematizar o impacto da expansão explosiva
das comunicações sobre a sociedade e minimizar a dicotomia entre teoria e prática.
6. O CULTURALISMO
Principalmente a partir da década de 1980, as teorias nas pesquisas latino-
americanas em comunicação, sofrem influência das tendências culturalistas ou estudos
culturais – desde os anos 30 do século XX esses estudos se consolidaram na Inglaterra,
quando um grupo de professores da Literatura passam a estudar e a sistematizar a
relação entre cultura e os meios de comunicação de massa. Em sequência, será essa
relação que fundamentará grande parte das pesquisas realizadas na América Latina.
Entre esses dois momentos, podem-se também assinalar como contribuição a
essa corrente os estudos sociológicos da Escola de Chicago, onde se faz dessa cidade,
um laboratório social que busca identificar e analisar os sinais de desorganização, de
marginalização, de aculturação e de assimilação da vida urbana. Em suas investigações,
10
11. os principais autores da Escola de Chicago, Robert Ezra Park e Georg Simmel,
procuram interrogar em suas pesquisas qual “é a função dos jornais e, em especial, das
inúmeras publicações em língua estrangeira junto às comunidades de imigrantes, no que
diz respeito à natureza das informações, à profissionalização do jornalismo e à diferença
que distingue a propaganda social ou publicidade municipal.”
Com o intuito de compreender a tensão existente entre a sociedade e o indivíduo,
os autores da Escola de Chicago criticam as interpretações unilaterais do processo Ed
urbanização que acreditam no desaparecimento de grupos primários e omitem as
interações entre as tendências uniformizadoras da cidade e o cotidiano vivido por seus
habitantes. Logo, tanto do ponto de vista teórico como do metodológico, é possível
designar a Escola de Chicago como precursora das pesquisas em comunicação
realizadas na América latina a partir da década de 1980, justamente por partirem do
pressuposto de que essa tensão entre indivíduo e sociedade deve ser analisada a partir da
compreensão das relações que se estabelecem entre os contextos macro e microssociais
nos quais está inserida.
Sem estabelecer uma relação direta entre essa corrente teórica e os estudos
culturais, Mattelart e Neveu (1996) apontam a grande tradição da literatura inglesa
como motivadora dessas pesquisas a partir do século XX. A Inglaterra, que ocupa uma
posição de vanguarda neste contexto, tanto do ponto de vista dos avanços tecnológicos
como do aparecimento de formas culturais do sistema industrial, precede o resto do
continente também no que diz respeito à teorização de questões como o despertar de
uma atitude crítica do tipo culturalista perante a civilização moderna, caracterizada pelo
mau gosto da sociedade de massa e pela pobreza de sua cultura.
A introdução de estudos ingleses de universidades como Oxford e Cambridge, se
dá em meio a duas guerras mundiais, através de professores de Literatura oriundos de
camadas mais pobres da população. São produzidos estudos relativos à cultura literária,
sua análise textual, seu sentido e seus valores socioculturais.
A obra de Richard Hoggart, The Uses of Literacy, de 1957, é um dos marcos
dessa escola e descreve as mudanças que revolucionaram o modo de vida e as práticas
culturais das classes trabalhadoras. Nela, Hoggart conclui que o poder de influência
dosmeios de comunicação de massa (em especial dos folhetins impressos) junto aos
trabalhadores ingleses é proporcional à eficácia de outras instituições sociais como a
escola, a igreja, o Estado e à comunidade de pertencimento do indivíduo, seja o bairro
ou a família. A partir da década de 1960, ele passa a definir a cultura como processo
global através do qual as significações se constroem social e historicamente e são ao
mesmo tempo, elementos importantes de sua constituição. Para outros autores como
Williams, a cultura é um sistema de significações em que uma dada ordem social é
comunicada, reproduzida, vivenciada e estudada. Também Thompsom salienta a
pluralidade da cultura onde se devem ressaltar aspectos como os modos diferenciados
de vida, ligados às diferentes culturas e às classes sociais.
Dessa maneira, os estudos culturais mostram a complexidade das questões
culturais ditando a necessidade de relacionar as estruturas sociais exteriores ao sistema
da mídia às condições históricas, ligada a um processo dialético entre sistema cultural,
conflito e controle social. Daí, os estudos culturais vão ao encontro dos estudos em
11
12. comunicação realizados na América Latina a partir dos anos 80, nos quais o objeto
preferencial se concentra no espaço do popular das práticas da vida cotidiana, em forte
ligação com as relações de poder e com conotação política. Vale ressaltar que neste
período o continente latino-americano se encontrava em transformações culturais,
marcadas pela entrada massiva dos meios de comunicação de massa nos lares
(especialmente a televisão), pelos processos de migração da populações do campo para
a cidade e por fortes mobilizações sociais e políticas contra os regimes militares
presentes em diversos países.
Diversos estudiosos latino-americanos podem ser associados a essa tradição de
estudos culturais no continente. Dois deles, porém, merecem destaque e exercem, por
sua vez, influência nas pesquisas brasileiras realizadas sob esta perspectiva: Néstor
García Canclini, que nos traz a noção de hibridismo cultural, e Jesús Martin Barbero
que prioriza a análisen dos meios a partir das mediações. São obras desses dois autores
em especial, mas também de outros autores como o mexicano Guillermo Orozco, por
exemplo, e alguns europeus como David Morley, Pierre Bourdieu, Michel Foucault e
Michel de Certeau, que passaram a exercer forte influência nos estudos de recepção
desenvolvidos no Brasil a partir da década de 90 por autores como Vassalo de Lopes,
Denise Cogo, Pedro Gilberto Gomes, Roseli Fígaro Paulino e Mauro Wilson de Sousa.
Influências e contribuições estas que representam o amadurecimento e a autonomias da
pesquisa em comunicação no Brasil e na América Latina.
12
13. 7. Considerações Finais
No decorrer de nossas pesquisas, ficou clara a “inspiração” vinda dos estudos
norte-americanos e europeus, nos estudos de comunicação latino-americanos, bem
como a influência dos estudos culturais.
Neste trabalho foi exposto o estudo de comunicação na América Latina, em
períodos, para um melhor aproveitamento de seus principais trajetos percorridos, ao
longo do século XX.
É importante realçar que o compromisso e a preocupação continuam presente em
muitos pesquisadores e nas formulações de pesquisas e projetos conjuntos, assumindo a
modalidade de luta plausível para o novo milênio. Hoje, a pesquisa em comunicação é
realizada nos programas de pós-graduação – mestrados e doutorados – que se expandem
e devem propiciar a qualidade teórica e metodológica reivindicadora durante todo o
percurso, deixando vislumbrar a tradição de compromisso social já sedimentada.
Sendo assim, a nós é cabível vislumbrar os pesquisadores que desenvolveram
estudos na América Latina, e alcançar posições suscetíveis a desenvolvimento de novas
pesquisas e teorias em comunicação.
13
14. 8. Referências bibliográficas
DALLA COSTA, Rosa Maria Cardoso. Teoria da Com. na América Latina: da herança
cultural à construção de uma identidade própria. Curitiba, UFPR, 2006.
MARQUES DE MELO, José. Comunicação e Modernidade. São Paulo, Loyola, 1991.
HOHLFELDT, Antonio; C. MARTINO, Luiz e VIEGA FRANÇA, Vera. Teorias da
Com.: conceitos, escolas e tendências. Petrópolis, Vozes, 2001.
C. MARTINO, Luiz. Marcos Teóricos do Estudo da Comunicação na América Latina.
Disponível em: < http://www.unirevista.unisinos.br/_pdf/UNIrev_Martino.PDF>.
Acesso em: 22 abr. 2012.
JACKS, Nilda e B. MENEZES, Daiane. Estudos de recepção na América Latina:
contribuição para atualizar o panorama. Disponível em: <
http://www.compos.org.br/files/02_JACKS.pdf> Acesso em: 22 abr. 2012.
14