1) A virtualização das relações sociais é um fenômeno crescente com o avanço das tecnologias de comunicação, que permitem novas formas de interação e comunidades online.
2) As redes sociais desempenham um papel importante na virtualização das relações, permitindo que pessoas se conectem e mantenham relacionamentos mediados pela tecnologia.
3) No entanto, questões sobre a autenticidade e transparência surgem nessas novas relações virtuais, à medida que informações sobre identidades e vidas pessoais são
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Virtualização das Relações Sociais
1. 1
A VIRTUALIZAÇÃO DAS RELAÇÕES SOCIAIS
Virtualization of social relations
Hélder Pereira
“Bem-vindos à nova morada do género humano. Bem-vindos aos caminhos do virtual.”
(LÉVY, 1996)
Resumo: Esta reflexão insere-se no desenvolvimento da atividade número quatro da unidade curricular Educação
e Sociedade em Rede, do mestrado em Pedagogia do Elearning da Universidade Aberta. O objetivo é
refletir sobre a virtualização das relações sociais. Partindo dos conceitos de sociedade em rede,
cibercultura e virtualização do real, procura-se analisar, fundamentadamente, as questões de
autenticidade e transparência nestas novas relações sociais que se desenvolvem, bem como avaliar estas
qualidades nas informações que se estabelecem na rede. Foram aplicados questionários no Google
Forms®, distribuídos na rede social Facebook®, para se identificar o tipo de utilização que os inquiridos
dão às redes sociais e averiguar sobre a virtualização das suas relações sociais (n=113). Constatou-se a
importância das tecnologias para as relações sociais nos nossos dias, bem como a necessidade de se
estabelecerem medidas de segurança no relacionamento na rede.
Palavras-chave: Virtualização, Autenticidade, Transparência, Sociedade em Rede, Cibercultura, Comunicação,
Informação, Relações Sociais.
Abstract: This discussion focus in the development of the fourth activity of the curricular unit Educação e Sociedade
em Rede, for the masters degree in Elearning Pedagogy at Universidade Aberta. The goal is to discuss the
virtualization of social relations. Based on concepts of network society, cyberculture and virtualization of
the real, we looked up to analyze, on reasonable grounds, the authenticity and transparency issues in
these new social relations and evaluate these qualities in information which are established on the
network. Questionnaires were developed on Google Forms® and applied on the social network
Facebook®, to identify the kind of use that respondents provide to social networks and verify about the
virtualization of their social relations (n=113). It was noted the importance of technology for social
relations today, as well as the need to establish security measures in the relationship in the network.
Keywords: Virtualization, Authenticity, Transparency, Network Society, Cyberculture, Communication, Information,
Social Relations.
1. INTRODUÇÃO
Com o advento das novas tecnologias de informação e comunicação, associadas a uma nova
reestruturação de formas de capitalismo, uma nova sociedade surge e se desenvolve, a
designada sociedade em rede (CASTELLS, 1999). Com a Internet, todo um conjunto de interações
se evidencia e torna o mundo mais próximo, mais rápido e mais conectado. Assim, colocam-se
várias questões ligadas a esta virtualização das relações sociais, agora fortemente mediadas
pelas novas tecnologias.
O objetivo fundamental desta reflexão é sintetizar as pesquisas efetuadas, associadas à
virtualização das relações sociais, para a atividade número quatro da unidade curricular
Educação e Sociedade em Rede, do mestrado em Pedagogia do Elearning da Universidade
Aberta. Estas pesquisas terão em conta questões associadas à virtualização das relações sociais,
mas também observar a autenticidade e a transparência destas, bem como da informação que
veicula e se propaga na rede.
No desenvolver das pesquisas, suscitou-nos a curiosidade em aprofundar um pouco mais
intimamente esta virtualização, lançando um desafio: identificar o tipo de utilização que se dá
às redes sociais e averiguar sobre a virtualização das suas relações sociais. Para o efeito, foi
2. 2
Virtualização das Relações Sociais
desenvolvido um questionário no Google Forms® e aplicado a alguns contactos da rede social
Facebook® (n=113), com os seus resultados triangulados e analisados.
2. CONTEXTUALIZAÇÃO
Atualmente vivemos a cibercultura, que altera e redimensiona as relações sociais, virtualizando-
as e desmaterializando-as. Desta forma, a cibercultura é o desenho deixado pelo traçado das
novas tecnologias na sociedade e na cultura, que proporciona o aparecimento de um mundo
novo, mais global e conectado, que se desenvolve num ciberespaço em constante mutação
(LÉVY, 2000).
Assim, a cibercultura é entendida por Lévy (2000) como “o conjunto de técnicas (materiais e
intelectuais), de práticas, de atitudes, de modos de pensamento e de valores que se
desenvolvem juntamente com o crescimento do ciberespaço”.
As redes interativas promovidas pelos computadores não param de crescer, criando consigo
novas formas e novos canais de comunicação, regulando a vida, mas também sendo regulados
por ela (CASTELLS, 1999). Bastaria pensarmos no fenómeno das redes sociais, que demonstra
em grande escala uma reconfiguração evidente do espaço social. Poderíamos então remeter
para um processo atual de desmaterialização do espaço, bem como para a rapidez temporal que
se associa ao ciberespaço (AMARAL, 2008).
Neste mundo tecnológico e digital, várias são as organizações que deslumbram uma forma de
se construírem referências de reconhecimento, de apresentação, de sociabilidade, de criação e
manutenção de uma imagem socialmente aceite (COSTA, 2006).
Como génese do género humano, temos o facto de todos sermos seres sociais. Como tal, seria
muito ingénuo perspetivar esta revolução tecnológica, fruto de humanos, sem impactos nas
relações sociais. Desta forma, para Castells (1999) “numa perspetiva histórica mais ampla, a
sociedade em rede representa uma transformação qualitativa da experiência humana”.
Caminhamos para uma vivência baseada em telas, locais que eliminam barreiras do tempo e do
espaço, que assustam e fascinam, onde o real já não existe (BAUDRILLARD, 1981). Fazemos parte
de uma geração claramente digital, que vivencia sensações e acontecimentos passageiros,
efémeros e em constante adaptação (KOEHLE & CARVALHO, 2013).
Podemos mesmo referir que esta efemeridade contemporânea gera novas relações com o
espaço que o Homem habita, atribuindo-lhe, novamente na História, a condição nómada e de
ser desenraizado, estruturando em rede (JUSTO, 2005).
Vários são os autores que apontam esta velocidade com uma conotação pessimista. Virilio
(1993) apresenta que nesta nova realidade uma “súbita reversão dos limites introduz, desta vez
no espaço comum, o que até o momento era da ordem da microscopia: o pleno não existe mais,
em seu lugar uma extensão sem limites desvenda-se em uma falsa perspetiva que a emissão dos
aparelhos ilumina”.
Neste contexto, torna-se interessante citar Silva (1999), no que respeita à conceção da Internet
como um lugar antropológico:
este novo espaço com áreas de privacidade - um novo mundo virtual
ou mundo mediatizado - é um suporte aos processos cognitivos,
sociais e afetivos, os quais efetuam a transmutação da rede de
tecnologia eletrónica e telecomunicações em espaço social povoado
por seres que (re)constroem as suas identidades e os seus laços sociais
nesse novo contexto comunicacional. Geram uma teia de novas
sociabilidades que suscitam novos valores. Estes novos valores, por
sua vez, reforçam as novas sociabilidades. Esta dialética é geradora de
novas práticas culturais.
Lévy e Althier (2000) constatam que “assistimos a um desses raros momentos em que, a partir
de uma nova configuração técnica, ou seja, de uma nova relação com o cosmos, inventa-se um
estilo de humanidade”.
3. 3
Virtualização das Relações Sociais
Para Kerckhove (1997):
a nossa relação de sentido único, frontal, com o ecrã do televisor
trouxe a cultura de massas. O ecrã de computador, ao introduzir
modalidades de interatividade bidirecional, aumentou a velocidade. O
efeito dos hipermedia integrados será a imersão total. Estamos à beira
de uma nova cultura profunda que está a tomar forma durante os anos
noventa. De todas as vezes que a ênfase dada a um determinado meio
muda, toda a cultura se move.
Várias questões se colocam, então, quando refletimos sobre a virtualização das relações sociais:
De que forma se figura a virtualização das relações sociais?
Será o Outro na rede autêntico?
Que EU transparece na rede?
Que cuidados se deverão ter?
E a informação que veicula pela rede, será ela fiável?
2.1. SOBRE A VIRTUALIZAÇÃO
Começando pela origem etimológica do conceito virtual, de origem latina, virtus, abrange
qualidades do Homem como coragem, valor ou mérito (virtual in Dicionário da Língua
Portuguesa com Acordo Ortográfico, 2015a). Podemos englobar tudo aquilo que existe em
forma potencial, que é simulado e estimulado pelos meios tecnológicos (virtual in Dicionário da
Língua Portuguesa com Acordo Ortográfico, 2015a).
Efetivamente, as comunidades virtuais são atualmente um fenómeno social e isso implica
constantes alterações na forma como nos relacionamos. As comunidades virtuais são, assim,
“agregados sociais nascidos na rede quando os intervenientes de um debate o levam por diante
em número e sentimento suficientes para formarem teias de relações pessoais no ciberespaço”
(RHEINGOLD, 1993).
Nestas comunidades virtuais, desenvolvemos a comunicação virtual, agora fundamental para a
nossa vida social, uma vez que, à luz de Lévy (1996):
um movimento geral de virtualização afeta hoje não apenas a
informação e a comunicação mas também os corpos, o funcionamento
económico, os quadros coletivos da sensibilidade ou o exercício da
inteligência. A virtualização atinge mesmo as modalidades do estar
junto, a constituição do “nós”: comunidades virtuais, empresas
virtuais, democracia virtual... Embora a digitalização das mensagens e
a extensão do ciberespaço desempenhem um papel capital na
mutação em curso, trata-se de uma onda de fundo que ultrapassa
amplamente a informatização.
Lévy (1996) não aceita a oposição virtual/real, preferindo estabelecer paralelismos entre o real
e o possível e entre o atual e o virtual:
Na filosofia escolástica, é virtual o que existe em potência e não em
ato. O virtual tende a atualizar-se, sem ter passado no entanto à
concretização efetiva ou formal. (...) Aqui, cabe introduzir uma
distinção capital entre possível e virtual que Gilles Deleuze trouxe à luz
em Differénce et repetition. O possível já está todo constituído, mas
permanece no limbo. O possível se realizará sem que nada mude em
sua determinação nem em sua natureza. É um real fantasmático,
latente. O possível é exatamente como o real: só lhe falta a existência.
A realização de um possível não é uma criação, no sentido pleno do
termo, pois a criação implica também a produção inovadora de uma
ideia ou de uma forma. A diferença entre possível e real é, portanto,
puramente lógica. Já o virtual não se opõe ao real, mas sim ao atual.
Contrariamente ao possível, estático e já constituído, o virtual é como
o complexo problemático, o nó de tendências ou de forças que
4. 4
Virtualização das Relações Sociais
acompanha uma situação, um acontecimento, um objeto ou uma
entidade qualquer, e que chama um processo de resolução: a
atualização. (...) A atualização aparece então como a solução de um
problema, uma solução que não estava contida previamente no
enunciado. A atualização é criação, invenção de uma forma a partir de
uma configuração dinâmica de forças e de finalidades.
O virtual é assim interpretado como a possibilidade de criação de novos sentidos.
Atualmente estamos rodeados de vivências virtuais, que nos promovem experiências
totalizantes ou multi-sensitivas. A virtualização consiste num “processo de transformação de um
modo de ser num outro” (LÉVY, 1996), que engloba uma íntima relação, impulsionada pelas
novas tecnologias, na qual se redesenha não só a sociedade, mas também a informação, a
economia e toda a convivência humana (LÉVY, 1996).
É aqui interessante relembrar o conceito de sociabilidade em Baechler (1995 apud MARCELO,
2001), que surge como “a capacidade humana de estabelecer redes através das quais as
unidades de atividades, individuais ou coletivas, fazem circular as informações que exprimem os
seus interesses, gostos, paixões, opiniões”.
Desta forma, as novas tecnologias, ao virtualizarem as relações sociais, trazem um novo desafio
a todos: reconstruir a imagem do EU e dos que o rodeia.
Um grande exemplo da virtualização das relações sociais são as redes sociais, tão em voga
atualmente. Castells (2003) refere que
as redes são estruturas abertas, capazes de se expandir de forma
ilimitada, integrando novos nós desde que consigam comunicar dentro
da rede, nomeadamente, desde que partilhem os mesmos códigos de
comunicação (por exemplo, valores ou objetivos de desempenho).
Para Thacker (2004 apud RECUERO, 2005) existem três princípios para a natureza das redes
sociais: conectividade (tudo está ligado e nada acontece de forma isolada), ubiquidade (tudo se
estabelece de forma permanente) e universalidade (as redes são universais).
Lévy (1996) humaniza o virtual, já que os utilizadores se conformam com essa virtualização e
por meio dela partilham as suas realidades. Retira-lhe, desta forma, o lado frio e maquinado da
tecnologia, conferindo-lhe um cariz de fator de sociabilização.
Para Silverstone (2002):
precisamos compreender a tecnologia, especialmente as tecnologias
da mídia e da informação, justamente nesse contexto, a fim de
aprender as sutilezas, o poder e as consequências da mudança
tecnológica. Pois as tecnologias são coisas sociais, impregnadas pelo
simbólico e vulneráveis aos paradoxos e contradições eternas da vida
social, tanto na sua criação como em seu uso.
Poderíamos também aqui integrar o dinamismo que as plataformas de mundos virtuais, como
por exemplo no Second Life®, conferem aos que mergulham nessas águas, estabelecendo
contactos, vivendo vidas que muitas vezes não vão ao encontro das designadas reais, mas que
no momento são sem dúvida atuais, verdadeiras e sentidas. Assim, o virtual é mais que
imaginário, uma vez que produz efeitos relevantes (LÉVY, 1996).
Portanto, podemos referir que o mundo real e o mundo virtual se complementam e estão
fortemente presentes na nossa vida, até porque “a virtualização é um dos principais vetores da
criação de realidade” (LÉVY, 1996), o que nos leva a refletir sobre a veracidade e a autenticidade
de tudo aquilo que vivenciamos na rede.
2.2. SOBRE A AUTENTICIDADE E A TRANSPARÊNCIA
Antes de analisarmos em concreto estes termos e o seu cariz tanto nas relações sociais, como
na informação veiculada pelos meios tecnológicos da rede, é importante relembrar, à
semelhança do realizado no subponto anterior, a origem etimológica destes dois conceitos.
5. 5
Virtualização das Relações Sociais
Desta forma, a palavra autenticidade veicula a qualidade do que é autêntico, do latim
authenticus, abrange aquilo que é verdadeiro e fidedigno (autêntico in Dicionário da Língua
Portuguesa com Acordo Ortográfico, 2015b). Transparência, por sua vez, reporta-se à qualidade
do que transmite a verdade sem a adulterar e que nada esconde (transparência in Dicionário da
Língua Portuguesa com Acordo Ortográfico, 2015c).
Assim, tornam-se mais do que pertinentes estes conceitos, pois esta virtualização pode associar
vários cenários, infinitos, que podem ser autênticos e transparentes, ou não.
Sabendo que os mundos virtuais estão mais presentes do que nunca na nossa vida, interessa
refletir sobre a sobrevivência nele e como se devem estruturar nossos comportamentos. As
características próprias do ser humano, a verdade, a mentira, a ética, o bom senso, entre outras,
estão também presentes neste meio virtual humanizado. Prende-se aqui a intencionalidade com
que a rede é utilizada, pois só essa comandará os resultados.
Segundo Teixeira (2006 apud HENRIQUES 2006),
para aprendermos a compreender a realidade é necessário
compreendermo-nos enquanto realidade. E para isso é preciso
aprender a vermo-nos como o resultado da nossa procura de contar
as nossas histórias, de nos ficcionarmos como possíveis outros, de nos
aceitarmos como aquilo que resta do que podíamos ter sido, o que não
é pouco.
A nossa identidade é complexa e depende das interações que desenvolvemos e dos espaços
onde ocorrem. Criar uma identidade é criar também uma imagem de nós próprios disponível
para todos, mas escolhida e controlada por nós. Podemos referir que a identidade com que cada
um se apresenta na rede é o resultado do perfil com que cada um se apresenta na rede.
Para Chatfield (2012):
tentar mostrar ao mundo a melhor imagem de si mesmo é um pouco
como se dedicar a um trabalho: você desenvolve habilidades, escolhe
melhor as palavras e aparências que vai usar e obtém satisfação
quando vê que seu produto teve sucesso.
Desta forma, associados aos conceitos de autenticidade e transparência surgem outros como
responsabilidade, seriedade e bom senso. Sem estes, à semelhança do que poderá acontecer na
vida dita real, também na rede as consequências podem ser nefastas.
Citando Iani (2000):
em lugar de O príncipe de Maquiavel e de O moderno príncipe de
Gramsci, assim como de outros “príncipes” pensados e praticados no
curso dos tempos pós-modernos, cria-se O príncipe eletrónico, que
simultaneamente subordina, recria, absorve ou simplesmente
ultrapassa os outros.
Efetivamente, é extremamente necessário desenvolvermos mecanismos de deteção de faltas de
autenticidade e de transparência, para podermos estar sempre alerta e atentos. Surgem assim
vários cuidados que devemos ter, para nos desviarmos de cibercrimes, de ciberpredadores, para
podermos navegar de forma segura e controlada nesta oceano imenso de seres
(des)conhecidos. A título de exemplo, remetemos para o Boletim de Segurança da Microsoft
MS04-039, com as classificações de gravidade e identificadores de vulnerabilidade.
Associada a esta questão de saber quem está do outro lado a navegar connosco, recordamos
um programa televisivo da MTV®, Catfish: The TV Show®. Em cada episódio deste programa, sob
a orientação de Nev Schulman e Max Joseph, uma pessoa embarca num turbilhão de
sentimentos, com o intuito de saber a verdade acerca da pessoa com que mantém um
relacionamento virtual, assistindo-se a acontecimentos que reportam para os relacionamentos
na geração digital e da autenticidade, transparência e identidade do outro lado da rede.
Esta questão de autenticidade e transparência refere-se a pessoas, mas também a conteúdo, à
informação que, numa medida imensurável, veicula a uma velocidade nunca antes vista.
6. 6
Virtualização das Relações Sociais
Em verdade, a Internet serve-nos um prato infinito de informações variadas, que devemos
verificar se são verdadeiras ou não. Podemos aqui apontar como fator determinante da
autenticidade da informação a transparência do seu processo de produção. Veja-se, por
exemplo, em artigos publicados, ou nesta própria reflexão, as referências que vão sendo feitas,
no sentido de refletir a transparente construção de ideias. Seria impensável controlar este
oceano de informações, mas se todos formos transparentes no processo de construção
caminharemos para uma autenticidade progressiva.
Assim, são também importantes os cuidados a ter na filtragem da informação encontrada e a
sua necessária validação. É também relevante apontar que a validação da informação é feita
pela própria comunidade, uma vez que tudo pode ser dito ou apontado no ciberespaço, mas é
a comunidade que colaborativa e conjuntamente acaba por validar essa mesma informação.
Não menos importantes são os direitos autorais, a propriedade intelectual e os plágios que
facilmente são promovidos pela rede, pela facilidade que ela dispõe tudo a todo o momento.
Segundo Henriques (2012), atualmente
esperamos muito mais estímulos e respostas muito mais rápidas do
que as que tivemos no passado. Por um lado, há muitas coisas boas
nisso. Por outro, isso desafia as organizações dedicadas a notícias. A
distinção na qualidade, nas fontes de informação torna-se cada vez
menos importante, porque as pessoas apenas querem muita coisa e
rapidamente.
Sendo o termo autenticidade sinónimo de capacidade de identificar elementos que permitam
medir a veracidade de um objeto digital, é fundamental definirem-se propriedades desse objeto
digital para que este seja preservado (FERREIRA, 2006). A preservação digital é assim uma
necessidade.
3. UM ESTUDO DE CASO
Tendo em consideração tudo apresentado até ao momento, bem como o cariz das pesquisas
efetuadas, surgiu-nos a curiosidade de levar a cabo um simples estudo para tentarmos, desta
forma, ilustrar e constatar algumas das ideias defendidas pelos autores apresentados. A visão
de Lemos e Lévy (2010) foi o ponto de partida para esta análise, ao destacarem que o
“desenvolvimento de comunidades e redes sociais online é provavelmente um dos maiores
acontecimentos dos últimos anos, sendo uma nova maneira de fazer sociedade”.
3.1. METODOLOGIA
O estudo é composto pela análise dos dados recolhidos no questionário aplicado a alguns
contactos da rede social Facebook®, desenvolvido na plataforma Google Forms®. Tendo em
conta esta situação, podemos assumir que estamos perante um “estudo de caso”, abordagem
metodológica de investigação orientada para a descrição, exploração e compreensão de
acontecimentos e contextos complexos. Esta metodologia adapta-se à investigação em
educação, nomeadamente na observação e discussão de resultados (Yin, 1994).
A conceção deste questionário foi orientada pelos seguintes objetivos: a) identificar o tipo de
utilização que as pessoas dão às redes sociais (3 perguntas de resposta fechada); b) averiguar
sobre a virtualização das suas relações sociais (5 perguntas de resposta fechada); c) analisar a
autenticidade e transparência da informação virtual (2 perguntas de resposta fechada). Os
dados obtidos, num total de 113 respondentes, foram alvo de uma análise estatística descritiva,
que apresentamos no subponto seguinte.
3.2. APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
Relativamente à utilização de outras redes sociais para além do Facebook®, os respondentes
indicaram ter perfil de utilizador no Google+® (53%), Instagram® (43%) e Twitter® 30%), sendo
que apenas 15% indicou não ter mais nenhum perfil (gráfico 1). Os resultados refletem a
7. 7
Virtualização das Relações Sociais
importância atual das redes sociais na comunicação entre pessoas, atualmente o grande canal
de relacionamento social.
Gráfico 1 – Perfil de Utilizador noutras redes sociais
Quanto à utilização das redes sociais, a maioria dos respondentes (82%) recorre mais de uma
vez por dia, utilizando-a principalmente para lazer (86%). Aqui denotámos que o uso das redes
sociais e a sua consequente virtualização das relações sociais é uma verdade e carece de
importantes atenções ao serem objeto de dedicação de tanto do nosso tempo.
A procura de informações variadas (56%), a partilha de informação (51%) e o reencontrar
pessoas (50%) também foram referidas pelos respondentes (gráfico 2). Os dados levam-nos a
refletir sobre as questões de autenticidade da informação, bem como os cuidados a ter,
referidos anteriormente.
Gráfico 2 – Finalidade das redes sociais
Quanto ao conhecimento pessoal de todos os amigos do Facebook®, 65% dos respondentes
afirmaram conhecer todos os amigos dessa rede social. Com estes dados, evidencia-se a grande
percentagem (45%) de pessoas que tem amigos na rede que não conhece pessoalmente. Aqui
estão patentes as questões referidas ao longo desta reflexão, quer da virtualização das relações
sociais, quer da autenticidade e da transparência na rede.
Verificámos que 55% dos respondentes mantém contacto presencial e frequente com as
pessoas com quem mais se relaciona nas redes sociais (gráfico 3). Através destes dados,
podemos afirmar que a virtualização das relações sociais é muito forte.
0
10
20
30
40
50
60
70
Para além do Facebook, selecione outras redes
sociais em que tenha perfil de utilizador.(n=113)
0 20 40 60 80 100 120
Trabalho
Lazer
Conhecer novas pessoas
Estabelecer contactos amorosos
Buscar informações variadas
Partilhar informação
Reencontrar pessoas
Dar a conhecer o seu quotidiano
Outros
Com que finalidade utiliza as redes sociais? (n=113)
8. 8
Virtualização das Relações Sociais
Gráfico 3 – Contacto presencial frequente
No que concerne às publicações no Facebook®, a maioria dos respondentes (80%) tem em
consideração aquilo que os outros utilizadores possam pensar, sendo que, apenas 33% dos
respondentes não reveem o que partilham nas redes sociais. 56% dos respondentes não publica
com frequência conteúdos que expressam o seu estado de espírito (gráfico 4). Podemos aqui
redirecionar a questões de transparência também aqui já referidas.
Gráfico 4 – Publicações nas redes sociais
Relativamente à autenticidade das publicações encontradas nas redes sociais, a esmagadora
maioria dos respondentes (90%) não as considera totalmente autênticas (gráfico 5). Estes dados
comprovam que a informação veiculada na rede nem sempre é autêntica, tal como referido, e
que necessita de cuidados e filtros especiais para a deteção de eventuais fraudes ou
deturpações.
Gráfico 5 – Autenticidade das publicações nas redes sociais
Um dado interessante de se notar é que a maioria dos respondentes considera que, sem as redes
sociais, as suas relações sociais seriam menos ricas (56%). Aqui fica bem patente a expressão da
cibercultura em que vivemos e a respetiva virtualização das relações sociais.
0
50
100
Imagine que vai publicar uma foto sua no
Facebook, contudo, não ficou favorecido. Partilha
mesmo assim ou tira uma nova foto? (n=113)
Partilha. Tira uma foto melhor.
Considera totalmente autênticas todas
as publicações que encontra nas redes
sociais? (n=113)
Sim. Não.
Mantém contacto presencial frequente com
as pessoas com que mais se relaciona nas
redes sociais? (n=113)
Sim Não
9. 9
Virtualização das Relações Sociais
Através da análise dos dados obtidos podemos concluir que as redes sociais encontram-se
presentes no quotidiano da sociedade, sendo utilizadas principalmente para o lazer, mas
também como fonte de informação e relacionamento social. Este relacionamento social, apesar
de virtualizado é real e atual, mas devem ter-se em conta sempre as questões de autenticidade
e transparência, pois muitas vezes o EU que se espelha na rede é aquele que o OUTRO espera e
não o EU verdadeiro. Relativamente à informação que circula na rede, constata-se que a maioria
tem em conta que esta pode ser deturpada, mas verificámos que a grande parte dos
respondentes considera importante a existência das redes sociais para uma vida social mais rica
e preenchida.
4. CONCLUSÕES
Enquanto seres sociais e seres inacabados, estamos sempre em busca de novas sensações e
novas descobertas que nos mostrem um lado mais amplo e que desafie os nossos limites
enquanto seres humanos.
Desta forma, as novas tecnologias servem-nos para atingirmos tudo a qualquer momento e
esbatermos as barreiras do tempo e do espaço. Esta é a grande vantagem e o grande perigo,
não da rede, mas de estarmos todos conectados na rede.
Ficou evidente a atual virtualização das relações sociais, virtualização essa que retirou alguns
dos tabus aos cibernautas, que passam a estar sem medo de se mostrarem e podem viver toda
uma vida virtual, potencializando aquilo que, muitas vezes, não podemos ter na realidade.
A preocupação com aquilo que o outro pensa de nós é uma constante na rede, também bastante
evidente nos resultados obtidos no questionário, mas pode ser esse o fator que nos condiciona
e nos leva a moldar ou a reconfigurar a nossa identidade digital. Esta só poderá ser autêntica se
for transparente e estará sempre condicionada pela intencionalidade com que a rede é usada,
mas acaba por refletir um prolongamento da identidade pessoal de cada um.
Ao potenciar relações, a rede promove uma rápida difusão de ideias e de informações. Torna-
se pertinente validar essa informação, confirmar a sua autenticidade através da transparência
no processo de construção. Ao democratizar o conhecimento e a informação, também se
promovem apetites de fraudes ou plágios que devem ser combatidos a denunciados.
A própria rede acaba por validar ou não essas informações, pois todos demonstram consciência
da necessidade dessa transparência. Cabe, à semelhança do mundo dito mais real, fazermos
todos com que este ciberespaço seja cada vez melhor e nele transparecermos valores como
responsabilidade e ética.
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10. 10
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A VIRTUALIZAÇÃO DAS RELAÇÕES SOCIAIS
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