Este documento discute um projeto de lei que pretende alterar o regime das Ordens Profissionais em Portugal, incluindo a Ordem dos Advogados. O autor argumenta que as mudanças propostas levariam à "estatização" das ordens e à perda de sua independência, colocando em risco o sigilo profissional e o papel da Ordem no Estado de Direito.
1. Estatizar a Ordem
A nossa Ordem, criada em 12 de Junho de 1926 e que sucedeu à
Associação dos Advogados que teve os seus estatutos aprovados em
1838, é uma associação pública, representativa dos profissionais que
exercem Advocacia, regida pelo direito público porquanto tem
atribuições de ordem pública.
No exercício dos seus poderes, sempre desempenhou as suas funções
de forma independente dos órgãos do Estado, sendo livre e autónoma
na sua actividade embora estando a sua atividade contabilística e
gestão financeira atualmente sujeita a jurisdição do Tribunal de Contas.
A função social da Ordem dos Advogados é abrangente, destacando-se
o seu papel na defesa do Estado de Direito e dos direitos liberdades e
garantias dos cidadãos, bem como na colaboração com a administração
da Justiça e na garantia do acesso ao direito, nos termos da
Constituição.
São também atribuições da Ordem dos Advogados zelar pela função
social, dignidade e prestígio da profissão de Advogado, nomeadamente
através da promoção dos valores e princípios deontológicos junto dos
seus membros; bem como representar a profissão de Advogado e
defender os interesses, direitos, prerrogativas e imunidades dos seus
membros, denunciando perante as instâncias nacionais e internacionais
os actos que atentem contra aqueles; e reforçar a solidariedade entre os
Advogados.
Ora, foi aprovado na generalidade, ao que parece sem que tenha havido
prévia audição das Ordens Profissionais, o Projeto Lei n.º 974/XIV/3ª
que pretende , a pretexto de diretivas europeias sobre o livre acesso a
profissões reguladas, alterar o regime das Ordens Profissionais em
termos de se assistir a uma manifesta governamentalização das
mesmas, estatizando-as e retirando-lhes a independência que deve ser
apanágio de qualquer instituição da Sociedade Civil.
2. No que se refere à Ordem dos Advogados (embora esta nunca tenha
deixado de permitir livre acesso à profissão de advogado como o
número de inscritos bem demonstra ) existem vários assuntos que
constam desta Proposta de Lei que até podem merecer discussão e
alteração do que está estabelecido ( por ex. no que se refere o Provedor
dos destinatários dos nossos serviços e a Formação e Estágio ).
Pretender-se estabelecer ( como as grandes sociedades auditoras há
muito pretendem ) a possibilidade de advogados ou sociedades de
advogados fazerem parte de sociedades multidisciplinares
conjuntamente com outros profissionais que pertençam ou não a
outras profissões públicas, pode contudo vir a gerar não só graves
problemas de incompatibilidades, como põe manifestamente em
causa o sigilo profissional a que estamos obrigados e que é pilar da
confiança que os nossos constituintes em nós depositam.
Porém o mais grave é a pretendida criação de um Conselho de
Supervisão constituído maioritariamente por pessoas estranhas à nossa
profissão e designadas pelo Estado , que será órgão de supervisão da
Ordem e do cumprimento das suas atribuições e órgão máximo de
recurso em sede disciplinar e no acesso à profissão .
Quando já existem mecanismos de controlo da actividade da nossa
Ordem ( Tribunal de Contas e Tribunais Administrativos ) é evidente
que se pretende, pura e simplesmente, estatizar a Ordem e coartá-la
da sua quase centenária independência e do seu papel fundamental no
Estado de Direito , Defesa dos Direitos Humanos e Liberdades e
Garantias dos cidadãos, assim, sem qualquer justificação ou sequer em
obediência a quaisquer diretivas nesse sentido, manietando e
controlando este fundamental sector da sociedade civil.
Margarida Lopes Branco