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– dois afluentes poéticos:
poesia-construção
(preocupação com a
forma) e poesia-participação
(preocupação
social)
Esta folha branca
me proscreve o sonho,
me incita ao verso
nítido e preciso.
4. rafabebum.blogspot.com Não a forma encontrada
como uma concha, perdida
nos frouxos areais
como cabelos;
não a forma obtida
em lance santo ou raro,
tiro nas lebres de vidro
do invisível;
mas a forma atingida
como a ponta do novelo
que a atenção, lenta,
desenrola,
aranha; como o mais extremo
desse fio frágil, que se rompe
ao peso, sempre, das mãos
enormes.
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– João Cabral: o poeta-engenheiro
– linguagem seca, agressiva
– pratica o antilirismo
Um galo sozinho não tece uma manhã:
ele precisará sempre de outros galos.
De um que apanhe esse grito que ele
e o lance a outro; de um outro galo
que apanhe o grito de um galo antes
e o lance a outro; e de outros galos
que com muitos outros galos se cruzem
os fios de sol de seus gritos de galo,
para que a manhã, desde uma teia tênue,
se vá tecendo, entre todos os galos.
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E se encorpando em tela, entre todos,
se erguendo tenda, onde entrem todos,
se entretendendo para todos, no toldo
(a manhã) que plana livre de armação.
A manhã, toldo de um tecido tão aéreo
que, tecido, se eleva por si: luz balão.
– obra: O Engenheiro, Psicologia da
Composição, O Cão sem Plumas, O Rio,
A Educação Pela Pedra
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Uma educação pela pedra: por lições;
Para aprender da pedra, frequentá-la;
Captar sua voz inenfática, impessoal
(pela de dicção ela começa as aulas).
A lição de moral, sua resistência fria
Ao que flui e a fluir, a ser maleada;
A de poética, sua carnadura concreta;
A de economia, seu adensar-se
compacta:
Lições da pedra (de fora para dentro,
Cartilha muda), para quem soletrá-la.
Outra educação pela pedra: no Sertão
(de dentro para fora, e pré-didática).
No Sertão a pedra não sabe lecionar,
E se lecionasse, não ensinaria nada;
Lá não se aprende a pedra: lá a pedra,
Uma pedra de nascença, entranha a
alma.
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– duas imagens:
a pedra (referência à poesia compacta e à
aridez do sertão do NE)
o rio (anseio do sertanejo nordestino)
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Morte e Vida Severina, auto de
natal pernambucano
sertão → agreste → zona da mata → litoral
Trajetória do Severino:
rio Capibaribe
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O meu nome é Severino,
não tenho outro de pia. (...)
Mas isso ainda diz pouco:
há muitos na freguesia (...)
Severino: alegoria do sertanejo
E se somos Severinos
iguais em tudo na vida,
morremos de morte igual,
mesma morte severina:
que é a morte que se morre
de velhice antes dos trinta,
de emboscada antes dos vinte,
de fome um pouco por dia (...)
Severina: adjetivo neológico
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Morte e Vida Severina,
auto de natal
pernambucano
sertão → agreste → zona da mata → litoral
Trajetória do Severino:
rio Capibaribe
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Agreste:
dois funerais
(dois Severinos)
— A quem estais carregando,
irmãos das almas,
embrulhado nessa rede?
dizei que eu saiba. (...)
— Severino Lavrador,
irmão das almas,
Severino Lavrador,
mas já não lavra.
uma carpideira
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Zona da mata:
funeral de um lavrador
— Essa cova em que estás,
com palmos medida,
é a cota menor
que tiraste em vida.
— é de bom tamanho,
nem largo nem fundo,
é a parte que te cabe
neste latifúndio.
— Não é cova grande.
é cova medida,
é a terra que querias
ver dividida. (morte)
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Litoral:
dois coveiros
carpinteiro José
— Seu José, mestre
carpina,
que diferença faria
se em vez de continuar
tomasse a melhor saída:
a de saltar, numa noite,
fora da ponte e da vida?
nascimento de um menino
vizinhos com presentes
(morte)
Estais aí conversando
em vossa prosa entretida:
não sabeis que vosso filho
saltou para dentro da vida?
(vida)
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Morte e Vida Severina, auto de natal
pernambucano
alegoria
— Severino retirante,
deixe agora que lhe diga:
eu não sei bem a resposta
da pergunta que fazia,
se não vale mais saltar
fora da ponte e da vida;
nem conheço essa resposta,
se quer mesmo que lhe diga;
é difícil defender,
só com palavras, a vida,
ainda mais quando ela é
esta que vê, severina;
mas se responder não pude
à pergunta que fazia,
ela, a vida, a respondeu
com sua presença viva.
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E não há melhor resposta
que o espetáculo da vida:
vê-la desfiar seu fio,
que também se chama vida,
ver a fábrica que ela mesma,
teimosamente, se fabrica,
vê-la brotar como há pouco
em nova vida explodida;
mesmo quando é assim
pequena
a explosão, como a ocorrida;
mesmo quando é uma explosão
como a de há pouco, franzina;
mesmo quando é a explosão
de uma vida severina.