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Autor: Profa. Adriana Padilha da Rosa
Profa. Lucy Ferreira de Almeida
Colaboradores: Profa. Silmara Machado
Profa. Renata Viana de Barros Thomé
Prof. Nonato Assis de Miranda
Alfabetização e Letramento
Professora conteudista: Lucy Ferreira de Almeida / Adriana Padilha da Rosa
Adriana Padilha da Rosa
Possui graduação em Pedagogia pela Universidade Tuiuti do Paraná (1993) e Mestrado em Administração pela
Universidade Federal de Santa Catarina (2001). Foi aluna especial do Programa de Doutorado em Marketing Global,
FEA/USP. Aluna do Programa de Doutoramento da European University (Lisboa/Portugal).
Atualmente, é professora adjunta e coordenadora do Curso de Pedagogia da Universidade Paulista. Tem experiência
na área de Educação, Administração e Marketing. Atua com os seguintes temas: Alfabetização, Leitura e Escrita,
Magistério Superior, Administração e Marketing de Produtos.
Lucy Ferreira de Almeida
Aluna ouvinte do Mestrado de Psicologia Escolar e do Desenvolvimento pela Universidade de São Paulo – USP.
Formada no curso de Extensão Universitária – O socioconstrutivismo: planejamento e Analisando a sala de aula
pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC). Pós-graduada, lato sensu, em Educação a Distância pela
Universidade Paulista (UNIP). Formou-se em Pedagogia pela Faculdade Teresa Martin (Pinheirense).
É professora do curso de Pedagogia EAD da Universidade Paulista (UNIP). Acumula, ainda, outras atividades.
Atualmente, é professora convidada da Escola Paulista de Negócios UMC, no curso de pós-graduação de Didática e
Metodologia do Ensino Superior. Coordena o setor de Estágio Supervisionado de Educação a Distância da Universidade
Paulista (UNIP). Também é concursada pela prefeitura de São Paulo, onde ministra aulas como professora de Educação
Infantil.
© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou
quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem
permissão escrita da Universidade Paulista.
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
R788a Rosa, Adriana Padilha da
Alfabetização e letramento / Adriana Padilha da Rosa; Lucy
Ferreira de Almeida. - São Paulo: Editora Sol, 2012.
160 p., il.
Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e
Pesquisas da UNIP, Série Didática, ano XVII, n. 2-016/12, ISSN 1517-9230.
1. Pedagogia. 2. Alfabetização. 3. Letramento. I.Título.
CDU 37.01
CENTRO UNIVERSITÁRIO PLANALTO DO DISTRITO FEDERAL – UNIPLAN
Reitoria
Reitor: Prof. Yugo Okida
Vice-Reitor: Prof. Fábio Nogueira Carlucci
Pró-Reitor Acadêmico: Prof. Humberto Venderlino Richter
Pró-Reitor Adminstrativo: Prof. Robson do Nascimento
Sumário
Alfabetização e Letramento
APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................7
INTRODUÇÃO............................................................................................................................................................7
Unidade I
1 O PENSAMENTO DOS PRINCIPAIS REPRESENTANTES DO SOCIOCONSTRUTIVISMO...............9
1.1 Perspectiva histórica...............................................................................................................................9
1.2 Leitura e escrita......................................................................................................................................18
1.3 Jean Piaget...............................................................................................................................................20
1.4 Descobertas feitas a partir das ideias de Piaget.......................................................................27
1.4.1 O desenvolvimento nas demais idades...........................................................................................27
2 A EPISTEMOLOGIA GENÉTICA......................................................................................................................29
2.1 Os esquemas............................................................................................................................................29
2.2 Síntese do pensamento piagetiano............................................................................................... 31
3 LEV SEMËNOVIČ VYGOTSKY.........................................................................................................................32
4 EMÍLIA FERREIRO.............................................................................................................................................34
4.1 Concepções que a criança possui e os níveis conceituais linguísticos...........................37
4.1.1 As fases da escrita infantil...................................................................................................................37
4.1.2 Níveis conceituais linguísticos...........................................................................................................37
Unidade II
5 LER E ESCREVER É MAIS QUE CODIFICAR E DECODIFICAR TEXTOS ............................................49
5.1 O fim das cartilhas em sala de aula...............................................................................................49
5.2 A concepção piagetiana de criança...............................................................................................57
5.3 Comunicação e linguagem................................................................................................................ 61
5.4 Sondagem da escrita infantil .........................................................................................................64
5.5 Ao desenhar, a criança escreve........................................................................................................65
5.6 Concepções que a criança adquire sobre os símbolos linguísticos antes da
alfabetização...................................................................................................................................................68
6 A NOVIDADE NA ALFABETIZAÇÃO COM EMILIA FERREIRO..............................................................71
6.1 A linguagem escrita.............................................................................................................................76
6.2 Textos e Jogos.........................................................................................................................................76
Unidade III
7 O CONHECIMENTO PRÉ-EXISTENTE E O LETRAMENTO.....................................................................85
7.1 Aprendizagem ativa.............................................................................................................................88
7.2 Implicações das práticas para a educação ................................................................................90
7.3 Principais conclusões........................................................................................................................... 91
7.4 As implicações para o ensino...........................................................................................................97
7.5 Tentando ordenar o caos....................................................................................................................99
7.6 Projetando ambientes para a sala de aula................................................................................100
7.7 Padrões significativos de informação.........................................................................................103
7.8 A organização do conhecimento..................................................................................................106
7.9 Contexto e acesso ao conhecimento..........................................................................................107
7.10 A memória imediata........................................................................................................................109
7.11 Os elementos que promovem aprendizagem inicial ..........................................................111
8 O QUE SE APRENDE NA ESCOLA: OS CONTEÚDOS DE ALFABETIZAÇÃO E
LETRAMENTO.......................................................................................................................................................112
8.1 Além da sala de aula..........................................................................................................................112
8.1.1 O mundo está cheio de coisas escritas: vamos vê-las!..........................................................112
8.1.2 Metodologias de alfabetização........................................................................................................113
8.1.3 Como um professor pode promover uma “boa atividade” na sala de aula?.................113
8.1.4 Características de uma “boa atividade”........................................................................................114
8.1.5 Atividade significativa.........................................................................................................................114
8.1.6 Atividade produtiva..............................................................................................................................115
8.1.7 Atividades desafiadoras .....................................................................................................................116
8.2 Proposta de alfabetização...............................................................................................................116
8.2.1 Atividades de sondagem.....................................................................................................................116
8.2.2 Atividades de ensino-aprendizagem ............................................................................................117
8.2.3 Atividades de aplicação.......................................................................................................................117
8.2.4 Atividades de avaliação.......................................................................................................................118
8.3 O trabalho com leitura......................................................................................................................118
8.3.1 Estratégias de leitura............................................................................................................................118
8.3.2 O trabalho com textos.........................................................................................................................119
8.4 A gramática na contramão.............................................................................................................126
8.4.1 Algumas possibilidades para o trabalho com a produção de textos............................... 126
7
APRESENTAÇÃO
Caro aluno,
O presente livro-texto tem o intuito de introduzir as principais questões da alfabetização e letramento
no contexto educacional, com o propósito de alcançar uma visão importantíssima do casamento entre as
questões de um mundo alfabetizador e letrado – contribuindo para o desenvolvimento do pensamento crítico
– e a formação de educadores com consciência do quanto as questões da alfabetização e letramento são
importantes para toda vida escolar da criança.
Vamos ver isso através de textos explicativos sobre a importância do estudo e aprofundamento das
questões do mundo letrado, vamos também aproveitar para fazer um comparativo entre o que aconteceu
em outros tempos e o que acontece hoje com as questões de alfabetização. Esse percurso histórico o
auxiliará a compreender e estabelecer reflexões sobre este livro e sobre o seu processo de alfabetização.
Teremos a oportunidade de conhecer os estudiosos desse tema e a oportunidade de adquirir
não só o conhecimento sobre as questões da alfabetização e letramento, como também entender
a contribuição de cada um para todo crescimento desse processo, reconhecendo a necessidade da
prática educativa e buscando a total integração entre prática e teoria.
Temos como objetivo que você, aluno, elabore, execute e avalie os planos de ação pedagógica
que expressem o processo de planejamento desenvolvido na área do conhecimento. Também é muito
importante que se saiba incorporar as ações pedagógicas à diversidade cultural, tema comum hoje em
sala de aula e que deve ter o seu lugar de importância reconhecido e trabalhado neste ambiente.
Um professor alfabetizador deve saber articular os resultados de investigações com a prática,
visando a ressignificá-la, bem como desenvolver metodologia e materiais pedagógicos adequados às
diferentes práticas educativas.
E como não podia deixar de ser, analisar as recentes contribuições das teorias educacionais para a
aquisição da língua escrita.
INTRODUÇÃO
Esta disciplina caracteriza-se por ser prática e por mostrar casos vividos em sala de aula. Também
vamos apresentar comentários de professores e suas práticas no contexto educacional brasileiro.
Você participará de uma vivência que poderá possibilitar o resgate dos conceitos aprendidos em sua
infância e que você hoje utiliza como passaporte para o entendimento do pensamento infantil. Além
disso, assumirá responsabilidades e presenciará as emoções do processo de ensinar uma criança a ler e
a escrever, utilizando o código como função social.
Este material apresentará a teoria que fundamenta o conceito de construtivismo, com seus aspectos
metodológicos e as habilidades requeridas para o processo de aprendizagem do código escrito, além das
descobertas da psicogênese da língua escrita efetuadas por Emilia Ferreiro.
8
Unidade I
Este livro é composto por três unidades. Na primeira, temos a introdução aos conceitos com que vamos
trabalhar. Na unidade I, serão apresentados os diferentes enfoques no estudo da alfabetização. Na unidade II,
apresentamos as conquistas das crianças de seis anos e o trabalho com a área do conhecimento. Damos
especial atenção ao conceito de Letramento e sua relação com o conceito de Alfabetização. Na unidade III,
você encontrará uma breve explanação sobre os conteúdos trabalhados em Língua Portuguesa do 1º ao 5º ano
do Ensino Fundamental I.
Apresentamos, ainda, o pensamento dos representantes do construtivismo, promovendo uma
perspectiva histórica entre as diferentes concepções que a criança possui e os níveis conceituais
linguísticos.
Esse livro foi elaborado para mostrar a você casos vividos em sala de aula, além de comentários de professores,
corriqueiros no contexto educacional. Você resgatará e utilizará esses conceitos para entender o pensamento
infantil, além de compreender o processo para ensinar uma criança a ler e escrever como função social.
Vamos apresentar para você, aluno, um pouco sobre a teoria que fundamentou o conceito de
construtivismo, com seus aspectos metodológicos e as habilidades requeridas para o processo de
aprendizagem do código escrito, as descobertas da psicogênese da língua escrita efetuadas por Emilia
Ferreiro e os diferentes enfoques no estudo da alfabetização.
O objetivo específico, neste caso, é que o aluno adquira conhecimento sobre como:
• articular resultados de investigações com a prática, visando a ressignificá-la;
• analisar as recentes contribuições das teorias educacionais, para a aquisição da língua escrita.
Por fim, esperamos que você consiga comparar algumas experiências vividas em sala de aula com
comentários de professores. No contexto abordado, fizemos uma relação entre a teoria e a situação real.
Você irá aprender um pouco mais sobre a realidade escolar na unidade III, com o resgate de conceitos
aprendidos e os conteúdos do processo de ler e escrever, utilizando o código como função social. Nesta
mesma unidade, você irá ler um texto sobre as pesquisas que fundamentam a ideia de letramento
e também aprender a relação do conceito de alfabetização e os conteúdos trabalhados em língua
portuguesa do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental I.
Agora, você aprenderá como alfabetizar usando as situações diárias de escrita como aliadas na arte
de ensinar a ler e escrever.
Com tudo isso, você saberá:
• elaborar, executar e avaliar planos de ação pedagógica que expressem o processo de planejamento
desenvolvido na área do conhecimento;
• desenvolver metodologias e materiais pedagógicos adequados às diferentes práticas
educativas.
9
ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO
Unidade I
1 O PENSAMENTO DOS PRINCIPAIS REPRESENTANTES DO
SOCIOCONSTRUTIVISMO
1.1 Perspectiva histórica
Foi na antiga Mesopotâmia que a escrita foi criada e elaborada. Por volta de 3500 a.C., os sumérios
desenvolveram uma escrita cuneiforme. Apenas para relembrar, a Mesopotâmia fica entre os rios
Eufrates e Tigre, onde hoje está a cidade de Bagdá, capital do Iraque. Cuneiforme significa em forma de
cunha, ou em outras palavras, na forma de pequenos triângulos. Os sumérios usavam placas de barro,
onde cunhavam esta escrita. Hoje, conseguimos, com o auxílio de computadores, decifrar o que eles
escreviam.
Figura 1 – Computador no auxílio do aprendizado
Já naquela época, a escrita era usada para narrar fatos cotidianos, enviar cartas para outras pessoas,
escrever contratos, editar leis, além do registro da própria história. Acredita-se que a escrita dos
sumérios teria influenciado a criação de outras formas de escrever, tanto no Egito quanto na Pérsia. Na
Mesopotâmia, talvez por uma questão de facilidade tecnológica, o material que servia para se escrever
era pequenas placas de barro. Escrevia-se enquanto o barro estava úmido e, depois de seco, era enviado
aos seus destinatários. Isto facilitou sua conservação, razão pela qual encontramos milhares destas
placas até hoje em escavações arqueológicas.
10
Unidade I
Figura 2 – Escrita rupestre
No nosso caso, é interessante notarmos que as primeiras formas de escrita eram representações
gráficas, tais como os desenhos que as crianças modernas acabam criando quando estão aprendendo
a narrar. Portanto, esta representação era limitada e os escribas abandonaram o sistema pictográfico.
Assim, os sumérios foram desenvolvendo valores fixos, figuras que significavam alguma coisa e deviam
ser gravadas sempre da mesma forma. Hoje, sabemos que eles acabaram por desenvolver uma escrita
com aproximadamente seiscentos signos, da mesma forma que hoje utilizamos as letras do alfabeto.
Com isso, os sumérios conseguiram evoluir para o mesmo estágio que temos hoje na escrita da nossa
língua: eles criaram a fonetização. Fonetização é o uso de signos representativos de uma palavra para
representar outra palavra.
Vamosestudarmaisafonetizaçãonasunidadesseguintes,mas,porora,vamosaumexemplobastante
simples: quando aprendemos a formação dos fonemas, muitas vezes somos obrigados a decorar que a
letra C e a letra A formam o fonema CA. Da mesma forma, S e A formam SA. Depois, se evolui para o
aprendizado da representação de figuras, e o desenho de uma casa evolui para a redundância da palavra
CASA. Como estamos aprendendo a linguagem oral sempre antes de aprendermos a grafia, o segundo
sentido desta palavra CASA, por exemplo, em Papai casa com mamãe é percebido, antes mesmo que nos
demos conta que eventualmente a palavra CASA seja responsável pela ideia de casamento.
Saiba mais
Acesse, no endereço abaixo, o arquivo em PDF “Programa de Formação
de Professores Alfabetizadores – Módulo I”, realizado pelo MEC em 2001.
Você vai conhecer, nesta primeira parte, os diversos sistemas de escrita
criados pela humanidade ao longo da História e vai perceber que o sistema
alfabético que usamos é apenas um dos sistemas possíveis.
<www.cipedya.com/web/FileDownload.aspx?IDFile=154152>
11
ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO
Portanto, os sumérios já tinham percebido que a fonetização fazia crescer a possibilidade de
representação do mundo em volta deles. Com a fonetização, ou seja, com o uso de signos representativos
de palavras com o intuito de representar outras, inclusive ideias abstratas, mesmo utilizando sílabas sem
significado próprio, mas que a fonética apresentava como similaridades. Conseguimos perceber isso
num exemplo simples, o banco (de sentar) e o banco (de guardar dinheiro), ou seja, a palavra banco
tem duas representações diferentes. Assim, os sumérios evoluíram a escrita da representação pictórica –
ideográfica, para a representação de um fonema, tendo, portanto, a possibilidade de uma única palavra
ter vários significados, como no caso que acabamos de citar.
Saiba mais
Caso você ainda não tenha entendido, veja, no endereço abaixo, uma
introdução aos silabários japoneses. Você vai ver o que estamos tentando
explicar.Osjaponesesaindautilizamumaescritapictórica,mastransformam
os ideogramas em fonemas.
<http://www3.nhk.or.jp/lesson/portuguese/syllabary/index.html>
Osegípciosantigosdesenvolveramsuaescritaumpoucodepoisqueossumérios.Todasasconstruções
egípcias tinham palavras gravadas: nas paredes, dentro das pirâmides, existem textos que contam a
vida dos faraós. Também nesta civilização, foram utilizados papiros, uma espécie de papel mais fácil
de guardar e de transportar do que as placas de barro dos sumérios. A fabricação do papiro era muito
semelhante à fabricação do papel moderno, porém, o papiro era fabricado com a planta do mesmo
nome, que crescia originariamente na beira do Rio Nilo. Não apenas os egípcios utilizaram o papiro,
como também os gregos e os antigos romanos.
Figura 3 – Escrita oriental
Atribui-se a invenção do papel aos chineses, por volta do ano 150 a.C. O segredo da fabricação
do papel acabou se espalhando pelo Japão, Coreia e Índia e, através dos muçulmanos, acabou
chegando à Europa, por volta do século VIII, em plena Idade Média.
12
Unidade I
Na Roma Antiga, os romanos passaram a escrever em peles de animais especialmente tratadas
para este fim. São os pergaminhos, que foram utilizados por muitos séculos até a popularização
do papel na sociedade europeia. O alfabeto romano continha apenas três letras maiúsculas.
Posteriormente, os romanos desenvolveram um estilo de escrever chamado de uncial, que foi
utilizado até o século VIII. O Novo Testamento foi escrito nesta grafia em pergaminhos.
Durante o império de Carlos Magno, justamente no século VIII, um monge e pedagogo inglês
chamado Alcuino de York inventou uma nova maneira de escrever: a diferença entre as letras maiúsculas
e minúsculas. Durante sete séculos, a grafia desenvolvida por ele foi a forma padrão de se escrever.
Lembramos aqui que, naquela época, todos os documentos ainda eram escritos em latim, mesmo depois
de quinhentos anos do fim do Império Romano.
Com o passar do tempo, esta forma de escrita também passou por modificações. Ludovico Vicentino
Degli Arrighi, um calígrafo que trabalhou para o Papa em Roma, criou uma nova forma de escrever,
inspirada nos manuscritos de então. Esta forma permitiu que ele criasse um caderno de caligrafia em
1522, além de tipos para imprensa que, mais tarde, foram chamados de itálicos. Até hoje, a letra cursiva ou
manuscrita é influenciada pelo seu trabalho. Além disso, surgiu uma infinidade de tipos que são utilizados
inclusive nos computadores e programas de edição de texto atuais.
Saiba mais
Vale a pena ler O menino que aprendeu a ver, pois o livro encanta em
cada virada de página. É uma imperdível história de Ruth Rocha, que aborda
aspectos pedagógicos relacionados à aprendizagem da leitura e da escrita
infantil. Este material serve de reflexão para quando você estiver diante de
uma criança em situação de aprendizagem.
Atualmente, não temos mais dúvidas de como escrever, apesar de sabermos que toda língua é viva
e sofre modificações com o tempo. Nos últimos anos, as discussões sobre o conhecimento das crianças
têm se multiplicado. As críticas da sociedade em relação ao que é ensinado na alfabetização das crianças
estão presentes, principalmente quando muitos jovens não conseguem se expressar por meio de um
texto escrito ou entender uma escrita quando leem.
Essa falta de entendimento de crianças e jovens em se expressar através de um texto escrito ou de
entender o que estão lendo, de darem sentido ao texto, se dá em boa parte por conta da progressão
continuada: a escola, com a preocupação da grande evasão escolar – que aconteceu durante muito
tempo por inúmeras questões, entre elas a visão de que os alunos deveriam ser vistos de forma
homogênea –, vê, na progressão continuada (a partir da educação em ciclos) uma forma de mudar esse
quadro. Entretanto, a falta de preparo de alguns educadores e de comprometimento de outros faz com
que os alunos sejam simplesmente promovidos de um ano para o outro sem terem conhecimento real
do que foi ensinado.
13
ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO
Muitas empresas têm dificuldade em seus processos seletivos por não encontrarem pessoas que
apresentem habilidades de leitura e escrita. Estudiosos, principalmente de outras áreas profissionais,
têm criticado ou mesmo buscado culpados para a dificuldade do país, já que a 9ª economia do mundo
está em 71º lugar em desempenho escolar, numa lista de 121 países, segundo a Organização das Nações
Unidas para a Educação, Ciência e Cultura – Unesco (cf. Ribeiro, 2009).
A Unesco aponta o Brasil como um dos doze países que concentram um grande número de pessoas
com idade acima de quinze anos que não sabem ler nem escrever. Isto significa que, ao todo, 75% das
pessoas que moram no Brasil têm dificuldades em ler e escrever. A Unesco denuncia que o país tem
1,9% dos analfabetos do planeta. Responsabilizar este ou aquele governo, ou pôr a culpa na história,
não ajuda em nada a resolver o problema. Precisamos encontrar formas de solucionar este problema
e atingir a tão almejada qualidade de ensino. Portanto, é preciso lembrar que a educação é construída
pela sociedade, em um contexto sociopolítico, econômico, histórico e cultural.
Devemos lembrar que as barreiras cognitivas podem vir a impedir o avanço dos grupos sociais das
camadas mais pobres da população. A linguagem falada pode ser uma barreira, hoje muito discutida
entre nós, de aquisição da cidadania plena do cidadão.
Por outro lado, a linguagem escrita é uma necessidade para que a cidadania plena venha ser exercida.
Lembramos aqui que, cada vez mais, existe a necessidade da aquisição da leitura e da escrita para que a
pessoa se aproprie da utilização plena dos computadores e dos telefones celulares.
Quando um cidadão não consegue entender o código escrito de sua língua, ele tem nitidamente
maiores dificuldades de socialização, pois se sente constrangido e muitas vezes não se vê como parte
daquele contexto por conta desta falta de entendimento da leitura. Atualmente, quase tudo tem uma
boa parcela de tecnologia e, para acessá-la, é necessário ler e só então se consegue executar o que é
pedido. Assim, como um cidadão que não domina o código de leitura escrita vai ter acessibilidade a
todos os campos da sociedade se encontrar sempre em sua frente uma ferramenta da tecnologia que
ele, ao menos, saberá ler para dizer que não consegue seguir aquele comando?
Figura 4 – Código escrito
14
Unidade I
Desde antes da Proclamação da República que o Brasil vem pesquisando a quantidade de
indivíduos alfabetizados (Beltrão e Novellino, 2002). A partir de 1940, a educação formal foi
incluída regularmente no questionário censitário. Nos censos, foram consideradas pessoas
alfabetizadas aquelas que tinham mais de cinco anos de idade e eram capazes de ler e escrever um
bilhete simples, no idioma que conhecessem. Este conceito levou em consideração, na época, tanto
as formulações internacionais que as Nações Unidas estavam desenvolvendo sobre educação,
quanto a ideia de que muitos imigrantes que vinham para o Brasil sabiam ler e escrever em suas
línguas, mas não em português.
Por outro lado, a população brasileira se modificou muito desde o século passado. A população
passou a ter menos filhos (ibidem, p. 11), viver mais tempo, e também a se miscigenar. Cada vez mais,
existem brasileiros que admitem não pertencer a nenhuma raça, mas serem fruto de uniões inter-raciais.
Vejamos o que perceberam os autores:
Nota-se um progressivo aumento da população alfabetizada (cerne da
pirâmide) em comparação com a população analfabeta (borda da pirâmide).
Se compararmos a pirâmide relativa a 1940 com a de 2000, é patente o
progresso na proporção de alfabetizados.
Nas pirâmides referentes aos censos de 1940 e 1950, o contingente de
indivíduos alfabetizados de ambos os sexos apresenta um crescimento
até a faixa de 15 a 19 anos. A partir dessa faixa, tal contingente vai caindo
progressivamente. Na pirâmide que concerne ao ano de 1960, o máximo
já é alcançado na faixa etária de 10 a 14 anos. O quadro para cada censo
é semelhante, apenas com um nível mais alto de alfabetização com o
passar do tempo. De acordo com os dados levantados em 1970, quase
duplica (em relação a 1960) a proporção de alfabetizados ainda crianças,
isto é, na faixa de 5 a 9 anos. Isto também é verdade para a faixa de 10
a 14 anos.
Esse número aumenta em taxas menores a partir da faixa de 15 a 19 anos.
A partir daí, é o aumento apresentado pelos diferentes grupos etários vai
diminuindo progressivamente. Em 1980, o retrato da alfabetização no Brasil
muda ligeiramente.
Diferentemente do que se observa nos censos de 1960 e 1970, a proporção
máxima de alfabetizados passa para a faixa seguinte, de 15 a 19 anos, como
observado nos censos de 1940 e 1950. Em 1991, há um aumento significativo
de alfabetizados, e o máximo volta a acontecer no grupo etário de 10 a 14
anos. Em 2000, como em 1980, o máximo volta a acontecer na faixa de 15
a 19 anos. Note-se que, paralelamente ao que se observa para as taxas de
alfabetização, nos grupos etários mais velhos há sempre proporcionalmente
mais homens alfabetizados, enquanto nos mais jovens, é das mulheres a
primazia (ibidem, p. 12).
15
ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO
Neste sentido, com uma população se modificando e, nos últimos dez anos, também se tornando
mais rica e incluída nos segmentos de consumo, precisamos pensar nos recortes contextuais.
Vamos relembrar um pouco o que são estes recortes contextuais: o contexto sociopolítico é a
realidade social, espelhada pela qualidade de vida que uma população usufrui dentro de um determinado
sistema político. Em outras palavras, se vivemos dentro de uma democracia e podemos eleger nossos
governantes, estes políticos são responsáveis por zelar pela qualidade de vida da população. O contexto
econômico é a realidade de produção e bem-estar das pessoas. O contexto histórico é as dificuldades
ou facilidades com que o tempo permite que uma população tenha acesso a determinadas coisas. Por
exemplo, hoje, todos nós temos acesso à internet. Há quarenta anos, no Brasil, um telefone custava mais
caro do que um computador atualmente. Também antigamente, muitas cidades com uma população
pequena jogavam o lixo no mar ou no rio e as águas davam conta de decompor este lixo. Hoje, com
a quantidade de gente e de consumo das populações, estamos poluindo as águas. O contexto cultural
também determina mudanças muito fortes. No passado, era comum que uma família tivesse muitos
filhos e era esperado que alguns desses filhos morressem porque não havia remédios que curassem a
maioria das doenças. Hoje, fazemos de tudo para mantermos os filhos vivos e bem cuidados e, portanto,
há uma grande preferência dos casais por poucos filhos.
Figura 5 – Alfabetização no contexto atual
Vamos falar da alfabetização dentro do contexto atual. Nesse contexto, você aprenderá um pouco
sobre a alfabetização com um recorte dessa realidade. Recorte da realidade é quando escolhemos
apenas alguns elementos que são importantes para a compreensão daquilo que estamos falando. Vamos
ver também os instrumentos reconhecidamente fundamentais para a inserção da criança na cultura
letrada da sociedade. Alguns questionamentos induzem à reflexão sobre a realidade educacional da
alfabetização dos brasileiros. Estas questões dizem respeito aos conhecimentos que adquiriram em sua
atuação na sociedade, e também sobre a forma como as pessoas utilizam esses conhecimentos para
reforçar o que existe ou transformar a educação, de forma a proporcionar melhores condições de vida
para todos.
16
Unidade I
Observação
Enfim, responda você: o que é uma pessoa alfabetizada? Quando
podemos dizer que uma pessoa está alfabetizada? Quais seriam as melhores
práticas escolares para a alfabetização?
Quando alfabetizamos as crianças, acabamos por nos deparar com situações inusitadas. Algumas
crianças copiam textos com uma letra muito bonita, mas não conseguem ler o que escrevem. Muitas
leem, mas não conseguem escrever. Há, ainda, as que recitam as letras de A a Z, mas não conseguem ler
nem escrever. Talvez o maior problema, cada vez mais identificado, é que, mesmo depois de alfabetizadas,
a maioria das pessoas não consegue compreender o que está escrito no texto.
Muitos equívocos são cometidos durante os anos iniciais da criança na escola. Um deles é pressupor
que a aprendizagem se dá ao mesmo tempo e da mesma forma para todas as crianças. O fato de o
professor ensinar, apresentar estratégias modernas, atividades recreativas de conteúdos, com certeza,
não significa que o aluno aprenderá. O professor tem um papel considerável na alfabetização, mas não é
o único. A criança traz consigo experiências, formas de pensar e hipóteses sobre a realidade. Não é uma
pessoa vazia que espera que coloquemos nossas impressões e pensamentos em sua mente. A criança
tem uma história: está inserida dentro de um contexto social e familiar de onde ela traz para sala de
aula suas impressões e suas experiências vivenciadas com essa família e com tudo o que está fora dos
muros da escola. Sendo assim, cabe ao professor refletir cotidianamente sobre quem são os seus alunos
e o que para eles é, de fato, importante e faz sentido.
Observação
Então, precisamos nos perguntar: será que ler e escrever são
ajuntamentos de letras? Será que é fazer a correspondência entre grafemas
e fonemas? Ou temos de fazer cópias e descrever as letras até memorizá-
las? Será que o que garante a alfabetização é a transmissão dos conteúdos
escolares pelos professores? Ou será o fato de os professores cobrarem os
conteúdos dos alunos?
O professor não pode parar de ser um pesquisador. Ele precisa estudar o seu aluno, buscar saber
como a criança pensa e apreende os conhecimentos que sua realidade traz, para que possa atuar nesse
contexto. Não há receitas prontas, fórmulas de sucesso a serem transplantadas em uma realidade
multifacetada, rica e diversa da outra, com pessoas distintas e diferentes. Mas sabemos que um professor
que reflete diariamente sobre a sua prática percebe que os seus alunos são seres heterogêneos e que,
acima de tudo, seres sociais, seres históricos que trazem uma “bagagem” que deve ser estudada e levada
em conta. Esses professores terão a possibilidade de maior sucesso no seu trabalho com os alunos, além
de uma percepção maior para ajudar aqueles que têm dificuldades nas suas construções.
17
ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO
Aprender a ler e a escrever significa adquirir uma tecnologia: a de codificar em língua escrita
(escrever) e de decodificar a língua escrita (ler). Porém, somente adquirir não é o suficiente, é necessário
se apropriar dela. Isto significa fazer uso das práticas sociais de leitura e de escrita, articulando-as ou
dissociando-as das práticas de interação oral, dependendo de cada situação vivida. Dito de outra forma,
não basta uma criança saber ler as palavras, ela precisa entender o contexto na qual elas estão escritas.
Isso quer dizer que não basta uma criança ser alfabetizada, ela precisa se tornar letrada, precisa saber
dar significado àquela palavra que lê.
Lembrete
Letramento: capacidade de fazer uso adequado da leitura e da escrita
socialmente utilizadas, conjugando-as com as práticas orais.
O conceito de letramento permite a identificação da concepção de língua que orienta as atividades
da escola nos primeiros anos do Ensino Fundamental. Não é possível considerar a língua só como
instrumento de transmissão de mensagem – o veículo de comunicação por meio do qual alguém que
compreende diz ou escreve para quem deve compreender o que ouve ou vê.
A escola precisa considerar a língua como um processo de interação entre os sujeitos construtores
de sentidos e significados. Entender que os sentidos e significados se constituem segundo as relações
que cada um mantém com a língua, com o tema sobre o qual fala ou escreve, ouve ou vê, com seus
conhecimentos prévios, atitudes e conceitos, segundo a situação específica em que interagem e o
contexto social em que ocorre a tal comunicação. Portanto, são muitas as operações que uma pessoa
faz para poder entender tanto o que está sendo dito, quanto o que está escrito.
Você, quando ensinar, precisará saber: para quem é o seu discurso pedagógico? Ensinar: o que? Por
quê? Para quem? Onde?
Figura 6 – O aprendente
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Unidade I
Se você não responder a essas perguntas considerando quem é o aprendente, a criança que aprende,
para que aprende, como aprende e onde está no momento em que aprende (contexto), provavelmente,
você depare com a situação do diálogo a seguir.
– Como vai a escola?
– Mais ou menos.
– Por quê?
– Eu já sei tudo o que a professora ensina. Então eu finjo que não sei, ela
pensa que me ensina e fica feliz.
Por outro lado, sabemos que cada população numa região geográfica acaba desenvolvendo
uma forma própria de falar. Por exemplo, em São Paulo, quando usamos a expressão “A Fiel”,
sabemos que está se falando da torcida do Corinthians. Em Porto Alegre, se estamos sentados à
mesa e dizemos “passa a faca, por favor.” os gaúchos riem e perguntam “quer que eu passe a faca
onde?” A expressão que eles usam é: “Me alcance a faca, por favor.” Portanto, é preciso considerar
a interação pedagógica. Essa questão implica saber que a criança imagina, pensa e antecipa
informações. Você precisa saber quem é a criança com quem você fala. Precisa sentir e avaliar o
que ela pensa a respeito do mundo, entender que imagens fazem parte do contexto estabelecido
entre o professor e o aluno.
Quadro 1 – Diferença entre alfabetização e letramento
Existe diferença entre alfabetização e letramento?
Alfabetização na concepção de
Emília Ferreiro
Letramento na concepção de
Magda Soares
Aquisição de habilidades que
possibilitam as práticas de
leitura e escrita. Apropriação
da tecnologia de codificar e
decodificar. Capacidade de
identificar as letras do alfabeto e
associá-las aos fonemas, às sílabas
e às palavras.
É a condição de quem não só lê
e escreve, mas, exerce práticas
sociais de leitura e de escrita
que circulam na sociedade em
que vive, articulando-as ou
dissociando-as das práticas sociais
de interação oral.
1.2 Leitura e escrita
Cócco e Hailer (1996) descrevem a leitura e a escrita como instrumentos básicos de ingresso
e participação do cidadão na sociedade letrada. Isto quer dizer que a leitura e a escrita exercem
função social. São ferramentas facilitadoras da compreensão e realização da comunicação do
homem na sociedade contemporânea. É a chave para a apropriação dos saberes conquistados pela
humanidade.
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ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO
Conforme a declaração da Unesco, de 1958 (apud Ribeiro, 2006), uma pessoa sabe ler e
escrever quando consegue ler ou escrever compreensivamente um pequeno texto relacionado à
sua vida diária. Tempos depois, a Unesco adotou outra definição, mais funcional; uma pessoa sabe
ler e escrever quando o sabe o suficiente para inserir-se em seu meio e quando seu desempenho
envolve tarefas de leitura, escrita e cálculo.
Isabel Cristina Alves da Silva Frade (2003), mestre e doutora em Educação pela UFMG,
relata como a concepção do ensino das primeiras letras tem se modificado ao longo dos
tempos. Ela ressalta que não é suficiente decifrar o código linguístico, mas que é fundamental
ter habilidades que possibilitam os saberes envolvidos no ler e escrever, além de participar
dos benefícios envolvidos na cultura escrita e construir atitudes e representações dessa
participação. Em outras palavras, quando uma pessoa consegue saber decifrar o que está
escrito e sabe responder a isso.
A autora relaciona a escola como representante da cultura escrita e, portanto, a escola
constitui-se como agente de letramento. A alfabetização, na visão do construtivismo, é vista
como um processo de construção contínua de conceitos que tem início muito antes de a criança
ser escolarizada. É necessário ter claras as características do sistema de escrita e o uso funcional
da linguagem.
Observação
Pense um pouco...
O(a) alfabetizador(a):
— Conhece como a criança aprende a ler e a escrever?
— Precisa trabalhar com elevada quantidade de conteúdo para
alfabetizar seus alunos?
— Considera a cartilha indispensável para a aprendizagem da leitura e
da escrita de nossas crianças?
— Concebe a leitura como decodificação e a escrita como cópia?
Alguns pesquisadores e estudiosos ajudaram a compreender não só como a criança pensa, mas
como o seu pensamento se desenvolve na aprendizagem da leitura e da escrita. Agora, você irá conhecer
um pouquinho de cada um.
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Unidade I
1.3 Jean Piaget
Figura 7 – Jean Piaget
Jean Piaget nasceu em Neuchâtel, Suíça, em 1896. Começou os seus estudos em uma época em
que Deus era identificado com a vida e a biologia, tida como a ciência da vida. Sendo assim, a religião
era a ciência que explicaria todas as coisas. Piaget estudou biologia, psicologia, filosofia, áreas que lhe
deram o suporte necessário para a formulação de sua teoria: a epistemologia genética. Seu problema de
pesquisa, no qual fundamentou sua tese era: quando é que uma criança passa de um estágio menor de
conhecimento para um estágio maior de conhecimento? Ou seja, quando ela avança no conhecimento?
Para buscar as respostas, propôs uma perspectiva construtivista: o sujeito aprende por meio da ação.
Tudo passa a girar em torno do equilíbrio – o conceito-chave de sua teoria. Neste sentido, o ser humano
busca constantemente o equilíbrio em sua vida por meio de dois fatores básicos: assimilação (aceitar a
novidade) e acomodação (transformar a informação em conhecimento).
Podemos classificar as pesquisas de Piaget em quatro fases:
• o modelo sociológico de desenvolvimento;
• o modelo biológico de desenvolvimento intelectual;
• a elaboração do modelo lógico de desenvolvimento intelectual;
• o estudo do pensamento figurativo.
Os quadros teóricos resultantes de cada fase de pesquisa são muito diferentes uns dos outros, o que
muitos autores classificam como fases muito diferentes de Piaget.
Na primeira fase, Piaget concebeu o modelo sociológico de desenvolvimento. Piaget, inicialmente,
investigou o lado oculto das mentes das crianças. Ele propôs que as crianças passam de uma posição
de egocentrismo para sociocentrismo. Para simplificar a explicação, ele combinou o uso de métodos
psicológicos e clínicos para criar o que chamou de uma entrevista semiclínica. Ele começava a entrevista
fazendo às crianças perguntas padronizadas e, dependendo da forma como eles respondiam, ele fazia
uma série de perguntas fora do padrão.
21
ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO
Piaget queria observar o que ele chamou de “convicção espontânea” e, para tanto, costumava fazer,
aos filhos, perguntas que não eram esperadas nem previstas. Em seus estudos, ele percebeu que havia
uma progressão gradual de respostas intuitivas que eram aceitáveis tanto científica quanto socialmente.
Piaget teorizou que as crianças faziam isso por causa da interação social, respondendo ao desafio vivido
pelas crianças menores, pelas ideias das crianças que estavam mais avançadas. Por este trabalho, Piaget
recebeu um título de doutorado honoris causa de Harvard em 1936.
Saiba mais
No endereço abaixo, você pode ter uma ideia dessas experiências
e entender melhor o que estamos falando. Você vai ouvir estudiosos
discutindo sobre Piaget.
<http://tvescola.mec.gov.br/index.php?item_id=7031&option=com_
zoo&view=item>.
Na segunda fase, Piaget desenvolveu o modelo sensório-motor / adaptativo do desenvolvimento
intelectual. Nesta fase, Piaget descreveu a inteligência como tendo duas partes estreitamente
relacionadas. A primeira parte, que foi observada ainda na primeira fase, foi o conteúdo do pensamento
infantil. A segunda parte foi a observação do processo da atividade intelectual. Ele acreditava que
esse processo de pensamento poderia ser considerado como uma extensão do processo biológico de
adaptação.
A adaptação tem duas partes: a assimilação e a acomodação. Para testar sua teoria, Piaget observou
os hábitos dos seus próprios filhos. Ele argumentou que as crianças estavam se envolvendo em um ato
de assimilação quando chupavam tudo ao seu alcance. Ele alegou que os bebês transformam todas as
coisas em um objeto a ser sugado. As crianças vão assimilando os objetos dessa forma, até que estejam
em conformidade com as suas próprias estruturas mentais. Piaget, em seguida, supôs que sempre que
alguém transforma a compreensão do mundo para atender às necessidades individuais ou concepções,
está, de certa forma, assimilando-o. Piaget também observou que seus filhos não só assimilavam objetos
para atender suas necessidades, mas também para modificar algumas de suas estruturas mentais a
fim de atender às demandas do ambiente. Esta é a segunda divisão de adaptação conhecida como
acomodação.
Para começar, as crianças só se engajam em ações reflexas primárias como a sucção, mas, logo
depois, eles pegam objetos reais e para colocá-los em suas bocas. Quando fazem isso, eles modificam sua
resposta reflexa (espontânea) para acomodar os objetos externos às suas ações reflexas. Como as duas
coisas muitas vezes entram em conflito, elas fornecem o impulso para o desenvolvimento intelectual.
A constante necessidade de equilibrar as duas posições mentais desencadeia o crescimento intelectual.
Ou, em outras palavras, quando uma criança experimenta alguma coisa, ela primeiro faz aquilo que
nasceu sabendo: a sucção com a boca para se alimentar. Depois, ela experimenta esta mesma ação com
todos os objetos para ver como ela vai se relacionar com os demais objetos. Cada vez que o objeto não
22
Unidade I
responde como o seio da mãe, ou tem uma textura específica, ela cria uma nova relação mental com
aquele objeto, para poder catalogá-lo. Isto cria o crescimento intelectual.
Na terceira fase, Piaget elaborou o modelo lógico de desenvolvimento intelectual. Neste
modelo, ele sustentou a ideia de que a inteligência se desenvolve em uma série de etapas que
estão relacionadas à idade e são progressivas porque um estágio deve ser realizado antes do
próximo poder ocorrer. Em cada fase do desenvolvimento da criança, ela forma uma visão da
realidade compatível com esse período de idade. Na fase seguinte, a criança precisa manter o
nível anterior de habilidades mentais adquiridas para reconstruir seus conceitos. Piaget concluiu
que o desenvolvimento intelectual é como uma espiral ascendente em expansão. As crianças
devem constantemente reconstruir as ideias formadas em níveis anteriores com novos conceitos
da ordem superior adquirida no nível seguinte. Este modelo lógico acabou sendo redescoberto nos
anos 60, nos Estados Unidos. Foi nessa época que as descobertas da psicologia do comportamento
passaram a se desenvolver.
Na quarta fase, Piaget estudou o pensamento figurativo. Ele pesquisou áreas da inteligência,
como a percepção e memória, que não são inteiramente lógicas. Conceitos lógicos são descritos
como sendo conceitos completamente reversíveis, porque eles sempre podem ser reduzidos de
volta para o ponto de partida. Piaget percebeu que os conceitos criados a partir da percepção
não podem ser manipulados. Para descrever o processo figurativo, Piaget usou as imagens como
exemplos. As imagens não podem ser desmembradas porque seus contornos não podem ser
separados das formas que elas apresentam. A memória funciona da mesma maneira. Ela nunca é
completamente reversível. Durante este último período de trabalho, Piaget, juntamente com seu
parceiro, Inhelder, publicou livros sobre a percepção, a memória e outros processos figurativos,
tais como a aprendizagem.
Jean Piaget definiu-se como um epistemólogo da “genética”, interessado no processo do
desenvolvimento qualitativo do conhecimento. Como ele diz na introdução de seu livro Epistemologia
genética: “O que a epistemologia genética propõe é descobrir as raízes das diferentes variedades de
conhecimento, desde as suas formas elementares, seguindo para os próximos níveis, incluindo também
o conhecimento científico” (PIAGET, 1978, p. 3).
Ele acreditava que podia encontrar as respostas para as questões epistemológicas do seu tempo ou,
pelo menos, uma proposição mais correta, se alguém pesquisasse o aspecto genético das mesmas; daí
a razão para suas experiências com crianças e adolescentes. Piaget considerava o desenvolvimento de
estruturas cognitivas como a possibilidade de fazer uma diferenciação dos regulamentos biológicos.
Isto quer dizer que, à medida que podemos fazer a construção dessas estruturas cognitivas, podemos
também desenvolver a inteligência e o conhecimento.
Em um de seus últimos livros, Equilíbrio das estruturas cognitivas: o problema central do
desenvolvimento intelectual, ele pretendeu explicar o desenvolvimento do conhecimento como um
processo de equilíbrio utilizando dois conceitos principais de sua teoria: a assimilação e a acomodação.
Segundo ele, estes dois movimentos pertenceriam não apenas às interações biológicas, mas também às
interações cognitivas.
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ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO
As quatro fases de desenvolvimento são descritas na teoria de Piaget como:
1º período: Sensório-motor		 (0 a 2 anos)
2º período: Pré-operatório			 (2 a 7 anos)
3º período: Operações concretas		 (7 a 11 ou 12 anos)
4º período: Operações formais 		 (11 ou 12 anos em diante)
No estágio sensório-motor, as crianças experimentam o mundo através do movimento e usam os
cinco sentidos para explorar o mundo. Durante este estágio, as crianças são extremamente egocêntricas,
ou seja, elas acreditam que são o centro do mundo e não conseguem perceber o mundo a partir do
ponto de vista dos outros. O estágio sensório-motor é dividido em seis subestágios:
• reflexos simples;
• hábitos iniciais e reações circulares primárias;
• reações circulares secundárias;
• coordenação das reações circulares secundárias;
• reações circulares terciárias, que incluem a percepção da novidade e da curiosidade;
• internalização de esquemas.
Os reflexos simples acontecem desde o nascimento até o primeiro mês. Até este momento, as
crianças usam seus reflexos naturais (ou inatos, que existem desde o nascimento) como a sucção. O
bebê relaciona-se com o mundo através dos seus sentidos e da ação. Os reflexos inatos compõem um
repertório mínimo de condutas, que são suficientes para assegurar sua sobrevivência. O comportamento
é organizado por uma série de condutas reflexivas, que entram em ação quando são estimuladas. Por
exemplo, todo objeto novo que a criança encontra, ela põe na boca e começa a sugar. Com isso, ela está
descobrindo se aquele objeto novo também proporciona alimento. Ao mesmo tempo, a sucção fornece
um padrão de comparação entre o novo objeto e o seio da mãe. Este subestágio é caracterizado pela
repetição dos esquemas motores inatos, ou, em outras palavras, da repetição dos comportamentos de
movimento com os quais nascemos.
O processo fundamental na adaptação é a assimilação: a experiência que o recém-nascido adquire
através dos reflexos permite que ele se adapte a novas condições de estímulo. Assim, ele aprende a
reagir sempre da mesma forma, ou de forma parecida, toda vez que é estimulada por uma ação.
A assimilação tem três aspectos, que são: a repetição, a generalização e o reconhecimento. A repetição
é a assimilação funcional que acontece quando o bebê é estimulado. O exemplo mais importante é que
a criança sempre suga o seio da mãe quando encostado em sua boca. A generalização acontece quando
novos objetos são trazidos à sua boca: o bebê suga fraldas, chupetas, bicos de mamadeira, brinquedos
e assim por diante. Por fim, surge o reconhecimento, à medida que o bebê percebe cada objeto tem
características diferentes. Dessa forma, podemos dizer que o indivíduo reconhece o objeto quando
diferencia coisas que pode chupar e que alimentam, das coisas que ele chupa e não alimentam.
24
Unidade I
As reações circulares primárias acontecem entre o primeiro e o quarto mês de vida, período
do segundo subestágio de desenvolvimento. Neste período, os bebês aprendem a coordenar suas
sensações com seus movimentos. Desta forma, ele começa a adquirir hábitos próprios. O motivo de
darmos o nome a estas reações como sendo reações circulares é porque existe um mecanismo que
chamamos de contágio condutual. Esta expressão significa que a conduta, ou comportamento,
é estimulado por um contágio, ou seja, por uma interação que é induzida externamente. Mesmo
que um estímulo aconteça por acaso da primeira vez, a repetição deste estímulo acaba por ensinar
ao bebê uma forma de comportamento como resposta a este estímulo. Então, neste período dos
quatro meses, os bebês aprendem a criar seus hábitos e a desenvolver a interação através das
reações circulares.
No terceiro subestágio, entre os quatro e oito meses de idade, a criança só consegue imitar o adulto
se o comportamento que ela deve imitar já existe no seu repertório. As ações que ela pode reproduzir
são aquelas já contidas no seu repertório, fruto da sua própria experimentação com seu próprio corpo.
Então, um bebê consegue reproduzir um fonema dito por um adulto, se este fonema for primeiro dito
por ela mesma. O movimento que acontece é que a criança produz um som, o adulto imita este som,
a criança percebe (ou assimila) que o som é o mesmo, ou parecido, e então repete também o mesmo
som. À medida que a própria criança experimenta fazer sons diferentes e estes sons são imitados pelos
adultos, ela ouve e associa estes sons e assim consegue expandir seu repertório.
Nesta terceira etapa, que ocorre entre o quarto e o oitavo mês de vida, o bebê descobre as coisas
que existem além do seu próprio corpo. Eles se tornam conscientes de que as coisas existem e, neste
sentido, começam a desenvolver as reações circulares secundárias. As crianças se tornam conscientes
das suas ações e condutas; mesmo que elas comecem a fazer alguma coisa por acaso, como balançar
um chocalho, elas continuam a balançar este chocalho pela satisfação de conseguir produzir um som
novo, que não é produzido por seu corpo.
Neste momento, as crianças passam a combinar os comportamentos aprendidos e adquiridos
até então, para poder explorar novas oportunidades. A atividade passa a ser cada vez mais
intencional, mas o bebê ainda não tem consciência das relações entre as ações e seus resultados.
Nesta fase, este aprendizado começa a acontecer sempre por acaso. Quando a criança chora e
esperneia pela primeira vez e a mãe traz a mamadeira, ela aprende que isto funciona. Depois, se
ela chora e esperneia de novo, e a mãe traz um brinquedo, ela percebe que seu comportamento
não tem resultados tão simples. Neste terceiro subestágio de desenvolvimento, a criança ainda
está muito ligada às coisas que existem como extensão do seu corpo e do seu espaço imediato
de visão. Com a repetição dos movimentos circulares, ela expande seu repertório introduzindo
interações entre seu corpo e os objetos.
Surge, então, o momento da criança promover a coordenação das reações circulares secundárias,
entre o oitavo e o décimo segundo mês de vida. Ao longo deste subestágio, elas começam a fazer
as coisas intencionalmente. As crianças começam a combinar e recombinar os esquemas para tentar
alcançar um objetivo. É neste estágio que elas começam a aprender a usar os martelinhos e a bater. Elas
também passam a entender o que é a permanência do objeto. Em outras palavras, elas aprendem que,
mesmo quando elas não estão olhando, o objeto continua existindo.
25
ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO
Neste quarto subestágio é quando mais percebemos as interações dos bebês com os adultos. As
crianças começam a exibir sinais de intencionalidade de suas ações. Ela começa a prestar atenção no
que acontece a sua volta. Sua coordenação passa a exibir uma intencionalidade e as reações passam
a se coordenar em função de metas não imediatas. Por exemplo, ela começa a mostrar a língua. Além
disso, a criança passa a perceber como alcançar os resultados com suas ações. Apesar do bebê ainda não
ter a coordenação necessária para reproduzir regularmente todos os seus movimentos, ele consegue
aprender a bater palmas, também a coordenar o piscar dos olhos com abrir e fechar as mãos.
Neste momento, a repetição dos movimentos de forma intencional demonstra o funcionamento
daquilo que Piaget chamou de esquemas. Esquemas são padrões de comportamento que podem ser
repetidos e que acabam por produzir resultados que são pretendidos pela criança. Neste sentido, há
progressos nas habilidades de imitação e a criança também começa a mover os lábios intencionalmente,
tocar seu nariz e suas orelhas. Ela também começa a perceber que sua fralda será trocada quando estiver
suja, ou que é despida para tomar banho. Os esquemas de representação facilitam a compreensão dos
objetos e dos fatos. Neste período, também surge a capacidade de distinguir as pessoas, no período
entre seis e oito meses. Assim, ela aprender também a chorar quando vê um adulto desconhecido sem a
presença de alguém conhecido por perto.
A quinta etapa ou subestágio ocorre a partir dos 12 meses de idade e segue até os dezoito meses.
Neste estágio, as crianças exploram as novas possibilidades de lidar com os objetos e começam a tentar
fazer coisas diferentes com os objetos conhecidos para tentar obter resultados diferentes. É o momento
das reações circulares terciárias, quando a assimilação deixa de ser apenas uma repetição, porque os
esquemas sensório-motores são integrados por vários elementos variáveis à medida que as condições
das ações de repetição são modificadas.
A criança já sabe que, dependendo da força com que ela joga um brinquedo longe, a distância
entre ela e o brinquedo será diferente. Assim, a intenção começa a se tornar importante. Por causa da
intencionalidade, a criança passa a ensaiar todos os comportamentos, para conseguir fixar, através da
repetição, a forma correta de fazer um movimento. Neste momento, podemos perceber que a criança
está utilizando sua inteligência para fazer as coisas. Ela passa a utilizar um objeto comprido, como uma
pazinha, para alcançar um objeto mais distante. Ela tenta passar um brinquedo pela grade do cercado e
gira o brinquedo na intenção de conseguir fazer passar pelas grades.
Ela já sabe que, se a bola que ela estava usando rolou para debaixo da mesa, ela deve procurá-la por
ali e não em outro lugar. Mas caso a bola não esteja onde ela imaginou, ela ainda não sabe olhar em volta
para identificar se não está por perto em outro lugar. Ela só percebe e entende aquilo que ela pode ver.
O último subestágio vai dos dezoito aos vinte e quatro meses de idade, ou seja, até entre um ano e
meio e dois anos. Nesta fase, surgem evidências do pensamento simbólico. Começam as invenções de
novos esquemas a partir das combinações e experiências que as crianças fazem. Mas também surgem
invenções a partir de formas de representação.
As representações permitem que a criança opere num nível simbólico. Isto ocorre por causa
da seguinte evolução: os esquemas servem para que as crianças aprendam a lidar com os objetos.
26
Unidade I
Aprendendo a utilizar os objetos, a criança aprende que existe um mundo para além de si, e de
seu próprio corpo. Ela aprende o que pode ser feito com os objetos até mesmo como extensão de
seu próprio corpo.
Com a combinação dos esquemas, a criança vai elaborando o seu conhecimento dos próprios objetos
e das relações espaciais e causais que a colocam em contato com os objetos, além dos acontecimentos
com as outras pessoas. Isto, de alguma forma, requer uma reflexão prévia, um raciocínio. A criança
aprende a subir nas coisas para alcançar objetos que estão no alto, empurrar carrinhos na curva e
guardá-los em caixas. É também neste período que ela aprende a falar. A aquisição da linguagem
transforma as relações da criança com os adultos e com o mundo exterior.
Assim, o sistema de reações circulares permanece atuando e, de certa forma, podemos afirmar que
se mantém como o principal sistema de aprendizado do ser humano. Isto significa que aprendemos
a falar repetindo o que ouvimos. Significa também que damos o sentido àquelas palavras aquilo que
conseguimos entender que significam. Porém, a evolução e o desenvolvimento intelectual passam a
perceber coisas que são condicionais: as crianças podem brincar com uma caixa como se fosse uma
casinha, podem fingir que estão andando de motocicleta ou dirigindo um automóvel. É a fase do faz de
conta. Isto acontece por causa da evolução da inteligência sensório-motora, designando significantes a
símbolos e, posteriormente significados.
Os símbolos nascem dos próprios objetos. Assim como uma mão é uma mão, um copo é um copo, a
percepção da representação de uma mão ou de um copo é entendida pela criança. Não é por acaso que
as escritas antigas começaram como coleções de desenhos. Os símbolos passaram a ter determinados
sentidos significantes, decorrentes das reações circulares que todas as pessoas adultas tinham ao lidar
com estes objetos.
À medida que a criança imita os comportamentos adultos, os significantes são determinados por
práticas sociais que são adotadas apenas por convenção (por exemplo, não cuspir no chão) e, portanto,
são diferidas; ou, por então, são internalizadas.
Os significantes surgem por causa das práticas sociais das quais o indivíduo se apropria através da
imitação: isto acontece através de comportamentos diferidos (adiados) ou internalizados (manejo de
imagens mentais). A diferença entre um comportamento diferido e um comportamento internalizado
é que o comportamento diferido faz com que você faça alguma coisa por imitação sem saber por que
motivo. Por exemplo, quando você lava as mãos antes de comer sem saber por que tem de lavar as mãos.
No comportamento internalizado, você sabe que tem de lavar as mãos, porque as mãos sujas podem
levar bactérias para dentro do seu corpo.
Os significados surgem quando conseguimos atribuir valores qualitativos tanto aos objetos quanto
às ações. À medida que atribuímos valores às reações circulares e percebemos que o mesmo gesto tem
resultados diferentes em situações diferentes, criamos os significados.
No estágio inicial de aprendizado sobre si mesmo e sobre o mundo, a criança faz o movimento
de assimilação e depois, acomodação. Por exemplo, uma bola serve para rolar e pode ser jogada. Se
27
ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO
exercitarmos nosso braço com a bola, ela vai voar e depois rolar até parar. Isto vai nos dizer quanto de
força precisamos para jogar a bola a uma determinada distância. Quando a criança aprende o significado,
ela vai perceber que jogar a bola no rosto de outra pessoa resulta numa reação de raiva. Por outro lado,
jogar a bola para perto de outra pessoa, vai significar um convite para a interação entre as duas pessoas.
Estes são os valores que acabam criando um novo repertório para a criança e sobre o qual ela pode
refletir e tomar decisões antes de realmente jogar uma bola.
1.4 Descobertas feitas a partir das ideias de Piaget
Piaget conseguiu perceber e descrever o desenvolvimento da fase sensório-motora observando
inicialmente seus três filhos. Outros pesquisadores resolveram verificar se este processo ocorre da
mesma forma em populações diferentes. Constataram, então, que Piaget tinha razão. Mas também
foram detectadas algumas diferenças no tempo de desenvolvimento das crianças, principalmente por
causa do tipo de estímulo que elas recebiam e do meio ambiente em que elas se encontravam, além da
forma que eram criadas.
Os psicólogos descobriram que os bebês têm, na verdade, mais capacidade de entender o mundo do
que Piaget verificou. A coordenação intersensorial (entre os sentidos) aparece desde os primeiros dias
de vida. E, se o objeto constitui algo significativo para a criança, ela percebe este objeto mais cedo do
que Piaget supunha.
O que Piaget imaginava que acontecia em função da competência cognitiva foi verificado,
posteriormente, que acontece por causa do desenvolvimento das execuções motoras. Piaget afirmou
que as crianças não procuram um objeto, pois não formaram ainda uma representação do mesmo.
Outros pesquisadores afirmam que isto acontece porque a criança não desenvolveu ainda a habilidade
motora para pegar o objeto. Por exemplo, bebês de nove meses conseguem levantar um obstáculo para
buscar um objeto escondido debaixo dele, mas um bebê de cinco meses não consegue fazer a mesma
coisa porque ainda não desenvolveu a habilidade motora para tal.
Por outro lado, os estudos de Piaget sobre a função simbólica foram confirmados com dados
de pesquisas mais recentes. A construção da função simbólica é a elaboração do conhecimento
sobre a realidade. Seus dois aspectos principais são a representação e a comunicação. Os
símbolos são instrumentos criados para facilitar a relação interpessoal. A permanência do objeto,
ou simplesmente a ideia de uma coisa, acontece quando o objeto é, na verdade, uma pessoa
relacionada à criança. O final desta fase acontece ao mesmo tempo em que acontecem os ajustes
entre a comunicação pré-linguística da mãe e seu filho. O momento em que ela começa a falar
chamamos de aquisição da linguagem.
1.4.1 O desenvolvimento nas demais idades
Piaget ainda escreveu sobre a evolução da criança até a adolescência. Ele sugeriu que, entre
os dois anos e os onze anos, aconteciam três estágios distintos. Entre os dois anos e os sete
anos acontece o estágio pré-operacional. Neste estágio, predomina o pensamento mágico e as
habilidades motoras se desenvolvem. As crianças parecem ainda não conseguir realmente ter
28
Unidade I
um pensamento lógico. Mesmo que eles entendam operações lógicas, não conseguem realmente
formular ideias lógicas. Durante esta fase, o egocentrismo se faz ainda muito presente, mas com
o tempo começa a diminuir.
Aosseteanosdeidadecomeçaoestágiooperacionalconcreto.Ascriançascomeçamadesenvolver
o pensamento lógico, mas ainda são muito concretos em seu pensamento. Isto significa que o
pensamento mágico é contraposto pela verificação de coisas que realmente existem e podem ser
comprovadas. As crianças já conseguem abrir mão de seu egocentrismo e atuar mais socialmente.
Esta fase dura aproximadamente até os onze anos de idade. Entre os onze e dezesseis anos, o jovem
começa a desenvolver o pensamento abstrato. Também durante estes anos, desenvolvem uma
forma lógica de pensar.
Piaget não forneceu uma descrição concisa do processo de desenvolvimento como um todo.
De uma forma geral, ele descreveu o desenvolvimento como ciclos. Primeiro a criança realiza
ações com os objetos, em seguida aprende a organizar os objetos. Ela é capaz de observar as
características da ação e seus efeitos. Através de ações repetidas, eventualmente com algumas
variações ou em contextos diferentes, ou até mesmo com diferentes tipos de objetos, a criança
aprende a diferenciar e a integrar os efeitos de suas ações. Este processo foi denominado por
Piaget como de “refletir sobre abstrações”. Isto significa que a criança não só consegue identificar
a propriedade de um objeto, mas também percebem como as ações conseguem afetá-las. A isto
ele deu o nome de “abstração empírica”.
Repetindo esse processo de experimentação com uma grande variedade de objetos e muitas ações,
a criança acaba por estabelecer um novo nível de conhecimento e percepção interna – a internalização.
Isto permite a evolução para um novo “estágio cognitivo”. Assim, a criança consegue construir novas
formas de lidar com os objetos e com os novos conhecimentos sobre estes objetos. Depois que a criança
construiu os novos tipos de conhecimento, ela começa a utilizá-los para realizar ações ainda mais
complexas, usando objetos mais complexos.
A criança começa a reconhecer padrões cada vez mais complexos e perceber novamente objetos
ainda mais complexos. Este processo de construção do conhecimento evolui até que ela atinja uma
etapa superior de percepção do mundo. Porém, este processo de construção do conhecimento não
é gradual. Quando um novo nível de conhecimento, organização e visão de mundo prova ser eficaz,
a criança generaliza para outras áreas. Como resultado, as transições entre os estágios tendem a ser
rápida e radical. A maior parte do tempo gasto no processo da construção de uma nova etapa consiste
em refinar esse novo nível de cognição. Quando acontece a passagem entre um nível de conhecimento
e o próximo, Piaget sugeriu que existe a formação de uma gestalt. Gestalt é uma palavra alemã que
significa originalmente forma. Porém, a ideia da gestalt é que existe uma forma organizada a partir da
cognição de ideias, imagens e experiências.
Como este processo de construção do conhecimento acontece de uma forma dialética, a cada nova
etapa a criança consegue distinguir mais e melhor as coisas. Assim, surge a integração e a síntese
de ideias contidas nas estruturas anteriores de percepção cognitiva. Cada nova etapa surge porque a
criança assume para si as realizações da cultura da sociedade em que vive.
29
ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO
OmodelodePiagetexplicanãoapenasaformacomoadquirimosoconhecimento,mastambémcomo
refletimossobreoqueaprendemos,porissoéqueelesetornoutãoimportanteparaodesenvolvimentoda
educação. Demonstrando como as crianças evoluem na sua compreensão das coisas, agindo e refletindo
sobre os efeitos que seu próprio conhecimento anterior proporcionava para o entendimento, é que
elas são capazes de seguir organizando seus conhecimentos em estruturas cada vez mais complexas.
Assim, quando uma criança consegue reconhecer os animais precisamente, ela adquire a capacidade de
organizá-los em diferentes tipos e grupos como “pássaros”, “peixes”, e assim por diante. Isto é importante
porque elas se tornam capazes de saber coisas sobre um animal desconhecido, simplesmente baseadas
no fato de que aquele animal é um pássaro – e que todo pássaro bota ovos.
Ao mesmo tempo, refletindo sobre suas próprias ações, a criança desenvolve uma consciência
cada vez mais sofisticada das “regras” que governam as coisas. É assim que Piaget explica a crescente
consciência da criança das noções como “direita”, “válido”, “necessário”, “adequada”, e assim por diante.
Em outras palavras, é através do processo de objetivação, reflexão e abstração que a criança constrói os
princípios onde a ação não é apenas eficaz ou correta, mas, principalmente, justificada.
2 A EPISTEMOLOGIA GENÉTICA
De acordo com Jean Piaget, a epistemologia genética constitui-se das tentativas de explicar
o conhecimento, e do conhecimento científico em particular, com base na sua história, na sua
sociogênese e, especialmente, nas origens psicológicas das noções e operações sobre as quais elas
se baseiam. Piaget acreditava que ele poderia testar as questões epistemológicas, estudando o
desenvolvimento do pensamento e da ação com as crianças. Como resultado, ele criou um campo
novo de estudo conhecido como epistemologia genética. Ele definiu este campo como o estudo do
desenvolvimento da criança como um meio de responder a questões epistemológicas (da construção
do conhecimento).
2.1 Os esquemas
Segundo Piaget, um esquema é um conjunto estruturado de conceitos. Segundo suas ideias, é a
construção de esquemas que leva a formação da gestalt. Um esquema pode ser usado para representar
objetos, cenários e sequências de eventos ou relações. Esta ideia foi proposta originalmente pelo filósofo
Emanuel Kant como estruturas inatas que usamos ​​
para nos ajudar a perceber o mundo. À medida que
ele pretendeu unificar a biologia e o conhecimento, Piaget propôs uma eventual microestrutura física
dos esquemas. Ele sugeriu que talvez existam possíveis incorporações físicas do aprendizado no DNA
das pessoas. Hoje, sabemos que é justamente o contrário: o DNA das pessoas determinam seus limites
e suas habilidades. Suas infinitas combinações determinam aquilo que a pessoa consegue aprender
com mais facilidade, porque tem mais disposição genética para uma determinada coisa. Por outro lado,
sabemos que todos os seres humanos são 99,9% geneticamente iguais e toda nossa diferença está em
poucos genes. Portanto, podemos afirmar que a capacidade de aprender está presente em toda criança,
independente de qualquer contexto racial ou cultural.
Piaget foi, sem dúvida, um dos mais influentes psicólogos do desenvolvimento e do comportamento,
influenciando não apenas o trabalho de Lev Vygotsky e de Lawrence Kohlberg, mas gerações inteiras
30
Unidade I
de acadêmicos. Embora suas ideias tenham sido investigadas por centenas de cientistas em todo
mundo, gerando novos conhecimentos, a qualidade do seu modelo original é indiscutível. Durante
os anos 1970 e 1980, seus trabalhos também inspiraram a transformação da educação nos países
europeus e americanos, inclusive no Brasil. Com uma abordagem mais “centrada na criança”, Piaget
afirmava:
Educação, para a maioria das pessoas, significa tentar levar a criança a
se parecer com um adulto típico de sua sociedade, mas para mim e mais
ninguém, a educação significa fazer criadores. Você tem que fazer os
inventores, os inovadores, os não conformistas (Piaget apud BRINGUIER,
1980, p. 132).
A influência de Piaget é mais forte na educação infantil e na educação moral. Sua teoria do
desenvolvimento cognitivo pode ser usada como uma ferramenta na sala de aula da primeira infância.
De acordo com Piaget, as crianças se desenvolvem melhor em sala de aula a partir da interação. Ele
acreditava em dois princípios básicos relativos à educação moral: que as crianças desenvolvem ideias
morais em etapas e que as crianças criam suas concepções do mundo.
De acordo com Piaget, “a criança é alguém que constrói sua própria visão de mundo moral, que
forma ideias sobre o certo e errado, justo e injusto, que não são o produto direto do ensinamento dos
adultos e que muitas vezes são mantidos para responder aos desejos adultos” (GALLAGHER, 1978, p. 26).
Piaget acreditava que as crianças fazem julgamentos morais com base em suas próprias observações do
mundo.
A teoria de Piaget sobre a moral foi tão radical quando o seu livro, O juízo moral da criança,
publicado em 1932. Ele utilizou critérios filosóficos para definir a moralidade (como critérios
universais, generalizáveis e aplicáveis) e rejeitou a equivalência das normas culturais com as normas
morais. Piaget, com base na teoria kantiana, propôs que a moralidade se desenvolveu a partir da
interação entre pares e que era autônoma de mandatos de autoridade. Em outras palavras, são
pessoas que se acreditam como iguais (pares), que criam as regras de convivência, que servem de
forma igual para eles e incluem todos aqueles que se entendem como pares uns dos outros. Os
pares, e não os pais, são a principal fonte de onde derivam os conceitos morais como a igualdade,
a reciprocidade e a justiça.
Piaget atribuiu diferentes tipos de processos psicossociais a diferentes formas de relações sociais.
Ele introduziu uma distinção fundamental entre os diferentes tipos de relacionamentos: quando um
dos participantes tem mais poder do que o outro, ele cria restrições e a relação se torna assimétrica
(desigual). O que acontece é que o conhecimento que poderia ser adquirido por todos acaba assumindo
uma forma fixa e inflexível pelo participante dominado. Só permitem a ele aprender determinadas
coisas e alguns conceitos. Piaget refere-se a este processo como o de transmissão social, ilustrando-o
através da referência ao modo pelo qual os mais velhos de uma tribo iniciam os membros mais jovens,
com o intuito de fazê-los respeitarem as crenças e as práticas do grupo. Da mesma forma que os adultos
exercem uma influência dominante sobre a criança que cresce, é através da transmissão social que as
crianças podem adquirir conhecimento.
31
ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO
Por outro lado, nas relações de cooperação, o poder é mais uniformemente distribuído entre os
participantes, de forma que surge uma relação mais simétrica. Com essas condições, as formas autênticas
de intercâmbio intelectual tornam-se possíveis, pois cada parceiro tem a liberdade de exibir seus próprios
pensamentos e levar em consideração as opiniões dos outros, além do poder defender o seu próprio
ponto de vista. Piaget acreditava que, nessas circunstâncias, quando o pensamento das crianças não é
limitado por uma influência dominante, existem condições favoráveis ​​
para o surgimento de soluções
construtivas para os problemas. Então, o conhecimento que emerge é aberto, flexível e regulado pela
lógica do argumento, ao invés de ser determinado por uma autoridade externa. Em suma, as relações
de cooperação fornecem o campo para o surgimento de operações, o que para Piaget exige a ausência
de qualquer influência restritiva.
Saiba mais
Para uma leitura fácil e muito interessante, além de propiciar um maior
conhecimentosobreJeanPiaget,sugerimosolivroPiagetparaprincipiantes,
escrito por Adriana Serulnikov e Rodrigo Suárez em 1999 e publicado em
2001. O livro pode ser encontrado em livrarias e bibliotecas, inclusive em
sebos.
2.2 Síntese do pensamento piagetiano
A preocupação de Jean Piaget foi tentar explicar como a criança pensava e interagia com o mundo
e com as pessoas, para adquirir conhecimento. Ele definiu que o conhecimento é construído a partir da
interação do sujeito com o objeto de aprendizagem. Ele ensinou a observar a maneira como a criança
adquire o conhecimento, para que seja possível entender o conhecimento humano. Seus estudos da
psicologia do desenvolvimento e a epistemologia genética tinham o objetivo de entender como o
conhecimento evolui.
Piaget formulou uma teoria: o conhecimento evolui progressivamente por meio de estruturas de
raciocínio que se superpõem, criando assim estágios do conhecimento. Portanto, é preciso entender que
a lógica e a forma de pensar da criança são completamente diferentes da lógica de um adulto. À medida
que cresce, a criança constrói seu conhecimento. Daí o nome construtivismo.
Jean Piaget identifica quatro estágios da evolução mental da criança: cada estágio marca um
período em que o pensamento e o comportamento infantil são caracterizados por uma forma de
raciocínio.
As autoras Telma Weisz e Ana Sanches (1999) reafirmam a contribuição de Piaget para a mudança
de concepção e de olhar sobre a aprendizagem, existentes até a sua época. Até o início do século XX,
acreditava-se que as crianças eram miniadultos e que somente depois de crescidas chegariam ao nível
dos adultos, que eram considerados superiores mentalmente. Acreditava-se também que seus processos
cognitivos eram iguais aos do adulto, mas em proporção menor por serem pequenas.
32
Unidade I
Piaget concluiu, por meio de suas pesquisas, que as crianças pensavam muito diferente dos adultos,
pois o que faltava para elas era certas habilidades. Sua contribuição foi explicar a maneira como a
criança interage com o mundo e com as pessoas para chegar ao conhecimento. É, portanto, a interação
do sujeito com o objeto de aprendizagem que produz o conhecimento.
Lembrete
Antes de passar para o próximo autor, é importante lembrar que assim
nasce a concepção da teoria epistemológica: o construtivismo, a qual
estuda a gênese do conhecimento infantil.
3 LEV SEMËNOVIČ VYGOTSKY
Lev S. Vygotsky nasceu em 1896, graduou-se em Literatura pela Universidade de Moscou. Foi
professor, pesquisador e palestrante de literatura, pedagogia e psicologia. Ele era contemporâneo de
Piaget, e viveu na Rússia até os 37 anos de idade, quando faleceu de tuberculose.
AspesquisasdeVygotskyapontaramparaopapeldalinguagemedaaprendizagemnodesenvolvimento
do indivíduo, cujo pensamento se constrói em um ambiente histórico-cultural.
Para Vygotsky (1984), a relação do homem com o mundo não é direta, mas mediada. O professor
é um mediador entre o aluno e o conhecimento. Ele investigou o desenvolvimento das capacidades
intelectuais superiores do homem e identificou a linguagem como o principal fator do crescimento.
Definia a linguagem como um conjunto de símbolos que mantinha seu caráter histórico e social.
Simpatizante da Revolução Russa, ele acreditava na possibilidade de uma sociedade mais justa e sem
conflito social ou exploração. Sua teoria estava fundamentada no desenvolvimento do indivíduo como
resultado de um processo sócio-histórico. Ele enfatizava o papel da linguagem no desenvolvimento e,
portanto, sua tese foi considerada histórico-social.
Vygotsky também enfatizava o papel da formação escolar, quando a criança, segundo ele, recebe
informações que foram socialmente construídas (experiências pessoais no contexto social) e transforma
as situações do presente, ou adquire consciência a respeito da situação do presente.
Seu ideal era que, se uma transformação social pode conseguir alterar o funcionamento cognitivo,
ela pode reduzir o preconceito e os conflitos sociais. Os processos psicológicos são de natureza social
e, portanto, precisam ser analisados e trabalhados por meio de ações socialmente elaboradas. O
sustentáculo da concepção de Vygotsky está no conceito de mediação, que é o processo de intervenção
de um elemento intermediário numa relação, que passa de direta (sujeito x objeto) para indireta (sujeito
x mediador x objeto) (Rosa, 2003).
No contexto escolar, tais ideias modificaram a perspectiva da relação entre professor e aluno.
33
ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO
Observação
Você consegue perceber que Vygotsky interfere no conceito de
alfabetizar? Ele faz surgir a concepção de letramento, que mais tarde foi
muito defendida por autores como Magda Soares, que produziu um livro
didático para esse contexto.
Nessa concepção, também defendida por Marta Koll de Oliveira (1993), a relação adulto x criança
não é binária, não envolve somente aluno-professor. Também não existe domínio de um sobre o outro,
pois muitas “coisas” (informações) circulam nesse espaço relacional. A socialização, que é a troca de
significados aprendidos e transformados, dialoga construindo saberes e dizeres. A intersubjetividade, a
simpatia e a oposição gerada pelos conflitos se transformam em relações que mudam o paradigma da
situação professor-aluno.
Não se nega que existam as reações biológicas defendidas por Piaget, mas entende-se que a
redução destas é uma condição para os eventos psicológicos defendidos por Vygotsky no conceito
da percepção:
A criança no início de sua vida tem apenas sensações orgânicas – tensão,
dor, calor –, principalmente nas áreas mais sensíveis. Quando a criança
deixa de sofrer influência desses processos biológicos, passa a perceber
a realidade. A percepção da realidade requer processos biológicos como
determinantes de experiência, permitindo que seu organismo passe a
ser afetado por fatores externos. Evidentemente, só a realidade dos
fatores externos não determina completamente essa percepção. A
informação de que esses processos biológicos tornam-se disponíveis no
organismo é organizada pela própria criança por meio de experiência
social e cultural. A criança passa a ver o mundo com sua própria visão,
administrando sob seu ponto de vista (VYGOTSKY, 1984, p. 78).
Um conhecimento só se solidifica quando resulta em um instrumento de pensamento. A
criança avança na aquisição de conceitos quando domina o abstrato e combina-o com um
pensamento mais complexo. Com os passar do tempo, os conceitos tornam-se concretos e
somam-se às habilidades adquiridas socialmente. Para ele, método é algo para ser praticado
e não aplicado como o fim que justifica os meios, ou seja, não é ferramenta no alcance de
resultados. Ferramenta e resultados se integram, ou se misturam e se somam, na aprendizagem.
Vygotsky elaborou o conceito de “zona de desenvolvimento proximal” (distância entre o nível
real – solução independente de problema – e o nível de desenvolvimento potencial – determinado
por meio da solução de problema com a intervenção de alguém com mais experiência). Sua
problemática era: quando o ser humano deixa de ser apenas biológico para se tornar sócio-
histórico?
34
Unidade I
Acredita-se que, para o bem da evolução educacional dessas propostas, o ideal é não diferenciá-
las, nem privilegiar uma ou outra em função dos dois teóricos (Piaget e Vygotsky). Bom é entender
que cada um deles se aprofundou em aspectos específicos do desenvolvimento humano. Piaget
dedicou seus estudos na pesquisa do sujeito cognoscente, e Vygotsky estudou o sujeito social
(histórico).
Hoje, se fala muito em propostas pedagógicas que sejam capazes de ver a criança como ser integral,
global. Assim, não se pode negar que ambos trazem contribuições para a criança biopsicossocial, ou
seja, a criança real.
4 EMÍLIA FERREIRO
Ainda na linha de pensamento dos autores representantes do construtivismo, temos o nome de
maior influência na reformulação metodológica da educação brasileira: Emilia Ferreiro.
Emilia Ferreiro é psicóloga e pesquisadora. Nasceu na Argentina, em 1942 e é radicada no México.
Fez seu doutorado na Universidade de Genebra e recebeu orientação de Jean Piaget, seu grande mestre.
Professora na Universidade de Buenos Aires, em 1974 começou os trabalhos que mais tarde deram
origem à sua tese: psicogênese da língua escrita, grande marco na transformação do conceito de
aprendizagem da escrita pela criança.
Ela foi uma referência no Brasil e seu nome ficou ligado ao conceito do construtivismo. Sua influência
atingiu as normas governamentais para a alfabetização, incorporadas nos Parâmetros Curriculares
Nacionais.
Lembrete
Você se lembra dos estudos de Piaget? Se julgar importante, pare aqui
e releia o item sobre Piaget.
A maneira desordenada como essas ideias foram introduzidas, no entanto, caracterizou a
falta de fundamentação teórico-epistemológica, causando confusões teórico-práticas, das
quais só atualmente o professor tem conhecimento. O construtivismo foi interpretado como
condenatório a tudo o que era habitual na escola até então, às práticas tradicionais de entender
a alfabetização.
As obras de Ferreiro (1985) causaram uma revolução na maneira de alfabetizar, demonstrando
a evolução da psicogênese da escrita infantil, ou seja, ela construiu um pensamento para ajudar na
interpretação da evolução da escrita infantil. Tal pensamento não é uma metodologia, como muitos
acreditaram, e sim um olhar para o erro construtivo da criança, que começa a entender que uma porção
de marquinhas no papel é chamada no mundo adulto de escrita e que isso é parte de um código: “língua
escrita”.
35
ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO
Figura 8 – Língua escrita
O termo psicogênese, cujo significado precisa ser relembrado no desmembramento da palavra (psico
= psicológico e gênese = nascimento), deveria ter a seguinte interpretação: como nasce na criança o
interesse pela escrita? Como seu pensamento evolui a cada conquista? Ela pensa para escrever? Levanta
hipóteses? Quais seriam essas hipóteses?
O ponto forte da caminhada construtivista foi a obra Reflexões sobre a alfabetização (1985). As
concepções piagetianas traziam severas críticas aos métodos tradicionais (cartilhas), fato que gerou
muito tumulto na escola brasileira. Ferreiro disse que a escola prestava atenção no aspecto gráfico da
escrita, ignorando aspectos construtivos, ou seja, era mais importante ter letra bonita do que interpretar
a escrita. O que deveria interessar seria, na sua visão, o que a criança quis representar, os meios utilizados
para a representação e as diferenças entre uma primeira e uma segunda tentativa, para que se possa
perceber a evolução de cada passo durante a rotina de escrita escolar. Os processos de construção e
aprendizagem das crianças levaram a conclusões que abalaram os métodos tradicionais de ensino da
leitura e da escrita.
A trajetória da alfabetização pode ser dividida em antes e depois de Emilia Ferreiro. Ela se tornou
o modelo no ensino brasileiro, fundamentada pelas descobertas do biólogo suíço Jean Piaget (1896-
1980), na investigação dos processos de aquisição e elaboração de conhecimento pela criança – ou seja,
o modo pelo qual ela aprende. Suas pesquisas concentram-se nos mecanismos cognitivos relacionados à
leitura e à escrita. De maneira equivocada, muitos consideram o construtivismo um método, ou seja, não
entenderam que a escola deveria dar oportunidade para a criança aprender. A criança vive em mundo
letrado e está submersa em um processo de letramento muito forte. Ela se vê continuamente envolvida
e observadora desse mundo letrado.
As contribuições de Ferreiro quanto às concepções relativas ao ensinar/aprender, que professoras
conseguiramapreenderdoparadigmapsicogenéticodeconstruçãodaescrita,sãoconcepçõesancoradas,
sobretudo, em Piaget. Elas evidenciam que, na relação do sujeito epistêmico – o alfabetizando, por
exemplo – com o objeto do conhecimento – a língua escrita – o sujeito transforma esse objeto pela
36
Unidade I
assimilação, com base nos seus conhecimentos prévios. Depois de assimilado o conhecimento,
o sujeito é transformado pelo objeto – a acomodação – porque construiu novos conhecimentos e,
consequentemente, (re)construiu aqueles já existentes. Como parte dessas concepções relativas ao
ensinar/aprender, emergiram do discurso de professoras, quatro subcategorias:
a) Compreensão do processo de alfabetização;
b) Concepções de hipóteses de escrita / Níveis de conceitualização da escrita;
c) Visão do erro construtivo;
d) Noção de conflito cognitivo.
Essas concepções relativas ao ensinar/aprender – que constituem o âmago do paradigma
psicogenético – estão intrinsecamente ligadas dentro do processo construtivo da lecto-escrita.
Figura 9 – Desenho
De maneira eficaz, a abordagem psicogenética de alfabetização permitiu ao professor alfabetizador
– não só de crianças – uma visão da singularidade do processo de cada alfabetizando, durante a
apropriação do conhecimento pelo sujeito. As particularidades do processo de construção da escrita são
próprias de cada indivíduo e são marcadas pelas hipóteses de escrita / níveis de conceitualização;
conflito cognitivo; erro construtivo. Segundo Ferreiro (1985), os níveis de escrita e as diversas hipóteses
elaboradas pelo alfabetizando no processo de construção estão inseridas nos três grandes períodos de
construção supracitados. As produções escritas são marcadas pelas hipóteses cognitivas subjacentes
a essas produções. Por essa razão, as produções que antecedem à escrita alfabética não correspondem
à escrita padrão porque, ali, nenhum ou nem todos os fonemas das sílabas estão representados. Desse
modo, embora a produção seja correta do ponto de vista da hipótese que a gerou, por não corresponder
à escrita padrão é considerada erro, mas um erro construtivo. Por exemplo, todas as escritas pré-silábicas
– sejam elas indiferenciadas, diferenciadas intra e interfiguralmente – são consideradas “erro” sob a
37
ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO
perspectiva da escrita alfabética padrão; todavia, considerando a construção cognitiva/hipótese que a
gerou, esse erro passa a ser considerado construtivo.
4.1 Concepções que a criança possui e os níveis conceituais linguísticos
4.1.1 As fases da escrita infantil
Emília Ferreiro (1996) realizou pesquisas científicas que deixaram nítida a trajetória de
pensamento da criança enquanto constrói o código linguístico, aprende o que a escrita representa
e como se estrutura. A partir das suas investigações, a educação começou a tomar novos rumos,
ao perceber o processo de conhecimento infantil e, especificamente a escola, ao entender a
reconstrução do processo de alfabetização. Consciente de sua função, a escola pode realizar um
trabalho pedagógico enfatizando a construção da linguagem (gesto, som, imagem fala e escrita).
4.1.2 Níveis conceituais linguísticos
Se perguntarmos ao adulto sobre a forma que as crianças adquirem a aprendizagem da leitura
e da escrita, vários responderão que é pelo ajuntamento das sílabas até formar as palavras. Muitos
ainda não conseguem entender por que algumas crianças aprendem e outras não, e permanecem na
aprendizagem da cartilha.
Emília Ferreiro, quando estudou as concepções que as crianças apresentam sobre a escrita,
demonstrou estas etapas, chamadas de fases ou níveis de desenvolvimento na construção do
pensamento em relação à linguagem escrita:
Ela estruturou em cinco os níveis conceituais:
Nível 1: pré-silábico – fase pictórica, gráfica primitiva e pré-silábica.
Nível 2: intermediário I.
Nível 3: silábico.
Nível 4: intermediário II ou silábico-alfabético.
Nível 5: alfabético.
Vejamos, resumidamente, um pouquinho sobre cada nível.
Nível 1 – Pré-silábico
A fase pictórica: é o registro feito pela criança com garatujas, desenhos sem figuração e, mais
tarde, desenhos com figuração. Inicia-se aos dois anos de idade se a criança vive em um ambiente
urbano que a estimula desde cedo ao uso de caneta ou lápis e papel.
38
Unidade I
Figura 10 – Fase pictórica
A fase gráfica primitiva: a criança mistura símbolos e pseudoletras, com letras e números em seus
desenhos. Costuma representar o que a criança conhece do meio e o representa desenhando bolinhas,
riscos e pedaços de letras.
Figura 11 – Fase gráfica primitiva
A fase pré-silábica: nesta fase, a criança começa a diferenciar as letras dos números, os desenhos
dos símbolos e reconhece o papel da letra na escrita. Sabe que as letras servem para escrever, mas não
sabe como ocorre, ainda. Não associa o fonema com o grafema. A criança acredita que a ordem das
letras e as vogais não têm importância. Ela não percebe variações quantitativas ou qualitativas dentro
da palavra. A leitura que a criança realiza do que é escrito é sempre de uma forma global deslizando o
dedo pelo registro escrito.
Figura 12 – fase pré-silábica
39
ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO
Nível 2 – Intermediário I
Essa fase é a dos conflitos, em que a criança não tem resposta para alguns questionamentos e diz
que “não sabe escrever”. Ela apresenta e usa alguns valores sonoros convencionais, por exemplo, diz que
seu nome começa com determinada letra e a conhece pelo som, mas não sabe onde fica na palavra que
escreve.
Figura 13 – Nível intermediário I
Nível 3 – Silábico
A criança conta os “pedaços sonoros” (sílabas) e os associa com um símbolo (letra). Essa associação
pode acontecer com ou sem valor sonoro convencional. Ela aceita palavras monossílabas, palavras
com uma ou duas letras com certa hesitação. Escreve uma frase utilizando uma letra para cada
palavra.
Figura 14 – Nível silábico
Nível 4 – Intermediário II ou silábico-alfabético
Este é mais um momento de conflito entre uma fase e outra, em que a criança precisa desconsiderar
o nível silábico para pensar segundo o nível alfabético. Nessa fase, o professor deve instigar a criança no
sentido de reflexão sobre o sistema linguístico pela observação da escrita alfabética.
40
Unidade I
Nível 5 – Alfabético
Quando a criança chega nessa fase, já reconstrói o sistema linguístico e compreende como ele
funciona, consegue ler e expressar seus pensamentos e falas. Forma sílabas e palavras juntando as
letras e consegue distinguir letra, sílaba, palavra e frase. Pode acontecer de a criança dividir a frase não
gramaticalmente, e sim conforme o ritmo frasal.
Figura 15 – Nível alfabético
A alfabetização exige conhecimento, habilidade e competência para dar condições à criança de
construir seus conhecimentos. O professor não pode somente fazer a transmissão do alfabeto, da junção
de letras e palavras, sem preocupar-se com a função da escrita, sem possibilitar o uso da linguagem
escrita pela criança.
As teorias pedagógicas, as investigações e as pesquisas científicas dão suporte ao professor no
planejamento e na atuação em sala de aula, quando o ajudam a conhecer as crianças, como pensam e
suas hipóteses na tentativa de resolver seus conflitos.
Com o conhecimento científico na área educacional, o professor tem condições de elaborar aulas de
forma a chamar a atenção do aluno, com propostas significativas, com jogos e atividades que instiguem
o aluno a pensar e a reformular suas hipóteses. Não podemos ignorar o papel do professor em ser o
mediador e o organizador da ação educativa, da construção e reconstrução dos conhecimentos de seus
alunos em sala de aula.
Além desses pensadores, nas últimas duas décadas, outro termo tem gerando inconstância na prática
pedagógica quando o assunto é alfabetização. O chamado letramento, como você viu no início desta
unidade de estudo, é definido como possibilidades sociais de uso da escrita, como sistema simbólico, em
contextos específicos. A vivência escolar, quando utilizada como parâmetro de prática social segundo
a qual as crianças se alfabetizam, desenvolve estas habilidades para utilizar o conhecimento sobre a
escrita. Você saberá mais sobre esse conceito na unidade II.
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Alfabetização e Letramento V.1

  • 1. Autor: Profa. Adriana Padilha da Rosa Profa. Lucy Ferreira de Almeida Colaboradores: Profa. Silmara Machado Profa. Renata Viana de Barros Thomé Prof. Nonato Assis de Miranda Alfabetização e Letramento
  • 2. Professora conteudista: Lucy Ferreira de Almeida / Adriana Padilha da Rosa Adriana Padilha da Rosa Possui graduação em Pedagogia pela Universidade Tuiuti do Paraná (1993) e Mestrado em Administração pela Universidade Federal de Santa Catarina (2001). Foi aluna especial do Programa de Doutorado em Marketing Global, FEA/USP. Aluna do Programa de Doutoramento da European University (Lisboa/Portugal). Atualmente, é professora adjunta e coordenadora do Curso de Pedagogia da Universidade Paulista. Tem experiência na área de Educação, Administração e Marketing. Atua com os seguintes temas: Alfabetização, Leitura e Escrita, Magistério Superior, Administração e Marketing de Produtos. Lucy Ferreira de Almeida Aluna ouvinte do Mestrado de Psicologia Escolar e do Desenvolvimento pela Universidade de São Paulo – USP. Formada no curso de Extensão Universitária – O socioconstrutivismo: planejamento e Analisando a sala de aula pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC). Pós-graduada, lato sensu, em Educação a Distância pela Universidade Paulista (UNIP). Formou-se em Pedagogia pela Faculdade Teresa Martin (Pinheirense). É professora do curso de Pedagogia EAD da Universidade Paulista (UNIP). Acumula, ainda, outras atividades. Atualmente, é professora convidada da Escola Paulista de Negócios UMC, no curso de pós-graduação de Didática e Metodologia do Ensino Superior. Coordena o setor de Estágio Supervisionado de Educação a Distância da Universidade Paulista (UNIP). Também é concursada pela prefeitura de São Paulo, onde ministra aulas como professora de Educação Infantil. © Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Universidade Paulista. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) R788a Rosa, Adriana Padilha da Alfabetização e letramento / Adriana Padilha da Rosa; Lucy Ferreira de Almeida. - São Paulo: Editora Sol, 2012. 160 p., il. Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e Pesquisas da UNIP, Série Didática, ano XVII, n. 2-016/12, ISSN 1517-9230. 1. Pedagogia. 2. Alfabetização. 3. Letramento. I.Título. CDU 37.01
  • 3. CENTRO UNIVERSITÁRIO PLANALTO DO DISTRITO FEDERAL – UNIPLAN Reitoria Reitor: Prof. Yugo Okida Vice-Reitor: Prof. Fábio Nogueira Carlucci Pró-Reitor Acadêmico: Prof. Humberto Venderlino Richter Pró-Reitor Adminstrativo: Prof. Robson do Nascimento
  • 4.
  • 5. Sumário Alfabetização e Letramento APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................7 INTRODUÇÃO............................................................................................................................................................7 Unidade I 1 O PENSAMENTO DOS PRINCIPAIS REPRESENTANTES DO SOCIOCONSTRUTIVISMO...............9 1.1 Perspectiva histórica...............................................................................................................................9 1.2 Leitura e escrita......................................................................................................................................18 1.3 Jean Piaget...............................................................................................................................................20 1.4 Descobertas feitas a partir das ideias de Piaget.......................................................................27 1.4.1 O desenvolvimento nas demais idades...........................................................................................27 2 A EPISTEMOLOGIA GENÉTICA......................................................................................................................29 2.1 Os esquemas............................................................................................................................................29 2.2 Síntese do pensamento piagetiano............................................................................................... 31 3 LEV SEMËNOVIČ VYGOTSKY.........................................................................................................................32 4 EMÍLIA FERREIRO.............................................................................................................................................34 4.1 Concepções que a criança possui e os níveis conceituais linguísticos...........................37 4.1.1 As fases da escrita infantil...................................................................................................................37 4.1.2 Níveis conceituais linguísticos...........................................................................................................37 Unidade II 5 LER E ESCREVER É MAIS QUE CODIFICAR E DECODIFICAR TEXTOS ............................................49 5.1 O fim das cartilhas em sala de aula...............................................................................................49 5.2 A concepção piagetiana de criança...............................................................................................57 5.3 Comunicação e linguagem................................................................................................................ 61 5.4 Sondagem da escrita infantil .........................................................................................................64 5.5 Ao desenhar, a criança escreve........................................................................................................65 5.6 Concepções que a criança adquire sobre os símbolos linguísticos antes da alfabetização...................................................................................................................................................68 6 A NOVIDADE NA ALFABETIZAÇÃO COM EMILIA FERREIRO..............................................................71 6.1 A linguagem escrita.............................................................................................................................76 6.2 Textos e Jogos.........................................................................................................................................76
  • 6. Unidade III 7 O CONHECIMENTO PRÉ-EXISTENTE E O LETRAMENTO.....................................................................85 7.1 Aprendizagem ativa.............................................................................................................................88 7.2 Implicações das práticas para a educação ................................................................................90 7.3 Principais conclusões........................................................................................................................... 91 7.4 As implicações para o ensino...........................................................................................................97 7.5 Tentando ordenar o caos....................................................................................................................99 7.6 Projetando ambientes para a sala de aula................................................................................100 7.7 Padrões significativos de informação.........................................................................................103 7.8 A organização do conhecimento..................................................................................................106 7.9 Contexto e acesso ao conhecimento..........................................................................................107 7.10 A memória imediata........................................................................................................................109 7.11 Os elementos que promovem aprendizagem inicial ..........................................................111 8 O QUE SE APRENDE NA ESCOLA: OS CONTEÚDOS DE ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO.......................................................................................................................................................112 8.1 Além da sala de aula..........................................................................................................................112 8.1.1 O mundo está cheio de coisas escritas: vamos vê-las!..........................................................112 8.1.2 Metodologias de alfabetização........................................................................................................113 8.1.3 Como um professor pode promover uma “boa atividade” na sala de aula?.................113 8.1.4 Características de uma “boa atividade”........................................................................................114 8.1.5 Atividade significativa.........................................................................................................................114 8.1.6 Atividade produtiva..............................................................................................................................115 8.1.7 Atividades desafiadoras .....................................................................................................................116 8.2 Proposta de alfabetização...............................................................................................................116 8.2.1 Atividades de sondagem.....................................................................................................................116 8.2.2 Atividades de ensino-aprendizagem ............................................................................................117 8.2.3 Atividades de aplicação.......................................................................................................................117 8.2.4 Atividades de avaliação.......................................................................................................................118 8.3 O trabalho com leitura......................................................................................................................118 8.3.1 Estratégias de leitura............................................................................................................................118 8.3.2 O trabalho com textos.........................................................................................................................119 8.4 A gramática na contramão.............................................................................................................126 8.4.1 Algumas possibilidades para o trabalho com a produção de textos............................... 126
  • 7. 7 APRESENTAÇÃO Caro aluno, O presente livro-texto tem o intuito de introduzir as principais questões da alfabetização e letramento no contexto educacional, com o propósito de alcançar uma visão importantíssima do casamento entre as questões de um mundo alfabetizador e letrado – contribuindo para o desenvolvimento do pensamento crítico – e a formação de educadores com consciência do quanto as questões da alfabetização e letramento são importantes para toda vida escolar da criança. Vamos ver isso através de textos explicativos sobre a importância do estudo e aprofundamento das questões do mundo letrado, vamos também aproveitar para fazer um comparativo entre o que aconteceu em outros tempos e o que acontece hoje com as questões de alfabetização. Esse percurso histórico o auxiliará a compreender e estabelecer reflexões sobre este livro e sobre o seu processo de alfabetização. Teremos a oportunidade de conhecer os estudiosos desse tema e a oportunidade de adquirir não só o conhecimento sobre as questões da alfabetização e letramento, como também entender a contribuição de cada um para todo crescimento desse processo, reconhecendo a necessidade da prática educativa e buscando a total integração entre prática e teoria. Temos como objetivo que você, aluno, elabore, execute e avalie os planos de ação pedagógica que expressem o processo de planejamento desenvolvido na área do conhecimento. Também é muito importante que se saiba incorporar as ações pedagógicas à diversidade cultural, tema comum hoje em sala de aula e que deve ter o seu lugar de importância reconhecido e trabalhado neste ambiente. Um professor alfabetizador deve saber articular os resultados de investigações com a prática, visando a ressignificá-la, bem como desenvolver metodologia e materiais pedagógicos adequados às diferentes práticas educativas. E como não podia deixar de ser, analisar as recentes contribuições das teorias educacionais para a aquisição da língua escrita. INTRODUÇÃO Esta disciplina caracteriza-se por ser prática e por mostrar casos vividos em sala de aula. Também vamos apresentar comentários de professores e suas práticas no contexto educacional brasileiro. Você participará de uma vivência que poderá possibilitar o resgate dos conceitos aprendidos em sua infância e que você hoje utiliza como passaporte para o entendimento do pensamento infantil. Além disso, assumirá responsabilidades e presenciará as emoções do processo de ensinar uma criança a ler e a escrever, utilizando o código como função social. Este material apresentará a teoria que fundamenta o conceito de construtivismo, com seus aspectos metodológicos e as habilidades requeridas para o processo de aprendizagem do código escrito, além das descobertas da psicogênese da língua escrita efetuadas por Emilia Ferreiro.
  • 8. 8 Unidade I Este livro é composto por três unidades. Na primeira, temos a introdução aos conceitos com que vamos trabalhar. Na unidade I, serão apresentados os diferentes enfoques no estudo da alfabetização. Na unidade II, apresentamos as conquistas das crianças de seis anos e o trabalho com a área do conhecimento. Damos especial atenção ao conceito de Letramento e sua relação com o conceito de Alfabetização. Na unidade III, você encontrará uma breve explanação sobre os conteúdos trabalhados em Língua Portuguesa do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental I. Apresentamos, ainda, o pensamento dos representantes do construtivismo, promovendo uma perspectiva histórica entre as diferentes concepções que a criança possui e os níveis conceituais linguísticos. Esse livro foi elaborado para mostrar a você casos vividos em sala de aula, além de comentários de professores, corriqueiros no contexto educacional. Você resgatará e utilizará esses conceitos para entender o pensamento infantil, além de compreender o processo para ensinar uma criança a ler e escrever como função social. Vamos apresentar para você, aluno, um pouco sobre a teoria que fundamentou o conceito de construtivismo, com seus aspectos metodológicos e as habilidades requeridas para o processo de aprendizagem do código escrito, as descobertas da psicogênese da língua escrita efetuadas por Emilia Ferreiro e os diferentes enfoques no estudo da alfabetização. O objetivo específico, neste caso, é que o aluno adquira conhecimento sobre como: • articular resultados de investigações com a prática, visando a ressignificá-la; • analisar as recentes contribuições das teorias educacionais, para a aquisição da língua escrita. Por fim, esperamos que você consiga comparar algumas experiências vividas em sala de aula com comentários de professores. No contexto abordado, fizemos uma relação entre a teoria e a situação real. Você irá aprender um pouco mais sobre a realidade escolar na unidade III, com o resgate de conceitos aprendidos e os conteúdos do processo de ler e escrever, utilizando o código como função social. Nesta mesma unidade, você irá ler um texto sobre as pesquisas que fundamentam a ideia de letramento e também aprender a relação do conceito de alfabetização e os conteúdos trabalhados em língua portuguesa do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental I. Agora, você aprenderá como alfabetizar usando as situações diárias de escrita como aliadas na arte de ensinar a ler e escrever. Com tudo isso, você saberá: • elaborar, executar e avaliar planos de ação pedagógica que expressem o processo de planejamento desenvolvido na área do conhecimento; • desenvolver metodologias e materiais pedagógicos adequados às diferentes práticas educativas.
  • 9. 9 ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO Unidade I 1 O PENSAMENTO DOS PRINCIPAIS REPRESENTANTES DO SOCIOCONSTRUTIVISMO 1.1 Perspectiva histórica Foi na antiga Mesopotâmia que a escrita foi criada e elaborada. Por volta de 3500 a.C., os sumérios desenvolveram uma escrita cuneiforme. Apenas para relembrar, a Mesopotâmia fica entre os rios Eufrates e Tigre, onde hoje está a cidade de Bagdá, capital do Iraque. Cuneiforme significa em forma de cunha, ou em outras palavras, na forma de pequenos triângulos. Os sumérios usavam placas de barro, onde cunhavam esta escrita. Hoje, conseguimos, com o auxílio de computadores, decifrar o que eles escreviam. Figura 1 – Computador no auxílio do aprendizado Já naquela época, a escrita era usada para narrar fatos cotidianos, enviar cartas para outras pessoas, escrever contratos, editar leis, além do registro da própria história. Acredita-se que a escrita dos sumérios teria influenciado a criação de outras formas de escrever, tanto no Egito quanto na Pérsia. Na Mesopotâmia, talvez por uma questão de facilidade tecnológica, o material que servia para se escrever era pequenas placas de barro. Escrevia-se enquanto o barro estava úmido e, depois de seco, era enviado aos seus destinatários. Isto facilitou sua conservação, razão pela qual encontramos milhares destas placas até hoje em escavações arqueológicas.
  • 10. 10 Unidade I Figura 2 – Escrita rupestre No nosso caso, é interessante notarmos que as primeiras formas de escrita eram representações gráficas, tais como os desenhos que as crianças modernas acabam criando quando estão aprendendo a narrar. Portanto, esta representação era limitada e os escribas abandonaram o sistema pictográfico. Assim, os sumérios foram desenvolvendo valores fixos, figuras que significavam alguma coisa e deviam ser gravadas sempre da mesma forma. Hoje, sabemos que eles acabaram por desenvolver uma escrita com aproximadamente seiscentos signos, da mesma forma que hoje utilizamos as letras do alfabeto. Com isso, os sumérios conseguiram evoluir para o mesmo estágio que temos hoje na escrita da nossa língua: eles criaram a fonetização. Fonetização é o uso de signos representativos de uma palavra para representar outra palavra. Vamosestudarmaisafonetizaçãonasunidadesseguintes,mas,porora,vamosaumexemplobastante simples: quando aprendemos a formação dos fonemas, muitas vezes somos obrigados a decorar que a letra C e a letra A formam o fonema CA. Da mesma forma, S e A formam SA. Depois, se evolui para o aprendizado da representação de figuras, e o desenho de uma casa evolui para a redundância da palavra CASA. Como estamos aprendendo a linguagem oral sempre antes de aprendermos a grafia, o segundo sentido desta palavra CASA, por exemplo, em Papai casa com mamãe é percebido, antes mesmo que nos demos conta que eventualmente a palavra CASA seja responsável pela ideia de casamento. Saiba mais Acesse, no endereço abaixo, o arquivo em PDF “Programa de Formação de Professores Alfabetizadores – Módulo I”, realizado pelo MEC em 2001. Você vai conhecer, nesta primeira parte, os diversos sistemas de escrita criados pela humanidade ao longo da História e vai perceber que o sistema alfabético que usamos é apenas um dos sistemas possíveis. <www.cipedya.com/web/FileDownload.aspx?IDFile=154152>
  • 11. 11 ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO Portanto, os sumérios já tinham percebido que a fonetização fazia crescer a possibilidade de representação do mundo em volta deles. Com a fonetização, ou seja, com o uso de signos representativos de palavras com o intuito de representar outras, inclusive ideias abstratas, mesmo utilizando sílabas sem significado próprio, mas que a fonética apresentava como similaridades. Conseguimos perceber isso num exemplo simples, o banco (de sentar) e o banco (de guardar dinheiro), ou seja, a palavra banco tem duas representações diferentes. Assim, os sumérios evoluíram a escrita da representação pictórica – ideográfica, para a representação de um fonema, tendo, portanto, a possibilidade de uma única palavra ter vários significados, como no caso que acabamos de citar. Saiba mais Caso você ainda não tenha entendido, veja, no endereço abaixo, uma introdução aos silabários japoneses. Você vai ver o que estamos tentando explicar.Osjaponesesaindautilizamumaescritapictórica,mastransformam os ideogramas em fonemas. <http://www3.nhk.or.jp/lesson/portuguese/syllabary/index.html> Osegípciosantigosdesenvolveramsuaescritaumpoucodepoisqueossumérios.Todasasconstruções egípcias tinham palavras gravadas: nas paredes, dentro das pirâmides, existem textos que contam a vida dos faraós. Também nesta civilização, foram utilizados papiros, uma espécie de papel mais fácil de guardar e de transportar do que as placas de barro dos sumérios. A fabricação do papiro era muito semelhante à fabricação do papel moderno, porém, o papiro era fabricado com a planta do mesmo nome, que crescia originariamente na beira do Rio Nilo. Não apenas os egípcios utilizaram o papiro, como também os gregos e os antigos romanos. Figura 3 – Escrita oriental Atribui-se a invenção do papel aos chineses, por volta do ano 150 a.C. O segredo da fabricação do papel acabou se espalhando pelo Japão, Coreia e Índia e, através dos muçulmanos, acabou chegando à Europa, por volta do século VIII, em plena Idade Média.
  • 12. 12 Unidade I Na Roma Antiga, os romanos passaram a escrever em peles de animais especialmente tratadas para este fim. São os pergaminhos, que foram utilizados por muitos séculos até a popularização do papel na sociedade europeia. O alfabeto romano continha apenas três letras maiúsculas. Posteriormente, os romanos desenvolveram um estilo de escrever chamado de uncial, que foi utilizado até o século VIII. O Novo Testamento foi escrito nesta grafia em pergaminhos. Durante o império de Carlos Magno, justamente no século VIII, um monge e pedagogo inglês chamado Alcuino de York inventou uma nova maneira de escrever: a diferença entre as letras maiúsculas e minúsculas. Durante sete séculos, a grafia desenvolvida por ele foi a forma padrão de se escrever. Lembramos aqui que, naquela época, todos os documentos ainda eram escritos em latim, mesmo depois de quinhentos anos do fim do Império Romano. Com o passar do tempo, esta forma de escrita também passou por modificações. Ludovico Vicentino Degli Arrighi, um calígrafo que trabalhou para o Papa em Roma, criou uma nova forma de escrever, inspirada nos manuscritos de então. Esta forma permitiu que ele criasse um caderno de caligrafia em 1522, além de tipos para imprensa que, mais tarde, foram chamados de itálicos. Até hoje, a letra cursiva ou manuscrita é influenciada pelo seu trabalho. Além disso, surgiu uma infinidade de tipos que são utilizados inclusive nos computadores e programas de edição de texto atuais. Saiba mais Vale a pena ler O menino que aprendeu a ver, pois o livro encanta em cada virada de página. É uma imperdível história de Ruth Rocha, que aborda aspectos pedagógicos relacionados à aprendizagem da leitura e da escrita infantil. Este material serve de reflexão para quando você estiver diante de uma criança em situação de aprendizagem. Atualmente, não temos mais dúvidas de como escrever, apesar de sabermos que toda língua é viva e sofre modificações com o tempo. Nos últimos anos, as discussões sobre o conhecimento das crianças têm se multiplicado. As críticas da sociedade em relação ao que é ensinado na alfabetização das crianças estão presentes, principalmente quando muitos jovens não conseguem se expressar por meio de um texto escrito ou entender uma escrita quando leem. Essa falta de entendimento de crianças e jovens em se expressar através de um texto escrito ou de entender o que estão lendo, de darem sentido ao texto, se dá em boa parte por conta da progressão continuada: a escola, com a preocupação da grande evasão escolar – que aconteceu durante muito tempo por inúmeras questões, entre elas a visão de que os alunos deveriam ser vistos de forma homogênea –, vê, na progressão continuada (a partir da educação em ciclos) uma forma de mudar esse quadro. Entretanto, a falta de preparo de alguns educadores e de comprometimento de outros faz com que os alunos sejam simplesmente promovidos de um ano para o outro sem terem conhecimento real do que foi ensinado.
  • 13. 13 ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO Muitas empresas têm dificuldade em seus processos seletivos por não encontrarem pessoas que apresentem habilidades de leitura e escrita. Estudiosos, principalmente de outras áreas profissionais, têm criticado ou mesmo buscado culpados para a dificuldade do país, já que a 9ª economia do mundo está em 71º lugar em desempenho escolar, numa lista de 121 países, segundo a Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura – Unesco (cf. Ribeiro, 2009). A Unesco aponta o Brasil como um dos doze países que concentram um grande número de pessoas com idade acima de quinze anos que não sabem ler nem escrever. Isto significa que, ao todo, 75% das pessoas que moram no Brasil têm dificuldades em ler e escrever. A Unesco denuncia que o país tem 1,9% dos analfabetos do planeta. Responsabilizar este ou aquele governo, ou pôr a culpa na história, não ajuda em nada a resolver o problema. Precisamos encontrar formas de solucionar este problema e atingir a tão almejada qualidade de ensino. Portanto, é preciso lembrar que a educação é construída pela sociedade, em um contexto sociopolítico, econômico, histórico e cultural. Devemos lembrar que as barreiras cognitivas podem vir a impedir o avanço dos grupos sociais das camadas mais pobres da população. A linguagem falada pode ser uma barreira, hoje muito discutida entre nós, de aquisição da cidadania plena do cidadão. Por outro lado, a linguagem escrita é uma necessidade para que a cidadania plena venha ser exercida. Lembramos aqui que, cada vez mais, existe a necessidade da aquisição da leitura e da escrita para que a pessoa se aproprie da utilização plena dos computadores e dos telefones celulares. Quando um cidadão não consegue entender o código escrito de sua língua, ele tem nitidamente maiores dificuldades de socialização, pois se sente constrangido e muitas vezes não se vê como parte daquele contexto por conta desta falta de entendimento da leitura. Atualmente, quase tudo tem uma boa parcela de tecnologia e, para acessá-la, é necessário ler e só então se consegue executar o que é pedido. Assim, como um cidadão que não domina o código de leitura escrita vai ter acessibilidade a todos os campos da sociedade se encontrar sempre em sua frente uma ferramenta da tecnologia que ele, ao menos, saberá ler para dizer que não consegue seguir aquele comando? Figura 4 – Código escrito
  • 14. 14 Unidade I Desde antes da Proclamação da República que o Brasil vem pesquisando a quantidade de indivíduos alfabetizados (Beltrão e Novellino, 2002). A partir de 1940, a educação formal foi incluída regularmente no questionário censitário. Nos censos, foram consideradas pessoas alfabetizadas aquelas que tinham mais de cinco anos de idade e eram capazes de ler e escrever um bilhete simples, no idioma que conhecessem. Este conceito levou em consideração, na época, tanto as formulações internacionais que as Nações Unidas estavam desenvolvendo sobre educação, quanto a ideia de que muitos imigrantes que vinham para o Brasil sabiam ler e escrever em suas línguas, mas não em português. Por outro lado, a população brasileira se modificou muito desde o século passado. A população passou a ter menos filhos (ibidem, p. 11), viver mais tempo, e também a se miscigenar. Cada vez mais, existem brasileiros que admitem não pertencer a nenhuma raça, mas serem fruto de uniões inter-raciais. Vejamos o que perceberam os autores: Nota-se um progressivo aumento da população alfabetizada (cerne da pirâmide) em comparação com a população analfabeta (borda da pirâmide). Se compararmos a pirâmide relativa a 1940 com a de 2000, é patente o progresso na proporção de alfabetizados. Nas pirâmides referentes aos censos de 1940 e 1950, o contingente de indivíduos alfabetizados de ambos os sexos apresenta um crescimento até a faixa de 15 a 19 anos. A partir dessa faixa, tal contingente vai caindo progressivamente. Na pirâmide que concerne ao ano de 1960, o máximo já é alcançado na faixa etária de 10 a 14 anos. O quadro para cada censo é semelhante, apenas com um nível mais alto de alfabetização com o passar do tempo. De acordo com os dados levantados em 1970, quase duplica (em relação a 1960) a proporção de alfabetizados ainda crianças, isto é, na faixa de 5 a 9 anos. Isto também é verdade para a faixa de 10 a 14 anos. Esse número aumenta em taxas menores a partir da faixa de 15 a 19 anos. A partir daí, é o aumento apresentado pelos diferentes grupos etários vai diminuindo progressivamente. Em 1980, o retrato da alfabetização no Brasil muda ligeiramente. Diferentemente do que se observa nos censos de 1960 e 1970, a proporção máxima de alfabetizados passa para a faixa seguinte, de 15 a 19 anos, como observado nos censos de 1940 e 1950. Em 1991, há um aumento significativo de alfabetizados, e o máximo volta a acontecer no grupo etário de 10 a 14 anos. Em 2000, como em 1980, o máximo volta a acontecer na faixa de 15 a 19 anos. Note-se que, paralelamente ao que se observa para as taxas de alfabetização, nos grupos etários mais velhos há sempre proporcionalmente mais homens alfabetizados, enquanto nos mais jovens, é das mulheres a primazia (ibidem, p. 12).
  • 15. 15 ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO Neste sentido, com uma população se modificando e, nos últimos dez anos, também se tornando mais rica e incluída nos segmentos de consumo, precisamos pensar nos recortes contextuais. Vamos relembrar um pouco o que são estes recortes contextuais: o contexto sociopolítico é a realidade social, espelhada pela qualidade de vida que uma população usufrui dentro de um determinado sistema político. Em outras palavras, se vivemos dentro de uma democracia e podemos eleger nossos governantes, estes políticos são responsáveis por zelar pela qualidade de vida da população. O contexto econômico é a realidade de produção e bem-estar das pessoas. O contexto histórico é as dificuldades ou facilidades com que o tempo permite que uma população tenha acesso a determinadas coisas. Por exemplo, hoje, todos nós temos acesso à internet. Há quarenta anos, no Brasil, um telefone custava mais caro do que um computador atualmente. Também antigamente, muitas cidades com uma população pequena jogavam o lixo no mar ou no rio e as águas davam conta de decompor este lixo. Hoje, com a quantidade de gente e de consumo das populações, estamos poluindo as águas. O contexto cultural também determina mudanças muito fortes. No passado, era comum que uma família tivesse muitos filhos e era esperado que alguns desses filhos morressem porque não havia remédios que curassem a maioria das doenças. Hoje, fazemos de tudo para mantermos os filhos vivos e bem cuidados e, portanto, há uma grande preferência dos casais por poucos filhos. Figura 5 – Alfabetização no contexto atual Vamos falar da alfabetização dentro do contexto atual. Nesse contexto, você aprenderá um pouco sobre a alfabetização com um recorte dessa realidade. Recorte da realidade é quando escolhemos apenas alguns elementos que são importantes para a compreensão daquilo que estamos falando. Vamos ver também os instrumentos reconhecidamente fundamentais para a inserção da criança na cultura letrada da sociedade. Alguns questionamentos induzem à reflexão sobre a realidade educacional da alfabetização dos brasileiros. Estas questões dizem respeito aos conhecimentos que adquiriram em sua atuação na sociedade, e também sobre a forma como as pessoas utilizam esses conhecimentos para reforçar o que existe ou transformar a educação, de forma a proporcionar melhores condições de vida para todos.
  • 16. 16 Unidade I Observação Enfim, responda você: o que é uma pessoa alfabetizada? Quando podemos dizer que uma pessoa está alfabetizada? Quais seriam as melhores práticas escolares para a alfabetização? Quando alfabetizamos as crianças, acabamos por nos deparar com situações inusitadas. Algumas crianças copiam textos com uma letra muito bonita, mas não conseguem ler o que escrevem. Muitas leem, mas não conseguem escrever. Há, ainda, as que recitam as letras de A a Z, mas não conseguem ler nem escrever. Talvez o maior problema, cada vez mais identificado, é que, mesmo depois de alfabetizadas, a maioria das pessoas não consegue compreender o que está escrito no texto. Muitos equívocos são cometidos durante os anos iniciais da criança na escola. Um deles é pressupor que a aprendizagem se dá ao mesmo tempo e da mesma forma para todas as crianças. O fato de o professor ensinar, apresentar estratégias modernas, atividades recreativas de conteúdos, com certeza, não significa que o aluno aprenderá. O professor tem um papel considerável na alfabetização, mas não é o único. A criança traz consigo experiências, formas de pensar e hipóteses sobre a realidade. Não é uma pessoa vazia que espera que coloquemos nossas impressões e pensamentos em sua mente. A criança tem uma história: está inserida dentro de um contexto social e familiar de onde ela traz para sala de aula suas impressões e suas experiências vivenciadas com essa família e com tudo o que está fora dos muros da escola. Sendo assim, cabe ao professor refletir cotidianamente sobre quem são os seus alunos e o que para eles é, de fato, importante e faz sentido. Observação Então, precisamos nos perguntar: será que ler e escrever são ajuntamentos de letras? Será que é fazer a correspondência entre grafemas e fonemas? Ou temos de fazer cópias e descrever as letras até memorizá- las? Será que o que garante a alfabetização é a transmissão dos conteúdos escolares pelos professores? Ou será o fato de os professores cobrarem os conteúdos dos alunos? O professor não pode parar de ser um pesquisador. Ele precisa estudar o seu aluno, buscar saber como a criança pensa e apreende os conhecimentos que sua realidade traz, para que possa atuar nesse contexto. Não há receitas prontas, fórmulas de sucesso a serem transplantadas em uma realidade multifacetada, rica e diversa da outra, com pessoas distintas e diferentes. Mas sabemos que um professor que reflete diariamente sobre a sua prática percebe que os seus alunos são seres heterogêneos e que, acima de tudo, seres sociais, seres históricos que trazem uma “bagagem” que deve ser estudada e levada em conta. Esses professores terão a possibilidade de maior sucesso no seu trabalho com os alunos, além de uma percepção maior para ajudar aqueles que têm dificuldades nas suas construções.
  • 17. 17 ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO Aprender a ler e a escrever significa adquirir uma tecnologia: a de codificar em língua escrita (escrever) e de decodificar a língua escrita (ler). Porém, somente adquirir não é o suficiente, é necessário se apropriar dela. Isto significa fazer uso das práticas sociais de leitura e de escrita, articulando-as ou dissociando-as das práticas de interação oral, dependendo de cada situação vivida. Dito de outra forma, não basta uma criança saber ler as palavras, ela precisa entender o contexto na qual elas estão escritas. Isso quer dizer que não basta uma criança ser alfabetizada, ela precisa se tornar letrada, precisa saber dar significado àquela palavra que lê. Lembrete Letramento: capacidade de fazer uso adequado da leitura e da escrita socialmente utilizadas, conjugando-as com as práticas orais. O conceito de letramento permite a identificação da concepção de língua que orienta as atividades da escola nos primeiros anos do Ensino Fundamental. Não é possível considerar a língua só como instrumento de transmissão de mensagem – o veículo de comunicação por meio do qual alguém que compreende diz ou escreve para quem deve compreender o que ouve ou vê. A escola precisa considerar a língua como um processo de interação entre os sujeitos construtores de sentidos e significados. Entender que os sentidos e significados se constituem segundo as relações que cada um mantém com a língua, com o tema sobre o qual fala ou escreve, ouve ou vê, com seus conhecimentos prévios, atitudes e conceitos, segundo a situação específica em que interagem e o contexto social em que ocorre a tal comunicação. Portanto, são muitas as operações que uma pessoa faz para poder entender tanto o que está sendo dito, quanto o que está escrito. Você, quando ensinar, precisará saber: para quem é o seu discurso pedagógico? Ensinar: o que? Por quê? Para quem? Onde? Figura 6 – O aprendente
  • 18. 18 Unidade I Se você não responder a essas perguntas considerando quem é o aprendente, a criança que aprende, para que aprende, como aprende e onde está no momento em que aprende (contexto), provavelmente, você depare com a situação do diálogo a seguir. – Como vai a escola? – Mais ou menos. – Por quê? – Eu já sei tudo o que a professora ensina. Então eu finjo que não sei, ela pensa que me ensina e fica feliz. Por outro lado, sabemos que cada população numa região geográfica acaba desenvolvendo uma forma própria de falar. Por exemplo, em São Paulo, quando usamos a expressão “A Fiel”, sabemos que está se falando da torcida do Corinthians. Em Porto Alegre, se estamos sentados à mesa e dizemos “passa a faca, por favor.” os gaúchos riem e perguntam “quer que eu passe a faca onde?” A expressão que eles usam é: “Me alcance a faca, por favor.” Portanto, é preciso considerar a interação pedagógica. Essa questão implica saber que a criança imagina, pensa e antecipa informações. Você precisa saber quem é a criança com quem você fala. Precisa sentir e avaliar o que ela pensa a respeito do mundo, entender que imagens fazem parte do contexto estabelecido entre o professor e o aluno. Quadro 1 – Diferença entre alfabetização e letramento Existe diferença entre alfabetização e letramento? Alfabetização na concepção de Emília Ferreiro Letramento na concepção de Magda Soares Aquisição de habilidades que possibilitam as práticas de leitura e escrita. Apropriação da tecnologia de codificar e decodificar. Capacidade de identificar as letras do alfabeto e associá-las aos fonemas, às sílabas e às palavras. É a condição de quem não só lê e escreve, mas, exerce práticas sociais de leitura e de escrita que circulam na sociedade em que vive, articulando-as ou dissociando-as das práticas sociais de interação oral. 1.2 Leitura e escrita Cócco e Hailer (1996) descrevem a leitura e a escrita como instrumentos básicos de ingresso e participação do cidadão na sociedade letrada. Isto quer dizer que a leitura e a escrita exercem função social. São ferramentas facilitadoras da compreensão e realização da comunicação do homem na sociedade contemporânea. É a chave para a apropriação dos saberes conquistados pela humanidade.
  • 19. 19 ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO Conforme a declaração da Unesco, de 1958 (apud Ribeiro, 2006), uma pessoa sabe ler e escrever quando consegue ler ou escrever compreensivamente um pequeno texto relacionado à sua vida diária. Tempos depois, a Unesco adotou outra definição, mais funcional; uma pessoa sabe ler e escrever quando o sabe o suficiente para inserir-se em seu meio e quando seu desempenho envolve tarefas de leitura, escrita e cálculo. Isabel Cristina Alves da Silva Frade (2003), mestre e doutora em Educação pela UFMG, relata como a concepção do ensino das primeiras letras tem se modificado ao longo dos tempos. Ela ressalta que não é suficiente decifrar o código linguístico, mas que é fundamental ter habilidades que possibilitam os saberes envolvidos no ler e escrever, além de participar dos benefícios envolvidos na cultura escrita e construir atitudes e representações dessa participação. Em outras palavras, quando uma pessoa consegue saber decifrar o que está escrito e sabe responder a isso. A autora relaciona a escola como representante da cultura escrita e, portanto, a escola constitui-se como agente de letramento. A alfabetização, na visão do construtivismo, é vista como um processo de construção contínua de conceitos que tem início muito antes de a criança ser escolarizada. É necessário ter claras as características do sistema de escrita e o uso funcional da linguagem. Observação Pense um pouco... O(a) alfabetizador(a): — Conhece como a criança aprende a ler e a escrever? — Precisa trabalhar com elevada quantidade de conteúdo para alfabetizar seus alunos? — Considera a cartilha indispensável para a aprendizagem da leitura e da escrita de nossas crianças? — Concebe a leitura como decodificação e a escrita como cópia? Alguns pesquisadores e estudiosos ajudaram a compreender não só como a criança pensa, mas como o seu pensamento se desenvolve na aprendizagem da leitura e da escrita. Agora, você irá conhecer um pouquinho de cada um.
  • 20. 20 Unidade I 1.3 Jean Piaget Figura 7 – Jean Piaget Jean Piaget nasceu em Neuchâtel, Suíça, em 1896. Começou os seus estudos em uma época em que Deus era identificado com a vida e a biologia, tida como a ciência da vida. Sendo assim, a religião era a ciência que explicaria todas as coisas. Piaget estudou biologia, psicologia, filosofia, áreas que lhe deram o suporte necessário para a formulação de sua teoria: a epistemologia genética. Seu problema de pesquisa, no qual fundamentou sua tese era: quando é que uma criança passa de um estágio menor de conhecimento para um estágio maior de conhecimento? Ou seja, quando ela avança no conhecimento? Para buscar as respostas, propôs uma perspectiva construtivista: o sujeito aprende por meio da ação. Tudo passa a girar em torno do equilíbrio – o conceito-chave de sua teoria. Neste sentido, o ser humano busca constantemente o equilíbrio em sua vida por meio de dois fatores básicos: assimilação (aceitar a novidade) e acomodação (transformar a informação em conhecimento). Podemos classificar as pesquisas de Piaget em quatro fases: • o modelo sociológico de desenvolvimento; • o modelo biológico de desenvolvimento intelectual; • a elaboração do modelo lógico de desenvolvimento intelectual; • o estudo do pensamento figurativo. Os quadros teóricos resultantes de cada fase de pesquisa são muito diferentes uns dos outros, o que muitos autores classificam como fases muito diferentes de Piaget. Na primeira fase, Piaget concebeu o modelo sociológico de desenvolvimento. Piaget, inicialmente, investigou o lado oculto das mentes das crianças. Ele propôs que as crianças passam de uma posição de egocentrismo para sociocentrismo. Para simplificar a explicação, ele combinou o uso de métodos psicológicos e clínicos para criar o que chamou de uma entrevista semiclínica. Ele começava a entrevista fazendo às crianças perguntas padronizadas e, dependendo da forma como eles respondiam, ele fazia uma série de perguntas fora do padrão.
  • 21. 21 ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO Piaget queria observar o que ele chamou de “convicção espontânea” e, para tanto, costumava fazer, aos filhos, perguntas que não eram esperadas nem previstas. Em seus estudos, ele percebeu que havia uma progressão gradual de respostas intuitivas que eram aceitáveis tanto científica quanto socialmente. Piaget teorizou que as crianças faziam isso por causa da interação social, respondendo ao desafio vivido pelas crianças menores, pelas ideias das crianças que estavam mais avançadas. Por este trabalho, Piaget recebeu um título de doutorado honoris causa de Harvard em 1936. Saiba mais No endereço abaixo, você pode ter uma ideia dessas experiências e entender melhor o que estamos falando. Você vai ouvir estudiosos discutindo sobre Piaget. <http://tvescola.mec.gov.br/index.php?item_id=7031&option=com_ zoo&view=item>. Na segunda fase, Piaget desenvolveu o modelo sensório-motor / adaptativo do desenvolvimento intelectual. Nesta fase, Piaget descreveu a inteligência como tendo duas partes estreitamente relacionadas. A primeira parte, que foi observada ainda na primeira fase, foi o conteúdo do pensamento infantil. A segunda parte foi a observação do processo da atividade intelectual. Ele acreditava que esse processo de pensamento poderia ser considerado como uma extensão do processo biológico de adaptação. A adaptação tem duas partes: a assimilação e a acomodação. Para testar sua teoria, Piaget observou os hábitos dos seus próprios filhos. Ele argumentou que as crianças estavam se envolvendo em um ato de assimilação quando chupavam tudo ao seu alcance. Ele alegou que os bebês transformam todas as coisas em um objeto a ser sugado. As crianças vão assimilando os objetos dessa forma, até que estejam em conformidade com as suas próprias estruturas mentais. Piaget, em seguida, supôs que sempre que alguém transforma a compreensão do mundo para atender às necessidades individuais ou concepções, está, de certa forma, assimilando-o. Piaget também observou que seus filhos não só assimilavam objetos para atender suas necessidades, mas também para modificar algumas de suas estruturas mentais a fim de atender às demandas do ambiente. Esta é a segunda divisão de adaptação conhecida como acomodação. Para começar, as crianças só se engajam em ações reflexas primárias como a sucção, mas, logo depois, eles pegam objetos reais e para colocá-los em suas bocas. Quando fazem isso, eles modificam sua resposta reflexa (espontânea) para acomodar os objetos externos às suas ações reflexas. Como as duas coisas muitas vezes entram em conflito, elas fornecem o impulso para o desenvolvimento intelectual. A constante necessidade de equilibrar as duas posições mentais desencadeia o crescimento intelectual. Ou, em outras palavras, quando uma criança experimenta alguma coisa, ela primeiro faz aquilo que nasceu sabendo: a sucção com a boca para se alimentar. Depois, ela experimenta esta mesma ação com todos os objetos para ver como ela vai se relacionar com os demais objetos. Cada vez que o objeto não
  • 22. 22 Unidade I responde como o seio da mãe, ou tem uma textura específica, ela cria uma nova relação mental com aquele objeto, para poder catalogá-lo. Isto cria o crescimento intelectual. Na terceira fase, Piaget elaborou o modelo lógico de desenvolvimento intelectual. Neste modelo, ele sustentou a ideia de que a inteligência se desenvolve em uma série de etapas que estão relacionadas à idade e são progressivas porque um estágio deve ser realizado antes do próximo poder ocorrer. Em cada fase do desenvolvimento da criança, ela forma uma visão da realidade compatível com esse período de idade. Na fase seguinte, a criança precisa manter o nível anterior de habilidades mentais adquiridas para reconstruir seus conceitos. Piaget concluiu que o desenvolvimento intelectual é como uma espiral ascendente em expansão. As crianças devem constantemente reconstruir as ideias formadas em níveis anteriores com novos conceitos da ordem superior adquirida no nível seguinte. Este modelo lógico acabou sendo redescoberto nos anos 60, nos Estados Unidos. Foi nessa época que as descobertas da psicologia do comportamento passaram a se desenvolver. Na quarta fase, Piaget estudou o pensamento figurativo. Ele pesquisou áreas da inteligência, como a percepção e memória, que não são inteiramente lógicas. Conceitos lógicos são descritos como sendo conceitos completamente reversíveis, porque eles sempre podem ser reduzidos de volta para o ponto de partida. Piaget percebeu que os conceitos criados a partir da percepção não podem ser manipulados. Para descrever o processo figurativo, Piaget usou as imagens como exemplos. As imagens não podem ser desmembradas porque seus contornos não podem ser separados das formas que elas apresentam. A memória funciona da mesma maneira. Ela nunca é completamente reversível. Durante este último período de trabalho, Piaget, juntamente com seu parceiro, Inhelder, publicou livros sobre a percepção, a memória e outros processos figurativos, tais como a aprendizagem. Jean Piaget definiu-se como um epistemólogo da “genética”, interessado no processo do desenvolvimento qualitativo do conhecimento. Como ele diz na introdução de seu livro Epistemologia genética: “O que a epistemologia genética propõe é descobrir as raízes das diferentes variedades de conhecimento, desde as suas formas elementares, seguindo para os próximos níveis, incluindo também o conhecimento científico” (PIAGET, 1978, p. 3). Ele acreditava que podia encontrar as respostas para as questões epistemológicas do seu tempo ou, pelo menos, uma proposição mais correta, se alguém pesquisasse o aspecto genético das mesmas; daí a razão para suas experiências com crianças e adolescentes. Piaget considerava o desenvolvimento de estruturas cognitivas como a possibilidade de fazer uma diferenciação dos regulamentos biológicos. Isto quer dizer que, à medida que podemos fazer a construção dessas estruturas cognitivas, podemos também desenvolver a inteligência e o conhecimento. Em um de seus últimos livros, Equilíbrio das estruturas cognitivas: o problema central do desenvolvimento intelectual, ele pretendeu explicar o desenvolvimento do conhecimento como um processo de equilíbrio utilizando dois conceitos principais de sua teoria: a assimilação e a acomodação. Segundo ele, estes dois movimentos pertenceriam não apenas às interações biológicas, mas também às interações cognitivas.
  • 23. 23 ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO As quatro fases de desenvolvimento são descritas na teoria de Piaget como: 1º período: Sensório-motor (0 a 2 anos) 2º período: Pré-operatório (2 a 7 anos) 3º período: Operações concretas (7 a 11 ou 12 anos) 4º período: Operações formais (11 ou 12 anos em diante) No estágio sensório-motor, as crianças experimentam o mundo através do movimento e usam os cinco sentidos para explorar o mundo. Durante este estágio, as crianças são extremamente egocêntricas, ou seja, elas acreditam que são o centro do mundo e não conseguem perceber o mundo a partir do ponto de vista dos outros. O estágio sensório-motor é dividido em seis subestágios: • reflexos simples; • hábitos iniciais e reações circulares primárias; • reações circulares secundárias; • coordenação das reações circulares secundárias; • reações circulares terciárias, que incluem a percepção da novidade e da curiosidade; • internalização de esquemas. Os reflexos simples acontecem desde o nascimento até o primeiro mês. Até este momento, as crianças usam seus reflexos naturais (ou inatos, que existem desde o nascimento) como a sucção. O bebê relaciona-se com o mundo através dos seus sentidos e da ação. Os reflexos inatos compõem um repertório mínimo de condutas, que são suficientes para assegurar sua sobrevivência. O comportamento é organizado por uma série de condutas reflexivas, que entram em ação quando são estimuladas. Por exemplo, todo objeto novo que a criança encontra, ela põe na boca e começa a sugar. Com isso, ela está descobrindo se aquele objeto novo também proporciona alimento. Ao mesmo tempo, a sucção fornece um padrão de comparação entre o novo objeto e o seio da mãe. Este subestágio é caracterizado pela repetição dos esquemas motores inatos, ou, em outras palavras, da repetição dos comportamentos de movimento com os quais nascemos. O processo fundamental na adaptação é a assimilação: a experiência que o recém-nascido adquire através dos reflexos permite que ele se adapte a novas condições de estímulo. Assim, ele aprende a reagir sempre da mesma forma, ou de forma parecida, toda vez que é estimulada por uma ação. A assimilação tem três aspectos, que são: a repetição, a generalização e o reconhecimento. A repetição é a assimilação funcional que acontece quando o bebê é estimulado. O exemplo mais importante é que a criança sempre suga o seio da mãe quando encostado em sua boca. A generalização acontece quando novos objetos são trazidos à sua boca: o bebê suga fraldas, chupetas, bicos de mamadeira, brinquedos e assim por diante. Por fim, surge o reconhecimento, à medida que o bebê percebe cada objeto tem características diferentes. Dessa forma, podemos dizer que o indivíduo reconhece o objeto quando diferencia coisas que pode chupar e que alimentam, das coisas que ele chupa e não alimentam.
  • 24. 24 Unidade I As reações circulares primárias acontecem entre o primeiro e o quarto mês de vida, período do segundo subestágio de desenvolvimento. Neste período, os bebês aprendem a coordenar suas sensações com seus movimentos. Desta forma, ele começa a adquirir hábitos próprios. O motivo de darmos o nome a estas reações como sendo reações circulares é porque existe um mecanismo que chamamos de contágio condutual. Esta expressão significa que a conduta, ou comportamento, é estimulado por um contágio, ou seja, por uma interação que é induzida externamente. Mesmo que um estímulo aconteça por acaso da primeira vez, a repetição deste estímulo acaba por ensinar ao bebê uma forma de comportamento como resposta a este estímulo. Então, neste período dos quatro meses, os bebês aprendem a criar seus hábitos e a desenvolver a interação através das reações circulares. No terceiro subestágio, entre os quatro e oito meses de idade, a criança só consegue imitar o adulto se o comportamento que ela deve imitar já existe no seu repertório. As ações que ela pode reproduzir são aquelas já contidas no seu repertório, fruto da sua própria experimentação com seu próprio corpo. Então, um bebê consegue reproduzir um fonema dito por um adulto, se este fonema for primeiro dito por ela mesma. O movimento que acontece é que a criança produz um som, o adulto imita este som, a criança percebe (ou assimila) que o som é o mesmo, ou parecido, e então repete também o mesmo som. À medida que a própria criança experimenta fazer sons diferentes e estes sons são imitados pelos adultos, ela ouve e associa estes sons e assim consegue expandir seu repertório. Nesta terceira etapa, que ocorre entre o quarto e o oitavo mês de vida, o bebê descobre as coisas que existem além do seu próprio corpo. Eles se tornam conscientes de que as coisas existem e, neste sentido, começam a desenvolver as reações circulares secundárias. As crianças se tornam conscientes das suas ações e condutas; mesmo que elas comecem a fazer alguma coisa por acaso, como balançar um chocalho, elas continuam a balançar este chocalho pela satisfação de conseguir produzir um som novo, que não é produzido por seu corpo. Neste momento, as crianças passam a combinar os comportamentos aprendidos e adquiridos até então, para poder explorar novas oportunidades. A atividade passa a ser cada vez mais intencional, mas o bebê ainda não tem consciência das relações entre as ações e seus resultados. Nesta fase, este aprendizado começa a acontecer sempre por acaso. Quando a criança chora e esperneia pela primeira vez e a mãe traz a mamadeira, ela aprende que isto funciona. Depois, se ela chora e esperneia de novo, e a mãe traz um brinquedo, ela percebe que seu comportamento não tem resultados tão simples. Neste terceiro subestágio de desenvolvimento, a criança ainda está muito ligada às coisas que existem como extensão do seu corpo e do seu espaço imediato de visão. Com a repetição dos movimentos circulares, ela expande seu repertório introduzindo interações entre seu corpo e os objetos. Surge, então, o momento da criança promover a coordenação das reações circulares secundárias, entre o oitavo e o décimo segundo mês de vida. Ao longo deste subestágio, elas começam a fazer as coisas intencionalmente. As crianças começam a combinar e recombinar os esquemas para tentar alcançar um objetivo. É neste estágio que elas começam a aprender a usar os martelinhos e a bater. Elas também passam a entender o que é a permanência do objeto. Em outras palavras, elas aprendem que, mesmo quando elas não estão olhando, o objeto continua existindo.
  • 25. 25 ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO Neste quarto subestágio é quando mais percebemos as interações dos bebês com os adultos. As crianças começam a exibir sinais de intencionalidade de suas ações. Ela começa a prestar atenção no que acontece a sua volta. Sua coordenação passa a exibir uma intencionalidade e as reações passam a se coordenar em função de metas não imediatas. Por exemplo, ela começa a mostrar a língua. Além disso, a criança passa a perceber como alcançar os resultados com suas ações. Apesar do bebê ainda não ter a coordenação necessária para reproduzir regularmente todos os seus movimentos, ele consegue aprender a bater palmas, também a coordenar o piscar dos olhos com abrir e fechar as mãos. Neste momento, a repetição dos movimentos de forma intencional demonstra o funcionamento daquilo que Piaget chamou de esquemas. Esquemas são padrões de comportamento que podem ser repetidos e que acabam por produzir resultados que são pretendidos pela criança. Neste sentido, há progressos nas habilidades de imitação e a criança também começa a mover os lábios intencionalmente, tocar seu nariz e suas orelhas. Ela também começa a perceber que sua fralda será trocada quando estiver suja, ou que é despida para tomar banho. Os esquemas de representação facilitam a compreensão dos objetos e dos fatos. Neste período, também surge a capacidade de distinguir as pessoas, no período entre seis e oito meses. Assim, ela aprender também a chorar quando vê um adulto desconhecido sem a presença de alguém conhecido por perto. A quinta etapa ou subestágio ocorre a partir dos 12 meses de idade e segue até os dezoito meses. Neste estágio, as crianças exploram as novas possibilidades de lidar com os objetos e começam a tentar fazer coisas diferentes com os objetos conhecidos para tentar obter resultados diferentes. É o momento das reações circulares terciárias, quando a assimilação deixa de ser apenas uma repetição, porque os esquemas sensório-motores são integrados por vários elementos variáveis à medida que as condições das ações de repetição são modificadas. A criança já sabe que, dependendo da força com que ela joga um brinquedo longe, a distância entre ela e o brinquedo será diferente. Assim, a intenção começa a se tornar importante. Por causa da intencionalidade, a criança passa a ensaiar todos os comportamentos, para conseguir fixar, através da repetição, a forma correta de fazer um movimento. Neste momento, podemos perceber que a criança está utilizando sua inteligência para fazer as coisas. Ela passa a utilizar um objeto comprido, como uma pazinha, para alcançar um objeto mais distante. Ela tenta passar um brinquedo pela grade do cercado e gira o brinquedo na intenção de conseguir fazer passar pelas grades. Ela já sabe que, se a bola que ela estava usando rolou para debaixo da mesa, ela deve procurá-la por ali e não em outro lugar. Mas caso a bola não esteja onde ela imaginou, ela ainda não sabe olhar em volta para identificar se não está por perto em outro lugar. Ela só percebe e entende aquilo que ela pode ver. O último subestágio vai dos dezoito aos vinte e quatro meses de idade, ou seja, até entre um ano e meio e dois anos. Nesta fase, surgem evidências do pensamento simbólico. Começam as invenções de novos esquemas a partir das combinações e experiências que as crianças fazem. Mas também surgem invenções a partir de formas de representação. As representações permitem que a criança opere num nível simbólico. Isto ocorre por causa da seguinte evolução: os esquemas servem para que as crianças aprendam a lidar com os objetos.
  • 26. 26 Unidade I Aprendendo a utilizar os objetos, a criança aprende que existe um mundo para além de si, e de seu próprio corpo. Ela aprende o que pode ser feito com os objetos até mesmo como extensão de seu próprio corpo. Com a combinação dos esquemas, a criança vai elaborando o seu conhecimento dos próprios objetos e das relações espaciais e causais que a colocam em contato com os objetos, além dos acontecimentos com as outras pessoas. Isto, de alguma forma, requer uma reflexão prévia, um raciocínio. A criança aprende a subir nas coisas para alcançar objetos que estão no alto, empurrar carrinhos na curva e guardá-los em caixas. É também neste período que ela aprende a falar. A aquisição da linguagem transforma as relações da criança com os adultos e com o mundo exterior. Assim, o sistema de reações circulares permanece atuando e, de certa forma, podemos afirmar que se mantém como o principal sistema de aprendizado do ser humano. Isto significa que aprendemos a falar repetindo o que ouvimos. Significa também que damos o sentido àquelas palavras aquilo que conseguimos entender que significam. Porém, a evolução e o desenvolvimento intelectual passam a perceber coisas que são condicionais: as crianças podem brincar com uma caixa como se fosse uma casinha, podem fingir que estão andando de motocicleta ou dirigindo um automóvel. É a fase do faz de conta. Isto acontece por causa da evolução da inteligência sensório-motora, designando significantes a símbolos e, posteriormente significados. Os símbolos nascem dos próprios objetos. Assim como uma mão é uma mão, um copo é um copo, a percepção da representação de uma mão ou de um copo é entendida pela criança. Não é por acaso que as escritas antigas começaram como coleções de desenhos. Os símbolos passaram a ter determinados sentidos significantes, decorrentes das reações circulares que todas as pessoas adultas tinham ao lidar com estes objetos. À medida que a criança imita os comportamentos adultos, os significantes são determinados por práticas sociais que são adotadas apenas por convenção (por exemplo, não cuspir no chão) e, portanto, são diferidas; ou, por então, são internalizadas. Os significantes surgem por causa das práticas sociais das quais o indivíduo se apropria através da imitação: isto acontece através de comportamentos diferidos (adiados) ou internalizados (manejo de imagens mentais). A diferença entre um comportamento diferido e um comportamento internalizado é que o comportamento diferido faz com que você faça alguma coisa por imitação sem saber por que motivo. Por exemplo, quando você lava as mãos antes de comer sem saber por que tem de lavar as mãos. No comportamento internalizado, você sabe que tem de lavar as mãos, porque as mãos sujas podem levar bactérias para dentro do seu corpo. Os significados surgem quando conseguimos atribuir valores qualitativos tanto aos objetos quanto às ações. À medida que atribuímos valores às reações circulares e percebemos que o mesmo gesto tem resultados diferentes em situações diferentes, criamos os significados. No estágio inicial de aprendizado sobre si mesmo e sobre o mundo, a criança faz o movimento de assimilação e depois, acomodação. Por exemplo, uma bola serve para rolar e pode ser jogada. Se
  • 27. 27 ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO exercitarmos nosso braço com a bola, ela vai voar e depois rolar até parar. Isto vai nos dizer quanto de força precisamos para jogar a bola a uma determinada distância. Quando a criança aprende o significado, ela vai perceber que jogar a bola no rosto de outra pessoa resulta numa reação de raiva. Por outro lado, jogar a bola para perto de outra pessoa, vai significar um convite para a interação entre as duas pessoas. Estes são os valores que acabam criando um novo repertório para a criança e sobre o qual ela pode refletir e tomar decisões antes de realmente jogar uma bola. 1.4 Descobertas feitas a partir das ideias de Piaget Piaget conseguiu perceber e descrever o desenvolvimento da fase sensório-motora observando inicialmente seus três filhos. Outros pesquisadores resolveram verificar se este processo ocorre da mesma forma em populações diferentes. Constataram, então, que Piaget tinha razão. Mas também foram detectadas algumas diferenças no tempo de desenvolvimento das crianças, principalmente por causa do tipo de estímulo que elas recebiam e do meio ambiente em que elas se encontravam, além da forma que eram criadas. Os psicólogos descobriram que os bebês têm, na verdade, mais capacidade de entender o mundo do que Piaget verificou. A coordenação intersensorial (entre os sentidos) aparece desde os primeiros dias de vida. E, se o objeto constitui algo significativo para a criança, ela percebe este objeto mais cedo do que Piaget supunha. O que Piaget imaginava que acontecia em função da competência cognitiva foi verificado, posteriormente, que acontece por causa do desenvolvimento das execuções motoras. Piaget afirmou que as crianças não procuram um objeto, pois não formaram ainda uma representação do mesmo. Outros pesquisadores afirmam que isto acontece porque a criança não desenvolveu ainda a habilidade motora para pegar o objeto. Por exemplo, bebês de nove meses conseguem levantar um obstáculo para buscar um objeto escondido debaixo dele, mas um bebê de cinco meses não consegue fazer a mesma coisa porque ainda não desenvolveu a habilidade motora para tal. Por outro lado, os estudos de Piaget sobre a função simbólica foram confirmados com dados de pesquisas mais recentes. A construção da função simbólica é a elaboração do conhecimento sobre a realidade. Seus dois aspectos principais são a representação e a comunicação. Os símbolos são instrumentos criados para facilitar a relação interpessoal. A permanência do objeto, ou simplesmente a ideia de uma coisa, acontece quando o objeto é, na verdade, uma pessoa relacionada à criança. O final desta fase acontece ao mesmo tempo em que acontecem os ajustes entre a comunicação pré-linguística da mãe e seu filho. O momento em que ela começa a falar chamamos de aquisição da linguagem. 1.4.1 O desenvolvimento nas demais idades Piaget ainda escreveu sobre a evolução da criança até a adolescência. Ele sugeriu que, entre os dois anos e os onze anos, aconteciam três estágios distintos. Entre os dois anos e os sete anos acontece o estágio pré-operacional. Neste estágio, predomina o pensamento mágico e as habilidades motoras se desenvolvem. As crianças parecem ainda não conseguir realmente ter
  • 28. 28 Unidade I um pensamento lógico. Mesmo que eles entendam operações lógicas, não conseguem realmente formular ideias lógicas. Durante esta fase, o egocentrismo se faz ainda muito presente, mas com o tempo começa a diminuir. Aosseteanosdeidadecomeçaoestágiooperacionalconcreto.Ascriançascomeçamadesenvolver o pensamento lógico, mas ainda são muito concretos em seu pensamento. Isto significa que o pensamento mágico é contraposto pela verificação de coisas que realmente existem e podem ser comprovadas. As crianças já conseguem abrir mão de seu egocentrismo e atuar mais socialmente. Esta fase dura aproximadamente até os onze anos de idade. Entre os onze e dezesseis anos, o jovem começa a desenvolver o pensamento abstrato. Também durante estes anos, desenvolvem uma forma lógica de pensar. Piaget não forneceu uma descrição concisa do processo de desenvolvimento como um todo. De uma forma geral, ele descreveu o desenvolvimento como ciclos. Primeiro a criança realiza ações com os objetos, em seguida aprende a organizar os objetos. Ela é capaz de observar as características da ação e seus efeitos. Através de ações repetidas, eventualmente com algumas variações ou em contextos diferentes, ou até mesmo com diferentes tipos de objetos, a criança aprende a diferenciar e a integrar os efeitos de suas ações. Este processo foi denominado por Piaget como de “refletir sobre abstrações”. Isto significa que a criança não só consegue identificar a propriedade de um objeto, mas também percebem como as ações conseguem afetá-las. A isto ele deu o nome de “abstração empírica”. Repetindo esse processo de experimentação com uma grande variedade de objetos e muitas ações, a criança acaba por estabelecer um novo nível de conhecimento e percepção interna – a internalização. Isto permite a evolução para um novo “estágio cognitivo”. Assim, a criança consegue construir novas formas de lidar com os objetos e com os novos conhecimentos sobre estes objetos. Depois que a criança construiu os novos tipos de conhecimento, ela começa a utilizá-los para realizar ações ainda mais complexas, usando objetos mais complexos. A criança começa a reconhecer padrões cada vez mais complexos e perceber novamente objetos ainda mais complexos. Este processo de construção do conhecimento evolui até que ela atinja uma etapa superior de percepção do mundo. Porém, este processo de construção do conhecimento não é gradual. Quando um novo nível de conhecimento, organização e visão de mundo prova ser eficaz, a criança generaliza para outras áreas. Como resultado, as transições entre os estágios tendem a ser rápida e radical. A maior parte do tempo gasto no processo da construção de uma nova etapa consiste em refinar esse novo nível de cognição. Quando acontece a passagem entre um nível de conhecimento e o próximo, Piaget sugeriu que existe a formação de uma gestalt. Gestalt é uma palavra alemã que significa originalmente forma. Porém, a ideia da gestalt é que existe uma forma organizada a partir da cognição de ideias, imagens e experiências. Como este processo de construção do conhecimento acontece de uma forma dialética, a cada nova etapa a criança consegue distinguir mais e melhor as coisas. Assim, surge a integração e a síntese de ideias contidas nas estruturas anteriores de percepção cognitiva. Cada nova etapa surge porque a criança assume para si as realizações da cultura da sociedade em que vive.
  • 29. 29 ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO OmodelodePiagetexplicanãoapenasaformacomoadquirimosoconhecimento,mastambémcomo refletimossobreoqueaprendemos,porissoéqueelesetornoutãoimportanteparaodesenvolvimentoda educação. Demonstrando como as crianças evoluem na sua compreensão das coisas, agindo e refletindo sobre os efeitos que seu próprio conhecimento anterior proporcionava para o entendimento, é que elas são capazes de seguir organizando seus conhecimentos em estruturas cada vez mais complexas. Assim, quando uma criança consegue reconhecer os animais precisamente, ela adquire a capacidade de organizá-los em diferentes tipos e grupos como “pássaros”, “peixes”, e assim por diante. Isto é importante porque elas se tornam capazes de saber coisas sobre um animal desconhecido, simplesmente baseadas no fato de que aquele animal é um pássaro – e que todo pássaro bota ovos. Ao mesmo tempo, refletindo sobre suas próprias ações, a criança desenvolve uma consciência cada vez mais sofisticada das “regras” que governam as coisas. É assim que Piaget explica a crescente consciência da criança das noções como “direita”, “válido”, “necessário”, “adequada”, e assim por diante. Em outras palavras, é através do processo de objetivação, reflexão e abstração que a criança constrói os princípios onde a ação não é apenas eficaz ou correta, mas, principalmente, justificada. 2 A EPISTEMOLOGIA GENÉTICA De acordo com Jean Piaget, a epistemologia genética constitui-se das tentativas de explicar o conhecimento, e do conhecimento científico em particular, com base na sua história, na sua sociogênese e, especialmente, nas origens psicológicas das noções e operações sobre as quais elas se baseiam. Piaget acreditava que ele poderia testar as questões epistemológicas, estudando o desenvolvimento do pensamento e da ação com as crianças. Como resultado, ele criou um campo novo de estudo conhecido como epistemologia genética. Ele definiu este campo como o estudo do desenvolvimento da criança como um meio de responder a questões epistemológicas (da construção do conhecimento). 2.1 Os esquemas Segundo Piaget, um esquema é um conjunto estruturado de conceitos. Segundo suas ideias, é a construção de esquemas que leva a formação da gestalt. Um esquema pode ser usado para representar objetos, cenários e sequências de eventos ou relações. Esta ideia foi proposta originalmente pelo filósofo Emanuel Kant como estruturas inatas que usamos ​​ para nos ajudar a perceber o mundo. À medida que ele pretendeu unificar a biologia e o conhecimento, Piaget propôs uma eventual microestrutura física dos esquemas. Ele sugeriu que talvez existam possíveis incorporações físicas do aprendizado no DNA das pessoas. Hoje, sabemos que é justamente o contrário: o DNA das pessoas determinam seus limites e suas habilidades. Suas infinitas combinações determinam aquilo que a pessoa consegue aprender com mais facilidade, porque tem mais disposição genética para uma determinada coisa. Por outro lado, sabemos que todos os seres humanos são 99,9% geneticamente iguais e toda nossa diferença está em poucos genes. Portanto, podemos afirmar que a capacidade de aprender está presente em toda criança, independente de qualquer contexto racial ou cultural. Piaget foi, sem dúvida, um dos mais influentes psicólogos do desenvolvimento e do comportamento, influenciando não apenas o trabalho de Lev Vygotsky e de Lawrence Kohlberg, mas gerações inteiras
  • 30. 30 Unidade I de acadêmicos. Embora suas ideias tenham sido investigadas por centenas de cientistas em todo mundo, gerando novos conhecimentos, a qualidade do seu modelo original é indiscutível. Durante os anos 1970 e 1980, seus trabalhos também inspiraram a transformação da educação nos países europeus e americanos, inclusive no Brasil. Com uma abordagem mais “centrada na criança”, Piaget afirmava: Educação, para a maioria das pessoas, significa tentar levar a criança a se parecer com um adulto típico de sua sociedade, mas para mim e mais ninguém, a educação significa fazer criadores. Você tem que fazer os inventores, os inovadores, os não conformistas (Piaget apud BRINGUIER, 1980, p. 132). A influência de Piaget é mais forte na educação infantil e na educação moral. Sua teoria do desenvolvimento cognitivo pode ser usada como uma ferramenta na sala de aula da primeira infância. De acordo com Piaget, as crianças se desenvolvem melhor em sala de aula a partir da interação. Ele acreditava em dois princípios básicos relativos à educação moral: que as crianças desenvolvem ideias morais em etapas e que as crianças criam suas concepções do mundo. De acordo com Piaget, “a criança é alguém que constrói sua própria visão de mundo moral, que forma ideias sobre o certo e errado, justo e injusto, que não são o produto direto do ensinamento dos adultos e que muitas vezes são mantidos para responder aos desejos adultos” (GALLAGHER, 1978, p. 26). Piaget acreditava que as crianças fazem julgamentos morais com base em suas próprias observações do mundo. A teoria de Piaget sobre a moral foi tão radical quando o seu livro, O juízo moral da criança, publicado em 1932. Ele utilizou critérios filosóficos para definir a moralidade (como critérios universais, generalizáveis e aplicáveis) e rejeitou a equivalência das normas culturais com as normas morais. Piaget, com base na teoria kantiana, propôs que a moralidade se desenvolveu a partir da interação entre pares e que era autônoma de mandatos de autoridade. Em outras palavras, são pessoas que se acreditam como iguais (pares), que criam as regras de convivência, que servem de forma igual para eles e incluem todos aqueles que se entendem como pares uns dos outros. Os pares, e não os pais, são a principal fonte de onde derivam os conceitos morais como a igualdade, a reciprocidade e a justiça. Piaget atribuiu diferentes tipos de processos psicossociais a diferentes formas de relações sociais. Ele introduziu uma distinção fundamental entre os diferentes tipos de relacionamentos: quando um dos participantes tem mais poder do que o outro, ele cria restrições e a relação se torna assimétrica (desigual). O que acontece é que o conhecimento que poderia ser adquirido por todos acaba assumindo uma forma fixa e inflexível pelo participante dominado. Só permitem a ele aprender determinadas coisas e alguns conceitos. Piaget refere-se a este processo como o de transmissão social, ilustrando-o através da referência ao modo pelo qual os mais velhos de uma tribo iniciam os membros mais jovens, com o intuito de fazê-los respeitarem as crenças e as práticas do grupo. Da mesma forma que os adultos exercem uma influência dominante sobre a criança que cresce, é através da transmissão social que as crianças podem adquirir conhecimento.
  • 31. 31 ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO Por outro lado, nas relações de cooperação, o poder é mais uniformemente distribuído entre os participantes, de forma que surge uma relação mais simétrica. Com essas condições, as formas autênticas de intercâmbio intelectual tornam-se possíveis, pois cada parceiro tem a liberdade de exibir seus próprios pensamentos e levar em consideração as opiniões dos outros, além do poder defender o seu próprio ponto de vista. Piaget acreditava que, nessas circunstâncias, quando o pensamento das crianças não é limitado por uma influência dominante, existem condições favoráveis ​​ para o surgimento de soluções construtivas para os problemas. Então, o conhecimento que emerge é aberto, flexível e regulado pela lógica do argumento, ao invés de ser determinado por uma autoridade externa. Em suma, as relações de cooperação fornecem o campo para o surgimento de operações, o que para Piaget exige a ausência de qualquer influência restritiva. Saiba mais Para uma leitura fácil e muito interessante, além de propiciar um maior conhecimentosobreJeanPiaget,sugerimosolivroPiagetparaprincipiantes, escrito por Adriana Serulnikov e Rodrigo Suárez em 1999 e publicado em 2001. O livro pode ser encontrado em livrarias e bibliotecas, inclusive em sebos. 2.2 Síntese do pensamento piagetiano A preocupação de Jean Piaget foi tentar explicar como a criança pensava e interagia com o mundo e com as pessoas, para adquirir conhecimento. Ele definiu que o conhecimento é construído a partir da interação do sujeito com o objeto de aprendizagem. Ele ensinou a observar a maneira como a criança adquire o conhecimento, para que seja possível entender o conhecimento humano. Seus estudos da psicologia do desenvolvimento e a epistemologia genética tinham o objetivo de entender como o conhecimento evolui. Piaget formulou uma teoria: o conhecimento evolui progressivamente por meio de estruturas de raciocínio que se superpõem, criando assim estágios do conhecimento. Portanto, é preciso entender que a lógica e a forma de pensar da criança são completamente diferentes da lógica de um adulto. À medida que cresce, a criança constrói seu conhecimento. Daí o nome construtivismo. Jean Piaget identifica quatro estágios da evolução mental da criança: cada estágio marca um período em que o pensamento e o comportamento infantil são caracterizados por uma forma de raciocínio. As autoras Telma Weisz e Ana Sanches (1999) reafirmam a contribuição de Piaget para a mudança de concepção e de olhar sobre a aprendizagem, existentes até a sua época. Até o início do século XX, acreditava-se que as crianças eram miniadultos e que somente depois de crescidas chegariam ao nível dos adultos, que eram considerados superiores mentalmente. Acreditava-se também que seus processos cognitivos eram iguais aos do adulto, mas em proporção menor por serem pequenas.
  • 32. 32 Unidade I Piaget concluiu, por meio de suas pesquisas, que as crianças pensavam muito diferente dos adultos, pois o que faltava para elas era certas habilidades. Sua contribuição foi explicar a maneira como a criança interage com o mundo e com as pessoas para chegar ao conhecimento. É, portanto, a interação do sujeito com o objeto de aprendizagem que produz o conhecimento. Lembrete Antes de passar para o próximo autor, é importante lembrar que assim nasce a concepção da teoria epistemológica: o construtivismo, a qual estuda a gênese do conhecimento infantil. 3 LEV SEMËNOVIČ VYGOTSKY Lev S. Vygotsky nasceu em 1896, graduou-se em Literatura pela Universidade de Moscou. Foi professor, pesquisador e palestrante de literatura, pedagogia e psicologia. Ele era contemporâneo de Piaget, e viveu na Rússia até os 37 anos de idade, quando faleceu de tuberculose. AspesquisasdeVygotskyapontaramparaopapeldalinguagemedaaprendizagemnodesenvolvimento do indivíduo, cujo pensamento se constrói em um ambiente histórico-cultural. Para Vygotsky (1984), a relação do homem com o mundo não é direta, mas mediada. O professor é um mediador entre o aluno e o conhecimento. Ele investigou o desenvolvimento das capacidades intelectuais superiores do homem e identificou a linguagem como o principal fator do crescimento. Definia a linguagem como um conjunto de símbolos que mantinha seu caráter histórico e social. Simpatizante da Revolução Russa, ele acreditava na possibilidade de uma sociedade mais justa e sem conflito social ou exploração. Sua teoria estava fundamentada no desenvolvimento do indivíduo como resultado de um processo sócio-histórico. Ele enfatizava o papel da linguagem no desenvolvimento e, portanto, sua tese foi considerada histórico-social. Vygotsky também enfatizava o papel da formação escolar, quando a criança, segundo ele, recebe informações que foram socialmente construídas (experiências pessoais no contexto social) e transforma as situações do presente, ou adquire consciência a respeito da situação do presente. Seu ideal era que, se uma transformação social pode conseguir alterar o funcionamento cognitivo, ela pode reduzir o preconceito e os conflitos sociais. Os processos psicológicos são de natureza social e, portanto, precisam ser analisados e trabalhados por meio de ações socialmente elaboradas. O sustentáculo da concepção de Vygotsky está no conceito de mediação, que é o processo de intervenção de um elemento intermediário numa relação, que passa de direta (sujeito x objeto) para indireta (sujeito x mediador x objeto) (Rosa, 2003). No contexto escolar, tais ideias modificaram a perspectiva da relação entre professor e aluno.
  • 33. 33 ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO Observação Você consegue perceber que Vygotsky interfere no conceito de alfabetizar? Ele faz surgir a concepção de letramento, que mais tarde foi muito defendida por autores como Magda Soares, que produziu um livro didático para esse contexto. Nessa concepção, também defendida por Marta Koll de Oliveira (1993), a relação adulto x criança não é binária, não envolve somente aluno-professor. Também não existe domínio de um sobre o outro, pois muitas “coisas” (informações) circulam nesse espaço relacional. A socialização, que é a troca de significados aprendidos e transformados, dialoga construindo saberes e dizeres. A intersubjetividade, a simpatia e a oposição gerada pelos conflitos se transformam em relações que mudam o paradigma da situação professor-aluno. Não se nega que existam as reações biológicas defendidas por Piaget, mas entende-se que a redução destas é uma condição para os eventos psicológicos defendidos por Vygotsky no conceito da percepção: A criança no início de sua vida tem apenas sensações orgânicas – tensão, dor, calor –, principalmente nas áreas mais sensíveis. Quando a criança deixa de sofrer influência desses processos biológicos, passa a perceber a realidade. A percepção da realidade requer processos biológicos como determinantes de experiência, permitindo que seu organismo passe a ser afetado por fatores externos. Evidentemente, só a realidade dos fatores externos não determina completamente essa percepção. A informação de que esses processos biológicos tornam-se disponíveis no organismo é organizada pela própria criança por meio de experiência social e cultural. A criança passa a ver o mundo com sua própria visão, administrando sob seu ponto de vista (VYGOTSKY, 1984, p. 78). Um conhecimento só se solidifica quando resulta em um instrumento de pensamento. A criança avança na aquisição de conceitos quando domina o abstrato e combina-o com um pensamento mais complexo. Com os passar do tempo, os conceitos tornam-se concretos e somam-se às habilidades adquiridas socialmente. Para ele, método é algo para ser praticado e não aplicado como o fim que justifica os meios, ou seja, não é ferramenta no alcance de resultados. Ferramenta e resultados se integram, ou se misturam e se somam, na aprendizagem. Vygotsky elaborou o conceito de “zona de desenvolvimento proximal” (distância entre o nível real – solução independente de problema – e o nível de desenvolvimento potencial – determinado por meio da solução de problema com a intervenção de alguém com mais experiência). Sua problemática era: quando o ser humano deixa de ser apenas biológico para se tornar sócio- histórico?
  • 34. 34 Unidade I Acredita-se que, para o bem da evolução educacional dessas propostas, o ideal é não diferenciá- las, nem privilegiar uma ou outra em função dos dois teóricos (Piaget e Vygotsky). Bom é entender que cada um deles se aprofundou em aspectos específicos do desenvolvimento humano. Piaget dedicou seus estudos na pesquisa do sujeito cognoscente, e Vygotsky estudou o sujeito social (histórico). Hoje, se fala muito em propostas pedagógicas que sejam capazes de ver a criança como ser integral, global. Assim, não se pode negar que ambos trazem contribuições para a criança biopsicossocial, ou seja, a criança real. 4 EMÍLIA FERREIRO Ainda na linha de pensamento dos autores representantes do construtivismo, temos o nome de maior influência na reformulação metodológica da educação brasileira: Emilia Ferreiro. Emilia Ferreiro é psicóloga e pesquisadora. Nasceu na Argentina, em 1942 e é radicada no México. Fez seu doutorado na Universidade de Genebra e recebeu orientação de Jean Piaget, seu grande mestre. Professora na Universidade de Buenos Aires, em 1974 começou os trabalhos que mais tarde deram origem à sua tese: psicogênese da língua escrita, grande marco na transformação do conceito de aprendizagem da escrita pela criança. Ela foi uma referência no Brasil e seu nome ficou ligado ao conceito do construtivismo. Sua influência atingiu as normas governamentais para a alfabetização, incorporadas nos Parâmetros Curriculares Nacionais. Lembrete Você se lembra dos estudos de Piaget? Se julgar importante, pare aqui e releia o item sobre Piaget. A maneira desordenada como essas ideias foram introduzidas, no entanto, caracterizou a falta de fundamentação teórico-epistemológica, causando confusões teórico-práticas, das quais só atualmente o professor tem conhecimento. O construtivismo foi interpretado como condenatório a tudo o que era habitual na escola até então, às práticas tradicionais de entender a alfabetização. As obras de Ferreiro (1985) causaram uma revolução na maneira de alfabetizar, demonstrando a evolução da psicogênese da escrita infantil, ou seja, ela construiu um pensamento para ajudar na interpretação da evolução da escrita infantil. Tal pensamento não é uma metodologia, como muitos acreditaram, e sim um olhar para o erro construtivo da criança, que começa a entender que uma porção de marquinhas no papel é chamada no mundo adulto de escrita e que isso é parte de um código: “língua escrita”.
  • 35. 35 ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO Figura 8 – Língua escrita O termo psicogênese, cujo significado precisa ser relembrado no desmembramento da palavra (psico = psicológico e gênese = nascimento), deveria ter a seguinte interpretação: como nasce na criança o interesse pela escrita? Como seu pensamento evolui a cada conquista? Ela pensa para escrever? Levanta hipóteses? Quais seriam essas hipóteses? O ponto forte da caminhada construtivista foi a obra Reflexões sobre a alfabetização (1985). As concepções piagetianas traziam severas críticas aos métodos tradicionais (cartilhas), fato que gerou muito tumulto na escola brasileira. Ferreiro disse que a escola prestava atenção no aspecto gráfico da escrita, ignorando aspectos construtivos, ou seja, era mais importante ter letra bonita do que interpretar a escrita. O que deveria interessar seria, na sua visão, o que a criança quis representar, os meios utilizados para a representação e as diferenças entre uma primeira e uma segunda tentativa, para que se possa perceber a evolução de cada passo durante a rotina de escrita escolar. Os processos de construção e aprendizagem das crianças levaram a conclusões que abalaram os métodos tradicionais de ensino da leitura e da escrita. A trajetória da alfabetização pode ser dividida em antes e depois de Emilia Ferreiro. Ela se tornou o modelo no ensino brasileiro, fundamentada pelas descobertas do biólogo suíço Jean Piaget (1896- 1980), na investigação dos processos de aquisição e elaboração de conhecimento pela criança – ou seja, o modo pelo qual ela aprende. Suas pesquisas concentram-se nos mecanismos cognitivos relacionados à leitura e à escrita. De maneira equivocada, muitos consideram o construtivismo um método, ou seja, não entenderam que a escola deveria dar oportunidade para a criança aprender. A criança vive em mundo letrado e está submersa em um processo de letramento muito forte. Ela se vê continuamente envolvida e observadora desse mundo letrado. As contribuições de Ferreiro quanto às concepções relativas ao ensinar/aprender, que professoras conseguiramapreenderdoparadigmapsicogenéticodeconstruçãodaescrita,sãoconcepçõesancoradas, sobretudo, em Piaget. Elas evidenciam que, na relação do sujeito epistêmico – o alfabetizando, por exemplo – com o objeto do conhecimento – a língua escrita – o sujeito transforma esse objeto pela
  • 36. 36 Unidade I assimilação, com base nos seus conhecimentos prévios. Depois de assimilado o conhecimento, o sujeito é transformado pelo objeto – a acomodação – porque construiu novos conhecimentos e, consequentemente, (re)construiu aqueles já existentes. Como parte dessas concepções relativas ao ensinar/aprender, emergiram do discurso de professoras, quatro subcategorias: a) Compreensão do processo de alfabetização; b) Concepções de hipóteses de escrita / Níveis de conceitualização da escrita; c) Visão do erro construtivo; d) Noção de conflito cognitivo. Essas concepções relativas ao ensinar/aprender – que constituem o âmago do paradigma psicogenético – estão intrinsecamente ligadas dentro do processo construtivo da lecto-escrita. Figura 9 – Desenho De maneira eficaz, a abordagem psicogenética de alfabetização permitiu ao professor alfabetizador – não só de crianças – uma visão da singularidade do processo de cada alfabetizando, durante a apropriação do conhecimento pelo sujeito. As particularidades do processo de construção da escrita são próprias de cada indivíduo e são marcadas pelas hipóteses de escrita / níveis de conceitualização; conflito cognitivo; erro construtivo. Segundo Ferreiro (1985), os níveis de escrita e as diversas hipóteses elaboradas pelo alfabetizando no processo de construção estão inseridas nos três grandes períodos de construção supracitados. As produções escritas são marcadas pelas hipóteses cognitivas subjacentes a essas produções. Por essa razão, as produções que antecedem à escrita alfabética não correspondem à escrita padrão porque, ali, nenhum ou nem todos os fonemas das sílabas estão representados. Desse modo, embora a produção seja correta do ponto de vista da hipótese que a gerou, por não corresponder à escrita padrão é considerada erro, mas um erro construtivo. Por exemplo, todas as escritas pré-silábicas – sejam elas indiferenciadas, diferenciadas intra e interfiguralmente – são consideradas “erro” sob a
  • 37. 37 ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO perspectiva da escrita alfabética padrão; todavia, considerando a construção cognitiva/hipótese que a gerou, esse erro passa a ser considerado construtivo. 4.1 Concepções que a criança possui e os níveis conceituais linguísticos 4.1.1 As fases da escrita infantil Emília Ferreiro (1996) realizou pesquisas científicas que deixaram nítida a trajetória de pensamento da criança enquanto constrói o código linguístico, aprende o que a escrita representa e como se estrutura. A partir das suas investigações, a educação começou a tomar novos rumos, ao perceber o processo de conhecimento infantil e, especificamente a escola, ao entender a reconstrução do processo de alfabetização. Consciente de sua função, a escola pode realizar um trabalho pedagógico enfatizando a construção da linguagem (gesto, som, imagem fala e escrita). 4.1.2 Níveis conceituais linguísticos Se perguntarmos ao adulto sobre a forma que as crianças adquirem a aprendizagem da leitura e da escrita, vários responderão que é pelo ajuntamento das sílabas até formar as palavras. Muitos ainda não conseguem entender por que algumas crianças aprendem e outras não, e permanecem na aprendizagem da cartilha. Emília Ferreiro, quando estudou as concepções que as crianças apresentam sobre a escrita, demonstrou estas etapas, chamadas de fases ou níveis de desenvolvimento na construção do pensamento em relação à linguagem escrita: Ela estruturou em cinco os níveis conceituais: Nível 1: pré-silábico – fase pictórica, gráfica primitiva e pré-silábica. Nível 2: intermediário I. Nível 3: silábico. Nível 4: intermediário II ou silábico-alfabético. Nível 5: alfabético. Vejamos, resumidamente, um pouquinho sobre cada nível. Nível 1 – Pré-silábico A fase pictórica: é o registro feito pela criança com garatujas, desenhos sem figuração e, mais tarde, desenhos com figuração. Inicia-se aos dois anos de idade se a criança vive em um ambiente urbano que a estimula desde cedo ao uso de caneta ou lápis e papel.
  • 38. 38 Unidade I Figura 10 – Fase pictórica A fase gráfica primitiva: a criança mistura símbolos e pseudoletras, com letras e números em seus desenhos. Costuma representar o que a criança conhece do meio e o representa desenhando bolinhas, riscos e pedaços de letras. Figura 11 – Fase gráfica primitiva A fase pré-silábica: nesta fase, a criança começa a diferenciar as letras dos números, os desenhos dos símbolos e reconhece o papel da letra na escrita. Sabe que as letras servem para escrever, mas não sabe como ocorre, ainda. Não associa o fonema com o grafema. A criança acredita que a ordem das letras e as vogais não têm importância. Ela não percebe variações quantitativas ou qualitativas dentro da palavra. A leitura que a criança realiza do que é escrito é sempre de uma forma global deslizando o dedo pelo registro escrito. Figura 12 – fase pré-silábica
  • 39. 39 ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO Nível 2 – Intermediário I Essa fase é a dos conflitos, em que a criança não tem resposta para alguns questionamentos e diz que “não sabe escrever”. Ela apresenta e usa alguns valores sonoros convencionais, por exemplo, diz que seu nome começa com determinada letra e a conhece pelo som, mas não sabe onde fica na palavra que escreve. Figura 13 – Nível intermediário I Nível 3 – Silábico A criança conta os “pedaços sonoros” (sílabas) e os associa com um símbolo (letra). Essa associação pode acontecer com ou sem valor sonoro convencional. Ela aceita palavras monossílabas, palavras com uma ou duas letras com certa hesitação. Escreve uma frase utilizando uma letra para cada palavra. Figura 14 – Nível silábico Nível 4 – Intermediário II ou silábico-alfabético Este é mais um momento de conflito entre uma fase e outra, em que a criança precisa desconsiderar o nível silábico para pensar segundo o nível alfabético. Nessa fase, o professor deve instigar a criança no sentido de reflexão sobre o sistema linguístico pela observação da escrita alfabética.
  • 40. 40 Unidade I Nível 5 – Alfabético Quando a criança chega nessa fase, já reconstrói o sistema linguístico e compreende como ele funciona, consegue ler e expressar seus pensamentos e falas. Forma sílabas e palavras juntando as letras e consegue distinguir letra, sílaba, palavra e frase. Pode acontecer de a criança dividir a frase não gramaticalmente, e sim conforme o ritmo frasal. Figura 15 – Nível alfabético A alfabetização exige conhecimento, habilidade e competência para dar condições à criança de construir seus conhecimentos. O professor não pode somente fazer a transmissão do alfabeto, da junção de letras e palavras, sem preocupar-se com a função da escrita, sem possibilitar o uso da linguagem escrita pela criança. As teorias pedagógicas, as investigações e as pesquisas científicas dão suporte ao professor no planejamento e na atuação em sala de aula, quando o ajudam a conhecer as crianças, como pensam e suas hipóteses na tentativa de resolver seus conflitos. Com o conhecimento científico na área educacional, o professor tem condições de elaborar aulas de forma a chamar a atenção do aluno, com propostas significativas, com jogos e atividades que instiguem o aluno a pensar e a reformular suas hipóteses. Não podemos ignorar o papel do professor em ser o mediador e o organizador da ação educativa, da construção e reconstrução dos conhecimentos de seus alunos em sala de aula. Além desses pensadores, nas últimas duas décadas, outro termo tem gerando inconstância na prática pedagógica quando o assunto é alfabetização. O chamado letramento, como você viu no início desta unidade de estudo, é definido como possibilidades sociais de uso da escrita, como sistema simbólico, em contextos específicos. A vivência escolar, quando utilizada como parâmetro de prática social segundo a qual as crianças se alfabetizam, desenvolve estas habilidades para utilizar o conhecimento sobre a escrita. Você saberá mais sobre esse conceito na unidade II.