1. A infância como construção pedagógica
Ponto de partida: o livro de Philippe Áries – eixo de origem acerca da reflexão atual
sobre a origem da infância.
Áries – Crianças eram inevitáveis – não se diferenciavam dos adultos; mignotage –
se reconhece certa especificidade da criança: mãe, babás – atitudes femininas. Novo
interesse pela infância, agora como objeto de estudo, compreensão, análise e
normalização.
Tornou-se indispensável analisar o conceito de infância não apenas a partir de uma
perspectiva sociológica, mas avançar também na compreensão do conceito de
infância gerado através do discurso pedagógico.
É possível afirmar que na Pedagogia do século XVII, não parece existir uma
infância bem estabelecida, com todos os atributos próprios que definem
inteiramente a infância moderna. Se reconhece minimamente a infância como: seres
biológica e socialmente diferentes dos adultos.
Em que consiste, no campo da Pedagogia do século XVII, a expressão mínima?
Para explicar vamos tomar como referência a Didática Magna de Jan Amós
Comenius. Ai a infância se acha presente apenas como conseqüência da ação adulta
– sem nenhuma classe de especificidade relativa ao seu próprio ser. “Se a ação
adulta é satisfatória, não se deverão produzir conflitos com crianças escolarizadas”.
Para Comenius, a infância consiste num momento efêmero, transitório, uma fase
própria da evolução de um ser genérico; as idades da vida expressavam uma
continuidade cíclica e inevitável na ordem geral das coisas.
Na Didática Magna é possível observar: ausência do que é próprio da criança, a
infância é introduzida para que a instituição escolar funcione, o que conta como
inicial, uma massa informe e bruta que necessita ser modelada.
Para Comenius há uma infância na Pedagogia, porque ainda que exista a
delimitação de um espaço geográfico, ela não se constrói segundo categorias
pedagógicas, senão filosóficas e se situa num contexto dos atributos gerais de
qualquer elemento incipiente, inscrito na ordem geral da natureza.
2. Para Comenius, a infância supõe maior capacidade para aprender, uma vez que sua
existência representa o espaço monopólico da ausência, ou em termos positivos, a
promessa do desenvolvimento futuro.
Pelos fins do século XVII – diferentes obras começam a fazer notar que a infância
se distingue da idade adulta por características essenciais: que a infância humana é
essencialmente diferente tanto da infância de outros seres vivos quanto da idade
adulta humana.
O tipicamente infantil começa a ser explorado – explicado mediante conceitos e
categorias próprias da pedagogia.
Conceitos e categorias pedagógicas remetem ao âmbito escolar em que a criança é
compreendida como aluno – aluno significa “sem luz”.
A pedagogia fundamenta a delimitação da infância a partir de sua dependência à
idade adulta.
Desde Hobbes a criança deve guardar obediência ao adulto para que este a proteja
daquilo que, por sua natureza, não pode resolver por si mesma.
Para a pedagogia esse dependência pode e deve ser transformada em independência
por meio do ensino e da aprendizagem.
Rousseau em “O Emílio”, demonstrou o caráter naturalmente educável da infância.
E esta infância em sua capacidade essência de aprender e de ser educada.
Ensina então não somente não constitui uma intromissão violenta ou antinatural na
natureza infantil por parte do aluno senão que, inclusive, constitui o meio mais
adequado para se conseguir que a criança se desfaça de sua essência dependente e
heterônoma e passe a realizar-se finalmente como adulto livre, independente e
autônomo.
Pode-se afirmar que a infância moderna é essencialmente dependente da ação
adulta, porque graças a essa dependência, o adulto pode atuar sobre a criança.
Por meio da educação a criança vai tornar-se um ser autônomo.
Para Rousseau e para a Pedagogia Moderna, surge a associação entre adultos
comprometidos (ação adulta) com a ação de outorgar plenos poderes àquele adulto
especializado na educação infantil: o professor.
3. A infância, não é somente o ponto de partida da pedagogia – na medida em que
representa seu objeto de estudo - , como também é seu ponto de chegada – na
medida em que reconstrói discursivamente esse objeto – ela infantiliza tudo aquilo
que toca.
Ao considerar-se criança como um ser biológico que percorre etapas etariamente
definidas encobre-se sua vinculação social e histórica e toma-se o que é particular
pelo universal.
Ao se identificada pelos critérios da insuficiência da razão e da experiência, e não
pela afirmação de suas especificidades, a criança é vista como aquela que deve
apenas ser guiada pelo adulto.
A sociedade centrada no adulto se relaciona com um futuro adulto e não com uma
criança.
Enquanto a psicologia na fizer apelo à antropologia continuaremos apenas a ensinar
crianças.
Trata-se de orientar a ação pedagógica por olhares que contemplem sujeitos
múltiplos e diversos, reconhecendo a infância como “tempo de direitos”.
Owens mostra que a construção da personalidade do indivíduo não se origina
apenas de sua subjetividade humana, mas principalmente, de uma produção cultural
de significados estabelecidos a partir de práticas sociais colaborativas.
Perpassando os séculos, desde a idade média até o século XVII, podemos ver a
concepção de infância em que a criança de até 08 anos não era contada no censo.
A família ocultava os menos de 08 anos, a maioria deles não sobrevivia e essa
realidade se agravava porque aos pais cabia selecionar os que deveriam viver,
eliminando outros.
Outro exemplo vem do filósofo John Locke para o qual o ser humano novo é
concebido como uma tabula rasa, visão empirista de vazio total, folha de papel em
branco. Hoje, o aluno ainda é tomado por alguns como aquele que não tem luz, não
tem saberes. Segundo essa concepção, não mandar um filho para a escola seria um
crime chamado de “abandono intelectual”. Então, tudo estava relacionado ao
cérebro e à mente.