SlideShare uma empresa Scribd logo
1 de 31
Faces poéticas de Gregório de Matos
             Manoel Neves
BARROCO
                                                     marcos literários
                             1601                                                                      1768
               Prosopopéia,	
  Bento	
  Teixeira	
                                      Obras,	
  Cláudio	
  Manuel	
  da	
  Costa	
  
poema	
  épico	
  q	
  narra	
  feitos	
  heroicos	
  de	
  Jorge	
  de	
             livro	
  de	
  sonetos	
  à	
  moda	
  camoniana	
  
Albuquerque	
  Coelho,	
  3º.	
  donatário	
  da	
  Capitania	
                    perfeição	
  formal	
  e	
  temáHca	
  neoclássica	
  
    de	
  Pernambuco;	
  segue	
  modelo	
  camoniano	
                       bucolismo	
  +	
  fugere	
  urbem	
  +	
  aurea	
  mediocritas	
  
DISCUTINDO O CONCEITO DE BARROCO
                          faces poéticas de Gregório de Matos

                                                         etimologia
         pérola	
  irregular	
  e	
  defeituosa	
                                      processos	
  confusos	
  de	
  raciocínio	
  
                                        perda	
  da	
  clareza	
  e	
  da	
  elegância	
  clássicas	
  

                                                   o senso comum
        para	
  o	
  senso	
  comum,	
  o	
  Barroco	
  está	
  associado	
  ao	
  que	
  é	
  bizarro,	
  confuso	
  ou	
  obscuro	
  

                                                      a reabilitação
o	
  estudioso	
  alemão	
  Wölflin	
  reabilitou	
  o	
  termo,	
  que	
  passou	
  a	
  designar	
  um	
  Hpo	
  de	
  arte	
  moderna	
  
A CONTRARREFORMA
                         e suas implicações na literatura barroca
                                                 século XVI
                                            MarHnho	
   Lutero	
   protesta	
   contra	
   desvios-­‐desmandos	
   dos	
   que	
  
   REFORMA	
  PROTESTANTE	
                 professavam	
   a	
   doutrina	
   católica.	
   [a	
   Reforma	
   espalha-­‐se	
   por	
  
                                            Alemanha,	
  França,	
  Reino	
  Unido	
  e	
  Holanda]	
  
                                            Defende-­‐se	
   a	
   unidade	
   da	
   fé	
   e	
   a	
   disciplina	
   eclesiásHca.	
  
                                            Desdobramentos:	
   Inquisição,	
   [volta	
   do]	
   Tribunal	
   do	
   Santo	
  
CONCÍLIO	
  DE	
  TRENTO	
  [1545]	
  
                                            O^cio	
   e	
   Index	
   librorum	
   prohibitorum.	
   A	
   Companhia	
   de	
   Jesus	
  
                                            difunde	
  e	
  aplica	
  os	
  ideais	
  contrarreformistas.	
  
                                       Autos	
   de	
   fé:	
   rituais	
   de	
   punição	
   aos	
   hereges,	
   que	
   eram	
  
CLIMA	
  DE	
  TERROR	
  RELIGIOSO	
   queimados	
   em	
   praça	
   pública.	
   A	
   ação	
   da	
   Inquisição	
   aHngiu	
  
                                       principalmente	
   Bahia	
   e	
   Pernambuco.	
   Autores	
   como	
   Galileu,	
  
                                       Descartes	
  e	
  Newton	
  são	
  abolidos	
  do	
  ensino.	
  

                                         temas na literatura
      fragilidade e efemeridade da existência                                 contrição e consciência do pecado

dolorosa percepção do tempo e da efemeridade                        advertência contínua sobre a brevidade da vida

 permanente inutilidade das glórias mundanas                       consciência de que o homem é mortal e limitado
O HOMEM BARROCO
                           dividido entre duas concepções de mundo
               TEOCENTRISMO	
  MEDIEVAL	
                                            ANTROPOCENTRISMO	
  RENASCENTISTA	
  
Deus	
  é	
  o	
  centro	
  e	
  a	
  medida	
  de	
  todas	
  as	
  coisas	
         o	
  homem	
  é	
  a	
  medida	
  de	
  todas	
  as	
  coisas	
  
                           geocentrismo	
                                                                 heliocentrismo	
  
             conhecimento	
  restrito	
  à	
  Igreja	
                                  produção	
  e	
  difusão	
  de	
  conhecimento	
  
          valorização	
  dos	
  santos	
  e	
  márHres	
                                                  caráter	
  clássico	
  
      consciência	
  da	
  transitoriedade	
  da	
  vida	
                          volta	
  aos	
  padrões	
  culturais	
  greco-­‐romanos	
  
                busca	
  da	
  salvação	
  da	
  alma	
                             celebração	
  do	
  prazer	
  de	
  viver:	
  Carpe	
  diem	
  

                                                           consequências
                                                         espiritualização	
  da	
  matéria	
  
                                                   mistura	
  do	
  real	
  e	
  do	
  sobrenatural	
  
                                                   fixação	
  de	
  estados	
  contraditórios	
  
                                             grande	
  volume	
  de	
  angteses	
  e	
  paradoxos	
  
ESTILOS BARROCOS
                                                      literatura colonial

      cultismo ou gongorismo                                                   conceptismo ou quevedismo
            influência: Luiz de Gôngora                                               influência: Francisco de Quevedo

                       requinte da forma                                                              sutileza das idéias

                         vocabulário raro                                                        raciocínios engenhosos

                      alusões mitológicas                                                       associações inesperadas

                   reiteração de metáforas                                                          alegorias, paradoxos

                       jogos de palavras                                                                jogos de idéias

       uso excessivo de figuras de linguagem                                                 percepção íntima dos objetos

Essas	
   duas	
   tendências	
   se	
   completam	
   e,	
   não	
   raro,	
   coexistem	
   num	
   mesmo	
   texto	
   literário.	
  
Gregório	
   de	
   Matos	
   usa,	
   em	
   geral,	
   o	
   culHsmo	
   em	
   sua	
   obra	
   literária;	
   por	
   vezes,	
   entretanto,	
   é	
  
percepgvel	
  a	
  presença	
  do	
  concepHsmo.	
  
CARACTERÍSTICAS
                                                barroco

                                            fusionismo
              tentativa de conciliar [fundir] concepções conflitantes de mundo




                                      consequências
    espiritualização	
  da	
  matéria	
                    mistura	
  do	
  real	
  e	
  do	
  sobrenatural	
  
fixação	
  de	
  estados	
  contraditórios	
           grandes	
  volumes	
  de	
  angteses	
  e	
  paradoxos	
  
CARACTERÍSTICAS
                                                             barroco

                                                      carpe diem
consciência	
  da	
  transitoriedade	
  da	
  vida	
                          desejo	
  de	
  aproveitar	
  a	
  vida	
  intensamente	
  


                                                   consequências
    desengano	
  ante	
  as	
  limitações	
  humanas	
                  preferência	
  pelo	
  grotesco	
  e	
  pelo	
  desarmonioso	
  
uso	
  de	
  símbolos	
  de	
  visão	
  pessimista	
  [caveira]	
                consciência	
  da	
  instabilidade	
  da	
  vida	
  
                                         consciência	
  de	
  que	
  a	
  morte	
  é	
  inevitável	
  
LINHAS TEMÁTICO-ESTILÍSTICAS
       faces poéticas de Gregório de Matos
                  religiosidade tensa;
                      fusionismo;
                   jogos de opostos;
                cultismo e conceptismo;
                desconcerto do mundo;
                     carpe diem;
poesia paradoxalmente ligada ao cotidiano e ao sublime.
GREGÓRIO DE MATOS
                                  aspectos biográficos
filho de proprietários rurais, sai do Brasil para estudar em Portugal na primeira metade do séc. XVII
 na primeira metade do século XVII, o dinheiro está nas mãos dos produtores de cana-de-açúcar
na segunda metade do século XVII, o dinheiro está nas mãos dos comerciantes de cana-de-açúcar
 ao voltar ao Brasil, tem sua posição econômica alterada, por isso faz oposição ao poder colonial
GREGÓRIO DE MATOS
                              aspectos estilísticos
                                      a obra
POESIA LÍRICA                   POESIA METAFÍSICA                   POESIA SATÍRICA

 molde	
  europeu	
                  molde	
  europeu	
              caráter	
  brasileiro	
  

                              caráter brasileiro
                    uso de termos indígenas, africanos e de baixo calão
                           crítica ao poder colonial estabelecido


                               boca do inferno
             textos satíricos de cunho popular que circulam de boca em boca
                                   atitude satírica ferina
A LÍRICA METAFÍSICA
poesia filosófica e religiosa de Gregório de Matos
PEQUEI, SENHOR, MAS...
                                                     Gregório de Matos
Pequei,	
  Senhor,	
  mas	
  não	
  porque	
  hei	
  pecado,	
  
                                                                                      CARÁTER	
  CLÁSSICO	
  
Da	
  vossa	
  piedade	
  me	
  despido,	
  
Porque	
  quanto	
  mais	
  tenho	
  delinquido,	
                                     soneto	
  decassílabo	
  
Vos	
  tenho	
  a	
  perdoar	
  mais	
  empenhado.	
  
                                                                                    LIRISMO	
  METAFÍSICO	
  
Se	
  basta	
  a	
  vos	
  irar	
  tanto	
  pecado,	
  
                                                                                    consciência	
  do	
  pecado	
  
A	
  abrandar-­‐vos	
  sobeja	
  um	
  só	
  gemido,	
  
Que	
  a	
  mesma	
  culpa	
  que	
  vos	
  há	
  ofendido,	
                intertextualidade	
  [Filho	
  pródigo]	
  
Vos	
  tem	
  para	
  o	
  perdão	
  lisonjeado.	
  
                                                                                   RELIGIOSIDADE	
  TENSA	
  
Se	
  uma	
  ovelha	
  perdida,	
  e	
  já	
  cobrada	
  
                                                                   quanto	
  +	
  peca,	
  +	
  o	
  locutor	
  quer	
  ser	
  perdoado	
  
Glória	
  tal,	
  e	
  prazer	
  tão	
  repenHno	
  
Vos	
  deu,	
  como	
  afirmais	
  na	
  Sacra	
  História	
          afirma-­‐se	
  que	
  Deus	
  se	
  compraz	
  no	
  pecado	
  
Eu	
  sou,	
  Senhor,	
  a	
  ovelha	
  desgarrada	
                 quanto	
  +	
  se	
  peca,	
  +	
  Deus	
  tem	
  que	
  perdoar	
  
Cobrai-­‐a,	
  e	
  não	
  queirais,	
  Pastor	
  Divino,	
  
                                                                                         CONCEPTISMO	
  
Perder	
  na	
  vossa	
  ovelha	
  a	
  vossa	
  glória.	
  
CARREGADO DE MIM ANDO NO MUNDO
                                                      Gregório de Matos
Carregado	
  de	
  mim	
  ando	
  no	
  mundo,	
                                   CARÁTER	
  CLÁSSICO	
  
E	
  o	
  grande	
  peso	
  embarga-­‐me	
  as	
  passadas,	
                       soneto	
  decassílabo	
  
Que	
  como	
  ando	
  por	
  vias	
  desusadas,	
  
Faço	
  o	
  peso	
  crescer,	
  e	
  vou-­‐me	
  ao	
  fundo.	
                 LIRISMO	
  METAFÍSICO	
  
O	
  remédio	
  será	
  seguir	
  o	
  imundo	
                                 o	
  desconcerto	
  do	
  mundo	
  
Caminho,	
  onde	
  dos	
  mais	
  vejo	
  as	
  pisadas,	
                     ASPECTOS	
  TEMÁTICOS	
  
Que	
  as	
  bestas	
  andam	
  juntas	
  mais	
  ousadas,	
  
Do	
  que	
  anda	
  só	
  o	
  engenho	
  mais	
  profundo.	
                        temáHca	
  clássica	
  

Não	
  é	
  fácil	
  viver	
  entre	
  os	
  insanos,	
                                  tom	
  elevado	
  
Erra,	
  quem	
  presumir	
  que	
  sabe	
  tudo,	
                     constatação	
  de	
  o	
  mundo	
  está	
  errado	
  
Se	
  o	
  atalho	
  não	
  soube	
  dos	
  seus	
  danos.	
  
                                                                               buscar	
  a	
  verdade	
  é	
  inócuo	
  
O	
  prudente	
  varão	
  há	
  de	
  ser	
  mudo,	
  
Que	
  é	
  melhor	
  neste	
  mundo	
  o	
  mar	
  de	
  enganos	
     adesão	
  ao	
  erro:	
  postura	
  conservadora	
  
Ser	
  louco	
  c’os	
  demais,	
  que	
  ser	
  sisudo.	
                            CONCEPTISMO	
  
NASCE O SOL, E NÃO DURA...
                                                            Gregório de Matos
Nasce	
  o	
  Sol,	
  e	
  não	
  dura	
  mais	
  que	
  um	
  dia,	
  
                                                                                       CARÁTER	
  CLÁSSICO	
  
Depois	
  da	
  Luz	
  se	
  segue	
  a	
  noite	
  escura,	
  
Em	
  tristes	
  sombras	
  morre	
  a	
  formosura,	
                                  soneto	
  decassílabo	
  
Em	
  congnuas	
  tristezas	
  a	
  alegria.	
  	
  
                                                                                      LIRISMO	
  METAFÍSICO	
  
Porém,	
  se	
  acaba	
  o	
  Sol,	
  por	
  que	
  nascia?	
  
                                                                           constatação	
  de	
  que	
  tudo	
  é	
  transitório	
  
Se	
  é	
  tão	
  formosa	
  a	
  Luz,	
  por	
  que	
  não	
  dura?	
  
Como	
  a	
  beleza	
  assim	
  se	
  transfigura?	
                                 RECURSOS	
  ESTILÍSTICOS	
  
Como	
  o	
  gosto	
  da	
  pena	
  assim	
  se	
  fia?	
  
                                                                           grande	
  volume	
  de	
  angteses	
  [estrofe	
  1]	
  
Mas	
  no	
  Sol,	
  e	
  na	
  Luz	
  falte	
  a	
  firmeza,	
  
                                                                              jogos	
  de	
  interrogações	
  [estrofe	
  2]	
  
Na	
  formosura	
  não	
  se	
  dê	
  constância,	
  
E	
  na	
  alegria	
  sinta-­‐se	
  tristeza.	
                                   grande	
  volume	
  de	
  metáforas	
  
Começa	
  o	
  mundo	
  enfim	
  pela	
  ignorância,	
                                paradoxo	
  [úlHmo	
  verso]	
  
E	
  tem	
  qualquer	
  dos	
  bens	
  por	
  natureza	
  
                                                                                 CULTISMO	
  E	
  CONCEPTISMO	
  
A	
  firmeza	
  somente	
  na	
  inconstância.	
  
O TODO SEM A PARTE NÃO É TODO...
                                                         Gregório de Matos
O	
  todo	
  sem	
  a	
  parte	
  não	
  é	
  todo,	
  
A	
  parte	
  sem	
  o	
  todo	
  não	
  é	
  parte,	
                                   CARÁTER	
  CLÁSSICO	
  
Mas	
  se	
  a	
  parte	
  o	
  faz	
  todo,	
  sendo	
  parte,	
                          soneto	
  decassílabo	
  
Não	
  se	
  diga	
  que	
  é	
  parte	
  sendo	
  todo.	
  
                                                                              LIRISMO	
  METAFÍSICO	
  [paradoxo]	
  
Em	
  todo	
  o	
  Sacramento	
  está	
  Deus	
  todo,	
  
E	
  todo	
  assiste	
  inteiro	
  em	
  qualquer	
  parte,	
              Deus	
  está	
  em	
  cada	
  parte	
  do	
  sacramento	
  
E	
  feito	
  em	
  partes	
  todo	
  em	
  toda	
  a	
  parte	
                    cada	
  uma	
  das	
  partes	
  é	
  Deus	
  
Em	
  qualquer	
  parte	
  sempre	
  fica	
  o	
  todo.	
  
                                                                                   POESIA	
  DE	
  CIRCUNSTÂNCIA	
  
O	
  braço	
  de	
  Jesus	
  não	
  seja	
  parte,	
  
Pois	
  que	
  feito	
  Jesus	
  em	
  partes	
  todo,	
                poema	
  feito	
  para	
  celebrar	
  o	
  fato	
  de	
  haverem	
  
Assiste	
  cada	
  parte	
  em	
  sua	
  parte.	
                     encontrado	
  um	
  braço	
  de	
  uma	
  imagem	
  de	
  Jesus	
  
Não	
  se	
  sabendo	
  parte	
  deste	
  todo,	
                     Cristo	
  que	
  desaparecera	
  de	
  uma	
  Igreja	
  na	
  Bahia	
  
Um	
  braço,	
  que	
  lhe	
  acharam,	
  sendo	
  parte,	
                                  CONCEPTISMO	
  
Nos	
  disse	
  as	
  partes	
  todas	
  deste	
  todo.	
  
A LÍRICA AMOROSA
o lirismo amoroso na poesia de Gregório de Matos
ANJO NO NOME, ANGÉLICA NA CARA!
                                                       Gregório de Matos
Anjo	
  no	
  nome,	
  Angélica	
  na	
  cara!	
  
                                                                                        CARÁTER	
  CLÁSSICO	
  
Isso	
  é	
  ser	
  flor,	
  e	
  Anjo	
  juntamente:	
  
Ser	
  Angélica	
  flor,	
  e	
  Anjo	
  florente	
                                        soneto	
  decassílabo	
  
Em	
  quem,	
  senão	
  em	
  vós,	
  se	
  uniformara?	
  
                                                                                       LIRISMO	
  AMOROSO	
  
Quem	
  vira	
  uma	
  tal	
  flor,	
  que	
  a	
  não	
  cortara,	
  
                                                                                celebração	
  da	
  beleza	
  da	
  amada	
  
De	
  verde	
  pé,	
  da	
  rama	
  florescente?	
  
A	
  quem	
  um	
  Anjo	
  vira	
  tão	
  luzente	
                                    JOGOS	
  DE	
  OPOSTOS	
  
Que	
  por	
  seu	
  Deus	
  o	
  não	
  idolatrara?	
  
                                                                        flor:	
  metáfora	
  da	
  beleza	
  fugaz	
  da	
  mulher	
  
Se	
  pois	
  como	
  Anjo	
  sois	
  dos	
  meus	
  altares,	
  
                                                                        anjo:	
  alusão	
  ao	
  caráter	
  celesHal	
  da	
  mulher	
  
Fôreis	
  o	
  meu	
  custódio,	
  e	
  minha	
  guarda,	
  
Livrara	
  eu	
  de	
  diabólicos	
  azares.	
                          Sois	
  anjo,	
  que	
  me	
  tenta,	
  e	
  não	
  me	
  guarda	
  
Mas	
  vejo	
  que	
  tão	
  bela,	
  e	
  tão	
  galharda,	
              a	
  mulher	
  possui	
  uma	
  beleza	
  paradoxal	
  
Posto	
  que	
  os	
  Anjos	
  nunca	
  dão	
  pesares,	
  
                                                                                            CONCEPTISMO	
  
Sois	
  Anjo,	
  que	
  me	
  tenta,	
  e	
  não	
  me	
  guarda.	
  
DISCRETA, E FORMOSÍSSIMA MARIA,
                                                       Gregório de Matos
Discreta,	
  e	
  formosíssima	
  Maria,	
                                                        CARÁTER	
  CLÁSSICO	
  
Enquanto	
  estamos	
  vendo	
  a	
  qualquer	
  hora	
                                            soneto	
  decassílabo	
  
Em	
  tuas	
  faces	
  a	
  rosada	
  Aurora,	
  
Em	
  teus	
  olhos,	
  e	
  boca	
  o	
  Sol,	
  e	
  o	
  dia:	
                               LIRISMO	
  AMOROSO	
  
Enquanto	
  com	
  genHl	
  descortesia	
                                           constatação	
  de	
  que	
  tudo	
  é	
  transitório	
  
O	
  ar,	
  que	
  fresco	
  Adônis	
  te	
  namora,	
                              convite	
  à	
  amada	
  para	
  aproveitar	
  a	
  vida	
  
te	
  espalha	
  a	
  rica	
  trança	
  voadora,	
  
Quando	
  vem	
  passear-­‐te	
  pela	
  fria:	
                                             RECURSOS	
  ESTILÍSTICOS	
  
Goza,	
  goza	
  da	
  flor	
  da	
  mocidade,	
                                       alusões	
  mitológicas	
  [estrofes	
  1	
  e	
  2]	
  
Que	
  o	
  tempo	
  trota	
  a	
  toda	
  ligeireza,	
                              uso	
  de	
  metáforas	
  [estrofes	
  1,	
  2,	
  3,	
  4]	
  
E	
  imprime	
  em	
  toda	
  a	
  flor	
  sua	
  pisada.	
  
                                                                                                gradação	
  [úlHmo	
  verso]	
  
Oh	
  não	
  aguardes	
  que	
  a	
  madura	
  idade	
  
te	
  converta	
  em	
  flor,	
  essa	
  beleza	
                                            aliteração	
  [terceira	
  estrofe]	
  
Em	
  terra,	
  em	
  cinza,	
  em	
  pó,	
  em	
  sombra,	
  em	
  nada.	
  	
                           CULTISMO	
  
RUBI, CONCHA DE PERLAS PEREGRINA
                                                          Gregório de Matos
Rubi,	
  concha	
  de	
  perlas	
  peregrina,	
                                        CARÁTER	
  CLÁSSICO	
  
Animado	
  Cristal,	
  viva	
  escarlata.	
  
Duas	
  Safiras	
  sobre	
  lisa	
  prata,	
                                             soneto	
  decassílabo	
  
Ouro	
  encrespado	
  sobre	
  prata	
  fina.	
                                         LIRISMO	
  AMOROSO	
  
Este	
  o	
  rosHnho	
  é	
  de	
  Caterina;	
                             celebração	
  da	
  beleza	
  da	
  mulher	
  amada	
  
E	
  porque	
  docemente	
  obriga,	
  e	
  mata,	
  
Não	
  livra	
  o	
  ser	
  divina	
  em	
  ser	
  ingrata,	
                    CONSTRUÇÃO	
  PARADOXAL	
  
E	
  raio	
  a	
  raio	
  os	
  corações	
  fulmina.	
                                três	
  primeiras	
  estrofes	
  
Viu	
  Fábio	
  uma	
  tarde	
  transportado	
                       [construção	
  de	
  um	
  retrato	
  idealizado	
  da	
  amada]	
  
Bebendo	
  admirações	
  e	
  galhardias,	
  
A	
  quem	
  já	
  tanto	
  amor	
  levantou	
  aras.	
                                     úlRma	
  estrofe	
  
Disse	
  igualmente	
  amante,	
  e	
  magoado:	
                             [desidealização:	
  cena	
  escatológica]	
  
Ah,	
  muchacha	
  genHl,	
  que	
  tal	
  serias,	
  
                                                                                              CULTISMO	
  
Se	
  sendo	
  tão	
  formosa,	
  não	
  cagaras.	
  
A SÁTIRA
poesia e contestação em Gregório de Matos
GREGÓRIO DE MATOS
                                              aspectos estilísticos

                                                          a sátira
             universo	
  colonial	
  brasileiro	
                                       língua	
  brasileira	
  
        vida cotidiana                                        política                                costumes

               políHca	
                              críHca	
  aos	
  dirigentes	
              visa	
  à	
  moralização	
  
             economia	
                                        nobres	
                       volta	
  à	
  ordem	
  anterior	
  
críHca	
  social	
  e	
  de	
  costumes	
             governadores	
  e	
  clero	
              caráter	
  conservador	
  
SE PICA-FLOR ME CHAMAIS
                                                  Gregório de Matos
                                                  Se	
  pica-­‐flor	
  me	
  chamais,	
  
                                                        Pica-­‐flor	
  aceito	
  ser,	
  
                                                   Mas	
  resta	
  agora	
  saber,	
  
                                                  Se	
  no	
  nome	
  que	
  me	
  dais,	
  
                                                 Meteis	
  a	
  flor,	
  que	
  guardais,	
  
                                                   No	
  passarinho	
  melhor!	
  
                                                      Se	
  me	
  dais	
  este	
  favor	
  
                                                  Sendo	
  só	
  de	
  mim	
  o	
  Pica,	
  
                                                 E	
  o	
  mais	
  vosso,	
  claro	
  fica,	
  
                                                  Que	
  fico	
  então	
  Pica-­‐flor.	
  
                          MATOS,	
  Gregório	
  de.	
  Antologia.	
  Disponível	
  em:	
  hrp://manoelneves.com	
  

                                                  POESIA	
  DE	
  CIRCUNSTÂNCIA	
  
o	
  poema	
  é	
  fruto	
  de	
  uma	
  situação	
  específica	
               freira	
  teria	
  dito	
  que	
  o	
  poeta	
  parecia	
  um	
  pássaro	
  

                                                      JOGOS	
  METAFÓRICOS	
  
         pica:	
  lança	
  [objeto	
  que	
  perfura]	
                         flor:	
  símbolo	
  da	
  beleza	
  fugaz	
  e	
  da	
  feminilidade	
  

                                                     pica-­‐flor:	
  pássaro	
  [beija-­‐flor]	
  

                                                                CULTISMO	
  
TRISTE BAHIA!
                                                           Gregório de Matos
Triste	
  Bahia!	
  Ó	
  quão	
  dessemelhante	
  	
                                       CARÁTER	
  CLÁSSICO	
  
Estás	
  e	
  estou	
  do	
  nosso	
  anHgo	
  estado!	
  	
                                soneto	
  decassílabo	
  
Pobre	
  te	
  vejo	
  a	
  H,	
  tu	
  a	
  mi	
  empenhado,	
  	
  
Rica	
  te	
  vi	
  eu	
  já,	
  tu	
  a	
  mi	
  abundante.	
                                LIRISMO	
  SOCIAL	
  
A	
  H	
  trocou-­‐te	
  a	
  máquina	
  mercante,	
  	
                críHca	
  à	
  situação	
  social	
  do	
  locutor	
  e	
  da	
  Bahia	
  
Que	
  em	
  tua	
  larga	
  barra	
  tem	
  entrado,	
  	
               ASPECTOS	
  HISTÓRICOS	
  E	
  ESTILÍSTICOS	
  
A	
  mim	
  foi-­‐me	
  trocando,	
  e	
  tem	
  trocado,	
  	
  
Tanto	
  negócio	
  e	
  tanto	
  negociante.	
  	
                     jogo	
  especular	
  e	
  anHtéHco	
  [primeira	
  estrofe]	
  

Deste	
  em	
  dar	
  tanto	
  açúcar	
  excelente	
  	
                referência	
  ao	
  mercanHlismo	
  [estrofes	
  2	
  e	
  3]	
  
Pelas	
  drogas	
  inúteis,	
  que	
  abelhuda	
  	
                                        anagrama:	
  brichote	
  
Simples	
  aceitas	
  do	
  sagaz	
  Brichote.	
  	
  
                                                                               desejo	
  de	
  mudança	
  [úlHma	
  estrofe]	
  
Oh	
  se	
  quisera	
  Deus	
  que	
  de	
  repente	
  	
  
Um	
  dia	
  amanheceras	
  tão	
  sisuda	
  	
                                        metáforas	
  	
  [estrofes	
  2	
  e	
  4]	
  
Que	
  fora	
  de	
  algodão	
  o	
  teu	
  capote!	
  	
                                          CULTISMO	
  
NESTE MUNDO É MAIS RICO...
                                                      Gregório de Matos
Neste	
  mundo	
  é	
  mais	
  rico	
  o	
  que	
  mais	
  rapa:	
                        CARÁTER	
  CLÁSSICO	
  
Quem	
  mais	
  limpo	
  se	
  faz,	
  tem	
  mais	
  carepa;	
                             soneto	
  decassílabo	
  
Com	
  sua	
  língua,	
  ao	
  nobre	
  o	
  vil	
  decepa:	
  
O	
  velhaco	
  maior	
  sempre	
  tem	
  capa.	
                                            LIRISMO	
  SOCIAL	
  
Mostra	
  o	
  paHfe	
  da	
  nobreza	
  o	
  mapa:	
                  o	
  locutor	
  demonstra	
  desprezo	
  pelos	
  novos	
  ricos	
  
Quem	
  tem	
  mão	
  de	
  agarrar,	
  ligeiro	
  trepa;	
                ASPECTOS	
  HISTÓRICOS	
  E	
  ESTILÍSTICOS	
  
Quem	
  menos	
  falar	
  pode,	
  mais	
  increpa:	
  
Quem	
  dinheiro	
  Hver,	
  pode	
  ser	
  Papa.	
                                 jogos	
  paronomásHcos	
  [rimas]	
  

A	
  flor	
  baixa	
  se	
  inculca	
  por	
  tulipa;	
                        jogos	
  metafóricos	
  [estrofes	
  1,	
  2,	
  3,	
  4]	
  
Bengala	
  hoje	
  na	
  mão,	
  ontem	
  garlopa,	
                             jogos	
  aliteraHvos	
  [úlHma	
  estrofe]	
  
Mais	
  isento	
  se	
  mostra	
  o	
  que	
  mais	
  chupa.	
  
                                                                                         feismo	
  [úlHma	
  estrofe]	
  
Para	
  a	
  tropa	
  do	
  trapo	
  vazo	
  a	
  tripa	
  
E	
  mais	
  não	
  digo,	
  porque	
  a	
  Musa	
  topa	
                        metalinguagem	
  [úlHma	
  estrofe]	
  
Em	
  apa,	
  epa,	
  ipa,	
  opa,	
  upa.	
                                                      CULTISMO	
  
A CADA CANTO...
                                                   Gregório de Matos
A	
  cada	
  canto	
  um	
  grande	
  conselheiro	
                                CARÁTER	
  CLÁSSICO	
  
Que	
  nos	
  quer	
  governar	
  cabana	
  e	
  vinha;	
                           soneto	
  decassílabo	
  
Não	
  sabem	
  governar	
  sua	
  cozinha	
  
E	
  podem	
  governar	
  o	
  mundo	
  inteiro.	
                                   LIRISMO	
  SOCIAL	
  

Em	
  cada	
  porta	
  um	
  bem	
  frequente	
  olheiro	
     críHca	
  aos	
  governantes,	
  aos	
  que	
  dão	
  palpites	
  no	
  
Que	
  a	
  vida	
  do	
  vizinho	
  e	
  da	
  vizinha	
        governo,	
  aos	
  	
  fofoqueiros,	
  aos	
  velhacos,	
  aos	
  
Pesquisa,	
  escuta,	
  espreita	
  e	
  esquadrinha	
  
                                                                 juros	
  altos	
  e	
  aos	
  ricos	
  [chamados	
  de	
  ladrões]	
  
Para	
  o	
  levar	
  à	
  praça	
  e	
  ao	
  terreiro.	
  
Muitos	
  mulatos	
  desavergonhados,	
                                        ASPECTOS	
  ESTILÍSTICOS	
  
Trazidos	
  sob	
  os	
  pés	
  os	
  homens	
  nobres,	
                reforço	
  poéHco	
  [primeira	
  estrofe]	
  
Posta	
  nas	
  palmas	
  toda	
  a	
  picardia,	
  
                                                                                linguagem	
  sagrica	
  direta	
  
Estupendas	
  usuras	
  nos	
  mercados,	
  
Todos	
  os	
  que	
  não	
  furtam	
  muito	
  pobres:	
                        economia	
  de	
  metáforas	
  
E	
  eis	
  aqui	
  a	
  cidade	
  da	
  Bahia.	
                    RESSENTIMENTO	
  CONTRA	
  OS	
  RICOS	
  
UM CALÇÃO DE PINDOBA A MEIA ZORRA
                                                        Gregório de Matos
Um	
  calção	
  de	
  pindoba	
  a	
  meia	
  zorra	
  	
  
Camisa	
  de	
  Urucu,	
  mantéu	
  de	
  Arara,	
  	
                                             CARÁTER	
  CLÁSSICO	
  
Em	
  lugar	
  de	
  cotó	
  arco,	
  e	
  taquara,	
  	
  
Penacho	
  de	
  Guarás	
  em	
  vez	
  de	
  gorra.	
  	
                                          soneto	
  decassílabo	
  

Furado	
  o	
  beiço,	
  e	
  sem	
  temor	
  que	
  morra,	
  	
                                    LIRISMO	
  SOCIAL	
  
O	
  pai,	
  que	
  lho	
  envazou	
  cuma	
  Htara,	
  	
                     críHca	
  à	
  nobreza	
  da	
  terra:	
  não	
  tem	
  sangue	
  azul	
  
Senão	
  a	
  Mãe,	
  que	
  a	
  pedra	
  lhe	
  aplicara,	
  	
  
A	
  reprimir-­‐lhe	
  o	
  sangue,	
  que	
  não	
  corra.	
                                  ASPECTOS	
  ESTILÍSTICOS	
  

Animal	
  sem	
  razão,	
  bruto	
  sem	
  fé,	
  	
                                               vocabulário	
  indígena	
  
Sem	
  mais	
  Leis,	
  que	
  as	
  do	
  gosto,	
  quando	
  erra,	
  	
                      linguagem	
  sagrica	
  direta	
  
De	
  Paiaiá	
  virou-­‐se	
  em	
  Abaeté.	
  
                                                                                                 economia	
  de	
  metáforas	
  
Não	
  sei,	
  onde	
  acabou,	
  ou	
  em	
  que	
  guerra,	
  	
  
Só	
  sei,	
  que	
  deste	
  Adão	
  de	
  Massapé,	
  	
                          RESSENTIMENTO	
  CONTRA	
  OS	
  RICOS	
  
Procedem	
  os	
  fidalgos	
  desta	
  terra.	
  
SENHOR ANTÃO DE SOUSA DE MENEZES
                                                     Gregório de Matos
Senhor	
  Antão	
  de	
  Sousa	
  de	
  Meneses,	
  
Quem	
  sobe	
  a	
  alto	
  lugar,	
  que	
  não	
  merece,	
                           CARÁTER	
  CLÁSSICO	
  
Homem	
  sobe,	
  asno	
  vai,	
  burro	
  parece,	
  
Que	
  o	
  subir	
  é	
  desgraça	
  muitas	
  vezes.	
                                  soneto	
  decassílabo	
  

A	
  fortunilha	
  autora	
  de	
  entremezes	
                                            LIRISMO	
  SOCIAL	
  
Transpõe	
  em	
  burro	
  o	
  Herói,	
  que	
  indigno	
  cresce	
                 críHca	
  ao	
  mau	
  governante	
  
Desanda	
  a	
  roda,	
  e	
  logo	
  o	
  homem	
  desce,	
  
Que	
  é	
  discreta	
  a	
  fortuna	
  em	
  seus	
  reveses.	
                      ASPECTOS	
  TEMÁTICOS	
  

Homem	
  (sei	
  eu)	
  que	
  foi	
  Vossenhoria,	
                                   desconcerto	
  do	
  mundo	
  
Quando	
  o	
  pisava	
  da	
  fortuna	
  a	
  Roda,	
                   denúncia	
  dos	
  desmandos	
  do	
  Braço	
  de	
  Prata	
  
Burro	
  foi	
  ao	
  subir	
  tão	
  alto	
  clima.	
  
                                                                                          engajamento	
  social	
  
Pois	
  vá	
  descendo	
  do	
  alto,	
  onde	
  jazia,	
  
Verá,	
  quanto	
  melhor	
  se	
  lhe	
  acomoda	
                                            CULTISMO	
  
Ser	
  home	
  em	
  baixo,	
  do	
  que	
  burro	
  em	
  cima.	
  
SENHOR: OS NEGROS JUÍZES
                                          Gregório de Matos
Senhor:	
  os	
  Negros	
  Juízes	
  
da	
  Senhora	
  do	
  Rosário	
  
fazem	
  por	
  uso	
  ordinário:	
  
como	
  são	
  infelizes,	
                                      CARÁTER	
  POPULAR	
  
que	
  por	
  seus	
  negros	
  pecados	
  
andam	
  sempre	
  emascarados	
                                  versos	
  heptassílabos	
  
contra	
  a	
  lei	
  da	
  polícia,	
                              LIRISMO	
  SOCIAL	
  
ante	
  Vossa	
  Senhoria	
  
pedem	
  licença	
  prostrados.	
              críHca	
  ao	
  costume	
  dos	
  negros	
  de	
  tomar	
  bebida	
  

A	
  um	
  General	
  Capitão	
                               ASPECTOS	
  ESTILÍSTICOS	
  
Suplica	
  a	
  Irmandade	
  preta,	
                           poesia	
  de	
  circunstância	
  
que	
  não	
  irão	
  de	
  careta,	
  
                                                               linguagem	
  sagrica	
  direta	
  
mas	
  descarados	
  irão:	
  
todo	
  o	
  negregado	
  Irmão	
                              economia	
  de	
  metáforas	
  
desta	
  Irmandade	
  bendita	
  
                                                             CARÁTER	
  CONSERVADOR	
  
pede,	
  que	
  se	
  lhe	
  permita	
  
ir	
  ao	
  alarde	
  enfrascados	
  
não	
  de	
  pólvora	
  atacados,	
  
[mas]	
  calcados	
  de	
  jeribita	
  .	
  
JOGANDO PEDRO, E MARIA
                                                       Gregório de Matos
      Jogando	
  Pedro,	
  e	
  Maria	
              Abrasado,	
  em	
  vivo	
  fogo	
                     Picou	
  Pedro,	
  e	
  de	
  feição,	
  
 os	
  piques	
  sobre	
  a	
  merenda,	
            Pedro,	
  que	
  o	
  jogo	
  sabia,	
                 que	
  a	
  Maria	
  fez	
  saltar:	
  
vi	
  pois,	
  que	
  sobre	
  a	
  contenda	
       disse,	
  eu	
  te	
  pico,	
  Maria,	
                quis	
  ela	
  também	
  picar,	
  
         Maria	
  picar	
  queria:	
               porque	
  tu	
  me	
  piques	
  logo:	
               pois	
  que	
  assim	
  picado	
  a	
  hão:	
  
   ela,	
  que	
  a	
  Pedro	
  entendia	
          disse	
  ela,	
  pois	
  o	
  teu	
  fogo	
              picados	
  ambos	
  estão:	
  
    disse	
  então:	
  aqui-­‐d’El-­‐Rei	
         é	
  dos	
  melhores	
  que	
  achei,	
                     diz	
  Maria	
  o	
  jogo	
  sei,	
  
pica-­‐me,	
  Pedro,	
  e	
  picar-­‐te-­‐ei.	
   pica-­‐me,	
  Pedro,	
  e	
  picar-­‐te-­‐ei.	
        pica-­‐me,	
  Pedro,	
  e	
  picar-­‐te-­‐ei.	
  
                                                      Pedro,	
  que	
  já	
  se	
  enfadava,	
  
                                                      de	
  picar,	
  queria	
  erguer-­‐se;	
  
                                                       Maria	
  quis	
  mais	
  deter-­‐se,	
  
                                                       porquanto	
  picada	
  estava:	
  
                                                     disse,	
  ela,	
  que	
  então	
  gostava	
  
                                                       do	
  jogo,	
  que	
  lhe	
  ensinei:	
  
                                                     pica-­‐me,	
  Pedro,	
  e	
  picar-­‐te-­‐ei.	
  
                                                              POESIA	
  POPULAR	
  
                     uso	
  do	
  heptassílabo	
                                                 exploração	
  do	
  duplo	
  senHdo	
  
                                          laivos	
  de	
  medievalismo:	
  linguagem	
  e	
  temáHca	
  
RECOMPILOU-SE O DIREITO
                                                                       a sátira
      Recopilou-­‐se	
  o	
  direito,	
                     Se	
  de	
  dous	
  ff	
  composta	
                     Provo	
  a	
  conjetura	
  já	
  
        e	
  quem	
  o	
  recopilou	
                          está	
  a	
  nossa	
  Bahia,	
               prontamente	
  com	
  um	
  brinco:	
  
       com	
  dous	
  ff	
  o	
  explicou	
                     errada	
  a	
  ortografia	
                      Bahia	
  tem	
  letras	
  cinco	
  
 por	
  estar	
  feito	
  e	
  bem	
  feito:	
          a	
  grande	
  dano	
  está	
  posta:	
                        que	
  são	
  BAHIA,	
  
 por	
  bem	
  digesto	
  e	
  colheito,	
                   eu	
  quero	
  fazer	
  aposta,	
                  logo	
  ninguém	
  me	
  dirá	
  
     só	
  com	
  dous	
  ff	
  o	
  expõe,	
            e	
  quero	
  um	
  tostão	
  perder,	
                que	
  dous	
  ff	
  chega	
  a	
  ter	
  
 e	
  assim	
  quem	
  os	
  olhos	
  põe	
             que	
  isso	
  a	
  há	
  de	
  perverter,	
        pois	
  nenhum	
  contém	
  sequer,	
  
no	
  trato,	
  que	
  aqui	
  se	
  encerra,	
          se	
  o	
  furtar	
  e	
  o	
  foder	
  bem	
        salvo	
  se	
  em	
  boa	
  verdade	
  
  há	
  de	
  dizer	
  que	
  esta	
  terra	
                 não	
  são	
  os	
  ff	
  que	
  tem	
                  são	
  os	
  ff	
  da	
  cidade	
  
       De	
  dous	
  ff	
  se	
  compõe.	
                    Esta	
  cidade	
  a	
  meu	
  ver.	
              um	
  furtar,	
  outro	
  foder.	
  
                                                                  POESIA	
  POPULAR	
  
                      uso	
  do	
  heptassílabo	
                                                          críHca	
  social	
  ferina	
  
                                                            A	
  LINGUAGEM	
  CHULA	
  
              choca	
  os	
  leitores	
  de	
  bom	
  gosto	
                       rompe	
  com	
  o	
  senso	
  comum	
  [caráter	
  contestador]	
  

Mais conteúdo relacionado

Mais procurados

Revisional de literatura moderna no enem
Revisional de literatura moderna no enemRevisional de literatura moderna no enem
Revisional de literatura moderna no enemma.no.el.ne.ves
 
Slides Seminário de Literatura Brasileira_ Memorias Póstumas de Brás Cubas
Slides Seminário de Literatura Brasileira_ Memorias Póstumas de Brás CubasSlides Seminário de Literatura Brasileira_ Memorias Póstumas de Brás Cubas
Slides Seminário de Literatura Brasileira_ Memorias Póstumas de Brás CubasKalyne Saadh
 
segunda geração romântica
segunda geração românticasegunda geração romântica
segunda geração românticaalinesantana1422
 
Realismo e naturalismo resumo
Realismo e naturalismo   resumoRealismo e naturalismo   resumo
Realismo e naturalismo resumoVilmar Vilaça
 
2ª Fase do Modernismo (Poesia)
2ª Fase do Modernismo (Poesia)2ª Fase do Modernismo (Poesia)
2ª Fase do Modernismo (Poesia)rkhelena
 
O negro na literatura brasileira
O negro na literatura brasileiraO negro na literatura brasileira
O negro na literatura brasileirama.no.el.ne.ves
 
Noite na Taverna
Noite na TavernaNoite na Taverna
Noite na TavernaKauan_ts
 
Memorias postumas de bras cubas
Memorias postumas de bras cubasMemorias postumas de bras cubas
Memorias postumas de bras cubassilvio30
 
Apresentação - Manuel Bandeira - Libertinagem
Apresentação - Manuel Bandeira - LibertinagemApresentação - Manuel Bandeira - Libertinagem
Apresentação - Manuel Bandeira - Libertinagemvinivs
 
Amar, verbo intransitivo, de mário de andrade
Amar, verbo intransitivo, de mário de andradeAmar, verbo intransitivo, de mário de andrade
Amar, verbo intransitivo, de mário de andradecarinemorossino74
 
Simbolismo em Portugal
Simbolismo em PortugalSimbolismo em Portugal
Simbolismo em PortugalMarcelleLG
 

Mais procurados (20)

Barroco
BarrocoBarroco
Barroco
 
Revisional de literatura moderna no enem
Revisional de literatura moderna no enemRevisional de literatura moderna no enem
Revisional de literatura moderna no enem
 
Slides Seminário de Literatura Brasileira_ Memorias Póstumas de Brás Cubas
Slides Seminário de Literatura Brasileira_ Memorias Póstumas de Brás CubasSlides Seminário de Literatura Brasileira_ Memorias Póstumas de Brás Cubas
Slides Seminário de Literatura Brasileira_ Memorias Póstumas de Brás Cubas
 
Basilio da Gama
Basilio da GamaBasilio da Gama
Basilio da Gama
 
Arcadismo
ArcadismoArcadismo
Arcadismo
 
segunda geração romântica
segunda geração românticasegunda geração romântica
segunda geração romântica
 
Realismo e naturalismo resumo
Realismo e naturalismo   resumoRealismo e naturalismo   resumo
Realismo e naturalismo resumo
 
Arcadismo 2010
Arcadismo 2010Arcadismo 2010
Arcadismo 2010
 
2ª Fase do Modernismo (Poesia)
2ª Fase do Modernismo (Poesia)2ª Fase do Modernismo (Poesia)
2ª Fase do Modernismo (Poesia)
 
O negro na literatura brasileira
O negro na literatura brasileiraO negro na literatura brasileira
O negro na literatura brasileira
 
Noite na Taverna
Noite na TavernaNoite na Taverna
Noite na Taverna
 
Barroco
BarrocoBarroco
Barroco
 
Memorias postumas de bras cubas
Memorias postumas de bras cubasMemorias postumas de bras cubas
Memorias postumas de bras cubas
 
Elementos da narrativa
Elementos da narrativaElementos da narrativa
Elementos da narrativa
 
Alguma poesia
Alguma poesiaAlguma poesia
Alguma poesia
 
Apresentação - Manuel Bandeira - Libertinagem
Apresentação - Manuel Bandeira - LibertinagemApresentação - Manuel Bandeira - Libertinagem
Apresentação - Manuel Bandeira - Libertinagem
 
Concretismo
ConcretismoConcretismo
Concretismo
 
Amar, verbo intransitivo, de mário de andrade
Amar, verbo intransitivo, de mário de andradeAmar, verbo intransitivo, de mário de andrade
Amar, verbo intransitivo, de mário de andrade
 
Simbolismo em Portugal
Simbolismo em PortugalSimbolismo em Portugal
Simbolismo em Portugal
 
Slide Dom Casmurro
Slide Dom CasmurroSlide Dom Casmurro
Slide Dom Casmurro
 

Destaque (20)

Gregório de Matos
Gregório de MatosGregório de Matos
Gregório de Matos
 
Gregório de matos
Gregório de matosGregório de matos
Gregório de matos
 
Gregório
 Gregório Gregório
Gregório
 
Gregório de Matos Guerra
Gregório de Matos GuerraGregório de Matos Guerra
Gregório de Matos Guerra
 
O barroco
O barrocoO barroco
O barroco
 
O barroco no Brasil
O barroco no BrasilO barroco no Brasil
O barroco no Brasil
 
Literatura - Barroco
Literatura - BarrocoLiteratura - Barroco
Literatura - Barroco
 
O Barroco
O BarrocoO Barroco
O Barroco
 
Gregório de matos
Gregório de matosGregório de matos
Gregório de matos
 
Barroco
BarrocoBarroco
Barroco
 
Barroco aula de literatura
Barroco   aula de literaturaBarroco   aula de literatura
Barroco aula de literatura
 
C1311 pequei senhor
C1311 pequei senhorC1311 pequei senhor
C1311 pequei senhor
 
Poemas de gregório de matos guerra
Poemas de gregório de matos guerraPoemas de gregório de matos guerra
Poemas de gregório de matos guerra
 
Revisional de estilos de época 02, barroco
Revisional de estilos de época 02, barrocoRevisional de estilos de época 02, barroco
Revisional de estilos de época 02, barroco
 
Projeto barroco brasileiro
Projeto barroco brasileiroProjeto barroco brasileiro
Projeto barroco brasileiro
 
GregóRio De Matos Caroline
GregóRio De Matos CarolineGregóRio De Matos Caroline
GregóRio De Matos Caroline
 
Revisando o barroco, 02
Revisando o barroco, 02Revisando o barroco, 02
Revisando o barroco, 02
 
Revisando o barroco, 01
Revisando o barroco, 01Revisando o barroco, 01
Revisando o barroco, 01
 
Análise do Sermão da Sexagésima
Análise do Sermão da SexagésimaAnálise do Sermão da Sexagésima
Análise do Sermão da Sexagésima
 
Sermão da sexagésima
Sermão da sexagésimaSermão da sexagésima
Sermão da sexagésima
 

Semelhante a Faces poéticas de gregório de matos (20)

Características do Barroco
 Características do Barroco Características do Barroco
Características do Barroco
 
Literatura
LiteraturaLiteratura
Literatura
 
Literatura
LiteraturaLiteratura
Literatura
 
Literatura.ppt
Literatura.pptLiteratura.ppt
Literatura.ppt
 
2- Perioddo Barroco.pptx
2- Perioddo Barroco.pptx2- Perioddo Barroco.pptx
2- Perioddo Barroco.pptx
 
Barroco contexto e caract
Barroco   contexto e caractBarroco   contexto e caract
Barroco contexto e caract
 
Barroco
BarrocoBarroco
Barroco
 
Barroco nota de aula -
Barroco nota de aula    - Barroco nota de aula    -
Barroco nota de aula -
 
13650916 literatura-aula-05-barroco-em-portugal-e-literatura-informativa
13650916 literatura-aula-05-barroco-em-portugal-e-literatura-informativa13650916 literatura-aula-05-barroco-em-portugal-e-literatura-informativa
13650916 literatura-aula-05-barroco-em-portugal-e-literatura-informativa
 
Lit humanismo-renasc-classicismo português - profª katty
Lit  humanismo-renasc-classicismo português - profª kattyLit  humanismo-renasc-classicismo português - profª katty
Lit humanismo-renasc-classicismo português - profª katty
 
Aula 05 barroco em portugal e literatura informativa
Aula 05   barroco em portugal e literatura informativaAula 05   barroco em portugal e literatura informativa
Aula 05 barroco em portugal e literatura informativa
 
Simbolismo/Decadentismo
Simbolismo/DecadentismoSimbolismo/Decadentismo
Simbolismo/Decadentismo
 
Barroco
BarrocoBarroco
Barroco
 
Barroco
BarrocoBarroco
Barroco
 
Barroco
BarrocoBarroco
Barroco
 
Barroco
BarrocoBarroco
Barroco
 
Barroco
BarrocoBarroco
Barroco
 
Jogos da memória
Jogos da memóriaJogos da memória
Jogos da memória
 
período barroco
período barrocoperíodo barroco
período barroco
 
Barroco e arcadismo
Barroco e arcadismoBarroco e arcadismo
Barroco e arcadismo
 

Mais de ma.no.el.ne.ves

Segunda aplicação do ENEM-2019: Literatura
Segunda aplicação do ENEM-2019: LiteraturaSegunda aplicação do ENEM-2019: Literatura
Segunda aplicação do ENEM-2019: Literaturama.no.el.ne.ves
 
Segunda aplicação do ENEM-2019: Internet e tecnologias
Segunda aplicação do ENEM-2019: Internet e tecnologiasSegunda aplicação do ENEM-2019: Internet e tecnologias
Segunda aplicação do ENEM-2019: Internet e tecnologiasma.no.el.ne.ves
 
Segunda aplicação do ENEM-2019: Identidades brasileiras
Segunda aplicação do ENEM-2019: Identidades brasileirasSegunda aplicação do ENEM-2019: Identidades brasileiras
Segunda aplicação do ENEM-2019: Identidades brasileirasma.no.el.ne.ves
 
Segunda aplicação do ENEM-2019: Educação Física
Segunda aplicação do ENEM-2019: Educação FísicaSegunda aplicação do ENEM-2019: Educação Física
Segunda aplicação do ENEM-2019: Educação Físicama.no.el.ne.ves
 
Segunda aplicação do ENEM-2019: Compreensão textual
Segunda aplicação do ENEM-2019: Compreensão textualSegunda aplicação do ENEM-2019: Compreensão textual
Segunda aplicação do ENEM-2019: Compreensão textualma.no.el.ne.ves
 
Segunda aplicação do ENEM-2019: Aspectos gramaticais
Segunda aplicação do ENEM-2019: Aspectos gramaticaisSegunda aplicação do ENEM-2019: Aspectos gramaticais
Segunda aplicação do ENEM-2019: Aspectos gramaticaisma.no.el.ne.ves
 
Segunda aplicação do ENEM-2019: Artes
Segunda aplicação do ENEM-2019: ArtesSegunda aplicação do ENEM-2019: Artes
Segunda aplicação do ENEM-2019: Artesma.no.el.ne.ves
 
ENEM-2019: Internet e Tecnologias
ENEM-2019: Internet e TecnologiasENEM-2019: Internet e Tecnologias
ENEM-2019: Internet e Tecnologiasma.no.el.ne.ves
 
ENEM-2019: Identidades brasileiras
ENEM-2019: Identidades brasileirasENEM-2019: Identidades brasileiras
ENEM-2019: Identidades brasileirasma.no.el.ne.ves
 
ENEM-2019: Aspectos Gramaticais
ENEM-2019: Aspectos GramaticaisENEM-2019: Aspectos Gramaticais
ENEM-2019: Aspectos Gramaticaisma.no.el.ne.ves
 
ENEM-2019: Educação Física
ENEM-2019: Educação FísicaENEM-2019: Educação Física
ENEM-2019: Educação Físicama.no.el.ne.ves
 
ENEM-2019: Compreensão Textual
ENEM-2019: Compreensão TextualENEM-2019: Compreensão Textual
ENEM-2019: Compreensão Textualma.no.el.ne.ves
 
Terceira aplicação do ENEM-2017: Tecnologias e Internet
Terceira aplicação do ENEM-2017: Tecnologias e InternetTerceira aplicação do ENEM-2017: Tecnologias e Internet
Terceira aplicação do ENEM-2017: Tecnologias e Internetma.no.el.ne.ves
 
Terceira aplicação do ENEM-2017: Literatura
Terceira aplicação do ENEM-2017: LiteraturaTerceira aplicação do ENEM-2017: Literatura
Terceira aplicação do ENEM-2017: Literaturama.no.el.ne.ves
 
Terceira aplicação do ENEM-2017: Educação Física
Terceira aplicação do ENEM-2017: Educação FísicaTerceira aplicação do ENEM-2017: Educação Física
Terceira aplicação do ENEM-2017: Educação Físicama.no.el.ne.ves
 
Terceira aplicação do ENEM-2017: Compreensão Textual
Terceira aplicação do ENEM-2017: Compreensão TextualTerceira aplicação do ENEM-2017: Compreensão Textual
Terceira aplicação do ENEM-2017: Compreensão Textualma.no.el.ne.ves
 
Terceira aplicação do ENEM-2017: Artes
Terceira aplicação do ENEM-2017: ArtesTerceira aplicação do ENEM-2017: Artes
Terceira aplicação do ENEM-2017: Artesma.no.el.ne.ves
 
Análise da Prova de Redação da UERJ-2010
Análise da Prova de Redação da UERJ-2010Análise da Prova de Redação da UERJ-2010
Análise da Prova de Redação da UERJ-2010ma.no.el.ne.ves
 

Mais de ma.no.el.ne.ves (20)

Segunda aplicação do ENEM-2019: Literatura
Segunda aplicação do ENEM-2019: LiteraturaSegunda aplicação do ENEM-2019: Literatura
Segunda aplicação do ENEM-2019: Literatura
 
Segunda aplicação do ENEM-2019: Internet e tecnologias
Segunda aplicação do ENEM-2019: Internet e tecnologiasSegunda aplicação do ENEM-2019: Internet e tecnologias
Segunda aplicação do ENEM-2019: Internet e tecnologias
 
Segunda aplicação do ENEM-2019: Identidades brasileiras
Segunda aplicação do ENEM-2019: Identidades brasileirasSegunda aplicação do ENEM-2019: Identidades brasileiras
Segunda aplicação do ENEM-2019: Identidades brasileiras
 
Segunda aplicação do ENEM-2019: Educação Física
Segunda aplicação do ENEM-2019: Educação FísicaSegunda aplicação do ENEM-2019: Educação Física
Segunda aplicação do ENEM-2019: Educação Física
 
Segunda aplicação do ENEM-2019: Compreensão textual
Segunda aplicação do ENEM-2019: Compreensão textualSegunda aplicação do ENEM-2019: Compreensão textual
Segunda aplicação do ENEM-2019: Compreensão textual
 
Segunda aplicação do ENEM-2019: Aspectos gramaticais
Segunda aplicação do ENEM-2019: Aspectos gramaticaisSegunda aplicação do ENEM-2019: Aspectos gramaticais
Segunda aplicação do ENEM-2019: Aspectos gramaticais
 
Segunda aplicação do ENEM-2019: Artes
Segunda aplicação do ENEM-2019: ArtesSegunda aplicação do ENEM-2019: Artes
Segunda aplicação do ENEM-2019: Artes
 
ENEM-2019: Literatura
ENEM-2019: LiteraturaENEM-2019: Literatura
ENEM-2019: Literatura
 
ENEM-2019: Internet e Tecnologias
ENEM-2019: Internet e TecnologiasENEM-2019: Internet e Tecnologias
ENEM-2019: Internet e Tecnologias
 
ENEM-2019: Identidades brasileiras
ENEM-2019: Identidades brasileirasENEM-2019: Identidades brasileiras
ENEM-2019: Identidades brasileiras
 
ENEM-2019: Aspectos Gramaticais
ENEM-2019: Aspectos GramaticaisENEM-2019: Aspectos Gramaticais
ENEM-2019: Aspectos Gramaticais
 
ENEM-2019: Educação Física
ENEM-2019: Educação FísicaENEM-2019: Educação Física
ENEM-2019: Educação Física
 
ENEM-2019: Compreensão Textual
ENEM-2019: Compreensão TextualENEM-2019: Compreensão Textual
ENEM-2019: Compreensão Textual
 
ENEM-2019: Artes
ENEM-2019: ArtesENEM-2019: Artes
ENEM-2019: Artes
 
Terceira aplicação do ENEM-2017: Tecnologias e Internet
Terceira aplicação do ENEM-2017: Tecnologias e InternetTerceira aplicação do ENEM-2017: Tecnologias e Internet
Terceira aplicação do ENEM-2017: Tecnologias e Internet
 
Terceira aplicação do ENEM-2017: Literatura
Terceira aplicação do ENEM-2017: LiteraturaTerceira aplicação do ENEM-2017: Literatura
Terceira aplicação do ENEM-2017: Literatura
 
Terceira aplicação do ENEM-2017: Educação Física
Terceira aplicação do ENEM-2017: Educação FísicaTerceira aplicação do ENEM-2017: Educação Física
Terceira aplicação do ENEM-2017: Educação Física
 
Terceira aplicação do ENEM-2017: Compreensão Textual
Terceira aplicação do ENEM-2017: Compreensão TextualTerceira aplicação do ENEM-2017: Compreensão Textual
Terceira aplicação do ENEM-2017: Compreensão Textual
 
Terceira aplicação do ENEM-2017: Artes
Terceira aplicação do ENEM-2017: ArtesTerceira aplicação do ENEM-2017: Artes
Terceira aplicação do ENEM-2017: Artes
 
Análise da Prova de Redação da UERJ-2010
Análise da Prova de Redação da UERJ-2010Análise da Prova de Redação da UERJ-2010
Análise da Prova de Redação da UERJ-2010
 

Faces poéticas de gregório de matos

  • 1. Faces poéticas de Gregório de Matos Manoel Neves
  • 2. BARROCO marcos literários 1601 1768 Prosopopéia,  Bento  Teixeira   Obras,  Cláudio  Manuel  da  Costa   poema  épico  q  narra  feitos  heroicos  de  Jorge  de   livro  de  sonetos  à  moda  camoniana   Albuquerque  Coelho,  3º.  donatário  da  Capitania   perfeição  formal  e  temáHca  neoclássica   de  Pernambuco;  segue  modelo  camoniano   bucolismo  +  fugere  urbem  +  aurea  mediocritas  
  • 3. DISCUTINDO O CONCEITO DE BARROCO faces poéticas de Gregório de Matos etimologia pérola  irregular  e  defeituosa   processos  confusos  de  raciocínio   perda  da  clareza  e  da  elegância  clássicas   o senso comum para  o  senso  comum,  o  Barroco  está  associado  ao  que  é  bizarro,  confuso  ou  obscuro   a reabilitação o  estudioso  alemão  Wölflin  reabilitou  o  termo,  que  passou  a  designar  um  Hpo  de  arte  moderna  
  • 4. A CONTRARREFORMA e suas implicações na literatura barroca século XVI MarHnho   Lutero   protesta   contra   desvios-­‐desmandos   dos   que   REFORMA  PROTESTANTE   professavam   a   doutrina   católica.   [a   Reforma   espalha-­‐se   por   Alemanha,  França,  Reino  Unido  e  Holanda]   Defende-­‐se   a   unidade   da   fé   e   a   disciplina   eclesiásHca.   Desdobramentos:   Inquisição,   [volta   do]   Tribunal   do   Santo   CONCÍLIO  DE  TRENTO  [1545]   O^cio   e   Index   librorum   prohibitorum.   A   Companhia   de   Jesus   difunde  e  aplica  os  ideais  contrarreformistas.   Autos   de   fé:   rituais   de   punição   aos   hereges,   que   eram   CLIMA  DE  TERROR  RELIGIOSO   queimados   em   praça   pública.   A   ação   da   Inquisição   aHngiu   principalmente   Bahia   e   Pernambuco.   Autores   como   Galileu,   Descartes  e  Newton  são  abolidos  do  ensino.   temas na literatura fragilidade e efemeridade da existência contrição e consciência do pecado dolorosa percepção do tempo e da efemeridade advertência contínua sobre a brevidade da vida permanente inutilidade das glórias mundanas consciência de que o homem é mortal e limitado
  • 5. O HOMEM BARROCO dividido entre duas concepções de mundo TEOCENTRISMO  MEDIEVAL   ANTROPOCENTRISMO  RENASCENTISTA   Deus  é  o  centro  e  a  medida  de  todas  as  coisas   o  homem  é  a  medida  de  todas  as  coisas   geocentrismo   heliocentrismo   conhecimento  restrito  à  Igreja   produção  e  difusão  de  conhecimento   valorização  dos  santos  e  márHres   caráter  clássico   consciência  da  transitoriedade  da  vida   volta  aos  padrões  culturais  greco-­‐romanos   busca  da  salvação  da  alma   celebração  do  prazer  de  viver:  Carpe  diem   consequências espiritualização  da  matéria   mistura  do  real  e  do  sobrenatural   fixação  de  estados  contraditórios   grande  volume  de  angteses  e  paradoxos  
  • 6. ESTILOS BARROCOS literatura colonial cultismo ou gongorismo conceptismo ou quevedismo influência: Luiz de Gôngora influência: Francisco de Quevedo requinte da forma sutileza das idéias vocabulário raro raciocínios engenhosos alusões mitológicas associações inesperadas reiteração de metáforas alegorias, paradoxos jogos de palavras jogos de idéias uso excessivo de figuras de linguagem percepção íntima dos objetos Essas   duas   tendências   se   completam   e,   não   raro,   coexistem   num   mesmo   texto   literário.   Gregório   de   Matos   usa,   em   geral,   o   culHsmo   em   sua   obra   literária;   por   vezes,   entretanto,   é   percepgvel  a  presença  do  concepHsmo.  
  • 7. CARACTERÍSTICAS barroco fusionismo tentativa de conciliar [fundir] concepções conflitantes de mundo consequências espiritualização  da  matéria   mistura  do  real  e  do  sobrenatural   fixação  de  estados  contraditórios   grandes  volumes  de  angteses  e  paradoxos  
  • 8. CARACTERÍSTICAS barroco carpe diem consciência  da  transitoriedade  da  vida   desejo  de  aproveitar  a  vida  intensamente   consequências desengano  ante  as  limitações  humanas   preferência  pelo  grotesco  e  pelo  desarmonioso   uso  de  símbolos  de  visão  pessimista  [caveira]   consciência  da  instabilidade  da  vida   consciência  de  que  a  morte  é  inevitável  
  • 9. LINHAS TEMÁTICO-ESTILÍSTICAS faces poéticas de Gregório de Matos religiosidade tensa; fusionismo; jogos de opostos; cultismo e conceptismo; desconcerto do mundo; carpe diem; poesia paradoxalmente ligada ao cotidiano e ao sublime.
  • 10. GREGÓRIO DE MATOS aspectos biográficos filho de proprietários rurais, sai do Brasil para estudar em Portugal na primeira metade do séc. XVII na primeira metade do século XVII, o dinheiro está nas mãos dos produtores de cana-de-açúcar na segunda metade do século XVII, o dinheiro está nas mãos dos comerciantes de cana-de-açúcar ao voltar ao Brasil, tem sua posição econômica alterada, por isso faz oposição ao poder colonial
  • 11. GREGÓRIO DE MATOS aspectos estilísticos a obra POESIA LÍRICA POESIA METAFÍSICA POESIA SATÍRICA molde  europeu   molde  europeu   caráter  brasileiro   caráter brasileiro uso de termos indígenas, africanos e de baixo calão crítica ao poder colonial estabelecido boca do inferno textos satíricos de cunho popular que circulam de boca em boca atitude satírica ferina
  • 12. A LÍRICA METAFÍSICA poesia filosófica e religiosa de Gregório de Matos
  • 13. PEQUEI, SENHOR, MAS... Gregório de Matos Pequei,  Senhor,  mas  não  porque  hei  pecado,   CARÁTER  CLÁSSICO   Da  vossa  piedade  me  despido,   Porque  quanto  mais  tenho  delinquido,   soneto  decassílabo   Vos  tenho  a  perdoar  mais  empenhado.   LIRISMO  METAFÍSICO   Se  basta  a  vos  irar  tanto  pecado,   consciência  do  pecado   A  abrandar-­‐vos  sobeja  um  só  gemido,   Que  a  mesma  culpa  que  vos  há  ofendido,   intertextualidade  [Filho  pródigo]   Vos  tem  para  o  perdão  lisonjeado.   RELIGIOSIDADE  TENSA   Se  uma  ovelha  perdida,  e  já  cobrada   quanto  +  peca,  +  o  locutor  quer  ser  perdoado   Glória  tal,  e  prazer  tão  repenHno   Vos  deu,  como  afirmais  na  Sacra  História   afirma-­‐se  que  Deus  se  compraz  no  pecado   Eu  sou,  Senhor,  a  ovelha  desgarrada   quanto  +  se  peca,  +  Deus  tem  que  perdoar   Cobrai-­‐a,  e  não  queirais,  Pastor  Divino,   CONCEPTISMO   Perder  na  vossa  ovelha  a  vossa  glória.  
  • 14. CARREGADO DE MIM ANDO NO MUNDO Gregório de Matos Carregado  de  mim  ando  no  mundo,   CARÁTER  CLÁSSICO   E  o  grande  peso  embarga-­‐me  as  passadas,   soneto  decassílabo   Que  como  ando  por  vias  desusadas,   Faço  o  peso  crescer,  e  vou-­‐me  ao  fundo.   LIRISMO  METAFÍSICO   O  remédio  será  seguir  o  imundo   o  desconcerto  do  mundo   Caminho,  onde  dos  mais  vejo  as  pisadas,   ASPECTOS  TEMÁTICOS   Que  as  bestas  andam  juntas  mais  ousadas,   Do  que  anda  só  o  engenho  mais  profundo.   temáHca  clássica   Não  é  fácil  viver  entre  os  insanos,   tom  elevado   Erra,  quem  presumir  que  sabe  tudo,   constatação  de  o  mundo  está  errado   Se  o  atalho  não  soube  dos  seus  danos.   buscar  a  verdade  é  inócuo   O  prudente  varão  há  de  ser  mudo,   Que  é  melhor  neste  mundo  o  mar  de  enganos   adesão  ao  erro:  postura  conservadora   Ser  louco  c’os  demais,  que  ser  sisudo.   CONCEPTISMO  
  • 15. NASCE O SOL, E NÃO DURA... Gregório de Matos Nasce  o  Sol,  e  não  dura  mais  que  um  dia,   CARÁTER  CLÁSSICO   Depois  da  Luz  se  segue  a  noite  escura,   Em  tristes  sombras  morre  a  formosura,   soneto  decassílabo   Em  congnuas  tristezas  a  alegria.     LIRISMO  METAFÍSICO   Porém,  se  acaba  o  Sol,  por  que  nascia?   constatação  de  que  tudo  é  transitório   Se  é  tão  formosa  a  Luz,  por  que  não  dura?   Como  a  beleza  assim  se  transfigura?   RECURSOS  ESTILÍSTICOS   Como  o  gosto  da  pena  assim  se  fia?   grande  volume  de  angteses  [estrofe  1]   Mas  no  Sol,  e  na  Luz  falte  a  firmeza,   jogos  de  interrogações  [estrofe  2]   Na  formosura  não  se  dê  constância,   E  na  alegria  sinta-­‐se  tristeza.   grande  volume  de  metáforas   Começa  o  mundo  enfim  pela  ignorância,   paradoxo  [úlHmo  verso]   E  tem  qualquer  dos  bens  por  natureza   CULTISMO  E  CONCEPTISMO   A  firmeza  somente  na  inconstância.  
  • 16. O TODO SEM A PARTE NÃO É TODO... Gregório de Matos O  todo  sem  a  parte  não  é  todo,   A  parte  sem  o  todo  não  é  parte,   CARÁTER  CLÁSSICO   Mas  se  a  parte  o  faz  todo,  sendo  parte,   soneto  decassílabo   Não  se  diga  que  é  parte  sendo  todo.   LIRISMO  METAFÍSICO  [paradoxo]   Em  todo  o  Sacramento  está  Deus  todo,   E  todo  assiste  inteiro  em  qualquer  parte,   Deus  está  em  cada  parte  do  sacramento   E  feito  em  partes  todo  em  toda  a  parte   cada  uma  das  partes  é  Deus   Em  qualquer  parte  sempre  fica  o  todo.   POESIA  DE  CIRCUNSTÂNCIA   O  braço  de  Jesus  não  seja  parte,   Pois  que  feito  Jesus  em  partes  todo,   poema  feito  para  celebrar  o  fato  de  haverem   Assiste  cada  parte  em  sua  parte.   encontrado  um  braço  de  uma  imagem  de  Jesus   Não  se  sabendo  parte  deste  todo,   Cristo  que  desaparecera  de  uma  Igreja  na  Bahia   Um  braço,  que  lhe  acharam,  sendo  parte,   CONCEPTISMO   Nos  disse  as  partes  todas  deste  todo.  
  • 17. A LÍRICA AMOROSA o lirismo amoroso na poesia de Gregório de Matos
  • 18. ANJO NO NOME, ANGÉLICA NA CARA! Gregório de Matos Anjo  no  nome,  Angélica  na  cara!   CARÁTER  CLÁSSICO   Isso  é  ser  flor,  e  Anjo  juntamente:   Ser  Angélica  flor,  e  Anjo  florente   soneto  decassílabo   Em  quem,  senão  em  vós,  se  uniformara?   LIRISMO  AMOROSO   Quem  vira  uma  tal  flor,  que  a  não  cortara,   celebração  da  beleza  da  amada   De  verde  pé,  da  rama  florescente?   A  quem  um  Anjo  vira  tão  luzente   JOGOS  DE  OPOSTOS   Que  por  seu  Deus  o  não  idolatrara?   flor:  metáfora  da  beleza  fugaz  da  mulher   Se  pois  como  Anjo  sois  dos  meus  altares,   anjo:  alusão  ao  caráter  celesHal  da  mulher   Fôreis  o  meu  custódio,  e  minha  guarda,   Livrara  eu  de  diabólicos  azares.   Sois  anjo,  que  me  tenta,  e  não  me  guarda   Mas  vejo  que  tão  bela,  e  tão  galharda,   a  mulher  possui  uma  beleza  paradoxal   Posto  que  os  Anjos  nunca  dão  pesares,   CONCEPTISMO   Sois  Anjo,  que  me  tenta,  e  não  me  guarda.  
  • 19. DISCRETA, E FORMOSÍSSIMA MARIA, Gregório de Matos Discreta,  e  formosíssima  Maria,   CARÁTER  CLÁSSICO   Enquanto  estamos  vendo  a  qualquer  hora   soneto  decassílabo   Em  tuas  faces  a  rosada  Aurora,   Em  teus  olhos,  e  boca  o  Sol,  e  o  dia:   LIRISMO  AMOROSO   Enquanto  com  genHl  descortesia   constatação  de  que  tudo  é  transitório   O  ar,  que  fresco  Adônis  te  namora,   convite  à  amada  para  aproveitar  a  vida   te  espalha  a  rica  trança  voadora,   Quando  vem  passear-­‐te  pela  fria:   RECURSOS  ESTILÍSTICOS   Goza,  goza  da  flor  da  mocidade,   alusões  mitológicas  [estrofes  1  e  2]   Que  o  tempo  trota  a  toda  ligeireza,   uso  de  metáforas  [estrofes  1,  2,  3,  4]   E  imprime  em  toda  a  flor  sua  pisada.   gradação  [úlHmo  verso]   Oh  não  aguardes  que  a  madura  idade   te  converta  em  flor,  essa  beleza   aliteração  [terceira  estrofe]   Em  terra,  em  cinza,  em  pó,  em  sombra,  em  nada.     CULTISMO  
  • 20. RUBI, CONCHA DE PERLAS PEREGRINA Gregório de Matos Rubi,  concha  de  perlas  peregrina,   CARÁTER  CLÁSSICO   Animado  Cristal,  viva  escarlata.   Duas  Safiras  sobre  lisa  prata,   soneto  decassílabo   Ouro  encrespado  sobre  prata  fina.   LIRISMO  AMOROSO   Este  o  rosHnho  é  de  Caterina;   celebração  da  beleza  da  mulher  amada   E  porque  docemente  obriga,  e  mata,   Não  livra  o  ser  divina  em  ser  ingrata,   CONSTRUÇÃO  PARADOXAL   E  raio  a  raio  os  corações  fulmina.   três  primeiras  estrofes   Viu  Fábio  uma  tarde  transportado   [construção  de  um  retrato  idealizado  da  amada]   Bebendo  admirações  e  galhardias,   A  quem  já  tanto  amor  levantou  aras.   úlRma  estrofe   Disse  igualmente  amante,  e  magoado:   [desidealização:  cena  escatológica]   Ah,  muchacha  genHl,  que  tal  serias,   CULTISMO   Se  sendo  tão  formosa,  não  cagaras.  
  • 21. A SÁTIRA poesia e contestação em Gregório de Matos
  • 22. GREGÓRIO DE MATOS aspectos estilísticos a sátira universo  colonial  brasileiro   língua  brasileira   vida cotidiana política costumes políHca   críHca  aos  dirigentes   visa  à  moralização   economia   nobres   volta  à  ordem  anterior   críHca  social  e  de  costumes   governadores  e  clero   caráter  conservador  
  • 23. SE PICA-FLOR ME CHAMAIS Gregório de Matos Se  pica-­‐flor  me  chamais,   Pica-­‐flor  aceito  ser,   Mas  resta  agora  saber,   Se  no  nome  que  me  dais,   Meteis  a  flor,  que  guardais,   No  passarinho  melhor!   Se  me  dais  este  favor   Sendo  só  de  mim  o  Pica,   E  o  mais  vosso,  claro  fica,   Que  fico  então  Pica-­‐flor.   MATOS,  Gregório  de.  Antologia.  Disponível  em:  hrp://manoelneves.com   POESIA  DE  CIRCUNSTÂNCIA   o  poema  é  fruto  de  uma  situação  específica   freira  teria  dito  que  o  poeta  parecia  um  pássaro   JOGOS  METAFÓRICOS   pica:  lança  [objeto  que  perfura]   flor:  símbolo  da  beleza  fugaz  e  da  feminilidade   pica-­‐flor:  pássaro  [beija-­‐flor]   CULTISMO  
  • 24. TRISTE BAHIA! Gregório de Matos Triste  Bahia!  Ó  quão  dessemelhante     CARÁTER  CLÁSSICO   Estás  e  estou  do  nosso  anHgo  estado!     soneto  decassílabo   Pobre  te  vejo  a  H,  tu  a  mi  empenhado,     Rica  te  vi  eu  já,  tu  a  mi  abundante.   LIRISMO  SOCIAL   A  H  trocou-­‐te  a  máquina  mercante,     críHca  à  situação  social  do  locutor  e  da  Bahia   Que  em  tua  larga  barra  tem  entrado,     ASPECTOS  HISTÓRICOS  E  ESTILÍSTICOS   A  mim  foi-­‐me  trocando,  e  tem  trocado,     Tanto  negócio  e  tanto  negociante.     jogo  especular  e  anHtéHco  [primeira  estrofe]   Deste  em  dar  tanto  açúcar  excelente     referência  ao  mercanHlismo  [estrofes  2  e  3]   Pelas  drogas  inúteis,  que  abelhuda     anagrama:  brichote   Simples  aceitas  do  sagaz  Brichote.     desejo  de  mudança  [úlHma  estrofe]   Oh  se  quisera  Deus  que  de  repente     Um  dia  amanheceras  tão  sisuda     metáforas    [estrofes  2  e  4]   Que  fora  de  algodão  o  teu  capote!     CULTISMO  
  • 25. NESTE MUNDO É MAIS RICO... Gregório de Matos Neste  mundo  é  mais  rico  o  que  mais  rapa:   CARÁTER  CLÁSSICO   Quem  mais  limpo  se  faz,  tem  mais  carepa;   soneto  decassílabo   Com  sua  língua,  ao  nobre  o  vil  decepa:   O  velhaco  maior  sempre  tem  capa.   LIRISMO  SOCIAL   Mostra  o  paHfe  da  nobreza  o  mapa:   o  locutor  demonstra  desprezo  pelos  novos  ricos   Quem  tem  mão  de  agarrar,  ligeiro  trepa;   ASPECTOS  HISTÓRICOS  E  ESTILÍSTICOS   Quem  menos  falar  pode,  mais  increpa:   Quem  dinheiro  Hver,  pode  ser  Papa.   jogos  paronomásHcos  [rimas]   A  flor  baixa  se  inculca  por  tulipa;   jogos  metafóricos  [estrofes  1,  2,  3,  4]   Bengala  hoje  na  mão,  ontem  garlopa,   jogos  aliteraHvos  [úlHma  estrofe]   Mais  isento  se  mostra  o  que  mais  chupa.   feismo  [úlHma  estrofe]   Para  a  tropa  do  trapo  vazo  a  tripa   E  mais  não  digo,  porque  a  Musa  topa   metalinguagem  [úlHma  estrofe]   Em  apa,  epa,  ipa,  opa,  upa.   CULTISMO  
  • 26. A CADA CANTO... Gregório de Matos A  cada  canto  um  grande  conselheiro   CARÁTER  CLÁSSICO   Que  nos  quer  governar  cabana  e  vinha;   soneto  decassílabo   Não  sabem  governar  sua  cozinha   E  podem  governar  o  mundo  inteiro.   LIRISMO  SOCIAL   Em  cada  porta  um  bem  frequente  olheiro   críHca  aos  governantes,  aos  que  dão  palpites  no   Que  a  vida  do  vizinho  e  da  vizinha   governo,  aos    fofoqueiros,  aos  velhacos,  aos   Pesquisa,  escuta,  espreita  e  esquadrinha   juros  altos  e  aos  ricos  [chamados  de  ladrões]   Para  o  levar  à  praça  e  ao  terreiro.   Muitos  mulatos  desavergonhados,   ASPECTOS  ESTILÍSTICOS   Trazidos  sob  os  pés  os  homens  nobres,   reforço  poéHco  [primeira  estrofe]   Posta  nas  palmas  toda  a  picardia,   linguagem  sagrica  direta   Estupendas  usuras  nos  mercados,   Todos  os  que  não  furtam  muito  pobres:   economia  de  metáforas   E  eis  aqui  a  cidade  da  Bahia.   RESSENTIMENTO  CONTRA  OS  RICOS  
  • 27. UM CALÇÃO DE PINDOBA A MEIA ZORRA Gregório de Matos Um  calção  de  pindoba  a  meia  zorra     Camisa  de  Urucu,  mantéu  de  Arara,     CARÁTER  CLÁSSICO   Em  lugar  de  cotó  arco,  e  taquara,     Penacho  de  Guarás  em  vez  de  gorra.     soneto  decassílabo   Furado  o  beiço,  e  sem  temor  que  morra,     LIRISMO  SOCIAL   O  pai,  que  lho  envazou  cuma  Htara,     críHca  à  nobreza  da  terra:  não  tem  sangue  azul   Senão  a  Mãe,  que  a  pedra  lhe  aplicara,     A  reprimir-­‐lhe  o  sangue,  que  não  corra.   ASPECTOS  ESTILÍSTICOS   Animal  sem  razão,  bruto  sem  fé,     vocabulário  indígena   Sem  mais  Leis,  que  as  do  gosto,  quando  erra,     linguagem  sagrica  direta   De  Paiaiá  virou-­‐se  em  Abaeté.   economia  de  metáforas   Não  sei,  onde  acabou,  ou  em  que  guerra,     Só  sei,  que  deste  Adão  de  Massapé,     RESSENTIMENTO  CONTRA  OS  RICOS   Procedem  os  fidalgos  desta  terra.  
  • 28. SENHOR ANTÃO DE SOUSA DE MENEZES Gregório de Matos Senhor  Antão  de  Sousa  de  Meneses,   Quem  sobe  a  alto  lugar,  que  não  merece,   CARÁTER  CLÁSSICO   Homem  sobe,  asno  vai,  burro  parece,   Que  o  subir  é  desgraça  muitas  vezes.   soneto  decassílabo   A  fortunilha  autora  de  entremezes   LIRISMO  SOCIAL   Transpõe  em  burro  o  Herói,  que  indigno  cresce   críHca  ao  mau  governante   Desanda  a  roda,  e  logo  o  homem  desce,   Que  é  discreta  a  fortuna  em  seus  reveses.   ASPECTOS  TEMÁTICOS   Homem  (sei  eu)  que  foi  Vossenhoria,   desconcerto  do  mundo   Quando  o  pisava  da  fortuna  a  Roda,   denúncia  dos  desmandos  do  Braço  de  Prata   Burro  foi  ao  subir  tão  alto  clima.   engajamento  social   Pois  vá  descendo  do  alto,  onde  jazia,   Verá,  quanto  melhor  se  lhe  acomoda   CULTISMO   Ser  home  em  baixo,  do  que  burro  em  cima.  
  • 29. SENHOR: OS NEGROS JUÍZES Gregório de Matos Senhor:  os  Negros  Juízes   da  Senhora  do  Rosário   fazem  por  uso  ordinário:   como  são  infelizes,   CARÁTER  POPULAR   que  por  seus  negros  pecados   andam  sempre  emascarados   versos  heptassílabos   contra  a  lei  da  polícia,   LIRISMO  SOCIAL   ante  Vossa  Senhoria   pedem  licença  prostrados.   críHca  ao  costume  dos  negros  de  tomar  bebida   A  um  General  Capitão   ASPECTOS  ESTILÍSTICOS   Suplica  a  Irmandade  preta,   poesia  de  circunstância   que  não  irão  de  careta,   linguagem  sagrica  direta   mas  descarados  irão:   todo  o  negregado  Irmão   economia  de  metáforas   desta  Irmandade  bendita   CARÁTER  CONSERVADOR   pede,  que  se  lhe  permita   ir  ao  alarde  enfrascados   não  de  pólvora  atacados,   [mas]  calcados  de  jeribita  .  
  • 30. JOGANDO PEDRO, E MARIA Gregório de Matos Jogando  Pedro,  e  Maria   Abrasado,  em  vivo  fogo   Picou  Pedro,  e  de  feição,   os  piques  sobre  a  merenda,   Pedro,  que  o  jogo  sabia,   que  a  Maria  fez  saltar:   vi  pois,  que  sobre  a  contenda   disse,  eu  te  pico,  Maria,   quis  ela  também  picar,   Maria  picar  queria:   porque  tu  me  piques  logo:   pois  que  assim  picado  a  hão:   ela,  que  a  Pedro  entendia   disse  ela,  pois  o  teu  fogo   picados  ambos  estão:   disse  então:  aqui-­‐d’El-­‐Rei   é  dos  melhores  que  achei,   diz  Maria  o  jogo  sei,   pica-­‐me,  Pedro,  e  picar-­‐te-­‐ei.   pica-­‐me,  Pedro,  e  picar-­‐te-­‐ei.   pica-­‐me,  Pedro,  e  picar-­‐te-­‐ei.   Pedro,  que  já  se  enfadava,   de  picar,  queria  erguer-­‐se;   Maria  quis  mais  deter-­‐se,   porquanto  picada  estava:   disse,  ela,  que  então  gostava   do  jogo,  que  lhe  ensinei:   pica-­‐me,  Pedro,  e  picar-­‐te-­‐ei.   POESIA  POPULAR   uso  do  heptassílabo   exploração  do  duplo  senHdo   laivos  de  medievalismo:  linguagem  e  temáHca  
  • 31. RECOMPILOU-SE O DIREITO a sátira Recopilou-­‐se  o  direito,   Se  de  dous  ff  composta   Provo  a  conjetura  já   e  quem  o  recopilou   está  a  nossa  Bahia,   prontamente  com  um  brinco:   com  dous  ff  o  explicou   errada  a  ortografia   Bahia  tem  letras  cinco   por  estar  feito  e  bem  feito:   a  grande  dano  está  posta:   que  são  BAHIA,   por  bem  digesto  e  colheito,   eu  quero  fazer  aposta,   logo  ninguém  me  dirá   só  com  dous  ff  o  expõe,   e  quero  um  tostão  perder,   que  dous  ff  chega  a  ter   e  assim  quem  os  olhos  põe   que  isso  a  há  de  perverter,   pois  nenhum  contém  sequer,   no  trato,  que  aqui  se  encerra,   se  o  furtar  e  o  foder  bem   salvo  se  em  boa  verdade   há  de  dizer  que  esta  terra   não  são  os  ff  que  tem   são  os  ff  da  cidade   De  dous  ff  se  compõe.   Esta  cidade  a  meu  ver.   um  furtar,  outro  foder.   POESIA  POPULAR   uso  do  heptassílabo   críHca  social  ferina   A  LINGUAGEM  CHULA   choca  os  leitores  de  bom  gosto   rompe  com  o  senso  comum  [caráter  contestador]