SlideShare uma empresa Scribd logo
1 de 3
Pensamos, mas nem sempre dizemos…!
Quando dois advogados se reúnem, pelo menos na primeira reunião, o
advogado com a data de inscrição na Ordem dos Advogados mais
recente (o número de cédula não é, como sabemos, critério seguro
atenta a diferente numeração que, antes, era atribuída a cada Conselho
Regional) deverá deslocar-se ao escritório daquele com a inscrição mais
antiga.
Apesar de se tratar de um uso perfeitamente enraizado na advocacia,
não só em Portugal, mas em muitos países europeus, tem vindo a ser
desconsiderado por alguns advogados. A constatação deste facto levou a
que cinco advogados, oriundos de cinco diferentes países da União
Europeia, a exercer, transitoriamente, em Portugal sob as respetivas
denominações de origem, se tenham proposto realizar um inquérito a
250 advogados da União Europeia com o objetivo de procurar perceber
até que ponto o cumprimento das normas Deontológicas constitui uma
prioridade para a advocacia europeia.
Como primeira nota, diga-se, em abono da verdade, que o número
irrisório de advogados inquiridos e a falta de rigor científico na recolha e
contabilização dos dados, apenas permitirá que os resultados obtidos
possam ser lidos como curiosidade e incentivo a um estudo mais
aprofundado.
Em jeito de segunda nota, importa referir, que para não tornar este
texto demasiado extenso, optei por referir, apenas, algumas das
conclusões que têm relação direta com o Estatuto da Ordem dos
Advogados Portugueses, adiante EOA.
Iniciando a análise das conclusões pelo capítulo relativo ao
relacionamento entre advogados, verifica-se que 112 inquiridos
criticam, pelo menos, três das seguintes condutas por parte de alguns
colegas:
•Não respondem, em prazo razoável, às solicitações orais ou escritas;
•Emitem, publicamente, opinião relativamente a questões pendentes
confiadas a outro advogado.
•Contactam a parte contraria apesar de saberem que está representada
por outro colega
•Iniciam o patrocínio de um assunto anteriormente confiado a outro
advogado antes de, previamente, terem exposto ao colega as razões da
aceitação do mandato e os esforços que tenham desenvolvido para lhe
serem pagos os honorários e quantias em dívida.
Estranhamente, 110 inquiridos desconheciam que poderá ser punido
disciplinarmente aquele advogado que, em sede de julgamento, não
procure obstar a que o seu cliente se dirija ao colega da parte contraria
de forma incorreta.
Por outro lado, no que se refere à relação com os clientes, referem 99
inquiridos conhecer situações em que os colegas exercem o mandato
sem atenderem ao facto de estarem em presença de um conflito de
interesses.
Estamos convictos de que a maioria dos colegas sabe que o advogado
não pode aconselhar, representar ou agir por conta de dois ou mais
clientes, no mesmo assunto ou em assunto conexo, se existir conflito
entre os interesses desses clientes, sob pena de incorrer em
responsabilidade disciplinar e criminal (prevaricação). Fica, assim, por
perceber se a motivação da referida infração decorre de manifesto dolo
ou se terá origem no desconhecimento de que o “impedimento”, para
advogar em conflito de interesses, é extensivo aos advogados que com
ele exerçam a atividade em sociedade ou em mera associação.
Grande número de inquiridos confessou, também, desconhecer o
direito de protesto regulado no artigo 80.º do EOA. Como é consabido o
advogado tem o dever de conhecer e de lançar mão do dever de
protesto sempre que, no decorrer de audiência ou de qualquer outro
ato ou diligência em que intervenha, seja impedido de requerer
oralmente ou por escrito, no momento que considerar oportuno, o que
julgar conveniente ao dever do patrocínio, sem necessidade de prévia
indicação ou explicitação do respetivo conteúdo. Não deveremos ficar
indiferentes ao desconhecimento dos direitos que a lei coloca ao dispor
dos advogados. Mas pior é a conclusão seguinte. A quase totalidade dos
inquiridos confessou já ter vivenciado situações em que poderia ter
exercido o direito/dever de protesto mas desconhece quando, e de que
forma, deverá exercê-lo!
Finalmente, no que se refere ao relacionamento com a comunidade,
pela sua relevância referimos, em primeiro lugar, as conclusões relativas
ao segredo profissional, regulado no artigo 92.º do EOA, elencando-as,
por ordem decrescente do número de vezes que foram citadas:
•O advogado não pode revelar factos de que tenha tido conhecimento
no âmbito de quaisquer negociações malogradas, orais ou escritas, em
que tenha intervindo. Assim, frustrando-se, total ou parcialmente, a
conciliação, os Advogados devem evitar expor ao magistrado o
conteúdo das negociações tentadas fora da sala de audiência.
Atrevemo-nos a sugerir que os advogados, em sede de tentativa de
conciliação, se limitem a comunicar ao juiz que, não lograram chegar
a acordo porquanto nenhuma das partes abdicou das posições
assumidas nos autos;
•O advogado não pode revelar factos de que a parte contrária do
cliente ou respetivos representantes lhe tenham dado conhecimento
durante negociações para acordo que vise pôr termo ao diferendo ou
litígio;
•O segredo profissional abrange ainda documentos ou outras coisas
que se relacionem, direta ou indiretamente, com os factos sujeitos a
sigilo. Daqui resulta que estando a correspondência trocada entre
advogados protegida pelo dever de sigilo não poderá ser invocada
nem utilizada como meio de prova sem que, previamente, seja
requerido, ao presidente do conselho regional respetivo, o
levantamento do sigilo.
Relacionado com o sigilo, importa referir que a maioria dos
advogados inquiridos afirmou desconhecer estar obrigado a garantir
a confidencialidade das missivas remetidas pelos colegas ao abrigo
do disposto no artigo 113.º do EOA mesmo que, para tanto, tenha
que optar por destruí-las ou devolvê-las aos remetentes. Uma
percentagem, ligeiramente superior, desconhecia, também, que o
escopo da referida norma é a criação de um mecanismo de
comunicação entre advogados que não poderá ser alvo de um
eventual pedido de dispensa de sigilo que vise utilizá-la como meio
de prova em juízo.
Concluímos referindo que a totalidade dos advogados inquiridos
manifestou estranheza pelo facto de não se ter conseguido, até hoje,
por cobro ao “autentico desfile de advogados” à saída dos tribunais,
quando estão presentes câmaras de televisão. A maioria dos
inquiridos aplaudiu o comportamento dos advogados que optam
pelo silêncio quando não está em causa a defesa da honra.
Paralelamente, gostariam que fossem publicitadas as punições
aplicadas àqueles que, reiteradamente, fazem tábua rasa do disposto
no artigo 93º do EOA, com o manifesto intuito de angariar clientela e
sem o mínimo respeito pela advocacia em geral e pelos legítimos
direitos dos demais intervenientes no mesmo processo que, não
raramente, prejudicam.
As conclusões do inquérito são omissas relativamente ao número de
advogados portugueses inquiridos. Por tal razão e porque não será
possível utilizar este inquérito para uma verificação rigorosa das
percentagens apuradas relativamente a cada um dos temas, tomei a
liberdade de alterar alguns algarismos para provocar a coincidência
das conclusões com o número dos artigos do Estatuto a que as
mesmas se referem.
Com um agradecimento sincero pela paciência e tempo que
dedicaram à leitura deste texto, ficam a saudades dos abraços que
tanto gosto de partilhar convosco!
António Neves Laranjeira

Mais conteúdo relacionado

Semelhante a Pensamos, mas nem sempre dizemos...! - Artigo do Dr. António Neves Laranjeira

Aula 4
Aula 4Aula 4
Aula 4CAMCPE
 
Inversão do onus da prova no cdc
Inversão do onus da prova no cdcInversão do onus da prova no cdc
Inversão do onus da prova no cdcPaulo César
 
Roteiro simples para audiências trabalhistas (1)
Roteiro simples para audiências trabalhistas (1)Roteiro simples para audiências trabalhistas (1)
Roteiro simples para audiências trabalhistas (1)Mariana Regina De Sá
 
1041- Embargos Declaratórios - PGM
1041- Embargos Declaratórios - PGM1041- Embargos Declaratórios - PGM
1041- Embargos Declaratórios - PGMConsultor JRSantana
 
APRESENTAÇÃO - O PRINCIPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL (1).pptx
APRESENTAÇÃO - O PRINCIPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL (1).pptxAPRESENTAÇÃO - O PRINCIPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL (1).pptx
APRESENTAÇÃO - O PRINCIPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL (1).pptxPregaoelouvores
 
Arbitragem e Propriedade Intelectual
Arbitragem e Propriedade IntelectualArbitragem e Propriedade Intelectual
Arbitragem e Propriedade IntelectualRodrigo Azevedo
 
Linguagem e argumentação jurídica 2 - Opinião do Juízes PB
Linguagem e argumentação jurídica 2 -  Opinião do Juízes PB Linguagem e argumentação jurídica 2 -  Opinião do Juízes PB
Linguagem e argumentação jurídica 2 - Opinião do Juízes PB Direito_fspb
 
Procedim sumaríssimo e ordinário direito trabalho
Procedim sumaríssimo e ordinário direito trabalhoProcedim sumaríssimo e ordinário direito trabalho
Procedim sumaríssimo e ordinário direito trabalhoAna Cristina Ramos
 
O principio "nemo tenetur se ipsum accusare"
O principio "nemo tenetur se ipsum accusare"O principio "nemo tenetur se ipsum accusare"
O principio "nemo tenetur se ipsum accusare"Half Life
 
Cartilha sobre alguns princípios do Direito
Cartilha sobre alguns princípios do DireitoCartilha sobre alguns princípios do Direito
Cartilha sobre alguns princípios do DireitoVITRIACAROLINEDEFREI
 
2015 _apostila__segunda_parte_outubro_de_2015__final_novembro_de_2015_reparado
2015  _apostila__segunda_parte_outubro_de_2015__final_novembro_de_2015_reparado2015  _apostila__segunda_parte_outubro_de_2015__final_novembro_de_2015_reparado
2015 _apostila__segunda_parte_outubro_de_2015__final_novembro_de_2015_reparadoKesiabertoli
 
Principios processo do trabalho
Principios processo do trabalhoPrincipios processo do trabalho
Principios processo do trabalhoAriel Prado
 
1 estatuto e etica oab
1  estatuto e etica oab1  estatuto e etica oab
1 estatuto e etica oabvolemar
 
Simulado de inéditas - XV Exame
Simulado de inéditas - XV ExameSimulado de inéditas - XV Exame
Simulado de inéditas - XV Exame'Roberto Morgado
 
Apostila juizados especiais_civeis
Apostila juizados especiais_civeisApostila juizados especiais_civeis
Apostila juizados especiais_civeisJane Cesca
 
Apostila audiência trabalhista 2013
Apostila audiência trabalhista 2013Apostila audiência trabalhista 2013
Apostila audiência trabalhista 2013DIONATAN22
 

Semelhante a Pensamos, mas nem sempre dizemos...! - Artigo do Dr. António Neves Laranjeira (20)

Palestra Asdrubal
Palestra AsdrubalPalestra Asdrubal
Palestra Asdrubal
 
Aula 4
Aula 4Aula 4
Aula 4
 
Inversão do onus da prova no cdc
Inversão do onus da prova no cdcInversão do onus da prova no cdc
Inversão do onus da prova no cdc
 
Roteiro simples para audiências trabalhistas (1)
Roteiro simples para audiências trabalhistas (1)Roteiro simples para audiências trabalhistas (1)
Roteiro simples para audiências trabalhistas (1)
 
1041- Embargos Declaratórios - PGM
1041- Embargos Declaratórios - PGM1041- Embargos Declaratórios - PGM
1041- Embargos Declaratórios - PGM
 
APRESENTAÇÃO - O PRINCIPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL (1).pptx
APRESENTAÇÃO - O PRINCIPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL (1).pptxAPRESENTAÇÃO - O PRINCIPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL (1).pptx
APRESENTAÇÃO - O PRINCIPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL (1).pptx
 
Blindagem patrimonial
Blindagem patrimonialBlindagem patrimonial
Blindagem patrimonial
 
Arbitragem e Propriedade Intelectual
Arbitragem e Propriedade IntelectualArbitragem e Propriedade Intelectual
Arbitragem e Propriedade Intelectual
 
Linguagem e argumentação jurídica 2 - Opinião do Juízes PB
Linguagem e argumentação jurídica 2 -  Opinião do Juízes PB Linguagem e argumentação jurídica 2 -  Opinião do Juízes PB
Linguagem e argumentação jurídica 2 - Opinião do Juízes PB
 
NOTA DE AULA - QUESITOS E FONTE DO DIREITO CONTÁBIL
NOTA DE AULA - QUESITOS E FONTE DO DIREITO CONTÁBILNOTA DE AULA - QUESITOS E FONTE DO DIREITO CONTÁBIL
NOTA DE AULA - QUESITOS E FONTE DO DIREITO CONTÁBIL
 
Procedim sumaríssimo e ordinário direito trabalho
Procedim sumaríssimo e ordinário direito trabalhoProcedim sumaríssimo e ordinário direito trabalho
Procedim sumaríssimo e ordinário direito trabalho
 
O principio "nemo tenetur se ipsum accusare"
O principio "nemo tenetur se ipsum accusare"O principio "nemo tenetur se ipsum accusare"
O principio "nemo tenetur se ipsum accusare"
 
Cartilha sobre alguns princípios do Direito
Cartilha sobre alguns princípios do DireitoCartilha sobre alguns princípios do Direito
Cartilha sobre alguns princípios do Direito
 
2015 _apostila__segunda_parte_outubro_de_2015__final_novembro_de_2015_reparado
2015  _apostila__segunda_parte_outubro_de_2015__final_novembro_de_2015_reparado2015  _apostila__segunda_parte_outubro_de_2015__final_novembro_de_2015_reparado
2015 _apostila__segunda_parte_outubro_de_2015__final_novembro_de_2015_reparado
 
Principios processo do trabalho
Principios processo do trabalhoPrincipios processo do trabalho
Principios processo do trabalho
 
1 estatuto e etica oab
1  estatuto e etica oab1  estatuto e etica oab
1 estatuto e etica oab
 
Simulado de inéditas - XV Exame
Simulado de inéditas - XV ExameSimulado de inéditas - XV Exame
Simulado de inéditas - XV Exame
 
Apostila juizados especiais_civeis
Apostila juizados especiais_civeisApostila juizados especiais_civeis
Apostila juizados especiais_civeis
 
Apostila audiência trabalhista 2013
Apostila audiência trabalhista 2013Apostila audiência trabalhista 2013
Apostila audiência trabalhista 2013
 
Boletim UniNorte Jurídico #6
Boletim UniNorte Jurídico #6Boletim UniNorte Jurídico #6
Boletim UniNorte Jurídico #6
 

Mais de Delegação de Cascais

Comunicação Cascais- Uma Advocacia de Cidadania.pdf
Comunicação Cascais- Uma Advocacia de Cidadania.pdfComunicação Cascais- Uma Advocacia de Cidadania.pdf
Comunicação Cascais- Uma Advocacia de Cidadania.pdfDelegação de Cascais
 
As Delegações e o seu valor - Dra. Manuela Frias
As Delegações e o seu valor - Dra. Manuela FriasAs Delegações e o seu valor - Dra. Manuela Frias
As Delegações e o seu valor - Dra. Manuela FriasDelegação de Cascais
 
A Advocacia e o Voluntariado - Dra. Inês Sevinate Pinto
A Advocacia e o Voluntariado - Dra. Inês Sevinate PintoA Advocacia e o Voluntariado - Dra. Inês Sevinate Pinto
A Advocacia e o Voluntariado - Dra. Inês Sevinate PintoDelegação de Cascais
 
O voto: direito, dever ou direito-dever? - Dr. Nuno Sanches de Baena Ennes
O voto: direito, dever ou direito-dever? - Dr. Nuno Sanches de Baena EnnesO voto: direito, dever ou direito-dever? - Dr. Nuno Sanches de Baena Ennes
O voto: direito, dever ou direito-dever? - Dr. Nuno Sanches de Baena EnnesDelegação de Cascais
 
Editorial: Frágil Realidade - Dr. Salvador Ulrich
Editorial: Frágil Realidade - Dr. Salvador UlrichEditorial: Frágil Realidade - Dr. Salvador Ulrich
Editorial: Frágil Realidade - Dr. Salvador UlrichDelegação de Cascais
 
O Ministério Público como autoridade judiciária à luz do direito europeu - Dr...
O Ministério Público como autoridade judiciária à luz do direito europeu - Dr...O Ministério Público como autoridade judiciária à luz do direito europeu - Dr...
O Ministério Público como autoridade judiciária à luz do direito europeu - Dr...Delegação de Cascais
 
Contributo para uma Reforma da Justiça- Dr. Jorge Bleck
Contributo para uma Reforma da Justiça- Dr. Jorge Bleck Contributo para uma Reforma da Justiça- Dr. Jorge Bleck
Contributo para uma Reforma da Justiça- Dr. Jorge Bleck Delegação de Cascais
 
Celeridade com qualidade nos Tribunais - Dra. Branca Corrêa
Celeridade com qualidade nos Tribunais - Dra. Branca CorrêaCeleridade com qualidade nos Tribunais - Dra. Branca Corrêa
Celeridade com qualidade nos Tribunais - Dra. Branca CorrêaDelegação de Cascais
 
Reforma da Justiça nos Tribunais Administrativos e Fiscais - Dra. Maria Paula...
Reforma da Justiça nos Tribunais Administrativos e Fiscais - Dra. Maria Paula...Reforma da Justiça nos Tribunais Administrativos e Fiscais - Dra. Maria Paula...
Reforma da Justiça nos Tribunais Administrativos e Fiscais - Dra. Maria Paula...Delegação de Cascais
 
Reforma na Justiça - Dra. Inês Nunes
Reforma na Justiça - Dra. Inês NunesReforma na Justiça - Dra. Inês Nunes
Reforma na Justiça - Dra. Inês NunesDelegação de Cascais
 
Artigo do Prof. Doutor Germano de Sousa
Artigo do Prof. Doutor Germano de SousaArtigo do Prof. Doutor Germano de Sousa
Artigo do Prof. Doutor Germano de SousaDelegação de Cascais
 
Artigo de Opinião - Dra. Francisca Castro
Artigo de Opinião - Dra. Francisca CastroArtigo de Opinião - Dra. Francisca Castro
Artigo de Opinião - Dra. Francisca CastroDelegação de Cascais
 

Mais de Delegação de Cascais (20)

Editorial - Tributo às Delegações
Editorial - Tributo às DelegaçõesEditorial - Tributo às Delegações
Editorial - Tributo às Delegações
 
Comunicação Conjunta
Comunicação ConjuntaComunicação Conjunta
Comunicação Conjunta
 
Comunicação Cascais- Uma Advocacia de Cidadania.pdf
Comunicação Cascais- Uma Advocacia de Cidadania.pdfComunicação Cascais- Uma Advocacia de Cidadania.pdf
Comunicação Cascais- Uma Advocacia de Cidadania.pdf
 
Tributo às Delegações - Editorial
Tributo às Delegações - EditorialTributo às Delegações - Editorial
Tributo às Delegações - Editorial
 
As Delegações e o seu valor - Dra. Manuela Frias
As Delegações e o seu valor - Dra. Manuela FriasAs Delegações e o seu valor - Dra. Manuela Frias
As Delegações e o seu valor - Dra. Manuela Frias
 
A Advocacia e o Voluntariado - Dra. Inês Sevinate Pinto
A Advocacia e o Voluntariado - Dra. Inês Sevinate PintoA Advocacia e o Voluntariado - Dra. Inês Sevinate Pinto
A Advocacia e o Voluntariado - Dra. Inês Sevinate Pinto
 
O voto: direito, dever ou direito-dever? - Dr. Nuno Sanches de Baena Ennes
O voto: direito, dever ou direito-dever? - Dr. Nuno Sanches de Baena EnnesO voto: direito, dever ou direito-dever? - Dr. Nuno Sanches de Baena Ennes
O voto: direito, dever ou direito-dever? - Dr. Nuno Sanches de Baena Ennes
 
Editorial: Frágil Realidade - Dr. Salvador Ulrich
Editorial: Frágil Realidade - Dr. Salvador UlrichEditorial: Frágil Realidade - Dr. Salvador Ulrich
Editorial: Frágil Realidade - Dr. Salvador Ulrich
 
O Ministério Público como autoridade judiciária à luz do direito europeu - Dr...
O Ministério Público como autoridade judiciária à luz do direito europeu - Dr...O Ministério Público como autoridade judiciária à luz do direito europeu - Dr...
O Ministério Público como autoridade judiciária à luz do direito europeu - Dr...
 
Contributo para uma Reforma da Justiça- Dr. Jorge Bleck
Contributo para uma Reforma da Justiça- Dr. Jorge Bleck Contributo para uma Reforma da Justiça- Dr. Jorge Bleck
Contributo para uma Reforma da Justiça- Dr. Jorge Bleck
 
Editorial - Pilares da Justiça
Editorial - Pilares da Justiça Editorial - Pilares da Justiça
Editorial - Pilares da Justiça
 
Celeridade com qualidade nos Tribunais - Dra. Branca Corrêa
Celeridade com qualidade nos Tribunais - Dra. Branca CorrêaCeleridade com qualidade nos Tribunais - Dra. Branca Corrêa
Celeridade com qualidade nos Tribunais - Dra. Branca Corrêa
 
Reforma da Justiça nos Tribunais Administrativos e Fiscais - Dra. Maria Paula...
Reforma da Justiça nos Tribunais Administrativos e Fiscais - Dra. Maria Paula...Reforma da Justiça nos Tribunais Administrativos e Fiscais - Dra. Maria Paula...
Reforma da Justiça nos Tribunais Administrativos e Fiscais - Dra. Maria Paula...
 
Reforma na Justiça - Dra. Inês Nunes
Reforma na Justiça - Dra. Inês NunesReforma na Justiça - Dra. Inês Nunes
Reforma na Justiça - Dra. Inês Nunes
 
Quem quer viver na Venezuela?
Quem quer viver na Venezuela?Quem quer viver na Venezuela?
Quem quer viver na Venezuela?
 
Editorial - Um Natal mágico
Editorial - Um Natal mágico Editorial - Um Natal mágico
Editorial - Um Natal mágico
 
Novidades Legislativas
Novidades Legislativas Novidades Legislativas
Novidades Legislativas
 
Artigo do Prof. Doutor Germano de Sousa
Artigo do Prof. Doutor Germano de SousaArtigo do Prof. Doutor Germano de Sousa
Artigo do Prof. Doutor Germano de Sousa
 
Editorial - Estatizar a Ordem
Editorial - Estatizar a OrdemEditorial - Estatizar a Ordem
Editorial - Estatizar a Ordem
 
Artigo de Opinião - Dra. Francisca Castro
Artigo de Opinião - Dra. Francisca CastroArtigo de Opinião - Dra. Francisca Castro
Artigo de Opinião - Dra. Francisca Castro
 

Pensamos, mas nem sempre dizemos...! - Artigo do Dr. António Neves Laranjeira

  • 1. Pensamos, mas nem sempre dizemos…! Quando dois advogados se reúnem, pelo menos na primeira reunião, o advogado com a data de inscrição na Ordem dos Advogados mais recente (o número de cédula não é, como sabemos, critério seguro atenta a diferente numeração que, antes, era atribuída a cada Conselho Regional) deverá deslocar-se ao escritório daquele com a inscrição mais antiga. Apesar de se tratar de um uso perfeitamente enraizado na advocacia, não só em Portugal, mas em muitos países europeus, tem vindo a ser desconsiderado por alguns advogados. A constatação deste facto levou a que cinco advogados, oriundos de cinco diferentes países da União Europeia, a exercer, transitoriamente, em Portugal sob as respetivas denominações de origem, se tenham proposto realizar um inquérito a 250 advogados da União Europeia com o objetivo de procurar perceber até que ponto o cumprimento das normas Deontológicas constitui uma prioridade para a advocacia europeia. Como primeira nota, diga-se, em abono da verdade, que o número irrisório de advogados inquiridos e a falta de rigor científico na recolha e contabilização dos dados, apenas permitirá que os resultados obtidos possam ser lidos como curiosidade e incentivo a um estudo mais aprofundado. Em jeito de segunda nota, importa referir, que para não tornar este texto demasiado extenso, optei por referir, apenas, algumas das conclusões que têm relação direta com o Estatuto da Ordem dos Advogados Portugueses, adiante EOA. Iniciando a análise das conclusões pelo capítulo relativo ao relacionamento entre advogados, verifica-se que 112 inquiridos criticam, pelo menos, três das seguintes condutas por parte de alguns colegas: •Não respondem, em prazo razoável, às solicitações orais ou escritas; •Emitem, publicamente, opinião relativamente a questões pendentes confiadas a outro advogado.
  • 2. •Contactam a parte contraria apesar de saberem que está representada por outro colega •Iniciam o patrocínio de um assunto anteriormente confiado a outro advogado antes de, previamente, terem exposto ao colega as razões da aceitação do mandato e os esforços que tenham desenvolvido para lhe serem pagos os honorários e quantias em dívida. Estranhamente, 110 inquiridos desconheciam que poderá ser punido disciplinarmente aquele advogado que, em sede de julgamento, não procure obstar a que o seu cliente se dirija ao colega da parte contraria de forma incorreta. Por outro lado, no que se refere à relação com os clientes, referem 99 inquiridos conhecer situações em que os colegas exercem o mandato sem atenderem ao facto de estarem em presença de um conflito de interesses. Estamos convictos de que a maioria dos colegas sabe que o advogado não pode aconselhar, representar ou agir por conta de dois ou mais clientes, no mesmo assunto ou em assunto conexo, se existir conflito entre os interesses desses clientes, sob pena de incorrer em responsabilidade disciplinar e criminal (prevaricação). Fica, assim, por perceber se a motivação da referida infração decorre de manifesto dolo ou se terá origem no desconhecimento de que o “impedimento”, para advogar em conflito de interesses, é extensivo aos advogados que com ele exerçam a atividade em sociedade ou em mera associação. Grande número de inquiridos confessou, também, desconhecer o direito de protesto regulado no artigo 80.º do EOA. Como é consabido o advogado tem o dever de conhecer e de lançar mão do dever de protesto sempre que, no decorrer de audiência ou de qualquer outro ato ou diligência em que intervenha, seja impedido de requerer oralmente ou por escrito, no momento que considerar oportuno, o que julgar conveniente ao dever do patrocínio, sem necessidade de prévia indicação ou explicitação do respetivo conteúdo. Não deveremos ficar indiferentes ao desconhecimento dos direitos que a lei coloca ao dispor dos advogados. Mas pior é a conclusão seguinte. A quase totalidade dos inquiridos confessou já ter vivenciado situações em que poderia ter exercido o direito/dever de protesto mas desconhece quando, e de que forma, deverá exercê-lo! Finalmente, no que se refere ao relacionamento com a comunidade, pela sua relevância referimos, em primeiro lugar, as conclusões relativas ao segredo profissional, regulado no artigo 92.º do EOA, elencando-as, por ordem decrescente do número de vezes que foram citadas: •O advogado não pode revelar factos de que tenha tido conhecimento no âmbito de quaisquer negociações malogradas, orais ou escritas, em que tenha intervindo. Assim, frustrando-se, total ou parcialmente, a conciliação, os Advogados devem evitar expor ao magistrado o conteúdo das negociações tentadas fora da sala de audiência. Atrevemo-nos a sugerir que os advogados, em sede de tentativa de conciliação, se limitem a comunicar ao juiz que, não lograram chegar
  • 3. a acordo porquanto nenhuma das partes abdicou das posições assumidas nos autos; •O advogado não pode revelar factos de que a parte contrária do cliente ou respetivos representantes lhe tenham dado conhecimento durante negociações para acordo que vise pôr termo ao diferendo ou litígio; •O segredo profissional abrange ainda documentos ou outras coisas que se relacionem, direta ou indiretamente, com os factos sujeitos a sigilo. Daqui resulta que estando a correspondência trocada entre advogados protegida pelo dever de sigilo não poderá ser invocada nem utilizada como meio de prova sem que, previamente, seja requerido, ao presidente do conselho regional respetivo, o levantamento do sigilo. Relacionado com o sigilo, importa referir que a maioria dos advogados inquiridos afirmou desconhecer estar obrigado a garantir a confidencialidade das missivas remetidas pelos colegas ao abrigo do disposto no artigo 113.º do EOA mesmo que, para tanto, tenha que optar por destruí-las ou devolvê-las aos remetentes. Uma percentagem, ligeiramente superior, desconhecia, também, que o escopo da referida norma é a criação de um mecanismo de comunicação entre advogados que não poderá ser alvo de um eventual pedido de dispensa de sigilo que vise utilizá-la como meio de prova em juízo. Concluímos referindo que a totalidade dos advogados inquiridos manifestou estranheza pelo facto de não se ter conseguido, até hoje, por cobro ao “autentico desfile de advogados” à saída dos tribunais, quando estão presentes câmaras de televisão. A maioria dos inquiridos aplaudiu o comportamento dos advogados que optam pelo silêncio quando não está em causa a defesa da honra. Paralelamente, gostariam que fossem publicitadas as punições aplicadas àqueles que, reiteradamente, fazem tábua rasa do disposto no artigo 93º do EOA, com o manifesto intuito de angariar clientela e sem o mínimo respeito pela advocacia em geral e pelos legítimos direitos dos demais intervenientes no mesmo processo que, não raramente, prejudicam. As conclusões do inquérito são omissas relativamente ao número de advogados portugueses inquiridos. Por tal razão e porque não será possível utilizar este inquérito para uma verificação rigorosa das percentagens apuradas relativamente a cada um dos temas, tomei a liberdade de alterar alguns algarismos para provocar a coincidência das conclusões com o número dos artigos do Estatuto a que as mesmas se referem. Com um agradecimento sincero pela paciência e tempo que dedicaram à leitura deste texto, ficam a saudades dos abraços que tanto gosto de partilhar convosco! António Neves Laranjeira