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8. Formas do Poder Político
Luiz Salvador de Miranda-Sá Jr,
O poder político pode assumir muitas e variadas formas, na dependência de
incontáveis fatores e de incontáveis variações e tipos de relações de poder. Como
já houve ocasião de mencionar, os diferentes tipos de organização estrutural do
poder político assinalam aquilo que há de essencial na organização de sua
estrutura social: a quem serve prioritariamente o poder mais do quem o exerce.
Tais estruturas de poder político podem ser dispostas de diversas maneiras,
configurando diversas formas de estruturas políticas. As formas de poder se
referem a quem exerce o poder político e como o faz, de certa maneira, se refere
à forma que o poder político assume.
As formas que assumem as estruturas do poder em sua realização concreta são:
a ditadura,
o totalitarismo,
o anarquismo e
a democracia.
Como se vê, a democracia ocupa lugar entre as estruturas de poder e também é
uma das formas que as estruturas de poder podem assumir. Esta duplicidade da
democracia como conceito político é uma das coisas que dificultam seu
entendimento pelos iniciantes no assunto.
As estruturas de poder caracterizam o conteúdo essencial do poder político dos
Estados. Em geral, as formas de poder assinalam a disposição e funcionamento
do governo. Nos Estados ditatoriais se confundem o governo e o Estado, a forma
e a estrutura do poder (forma e conteúdo). Mas, em situações excepcionais, é
possível haver um governo ditatorial em um estrutura democrática de poder
(como acontecia na Roma Antiga, exatamente onde surgiu o conceito de ditaura).
Mais tarde este conceito foi repetido em outros lugares, como, por exemplo, no
governo revolucionário francês ao tempo do Diretório; no gorverno de Francia
no Paraguai logo após a independência e nos governos socialistas, recusando-se
a figura do ditador (a ditadura do proletariado, como se denominava).
Em todos estaes casos, a propaganda política identificava a imagem do ditador
com o povo, e fixava publicitariamente certas imagens como pai da pátria, chefe
da nação e outras asneiras semelhantes, mas que parecem bem razoáveis
enquanto estão operando como artefatos ideológicos.

Ditadura
Ditadura (ou despotismo, absolutismo) é o tipo forma de estrutura de poder
político no qual a autoridade governamental se caracteriza por diferentes
combinações de algumas e, freqüentemente, da maioria das seguintes
características:
-

concentração do poder nas mãos de um indivíduo, ditador ou junta
ditatorial;

-

falta da obrigação de prestar contas de seus atos;

-

ausência de recursos legais e políticos que prevejam seu afastamento;

-

falta ou grande imprecisão nos limites de sua autoridade sobre as
pessoas;

-

investidura da maior autoridade em desacordo com a legislação préexistente;

-

ausência de normas para sucessão ordenada;

-

uso da autoridade em benefício de um grupo mais ou menos restrito;

-

obediência inspirada pelo medo e no terror como instrumento político.

No plano formal, sua característica principal é o caráter ilimitado, tendente ao
absoluto, da intensidade do poder e a falta de obrigação de responder pelos seus
erros; quando emprega a crueldade e o terror como instrumento de controle
social, a ditadura é chamada tirania.
Essencialmente, a ditadura é uma forma de governo sempre baseada na força e
alheia à participação cidadã.
A ditadura é uma forma de exercitar poder e, como tal, pode ser empregado em
qualquer tipo de estrutura de poder seja autocrática, oligárquica ou democrática.
Como a história mostra em muitos casos.
A estrutura ditatorial de poder nem sempre teve a conotação
condenável que ostenta hoje. Na República Romana, o ditador era
um governante absoluto escolhido por tempo certo ou para realizar
uma tarefa, geralmente em época de guerra ou de grave comoção
social que exigisse comando único e disciplina unitária. O instituto
estava previsto na lei. Ao fim do período determinado, o ditador
reintegrava-se na vida civil, deixando o governo a quem tinha o
direito de exercê-lo legitimamente. Compara-se ao estado de sítio
da legislação atual.Em tempos mais recentes, os ditadores se
encantam com o exercício do poder e inventam mil e uma
artimanhas para se perpetuarem nele e, quase sempre, têm que
ser apeados a força.
Atualmente, ao contrário do que já aconteceu na história de outros países (como
a Roma antiga republicana e o Paraguai logo depois da independência), o poder
ditatorial é, por definição, um poder autoritário que justifica a si mesmo pela
força e cria as leis de que necessita para continuar a existir, confundindo os
interesses de quem está no poder (indivíduo ou grupo) com os interesses
estatais.
O autoritarismo ditatorial pode ser totalitário ou não. Quando se avaliam as
relações entre os conceitos de ditadura absolutista (inclusive a tirania) e
totalitarismo, pode-se concluir que todo totalitarismo é ditatorial, embora nem
toda ditadura seja totalitária, pois pode restringir sua intromissão nos direitos
individuais ao que for essencial para a menutenção do poder..

Totalitalitarismo
Totalitarismo, ou poder totalitário. A rigor, é um tipo de exercício do poder no
qual a autoridade se expande para todos os aspectos da vida social e, determina
as mais importantes opções de seus membros, não deixando margem
significativa de liberdade aos indivíduos, grupos ou associações. O poder
totalitário se impõe a todas as manifestações importantes da possibilidade de
uma pessoa ser liver. Contudo, modernamente, o termo totalitário pode ser
empregado para apontar estruturas de poder que invadam indevidamente a
liberdade individual e afrontem suas garantias fundamentais (os Direitos
Humanos).
Enquanto o autoritarismo é considerado como um abuso da intensidade do
poder, o totalitarismo é um abuso de sua amplitude em relação aos direitos
individuais. O poder é tão mais totalitário quanto menos espaço deixa aos
indivíduos para decidir sobre seus assuntos pessoais. De certa maneira, o
totalitarismo tende para o aniquilamento dos direitos individuais Ao menos, dos
cidadãos comuns). O totalitarismo é uma forma de poder característica das
autocracias e das oligarquias, sendo completamente incompatível com um
Estado ou com um governo democráticos.
Não pode haver governo totalitário senão em um Estado totalitário e todo Estado
totalitário necessita ter governo totalitário. Em um plano mais abrangente, o
totalitarismo se caracteriza pela intervenção do Estado burocrático-autoritário
em todas as manifestações individuais e sociais, tornado em única fonte da
verdade e da mentira, do certo e do errado, do justo e do injusto, do bem e do
mal. Quanto mais totalitário for o Estado, tanto menos espaço haverá para a
consciência do cidadão optar e para a livre organização de grupos, associações,
instituições e comunidades. Como em muitas outras deformações do poder em
outros fenômenos político-sociais, o totalitarismo não pode ser entendido como
inteiramente presente ou completamente ausente em qualquer estrutura de
poder.
Quando se considera o caráter totalitário de um governo ou direção de
organismo social, sabe-se que existem formas mais ou menos agudas ou
mitigadas e tipos mais ou menos restritos a alguns aspectos da vida individual,
como o religioso ou o político, por exemplo.
Muitos imaginam o totalitarismo incompatível com a democracia formal. Isto é
falso. Ao contrário desta opinião, os Estados totalitários (e, por extensão, outras
instituições totalitária), eventualmente, podem ser democráticos.
A este propósito, diz Bobbio: “Todas as grandes ideologias do século XIX, a

democrática, a nacionalista e a católica (nos seus aspectos reacionário ou social)
ou a socialista, na medida em que se afastaram explicitamente do Liberalismo,
buscaram a edificação de uma outra forma de Estado que, conforme a matriz
ideológica, poderia ser um estado autoritário ou uma democracia populista e
totalitária”. No entanto, a tendência atual é sustentar a incompatibilidade entre o
totalitarismo e a democracia como valor político essencial.
A União Soviética e os demais Estados comunistas foram uma
forma de tentar criar uma democraacia econômica, mesmo a custo
de operá-lo com um Estado ditatorial e totalitário. Deu no que deu.
É possível haver totalitarismo disfarçado ou explícito em uma estrutura
democrática de poder, quando se privam as pessoas de escolher com liberdade
as opiniões a esposar e as crenças a cultivar. Procedimentos muito totalitários
podem decorrer de procedimentos formais democráticos, como eleições.
Emdeterminadas condições, é possível um governo ditatorial no regime
democrático. Certas situações sociais excepcionais chamadas estado de sítio,
estado de guerra e estado de emergência exemplificam esta afirmativa. O estado
de calamidade pública permite ao governo atuar ditatorialmente no âmbito
administrativo, tanto autoritária, quanto totalitariamente.
Quando se avalia de outro ângulo, verifica-se que o totalitarismo não se refere
apenas à opressão da maioria pela minoria que se aproveita do poder, como tem
acontecido na maior parte das vezes em que o problema chama a atenção. Nos
casos em que a vontade política e os interesses da maioria se impõem
totalitariamente à minoria, pode-se falar em totalitarismo com forma
democrática, o totalitarismo da maioria que é, no fim das contas, antidemocrático. E este regime não tem sido raro na história política da humanidade
e não é menos danoso por causa de seu envoltório formal.
O Estado não é a única instituição que pode se tornar ou ser feita totalitária, ao
comtrário do que muita gente parece pensar. Qualquer instituição pode
degenerar no totalitarismo, desde que invada os terrenos da vida individual que
devam ser decididos pela própria pessoa (ou afrontem os direitos humanos.
Para GOFFMANN, os asilos, os conventos e as prisões são típicas instituições
totais, assim chamadas porque se caracterizam principalmente pelo seu
totalitarismo. Instituições nas quais a individualidade se anula completamente
ou quase completamente ante a subcultura institucional que não deixa aos
indivíduos muita margem para optar e decidir sobre as coisas de sua vida,
mesmo as mais privadas. Tanto mais totalitária é a instituição e tanto menor é a
margem de liberdade que deixa à consciência dos indivíduos. O poder totalitário
esmaga os indivíduos em nome da coletividade, do futuro, de uma divindade ou
outro motivo proposto como elevado ou altruista. Mas, só em nome (ainda que
possa ser muito convincente).
A família patriarcal é outra instituição totalitária exemplar, se bem que apenas
raramente se impusesse a todos os aspectos da vida de seus membros, ainda que
suas exigências supra-individuais originadas na família fossem mais prementes e
extensas nas mulheres e nas crianças que nos homens adultos, sobretudo se mais
bem situados na pirâmide econômica da sociedade.
As religiões tendem a ser instituições totalitárias, se bem que, em geral, restritas
a alguns aspectos particulares da vida pessoal, as crenças nos dogmas e a
obediência à hierarquia sacerdotal. As religiões tendem a ser menos totalitárias
que as seitas, ainda que as religiões monoteístas se mostrem mais totalitárias
que as politeístas. No entanto, algumas seitas são mais totalitárias que outras
(alcançando comportamentos mais numerosos e aspectos mais vastos da vida de
seus crentes) e isto se manifesta na amplitude dos comportamentos
homogeneizados.
Em geral, quanto mais totalitária a religião (ainda que disfarçada de escola
filosófica ou partido político), mais intolerante é a conduta social de seus
membros, o que tende a acentuar o dogmatismo e o totalitarismo. Dado curioso
da história, é que organizações religiosas extremamente autoritárias em seu
interior e quando tiveram oportunidade, em seu exterior, se transformam em
muito libertárias quando despidas do poder político. Não é raro, muito ao
contrário, que partidos políticos se transformem em instituições totalitárias,
quando assumem caráter religioso e mobilizador de obsessividade.
Coisa em que muita gente parece não pensar é que o mercado pode ser uma
instituição totalitária, na medida em que se impõe à margem de qualquer
controle e influi em decisões que devem ser restritas às pessoas.

Totalitarismo em Instituições Sanitárias
Enquanto que as instituições sanitárias comunitárias, como os centros de saúde,
tendem a funcionarem de maneira democrática, os hospitais, de uma maneira
geral, tendem a funcionar como instituições totalitárias ou, no mínimo, com
doses superlativas de autoritarismo e totalitarismo, na medida em que estão
organizadas para prover todas as necessidades de todas as pessoas que estão
nele, interiramente à margem de sua vontade (ou, até, inteiramente contra ela).
Desde a roupa, a alimentação, os horários, os regulamentos, a disciplina, o
remédios, exames e tudo o mais, são organizados sem a participação do
pacientes. Nos casos em que a internação é breve, isto não chega a incomodar ou
danificar a personalidade do paciente, até porque, em sua regressão, se satisfaz
com isto. Quando a situação de dependência se prolonga, tudo é bem pior e,
aquilo que foi benéfico no início, passa a gerar malefícios. Como quase todos os
demais instrumentos terapêuticos, a internação deve ser encarada como um mal
menor, um mal necessário, devendo-se cuidar que seja o menos iatrogênica
possível.
Por outro lado, a situação particular dos enfermos, o estado de necessidade
premente em que sobrevive a meior parte da população brasileira; as limitações
da realidade institucional dos hospitais e lida com a vida e a morte, ocasionam e
justificam o exagero em intensidade (autoritarismo) e em extensão
(totalitarismo) da autoridade dos médicos e dirigentes hospitalares. Entretanto,
deve-se afirmar que o fato de ser guardão da vida deve justificar este poder, mas
nunca seu abuso ou exagêro. De todas as organizações sanitárias, o manicômio é
a mais totalitária.
O hospício ou asilo, depois, chamado manicômio, (do grego mani
-de maníaco, louco e comeion=tratar, literalmente = hospital de
doidos) há até bem pouco tempo, era uma instituição total e
fechada. No início deste século, este termo substitui asilo para
designar organizações de internação de enfermos psiquiátricos.
Depois, passou a designar os estabelecimentos para doentes
mentais criminosos. Atualmente, por influência anarquista,
antimédica, por questões de disputa de mercado ou por pura e
simples ignorância, tem-se denominado manicômios a serviços
hospitalares destinados a pacientes psiquiátricos, qualquer que for
sua dinâmica ou estrutura de poder, não importando se são
autoritários e totalitários ou não.
Por isto, há que se considerar a importância de ponderar a necessidade imposta
pela conduta patológica e as necessidades advindas dos aspectos sadios da
personalidade do paciente, sempre que se lhe fizer um programa terapêutico,
principalmente se incluir a internação compulsória.
A internação médica compulsória, psiquiátrica ou quarentena, ainda que
signifique uma restrição à liberdade do doente pode ser um mal menor, quando
corretamente indicada. e adequadamente praticada. Mas, também se deve
atentar cuidadosamente para a identidade forma e substância que se nota nas
manifestações do totalitarismo (no Estado ou em qualquer outra instituição)
quando se tratar de planejar ou fazer funcionar um sistema de abrigo e proteção
aos dependentes psico-sociais em geral e não apenas aos doentes mentais
crônicos e aos deficientes dependentes.

Autoritarismo e Anarquismo
Deve-se ressaltar que os conceitos de autoridade e de autoritarismo, liberdade e
anarquismo são muito fortemente ideologizados em função das paixões que
mobilizam e interesses que suscitam. Sabe-se que não pode existir qualquer
sistema social sem autoridade e que não deve existir um sem liberdade; que
liberdade e autoridade são características que não se auto-excluem mutuamente,
mas que devem ser ponderadas em cada sistema social, em cada tipo de
organização política. Por outro lado, também se sabe que tanto a liberdade
quanto a autoridade (e o poder que a inspira) podem ser distorcidos em práticas
sociais pervertidas.
O seu exagero ocasiona duas opiniões políticas rigorosamente opostas, ambas
disseminadas na sociedade, o arbítrio que envolve o autoritarismo e o
totalitaraismo e, no outro extremo, seu oposto o anarquismo.
A democracia pressupõe o exercício do poder nos limites da lei e submetidos aos
devidos mecanismos sociais de fiscalização.
O poder arbitrário é a perversão do poder individual ou social que degenera em
um excesso de autoridade e do poder e, consequentemente, em um prejuízo da
liberdade individual. É uma das características do poder ditatorial que consiste
na falta de limites para o poder dos dirigentes, da ilegitimidade sua investidura,
da falta de controle político sobre eles e da impossibilidade política ou legal de
removê-los de sua posição de autoridade.
Tanto da instituição estatal, como em quaisquer outras instituições,
o poder arbitrário consiste, como se viu, na ilegitimidade do poder,
na indevida extensão de seu alcance diante dos direitos
individuais, no abuso ou a degradação da autoridade em tirania ou,
ainda, o exercício do poder e da força sem a necessária legalidade
democrática em sua origem ou em seu exercício.
Na linguagem comum dos meios de comunicação de massa, se mantém este
significado e, por autoritarismo se menciona, a posição política que prega um
regime de concentração excessiva de poder nas mãos de alguém, a extensão
indevida ou de supremacia absoluta da autoridade e o poder sem
responsabilidade.
Ao contrário do poder arbitrário, o anarquismo é a perversão do poder que se
degrada no exagero da liberdade individual em detrimento dos interesses sociais
e do poder político. É, de certa maneira, conseqüência da visão individualista da
sociedade.
Anarquismo é a tendência política que renega todo poder e toda e qualquer
autoridade, acusados de autoritários só por existir. Como em muitas outras
condições sociológicas e psicológicas, nas quais nada é mais parecido com
alguma coisa como o seu exato contrário, o anarquismo e o autoritarismo se
identificam como práticas anti-sociais e frequentemente se superpõem como
práticas políticas. O anarquismo como utopia é a crença em uma sociedade
perfeita, de pessoas que conhecem exatamente os limites de suas necessidades e
possibilidades e os limites alheios; a ponto da autoridade ser desnecessária e o
poder, obsoleto.
Como já se viu atrás, tanto o exercício arbitrário do poder quanto o anarquismo
são negações da autoridade (expressão legal e legítima do poder).

Democracia: Forma e Conteúdo do Poder Político
O estudo da democracia como objeto da ciência política se justifica
principalmente porque se lastreia em um conceito extremamente ideologizado.
De fato, muitos interesses políticos têm tentado se confundir com a democracia e
alguns conseguem. E quando isto acontece, tiram imenso proveito; por isto,
investem muito tentando revogar seu significado para impor um novo que venha
em socorro de seus interesses políticos. Não há político que não se apregoe
democrático, o mais democrático, o mais e completamente democrático. (Que
tem mais uma vantagem, as pessoas incultas têm autêntica fascinação por
proparoxítonos). Consoante o que se viu anteriormente, no significado da
expressão democracia se misturam dois fenômenos político diferentes: os que se
referem a um tipo de estrutura de poder (o poder de todos para todos) e um tipo
de forma de exercício do poder (uma forma de organização política que obedece
a certas exigências, como se há de ver logo a seguir). E esta ambigüidade que lhe
é característica, muito provavelmente origine ao menos grande parte das muitas
confusões que existiram e existem em relação à vida política dos povos.
Democracia, o termo se origina do grego, demo=povo e cracia=poder. Poder do
povo, pelo povo, para o povo, diz o brocardo popular. Importa muito que se saiba
que a democracia não é o poder da para a maioria, senão que a vontade da
maioria é seu melhor (ou menos pior) instrumento de escolha das autoridades e
da tomada das decisões políticas mais importantes. No que há de essencial, a
democracia é o tipo de estrutura de poder político na qual todas pessoas que
compõem aquela organização política desfrutam os mesmos direitos políticos e
participam de maneira igual (direta ou indiretamente) na administração do
poder e na distribuição da autoridade.
É possível empregar a palavra democracia figuradamente (ou, ao menos,
extensivamente) para designar o tipo de organização de poder em uma
coletividade restrita não hierarquizada, que sejam não uma sociedade (como
acontece em grupos, associações ou comunidades mais ou menos homogêneos),
em que todos os seus membros desfrutem status, papéis e funções idênticas ou
equivalentes, como um sindicato ou uma sociedade cujos proprietários
detenham quotas iguais, por exemplo.
Já nas organizações e coletividades hierarquizadas, cujos componentes não
sejam iguais, como em uma sociedade anônima, na qual a participação dos
associados se define pelo número de quotas que possuem no capital da empresa
que determina sua hierarquização na participação de cada um no poder
decisório e gestor, também é função do número de suas ações; de tal modo que,
se alguém tem a maioria das ações com direito a voto na assembléia geral de
acionistas, exerce autoridade completa sobre a administração da sociedade e
permanece assim até que perca o controle acionário.

Exigências da Democracia
A democracia, sabe-se, é um conceito muito ideologizado, prestando-se para
muita demagogia e para justificar muito aproveitamento indecente. Além de
encobrir muita ignorância política.Como a liberdade e a justiça, a democracia
muitas vezes pode ser invocada para encobrir os desígnios mais antidemocráticos, mais injustos, mais liberticidas. Por isto, é muito importante ter
um bom entendimento dela.
A democracia não é panacéia social, nem fetiche político ou instrumento para
todos os usos na vida social. (Ainda que seja empregado como se fosse pelos
demagogos de todos os tempos). Já foi visto, mas vale a pena repetir sempre, pois
isto é necessário, que o conceito estrito de democracia, quando aplicado à
administração do poder nos grupos sociais mais restritos ou diferentes do
Estado (sejam grupos naturais ou grupos por associação) presume
necessariamente o atendimento de duas pré-condições essenciais e necessárias.
Exigências prévias indispensáveis ao exercício da democracia:
-

primeira, a responsabilidade social, isto é, que se coloque o interesse
social mais amplo acima dos interesses individuais ou de segmentos mais
restritos daquela entidade social, ainda que estes últimos devam ter um
elenco de direitos asegurados; e,

-

segunda, que se trate de uma associação de iguais dentro daquele grupo
ou instituição, sobretudo em função de seus objetivos.
O primeiro objetivo só pode ser alcançado em grupos de grande
extensão, nos quais o grande número de eleitores compensem a
tendenciosidade parcial de grupos específicos e o egoísmo de
indivíduos.Nos grupos ou organizações específicas, como fábricas,
universidades ou hospitais, a igualdade não é atributo universal,
como a igualdade jurídico-política dos cidadãos é no âmbito do
Estado, mas uma decorrência da correlação de responsabilidades
e prerrogativas, de direitos e deveres; uma correlação das
atribuições e prerrogativas de cada conjunto de status e papel; ou
uma correlação de força política e de influência social.
No caso das associações ou grupos de iguais, por exemplo, todos
os associados ou componentes do grupo devem participar do
poder, como acontece em uma universidade cooperativa da qual
todos sejam cooperados.
Qualquer organização hierarquizada em função de seus propósitos
(como uma seleção de futebol ou uma empresa complexa) não
tem, nem pode ou deve ter todos os seus componentes iguais e,
por isto, tal organização não pode e não deve ser regida por regras
democratistas, sob pena de ter sacrificados seus objetivos
específicos e comprometido o prestígio da democracia, supondose que ela seja mais ou menos indispensável para a sociedade.
Porque a democracia presume a igualdade de todos (entendida
exclusivamente como igualdade jurídico-política, a igualdade social
e não igualdade individual, pessoal ou funcional) e aí, como é
bastante óbvio, este último tipo de igualdade não existe, nem deve
existir, necessariamente.
Uma das características mais evidentes do democratismo é a supervalorização
dos aspectos formais da democracia ante os essenciais. buscando estender
indevidamente as práticas democráticas formais para além de suas
possibilidades e limites, diminuindo seu crédito e sua validade específica na
política estatal e na participação governamental.
A igualdade democrática (que deveria ser sempre chamada igualdade política,
jurídica e civil, ao menos para evitar os tantos mal-entendidos que provoca) é
apanágio da cidadania democrática porque todos os direitos civís devem ser
iguais para todos. Não a qualificação profissional, as funções sociais ou as
prerrogativas administrativas como a autoridade. Nem a distribuição da
inteligência ou das enfermidades são democráticas, porque estas coisas, como
muitas outras, são distribuidas desigualmente na natureza e na sociedade.
A democracia, em sua significação plena, é um instrumento político do Estado e
para o Estado; também pode ser considerada como um princípio político acima
de todos os outros na administração dos interesses do povo, uma forma de
administração do poder político estatal, um tipo de estrutura de poder político
aplicável à sociedade como um conjunto e um valor essencial e perene para a
convivência política nos organismos estatais. Seria grave eqüívoco utilizar a
democracia como uma panacéia (remédio para todos os males) e empregá-la
como instrumento, ainda que o melhor, para intermediar relações interpessoais
ou de grupos sociais mais ou menos restritos e hierarquizados. Porque a
democracia é um precioso valor político e um instrumento político a serviço da
população para administrar o poder político estatal, ainda que seja desejável que
se aplique nas associações e outras coletividades homogêneas, quando isto for
possível e necessário.
Nas demais unidades sociais que não o Estado, a democracia deve ser um valor
de referência para indicar a utilidade coletiva do bem ou serviço produzido ou da
conduta praticada, como já foi mencionado anteriormente, devendo estar
modulada pela justiça e pela eqüidade; um objetivo a ser cumprido durante o
processo de evolução da sociedade no plano político.

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5.. formas do poder político

  • 1. 8. Formas do Poder Político Luiz Salvador de Miranda-Sá Jr, O poder político pode assumir muitas e variadas formas, na dependência de incontáveis fatores e de incontáveis variações e tipos de relações de poder. Como já houve ocasião de mencionar, os diferentes tipos de organização estrutural do poder político assinalam aquilo que há de essencial na organização de sua estrutura social: a quem serve prioritariamente o poder mais do quem o exerce. Tais estruturas de poder político podem ser dispostas de diversas maneiras, configurando diversas formas de estruturas políticas. As formas de poder se referem a quem exerce o poder político e como o faz, de certa maneira, se refere à forma que o poder político assume. As formas que assumem as estruturas do poder em sua realização concreta são: a ditadura, o totalitarismo, o anarquismo e a democracia. Como se vê, a democracia ocupa lugar entre as estruturas de poder e também é uma das formas que as estruturas de poder podem assumir. Esta duplicidade da democracia como conceito político é uma das coisas que dificultam seu entendimento pelos iniciantes no assunto. As estruturas de poder caracterizam o conteúdo essencial do poder político dos Estados. Em geral, as formas de poder assinalam a disposição e funcionamento do governo. Nos Estados ditatoriais se confundem o governo e o Estado, a forma e a estrutura do poder (forma e conteúdo). Mas, em situações excepcionais, é possível haver um governo ditatorial em um estrutura democrática de poder (como acontecia na Roma Antiga, exatamente onde surgiu o conceito de ditaura). Mais tarde este conceito foi repetido em outros lugares, como, por exemplo, no governo revolucionário francês ao tempo do Diretório; no gorverno de Francia no Paraguai logo após a independência e nos governos socialistas, recusando-se a figura do ditador (a ditadura do proletariado, como se denominava). Em todos estaes casos, a propaganda política identificava a imagem do ditador com o povo, e fixava publicitariamente certas imagens como pai da pátria, chefe da nação e outras asneiras semelhantes, mas que parecem bem razoáveis enquanto estão operando como artefatos ideológicos. Ditadura Ditadura (ou despotismo, absolutismo) é o tipo forma de estrutura de poder político no qual a autoridade governamental se caracteriza por diferentes combinações de algumas e, freqüentemente, da maioria das seguintes características:
  • 2. - concentração do poder nas mãos de um indivíduo, ditador ou junta ditatorial; - falta da obrigação de prestar contas de seus atos; - ausência de recursos legais e políticos que prevejam seu afastamento; - falta ou grande imprecisão nos limites de sua autoridade sobre as pessoas; - investidura da maior autoridade em desacordo com a legislação préexistente; - ausência de normas para sucessão ordenada; - uso da autoridade em benefício de um grupo mais ou menos restrito; - obediência inspirada pelo medo e no terror como instrumento político. No plano formal, sua característica principal é o caráter ilimitado, tendente ao absoluto, da intensidade do poder e a falta de obrigação de responder pelos seus erros; quando emprega a crueldade e o terror como instrumento de controle social, a ditadura é chamada tirania. Essencialmente, a ditadura é uma forma de governo sempre baseada na força e alheia à participação cidadã. A ditadura é uma forma de exercitar poder e, como tal, pode ser empregado em qualquer tipo de estrutura de poder seja autocrática, oligárquica ou democrática. Como a história mostra em muitos casos. A estrutura ditatorial de poder nem sempre teve a conotação condenável que ostenta hoje. Na República Romana, o ditador era um governante absoluto escolhido por tempo certo ou para realizar uma tarefa, geralmente em época de guerra ou de grave comoção social que exigisse comando único e disciplina unitária. O instituto estava previsto na lei. Ao fim do período determinado, o ditador reintegrava-se na vida civil, deixando o governo a quem tinha o direito de exercê-lo legitimamente. Compara-se ao estado de sítio da legislação atual.Em tempos mais recentes, os ditadores se encantam com o exercício do poder e inventam mil e uma artimanhas para se perpetuarem nele e, quase sempre, têm que ser apeados a força. Atualmente, ao contrário do que já aconteceu na história de outros países (como a Roma antiga republicana e o Paraguai logo depois da independência), o poder ditatorial é, por definição, um poder autoritário que justifica a si mesmo pela força e cria as leis de que necessita para continuar a existir, confundindo os interesses de quem está no poder (indivíduo ou grupo) com os interesses estatais. O autoritarismo ditatorial pode ser totalitário ou não. Quando se avaliam as relações entre os conceitos de ditadura absolutista (inclusive a tirania) e totalitarismo, pode-se concluir que todo totalitarismo é ditatorial, embora nem
  • 3. toda ditadura seja totalitária, pois pode restringir sua intromissão nos direitos individuais ao que for essencial para a menutenção do poder.. Totalitalitarismo Totalitarismo, ou poder totalitário. A rigor, é um tipo de exercício do poder no qual a autoridade se expande para todos os aspectos da vida social e, determina as mais importantes opções de seus membros, não deixando margem significativa de liberdade aos indivíduos, grupos ou associações. O poder totalitário se impõe a todas as manifestações importantes da possibilidade de uma pessoa ser liver. Contudo, modernamente, o termo totalitário pode ser empregado para apontar estruturas de poder que invadam indevidamente a liberdade individual e afrontem suas garantias fundamentais (os Direitos Humanos). Enquanto o autoritarismo é considerado como um abuso da intensidade do poder, o totalitarismo é um abuso de sua amplitude em relação aos direitos individuais. O poder é tão mais totalitário quanto menos espaço deixa aos indivíduos para decidir sobre seus assuntos pessoais. De certa maneira, o totalitarismo tende para o aniquilamento dos direitos individuais Ao menos, dos cidadãos comuns). O totalitarismo é uma forma de poder característica das autocracias e das oligarquias, sendo completamente incompatível com um Estado ou com um governo democráticos. Não pode haver governo totalitário senão em um Estado totalitário e todo Estado totalitário necessita ter governo totalitário. Em um plano mais abrangente, o totalitarismo se caracteriza pela intervenção do Estado burocrático-autoritário em todas as manifestações individuais e sociais, tornado em única fonte da verdade e da mentira, do certo e do errado, do justo e do injusto, do bem e do mal. Quanto mais totalitário for o Estado, tanto menos espaço haverá para a consciência do cidadão optar e para a livre organização de grupos, associações, instituições e comunidades. Como em muitas outras deformações do poder em outros fenômenos político-sociais, o totalitarismo não pode ser entendido como inteiramente presente ou completamente ausente em qualquer estrutura de poder. Quando se considera o caráter totalitário de um governo ou direção de organismo social, sabe-se que existem formas mais ou menos agudas ou mitigadas e tipos mais ou menos restritos a alguns aspectos da vida individual, como o religioso ou o político, por exemplo. Muitos imaginam o totalitarismo incompatível com a democracia formal. Isto é falso. Ao contrário desta opinião, os Estados totalitários (e, por extensão, outras instituições totalitária), eventualmente, podem ser democráticos. A este propósito, diz Bobbio: “Todas as grandes ideologias do século XIX, a democrática, a nacionalista e a católica (nos seus aspectos reacionário ou social) ou a socialista, na medida em que se afastaram explicitamente do Liberalismo, buscaram a edificação de uma outra forma de Estado que, conforme a matriz ideológica, poderia ser um estado autoritário ou uma democracia populista e totalitária”. No entanto, a tendência atual é sustentar a incompatibilidade entre o totalitarismo e a democracia como valor político essencial.
  • 4. A União Soviética e os demais Estados comunistas foram uma forma de tentar criar uma democraacia econômica, mesmo a custo de operá-lo com um Estado ditatorial e totalitário. Deu no que deu. É possível haver totalitarismo disfarçado ou explícito em uma estrutura democrática de poder, quando se privam as pessoas de escolher com liberdade as opiniões a esposar e as crenças a cultivar. Procedimentos muito totalitários podem decorrer de procedimentos formais democráticos, como eleições. Emdeterminadas condições, é possível um governo ditatorial no regime democrático. Certas situações sociais excepcionais chamadas estado de sítio, estado de guerra e estado de emergência exemplificam esta afirmativa. O estado de calamidade pública permite ao governo atuar ditatorialmente no âmbito administrativo, tanto autoritária, quanto totalitariamente. Quando se avalia de outro ângulo, verifica-se que o totalitarismo não se refere apenas à opressão da maioria pela minoria que se aproveita do poder, como tem acontecido na maior parte das vezes em que o problema chama a atenção. Nos casos em que a vontade política e os interesses da maioria se impõem totalitariamente à minoria, pode-se falar em totalitarismo com forma democrática, o totalitarismo da maioria que é, no fim das contas, antidemocrático. E este regime não tem sido raro na história política da humanidade e não é menos danoso por causa de seu envoltório formal. O Estado não é a única instituição que pode se tornar ou ser feita totalitária, ao comtrário do que muita gente parece pensar. Qualquer instituição pode degenerar no totalitarismo, desde que invada os terrenos da vida individual que devam ser decididos pela própria pessoa (ou afrontem os direitos humanos. Para GOFFMANN, os asilos, os conventos e as prisões são típicas instituições totais, assim chamadas porque se caracterizam principalmente pelo seu totalitarismo. Instituições nas quais a individualidade se anula completamente ou quase completamente ante a subcultura institucional que não deixa aos indivíduos muita margem para optar e decidir sobre as coisas de sua vida, mesmo as mais privadas. Tanto mais totalitária é a instituição e tanto menor é a margem de liberdade que deixa à consciência dos indivíduos. O poder totalitário esmaga os indivíduos em nome da coletividade, do futuro, de uma divindade ou outro motivo proposto como elevado ou altruista. Mas, só em nome (ainda que possa ser muito convincente). A família patriarcal é outra instituição totalitária exemplar, se bem que apenas raramente se impusesse a todos os aspectos da vida de seus membros, ainda que suas exigências supra-individuais originadas na família fossem mais prementes e extensas nas mulheres e nas crianças que nos homens adultos, sobretudo se mais bem situados na pirâmide econômica da sociedade. As religiões tendem a ser instituições totalitárias, se bem que, em geral, restritas a alguns aspectos particulares da vida pessoal, as crenças nos dogmas e a obediência à hierarquia sacerdotal. As religiões tendem a ser menos totalitárias que as seitas, ainda que as religiões monoteístas se mostrem mais totalitárias que as politeístas. No entanto, algumas seitas são mais totalitárias que outras (alcançando comportamentos mais numerosos e aspectos mais vastos da vida de
  • 5. seus crentes) e isto se manifesta na amplitude dos comportamentos homogeneizados. Em geral, quanto mais totalitária a religião (ainda que disfarçada de escola filosófica ou partido político), mais intolerante é a conduta social de seus membros, o que tende a acentuar o dogmatismo e o totalitarismo. Dado curioso da história, é que organizações religiosas extremamente autoritárias em seu interior e quando tiveram oportunidade, em seu exterior, se transformam em muito libertárias quando despidas do poder político. Não é raro, muito ao contrário, que partidos políticos se transformem em instituições totalitárias, quando assumem caráter religioso e mobilizador de obsessividade. Coisa em que muita gente parece não pensar é que o mercado pode ser uma instituição totalitária, na medida em que se impõe à margem de qualquer controle e influi em decisões que devem ser restritas às pessoas. Totalitarismo em Instituições Sanitárias Enquanto que as instituições sanitárias comunitárias, como os centros de saúde, tendem a funcionarem de maneira democrática, os hospitais, de uma maneira geral, tendem a funcionar como instituições totalitárias ou, no mínimo, com doses superlativas de autoritarismo e totalitarismo, na medida em que estão organizadas para prover todas as necessidades de todas as pessoas que estão nele, interiramente à margem de sua vontade (ou, até, inteiramente contra ela). Desde a roupa, a alimentação, os horários, os regulamentos, a disciplina, o remédios, exames e tudo o mais, são organizados sem a participação do pacientes. Nos casos em que a internação é breve, isto não chega a incomodar ou danificar a personalidade do paciente, até porque, em sua regressão, se satisfaz com isto. Quando a situação de dependência se prolonga, tudo é bem pior e, aquilo que foi benéfico no início, passa a gerar malefícios. Como quase todos os demais instrumentos terapêuticos, a internação deve ser encarada como um mal menor, um mal necessário, devendo-se cuidar que seja o menos iatrogênica possível. Por outro lado, a situação particular dos enfermos, o estado de necessidade premente em que sobrevive a meior parte da população brasileira; as limitações da realidade institucional dos hospitais e lida com a vida e a morte, ocasionam e justificam o exagero em intensidade (autoritarismo) e em extensão (totalitarismo) da autoridade dos médicos e dirigentes hospitalares. Entretanto, deve-se afirmar que o fato de ser guardão da vida deve justificar este poder, mas nunca seu abuso ou exagêro. De todas as organizações sanitárias, o manicômio é a mais totalitária. O hospício ou asilo, depois, chamado manicômio, (do grego mani -de maníaco, louco e comeion=tratar, literalmente = hospital de doidos) há até bem pouco tempo, era uma instituição total e fechada. No início deste século, este termo substitui asilo para designar organizações de internação de enfermos psiquiátricos. Depois, passou a designar os estabelecimentos para doentes mentais criminosos. Atualmente, por influência anarquista, antimédica, por questões de disputa de mercado ou por pura e
  • 6. simples ignorância, tem-se denominado manicômios a serviços hospitalares destinados a pacientes psiquiátricos, qualquer que for sua dinâmica ou estrutura de poder, não importando se são autoritários e totalitários ou não. Por isto, há que se considerar a importância de ponderar a necessidade imposta pela conduta patológica e as necessidades advindas dos aspectos sadios da personalidade do paciente, sempre que se lhe fizer um programa terapêutico, principalmente se incluir a internação compulsória. A internação médica compulsória, psiquiátrica ou quarentena, ainda que signifique uma restrição à liberdade do doente pode ser um mal menor, quando corretamente indicada. e adequadamente praticada. Mas, também se deve atentar cuidadosamente para a identidade forma e substância que se nota nas manifestações do totalitarismo (no Estado ou em qualquer outra instituição) quando se tratar de planejar ou fazer funcionar um sistema de abrigo e proteção aos dependentes psico-sociais em geral e não apenas aos doentes mentais crônicos e aos deficientes dependentes. Autoritarismo e Anarquismo Deve-se ressaltar que os conceitos de autoridade e de autoritarismo, liberdade e anarquismo são muito fortemente ideologizados em função das paixões que mobilizam e interesses que suscitam. Sabe-se que não pode existir qualquer sistema social sem autoridade e que não deve existir um sem liberdade; que liberdade e autoridade são características que não se auto-excluem mutuamente, mas que devem ser ponderadas em cada sistema social, em cada tipo de organização política. Por outro lado, também se sabe que tanto a liberdade quanto a autoridade (e o poder que a inspira) podem ser distorcidos em práticas sociais pervertidas. O seu exagero ocasiona duas opiniões políticas rigorosamente opostas, ambas disseminadas na sociedade, o arbítrio que envolve o autoritarismo e o totalitaraismo e, no outro extremo, seu oposto o anarquismo. A democracia pressupõe o exercício do poder nos limites da lei e submetidos aos devidos mecanismos sociais de fiscalização. O poder arbitrário é a perversão do poder individual ou social que degenera em um excesso de autoridade e do poder e, consequentemente, em um prejuízo da liberdade individual. É uma das características do poder ditatorial que consiste na falta de limites para o poder dos dirigentes, da ilegitimidade sua investidura, da falta de controle político sobre eles e da impossibilidade política ou legal de removê-los de sua posição de autoridade. Tanto da instituição estatal, como em quaisquer outras instituições, o poder arbitrário consiste, como se viu, na ilegitimidade do poder, na indevida extensão de seu alcance diante dos direitos individuais, no abuso ou a degradação da autoridade em tirania ou, ainda, o exercício do poder e da força sem a necessária legalidade democrática em sua origem ou em seu exercício.
  • 7. Na linguagem comum dos meios de comunicação de massa, se mantém este significado e, por autoritarismo se menciona, a posição política que prega um regime de concentração excessiva de poder nas mãos de alguém, a extensão indevida ou de supremacia absoluta da autoridade e o poder sem responsabilidade. Ao contrário do poder arbitrário, o anarquismo é a perversão do poder que se degrada no exagero da liberdade individual em detrimento dos interesses sociais e do poder político. É, de certa maneira, conseqüência da visão individualista da sociedade. Anarquismo é a tendência política que renega todo poder e toda e qualquer autoridade, acusados de autoritários só por existir. Como em muitas outras condições sociológicas e psicológicas, nas quais nada é mais parecido com alguma coisa como o seu exato contrário, o anarquismo e o autoritarismo se identificam como práticas anti-sociais e frequentemente se superpõem como práticas políticas. O anarquismo como utopia é a crença em uma sociedade perfeita, de pessoas que conhecem exatamente os limites de suas necessidades e possibilidades e os limites alheios; a ponto da autoridade ser desnecessária e o poder, obsoleto. Como já se viu atrás, tanto o exercício arbitrário do poder quanto o anarquismo são negações da autoridade (expressão legal e legítima do poder). Democracia: Forma e Conteúdo do Poder Político O estudo da democracia como objeto da ciência política se justifica principalmente porque se lastreia em um conceito extremamente ideologizado. De fato, muitos interesses políticos têm tentado se confundir com a democracia e alguns conseguem. E quando isto acontece, tiram imenso proveito; por isto, investem muito tentando revogar seu significado para impor um novo que venha em socorro de seus interesses políticos. Não há político que não se apregoe democrático, o mais democrático, o mais e completamente democrático. (Que tem mais uma vantagem, as pessoas incultas têm autêntica fascinação por proparoxítonos). Consoante o que se viu anteriormente, no significado da expressão democracia se misturam dois fenômenos político diferentes: os que se referem a um tipo de estrutura de poder (o poder de todos para todos) e um tipo de forma de exercício do poder (uma forma de organização política que obedece a certas exigências, como se há de ver logo a seguir). E esta ambigüidade que lhe é característica, muito provavelmente origine ao menos grande parte das muitas confusões que existiram e existem em relação à vida política dos povos. Democracia, o termo se origina do grego, demo=povo e cracia=poder. Poder do povo, pelo povo, para o povo, diz o brocardo popular. Importa muito que se saiba que a democracia não é o poder da para a maioria, senão que a vontade da maioria é seu melhor (ou menos pior) instrumento de escolha das autoridades e da tomada das decisões políticas mais importantes. No que há de essencial, a democracia é o tipo de estrutura de poder político na qual todas pessoas que compõem aquela organização política desfrutam os mesmos direitos políticos e participam de maneira igual (direta ou indiretamente) na administração do poder e na distribuição da autoridade.
  • 8. É possível empregar a palavra democracia figuradamente (ou, ao menos, extensivamente) para designar o tipo de organização de poder em uma coletividade restrita não hierarquizada, que sejam não uma sociedade (como acontece em grupos, associações ou comunidades mais ou menos homogêneos), em que todos os seus membros desfrutem status, papéis e funções idênticas ou equivalentes, como um sindicato ou uma sociedade cujos proprietários detenham quotas iguais, por exemplo. Já nas organizações e coletividades hierarquizadas, cujos componentes não sejam iguais, como em uma sociedade anônima, na qual a participação dos associados se define pelo número de quotas que possuem no capital da empresa que determina sua hierarquização na participação de cada um no poder decisório e gestor, também é função do número de suas ações; de tal modo que, se alguém tem a maioria das ações com direito a voto na assembléia geral de acionistas, exerce autoridade completa sobre a administração da sociedade e permanece assim até que perca o controle acionário. Exigências da Democracia A democracia, sabe-se, é um conceito muito ideologizado, prestando-se para muita demagogia e para justificar muito aproveitamento indecente. Além de encobrir muita ignorância política.Como a liberdade e a justiça, a democracia muitas vezes pode ser invocada para encobrir os desígnios mais antidemocráticos, mais injustos, mais liberticidas. Por isto, é muito importante ter um bom entendimento dela. A democracia não é panacéia social, nem fetiche político ou instrumento para todos os usos na vida social. (Ainda que seja empregado como se fosse pelos demagogos de todos os tempos). Já foi visto, mas vale a pena repetir sempre, pois isto é necessário, que o conceito estrito de democracia, quando aplicado à administração do poder nos grupos sociais mais restritos ou diferentes do Estado (sejam grupos naturais ou grupos por associação) presume necessariamente o atendimento de duas pré-condições essenciais e necessárias. Exigências prévias indispensáveis ao exercício da democracia: - primeira, a responsabilidade social, isto é, que se coloque o interesse social mais amplo acima dos interesses individuais ou de segmentos mais restritos daquela entidade social, ainda que estes últimos devam ter um elenco de direitos asegurados; e, - segunda, que se trate de uma associação de iguais dentro daquele grupo ou instituição, sobretudo em função de seus objetivos. O primeiro objetivo só pode ser alcançado em grupos de grande extensão, nos quais o grande número de eleitores compensem a tendenciosidade parcial de grupos específicos e o egoísmo de indivíduos.Nos grupos ou organizações específicas, como fábricas, universidades ou hospitais, a igualdade não é atributo universal, como a igualdade jurídico-política dos cidadãos é no âmbito do Estado, mas uma decorrência da correlação de responsabilidades e prerrogativas, de direitos e deveres; uma correlação das
  • 9. atribuições e prerrogativas de cada conjunto de status e papel; ou uma correlação de força política e de influência social. No caso das associações ou grupos de iguais, por exemplo, todos os associados ou componentes do grupo devem participar do poder, como acontece em uma universidade cooperativa da qual todos sejam cooperados. Qualquer organização hierarquizada em função de seus propósitos (como uma seleção de futebol ou uma empresa complexa) não tem, nem pode ou deve ter todos os seus componentes iguais e, por isto, tal organização não pode e não deve ser regida por regras democratistas, sob pena de ter sacrificados seus objetivos específicos e comprometido o prestígio da democracia, supondose que ela seja mais ou menos indispensável para a sociedade. Porque a democracia presume a igualdade de todos (entendida exclusivamente como igualdade jurídico-política, a igualdade social e não igualdade individual, pessoal ou funcional) e aí, como é bastante óbvio, este último tipo de igualdade não existe, nem deve existir, necessariamente. Uma das características mais evidentes do democratismo é a supervalorização dos aspectos formais da democracia ante os essenciais. buscando estender indevidamente as práticas democráticas formais para além de suas possibilidades e limites, diminuindo seu crédito e sua validade específica na política estatal e na participação governamental. A igualdade democrática (que deveria ser sempre chamada igualdade política, jurídica e civil, ao menos para evitar os tantos mal-entendidos que provoca) é apanágio da cidadania democrática porque todos os direitos civís devem ser iguais para todos. Não a qualificação profissional, as funções sociais ou as prerrogativas administrativas como a autoridade. Nem a distribuição da inteligência ou das enfermidades são democráticas, porque estas coisas, como muitas outras, são distribuidas desigualmente na natureza e na sociedade. A democracia, em sua significação plena, é um instrumento político do Estado e para o Estado; também pode ser considerada como um princípio político acima de todos os outros na administração dos interesses do povo, uma forma de administração do poder político estatal, um tipo de estrutura de poder político aplicável à sociedade como um conjunto e um valor essencial e perene para a convivência política nos organismos estatais. Seria grave eqüívoco utilizar a democracia como uma panacéia (remédio para todos os males) e empregá-la como instrumento, ainda que o melhor, para intermediar relações interpessoais ou de grupos sociais mais ou menos restritos e hierarquizados. Porque a democracia é um precioso valor político e um instrumento político a serviço da população para administrar o poder político estatal, ainda que seja desejável que se aplique nas associações e outras coletividades homogêneas, quando isto for possível e necessário. Nas demais unidades sociais que não o Estado, a democracia deve ser um valor de referência para indicar a utilidade coletiva do bem ou serviço produzido ou da conduta praticada, como já foi mencionado anteriormente, devendo estar
  • 10. modulada pela justiça e pela eqüidade; um objetivo a ser cumprido durante o processo de evolução da sociedade no plano político.