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Sociologia e Realidade Social
Índice
1.1 – SOCIOLOGIA - CIÊNCIA SOCIAL..................................................................................................2
1.1.1 - Ciências sociais e realidade social ....................................................................................................7
1.1.2 - Objeto da Sociologia:...........................................................................................................................10
1.1.3-PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO EM SOCIOLOGIA SENSO COMUM E
CONHECIMENTO CIENTÍFICO....................................................................................................................12
1.1.4 – PROCESSO DE INVESTIGAÇÃO.................................................................................................18
6732 – SOCIOLOGIA E REALIDADE SOCIAL
2. 2
1.1 – SOCIOLOGIA - CIÊNCIA SOCIAL
ENQUADRAMENTO HISTÓRICO DA SOCIOLOGIA
Para podermos compreender a Sociologia como ciência, devemos saber como
nasceu. O interesse pela vida social intensificou-se na segunda metade do
séc.XIII, com a REVOLUÇÃO INDUSTRIAL e o tipo de transformações sociais
que esta causou.
A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL tem esta denominação por se ter iniciado
através da introdução de novos inventos na produção.
As máquinas substituíram as mãos, as manufacturas familiares com 1 ou 2
artesãos deram lugar ás grandes fábricas com grandes linhas de produção e
muita maquinaria.
Se até aí eram necessárias horas ou até dias para se fazer uma peça á mão,
com a introdução das máquinas esse tempo reduziu-se a breves minutos. Isto
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significa que as máquinas permitiram a confeção de grandes quantidades de
peças num curto espaço de tempo.
Depois da grande guerra mundial o mundo estava de rastos, destruído e
carente de tudo. A reconstrução teria que ser rápida e em grande escala, e as
prateleiras dos mercados e feiras teriam que voltar a encher, daí a aposta na
industrialização.
A solução foi trazer os camponeses para as cidades, ÊXODO RURAL, e dar
emprego a todas as mulheres, as fábricas precisavam de muitos braços….
Aqui reside outra grande mudança social. A mulher até aí estava condenada
a ocupar-se das árduas tarefas de casa (lavar, limpar, cozinhar, cozer, varrer
etc…) e cuidar dos filhos, não podendo sequer, frequentar a escola. Depois da
guerra a sua condição social muda completamente e passam a ocupar o lugar
dos homens nas fábricas. Depressa os grandes patrões se percebem que são
óptima mão de obra. São rápidas, responsáveis e de fácil aprendizagem, e por
outro lado, a sua fisionomia frágil, torna-as mais submissas. Contudo, a nível
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de escolarização ainda de encontram em desvantagem em relação aos
homens. Há que enviá-las urgentemente para a escola…
Com esta mudança de papéis, as casas ficam desarrumadas e as crianças
desprotegidas, sem a proteção da mãe. Algo tem que mudar...
E assim surge outra grande mudança social: a criação de espaços de apoio às
famílias, onde estas entregam os filhos de manhã e os vão buscar ao fim do dia
de trabalho.
APARECEM AS CRECHES E INFANTÁRIOS….
Contudo, apesar de todo o progresso e desenvolvimento causado pela
revolução industrial, nem tudo correu bem.
A burguesia, responsável pela revolução industrial, nunca se preocupou em
realizar uma Revolução social. Pensou, simplesmente, no aspeto tecnológico e
no lucro que isso lhe traria, originando situações morais e sociais dramáticas e
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quadros de miséria e de exploração, que atingiram, sobretudo a classe
operária.
Texto 1
“Trabalhamos desde as cinco horas da manhã ao pôr-do-sol, o que faz catorze
horas de duro trabalho, somente com meia hora para o pequeno-almoço (…) O
curto repouso que temos à noite não é suficiente para restaurar os nossos
fracos corpos. (…) Voltamos ao trabalho tão cansados como o tínhamos
deixado. Todavia não podemos deixar de trabalhar, pois as nossas famílias
estariam condenadas a morrer de fome.
(…) Não nos podemos precaver contra a doença ou outros acidentes de
trabalho, guardando algum, pois tudo o que ganhamos é para satisfazer todas
as necessidades imediatas (…).
Operário anónimo da indústria algodoeira, nos finais do séc.XVIII
Tudo isto se revelou interessante à SOCIOLOGIA. Todas estas mudanças
serviram de objeto de estudo a esta ciência.
O que é a SOCIOLOGIA?
A Sociologia é uma das ciências sociais que estuda a
sociedade, ou seja, estudo o comportamento
humano em função do meio e os processos que
interligam os indivíduos em associações, grupos e
instituições.
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Enquanto o indivíduo isolado (só) é estudado pela Psicologia, a Sociologia
estuda o TODO, o GRUPO, os FENÓMENOS SOCIAIS, tentando explicá-los,
analisando os homens nas suas relações de interdependência.
Compreender as diferentes sociedades e culturas é um dos objetivos da
sociologia.
Como disciplina, a Sociologia surgiu no séc.XVIII, no pós revolução industrial.
A Sociologia é uma área de interesse muito recente, mas foi a 1ª ciência social
a institucionalizar-se.
Grandes Sociólogos:
*Auguste Comte
*Émile Durkheim
*Karl Marx
*Vilfredo Pareto
*Georg Simmel
*Max Weber
O termo “SOCIOLOGIE” foi criado por Auguste Comte (1838), que pretendeu
juntar todos os estudos relativos ao homem, como a História, a Psicologia e a
Economia, num só estudo.
No entanto, foi com Emile Durkheim (1858-1917) que a sociologia ganha o
estatuto de ciência. As transformações económicas, políticas e culturais
ocorridas no séc. XVIII, como a revolução industrial e francesa, colocaram em
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destaque mudanças significativas da vida em sociedade, transformando
totalmente a vivência social.
A sociologia foi a única ciência que tentou analisar e interpretar estas
transformações do ponto de vista social, e não só económico e político como
as outras ciências. Por isso, esta disciplina marca uma mudança na maneira de
se pensar a REALIDADE SOCIAL.
1.1.1 - Ciências sociais e realidade social
A Sociologia é uma jovem ciência social que estuda a REALIDADE SOCIAL.
Ora, a 1ª questão a esclarecer é que a sociologia não estuda os indivíduos,
mas sim a relação que eles estabelecem entre si nas mais variadas situações
sociais, isto é REALIDADE SOCIAL.
A REALIDADE SOCIAL é, portanto o conjunto das interações que os seres
humanos estabelecem entre si e aquilo que os rodeia, tendo como suporte um
sistema comunicacional durável que exprime e assegura a vida dos indivíduos
num grupo, num dado espaço e tempo.
A sociologia enquadra-se no âmbito das ciências sociais. Como ciência social,
a sociologia diz respeito ao estudo da vida social humana, dos grupos e das
sociedades. É um desafio fascinante e ao mesmo tempo difícil, uma vez que o
seu OBJECTO DE ESTUDO se centra no próprio comportamento dos sujeitos
enquanto seres sociais.
Sendo a sociologia uma ciência dos comportamentos sociais não deixa, por
isso mesmo, de ser uma ciência do humano, pois TUDO O QUE É SOCIAL É
HUMANO, E TUDO O QUE É HUMANO É SOCIAL. Se antigamente se atribuía
a origem de certos males sociais a entidades espirituais ou a entidades
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metafísicas, hoje, pela MÃO da SOCIOLOGIA, temos conhecimento de que os
factos sociais se explicam a eles próprios. Temos como ex: o Amor e o Ódio; a
Guerra e a Paz; o Trabalho e o Lazer; a Saúde e a Doença; etc….Todos estes
processos sociais têm em comum um mecanismo: a comunicação.
A comunicação é o processo social básico da vida em coletividade, sem ela o
ser humano não poderia viver, pelo menos em grupo.
"O Homem é um ser social. O ser capaz de viver
isoladamente ou é um Deus ou é uma besta, mas não
um ser humano."
- Aristóteles
Complexidade da realidade social:
O social é um todo, englobando diferentes tipos de relacionamento que os
homens desenvolvem entre si, entre o mundo que os circunda e entre os
artefactos que produzem.
Logo o real social tem uma série de dimensões que tanto podem interessar à
Economia como à Geografia por serem tão complexas e envolverem tantas
interações.
O facto de as CS estudarem a realidade social não significa que esta se possa
dividir em campos distintos ou que os fenómenos sociais se possam separar,
pelo contrário, a realidade social é una e indivisível – unidade do social.
Compreender que todo o fenómeno social é total:
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Os fenómenos sociais resultam das ações dos indivíduos, as quais se
desdobram em práticas materiais e simbólicas, relações com a Natureza e
relações com os outros homens.
Por outro lado, nenhum fenómeno pode ser explicado isoladamente, separado
dos fenómenos que o circundam, das condições que o rodeiam e a que está
ligado (por exemplo se separarmos o oxigénio do hidrogénio estes não
explicam as propriedades da água).
Os diferentes acontecimentos que existem na realidade social deram
origem ao aparecimento de várias ciências, como a história, a geografia, a
economia, política, sociologia, etc., que interpretam esses
acontecimentos de forma diferente. Aos acontecimentos damos o nome
de FENÓMENOS SOCIAIS.
EXEMPLO:
Uma guerra pode ser estudada e analisada pelo historiador, pelo político,
pelo economista, pelo sociólogo, etc….todos estes profissionais vão
analisa-la de forma diferente e chegar a conclusões diferentes.
Se juntarmos todas as teorias vamos conseguir um retrato fiel e completo
sobre a guerra.
Concluindo através das ciências sociais e do seu contributo podemos atingir
uma explicação mais completa sobre a REALIDADE SOCIAL. Há pois, uma
pluralidade de ciências sociais que incidem sobre o mesmo campo de análise –
a realidade social – buscando aí, e de acordo com a perspetiva de cada uma,
informações que a complementam.
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As ciências sociais “invadem” a realidade social sem, contudo, a
repartirem porque possuem o mesmo campo de análise, o que significa
que a realidade social é só uma e única, mas analisável por diversas
ciências (sociais): UNIDADE SOB A DIVERSIDADE.
OBJETO DAS CIENCIAS SOCIAIS
As relações estabelecidas pelo Homem em sociedade fazem dele um ser
social. As suas acções Homem/Homem e Homem/Natureza, permitem-nos
designá-las de sociais. É vivendo em sociedade que o homem garante a sua
sobrevivência. Por outro lado, a sociedade onde todos vivemos depende das
nossas ações, daquilo de fazemos em sociedade e na sociedade. Assim o
homem produz e reproduz ações que beneficiam ou prejudicam a sua vida em
grupo, em sociedade.
A noção de sociedade surge, apresentada como um
conjunto vasto de seres sociais (os homens) que mantêm
ações/relações uns com os outros e com a natureza.
Deste modo, sociedade é uma estrutura complexa de
relações entre os indivíduos que com as suas ações, atos e
com a sua cultura, crenças e tradições constroem a realidade social.
Simplificando, o OBJECTO REAL das ciências sociais é o estudo da realidade
social como conjunto de fenómenos resultantes de relações entre indivíduos e
entre estes e a natureza, fenómenos esses que se reproduzem no social, daí
chamarem-se FENÓMENOS SOCIAIS.
1.1.2 - Objeto da Sociologia:
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A sociologia procura o seu objeto de estudo na realidade social. Tem por objeto
só e unicamente a SOCIEDADE DOS HOMENS.
Ao analisarmos um acontecimento – FACTO SOCIAL ( é a maneira de agir,
pensar e de sentir de cada um dos indivíduos), podemos fazê-lo de duas
formas :
Pelo Senso Comum – o que o cidadão comum vê
Pela Ciência – o que o investigador (sociólogo) analisa através de um método
científico próprio.
Pelo Espaço – local, comunidade, sociedade onde acontece.
Pelo Tempo – em que altura o facto acontece, século, ano, mês, época, etc…
O homem mal nasce é automaticamente inserido na sociedade onde vive, 1º
pela mão da família, depois pela escola, igreja, etc…
É através dos lugares por onde passa e das pessoas que a conduzem que a
criança constrói a sua personalidade, os seus valores e identidade pessoal. Por
isso dentro de uma comunidade - espaço social - podemos encontrar pessoas
perfeitamente inseridas ou integradas, chamados de membros da comunidade
e outras não integradas, chamadas de não membros ou intrusos, como é o
caso dos imigrantes.
Exemplo de análise um facto social:
O Divórcio analisado pelo:
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Senso Comum: fim do casamento, discórdia, má sorte para os filhos. Ato
condenável socialmente, uma vergonha para a família. Um erro aos olhos de
Deus e dos homens tementes a Deus.
Pela Ciência: acordo entre o casal, rutura na relação aliada ao fim do
sentimento amor. Facto social que só ao casal e filhos diz respeito. A
sociedade em que esta família se insere deve respeitar e apoiar esta decisão.
O sociólogo vai analisar o divórcio tendo em conta as causas ou motivos, a
acto em si (se foi amigável ou litigioso), as consequências (os filhos sofreram
ou não, as partilhas foram justas, se foram salvaguardadas os interesses de
todas as partes), o que pensa a sociedade, se houve discriminação ou
aceitação, se a igreja se pronunciou, etc…
Pelo Espaço: se aconteceu numa aldeia pequena e conservadora, este facto
social tem um impacto, se acontecer numa grande cidade desenvolvida tem
outro totalmente diferente. Também difere de continente para continente, de
país para país, etc…
Pelo Tempo: há 500 anos não era permitido, há 100 extremamente
condenável, há 50 anos, acontecia em reduzida escala e hoje é totalmente
permitido e banal. Aliás, neste preciso momento o número de divórcios por ano
já ultrapassou o número de casamentos.
1.1.3-PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO EM SOCIOLOGIA
SENSO COMUM E CONHECIMENTO CIENTÍFICO
SENSO COMUM
No seu dia-a-dia, o homem adquire espontaneamente um modo de entender e
atuar sobre a realidade. Algumas pessoas, por exemplo, não passam por baixo
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de escadas, porque acreditam que dá azar; se quebrarem um espelho, sete
anos de azar. Algumas confeiteiras sabem que o forno não pode ser aberto
enquanto o bolo está assando, senão ele "embatuma", sabem também que a
determinados pratos, feitos em banho-maria, devem-se acrescentar umas
gotas de vinagre ou de limão para que a vasilha de alumínio não fique escura.
Como aprenderam estas informações? Elas foram sendo passadas de geração
a geração. Elas não só foram assimiladas mas também transformadas,
contribuindo assim para a compreensão da realidade.
Assim, se o conhecimento é produto de uma prática que se faz social e
historicamente, todas as explicações para a vida, para as regras de
comportamento social, para o trabalho, para os fenômenos da natureza, etc.,
passam a fazer parte das explicações para tudo o que observamos e
experienciamos. Todos estes elementos são assimilados ou transformados de
forma espontânea. Por isso, raramente há questionamentos sobre outras
possibilidades de explicações para a realidade.
São inúmeros os exemplos presentes na vida social, construídos pelo "ouvi
dizer", que formam uma visão de mundo fragmentada e assistemática. Mesmo
assim, é uma forma usada pelo homem para tentar resolver seus problemas do
dia a dia. Isso tudo é denominado de senso comum ou conhecimento
espontâneo.
Portanto, podemos dizer que o senso comum é o conhecimento acumulado
pelos homens, de forma empírica, porque se baseia apenas na experiência
quotidiana, sem se preocupar com o rigor que a experiência científica exige e
sem questionar os problemas colocados justamente pelo quotidiano. Portanto,
é também um saber ingénuo uma vez que não possui uma postura crítica.
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" Geralmente, as pessoas percebem que existe uma diferença entre o
conhecimento do homem do povo, às vezes até cheio de experiências, mas
que não estudou, e o conhecimento daquele que estudou determinado assunto.
E a diferença é que o conhecimento do homem do povo foi adquirido
espontaneamente, sem muita preocupação com o método, com crítica ou com
sistematização. Ao passo que o conhecimento daquele que estudou algo foi
obtido com esforço, usando-se um método, uma crítica mais pensada e uma
organização mais elaborada dos conhecimentos.
Porém, é importante destacar que o senso comum é uma forma válida de
conhecimento, pois o homem precisa dele para encaminhar, resolver ou
superar suas necessidades do dia-a-dia. Os pais, por exemplo, educam seus
filhos mesmo não sendo psicólogos ou pedagogos, e nem sempre os filhos de
pedagogos ou psicólogos são melhor educados.
O senso comum é ainda subjetivo ao permitir a expressão de sentimentos,
opiniões e de valores pessoais quando observamos as coisas à nossa volta.
Exemplo:
a) Se uma determinada pessoa não nos agrada, mesmo que ela tenha um
grande valor profissional, torna-se difícil reconhecer este valor. Neste caso, a
antipatia por esta determinada pessoa impede – nos de reconhecer a sua
capacidade;
b) Os hindus consideram a vaca um animal sagrado, enquanto nós, ocidentais,
concebemos este animal apenas como um fornecedor de carne, leite, etc.
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Por essa razão os consideramos ignorantes e ridículos, pois tendemos a julgar
os povos, que possuem uma cultura diferente da nossa, a partir dos nossos
valores e cultura.
Levando-se em conta a reflexão feita até aqui, podemos considerar o senso
comum como sendo uma visão de mundo precária e fragmentada. Mesmo
possuindo o seu valor enquanto processo de construção do conhecimento, ele
deve ser superado por um conhecimento que o incorpore, que se estenda a
uma concepção crítica e coerente e que possibilite, até mesmo, o acesso a um
saber mais elaborado, como as ciências sociais.
CONHECIMENTO CIENTÍFICO
Os Gregos, na antiguidade, através do uso da razão, procuravam a superação
do mito ou do saber comum. O avanço na produção do conhecimento,
conseguido por esses pensadores, foi estabelecer vínculo entre ciência e
pensamento sistematizado (filosofia, sociologia...), que perdurou até o início da
Idade Moderna. A partir daí, as relações dos homens tornaram-se mais
complexas bem como toda a forma de produzir a sua sobrevivência.
Gradualmente, houve um avanço técnico e científico, como a utilização da
pólvora, a invenção da imprensa, a Física de Newton, a Astronomia de Galileu,
etc.
Foi no início do século XVII, quando o mundo europeu passava por profundas
transformações, que o homem se tornou o centro da natureza
(antropocentrismo). Acompanhando o movimento histórico, ele mudou toda a
estrutura do pensamento e rompeu com as concepções de Aristóteles, ainda
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vigentes e defendidas pela Igreja, segundo as quais tudo era hierarquizado e
imóvel, desde as instituições e até mesmo o planeta Terra. O homem passou,
então, a ver a natureza como objeto de sua ação e de seu conhecimento,
podendo nela interferir. Portanto, podia formular hipóteses e experimentá-las
para verificar a sua veracidade, superando assim as explicações metafísicas e
teológicas que até então predominavam. O mundo imóvel foi substituído por
um universo aberto e infinito, ligado a uma unidade de leis. Era o nascimento
da ciência enquanto um objecto específico de investigação, com um método
próprio para o controle da produção do conhecimento. Assim sendo, ciência e
filosofia separam - se.
Portanto, podemos afirmar que o conhecimento científico é uma
conquista recente da humanidade, pois tem apenas trezentos anos. Ele
transformou-se numa prática constante, procurando afastar crenças
supersticiosas e ignorância, através de métodos rigorosos, para produzir um
conhecimento sistemático, preciso e objectivo que garanta prever
acontecimento e agir de forma mais segura.
Sendo assim, o que diferencia o senso comum do conhecimento científico
é o rigor. Enquanto o senso comum é acrítico, fragmentado, preso a
preconceitos e a tradições conservadoras, a ciência preocupa-se com as
pesquisas sistemáticas que produzam teorias que revelem a verdade sobre a
realidade, uma vez que a ciência produz o conhecimento a partir da razão.
Desta forma, o cientista, para realizar uma pesquisa e torná-la científica, deve
seguir determinados passos. Em primeiro lugar, o pesquisador deve estar
motivado a resolver uma determinada situação-problema que, normalmente, é
seguida , por algumas hipóteses. Usando a criatividade, o pesquisador deve
17. 17
observar os factos, recolher dados e então testar as suas hipóteses, que
poderão se transformar em leis e, posteriormente, ser incorporadas às teorias
que possam explicar e prever os fenómenos.
O CONHECIMENTO CIENTÍFICO PARA AUGUSTE COMTE
Para Comte, o conhecimento científico é, baseado na observação dos fatos e
nas relações entre fatos que são estabelecidas pelo raciocínio. Estas relações
excluem tentativas de descobrir a origem, ou uma causa subjacente aos
fenômenos, e são, na verdade, a descrição das leis que os regem. Comte
afirma: "Nossas pesquisas positivas devem essencialmente reduzir-se, em
todos os gêneros, à apreciação sistemática daquilo que é, renunciando a
descobrir sua primeira origem e seu destino final".
O conhecimento científico positivo, que estabelece as leis que regem os
fenômenos de forma a refletir o modo como tais leis operam na natureza, tem,
para Comte, ainda, duas características: é um conhecimento sempre certo, não
se admitindo conjecturas, e é um conhecimento que sempre tem algum grau de
precisão. Assim, Comte reforça a noção de que o conhecimento científico é
um conhecimento que não admite dúvidas e indeterminações e desvincula-o de
todo conhecimento especulativo.
Resumo:
O senso comum é uma forma de conhecimento empírico, transmitida de
geração para geração, e não precisa ser aprendida para ser dominada – todos
temos senso comum mas poucos tem conhecimento sociológico.
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O conhecimento sociológico é resultado de uma investigação profissional,
cientifica tendo por base a recolha de dados, a análise desses dados e a
formulação de conceitos procurando a verdade sobre o funcionamento da
sociedade humana.
1.1.4 – PROCESSO DE INVESTIGAÇÃO
ESTRATÉGIAS DE INVESTIGAÇÃO
Métodos de investigação sociológica
Método de estudo de caso ou análise intensiva (estudo de casos
particulares => os resultados obtidos dizem respeito, apenas, aos casos
estudados): este método é um processo de investigação sociológica que se
destina ao estudo de fenómenos particulares, observando-os sob todos os
aspetos. Segundo este método, os fenómenos são analisados de uma forma
intensiva, recorrendo a todas as técnicas disponíveis e a uma amostra
particular. A finalidade deste método é a compreensão ampla do fenómeno na
sua totalidade.
Método de medida ou análise extensiva (resultados relativos a toda a
população): este método implica a observação de populações vastas. As
populações amplas constituem o objeto da análise extensiva, pelo que se
recorre, muitas vezes, a técnicas de amostragem.
Investigação-ação: este método permite: abordar a complexidade em
contextos reais, referindo-se a uma multi-referencialidade teórica; conhecer,
analisar, esquematizar e generalizar aspetos de processos de construção de
novos conhecimentos e de novas práticas; e pôr a descobertos espaços e
19. 19
mecanismos, assim como as dificuldade diversas que daí possam provir,
reconhecendo-as como questões reais e pertinentes.
Estratégias de investigação sociológica
A realização de uma pesquisa empírica em Sociologia implica sempre o
acionamento de procedimentos teórico - metodológicos de observação do real:
estruturação de uma estratégia de investigação. Esta irá depender, em grande
parte, dos objetos concretos da pesquisa, bem como da sua origem.
Com efeito, alguns objetos de investigação sugerem a utilização de métodos e
técnicas de carácter mais quantitativo (quando o universo em estudo é muito
vasto), enquanto outros objectos de pesquisa permitem uma análise mais
intensiva. Deste modo, as estratégias de investigação sociológica podem
designara-se por: extensiva, intensiva e investigação - ação.
A lógica extensiva é caracterizada pelo uso dominante de técnicas
quantitativas. A sua principal vantagem é o facto de permitir o conhecimento
em extensão de fenómenos.
A segunda estratégia (intensiva) analisa em profundidade as características,
opiniões, uma problemática relativa a uma população determinada, segundo
vários ângulos e pontos de vista.
Nesta segunda estratégia, privilegia-se a abordagem directa das pessoas
nos seus próprios contextos de interação.
20. 20
Nesta lógica de pesquisa tendem a ser usadas técnicas não só qualitativas,
como também quantitativas ou extensivas. Porém, a lógica multilateral e
intensiva do objeto de pesquisa definido é sempre dominante.
A última estratégia denomina-se investigação - ação e consiste na
intervenção direta dos cientistas, que são chamados a participar em projetos
de intervenção. Os objetivos de aplicação mais direta dos conhecimentos
produzidos tornam esta lógica específica.
Etapas da pesquisa sociológica
O processo de investigação envolve um conjunto de etapas desde que o
investigador inicia o processo de pesquisa até que os resultados obtidos
assumem uma forma de escrita. Apesar da pesquisa empírica poder obedecer
a diferentes estratégias, as suas etapas seguem um modelo padrão:
1ª etapa: definição de um problema ou de uma questão de partida
(pergunta de partida);
2ª etapa: estudo exploratório (recolha de informações sobre o tema);
3º etapa: definição da problemática, das hipóteses de trabalho e
construção de um modelo de análise (deve recorrer-se à produção
teórica já existente sobre o tema, de modo a definir os conceitos que a
ele estão associados e estabelecer as relações entre eles);
4ª etapa: selecção e aplicação dos instrumentos de observação e
recolha de informações (definição das técnicas a usar, em função dos
objectivos da investigação);
5ª etapa: análise da informação e conclusões (processo de verificação
empírica, isto é, análise dos dados e conclusões do estudo)
21. 21
Técnicasde pesquisasociológica
Técnicas documentais – observam-se documentos escritos, ou não,
que revelam fenómenos sociais. As técnicas documentais podem
subdividir-se em clássicas (permitem uma análise qualitativa em
profundidade, mas são muito subjetivas), e em modernas (permitem
uma análise quantitativa e são extensivas, cobrindo um amplo campo de
estudo, pelo que complementam as técnicas clássicas).
Os tipos de técnicas modernas mais frequentes são a semântica quantitativa
(estuda o vocabulário dos textos, por forma a analisar os estilos, a detetar
lacunas, etc.), e a análise de conteúdo, uma técnica de investigação para a
descrição objetiva, sistemática e quantitativa do conteúdo das comunicações
que tem por fim interpretá-las.
Técnicas não documentais – consistem na recolha de informações
através da observação/experimentação. Dentro destas, existem, ainda, a
observação participante (o observador integra-se no grupo observado, o
que lhe permite fazer uma análise global e intensiva), e a observação
não participante (o entrevistador não intervém na situação em estudo).
A observação participante pode subdividir-se em observação-participação
(implica que o observador seja aceite, ao ponto de se integrar no grupo que
observa; ou participação-observação (o investigador, por não ter
possibilidade de se integrar no grupo que quer investigar, recorre à
colaboração de um participante-observador que aceite submeter-se às ordens
de rigor que lhe são dadas pelo investigador).
22. 22
No entanto, a observação participante pode constituir uma armadilha, pelo que
pode ocorre perigo de o observador cair na participação inobservante,
resultante da interiorização dos interesses e das ideias do grupo a estudar, ou
perigo que o observador cair numa participação distante e fria, o que pode
impedir um estudo em profundidade do grupo social observado.
Quanto à observação não participante, esta pode tomar a forma de
entrevistas, inquérito por questionário ou testes e medida de atitudes e
opinião.
As entrevistas constituem uma técnica que pode ir do breve contacto formal a
uma entrevista longa e relativamente vaga, na qual o investigador permite ao
entrevistado desenvolver pontos à sua vontade ou sugerir outros que deseja
considerar. O ponto básico da técnica da entrevista é a construção do
questionário sobre o qual cada entrevista se efetua. As questões devem
centrar-se, portanto, sobre o entrevistado.
Dentro das entrevistas, há, ainda, as entrevistas estruturadas (obedecem a
um esquema rígido, previamente fixado, que o entrevistador deverá respeitar
integralmente: o enunciado das perguntas e a ordem por que são feitas são
fixos. Neste tipo de entrevistas, as questões são, geralmente, fechadas, ou
seja, o entrevistado não tem a possibilidade de desenvolver a sua resposta. O
objetivo é conseguir uma estandardização máxima da entrevista), e as não
estruturadas (a condução por parte do entrevistador é mais flexível, podendo
orientá-la com a sequência e as questões que julgar mais convenientes, de
acordo com a sua sensibilidade e tato. As questões apresentadas são,
sobretudo, abertas, isto é, o entrevistado tem a possibilidade de exprimir e
justificar livremente a sua opinião. Neste tipo de entrevistas, não existe uma
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lista pré-definida de questões que possa ser rigorosamente seguida. O
entrevistador tem, apenas, um guia de tópicos que lhe recorda os temas sobre
que deve inquirir).
As entrevistas podem ser de tipo intensivo (centra-se num individuo, sem
limites de tempo e com ampla liberdade) ou extensivo (entrevista curta e
superficial, abrangendo um conjunto relativamente alargado da população).
O inquérito por questionário possibilita obter dados através do questionário,
consistindo em apresentar um conjunto pré-determinado de perguntas à
população. O questionário é, portanto, um conjunto estruturado de questões
expressas num papel, destinado a explorar a opinião das pessoas a que se
dirige.
Os questionários podem ser de tipo livre ou aberto (deixa-se toda a latitude de
resposta ao inquirido. A principal vantagem é o facto de permitir à pessoa
interrogada dar uma resposta livre e pessoal, sendo que as desvantagens são,
essencialmente, o facto de poderem dar origem a respostas equívocas,
contraditórias ou ilegíveis, e o facto de serem de difícil apuramento, em
consequência da multiplicidade de respostas possíveis);
fechado (feito sem qualquer maleabilidade, seguindo um plano rígido, no qual
a ordem das questões e os seus termos se mantêm invariantes. Vantagem:
permite canalizar as reacções das pessoas interrogadas para algumas
categorias muito fáceis de interpretar. Inconveniente: tem a ver com o aspecto
técnico do questionário); ou semi-aberto ou semi-fechado (combinação das
vantagens dos 2 tipos anteriores, com vista à redução dos seus
inconvenientes. Neste tipo de inquérito, as questões podem são fechadas, mas
dá-se a possibilidade da resposta ser livre)
24. 24
Por outro lado, os testes e medida de atitudes e opinião visam o
conhecimento quantificado e direto do comportamento do sujeito. As medidas
de atitudes e opinião têm por objeto a graduação da respetiva intensidade,
possibilitando a ordenação dos indivíduos ao longo de uma escala.
Estas técnicas são criticadas pelo seu carácter subjetivo e pela ausência de um
padrão estandardizado de medida. As escalas de atitudes e opiniões visam
superar esse subjetivismo, através da utilização de um sistema pré-construído
de proposições sobre as quais o inquirido toma posição.
Tipos de questões a incluir num inquérito por questionário: questões
fechadas (apuramento rápido dos resultados / pobreza das informações
obtidas; as perguntas podem ser feitas de forma tendenciosa); questões
abertas (grande abundância e riqueza de informações / dificuldade no
tratamento dos dados, dada a variedade de respostas, a maior parte das
vezes, pouco objetivas); questões semi-abertas ou semi-fechadas (facilidade
e rapidez no apuramento dos dados; informação suficiente, dado ser
apresentada a justificação da resposta).
As sondagens são uma modalidade particular de inquérito por
questionário, que visam obter a opinião dos inquiridos sobre determinado
assunto. Os seus resultados poderão ser generalizados a um universo mais
vasto. Apesar disto, esta técnica é bastante complexa, se tivermos em conta os
passos da sua correta aplicação:
- Definição dos objetivos;
- Inventariação do recursos disponíveis, o que permite determinar a
extensão, os limites e a duração do trabalho a realizar;
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- Identificação do universo e escolha do intervalo de confiança. É necessário
conhecer o nº total de indivíduos do universo cuja opinião se deseja pesquisar,
bem como a sua distribuição por categorias (profissão, idade, sexo, regiões). A
esta discriminação qualitativa e quantitativa do universo dá-se o nome de
breakdown do universo, que se torna fundamental para escolher o intervalo de
confiança que se espera atingir no trabalho;
- Construção da amostra. Sendo que, normalmente, o universo apresenta
uma enorme extensão, é preciso seleccionar uma amostra representativa
desse universo, isto é, considerar uma parcela do universo que seja
numericamente expressiva, a fim de representar o mais exactamente possível
todo o universo. É importante que os indivíduos que compõem a amostra
representativa se encontrem discriminados, afim de que a colheita das opiniões
se processe nas devidas proporções. A esta discriminação dá-se o nome de
breakdown da amostra;
- Elaboração do esboço do questionário, elaborando e ordenando as
questões e os métodos a utilizar;
- Realização do pré-teste, destinado a assegurar a natureza e a complexidade
das questões e a sua adequação aos objectivos previamente determinados;
- Elaboração do questionário definitivo;
- Recolha da informação;
- Codificação das respostas;
- Análise e tratamento dos dados;
- Elaboração do relatório final.
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Vantagens da sondagem: abarcando, apenas, uma parcela da população total,
exige menos recursos do que o inquérito exaustivo. Os inconvenientes
prendem-se, sobretudo, com distorções que podem ser introduzidas, tanto na
fase de identificação prévia da população a inquirir, como na do tratamento dos
dados ou nas falhas de informação.
Os elementos primários da vida social
Processos de interação social
A interação social deriva dos relacionamentos dos indivíduos entre si, pois
quando os seres humanos se relacionam atuam uns sobre os outros. O
conceito de interação social tem a ver com a maneira como os indivíduos
reagem face a determinada situação. Esta reação é condicionada pela
presença, ou não, de terceiros.
O estudo das formas de interação social constitui uma das áreas de maior
importância para a investigação sociológica, por 2 razões fundamentais: porque
as nossas rotinas diárias formam e estruturam a sociedade através das
constantes interações entre os indivíduos.
As nossas vidas organizam-se à volta da repetição de comportamentos
padronizados; por outro lado, o estudo da interação social da vida quotidiana
fornece-nos dados para o estudo de outros sistemas sociais mais alargados e
das instituições.