1) O documento fornece diretrizes sobre fluidoterapia em pediatria, incluindo esquemas de hidratação, correção de eletrólitos e ácido-base.
2) São descritos os graus de desidratação, soluções para reparação, correção de hiponatremia e acidose metabólica.
3) Também são detalhadas as fases de manutenção e reposição de líquidos e eletrólitos de acordo com as necessidades calóricas e perdas.
1. normas gerais de fluidoterapia 8
PRINCÍPIO DE FLUIDOTERAPIA
ESQUEMA DE HIDRATAÇÃO
Indicações de
HIDRATAÇAO ENDOVENOSA
desidratação de 2º grau franco ou 3º grau
sepsis, coma, comprometimento do estado geral
crise convulsiva
vômitos incoercíveis
diarréia profusa
insucesso na tentativa de reidratação oral
acidose metabólica grave (pH < 7,10 e/ou HCO3 < 7)
AVALIAÇÃO DO GRAU DA DESIDRATAÇÃO
Estimado clinicamente
ou através da
perda de peso,
quando houver
dados
GRAU LACTENTES CRIANÇAS MAIORES
I 2,5 a 5% até 3%
II 6 a 10% 4 a 6%
III 11 a 15% (ou mais) 7 a 9%
2. `
1 ml NaCl 20%
=
3,4 mEq de Na
=
22 ml de SF
normas gerais de fluidoterapia 8
FASE DE REPARAÇÃO
Deve ser realizada de preferência em 4 horas. Se o volume infundido for insuficiente, por
erro na avaliação inicial ou por perdas abundantes durante essa fase, prolongá-la por mais 2
horas, totalizando no máximo 6 horas. Obedecer à proporção na velocidade de infusão, o
seja, se o primeiro prescrito para 4 horas foi de 10%, o correspondente a 2 horas deve ser no
máximo de 5% (o mesmo sendo válido para a quantidade de bicarbonato), a menos que o
grau de desidratação seja maior: nesse caso, também o tempo deve ser aumentado.
1. Soluções a serem utilizadas
1/2 SF : 1/2 SG5%
77 mEq/l de NaCl
desidratação isonatrêmica
crianças bem nutridas até 2 anos de idade
crianças < 2 meses de idade, independente do estado nutricional
2/3 SF : 1/3 SG5%
100 mEq/l de NaCl
desidratação hiponatrêmica
crianças desnutridas acima dos dois meses
crianças > 2 anos, independente do estado nutricional
2. Correção da hiponatremia
Em crianças desidratadas, apresentando sinais e sintomas compatíveis com hiponatremia
(crise convulsiva, edema cerebral, movimentos de descerebração, irritabilidade ou apatia
extremas, alteração do ritmo cardio-respiratório), corrigir o sódio pela fórmula:
(Na desejado – Na atual) x 0,6 x Peso = mEq de Na
Utilizando para o Na desejado, valores entre 125 e 130 mEq/l, dependendo
do valor do Na atual (a diferença deve ser ao redor de 10 mEq/l).
Administrar 50% do total calculado, utilizando solução de NaCl 20%,
diluída em 5 partes de SG%, durante aproximadamente 30 minutos. O soro
de reparação programado (2/3 SF : 1/3 SG5%) deve ser administrado ao
mesmo tempo, em outra veia.
Obs.: Infundir essa solução em veia mais calibrosa, dada sua alta osmolaridade.
3. normas gerais de fluidoterapia 8
3. Correção da Acidose Metabólica
O critério para utilização de Bic. Na quando em hidratação EV é: HCO3 < 7 mEq/l. Corrigir
em 4 a 6 horas pela fórmula:
BE x 0,3 x Peso = mEq de Bic. Na
Cuidado n.º 1: não ultrapassar 6 mEq/kg
Cuidado n.º 2: descontar o teor de sódio do SF, substituindo-o por SG 5%
1ml NaHCO3 8,4% = 1 mEq NaHCO3 = 6,6 ml SF
Ex.: Criança de 5 kg, com desidratação isonatrêmica grau II.
Gaso: pH = 7.1 HCO3 = 8 BE = - 20
Volume de soro necessário 500 ml
Quantidade de HCO3 30 mEq
Composição final do soro SF 50ml
SG 5% 420 ml
NaHCO3 8,4% 30 ml
Na impossibilidade de colheita de sangue para gasometria, e em vigência de sinais evidentes
de acidose metabólica, pode-se administrar até 6 mEq/Kg de NaHCO3 na fase de reparação.
4. Indicação do uso de potássio na reparação
Sempre que o potássio estiver < 4,5 mEq/l, em vigência ou não de acidose metabólica,
colocar K no soro de reparação. A quantidade recomendada é de 1 a 2 ml de KCl 19,1% para
cada 100 cal metabolizadas/24h, corrigindo-se esse valor para o número de horas em que foi
programada a reparação.
Cuidado: concentração final da solução não deve ultrapassar 50 a 60 mEq/l. Tomar a
precaução de não acrescentar K em soros já instalados, a menos que isso tenha ocorrido a
curto espaço de tempo. Orientar sempre para que a solução seja bem homogeneizada.
Ex.: mesma criança anterior com K=3,5 mEq/l
gasto calórico (vide fase de manutenção) = 5 kg x 80 = 400 cal/24h
necessidade de K = 1 a 2ml/100cal/24h = 4 a 8 ml
soro de reparação (4h) = 4-8 ml dividido em 6h = 0,7 – 1,3 ml KCl 19,1%
4. normas gerais de fluidoterapia 8
5. Uso de sais de cálcio na fase de reparação
Dada a possibilidade de ocorrência de hipocalcemia durante a correção da acidose metabólica
em crianças desidratadas (principalmente naquelas de baixa idade, em pacientes com quadro
infeccioso grave, em crianças muito desnutridas ou mesmo quando a acidose for muito
intensa), pode-se administrar 1ml/kg de gluconato de cálcio 10% (ou 0,25 ml/kg de cloreto de
cálcio 10%), diluído em igual volume de SG 5% sob ausculta cardíaca, no meio ou no final
da reparação, para prevenir o aparecimento de sinais clínicos de hipocalcemia (estridor
laríngeo, hipertonia muscular, tremores, clônus, irritabilidade, crise convulsiva). Igual
procedimento é indicado naqueles pacientes que apresentam sintomatologia.
Sais de cálcio precipitam em solução contendo bicarbonato
Não administrar cálcio em bolo em pacientes com hipopotassemia
5. normas gerais de fluidoterapia 8
FASE DE MANUTENÇÃO
Não iniciar manutenção se não houver diurese
NECESSIDADES BASAIS DE ÁGUA
Perda insensível 30 – 40 ml/100 cal
Sudorese 10 – 20 ml/100 cal
Urina 60 – 80 ml/100 cal
Fezes 10 – 20 ml/100 cal
Para cada 100 cal metabolizadas, há consumo de 150 ml de água
(regra de Darrow)
GASTO CALÓRICO DIÁRIO
(Darrow)
Peso (em Kg) Cal/Kg
RN 45-50
3 a 10 60-80
11 a 15 45-65
16 a 25 40-50
26 a 35 35-40
35 a 60 30-35
> 61 25-30
Para crianças maiores (> 10Kg), pode-se utilizar regra de Holliday:
Regra de Holliday
Peso (em Kg) Volume
Até 10 100 ml/kg
11 a 20 1000 ml + 50 ml/kg acima de 10 kg
21-30 1500 ml + 30 ml/kg acima de 20 kg
6. normas gerais de fluidoterapia 8
NECESSIDADES BASAIS DE ELETRÓLITOS
Sódio e Cloro 3 a 5 mEq / 100 cal ¼ SF : ¾ SG 5 ou SG 10%
Potássio KCl 19,1% (1ml = 2,5 mEq) 1 a 2,5 ml/kg/dia (máx = 50 a 60 mEq/l)
Cálcio
Gluconato Ca 10% (1ml = 9mg) 4 a 8 ml/kg/dia (máx = 80 ml/dia)
Cloreto Ca 10% (1ml = 36 mg) 1 a 2 ml/kg/dia (máx = 20 ml/dia)
Magnésio
MgSO4 20% (1ml = 3,2 mEq) 0,3 a 0,5 ml/kg/dia
MgSO4 6% 1 a 1,5 ml/kg/dia
Fósforo KH2PO4 13,6% 1 a 2 ml/kg/dia
Uso de sais de magnésio:
- crianças desidratadas abaixo dos 2 meses (promove maior retenção de Na e K)
- crianças desnutridas
- parenteral prolongada
NECESSIDADES ANORMAIS OU DE REPOSIÇÃO
São calculadas de acordo com o tipo e intensidade das perdas, em ml/kg/dia. Em se tratando
de diarréia e/ou vômito, a composição da solução deve ser 1/2 SF :1/2 SG5% (77 mEq/l de
NaCl). Em casos de diarréia muito profusa (acima de 70 – 80 ml/kg/dia) ou quando haja
queda na natremia, utilizar 2/3 SF: 1/3 SG5%, com exceção das crianças menores que 2
meses de idade. Quando se tratar de perdas insensíveis, como taqui ou hiperpnéia ou febre,
acrescentar volume de líquido com composição semelhante à do soro de manutenção
utilizado.
Soro de perdas na maior parte dos casos
Crianças menores que 2 meses
1/2 SF : 1/2 SG5%
Diarréia muito profusa
Queda na natremia
2/3 SF : 1/3 SG5%
7. normas gerais de fluidoterapia 8
HIPONATREMIA (Na < 130 mEq/l) na fase de MANUTENÇÃO
Sem
sintomatologia
clínica
Se Na até 125mEq/l – corrigir lentamente com soro de reposição SF 2/3 :
1/3 SG%
Se Na < 125 mEq/l - alterar composição final do soro (manutenção +
reposição) para 1/2 SF: 1/2 SG5% ou mesmo 2/3 SF : 1/3 SG
5% programada para 12 ou 24h, dependendo na natremia
encontrada
Com
sintomatologia
clínica
Programar como descrito na fase de reparação, com correção rápida do
sódio em aproximadamente 30 minutos e em seguida,
proceder como acima
Correção da ACIDOSE METABÓLICA na fase de MANUTENÇÃO
HCO3 < 13 mEq/l
Continuar com correção de bicarbonato EV
Se após 6h continuar com HCO3 < 13 mEq/l, pode-se repetir esquema
(soro de manutenção + perdas), observando-se edemas. Avaliar
necessidade de cálcio em bolo
HCO3 > 13 mEq/l
Tentar correção com NaHCO3 por via oral, calculando-se a dose
necessária pelo BE e fracionando-a em 4 a 6 tomadas
Em lactentes < 3 meses, com desnutrição acentuada ou diarréia profusa,
pode ser utilizada maior quantidade de NaHCO3 como 1,5 a 2 vezes o
BE
HCO3 > 16 mEq/l Não é mais necessário utilizar NaHCO3 por VO, com exceção dos casos
onde a perda fecal é profusa ou em lactentes pequenos
NaCl 3% 513 mEq/l
1 ml = 0,513mEq
NaCl 20% 3420mEq/l ou 3,4 mEq/ml
Calculo do déficit total
8. normas gerais de fluidoterapia 8
Criança com 10 Kg, sem déficit de volume , porem com Sódio sérico de 120mEq/l que
manifesta irritabilidade e diminuição da consciência
10 x 0,6 x 15mEq =90 mEq.......(total do déficit) para elevar rapidamente o Na de 5
mEq/l são necessários
5 mEq/l x 0,6 x 10 =30 mEq ou 8,8ml de NaCl à 20%
Holliday MA, Segar W.E. Pediatrics 1957;19:823
Darrow, DC and Pratt, E.L .Fluid Therapy relation to tissue composition and
electrolyte. J.A.M.A. 143:365,432.1950
Darrow DC The role of potassium in the clinical disturbances of body water and
electrolyte . New England J. Med. 242: 978,1950