1. HOSPITAL DIA
O modelo de hospital dia pode ser muito útil aos sistemas público e privado de
saúde do Brasil. Entender a sua origem, desenvolvimento e perceber as suas
características técnicas e funcionais é um dos objetivos deste artigo. Outro
aspecto muito importante é compreender que, com o desenvolvimento das
técnicas e tecnologias cirúrgicas, bem como os avanços nas medicações e
técnicas anestésicas permitiram que, obedecendo os critérios de elegibilidade,
um hospital dia possa ser um local ideal para a realização de procedimentos de
media complexidade.
A realização de procedimentos cirúrgicos de médio e pequeno porte pelo
sistema ambulatorial, com curto período de internação dos pacientes, não é
uma conduta recente ou inovadora. Este tipo de atendimento ao paciente
cirúrgico é descrito desde a Antiguidade. Há registros de que, desde 1920, o
Royal Glasgow Hospital for Children, na Grã-Bretanha, já realizava operações
ambulatoriais em crianças com bons resultados.
O maior estímulo para o progresso da grande cirurgia ambulatorial ocorreu na
década de 1970, com a instalação do Surgical Center, em Phoenix, EUA, como
uma unidade independente administrada pelos anestesiologistas Wallace Reed
e John Ford, que mostrou resultados interessantes e despertou o interesse de
entidades hospitalares neste tipo de atenção ao paciente cirúrgico.
O desenvolvimento da cirurgia ambulatorial está apoiado em razões médicas,
psicológicas e econômicas. A resposta hospitalar tem sido positiva com a
criação de unidades específicas, com centro cirúrgico isolado, circulação
independente, separada funcional e administrativamente do corpo hospitalar.
Evita-se a espera e a burocracia das internações, a disputa para a utilização de
leitos hospitalares nos primeiros horários do dia e agrega-se a vantagem de
menor trauma emocional, reduzido risco de infecção e menores custos dos
procedimentos.
Em 2012, nos Estados Unidos da América do Norte o conceito de
AmbulatorySurgery Center – ASC está em franca expansão. Calcula-se que
existam cerca de 5 mil unidades em todo o pais.
No Reino Unido o “Nacional Health Service” (NHS) dispõe de um guia para
hospitais dia, tanto relativo aos aspectos estruturais e às instalações, como em
relação aos processos e procedimentos. A “Health Building Note 52”:
“Accomodation for daycare”, é aplicável tanto para novas instalações, como
para as adaptações e ampliações das unidades já existentes e aqueles ligadas
a hospitais Gerais. Esta normatização estabelece critérios em relação ao
prometo arquitetônico e funcionamento geral, circulação de pacientes,
equipamentos, espaços físicos, instalações e engenharia. Além disso, também
define as especialidades e procedimentos que podem se beneficiar do modelo
de hospital dia.
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2. No Canadá o Ministério de Saúde revisou em 1984 as diretrizes que definem o
modelo público de hospital dia. Essas diretrizes tratam de aspectos relativos a
carga de trabalho, recomendações sobre distribuição e gestão de pacientes,
recursos humanos, programas funcionais, equipamentos e os demais serviços
inseridos no contexto. Também dispõe de uma relação de procedimentos de
diagnóstico e terapêutico que podem ser realizados neste tipo de unidade
hospitalar.
No Brasil estamos ainda dando os primeiros passos, porém com uma
perspectiva muito favorável para o crescimento da oferta deste modelo de
unidade hospitalar. Duas unidades se destacam no cenário nacional pelo
pioneirismo. A primeira é o Hospital Dia do Grupo PROMEDICA, considerado
uma das primeiras unidades de hospital dia no Brasil e o Itaigara Memorial
Hospital DIa, que inovou com uma estrutura planejada para ser um hospital dia
de referência mundial.
A experiência norte americana
O relatório AmbulatorySurgery Centers – A Positive Trend in Health Care de
autoria da The ASC Association, descreve de forma muito positiva o
crescimento deste modelo hospital nos Estados Unidos.
“As our nation struggles with how to improve a troubled health care system, the
experience of ASCs is a rare example of a successful transformation in health
care delivery.”
Na experiência norte americana, os médicos passaram a investir nas estruturas
de ASCs, em decorrência de problemas com agendas cirúrgicas concorridas,
atrasos nas cirurgias e limitação de orçamento para investimentos em
equipamentos dos hospitais gerais. A segmentação entre inpatient e outpatient
ficou cada vez mais clara e algumas entidades representativas dos
AmbulatorySurgery Centers foram fundadas para a defesa dos interesses
dessas empresas.
“Thirty years ago, virtually all surgery was performed in hospitals. Waits of
weeks or months for an appointment were not uncommon, and patients typically
spent several days in the hospital and several weeks out of work in recovery. In
many countries, surgery is still like this today, but not in the United States.”
A realidade norte americana acima destacada não parece ter mudado tanto em
outras partes do mundo. No Brasil, por exemplo, ainda temos hospitais
superlotados com pacientes que poderiam ser tratados em estruturas mais
simples e com menores custos. No entanto, e mais grave ainda, podemos
verificar que os novos investimentos, especialmente de origem pública ainda
adota o modelo de hospital convencional, com alto custo de implantação e
operação.
Outro fator importante na realidade norte americana e que não difere da
realidade brasileira refere-se a população de terceira idade, que cada vez mais,
em maior numero, necessitará realizar procedimentos cirúrgicos em percentual
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3. crescente e para atender esta demanda os sistemas de saúde precisam se
preparar desde já. Neste contexto as estruturas de hospitais dia podem
desempenhar um papel importante no planejamento dos meios para atender a
esta demanda. A previsão é de que as pessoas inseridas no segmento de
terceira idade terão uma demanda cirúrgica, que crescerá cerca de 47% até
2020 e as unidades de hospitais dia poderão atender com qualidade,
segurança e com custos bem mais competitivos do que os hospitais
convencionais.
A experiência espanhola
Na Espanha o conceito de hospital dia também evoluiu ao longo do tempo e é
adotado como uma excelente alternativa de prestação de serviços de saúde,
seja para o sistema público, denominado Sistema Nacional de Saúde, seja
para o setor privado.
“La Hospitalización de Día ha tenido, dentro del Sistema Nacional de
Salud y enelámbito privado, unconsiderabledesarrollo durante los últimos
veinticincoaños, que se ha traducidoenun incremento
notableenlaeficienciaenlaatención a pacientes, que
conanterioridaderaningresadosen unidades de hospitalización
convencional.”
O sistema público de saúde espanhol utiliza e incentiva o surgimento de novas
unidades de hospital dia e a maior justificativa desta ação refere-se a redução
dos custos da assistência e a redução das filas nos hospitais gerais.
Dados de saúde nacionais pesquisados pelo IBGE
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE publica o relatório
Pesquisa de Assistência Médico Sanitária – AMS. Esta pesquisa, que em 1999,
2002, 2005 e 2009 contaram com apoio do Ministério da Saúde, investiga todos
os estabelecimentos de saúde, sejam públicos ou privados, com ou sem
internação, em todo o Território Nacional, com o objetivo básico de revelar o
perfil da capacidade instalada em saúde no Brasil e a formação de um cadastro
atualizado dos estabelecimentos de saúde.
Alguns resultados divulgados na pesquisa de 2009 são interessantes de serem
tratados:
(a) O número de estabelecimentos de saúde em atividade total ou parcial
aumentou de 77 mil em 2005 para 94 mil em 2009 (22,2%). Das 52 mil
unidades assistenciais públicas em atividade, 95,6% são municipais e, das 42
mil unidades particulares, 90,6% têm fins lucrativos.
(b) O número de estabelecimentos sem internação acompanhou o crescimento
do total de unidades, aumentando 22,7% em relação a 2005 e chegando a 67,9
mil em 2009, o que corresponde a 72,2% do total pesquisado.
(c) Entre 2005 e 2009, o país ficou com menos 390 estabelecimentos com
serviços de internação no setor privado. O setor público aumentou sua oferta
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4. de internação em 112 estabelecimentos, resultando em uma perda líquida de
280 unidades. Apenas a região Norte registrou aumento (2,3%) na oferta de
serviços de internação, enquanto todas as demais regiões tiveram queda, com
destaque para o Centro-Oeste (-7,8%). Os leitos para internação também
tiveram redução de oferta: menos 11.214 leitos entre 2005 e 2009. Dos 431,9
mil leitos registrados, 152,8 mil (35,4%) eram públicos e 279,1mil (64,6%)
privados. A taxa nacional em 2009 foi de 2,3 leitos/mil habitantes, abaixo do
parâmetro estabelecido pelo Ministério da Saúde, de 2,5 a 3 leitos/mil
habitantes; apenas a região Sul se manteve nessa faixa, com 2,6 leitos/mil hab.
Entre 2005 e 2008, o número de internações registrou queda de 0,2%, com
quase 23,2 milhões de internações, dos quais 15,0 milhões foram no setor
privado.
(d) Acompanhando a tendência observada nos estabelecimentos com
internação, os leitos também tiveram redução de oferta em 11214 leitos na
comparação entre 2005 e 2009. No total, foram registrados 432 mil leitos,
sendo 152,9 mil (35,4%) públicos e 279,1 mil (64,6%) privados. Mais uma vez,
a região Norte foi a única a ter aumento de 4,2% no total de leitos em relação a
2005.Os leitos privados no país tiveram uma queda de 5,1% no período
considerado. Os parâmetros do Ministério da Saúde são de 2,5 a 3 leitos por
mil habitantes. A taxa nacional em 2009 foi de 2,3 leitos/mil habitantes. A
região Sul foi a única que atingiu o parâmetro oficial, com 2,6 leitos, enquanto
as regiões Norte e Nordeste continuaram as mais desprovidas (1,8 e 2,0 leitos
por mil habitantes, respectivamente).
(e) O número de internações por cem habitantes recuou de 12,8 em 2005 para
12,2 em 2009. No Norte, o indicador ficou em 11,5 e no Nordeste em 10,5.
Entre 2004 e 2008, o Sudeste apresentou queda relativa de -11,7% e o Norte
de -9,2% na taxa de internação.
Há indicadores que denotam a clara redução do numero de internações, do
tempo de internamento e da oferta de leitos hospitalares no país.
Considerações finais
O modelo de hospital dia não substitui o hospital convencional. Este sempre
será de fundamental importância para a sociedade. Porém os hospitais gerais
ficarão cada vez mais concentrados na alta complexidade, traumas e
transplantes, enquanto que as unidades de hospital dia serão direcionadas
para a realização de procedimentos de média e pequena complexidade, com
maior produtividade, menores custos operacionais e com melhores resultados
para a sociedade.
Newton Quadros: Administrador de Empresas, Especialista em Qualidade
Hospitalar. Sócio e presidente do Conselho de Administração do Baía Sul
Hospital Dia, em Florianópolis, Santa Catarina
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