O Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) manteve a condenação dos empresários e do ex-prefeito de Serra Alta Claudinei Senhor, que impediram o caráter competitivo da licitação que visava à contratação de transporte escolar do município. Eles foram condenados em primeiro grau por prática de ato de improbidade administrativa, a partir de uma ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público de Santa Catarina (MPSC).
Protocolo Pisc Protocolo de Rede Intersetorial de Atenção à Pessoa Idosa em S...
Improbidade administrativa recurso especial em apelação cível 20090014776000100
1. Apelação Cível n. 2009.001477-6, de Modelo
Relator: Des. Cid Goulart
APELAÇÕES CÍVEIS – AÇÃO CIVIL PÚBLICA –
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – RECURSO DO
MUNICÍPIO DE SERRA ALTA NÃO CONHECIDO, ANTE
SUA AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL –
RESULTADO DE CERTAME PREORDENADO ENTRE O
ENTÃO PREFEITO E EMPRESÁRIOS DO RAMO DE
TRANSPORTE ESCOLAR – VIOLAÇÃO AO CARÁTER
COMPETITIVO DO PROCEDIMENTO LICITATÓRIO
PATENTE – DOLO SUFICIENTEMENTE DEMONSTRADO –
ELEMENTOS COLHIDOS NO INQUÉRITO CIVIL QUE
RESTARAM CONFIRMADOS NA INSTRUÇÃO DA ACTIO –
APELO DE CLAUDINEI SENHOR PARCIALMENTE
PROVIDO, TÃO SOMENTE PARA O FIM DE REDUZIR A
MULTA CIVIL QUE LHE FOI APLICADA – RECURSOS DOS
DEMAIS RÉUS DESPROVIDOS.
"'O interesse de agir - que consiste 'não apenas na
utilidade, mas especificamente na necessidade do processo
como remédio apto à aplicação do direito objetivo no caso
concreto' (Humberto Theodoro Júnior) - é condição da ação
(CPC, art. 267, VI). Também o é 'para excepcionar, reconvir
ou recorrer' (Theotônio Negrão)" (EDclEDclAC n.
2004.013596-3/0001.01, Des. Newton Trisotto). Assim, 'só a
decisão que causa gravame desafia recurso, faltando, àquele
que em decorrência dela não tenha prejuízo, interesse em
atacá-la' (AI n. 7.138, Des. Cid Pedroso).” (Apelação Cível n.
2011.019017-6, rel. Des. Newton Trisotto, j. 5-3-2013).
"Para que se concretize a ofensa ao art. 11 da Lei de
Improbidade, revela-se dispensável a comprovação de
enriquecimento ilícito do administrador público ou a
caracterização de prejuízo ao Erário" (REsp 951.389⁄SC, Rel.
Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado
em 9-6-2010, DJe 4-5-2011), ademais, a "fraude à licitação
tem como consequência o chamado dano in re ipsa (REsp
1.280.321/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques,
Segunda Turma DJe 9.3.2012; REsp 1.190.189, Relator Min.
Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 10.9.2010;
STF, RE 160.381/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, Segunda
Turma, DJ 12.8.1994)" (AgRg nos EDcl no AREsp
2. 178.852/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA
TURMA, julgado em 14-5-2013, DJe 22-5-2013).
"O posicionamento firmado pela Primeira Seção é que se
exige dolo, ainda que genérico, nas imputações fundadas
nos arts. 9º e 11 da Lei 8.429/1992 (enriquecimento ilícito e
violação a princípio), e ao menos culpa, nas hipóteses do art.
10 da mesma norma (lesão ao erário)." (EDcl no AREsp
57.435/RN, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA
TURMA, julgado em 1-10-2013, DJe 9-10-2013).
“As medidas punitivas previstas na Lei 8.429/92 não se
restringem ao ressarcimento das quantias indevidamente
apropriadas. São também de natureza política, político-
administrativa e administrativa." (Apelação Cível n.
2012.039152-0, de Turvo, rel. Des. Nelson Schaefer Martins,
j. 25-6-2013).
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n.
2009.001477-6, da comarca de Modelo (Vara Única), em que são apelantes
Claudinei Senhor e outros, e apelado Representante do Ministério Público:
A Segunda Câmara de Direito Público decidiu, por votação unânime,
não conhecer do recurso interposto pelo Município de Serra Alta, dar parcial
provimento ao apelo de Claudinei Senhor e desprover os recursos dos demais
réus. Custas legais.
O julgamento, realizado no dia 19 de novembro de 2013, foi
presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Nelson Schaefer Martins,
com voto, e dele participou o Excelentíssimo Senhor Desembargador João
Henrique Blasi.
Florianópolis, 17 de dezembro de 2013.
Cid Goulart
RELATOR
Gabinete Des. Cid Goulart
3. RELATÓRIO
Trata-se de Ação Civil Pública por Ato de Improbidade
Administrativa promovida pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina em
face de CLAUDINEI SENHOR, Prefeito do Município de Serra Alta/SC, LAURO
MÜLLER, MAURO MARCA, GENOIR BAMPI e ACIR GAMBA, aduzindo, em
suma, que "Em 19 de janeiro de 2005, após ser publicado Aviso de Licitação da
Tomada de Preços n. 1/2005, referente à contratação de transporte escolar de
alunos do município de Serra Alta, na modalidade de menor preço por item,
Lauto Muller, Mauro Marca, Genoir Bampi e Acir Gamba, respectivamente
proprietários ou sócios das empresas Lauro Muller & Cia Ltda-ME, Mauro Marca
& Cia Ltda-ME, Inelsa Bampi & Cia Ltda-ME e Acir Gamba & Cia Ltda-ME,
reuniram-se no gabinete do Prefeito do Município de Serra Alta, Claudinei
Senhor, ocasião na qual, pretendendo fraudar o caráter competitivo de
mencionado procedimento licitatório, com o manifesto intuito de obterem para si
vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação, ajustaram apresentar
preço único para cada quilômetro rodado, no valor de R$ 1,85 (um real e oitenta
e cinco centavos), comprometendo-se os quatro primeiros, ainda, a oferecer
cotação apenas nas linhas que tivessem interesse em prestar o serviço licitado"
(fl. 07).
Após regular trâmite, sobreveio a sentença de fls. 544-559, cujo
dispositivo restou assim redigido:
Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido contido na presente
Ação Civil Pública para, com fundamento no art. 37, §4º, da Constituição
Federal, no art. 11, caput, e no art. 12, III, ambos da Lei n. 8.429/92:
a) condenar CLAUDINEI SENHOR ao pagamento de multa civil
corresponde a duas vezes o valor da remuneração percebida mensalmente, a
ser revertida em benefício do Município de Serra Alta;
b) proibir os Réus LAURO MÜLLER, MAURO MARCA, GENOIR BAMPI e
ACIR GAMBA de contratar com o poder público ou receber benefícios ou
incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por
intermédio de pessoa jurídica da qual sejam sócios majoritários, pelo prazo de
três anos.
Custas pelos Réus (pro rata).
Gabinete Des. Cid Goulart
4. Não há condenação na verba honorária.
Publique-se. Registre-se. Intime-se. (fls. 558/559)
Posteriormente, tal decisum foi complementado em sede de
embargos de declaração para o fim de sanar omissão relativa ao afastamento da
prefacial de ilegitimidade ativa do Ministério Público (fls. 600-604).
Claudinei Senhor interpôs recurso de apelação cível asseverando,
em suma, que não há prova do aventado colóquio com objetivo de frustrar
certame; não houve perda patrimonial para o Município de Serra Alta; que sua
conduta, além de acobertada pela boa-fé, teve como propósito defender o
interesse do Município, tendo se negado a majorar preço ou aumentar trajeto (fls.
568-599).
Acir Gamba, Genoir Bampi e Mauro Marca apresentar recurso
conjunto alegando, em síntese, a ausência de dolo específico e a ausência de
dano ao erário, postulando, ainda, o prequestionamento do art. 37, § 4º, da CF, o
art. 90 da Lei n. 8.666/93 e os artigos 10, VIII, 11 e 12, III, da Lei n. 8.429/92 (fls.
607-617).
O Município de Serra Alta, finalmente, apelou defendendo que
inexistem as irregularidades apontadas e que não sofreu qualquer prejuízo, razão
pela qual deveria ser 'absolvido' (fls. 632-647).
Em suas contrarrazões, o Ministério Público suscita preliminarmente
a ilegitimidade do Município apelante, pois não detém interesse processual para
tanto, eis que sequer foi demandado. Quanto ao mérito, rebateu os argumentos
do recorrentes e postulou a manutenção da sentença em sua integralidade (fls.
650-659).
A douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do
Excelentíssimo Senhor Procurador de Justiça Doutor João Fernando Quagliarelli
Borrelli, opinou pelo não conhecimento do apelo do Município de Serra Alta e
pelo conhecimento e desprovimento dos demais recursos (fls. 666-670).
È a síntese do essencial.
Gabinete Des. Cid Goulart
5. VOTO
Inicialmente cumpre reconhecer que o Município de Serra
efetivamente não detém legitimidade para recorrer pois, além de não integrar a
lide, seu pleito de absolvição é absolutamente desprovido de qualquer interesse
processual, eis que a sentença recorrida além de não lhe ter condenado, por
óbvio, não determinou qualquer medida ou sanção que lhe atingisse, direta ou
indiretamente.
Sobre o tema, mutatis mutandi já se decidiu:
"CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR
ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AÇÃO CAUTELAR
PREPARATÓRIA DE BUSCA E APREENSÃO DE EQUIPAMENTOS DE
INFORMÁTICA PARA PERÍCIA, DE USO DO PREFEITO E DE SERVIDORES
DO MUNICÍPIO. PRETENSÃO JULGADA PROCEDENTE. RECURSO
INTERPOSTO PELO MUNICÍPIO NÃO CONHECIDO ANTE A AUSÊNCIA DE
INTERESSE RECURSAL.
"O interesse de agir - que consiste 'não apenas na utilidade, mas
especificamente na necessidade do processo como remédio apto à aplicação do
direito objetivo no caso concreto' (Humberto Theodoro Júnior) - é condição da
ação (CPC, art. 267, VI). Também o é 'para excepcionar, reconvir ou recorrer'
(Theotônio Negrão)" (EDclEDclAC n. 2004.013596-3/0001.01, Des. Newton
Trisotto). Assim, "só a decisão que causa gravame desafia recurso, faltando,
àquele que em decorrência dela não tenha prejuízo, interesse em atacá-la" (AI
n. 7.138, Des. Cid Pedroso).
“Proposta ação civil pública para assegurar a reparação de danos
eventualmente causados ao Município, carece este de interesse em recorrer da
sentença que determinou a busca e apreensão de equipamentos de informática
que poderiam conter provas dos atos de improbidade administrativa atribuídos a
seus agentes.” (Apelação Cível n. 2011.019017-6, de Mafra, rel. Des. Newton
Trisotto, j. 05-03-2013).
Não se conhece, portanto, do recurso de fls. 632-647.
Quanto aos demais, vejamos os fundamentos centrais do decisum
recorrido:
"Aos Réus está sendo atribuída a prática de ato de improbidade
administrativa, consistente na frustração de procedimento licitatório deflagrado
para contratação do transporte escolar (Tomada de Preços n. 1/2005).
De acordo com o art. 11, da Lei n. 8.429/92:
Gabinete Des. Cid Goulart
6. "Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os
princípios da Administração Pública qualquer ação ou omissão que viole os
deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições..."
[...]
Na situação em apreço, o ato de improbidade praticado pelos Requeridos
consistiu em frustar o caráter competitivo inerente ao processo licitário,
porquanto efetuaram, no gabinete do Sr. Prefeito Municipal, acordo prévio
quanto ao valor das propostas, bem como distribuíram as linhas que tocariam a
cada um.
Com efeito, das declarações prestadas em juízo pelo Réu Lauro Müller
colhe-se:
"que quando foi convidado para participar da reunião não sabia que o
assunto seria 'a finalização de preços'; que foi o próprio [Prefeito] quem disse
quais linhas caberiam a cada um dos réus
; que inclusive o prefeito ligou para a AMOSC para informar-se sobre os
preços do quilômetro rodado; que fazia 8 anos que trabalhava no transporte
escolar para o município; que à época da reunião o preço do quilômetro rodado
era R$ 1,58; que os réus pretendiam a majoração do valor para dois reais ou
mais, tendo o prefeito decido que seria pago no máximo R$ 1,85, caso contrário
'passaria' do orçamento; (...)que tão logo o interrogando e os demais
transportadores saíram da reunião se encaminharam para o escritório do Sr.
Olinto para confecção da documentação do certame; que o interrogando, Lauro,
Genoir e Acir pediram ao contador que fizesse constar das propostas o valor de
R$ 1,85 por quilômetro rodado , que também o pais do réu Mauro os
acompanhou ao escritório do contador; que na reunião o prefeito disse que cada
um dos transportadores continuaria com as linhas que já estavam atendendo "
(fl. 454, grifei).
É bem verdade que os demais Réus apresentaram versão distinta, pois
embora não neguem a realização da reunião no gabinete do alcaide, negam
tenha o colóquio se prestado aos "acertos finais" acerca das propostas e da
distribuição das linhas de transporte.
Todavia, existe entendimento consolidado – ainda que o seja em matéria
criminal – que se enluva à hipótese presente, qual seja a de que a delação, por
ter vindo acompanhada de confissão, torna-se forte elemento de prova, pois,
conforme a ensinança de ADALBERTO JOSÉ Q. T. DE CAMARGO ARANHA,"o
elemento essencial da delação, sob o prisma de valor como prova, é a confissão
do delator, pois com a escusa de modo algum pode atingir o terceiro apontado"
(Da Prova no Processo Penal, 4ª ed., Saraiva, São Paulo: 1996, p. 110).
Oportuna, também, a ensinança do Magistrado catarinense Jorge
Henrique Schaefer Martins:
acusação de concurso , ou nomeação de sócio , ou chamamento de co-
réu , constitui elemento suspeito nos processos. Uma vez que está de acordo
com esclarecimentos provindos de outras fontes, e não se mostra que seja
determinado por ódio, ou feita com finalidade defensiva, não há razão para seu
abandono. É, sem dúvida, exagerada a doutrina que, vendo no chamamento do
co-réu menos o verdadeiro que o falso, por isso que na boca dos réus mais
freqüentemente se encontra a mentira que a verdade, considera-o
Gabinete Des. Cid Goulart
7. simplesmente um vago indício de responsabilidade. Segundo os melhores
ensinamentos, o valor do chamamento do co-réu resulta do concurso destes
três extremos: a) verdade da confissão; b) inexistência de ódio, em qualquer das
manifestações; c) inexistência de objetivo de atenuar, ou mesmo eliminar, a
própria responsabilidade. (Arquivo Judiciário, vol. 43, 1937, p. 481)" (Prova
Criminal, Juruá, Curitiba: 1996, p. 80).
Com dito, o Réu Lauro não só confirma que houve acerto quanto às
propostas, orquestrado pelo Réu Prefeito, como também confessa que os
proponentes foram juntos ao escritório do contador que confeccionou as
propostas.
A testemunha Olinto Cerizolli, contador que elaborou as planilhas,
confirma que os Réus transportadores estiveram todos juntos em seu escritório
e que ao receberem as planilhas para cotação dos valores solicitaram que o
profissional preenchesse o documento, "com o que, num primeiro momento, não
concordou" (fl. 28). Alega o Sr. Contador que se atendesse o requerimento dos
Réus poderia "dar margens a reclamações posteriores, no sentido de que um
dos proponentes soubera de antemão da proposta dos outros" (fl. 28) e que só
concordou em preencher as planilhas, "diante da insistência dos empresários,
que esclarecerem que cada um deles apresentaria cotação apenas para a linha
que tinha interesse em prestar o transporte escolar" (fl. 28).
Tal declaração robora a do Réu Lauro Müller, no sentido de que estavam
os licitantes previamente ajustados acerca das linhas que caberiam a cada um.
De fato, e quando o contador percebeu que não haveria "colidência de
interesses", anuiu com o preenchimento das planilhas...
[...]
Na hipótese, todos os Réus tinham plena ciência da ilegalidade da
conduta (frustração da competitividade do procedimento) e agiram com a clara
intenção de produzir o resultado (os Réus transportadores visavam se beneficiar
com a vitória no certame, ao passo que o Réu Prefeito, com sua conduta –
distribuição das linhas de molde a evitar disputa – contribuiu para garantir
interesse de terceiros).
[...]
Destarte, não há como deixar de atribuir a pecha de improbidade à
conduta dos Requeridos.
2.3. Dito isso, resta analisar a sanção a ser aplicada.
E as sanções vêm expressas no art. 37, § 4º, da Carta Magna, que reza:
"Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos
direitos públicos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o
ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da
ação penal cabível".
Tal norma foi regulamentada pelo art. 12 da LIA, que estabelece:
"Independentemente das sanções penais, civis e administrativas, previstas
na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às
seguintes cominações:
(...).
III – na hipótese do art. 11, ressarcimento integral do dano, se houver,
perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos,
Gabinete Des. Cid Goulart
8. pagamento de multa civil até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo
agente e proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou
incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por
intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três
anos.
Parágrafo único. Na fixação das penas previstas nesta lei o juiz levará
com conta a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial
obtido pelo agente."
[...]
Na hipótese, por mais reprovável que seja a conduta, não houve
locupletamento ilícito dos Réus, tampouco prejuízo ao erário.
Assim, entendo razoável e proporcional ao ato praticado a fixação de
multa civil, em relação ao Réu Prefeito, correspondente ao dobro da
remuneração percebida mensalmente, a ser revertida em benefício do Município
de Serra Alta.
Quanto aos Réus transportadores, restam proibidos de contratar com o
poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou
indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual sejam sócios
majoritários, pelo prazo de três anos. (548-558)
Em seu cerne, a sentença deve ser mantida por seus próprios
fundamentos.
Ademais, resta assente que a aplicação das penas decorrentes de
ato de improbidade prescinde da existência de prejuízo ao erário, nos termos do
art. 21, inc. I, da Lei n. 8.429/1992, até mesmo por conta do caráter pedagógico
contido em tais sanções, quem também visam a preservação da moralidade
administrativa.
Neste norte:
"Para que se concretize a ofensa ao art. 11 da Lei de Improbidade, revela-
se dispensável a comprovação de enriquecimento ilícito do administrador
público ou a caracterização de prejuízo ao Erário" (REsp 951.389⁄SC, Rel.
Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 9-6-2010, DJe 4-
5-2011).
“As medidas punitivas previstas na Lei 8.429/92 não se restringem ao
ressarcimento das quantias indevidamente apropriadas. São também de
natureza política, político-administrativa e administrativa." (Apelação Cível n.
2012.039152-0, de Turvo, rel. Des. Nelson Schaefer Martins, j. 25-6-2013).
Ao que se soma o entedimento de que "A fraude à licitação tem
Gabinete Des. Cid Goulart
9. como consequência o chamado dano in re ipsa (REsp 1.280.321/MG, Rel.
Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma DJe 9.3.2012; REsp
1.190.189, Relator Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe
10.9.2010; STF, RE 160.381/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, Segunda Turma, DJ
12.8.1994)" (AgRg nos EDcl no AREsp 178.852/RS, Rel. Ministro HERMAN
BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 14-5-2013, DJe 22-5-2013).
Acrescente-se que, ao contrário do que afirmam os recorrentes, a
condenação não exige dolo específico, mas sim “dolo genérico de realizar
conduta que atente contra os princípios da Administração Pública” (REsp
951.389⁄SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em
09⁄06⁄2010, DJe 04⁄05⁄2011).
Ainda sobre o tema, colhe-se da jurisprudência:
"O posicionamento firmado pela Primeira Seção é que se exige dolo,
ainda que genérico, nas imputações fundadas nos arts. 9º e 11 da Lei
8.429/1992 (enriquecimento ilícito e violação a princípio), e ao menos culpa, nas
hipóteses do art. 10 da mesma norma (lesão ao erário)." (EDcl no AREsp
57.435/RN, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 1-
10-2013, DJe 9-10-2013)
"PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. ALEGAÇÃO
GENÉRICA. SÚMULA 284/STF. ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA. DANO AO ERÁRIO. VEREADORES, EMPRESA E
TERCEIROS BENEFICIADOS. AUSÊNCIA DE LITISCONSÓRCIO PASSIVO
NECESSÁRIO. ATO ÍMPROBO. ARTS. 10 E 11 DA LEI N. 8.429/92. DOLO
GENÉRICO. CONFIGURAÇÃO. APLICAÇÃO DE SANÇÕES. ART. 12 DA LIA.
DECORRÊNCIA LÓGICA. DOSIMETRIA. REVISÃO. AUSÊNCIA DE
HIPÓTESES EXCEPCIONAIS. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. AUSÊNCIA DE
COTEJO ANALÍTICO. NÃO-INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO LEGAL AO QUAL
FOI DADA INTERPRETAÇÃO DIVERGENTE. FUNDAMENTAÇÃO
DEFICIENTE.
"[...]
"3. Nos termos da jurisprudência do STJ, para que seja reconhecida a
tipificação da conduta do réu como incurso nas previsões da Lei de Improbidade
Administrativa, é necessária a demonstração do elemento subjetivo,
consubstanciado pelo dolo para os tipos previstos nos arts. 9º e 11 e, ao menos,
pela culpa, nas hipóteses do art. 10 que resulte dano ao erário.
"4. Os atos de improbidade administrativa descritos no art. 11 da Lei n.
8.429/92 dependem da presença do dolo genérico, mas dispensam a
demonstração da ocorrência de dano para a Administração Pública ou
Gabinete Des. Cid Goulart
10. enriquecimento ilícito do agente.
"5. Verificado pelas instâncias ordinárias que a Associação dos Produtores
Rurais de Ouro Verde - APROVERDE, sociedade civil sem fins lucrativos criada
com o intuito de servir aos produtores rurais de Ouro Verde, não prestava os
serviços de utilidade pública previstos em seu estatuto e/ou que pudessem
justificar o repasse das verbas públicas previstas em lei; não apresentava
contas da destinação dos valores percebidos; contratava funcionários cuja
prestação de serviços não guardava relação com os objetivos buscados pela
Associação; remunerava funcionários cuja prestação de serviços era destinada,
na realidade, à Prefeitura Municipal de Ouro Verde, sem a devida realização ou
dispensa de licitação, configurado está o dolo genérico e caracterizadas estão
as condutas tipificadas nos incisos III, VIII e IX do artigo 10 e inciso I do artigo
11 da LIA e, consubstanciado na intenção de beneficiar a empresa vencedora
do certame. [...]" (EDcl no AgRg no REsp 1314061/SP, Rel. Ministro
HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 25/06/2013, DJe
05/08/2013)
Corroborando as conclusões da sentença sob análise, temos que o
apelante Claudinei Senhor restou condenado na esfera criminal, em decisão já
acobertada pelo trânsito em julgado, nos termos do acórdão que segue:
“AÇÃO PENAL. FRAUDE À LICITAÇÃO (ART. 90, LEI N. 8.666/1993).
DENÚNCIA CONTRA PREFEITO E EMPRESÁRIOS DO RAMO DE
TRANSPORTE ESCOLAR. PRELIMINARES. 1) NULIDADE DO PROCESSO.
PEÇA ACUSATÓRIA OFERTADA COM BASE NOS ELEMENTOS COLHIDOS
EM INQUÉRITO CIVIL INSTAURADO PARA APURAR ATO DE IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA. POSSIBILIDADE (ART. 129, VI E VIII, CF, ARTS. 82, VI E
XII, E 83, I, II E III, LCE N. 197/2000, E ART. ART. 39, § 5º, CPP). HIPÓTESE
QUE NÃO CARACTERIZA A FUNÇÃO DE PRESIDIR INQUÉRITO POLICIAL.
2) INÉPCIA DA DENÚNCIA. INOCORRÊNCIA. PEÇA ACUSATÓRIA QUE
ATENDE AOS REQUISITOS EXIGIDOS PELO ART. 41 DO CÓDIGO DE
PROCESSO PENAL. PREFACIAIS AFASTADAS.
“MÉRITO. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. RESULTADO
DO CERTAME PREORDENADO ENTRE OS ACUSADOS. VIOLAÇÃO AO
CARÁTER COMPETITIVO DO PROCEDIMENTO LICITATÓRIO
CONFIGURADO. OBTENÇÃO DE VANTAGEM INDEVIDA DEMONSTRADA.
DOLO EVIDENCIADO. DENÚNCIA PROCEDENTE. CONDENAÇÃO
DECRETADA.
“PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA ESTATAL VERIFICADA EM
FAVOR DE 4 (QUATRO) RÉUS (ART. 109, V, CP). EXTINÇÃO DA
PUNIBILIDADE DECLARADA DE OFÍCIO (ART. 107, IV, CP, E ART. 61, CPP).”
(Processo Crime n. 2010.077578-2, de Modelo, rel. Des. Newton Varella Júnior,
j. 4-12-2012).
O único reparo que merece a sentença prolatada é quanto à multa
Gabinete Des. Cid Goulart
11. civil aplicada ao réu Claudinei Senhor que, em atenção aos princípios da
razoabilidade e da proporcionalidade, deve ser reduzida para o valor de uma vez
a remuneração que percebia a época, corrigida monetariamente.
Por tais razões, cumpre não conhecer do recurso interposto pelo
Município de Serra Alta, dar parcial provimento ao apelo de Claudinei Senhor e
desprover os recursos dos demais réus.
Este é o voto.
Gabinete Des. Cid Goulart