3. Governo do Estado do Maranhão
Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia,
Ensino Superior e Desenvolvimento Tecnológico
Universidade Estadual do Maranhão - UEMA
Núcleo de Tecnologias para Educação - UEMANET
ALFABETIZAÇÃO
Regina Sodré Almeida
São Luís
2010
5. SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 11
UNIDADE 1
ALFABETIZAÇÃO E HISTÓRIA? ............................................................................. . 13
Métodos tradicionais ................................................................................... 14
Método sintético .................................................................................. 14
Método analítico ou global ............................................................ 15
Método Paulo Freire ........................................................................... 16
Prontidão para alfabetização ........................................................ 17
UNIDADE 2
PSICOGÊNESE DA LÍNGUA ESCRITA SEGUNDO
EMÍLIA FERREIRO E ANA TEBEROSKI ................................................................. 19
Características do nível pré-silábico ..................................................... 20
Características do nível intermediário ................................................. 21
Características do nível silábico alfabético ....................................... 22
Como trabalhar a didática nesse contexto ....................................... 24
Primeiros passos.................................................................................... 25
Trabalho com nome e sugestão de atividades ....................... 25
Trabalho com textos .............................................................. ............ 26
UNIDADE 3
LETRamento e aLfabetizAÇÃO............................................. ........................ 31
Ganhos e enganos ......................................................................................... 33
6. UNIDADE 4
DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM COMO LIDAR? .................................. 35
O que é transtorno de déficit de atenção/
hiperatividade ? ............................................................................................... 36
O que é dislexia? ............................................................................................. 39
O que é disgrafia? ........................................................................................... 43
O que é dislalia?............................................................................................... 44
REFERÊNCIAS ...................................................................................................... 47
ANEXOS
7. PLANO DE ENSINO
DISCIPLINA: Alfabetização
Carga horária: 60 h
EMENTA:
Mudanças conceituais relativas a alfabetização. Sistematização do tra-
balho. Compreensão e domínio do código alfabético. Conhecimento
prévio como ponto de partida para a construção da leitura. Pressupos-
tos teóricos da didática da alfabetização (níveis de leitura e escrita). Pa-
pel do professor como mediador do processo no contexto da prática
pedagógica.
OBJETIVOS:
Geral:
Pretende-se que o aluno adquira conhecimentos que lhe permita traba-
lhar o processo de construção da leitura e escrita de forma consciente
e investigativa.
Específicos:
¡ Construir uma visão crítica sobre o processo de construção da leitu-
ra e escrita;
¡ Analisar o papel do professor como mediador da aprendizagem;
¡ Compreender que a utilização de diferentes tipos de textos possibi-
lita a construção da leitura e escrita de forma consciente.
8. CONTEÚDOS PROGRAMÁTICOS
UNIDADE 1
ALFABETIZAÇÃO E HISTÓRIA
Métodos tradicionais
Método sintético
Método analítico ou global
Método Paulo Freire
Prontidão para alfabetização
UNIDADE 2
PSICOGÊNESE DA LÍNGUA ESCRITA SEGUNDO EMÍLIA FERREIRO E
ANA TEBEROSKI
Características do nível pré-silábico
Características do nível intermediário
Características do nível silábico alfabético
Características do nível alfabético.
Como trabalhar a didática nesse contexto
Primeiros passos
Trabalho com nome e sugestão de atividades
Trabalho com textos
UNIDADE 3
LETRAMENTO E ALFABETIZAÇÃO
Ganhos e enganos
UNIDADE 4
DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM. COMO LIDAR?
O que é transtorno de déficit de atenção/hiperatividade?
O que é dislexia?
O que é disgrafia?
O que é dislalia?
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS:
O conteúdo deverá ser trabalhado através de teleconferências, video-
conferências fornecendo fundamentação teórica com bases em estudos
de textos, trabalhos em grupos nos pólos, pesquisas, trabalhos indivi-
duais e seminários.
9. RECURSOS DIDÁTICOS
¡ Powerpoin(tela)
¡ Trechos de filme
¡ Textos
¡ Quadro e acessórios
¡ Gravuras
AVALIAÇÃO
A avaliação será realizada de forma continua sobre a orientação dos tu-
tores através de trabalhos em grupos e atividades escritas individuais.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
BARBOSA, José Juvêncio. Alfabetização e leitura. 2ª ed. Revista Cortez,
1994.
FERREIRO, Emília. Reflexões sobre alfabetização. 2ª ed. Coleção:
Polêmicas do nosso tempo. São Paulo: Cortez, 1985.
__________. Com todas as letras. 2ª ed. São Paulo, Cortez, 1993.
GADOTTI, Moacir. Convite a leitura de Paulo Freire. Scipione, 1989.
GROSSI, Esther Pillar. Didática da alfabetização. Vol. I. Didática do nível
pré-silábico. 2ª ed. Rio de janeiro: Paz e Terra, 1990.
_________________. Didática da alfabetização. Vol. II. Didática do nível
silábico. 4ª ed. Rio de janeiro: Paz e Terra, 1992.
_________________. Didática da alfabetização. Vol. III. Didática do nível
alfabético. 3ª ed. Rio de janeiro: Paz e Terra, 1991.
KAUFMAN, Ana Maria. A leitura, a escrita e a escola: uma experiência
construtivista. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.
RONDE, Luis Augusto P. Transtorno de déficit de atenção/
hiperatividade: o que é? Como ajudar? Porto Alegre: Artemed, 1999.
RUSSO, Maria de Fátima/ AGUIAR VIAM, Maria Inês. Alfabetização. 2ª ed.
São Paulo: Saraiva, 1995.
SOARES, Magda. Alfabetização e letramento. 2ª ed- São Paulo:
Contexto, 2004.
10. TEBEROSKY, Ana/ COLOMER,Teresa. Aprender a ler e a escrever: uma
proposta construtivista. Porto Alegre: Artmed, 2003.
TOPCZEWSKI Abram. Aprendizagem e suas desabilidades, como lidar?
São Paulo: Casa do psicólogo, 2000.
11. INTRODUÇÃO
Caro aluno-leitor,
Este fascículo vem recheado de intenções, mas é preciso que haja en-
trega e inquietação diante de cada tema abordado ao longo do nosso
curso, fazendo-se necessário buscar outras fontes de pesquisas.
Quando falo de intenções, uma delas é que você precisa enxergar
seu aluno como um ser potente, um ser pensante. No entanto, é muito
importante a construção do vínculo, construção essa que surge a partir
do respeito e do afeto que se cria na relação professor x aluno, para que
a confiança se instale e a criança sinta-se apoiada e acolhida diante dos
desafios. Como diz Loris Malagguzi, a criança possue “Cem linguagens”,
(EDWARDS, Edwards, GANDINI, Leila e FORMAN, George.), e cada uma
se expressa de forma diferenciada, portanto, será necessário que você
perceba por qual linguagem ela se comunica, e não podemos esquecer
que se aprende errando, e esse desafiar-se diante da leitura e da escrita
vai depender muito da sua postura, de como você reagirá diante dos “
erros”que ela cometerá.
No processo de construção da aprendizagem essa é uma via de mão
dupla onde o professor também é aprendiz. É preciso nos colocarmos a
partir do ponto de vista do aluno para podermos ajudá-lo.
Não esqueça que você é a referência para os seus alunos e o que
você diz tem muita força sobre suas atitudes.
O que nos propomos é oferecer idéias a partir das quais possamos
repensar a prática de sala de aula e entender o processo de evolução da
alfabetização.
Discutiremos pontos relevantes sobre os diferentes métodos de
alfabetização, procurando entender a importância de cada método na
construção do processo de evolução da alfabetização. Vocês observarão
a singularidade de cada um e suas contribuições nesse processo, não es-
12. 12
quecendo que foram necessários anos de estudos, avaliações e pesqui-
sas sobre como se constitui o processo de leitura e escrita.
Ao longo do curso conversaremos sobre o processo evolutivo e os
avanços alcançados.
Contem comigo.
Um abraço,
Regina Sodré
13. 1
unidade
Alfabetização e história
C
onversaremos agora sobre a história da alfabetização, lembran-
do que, o professor precisa conhecer o processo histórico para
que possa situar-se e ajudar seu aluno. Cada um aprende de
jeito diferente, dependendo de sua história de vida, de suas expe-
riências.
O método traz implícito o objetivo que o professor pode atingir
e durante anos a escola focava o ensino de uma certa modalidade
de leitura decorrente de um saber específico sobre o sistema alfabé-
tico. As metodologias de alfabetização evoluíram, de acordo com as
necessidades. A história do ensino da leitura e escrita foi divida em
períodos:
1. o primeiro período da antiguidade até meados do século XVIII,
foi marcada pelo uso exclusivo do método sintético.
2. O segundo - a partir do século XVIII, tem início uma oposição
teórica ao método sintético pelos criadores do método global,
esta oposição só foi efetuada no início do século XX.
3. O terceiro - no final do século XIX e inicio do século XX sobressai
a questão que vai se opor ao método sintético e estabelecer os
postuladas do método analítico.
“Às vezes,é preciso escrever unicamente para
aprender.O importante é dar sentido
às atividades de escrita.”
Parâmetros Curriculares Nacionais
Objetivo dESTA unidade:
Avaliar que os métodos
significaram conquistas
fundamentais para
compreender como
se dá a apropriação da
escrita e sua importância
na elaboração de novas
concepções.
14. PEDAGOGIA14
MÉTODOS TRADICIONAIS
Método Sintético
O método sintético é o mais antigo de todos, tem mais de 2000 anos. Ele
parte do simples para o complexo. A criança aprende as letras, depois as
sílabas, as palavras, frases e finalmente, o texto completo parte das partes
para o todo, do desconhecido para o conhecido, é o método do be a bá.
Na escrita, é o método que se inicia com o traçado isolado de cada
letra, e às vezes só parte dela, sem se saber o que ela significa, tendo de
ser traçada dentro de um espaço limitado (papel de duas linhas) e logo
nas proporções e nas inclinações devidas.
Consiste em propor ao aluno que de início faça uma série de exercí-
cios de que ele não vislumbra a sua utilidade.
Ensinavam-se os nomes e o traçado de todas as letras do abecedário,
isoladas umas das outras, sem o aluno saber o que era e para que servia
aquilo e depois de decorá-las era suposto que o aluno já sabia ler porque
bastava juntar as letras e soletrar.
Assim um Pê e um a teria de fazer Pá, e umTê e um o teria de fazerTo,
e depois tudo junto parecia evidente e inevitável que desse pato.
Hoje parece claro que um método destes e para ensinar seja o que
for a crianças, é um absurdo:
1o
) Porque a criança não tem a percepção das partes antes de conhecer
o todo;
2o
) Porque é cansativo para a criança trabalhar a partir do desconheci-
do, para que muito mais tarde, e só na cabeça do adulto, a criança
venha a identificar o conhecido;
3o
) Porque não tem lógica.
Vejamos a palavra pato. A letra Pê não vale Pê, porque só seria assim
se tivesse um ê à sua frente. Sozinha ela não tem som, ela simplesmente
corresponde a uma posição do aparelho fonador e soará CONSOANTE a
vogal que se lhe vier a colocar à sua frente; é por isso que se chama CON-
SOANTE, a ela e a mais dezoito letras do nosso alfabeto.Vogais são o A, E, I,
O, U, porque estes sim já têm VOZ própria, independente de qualquer as-
sociação com outras letras. Se se juntar um Pê e um a, o mais que dá é Pêa.
E como o Tê e o o sofrem do mesmo mal, não teríamos To, mas sim Têo.
Como resultado lógico deste imbróglio seria um Pêatêo e nunca um Pato.
Mas isto é conversa de adulto, porque para criança nem uma nem outra,
como parece evidente, servem. Assim, a criança só muito tarde começará
a ler e a escrever palavrinhas, e mesmo assim, soletrando.Fonte: PT/arquivos/cartilhas2
15. Alfabetização | unidade 1 15
Exemplo de cartilha:
De autoria anônima, a 1ª edição dessas “cartas de ABC” é
de 1905. Há, entretanto, indícios de que essa publicação
é a introdução do Livro da Infância de Augusto Emílio
Zaluar, escritor português radicado no Rio de Janeiro. As
“cartas de ABC” representam o método mais tradicional e
antigo de alfabetização, conhecido como“método sintéti-
co”: apresenta primeiro as letras do alfabeto (maiúsculas e
minúsculas; de imprensa e manuscritas), depois apresenta
segmentos de um, dois e três caracteres, em ordem alfa-
bética (a-é-i-ó-u, ba-bé-bi-bó-bu, ai-ei-oi-ui, bai-bei-boi-
bui, etc); e, por fim, palavras cujas sílabas são separadas
por hífen (An-tão, A-na, An-dei, A-mar; Ben-to, Bri-tes, Bus-
car, Ba-ter, etc. A sobrevivência desse livro até 1956, data
desta 107a. edição, denota a sobrevivência desse modelo
antigo de alfabetização.
Método Analítico ou Global
Opunha-se ao método sintético, questionando dois argumentos dessa
teoria. Um que diz respeito à maneira como o sentido é deixado de lado
e outro que supunha que a criança não reconheceria uma palavra sem
antes reconhecer sua unidade mínima.
A principal característica que diferencia o método sintético do analí-
tico é o ponto de partida. Enquanto o primeiro parte do menor compo-
nente para o maior, o segundo parte de um dado maior para unidades
menores.
Justificando o método analítico, Nicolas Adam (BARBOSA, José Ju-
vêncio. Alfabetização e Leitura,1994. pg. 50) responsável por suas bases,
vai utilizar-se de uma metáfora, dizendo que, quando se apresenta um
casaco a uma criança, mostra-se ele todo, e não a gola, depois os bolsos,
os botões etc. Adam afirma que é dessa forma que uma criança apren-
de a falar, portanto deve ser da mesma forma que deve aprender a ler e
escrever, partindo do todo, decompondo-o, mais tarde, em porções me-
nores. Para ele, era imprescindível ressaltar a importância que a criança
tem de ler e não decifrar o que está escrito, isso quer dizer que ela tem a
necessidade de encontrar um significado afetivo e efetivo nas palavras.
O método analítico se decompõe em:
1. Palavração: diz respeito ao estudo de palavras, sem decompô-las,
16. PEDAGOGIA16
Fonte : Ufgm/arquivos
imediatamente, em sílabas; assim, quando as crianças conhecem de-
terminadas palavras, é proposto que componham pequenos textos;
2. Sentenciação: formam-se as orações de acordo com os interesses
dominantes da sala. Depois de exposta uma oração, essa vai ser de-
composta em palavras, depois em sílabas;
3. Conto: a idéia fundamental aqui é fazer com que a criança entenda
que ler é descobrir o que está escrito. Da mesma maneira que as mo-
dalidades anteriores, pretendia-se decompor pequenas histórias em
partes cada vez menores: orações, expressões, palavras e sílabas.
Método Paulo Freire
“(...) a prática educativa que, coerente com o ser que estamos
sendo,desafia a nossa curiosidade crítica e estimula o nosso
papel de sujeito do conhecimento e da reinvenção do mundo.
Esta, no meu entender, é a prática educativa que vem sendo
exigida pelos avanços tecnológicos que caracterizam o nosso
tempo.” (Paulo Freire, 1977)
O Método Paulo Freire consiste numa proposta para a alfabetização de
adultos desenvolvida pelo educador Paulo Freire, que criticava o siste-
ma tradicional que utilizava a cartilha como ferramenta central da di-
dática para o ensino da leitura e da escrita. As cartilhas ensinavam pelo
método da repetição de palavras soltas ou de frases criadas de forma
forçosa (em linguagem de cartilha), como Eva viu a uva, O bebê baba
dentre muitas outras.
O processo proposto por Paulo Freire iniciava-se pelo levantamento
do universo vocabular dos alunos. Através de conversas informais, o edu-
cador observa os vocábulos mais usados pelos alunos e assim seleciona
as palavras que servirão de base para as lições. A quantidade de palavras
geradoras pode variar de 18 a 23 palavras, aproximadamente. Depois de
composto o universo das palavras geradoras, passa-se de exercitá-las
com a participação do grupo.
A silabação: uma vez identificadas, cada palavra geradora passa a ser
estudada através da divisão silábica, semelhantemente ao método tra-
O método analítico alfabetizava com palavras e sílabas e se
opunha ao antigo método sintético, que ensinava as letras,
o bê-a-bá.
17. Alfabetização | unidade 1 17
Fonte: Braun. Atividades
Preparatórias para a leitura e
escrita, p. 8
dicional. Cada sílaba se desdobra em sua respectiva família silábica, com
a mudança da vogal. Por exemplo, para a palavra “ROBÔ”, as sílabas são:
RA-RE-RI-RO-RU, BA-BE-BI-BO-BU.
As palavras novas: o passo seguinte é a formação de palavras novas.
Usando as famílias silábicas agora conhecidas, o grupo forma palavras
novas.
Prontidão para alfabetização
Nos anos de 1970, predominaram os métodos de marcha sintética e re-
comendavam-se as atividades de “prontidão” antes que se iniciasse um
processo de alfabetização. Considerava-se que as capacidades para alfa-
betização estavam apoiadas em funções perceptivas e que as crianças
aprendiam por associações viso-audio motoras. Havia a recomendação
de não ensinar a ler e escrever na pré-escola, tempo dedicado a desen-
volver as discriminações auditiva e visual, a coordenação motora, a orien-
tação temporal e espacial. Esse período era reservado para o treino des-
sas habilidades e aplicava-se um teste de prontidão para certificar-se de
que as crianças poderiam iniciar-se na leitura e escrita.
[...] um novo método não resolve os problemas. É preciso reanalisar as práti-
casdeintroduçãodalínguaescrita,tratandodeverospressupostossubjacen-
tes a elas, e até que ponto funcionam como filtro de transformação seletiva
e deformante de qualquer proposta inovadora. Os testes de prontidão tam-
bém não são neutros. A análise de suas pressuposições merecia um estudo
em particular, que escapa aos limites deste trabalho. È suficiente apontar que
a “prontidão” que tais testes dizem avaliar é uma noção tão pouco científica
como a “ inteligência” que outros pretendem medir.(FERREIRO,1985, p.41)
Quando as crianças não conseguiam alfabetizar-se, as explicações in-
cidiam sobre déficit nessas funções.
18. PEDAGOGIA18
ATIVIDADES
“Estudar é, realmente, um trabalho difícil. Exige de quem o
faz uma postura crítica sistemática. Exige uma disciplina
intelectual que não se ganha a não ser praticando”.
[Extraído de um texto escrito por Paulo Freire,
em 1968, no Chile, para um seminário sobre
educação e reforma agrária]
O que você entende sobre“Postura critica e sistemática”no
processo de aprendizagem. Comente.
Que concepções você construiu depois de ler e discutir sobre
os métodos analíticos e sintéticos no processo de alfabetização.
19. unidade
PSICOGÊNESE DA LÍNGUA ESCRITA
”Ler não é decifrar, escrever não é copiar”.
(Emilia Ferreiro)
Nos anos de 1980, chegam ao Brasil os resultados dos estudos de
Emília Ferreiro e Ana Teberosky sobre a construção da escrita pela
criança, fundamentada na teoria piagetiana. Nessa pesquisa, fica
evidenciado que a criança começa a aprendizagem da escrita des-
de o momento em que ela convive com pessoas que usam a escrita
e que fazem intervenções colocando-as no lugar de leitores ou
solicitando que se arrisquem a escrever. Nessas situações, as crian-
ças elaboram hipóteses sobre a escrita de forma progressiva, que
vão desde a idéia de que a escrita representa pessoas e objetos,
até se darem conta de que a escrita representa o aspecto sonoro
da linguagem.
As investigações de Emília Ferreiro mostraram as concepções
que as crianças tem a respeito do sistema de escrita, os modos está-
veis de organização cognitiva que se sucedem em uma ordem deter-
minada, bem como os aspectos dinâmicos do processo, isto é, aquilo
que determina e permite a passagem de um nível para o outro.
A Emília Ferreiro e Ana Teberosky (Ferreiro e Teberosky, Anna.
Psicogênese da língua escrita. Porto Alegre, Artes Médicas, 1995.)
definiram, em Psicogênese da Língua Escrita, cinco níveis:
¡ Nível 1: Hipotese Pré-silábica
¡ Nível 2: Intermediário 1
¡ Nível 3: Hipótese Silábica
Objetivos dESTA unidade:
Reconhecer que há
atos inteligentes por
trás das escritas dos
alunos que ainda não
sabem ler e escrever
convencionalmente.
Compreender os
procedimentos possíveis/
necessários para ler e
escrever antes de estar
alfabetizada
2
20. PEDAGOGIA20
¡ Nível 4: Hipótese Silábico-alfabético ou Intermediário II
¡ Nível 5: Hipótese Alfabética
Em cada nível, a criança elabora suposições a respeito dos processos
de construção da leitura e escrita, baseando-se na compreensão que pos-
sui desses processos. Assim, a mudança de um nível para o outro só irá
ocorrer quando ela se depara com questões que o nível em que se encon-
tra não puder explicar: ela irá elaborar novas suposições e novas questões
e assim por diante. Podemos dizer, então, que o processo de assimilação
de conceitos é gradativo, o que não exclui“idas e vindas”entre os níveis.
Nível 1: Pré-silábico
A CRIANÇA:
¡ Não estabelece vínculo entre a fala e a escrita;
¡ Supõe que a escrita é outra forma de dese-
nhar ou de representar coisas e usa dese-
nhos, garatujas e rabiscos para escrever;
¡ Demonstra intenção de escrever através de
traçado linear com formas diferentes;
Para entrar no mundo da escrita, é importante que as
crianças interajam com uma grande diversidade de textos,
já que são capazes de produzir e reproduzir textos narrati-
vos, descritivos, de ficção, cartazes, textos de jornais, etc.
NÍVEIS
¡ Supõe que a escrita representa os objetos e não seus nomes: coisas
grandes devem ter nomes grandes, coisas pequenas devem ter no-
mes pequenos;
¡ Faz registros diferentes entre as palavras modificando a quantidade
e a posição e fazendo variações nos caracteres;
¡ Caracteriza uma palavra com uma letra inicial;
¡ Tem leitura global, individual e instável do que escreve: só ela sabe
o que quis escrever;
¡ Supõe que para algo poder ser lida precisa ter no mínimo de duas a
quatro grafias, geralmente três (hipótese de quantidade mínima de
caracteres)
Produção espontânea
21. Alfabetização | unidade 2 21
Segundo a UNESCO, a alfabetiza-
ção funcional equivale a“ser capaz
de compreender um texto simples
da vida cotidiana”
RECEITA
Nível 2: Intermediário
A CRIANÇA:
¡ Começa a ter consciência de que existe alguma relação entre
a pronúncia e a escrita;
¡ Começa a desvincular a escrita das imagens e os números das
letras;
¡ Só demonstra estabilidade ao escrever seu nome ou pala-
vras que teve oportunidade e interesse de gravar. Esta esta-
bilidade independe da estruturação do sistema de escrita;
¡ Conserva as hipóteses da quantidade mínima e da varieda-
de de caracteres.
Nível 3: Silábico
A CRIANÇA:
¡ Já supõe que a escrita representa a fala;
¡ Tenta fonetizar a escrita e dar valor sonora ás letras;
¡ Pode ter adquirido, ou não, a compreensão do valor sonoro
convencional das letras;
¡ Já supõe que a menor unidade da língua seja a sílaba;
¡ Supõe que deve escrever tantos sinais quantas forem as vezes
que mexe a boca, ou seja, para cada sílaba oral corresponde
uma letra ou um sinal;
¡ Em frases, pode escrever uma letra para cada palavra.
Produções espontâneas
22. PEDAGOGIA22
NÍVEL 5: Alfabético
A CRIANÇA:
¡ Compreende que a escrita tem uma função social: a comu
nicação;
¡ Compreende o modo de construção do código da escrita;
¡ Compreende que cada um dos caracteres da escrita corres-
ponde a valores menores que a sílaba;
¡ Conhece o valor sonoro de todas as letras ou de quase todas;
¡ Pode ainda não separar todas as palavras nas frases;
¡ Omite letras quando mistura as hipóteses alfabéticas e silá-
bicas;
¡ Não tem problemas de escrita no que se refere a conceito;
NÍVEL 4: Silábico-alfabético
A CRIANÇA:
¡ Inicia a superação da hipótese silábica;
¡ Compreende que a escrita representa o som da fala;
¡ Combina só vogais ou só consoantes, fazendo grafias equi-
valentes para diferentes. Por exemplo, AO para gato e sapo
ou ML para mola e mula;
¡ Pode combinar vogais e consoantes numa mesma palavra,
numa tentativa de combinar sons, sem tomar, ainda sua
escrita sociável. Por exemplo, CAL para cavalo.
¡ Passa a fazer uma leitura termo a termo (global)
O trabalho com diferentes tipos
de textos possibilita a compre-
ensão do aluno sobre os dife-
rentes gêneros textuais.
POEMA
(Elias José, Segredinhos do amor. São Paulo,
Moderna, 1195. coleção Girassol)
Produções espontâneas
23. Alfabetização | unidade 2 23
(...) fica assim, descartado o trabalho com unidades lingüísticas des-
contextualizados, tais como sílabas, palavras, sentenças, que só fazem
sentidoparaquemalinguagemjáconstituiobjetodereflexãoeanálise.
Da mesma forma fica prejudicada, porque ineficiente, o trabalho com
metalinguagem como objetivo em si mesmo, já que a metalinguagem
sófazsentidoapósareflexãoeanálise,Ficaigualmentedescartada,na
chamada alfabetização, a necessidade do tradicional período prepa-
ratório em que se treinam a discriminação visual e auditiva como se a
criança não fosse capaz de distinguir objetos e sons significativos para
ela, ou em que se treina o comportamento motor de forma completa-
mente mecânica e sem sentido (Abaurre,1998,p.7)
24. PEDAGOGIA24
COMO TRABALHAR A DIDÁTICA NESSE CONTEXTO
Segundo Sara Pain:“A didática é a disciplina que liga o âmbito do conhe-
cimento ao âmbito da aprendizagem, estabelecendo as metodologias ou
normas de ação que conduzem a consecução de objetivos pedagógicos
explícitos, os quais se referem, nesse caso á aquisição da lecto-escritura”.
E, nas palavras de Esther P. Grossi:”A didática é o campo do conhecimento
que busca, entre outras coisas, dar condições para o sujeito reestruturar
efetivamente seu saber”. (Russo e Vian. Alfabetização Um processo em
Construção, p.32).
As crianças são facilmente alfabetizáveis desde que descubram, através
de contextos sociais funcionais, que a escrita é um objeto interessante que
merece ser conhecido (como tantos outros objetos da realidade aos quais
dedicam seus melhores esforços intelectuais).(FERREIRO,1993,p.25)
Para definir a didática mais adequada, o professor precisa, antes de
mais nada, procurar detectar o nível em que se encontra o aluno para
mais nada, procurar atingir os alunos em que se encontra o aluno para
intervir coerentemente no processo de aprendizagem de cada um.
O professor deve procurar atingir os alunos de todos os níveis, de-
safiando-os para provocar o avanço. As atividades podem motivar dife-
rentes e em cada criança implicarão uma mudança, ou adequação, da
hipótese própria do nível em que o aluno se encontra.
No que se refere à aplicação das atividades, a maior dificuldade pare-
ce ser, justamente, a de desenvolver trabalhos que possam ser compre-
endidos e acompanhados por todas as crianças. Ora, numa classe com
os alunos em todos os níveis, é bastante difícil conseguir isso, mas não é
impossível. Assim, as atividades comuns á classe toda devem garantir a
participação dos alunos de níveis pré-silábico e silábico, para que estes
tenham a oportunidade de progredir em seus conceitos. Não se deve,
por exemplo, programar atividades que só os alunos silábico-alfabéticos
ou alfabéticos possam“resolver”e tampouco deve-se desafiar apenas os
alunos de níveis anteriores, com o risco de desmotivar os alunos que se
encontram nos níveis seguintes. Todos os alunos, de todos os níveis, pre-
cisam de estimulo9s para adequar as hipóteses pelas quais estão passan-
do e, por isso, as atividades devem se desafiantes e não desestimulantes.
De modo geral, o professor precisa levar a criança a raciocinar sobre
a escrita e, para isso, ele deve criar um ambiente rico em materiais e em
atos de leitura e escrita, incentivando-as. Deve, também, provocar a inte-
ração entre os diferentes níveis, principalmente os mais próximos. Assim,
o professor não precisa trabalhar necessariamente com cada aluno, mas
sim permitir-lhes a comunicação, que é o principal instrumento da didá-
tica da aprendizagem da alfabetização.
25. Alfabetização | unidade 2 25
Primeiros passos
Emilia Ferreiro e seus colaboradores têm mostrado que, para a criança
chegar à compreensão do processo de alfabetização, ela necessita passar
por um processo evolutivo que se inicia no rabisco, vai até a descoberta
de que as letras representam os aspectos sonoros da palavra (fase silábi-
ca) para depois, entender a representação alfabética. Nas palavras dela:
“A tal falada prontidão para a leitura e a escrita depende muito mais de
ocasiões sociais de estar em contato com a língua escrita do que qual-
quer outro fator. Não tem nenhum sentido deixar a criança á margem da
língua escrita, esperando que amadureça”.
[...] desde aproximadamente os quatro anos, as crianças possuem sólidos
critérios para admitir que uma marca gráfica possa ou não ser lida, antes de
serem capazes de ler os textos apresentados. (FERREIRO, 1985, p.45)
Trabalho com nomes (sugestões de atividades)
A primeira preocupação no processo de alfabetização deve ser a de pro-
curar trabalhar com elementos significativos para o aluno e sabemos que
o que tem mais significado para uma criança é o seu próprio nome, seu
nome próprio, que a identifica e lhe dá identidade.
Sempre que possível, deve-se requerer e incentivar o registro a leitu-
ra do0s nomes pelos alunos a fim de que a atividade não perca o obje-
tivo. O registro é importante, uma vez que representa a organização do
trabalho oral.
O uso da letra de forma maiúscula, também chamada de letra bas-
tão( exemplo: ALEXANDRE), no inicio da alfabetização, facilita a discri-
minação visual, além de apresentar traçado mais simples. No entanto,
aconselha-se apresentar e usar outros tipos de letras, como a cursiva
(exemplo: ) e a da imprensa ( exemplo: ALEXANDRE). No que se refe-
re à letra bastão, a constância da cor facilitará determinadas atividades.
Quanto na letra cursiva, o professor deve ter cuidado com o traçado para
que as letras possam ser identificadas com facilidade.
Sugiro agora algumas atividades que podem ser realizadas com os
alunos. O nome é o que a criança possui de identidade em relação a es-
crita e leitura. Ele é estável, não muda nunca a seqüência de como se
escreve, portanto é mais fácil para a criança compreender a estrutura.
26. PEDAGOGIA26
ATIVIDADES COM OS CRACHÁS
¡ Chamar a criança pelo nome e pedir que ela repita.
¡ Chamar o aluno pelo o nome e mostrar o crachá para a
classe. A criança levanta para buscá-lo.
¡ Mostrar um crachá, sem ler, e esperar que o dono ou
seus colegas o reconheça.
¡ Mostrar um crachá, sem ler, e dar uma característica do
dono. As crianças devem identificar quem é.
¡ Embaralhar os crachás, sem ler, entregar um para cada
criança e pedir que cada aluno procure o seu.
¡ Embaralhar os crachás e entregar um para cada aluno
que deverá entregar o crachá em seu poder para o res-
pectivo dono.
¡ Misturar os crachás e pedir ás crianças que venham
procurar o seu nome.
¡ Separar os crachás por fileira e deixá-los na primeira
carteira. A um sinal, dado pelo professor, o primeiro
aluno pega o seu e passa o restante para trás, e assim
sucessivamente até chegar ao último da fileira.
Quando os crachás tiverem sido bastante explorados, o
professor recorta as letras ou as sílabas e pede que cada
aluno forme seu nome de novo, colocando-o em sulfite.
exemplo: SO LAN GE
Trabalho com texto
Produzir textos é inerente á criança. Antes mesmo de conhecer as letras,
ela conta um fato, descreve um passeio, dita regras de uma brincadeira,
entre outras coisas. Em sua rotina diária, ela produz texto oral.
A criança precisa ser incentivada a soltar-se para escrever, a relevar seu
interior, a transcrever suas experiências, a relatar fato do seu mundo sem
ter que se preocupar com correções, riscos vermelhos e notas baixa: sim-
plesmenteescreveroquelhedámaiorprazeresaberque,comisso,estáse
comunicando, mesmo antes de saber ler e escrever convencionalmente.
27. Alfabetização | unidade 2 27
MACACA SOFIA
(domínio publico)
A linguagem integral propõe
trabalhar com textos reais. A
posiçãoconstrutivistavaimais
além e defende que aprender
a ler e a escrever é entrar no
mundo real da cultura escrita.
Atualmente, existe uma preocupação maior com a pro-
dução de textos desde os primeiros anos de escolaridade e a
criança pode escrever um texto desde o primeiro dia de aula.
Em geral, não é muito fácil o entendimento desses textos
iniciais por parte do professor, e para que isso não aconteça,
para que o aluno tenha um retorno do seu trabalho, é preciso
conversar com a criança sobre o que ela escreveu.
Não é preciso fechar famílias silábicas nem desenvolver
regras gramaticais antes da produção. A criança deve escre-
verdamaneiracomoentendequesejaaescritae,aospoucos,
ao serem desenvolvidos os conteúdos, ela mesma se corrigirá
ou, se um determinado erro persistir, deverá ser direcionado
a correção.
Os alunos se interessam mais por uma informação e a
retêm melhor se ela fizer parte de um todo: eles vivem o mo-
mento tão intensamente que tudo que é retirado de um assunto central,
com significado pra eles, fará parte desse momento tão bem vivencio-
nado. Assim com base no que diz David Ausubel (citado por Joseph D.
Novak, em uma teoria de educação1981, ed. São Paulo), podemos dizer
que a aprendizagem significativa é um processo no qual uma nova infor-
mação é relacionada de maneira não arbitraria a um aspecto relevante, já
existente, da estrutura de conhecimento de um individuo.
Portanto, não tem sentido atividades como trabalhar com listas infin-
dáveis de palavras com mesma dificuldade gramatical, trabalhar páginas
inteiras de treinos ortográficos, separar sílabas de dezenas de palavras
com dígrafos e fazer cópias quilométricas. Uma atividade muito longa e
repetitiva cansa, desanima, desestimula e desinteressa. Palavras soltas,
sem significado e sem adequação imediata perdem-se no espaço do pa-
pel, desaparecem sobre a vista com a mesma rapidez com quer foram
escritas.
Exemplo de uma produção de escrita
espontânea.
MACACO ASSOBIA
PANELA NO FOGO
BARRIGA VAZIA
FAZENDO CARETA
PRA DONA MARIA
28. PEDAGOGIA28
Sugestões para a produção
A produção de texto não deve ser trabalhada isoladamente;
pelo contrário, devem-se aproveitar o assunto o tema ou a pala-
vra que estão sendo trabalhado para intercalar a produção.Sobe
esse ponto de vista a produção de texto é apenas mais uma ati-
vidade a ser executada pelos alunos. Por exemplo, se a classe
está trabalhando a palavra camelo , pode-se:
¡ Pedir que os alunos escrevam um texto sobre esse animal;
¡ Sugerir que eles montem um livro com os animais que eles
conhecem;
¡ Pedir que falem e escrevam sobre um animal de estimação
que já tiveram em casa ou gostariam de ter etc.
A seguir, algumas idéias de atividades de produção de textos
para serem desenvolvidas com os alunos. Como todas as outras
sugestões, essas também não são rígidas: fica a critério do pro-
fessor adaptá-las, de acordo com o nível em que se encontra os
alunos.
As produções podem ser arquivadas em um caderno especifi-
co, de maneira que o progresso do aluno possa ser percebido e
avaliado com maior segurança pelo professor.
Construção de textos através da leitura de gravuras
1. PREPARAÇÃO PARA O TEXTO
Predições ou formulação de hipóteses quanto ao conteúdo e tipo de
texto, a partir dos conhecimentos prévios (aqueles já adquiridos pelo
autor).
Ao fazer predições, a criança deixa de ler porque algum adulto solici-
tou e passa a ler com objetivos bem específicos, dentro de seus interes-
ses: lê procurando pistas que confirmem ou não suas hipóteses.
Nesse contexto o papel do professor é intermediar essas predições,
sugerindo as questões propostas junto aos textos e outras que surgirem
durante a preparação de cada texto:
29. Alfabetização | unidade 2 29
Fonte:livro – O pote de
Melado(Mary e Eliardo França)
COMO É FEITO (exemplos)
¡ Análise do portador do texto: observar na fonte a natureza do
portador (jornal, revista em quadrinhos, dicionário, livro de en-
ciclopédia, receita) autoria e época em que foi escrito.
¡ Analisar ilustração que acompanha o texto: É um desenho? É
um foto? O que indica? É atual ou antiga? Que características
poderiam ser dadas a cada personagem?
¡ A disposição do texto na página: Observar a“silhueta”do texto
(Como o texto está distribuído na página? Há presença de títu-
los? Subtítulos? Algarismos? Espaços em branco? Que tipo de
texto seria? Parece ser uma receita? Um poema? Uma notícia?
Um conto? Uma propaganda? Por quê?)
2. LEITURA:
A leitura é feita pelo professor, e acompanhada pelos alunos ini-
cialmente em faixas e em seguida o texto completo em forma de
blocão.O aluno é estimulado a fazer a leitura individual e silenciosa.
3. ATIVIDADES DE VOCABULÁRIO
O significado das palavras-chaves, necessárias à compreensão do texto,
é construído através do uso do dicionário.
4. RECONSTRUÇÃO E AMPLIAÇÃO DO SENTIDO DO TEXTO.
Atividades que promovam intercâmbio oral, tais como: recriação de his-
tórias, análise e descrição de personagens, relato e escuta de impressões
causadas pelo texto, leitura oral individual, em dupla etc.Após toda essa
exploração, você poderá sugerir que cada aluno produza seu texto, como
mostra o exemplo abaixo. Deixando claro que esse texto não possui cor-
reção, uma vez que a proposta é deixar que a criança ordene o pensa-
mento com a estrutura textual.
Produção espontânea depois da
exploração do texto: O pote de
melado
30. PEDAGOGIA30
ATIVIDADES
Ana e João têm 7 anos, não são alfabetizados e estão na mesma
turma. Aline conhece as letras, pratica intensamente a leitura
incidental (memorização de palavras/símbolos), manipula
livros segundo a lógica da leitura, já reconhece e escreve seu
nome há alguns meses, mas ultimamente passou a escrevê-lo
de forma estranha, usando apenas as letras A, I, E. Antônio não
tem intimidade com o lápis, pois teve poucas oportunidades
de desenhar, mas diferencia perfeitamente desenho de escrita.
Conhece poucas letras, faz raras leituras incidentais, manipula
livros de forma aleatória, mas pede para que sejam“contados”. Não
reconhece seu nome em meio a outras palavras. Instado a ler uma
lista de nomes de animais, atribuiu à palavra BOI o significado de
“formiguinha”.
a) Segundo a concepção construtivista da alfabetização, apresente
duas diferenças entre Aline e Antônio quanto às etapas do
processo de aprendizagem da leitura e da escrita.
b) Ainda com base na concepção construtivista da alfabetização
e nos perfis acima apresentados, indique duas atividades
que contemplem, respectivamente, os seguintes objetivos:
ampliação dos conhecimentos/informações de caráter
socialmente transmissível, imprescindíveis ao ato de ler e escrever;
intensificação da interação das crianças com a expressão escrita
com vistas ao aprendizado conceitual da escrita como sistema de
representação.
31. unidade
LETRAMENTO E ALFABETIZAÇÃO
“A literatura infantil propicia uma reorganização das
percepções do mundo, possibilitando a ordenação
das experiências da criança e promovendo a
formação de novos padrões e o desenvolvimento do
senso critico.”
Apostila do congresso Paranaense de Alfabetização.
Literatura infantil, frações e conceitos, 1997.
Já nos anos de 1990, o foco passa a ser a construção das funções da
escrita. Amplia-se o conceito de alfabetização, e ganha destaque o
conceito de letramento (a expressão analfabetismo funcional é utili-
zada como sinônimo de letramento).
As crianças são iniciadas na escrita em “eventos de letramento”,
quando os adultos lêem e escrevem para as crianças e também as
convida para arriscar-se em leituras ou escritas. Nesses momentos,
elas vão aprendendo as funções da escrita, entendendo que ela ser-
ve para comunicar, divertir, convencer. Fazem leituras apoiadas em
ilustrações, evidenciando que, mesmo não sendo alfabetizadas, são
capazes de atribuir sentido a textos. Dessa forma, as crianças vão se
apropriando da escrita, adquirindo algum nível de letramento e isso
facilita a própria alfabetização.
A apropriação da escrita é um processo complexo, implicando
muitas facetas, mas podemos aqui resumí-las a duas:
¡ Alfabetização: estabelecimento inicial de relações entre a pauta
sonora e as letras, que evoluem para o domínio do sistema alfa-
bético-ortográfico;
¡ Letramento: participação na cultura escrita; conjunto de conhe-
cimentos, atitudes e capacidades para usar a escrita em práticas
sociais.
Essa diferenciação surge diante das mudanças ocorridas nas so-
Objetivo dESTA unidade:
Compreender que a
criança com um bom
nível de letramento será
facilmente alfabetizada.
3
32. 32 PEDAGOGIA
ciedades contemporâneas, muito centradas na escrita, nas quais é insu-
ficiente o domínio das primeiras letras. Torna-se preciso que as pessoas
leiam e escrevam textos com competência. A participação da vida social,
cultural e produtiva, e o exercício da cidadania exigem mais do que ser
alfabetizadas, requerem domínio das práticas letradas.
No Brasil, o termo “letramento” foi usado pela 1a vez por Mary
Kato, em 1986, na obra “No mundo da escrita: uma perspectiva
psicolingüística”(São Paulo, Ática). Dois anos depois, passa a re-
presentar um referencial no discurso da educação, ao ser defini-
do porTfouni em“Adultos não alfabetizados: o avesso do avesso”
(São Paulo, Pontes) e retomado em publicações posteriores
33. Alfabetização | unidade 3 33
GANHOS E “ENGANOS”
Todas essas mudanças significaram conquistas fundamentais para com-
preender como se dá a apropriação da escrita, e não podemos aban-
doná-las. No entanto é preciso olhar para essas concepções e práticas
não de forma alternativa, mas complementar, para que não descartemos
idéias importantes. Neste contexto todo método tem sua importância Se
falei no início que cada criança aprende de forma diferenciada , é neces-
sário que o professor tenha conhecimento das várias metodologias e as
reais necessidades de seus alunos para ajudá-los em sua aprendizagem.
Métodos de
alfabetização:
GANHOS “ENGANOS”
Sintéticos
Analíticos
¡ Trabalho sistemático que oferece segurança ao
professor, que leva em conta uma progressão
de conteúdos e atividades.
¡ Relações explícitas entre a fala e a escrita
¡ Priorizam o sentido, tornam a leitura possível
antes da decodificação.
¡ A leitura é vista
¡ Insistir na aplicação de estratégias mesmo
quando o resultado do trabalho mostrava que
as crianças não estavam aprendendo, sem
levar em conta a diversidade e dinâmica do
processo de aprendizagem.
¡ Trabalhar a decodificação e o sentido como
práticas separadas.
¡ Entender a relação entre letras e sons como
condição para o uso da escrita.
¡ Trabalhar o sentido e não a função social da
escrita, seu uso.
Prontidão para a
alfabetização
¡ Início de um olhar para a criança que aprende.
¡ Percepção de que nem todas as crianças
aprendem da mesma maneira.
¡ Funções perceptivas e motoras são importantes
para a conquista de algumas competências.
¡ Explicar o fracasso escolar pelos déficits das
funções perceptivo-motoras, estabelecendo
relações causais entre elas e a alfabetização.
Psicogênese da
língua escrita
¡ Leva em conta a maneira como a criança
aprende.
¡ Traz para a sala de aula a escrita com sentido.
¡ Possibilidade de ler o que a criança escreve
(escritas não convencionais)
¡ Considerar o papel do professor muitas vezes
restrito a organizar o ambiente e a incentivar
a aprendizagem.
Letramento ¡ Trabalha a escrita em situação de uso.
¡ Destaca a função social da escrita.
¡ Recupera o papel do ensino.
¡ Pensar que todas as crianças naturalmente
voltam sua atenção para os aspectos
fonográficos da escrita, sem realização de um
trabalho sistemático para isso.
34. 34 PEDAGOGIA
ATIVIDADES
Quais as diferenças entre ALFABETIZAR E LETRAR?
Discuta com o seu grupo: Quais são as condições para que
o aprender a ler e a escrever seja algo que realmente tenha
sentido, uso e função para as pessoas?
Através da imagem a seguir, crie uma aula que favoreça o
processo de aprendizagem entre os alunos.
Observando esse quadro, podemos perceber que conceitos impor-
tantes foram utilizados alternadamente. Temos agora o desafio de reco-
nhecer os conhecimentos produzidos na área de ensino e aprendizagem
da escrita inicial e integrá-los em uma nova proposta.
Sabemos hoje que a entrada no mundo da escrita se dá simultanea-
mente pelos processos de letramento e alfabetização, complementares
e inseparáveis. A alfabetização precisa se desenvolver por meio de práti-
cas sociais de leitura e produção de texto. Mas, não podemos nos esque-
cer de que a palavra têm, além do sentido, uma dimensão sonora, não
evidente para as crianças e que precisa ser trabalhada, para que possam
compreender o funcionamento do sistema alfabético. E isso precisa ser
feito de forma consciente e sistemática.
(Eva Funari. A bruxinha e o
Gregório. São Paulo, Ática,
2002. pg.19)
35. unidade
DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM.
COMO LIDAR?
O aprendizado é uma tarefa primária do ser humano que tem,
na nossa cultura, o seu ponto alto associado à escolaridade. É esse
tipo de aprendizado que move o indivíduo em direção ao desenvol-
vimento intelectual, criativo e produtivo, levando-o a se tornar um
vencedor, pois amplia as suas possibilidades de crescimento.
Como já está estabelecido pela sociedade, o aprendizado es-
colar é um dos meios fundamentais de progresso profissional e de
ascensão social. Sabemos que muitas pessoas se encontram com-
prometidas com o aprendizado, nos mais diversos graus e pelas mais
variadas causas. Nesse sentido, os objetivos básicos parecem nortear
as instituições e os profissionais ligados, direta ou indiretamente, à
educação, minimizar as causas determinantes do fracasso escolar e
adaptar o sistema de ensino para um melhor aprendizado dos indiví-
duos com dificuldades; com isso, poder-se-á aproveitar o máximo de
potencial de cada indivíduo, respeitando suas limitações, mas procu-
rando encaminhá-lo para um porvir melhor.
Conversaremos agora sobre as dificuldades de aprendiza-
gem e pensaremos mais sobre como ajudar nossos alunos.
ObjetivoS dESTA unidade:
Perceber o aluno como
pessoa que possa
desenvolver pessoalmente
suas aprendizagens, para
ter uma imagem positiva
de si mesmo.
Organizar uma proposta
de apoio pedagógico para
os alunos com dificuldade
de aprendizagem na
leitura e escrita.
“Toda aprendizagem resulta em alguma mudança
ocorrida no comportamento daquele que aprende”
Campos. Psicologia da aprendizagem, 1997. pg.33
4
36. 36 PEDAGOGIA
O QUE É TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO/
HIPERATIVIDADE?
OTranstorno de Déficit de Atenção/ Hiperatividade, que passaremos
a chamar apenas pela sigla TDAH, é um problema de
saúde mental que tem três características básicas: a desatenção, a
agitação ( ou hiperatividade) e a impulsividade. Esse transtorno tem um
grande impacto na vida da criança ou do adolescente e das pessoas com
as quais convive (amigos, pais e professores). Pode levar às dificuldades
emocionais, de relacionamento familiar e social, bem como a um baixo
desempenho escolar. Muitas vezes, é acompanhado de outros proble-
mas de saúde mental. Para exemplificar, vejamos o caso de um menino
que chamaremos de Marcelo.
Marcelo tem oito anos e está repetindo a primeira série.
Em casa, brinca por pouco tempo na mesma coisa. É um
“foguete”. Prefere jogos com atividades físicas, como fu-
tebol e vôlei, embora os colegas reclamem que, às vezes,
não presta atenção à bola. Na hora das refeições, dificil-
mente come sentado à mesa. Gosta de transitar entre a
mesa e a sala de TV, com o prato na mão. Quando os pais
insistem para que fique sentado, fica remexendo-se na
cadeira, seguidamente, e acaba derrubando alguma coi-
sa. Tem muita dificuldade de sentar e fazer as atividades.
Basta um pequeno barulho para que largue tudo e vá ver
o que está acontecendo. Muitas vezes, mente para a mãe
dizendo que não tem atividades. Dificilmente termina as
tarefas que começa, entretanto, consegue passar algumas
horas jogando videogame. Na maioria das vezes, parece
estar “no mundo da lua” quando os pais falam com ele,
mas se intromete nas conversas dos pais quando quer fa-
lar alguma coisa. Na escola, as professoras reclamam que
ele está sempre se levantando da classe, conversa muito
com os colegas, o seu material está, com freqüência, de-
sorganizado, perde o estojo ou as folhas de exercícios e
não consegue esperar a sua vez na fila para entrar em aula.
Frequentemente inicia brigas com os colegas para passar
na frente deles na fila. Não gosta de ler as “historinhas” e
erra os exercícios por não prestar atenção ao que a profes-
sora pediu.
37. Alfabetização | unidade 4 37
Essas dificuldades já eram notadas pelos pais desde muito
cedo. Embora a gravidez tenha transcorrido sem maiores
problemas, o parto teve que ser cesariana, pois ele estava
em sofrimento fetal. Entretanto, tanto o parto como o perí-
odo logo após o nascimento transcorreram normalmente.
Sempre foi uma criança bastante agitada. No primeiro ano
de vida, os pais lembram que ele chorava muito, tanto de
dia como de noite. Quando ele tinha quatro anos, era di-
fícil para os pais visitarem amigos, pois ele ficava pulando
de um lado para o outro. No jardim, a professora reclama-
va que ele não parava na rodinha para ouvir as histórias.
Queria sempre contar a sua primeiro.
Marcelo é filho de Jorge e Isabel e tem um irmão de três
anos. Jorge é profissional liberal e Isabel é dona de casa.
Embora Jorge seja bem-sucedido na profissão, sempre
teve dificuldades em organizar-se no trabalho. Mantém
uma agenda dos seus compromissos, que é cuidadosa-
mente preparada pela secretária. Quando não consulta a
agenda, com freqüência esquece as reuniões marcadas.
Tem dificuldades de ler os relatórios da empresa onde
trabalha. Prefere que a secretária prepare um resumo dos
pontos mais importantes. Já perdeu algumas possibilida-
des de bons negócios, pois toma muitas decisões rapida-
mente, antes de pensar. Na escola, tinha dificuldade de
ficar sentado por um período inteiro. Ainda hoje gosta de
estar em movimento. O relacionamento do casal é bom,
embora discutam bastante sobre a educação de Marcelo.
Jorge acha Marcelo muito parecido com ele, quando era
menor. Acredita que o filho irá superar as dificuldades com
o tempo. Isabel tem medo de que as dificuldades do filho
possam continuar atrapalhando-o em casa e na escola.
QUAIS OS SINTOMAS DO TDAH?
O TDAH caracteriza-se por dois grupos de sintomas: (1) desatenção e (2)
hiperatividade ( agitação) e impulsividade.
¡ Não prestar atenção a detalhes ou cometer erros por descuido;
¡ Ter dificuldade para concentrar-se em tarefas e/ou jogos;
¡ Não prestar atenção ao que lhe é dito (“ estar no mundo da lua”);
38. 38 PEDAGOGIA
¡ Ter dificuldades em seguir regras e instruções e/ou não terminar o
que começa;
¡ Ser desorganizado com tarefas e materiais;
¡ Evitar atividades que exijam um esforço mental continuado;
¡ Perder coisas importantes;
¡ Distrair-se facilmente com coisas que não têm nada a ver com o que
está fazendo;
¡ Esquecer compromissos e tarefas.
Os seguintes sintomas fazem parte do grupo de hiperatividade / impul-
sividade:
¡ Ficar remexendo as mãos e/ou os pés quando sentado;
¡ Não parar sentado por muito tempo;
¡ Pular, correr excessivamente em situações inadequadas, ou ter uma
sensação interna de inquietude ( ter“bicho-carpinteiro por dentro”);
¡ Ser muito barulhento para jogar ou divertir-se;
¡ Ser muito agitado (“ a mil por hora”; “ou um foguete”);
¡ Falar demais;
¡ Responder as perguntas antes de terem sido terminadas;
¡ Ter dificuldade de esperar a vez;
¡ Intrometer-se em conversas ou jogos dos outros.
É PRECISO TER TODOS ESSES SINTOMAS PARA TER TDAH?
Não. Algumas crianças e adolescentes, como no exemplo de Marcelo,
apresentam muitos dos sintomas listados anteriormente. Na maioria
das vezes, estão presentes vários, mas não todos. As pesquisas mais re-
centes têm mostrado que são necessários pelo menos seis dos sintomas
de desatenção e/ou seis dos de hiperatividade/impulsividade, para que
se possa pensar na possibilidade do diagnóstico do TDAH.
Mas, cuidado! Para se considerar que alguns dos sintomas da lista
está presente é importante que ele aconteça frequentemente, não de vez
em quando.Todos nós, vez por outra, estamos mais inquietos, ou no “
mundo da lua”.
EXISTE ALGUMA IDADE DE INÍCIO DOS SINTOMAS?
Os pesquisadores têm discutido muito essa questão. Como o TDAH é
um problema associado ao desenvolvimento, sempre se pensou que
os sintomas já deveriam estar presentes desde muito cedo na vida da
criança e do adolescente. Na maioria dos casos, isso é verdade. Como
Marcelo, muitas crianças com TDAH são agitadas e choram muito desde
39. Alfabetização | unidade 4 39
bebê, ou não param sentadas nas rodinhas de histórias no jardim de
infância. Afirmava-se que, para existir TDAH, era necessário que alguns
sintomas estivessem presentes antes dos sete anos e já causassem difi-
culdades para a criança.
Tem-se visto que em algumas crianças com TDAH, os sintomas apa-
recem após os sete anos, apresentando tantas dificuldades quanto as
criança que começaram a tê-los antes dessa idade. Assim, há uma ten-
dência mais moderna de entender o limite de início dos sintomas um
pouco mais tarde até por volta dos 12 anos. Se um adolescente que nun-
ca teve sintomas de desatenção, hiperatividade ou impulsividade apre-
sentar esses sintomas após a puberdade, é quase certo que a causa não
é TDAH. A causa pode ser um outro problema de saúde mental, ou pelos
mesmos conflitos emocionais próprios da adolescência ou do relaciona-
mento familiar. Desatenção, hiperatividade e impulsividade podem ser a
via final de muitas outras coisas.
O QUE É DISLEXIA?
A dislexia, palavra de origem grega, é definida como uma dificuldade rela-
cionada à aquisição e ao desenvolvimento da leitura. Atualmente, o senti-
do é mais abrangente, pois considera-se a dislexia como sendo a dificulda-
de relacionada, também, à escrita.
COMO SE CARACTERIZA A DISLEXIA?
Trata-se de uma dificuldade específica que a criança apresenta, para
perceber e decodificar as palavras de maneira adequada.
Essa dificuldade é de origem constitucional, inesperada para a idade
e para as condições da criança; compromete o aprendizado da leitura, da
escrita e do soletrar.
COMO SE PERCEBE A EXISTÊNCIA DA DISLEXIA?
As crianças disléxicas apresentam a leitura lenta, trabalhosa, palavra por
palavra, e isso interfere na compreensão do texto lido. Além disso, as
distorções que aparecem na escrita reforçam o diagnóstico. A criança é
considerada disléxica quando todas essas dificuldades que apresenta já
deveriam ter sido superadas para a sua idade.
40. 40 PEDAGOGIA
A DISLEXIA É DISFUNÇÃO FREQUENTE?
Existem várias estatísticas, de autores estrangeiros, que apontam para
uma freqüência, variando em torno de 10% da população na idade es-
colar. Embora não tenhamos dados estatísticos consistentes no nosso
meio, calculamos que a porcentagem de disléxicos esteja nesse mes-
mo patamar, com agravante do número de analfabetos ainda ser muito
grande.
Isso significa que, entre os 14% oficialmente declarados de analfabe-
tos, deve haver um número não desprezível de disléxicos.
A DISLEXIA SE MANI FESTA EM AMBOS OS SEXOS?
Os dados mostram que a dislexia aparece predominantemente no sexo
masculino, na razão de 2-3: 1.
EXISTEM TIPOS DIFERENTES DE DISLEXIA?
Podemos citar, de uma maneira simples, três tipos de dificuldades que
definem a dislexia:
¡ Falha no estabelecimento da relação som-símbolo gráfico. No caso,
há uma provável disfunção da discriminação auditiva.
¡ Falha na discriminação visual que acarretará as inversões, rotações e
confusões das letras com grafia semelhante.
¡ Associação das duas anteriores. Para exemplificar o que foi citado:
Grafia semelhante: b/d, p/q;
Sons semelhantes: d/t, v/f.
Inversão: sapato/satapo, par/pra.
Adição: casa/casca, mal/male.
Supressão: branco/banco, carro/ caro
Espelho: tio/oit, sol/los.
Repetição: caramemelo, bananana
O QUE É DISLEXIA DE EVOLUÇÃO?
Também denominada dislexia de desenvolvimento, é a dificuldade que
a criança apresenta para ler, a qual está, especificamente, relacionada à
imaturidade neurológica e que tende a ser, lentamente, superada com o
41. Alfabetização | unidade 4 41
desenvolvimento da criança. É o tipo de leitura apresentado pelas crian-
ças, na fase inicial do aprendizado.
COMO SE PERCEBE SE A DISLEXIA É DE EVOLUÇÃO?
Quando as crianças lêem, nota-se que a leitura é lenta, hesitante, com
omissões, substituições, adivinhações e erros. Devemos estar cientes
que este é um quadro transitório, o qual deverá ser superado em pouco
tempo e essa dislexia desaparece. Todo o processo evolutivo necessita
de um período de tempo determinado a fim de se desenvolver, aperfei-
çoar e atingir a maturidade para o desempenho pleno da função.
HÁ REPERCUSSÕES, TAMBÉM NA ESCRITA, NOS
CASOS DE DISLEXIA DE EVOLUÇÃO?
esse caso encontramos comprometimento da escrita caracterizado por
inversões de letras, inserções de letras, omissões, alterações na ordem
das letras. A essas alterações que se manifestam na escrita denomina-
mos disortografia. Da mesma forma como em relação à leitura, a ten-
dência é a superação dessa dificuldade com o desenvolvimento e a ma-
turação neurológica da criança.
A DISLEXIA DE EVOLUÇÃO NECESSITA DE ALGUM
TRATAMENTO ESPECÍFICO?
Como é um quadro transitório e que tende a ser superado em curto
espaço de tempo, não se recomenda um tratamento específico inicial;
deve-se dispensar uma especial atenção para que essa situação não se
prolongue para não retardar o aprendizado, pois isso pode ser um fator
de desencorajamento à criança para a leitura e escrita.
Devemos, ainda, lembrar-nos que a dislexia de evolução está relacio-
nada ao processo de desenvolvimento neurológico, portanto, o desapa-
recimento do quadro necessita de um determinado período de tempo
estabelecido para a devida maturação cerebral. Assim, a compreensão e
a paciência dos circunstantes são necessárias e importantes.
A DISLEXIA PODE SER UM QUADRO PERMANENTE?
A dislexia denominada específica é um quadro geneticamente determi-
nado, portanto, é um quadro definitivo. Nesse caso, o indivíduo deverá
conviver com essas dificuldades, pois não serão superadas nem mesmo
42. 42 PEDAGOGIA
na adultidade, e isso significa que não tem cura. Atualmente, existem
alguns artifícios que são utilizados para contornar essas dificuldades,
tornando-as menos aparentes, podendo citar, no caso, os recursos da
informática.
QUAIS SÃO AS CARACTERÍSTICAS PERCEBIDAS NA
ESCRITA DO PACIENTE DISLÉXICO?
Muitos apresentam as letras com o traçado incorreto, erros ortográficos,
sentenças incompletas, erros gramaticais; denotam, ainda, dificuldades
para copiar do quadro negro ou de um livro, além da escrita ser lenta.
A DISLEXIA É UM QUADRO FAMILIAR?
Ao se analisar, criteriosamente, os antecedentes familiares, poderemos
encontrar, não raramente, em outros parentes próximos (pais, avós, ir-
mãos, tios), quadros que se assemelham, embora tais achados não se-
jam obrigatórios.
EXISTE ALGUMA COMPROVAÇÃO GENÉTICA
RELACIONADA À DISLEXIA?
Foram feitas, e ainda estão em andamento, várias pesquisas a respeito
da relação da dislexia com as alterações genéticas. Já existem algumas
publicações citando a dislexia como sendo determinada por alterações
nos cromossomos 2, 6 e 15.
A DISLEXIA INTERFERE NA COMPREENSÃO DE
TEXTOS?
O disléxico apresenta uma série de razões que podem interferir na in-
terpretação dos textos, pois a leitura é lenta, fragmentada, monótona,
hesitante e com troca de fonemas; esse conjunto de dificuldades atra-
palhará a interpretação do texto lido. Quando o individuo lê, existe uma
preocupação que é dirigida à decodificação, para que a leitura seja cor-
reta; essa preocupação acaba prejudicando a interpretação da parte
global do texto, pois dispersa o leitor do conteúdo, dificultando a com-
preensão, portanto ele não consegue assimilar o sentido do que foi lido.
Além disso, o disléxico dispersa-se com muita freqüência, fato este que
acaba dificultando, ainda mais, a capacidade para memorização duran-
te a leitura. Como resultado final dessas dificuldades, teremos um texto
43. Alfabetização | unidade 4 43
mal lido, mal interpretado, mal armazenado na memória e, portanto, mal
aproveitado.
O DISLÉXICO APRESENTA DIFICULDADES PARA
ARITMÉTICA?
Em algumas ocasiões a criança disléxica é brilhante em cálculos arit-
méticos, mas necessita que alguém leia textos dos exercícios propostos
pois, se isso não acontecer, os enganos acontecem por erro de interpre-
tação da proposta e não por dificuldade para a elaboração dos cálculos.
Há vezes em que o disléxico pode apresentar, assim como na escrita,
inversões dos números, confusão com os símbolos operacionais (+ e x)
e cópia de modo incorreto; apresenta, ainda, dificuldade para evocar as
seqüências dos números e para memorizar a tabuada.
A ASSOCIAÇÃO DA DISLEXIA COM DIFICULDADES
ARITMÉTICAS É UMA ASSOCIAÇÃO MUITO
FREQUENTE?
Alguns autores afirmam que mais ou menos 2/3 das crianças com disle-
xia apresentam dificuldades para os cálculos aritméticos.
O QUE É DISGRAFIA?
A disgrafia caracteriza-se por uma escrita mal elaborada, feia, não se con-
seguindo, muitas vezes, decifrar o que está escrito. Há vezes que nem
a própria criança consegue entender o que escreveu. Entre os adultos,
a disgrafia é encontrada de modo tradicional, principalmente no meio
médico, pois são poucas as pessoas que conseguem decifrar o que foi
escrito no receituário.
EXISTE ALGUMA RELAÇÃO ENTRE A DISLEXIA E O
ATRASO NO DESENVOLVIMENTO DA FALA?
As crianças que apresentam defasagem na aquisição e no desenvolvi-
mento da fala poderão, na fase de alfabetização, apresentar algumas
dificuldades transitórias no aprendizado da escrita e leitura. Deve-se
salientar que esse quadro não está, necessariamente, relacionado à dis-
lexia.
44. 44 PEDAGOGIA
OS DISLÉXICOS APRESENTAM ALTERAÇÕES
COMPORTAMENTAIS ASSOCIADAS?
Considerando-se as dificuldades relacionadas à dislexia, a criança per-
cebe que a sua vida se torna um tanto penosa, complicada, seja na es-
cola ou em casa. Enquanto as reais dificuldades não são detectadas, o
disléxico vive sob pressão constante, pois as cobranças em relação aos
resultados são freqüentes, tanto pelos pais quanto pelos professores; é
essa dinâmica complicada o fator que determina uma sobrecarga emo-
cional acentuada. Portanto, com a sua saúde emocional comprometida,
afloram os distúrbios comportamentais.
O QUE É DISLALIA?
Trata-se de uma alteração da fala caracterizada por troca, omissão e
substituição de fonemas (som das letras). A dislalia é um quadro consi-
derado normal no desenvolvimento da criança e que deve ser superado
até os 4 anos de idade. Havendo persistência da dislalia após essa idade,
a criança deverá ser encaminhada para orientação e tratamento espe-
cializado para que haja interferência no seu processo de alfabetização.
Há ocasiões em que a dislalia é estimulada pelos pais, babás e parentes,
pois acham graça no modo como a criança fala e, muitas vezes, usam a
mesma maneira da fala, o que é um grande desserviço para o aprendi-
zado da criança.
AS DIFICULDADES ESCOLARES PODEM ESTAR
RELACIONADAS SOMENTE AO APRENDIZADO DA
ARITMÉTICA?
Há um número considerável de crianças que apresenta dificuldades
para cálculos, devido a problemas de percepção espacial da seqüên-
cia dos números, dificuldades para conhecer os símbolos aritméticos e
inabilidade em lidar com a linguagem lógica para realizar as operações
simples de somar, subtrair, multiplicar ou dividir. Muitas crianças apre-
sentam dificuldades para memorizar a tabuada e isso causa transtornos
para a execução dos cálculos.
45. Alfabetização | unidade 4 45
ATIVIDADES
Em sua prática educativa ou no dia-a-dia, é comum encontrar
dificuldades de aprendizagem ? Caracterize-as.
O Transtorno Déficit de Atenção com Hiperatividade(TDAH)
é um transtorno neurobiológico, inicialmente vinculado a
uma lesão cerebral mínima. Como você trabalharia com uma
criança em sala de aula que necessita ser incluída no processo
pedagógico?
46.
47. 47
Azevedo Ricardo. Revista Nova Escola, São Paulo, Fundação Victor Civita,
n. 100, março de 1997.
Barbosa, José Juvêncio. Alfabetização e leitura.2ª ed. Revista, Cortez,
1994.
Ferreiro, Emília. Reflexões sobre alfabetização. 2ª ed. Coleção: Polêmi-
cas do nosso tempo. São Paulo: Cortez, 1985.
_______________. Com todas as letras. 2ª ed. São Paulo: Cortez, 1993.
Grossi, Esther Pillar. Didática da alfabetização. Vol. I. Didática do nível
pré-silábico. 2ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1990.
_________________. Didática da alfabetização. Vol. II. Didática do ní-
vel silábico. 4ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
_________________. Didática da alfabetização. Vol. III. Didática do ní-
vel alfabético. 3ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991.
Gadotti, Moacir. Convite a leitura de Paulo Freire. Scipione, 1989.
Kaufman, Ana Maria. A leitura, a escrita e a escola: uma experiência
construtivista. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.
Russo, Maria de Fátima / AGUIAR VIAM, Maria Inês. Alfabetização. 2ª ed.
São Paulo: Saraiva, 1995.
Ronde, Luis Augusto P. Transtorno de déficit de atenção/hiperativida-
de: o que é? Como ajudar? Porto Alegre: Artemed, 1999.
Soares, Magda. Alfabetização e letramento. 2ª ed- São Paulo: Contex-
to, 2004.
REFERÊNCIAS
48. Teberosky, Ana / Colomer,Teresa. Aprender a ler e a escrever: uma pro-
posta construtivista. Porto Alegre: Artmed, 2003.
Topczewski Abram. Aprendizagem e suas desabilidades, como lidar?
São Paulo: Casa do Psicólogo, 2000.
51. Alfabetização | anexos 51
TEXTO 1
O GAROTINHO
Uma vez um garotinho foi para a Escola. Ele era bem garotinho e a es-
cola era bem grande. Mas, quando o garotinho viu que podia ir para a
sua sala, caminhando diretamente da porta lá de fora, ele ficou feliz e a
escola não parecia tão grande assim.
Numa manhã, quando o garotinho estava a pouco tempo na escola,
a professora disse:
— Hoje nós vamos fazer um desenho!
— Que bom! Pensou o garotinho.
Ele gostava de desenhar. Ele podia fazer todas as coisas: leões e tigres,
galinhas e vacas, trens e barcos...Pegou sua caixa de lápis e começou a
desenhar. Mas a professora disse:
— Esperem!
— Não é hora de começar!
Ele esperou até que todos estivessem prontos.
— Agora, disse a professora, nós vamos desenhar flores.
Bom! Pensou o garotinho.
Ele gostava de desenhar flores. E começou a fazer bonitas flores com
lápis rosa, laranja e azul. Mas a professora disse:
— Esperem!
— Eu mostrarei como se faz.
Assim disse a professora.
— Agora vocês podem começar.
O garotinho olhou a flor da professora e então olhou a sua. Ele gostava
mais da sua flor do que a da professora. Mas ele não revelou isto. Era
vermelha, com haste verde. Outro dia, quando o garotinho abria a porta
lá de fora, a professora disse:
— Hoje nós vamos trabalhar com argila.
— Bom! Pensou o garotinho.
Ele podia fazer todos os tipos de coisas com argila: cobras e bonecos de
neve, elefantes e ratos, carros e caminhões...E começou a puxar e amas-
sar a bola de argila. Mas a professora disse:
— Esperem, não é hora de começar.
— Agora, disse a professora, nós vamos fazer uma travessa.
— Bom! Pensou o garotinho.
52. 52 PEDAGOGIA
Ele gostava de fazer travessas, e começou a fazer algumas de diferentes
tamanhos e formas, mas a professora disse:
— Esperem e eu lhes mostrarei como fazer uma travessa funda!
— Assim! Agora podem começar.
O garotinho olhou para a travessa da professora e então olhou para as
suas. Ele gostava mais das suas. Mas não revelou isso. Ele apenas amas-
sou sua argila, numa grande bola e fez uma travessa como a da profes-
sora, que era uma travessa funda.
E logo, o garotinho aprendeu a esperar, e a observar, e a fazer coisas
como a professora, e logo, ele não fazia as coisas por si mesmo.
Então aconteceu que o garotinho e sua família mudaram para ou-
tra casa, numa outra cidade, e o garotinho teve que ir para outra escola.
Uma escola que era ainda maior do que a primeira. Não havia porta lá
fora para a sua sala. Ele tinha que subir alguns degraus e seguir por um
corredor comprido para chegar à sua sala.
E justamente no primeiro dia que ele estava lá, a professora disse:
— Hoje nós vamos fazer desenhos.
— Bom! Pensou o garotinho.
Esperou pela professora para dizer-lhe o que fazer, mas ela não disse
nada. Apenas andou pela sala. Quando aproximou-se do garotinho ela
disse:
— Você não quer desenhar?
— Sim, disse o garotinho!
— Mas o que vamos fazer? Ele disse.
— Eu não sei até que você faça, disse a professora.
— Como eu farei? Perguntou o menino.
— Porque? Do jeito que você quiser, respondeu a professora.
— E de que cor?
— De qualquer cor. Se todos fizessem o mesmo desenho e usassem
a mesma cor, como eu poderia saber quem fez o quê, e qual era
qual?
— Eu não sei, disse o garotinho.
— E ele começou a fazer uma flor vermelha com haste verde.
Pensamento criativo e mente aberta pode gerar produtividade e pro-
gresso em todas as áreas: familiar, profissional, social e cultural.
Abrir espaço para que as pessoas possam apresentar suas idéias é a
liberdade e a oportunidade de poder transformar, inovar e renovar, incre-
mentar, aperfeiçoar, criar, crescer, amadurecer e interagir.
O diálogo, a escuta e o consenso são ferramentas fundamentais em
toda e qualquer área. Saber até onde pode ir, ter conhecimento das limi-
tações, é importante; mas saber das possibilidades, também.
Texto de Helen E.Buckley
53. Alfabetização | anexos 53
TEXTO 2
APRENDIZADO DEVE COMEÇAR A PARTIR DO NASCIMENTO.
Pesquisas recentes sobre o cérebro infantil demonstram a
necessidade de estimular as crianças para aproveitar mais
a capacidade que elas têm de aprender já com poucos dias
Daniela Falcão, especial para a Folha, de Nova York
Há 20 anos, o cérebro de uma criança de cinco anos que ia à escola pela
primeira vez era visto como uma fita semivirgem que registraria tudo o
que fosse ensinado por pais e professores.
Entretanto, descobertas feitas sobre o desenvolvimento do cérebro
com a ajuda de “scanners” -aparelhos que captam imagens do interior
do corpo humano em funcionamento- provocaram uma revolução nas
pesquisas sobre o processo de aprendizado.
As duas descobertas mais importantes revelam que o cérebro usa o
mundo exterior para se moldar e que existem períodos críticos em que as
células cerebrais (os neurônios) precisam de determinados estímulos para
desenvolver habilidades como visão, coordenação motora ou linguagem.
Esses períodos ganharam o nome de “janelas de oportunidade” e
vão do nascimento até por volta dos 12 anos de idade.
Ainda há discordância entre os cientistas quanto à idade em que as
janelas se fecham, mas todos são unânimes em afirmar que a maior parte
delas se abre nos primeiros meses de vida.
Hoje, sabe-se que, ao entrar na pré-escola, metade do processo de
desenvolvimento do cérebro da criança já está concluído. As experiên-
cias vividas pelo bebê, do nascimento aos seis anos, determinarão em
grande parte seu futuro emocional e intelectual.
A outra parte desse futuro é determinada pela carga genética, que as
crianças herdam de seus pais.
Os genes são responsáveis pela estrutura do cérebro, enquanto o
ambiente torna-se determinante para seu funcionamento.
Para o neuropediatra Harry Chugani, da Universidade de Michigan
e um dos maiores especialistas em pesquisa cerebral nos EUA, genes e
ambiente interagem na formação do cérebro infantil “como bailarinos e
música se misturam durante uma dança”.
Década da pesquisa cerebral
Nos últimos anos, houve tantas descobertas sobre o desenvolvimento
do cérebro que os anos 90 estão sendo conhecidos como “a década da
pesquisa cerebral”.
54. 54 PEDAGOGIA
Até o fim da década de 70, antes da introdução dos “scanners”, só
era possível pesquisar o cérebro de pessoas mortas. Graças aos avanços
da biologia molecular e a equipamentos de última geração, cientistas já
conseguem acompanhar o desenvolvimento do cérebro mês a mês e até
contar neurônios.
Esses avanços na pesquisa mostraram que, ao nascer, o cérebro do
bebê já vem equipado com cerca de 100 bilhões de neurônios, que serão
usados ao longo da vida.
A maior diferença entre o cérebro do recém-nascido e o do adulto
é que, logo após o nascimento, os neurônios do cérebro do bebê ainda
não estão conectados.
O início da produção de sinapses -conexões entre os neurônios- vão
permitirqueacriançapenseeaprenda.Aonascer,elassãosuficientesape-
nas para controlar a respiração, o batimento cardíaco e a temperatura.
Aos três anos, ocorrem cerca de 1 trilhão de sinapses, número que se
manterá estável até os dez anos. A partir daí, em seu esforço de autocon-
servação, o cérebro passa a eliminar as conexões que não são utilizadas
com frequência.
Por isso, insistem os cientistas, é tão importante aproveitar as“jane-
las de oportunidade”, oferecendo estímulos para que o bebê desenvolva
o maior número de conexões possível. Uma criança que cresce em um
ambiente em que os adultos não conversam nem lêem para ela poderá
ter dificuldades no futuro.
Da mesma maneira, se o cérebro não for exposto a estímulos visuais
nos primeiros meses de vida, o bebê terá limitada sua visão, mesmo que
seus olhos não apresentem nenhum problema físico.
O aprendizado de línguas é outro exemplo. Ao nascer, os bebês têm
o potencial de aprender a falar qualquer língua sem sotaque.
Mas, se não conviver com os sons de outras línguas até os cinco anos
de idade, as chances de que a criança fale sem sotaque diminuem pro-
gressivamente até chegar aos dez anos, quando o esforço para aprender
um idioma estrangeiro será muito maior
Não há milagres... Embora a estimulação precoce altere a maneira e o
grau de facilidade com que a criança aprende, neuropediatras advertem
que não se pode querer milagres.
Não há comprovação, por exemplo, de que as experiências vividas
pela criança ou os estímulos que ela recebe possam alterar de forma
significativa seu QI (quociente intelectual, uma das técnicas usadas para
medir a inteligência).
Mas um ambiente estimulante pode ser decisivo na capacidade da
criança de tocar instrumentos, entender conceitos de geometria espa-
cial, ser criativa ou ter um discurso articulado.
Folha de São Paulo,1998
55. Alfabetização | anexos 55
TEXTO 3
O HOMEM QUE NÃO SABIA NEM LER
Um menino andando na rua, encontrou um homem sentado na calçada.
O menino ia da escola para casa. O homem descansava, depois de
um dia duro de trabalho.
— Moço, que horas são ?, perguntou o menino.
O homem disse que não tinha relógio e, para falar a verdade, nem
sabia ver as horas.
O menino não entendeu.
O homem explicou:
— Não sei para que servem aquele ponteirão e aquele ponteirinho.
Eles giram, giram e giram, mas não consigo entender direito
como a coisa funciona.
— Mas é tão fácil!, espantou-se o menino. O ponteirinho marca as
horas e o ponteirão marca os minutos. Por exemplo: se o pontei-
rinho está no dez e ponteirão está no cinco, isso quer dizer que
são 10 horas e 25 minutos.
O sujeito balançou os ombros.
— Mas qual é o dez e qual é o cinco? Não sei ler os números.
O homem tinha a idade para ser pai do menino.
— O senhor não conhece os números?
— Nem os números, nem as letras.
— O senhor não sabe ler?
— Nem ler, nem escrever.
O menino espiou aquela pessoa sentada na calçada.
— Às vezes, na rua, disse o homem, olhando as letras dos cartazes,
eu pergunto: o que será que elas dizem ? Outras vezes, na banca,
fico admirando as revistas, os jornais... queria tanto poder ler as
notícias, entender o que se passa no mundo, ler os letreiros dos
ônibus e saber para onde eles vão...
O homem suspirou.
— Queria tanto ir para baixo de uma árvore, abrir um livro e ler uma
história.
Um automóvel entrou na curva soltando uma fumaça preta.
— Eu não sou daqui, continuou o sujeito. Minha cidade fica depois
da serra, pegando a estrada, passando à outra serra e depois a
outra, lá longe, perto do mar.
56. 56 PEDAGOGIA
E seus olhos brilharam tristes.
— Às vezes, fico me lembrando de casa, de minha mãe, meu pai,
meus irmãos...
O menino procurou um lugar para sentar.
— Você sabe escrever?, quis saber o homem.
O menino estufou o peito:
— Já sou quase da terceira série!
O outro sorriu:
— Tenho uma noiva lá na minha terra. Ela é uma princesa. A coisa
mais linda do mundo. Um dia a gente vai se casar...
Examinou o menino:
— Escreve uma carta pra mim?
Dizendo sim com a cabeça, o menino tirou um caderno e uma cane-
ta esferográfica do fundo da mochila.
O homem foi falando. O vento soprava morno. O homem contou
que a cidade era grande. Contou que estava sozinho. Contou que sentia
medo. Contou que quase tinha juntado um dinheirinho, que estava mor-
to de saudade e que no fim do ano, se Deus ajudasse, pegava o ônibus e
voltava para casa.
O menino escreveu tudo com letra caprichada, dobrou o papel e en-
tregou ao homem.
A Lua havia surgido sem ninguém perceber.
O menino precisava ir embora.
O homem apertou a mão do menino.
Ricardo Azevedo.
Revista Nova Escola,São Paulo,
Fundação Victor Civita,n.100,março de 1997.
57. Alfabetização | anexos 57
TEXTO 4
Emília Ferreiro, psicóloga e pesquisadora argentina, radicada no Méxi-
co, fez seu doutorado na Universidade de Genebra, sob a orientação de
Jean Piaget.
Na Universidade de Buenos Aires, a partir de 1974, como docente,
iniciou seus trabalhos experimentais, que deram origem aos pressupos-
tos teóricos sobre a Psicogênese do Sistema de Escrita, campo não estu-
dado por seu mestre, que veio a tornar-se um marco na transformação
do conceito de aprendizagem da escrita, pela criança. Autora de várias
obras, muitas traduzidas e publicadas em português, já esteve algumas
vezes no país, participando de congressos e seminários. Falar de alfabe-
tização, sem abordar pelo menos alguns aspectos da obra de Emilia Fer-
reiro, é praticamente impossível. Ela não criou um método de alfabeti-
zação, como ouvimos muitas escolas erroneamente apregoarem, e sim,
procurou observar como se realiza a construção da linguagem escrita na
criança. Os resultados de suas pesquisas permitem, isso sim, que, conhe-
cendo a maneira com que a criança concebe o processo de escrita, as
teorias pedagógicas e metodológicas, nos apontem caminhos, a fim de
que os erros mais freqüentes daqueles que alfabetizam possam ser evita-
dos, desmistificando certos mitos vigentes em nossas escolas.
Aqueles que são, ou foram alfabetizadores, com certeza, já se depa-
raram com certos professores que logo ao primeiro mês de aula estão
dizendo, a respeito de alguns alunos: não tem prontidão para aprender,
tem problemas familiares, é muito fraca da cabeça, não fez uma boa pré-
escola, não tem maturidade para aprender e tantos outros comentários
assemelhados. Outras vezes, culpam-se os próprios educadores, os mé-
todos ou o material didático. Com seus estudos, Ferreiro desloca a ques-
tão para outro campo:“ Qual a natureza da relação entre o real e sua re-
presentação? “ As respostas encontradas a esse questionamento levam,
pode-se dizer, a uma revolução conceitual da alfabetização.
A escrita da criança não resulta de simples cópia de um modelo ex-
terno, mas é um processo de construção pessoal. Emilia Ferreiro percebe
que, de fato, as crianças reinventam a escrita, no sentido de que inicial-
mente precisam compreender seu processo de construção e suas nor-
mas de produção.
Site: http//www.centrorefeducacional.com.br
58. 58 PEDAGOGIA
TEXTO 5
A HISTÓRIA DE PEDRO
Como explicar para o seu filho o Transtorno de Déficit de Atenção/Hipe-
ratividade?
1. Meu nome é Pedro e vou contar a minha história para você.
Quase nunca me sinto cansado... O mundo é muito grande e tem
muita coisa para descobrir, mas tenho que ir a escola. Lá tenho que
fazer coisas que, às vezes, não estou nem um pouco a fim. Prefiro
brincar no pátio ou na quadra.
2. Ninguém acredita, mas bem que eu quero e tento fazer as lições
bem caprichadas, mas acontece tanta coisa... De repente meu ami-
go conversa comigo, ou um carro buzina lá fora, ou até se eu escuto
alguém conversar, um lápis caindo no chão, eu me distraio e me
perco. Quando olho de novo para a lousa, demoro para achar onde
parei, confundo tudo e aí, todos já acabaram a tarefa, só eu que não.
Fico muito chateado... De novo não consegui.
A professora sempre fala: - Pedro, você já terminou sua lição? Eu pre-
ciso apagar a lousa!
3. Quase nunca presto atenção ao que minha professora diz, nem às
lições. A professora sempre pede que eu seja mais organizado com
meu material e mais caprichoso com as lições.
Na verdade, concordo que me mexo muito, levanto da cadeira a
toda hora, faço barulho com o lápis e às vezes até com a boca (uns
barulhos que só eu sei fazer), falo muito e atrapalho a professora.
São dois grandes problemas: eu faço malfeito, pois quero acabar
muito depressa, ou então quero fazer tudo muito bem feito e termi-
nar tudo, mas... não consigo! Aí todos pensam que sou preguiçoso,
relaxado e vagabundo, ou ainda que sou bobo e não me esforço.
4. Parece que ninguém me entende. Por mais que eu tente, não consi-
go prestar atenção e terminar toda a tarefa tão bem como as outras
crianças.
Mas bem que eu gostaria... De verdade! Na classe, quando o assun-
to é lição, as crianças tiram sarro de mim, fazem muitas gozações.
Eles me chamam de“minhoca”e de“super tartaruga lerdinha”.Todos
acham engraçado, menos eu.
5. Quando estou sentado, ali, sozinho, sem perceber, começo a mor-
der o lápis, desmontar meu estojo, rabiscar as folhas no caderno e
59. Alfabetização | anexos 59
a mexer com os pés sem parar. Acho que preciso me movimentar
mais do que os meus colegas porque assim me sinto mais ligado e
esperto. Estou sempre mexendo minhas mãos e balançando os pés.
A professora vive me dizendo que parece que tenho o bicho- car-
pinteiro no corpo. Ela pergunta também se tem formiga ou prego
na cadeira, porque não tenho parada nem sossego.
6. Percebo que, quando a professora pergunta alguma coisa para mim,
respondo rapidinho. Muitas vezes começo a responder antes de ou-
vir a pergunta inteira. Só quando estou falando é que me dou conta
de que não era nada daquilo...
E quando se trata de escrever... Hum! É tão mais complicado... Eu
bem que gostaria não precisar escrever tanto.
7. Sabe, acho bem mais interessante ver o que está se passando fora da
sala de aula. Pela janela, vejo a árvore a balançar, o passarinho voar; e,
pela porta, sempre vejo quem passa no corredor.
Fico triste, irritado e confuso porque sei que as pessoas ficam cansa-
das de mim. Outro dia vi minha mãe chorando. Também ouvi meus
pais brigando por minha causa. A professora vive mandando bilhetes
para a minha mãe. Ela avisou que minhas notas estão ruins, que assim
não vou passar de ano e que não sabe mais o que fazer comigo. Além
do mais, falou que sou distraído, que caminho pela escola sem olhar
por onde ando, diz que derrubo com facilidade as coisas da minha
mão. Ela diz que parece que estou sempre voando, como se eu esti-
vesse no mundo da lua. Muitas vezes me chama de“rei do espaço”.
8. Fico triste. Às vezes tento disfarçar, finjo que não ligo, mas não é
verdade. Queria que todos dissessem: - Olha, o Pedro foi o melhor!
Ah! Como eu gostaria que a minha tarefa fosse realmente a melhor.
9. Lá em casa não é muito diferente da escola. Sempre me meto em con-
fusão. Tudo o que acontece de errado pensam que fui eu. Outro dia
mesmo, meu pai perguntou quem tinha quebrado o vidro da janela.
Respondi que não sabia e que não tinha sido eu. Mas eu sabia que
não era verdade. É que eu estava jogando bola e não pensei que ia
dar um chute tão forte. Aí quebrei o vidro da janela. Sei que não sou
tão cuidadoso como deveria ser. Muitas vezes faço coisas sem pensar.
Quando percebo... já fiz!Também não falo a verdade porque tenho
medo de que meus pais briguem comigo. Só que isso é um grande
erro, porque, quando descobrem... É horrível, quero sumir!
10. E na hora de fazer a lição de casa, então? É um verdadeiro terremo-
to. Minha mãe começa a me lembrar da lição, eu enrolo, falo daqui
a pouco eu faço, daí enrolo mais um pouquinho e vou arrumando
mil desculpas para não fazer a lição. Aí, sabe o que acontece? Minha
60. 60 PEDAGOGIA
mãe fica muito brava, irritada e perde a paciência. Algumas vezes
minha mãe chegou até a terminar a lição para mim. Mas todas as
vezes a professora percebeu. Que vergonha!
11. Um mês atrás, a professora chamou minha mãe de novo à escola e
pediu que ela me levasse a um psicólogo. Explicou que seria bom
e que ele poderia nos ajudar nessa dificuldade. No começo eu não
queria ir porque fiquei com medo de que os colegas de aula soubes-
sem e começassem a me chamar de louco, e aí tudo ficaria pior. Eles
já me chamam de tanta coisa! Não queria ter mais um apelido!
Mas eu não tive saída. Chegando lá, encontrei um psicólogo muito
legal. Ele conversou comigo e parece que me entendeu e me expli-
cou também que conhecia uma porção de crianças parecidas co-
migo. Confesso que fiquei mais tranqüilo. Ele pediu que eu fizesse
uns desenhos, contasse umas histórias, tive que fazer também uns
problemas de matemática, quebra-cabeça e outras coisas legais.
12. Então... Num outro dia, o psicólogo chamou meus pais e falou que
eles deveriam me levar a um outro médico especial que trabalha
com crianças que têm dificuldade para prestar atenção.
Fiquei pensando: - Será que estou doente? E se esse médico me der
injeções?
Mas... de novo não tive saída. O médico também era legal! Pergun-
tou-me tanta coisa! Até me cansei! Ele queria saber da minha escola,
dos meus amigos, da minha família e porque era tão difícil para mim
terminar as lições. Ele pediu que eu fizesse uns testes de atenção e
alguns desenhos. Falou o mesmo que o psicólogo. Eles explicaram
que eu tinha um problema de atenção que se chama Transtorno
de Déficit de Atenção-TDAH. Nossa, que nome comprido! Falaram
também que quem tem isso nada tem de louco ou de burro; apenas
tem dificuldade de prestar atenção e de parar quieto!
13. Aliás, o médico e o psicólogo falaram que sou um garoto muito
inteligente e esperto. Eu gostaria tanto que os meus amigos da es-
cola tivessem ouvido isso! O médico explicou que eu e meus pais
precisamos continuar conversando para sabermos como levar a
nossa vida de maneira mais tranqüila, e nos explicou também que
muitas crianças precisam tomar remédio para ajuda-las a prestar
atenção! Meus pais ficaram assustados. Gostariam que eu não pre-
cisasse disso.
O médico falou também que ele, o psicólogo, a professora, minha
família e eu trabalharíamos em equipe, todos juntos, e cada um te-
ria que fazer sua parte.
E ainda nos alertou que era muito importante que meus pais e meus
professores entendessem o que estava acontecendo comigo.
61. Alfabetização | anexos 61
14. Continuo sendo acompanhado pelo médico e pelo psicólogo. Te-
nho aprendido muita coisa, principalmente a lidar com o meu jeito
distraído e desajeitado de ser. Descobri também que as pessoas po-
dem ser muito boas em alguma coisa, muito ruins em outras, mas,
na maioria das vezes, elas são mais ou menos.
Agora sei que também tenho coisas boas.
Minha equipe (médico e psicólogo) está sempre em contato com
minha escola. Eles conversam sobre a melhor maneira de minha fa-
mília e a professora agirem comigo para me ajudar nas dificuldades.
Tenho que fazer minha parte. Sei que posso melhorar.
15. Eu e minha professora temos que cumprir algumas regras, como se
fosse um jogo.
Olhe só:
¡ Minha professora deve elogiar meus progressos e minhas habili-
dades.
¡ Eu devo me esforçar para não falar a toda hora e nem me levantar
da cadeira o tempo todo.
¡ Minha professora me deixa sair e dar uma volta fora da sala de
aula quando estou me sentindo muito inquieto. Sei que vou per-
der parte da aula e procuro sair cada vez menos.
¡ Faço minhas lições por partes, até que tudo esteja pronto. Para
isso , preciso muito da ajuda de minha professora.
¡ Devo fazer a lição do melhor modo que puder, naquele momento.
16. A professora está me entendendo mais e tem se esforçado para ir
passando as atividades passo a passo e sem muita pressa, come-
çando da lição mais fácil para a mais difícil. Além disso, quando a
atividade é muito demorada e desinteressante, ela vai alternando
com atividades mais rápidas e legais. Ela já não fica mais com tanta
pressa para passar as lições na lousa; vai colocando-as por partes.
Assim, não fico tão afobado, perdido e confuso. Todos os dias a pro-
fessora manda anotações para os meus pais me lembrarem do que
eu devo fazer. Estou deixando todo o material de que preciso no
armário da escola. Assim, quando eu precisar de um deles, já está lá.
E não corro o risco de me esquecer.
17. Em casa as coisas também melhoraram. Minha mãe combinou co-
migo para eu fazer a lição todos os dias, no mesmo horário. Com
isso ainda sobra tempo para brincar. Não quero nem me lembrar
dos terremotos em casa quando tinha que fazer a lição.
Meus pais fizeram um trato comigo:
¡ Devo ouvir o que eles me dizem logo na primeira vez. Não devo
deixá-los repetir a mesma coisa várias vezes.
¡ Ser mais obediente.
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¡ Não contar mentiras.
¡ Fazer as lições na hora combinada.
E o que eles têm que fazer é me deixar assistir TV, brincar no com-
putador e no videogame, ir a casa do meu amigo, nadar e andar de
bicicleta. Mas, se eu não cumprir as regras, não posso fazer essas
coisas de que eu gosto muito.
18. Vou contar um segredinho:
Muitas vezes quando me meto em confusão e encrencas, quero fa-
lar que é porque eu tenho TDAH. Mas meu pai e minha mãe me
explicam que eu não posso ficar usando o TDAH como desculpa e
permissão para tudo que eu faço de errado, porque nem tudo que
eu faço é por causa do TDAH.
Porém, eles sabem como é difícil para mim, às vezes, me comportar
como deveria. Outra coisa que eu acho chato é ter que tomar remé-
dio todos os dias, de manhã após o café e ao meio-dia após o almo-
ço. Mas sinto que o remédio me ajuda a prestar mais atenção na es-
cola e em casa. Penso mais antes de fazer as coisas. Meu psicólogo e
meu médico me explicaram que se eu continuar melhorando, logo
vou poder parar de tomar o remédio!
19. Às vezes fico pensando como é difícil entender por que não con-
sigo prestar atenção e fazer o que preciso, se sou inteligente. Por
que consigo passar horas em frente a TV? Por que consigo jogar no
computador e ainda ganhar do meu amigo?
Eu peço para o meu médico e para o meu psicólogo me explicarem
tudo de novo. Eles me dizem que é como se parte do meu cérebro
que me ajuda a prestar atenção não trabalhasse muito bem, a não
ser que sejam coisas muito, muito interessantes para mim.
20. Meus dias têm sido mais agradáveis. Percebi que minha letra melho-
rou. Já consigo prestar mais atenção. Agora, eu penso mais, antes de
fazer alguma coisa.
Sinto-me melhor, vejo que todos estão me ajudando, minha família,
o médico, o psicólogo, a professora, e eu estou fazendo o melhor
que posso. Às vezes, relaxo um pouco, mas, em seguida, me esforço
e continuo sendo persistente.
Penso sempre que eu quero que aconteça uma coisa: que o tem-
po passe bem, bem depressa para não me lembrar da frase:- Pedro,
você já terminou sua lição? Eu preciso apagar a lousa.
RONDE, Luis Augusto P. Transtorno de déficit de atenção/hiperati-
vidade: o que é? Como ajudar? Porto Alegre: Artemed, 1999.