Foi desprovido o recurso que o ex-Prefeito de Monte Carlo Marcos Leal Nunes interpôs no Tribunal de Justiça de Santa Catarina contra decisão que o condenou por ato de improbidade administrativa, proferida em ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público de Santa Catarina.
Protocolo Pisc Protocolo de Rede Intersetorial de Atenção à Pessoa Idosa em S...
Improbidade Administrativa - 2012.029850-9
1. Apelação Cível n. 2012.029850-9, de Fraiburgo
Relator: Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PROCEDIMENTO
LICITATÓRIO FORJADO POR MEIO DE CARTA-CONVITE,
PARA JUSTIFICAR O PAGAMENTO DE DESPESAS
REALIZADAS SEM CONCORRÊNCIA. DOLO, PREJUÍZO
AO ERÁRIO E ENRIQUECIMENTO ILÍCITO DE TERCEIRO
DEVIDAMENTE DEMONSTRADOS. INTELIGÊNCIA DO
ART. 10 DA LEI N. 8.429/1992. SENTENÇA DE
PROCEDÊNCIA MANTIDA, INCLUSIVE NO QUE TANGE ÀS
PENALIDADES. RECURSO DESPROVIDO.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n.
2012.029850-9, da comarca de Fraiburgo (1ª Vara), em que é apelante Marcos
Leal Nunes e apelados o Ministério Público e outro:
A Primeira Câmara de Direito Público decidiu, por unanimidade,
desprover o recurso. Custas legais.
Participaram do julgamento, realizado nesta data, os
Excelentíssimos Senhores Desembargadores Jorge Luiz de Borba (Presidente) e
Gerson Cherem II.
Florianópolis, 14 de outubro de 2014.
Paulo Henrique Moritz Martins da silva
Relator
2. RELATÓRIO
O Ministério Público propôs "ação civil pública por ato de
improbidade administrativa" em face de Marcos Leal Nunes, Aury Roque
Haslinger, Marcos Rodrigues Motecarlense – ME e Marcos Rodrigues.
Alegou que o requerido Marcos Leal, na qualidade de Prefeito de
Monte Carlo, promoveu licitação na modalidade convite visando a contratação de
serviços de calçamento em diversas ruas.
Abertas as propostas em 5-4-1993, Marcos Rodrigues Motecarlense
– ME saiu vencedora. Todavia, o processo licitatório foi deflagrado quando as
obras já haviam sido contratadas e estavam em andamento, de modo apenas a
dar ares de legalidade aos pagamentos efetuados em favor da empresa.
Os requeridos Marcos Leal e Aury (Secretário de Obras),
autorizaram a quitação dos empenhos n. 438 e n. 459 – o primeiro com data
anterior à abertura das propostas (1º-4) e o segundo emitido no dia
imediatamente seguinte (6-4).
O montante global do serviço ultrapassava o limite para dispensa de
licitação e o valor do metro efetivamente pago à empresa ré foi superior ao de
todas as concorrentes do certame.
Apontou violação ao art. 10, I, VIII e XII da Lei de Improbidade.
Em contestação, Aury sustentou: a) inépcia da inicial, pela
impossibilidade de se veicular, em ação civil pública, pedido de restituição ao
erário ou imposição de penalidades por improbidade; b) carência de ação, pois
não houve processo administrativo prévio de apuração; c) ilegitimidade passiva,
tendo em vista que não teve participaçao nos fatos descritos; d) prescrição
quinquenal; e) não tinha responsabilidade pela contratação ou pagamento da
empresa ré; f) não há certeza quanto ao dano alegado pelo Ministério Público; g)
se houve prejuízo, foi de pequena monta; h) houve "falta de preparo dos
administradores", mas sem intenção de lesar o erário ou beneficiar terceiros (f.
115/135).
Marcos Leal Nunes alegou: a) os gastos foram realizados para
atender o interesse público; b) o Município foi emancipado em 1992 e a época foi
marcada por "toda sorte de percalços, falta de infra-estrutura, bens e materiais";
c) os valores pagos nos empenhos n. 438 e n. 459 se referem a obras iniciadas
em 1992 e concluídas em 1993, que haviam sido contratadas pelo Município de
Campos Novos, do qual Monte Carlo se emancipou; d) não houve desvio de
dinheiro público ou benefício a terceiros, mas mera irregularidade administrativa
(f. 142/151).
O magistrado declinou da competência para esta Corte (f. 242/249).
O Ministério Público interpôs agravo de instrumento, que foi provido
(f. 256/265 e 281/282).
A Marcos Rodrigues Motecarlense – ME e Marcos Rodrigues,
citados por edital, foi nomeado curador (f. 412), que apresentou resposta,
Gabinete Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva
3. argumentando: a) ilegitimidade ativa, pois o Ministério Público não pode atuar na
defesa do erário; b) ilegitimidade passiva, já que não praticaram ato ímprobo –
foram apenas contratados para executar obra pública; c) não houve dolo,
desonestidade ou má-fé e d) os serviços foram prestados (f. 416/421).
As preliminares e a prejudicial de prescrição foram rejeitadas em
decisão saneadora (f. 439/442).
Colhida prova oral (f. 468/473), ofertadas alegações finais (f.
489/490, 491/498 e 503/504), foi proferida sentença cuja conclusão é a seguinte:
Ante o exposto, com fundamento no artigo 269, inciso I, do Código de
Processo Civil, JULGO PROCEDENTES EM PARTE os pedidos iniciais
deduzidos pelo MINISTÉRIO PÚBLICO em face de MARCOS LEAL NUNES,
AURY ROQUE HASLINGER, MARCOS RODRIGUES MONTECARLENSE - ME
e MARCOS RODRIGUES, para, de acordo com previsto no art. 11, caput, e art
12, incisos II e III, ambos, da Lei nº 8.429/92:
a) CONDENAR: Marcos Leal Nunes, solidariamente, ao ressarcimento dos
danos causados ao erário municipal montecarlense, conforme exposto no item
II-2.4 - Do Ressarcimento, no valor de R$ 3.949,58 (três mil novecentos e
quarenta e nove reais e cinquenta e oito centavos), monetariamente corrigidos e
acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, ambos a partir da data desta
sentença e ao pagamento de multa civil no valor de R$5.000,00 (cinco mil
reais); PROIBIR de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou
incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por
intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário pelo prazo de 03
(três) anos; e, DECRETAR a suspensão de seus direitos políticos por 03 (três)
anos;
b) CONDENAR: Aury Roque Haslinger na responsabilidade pelos atos de
improbidade administrativa narrados na inical, solidariamente, ao ressarcimento
do montante apontado no item II-2.4 - Do Ressarcimento, qual seja, R$ 3.949,58
(três mil novecentos e quarenta e nove reais e cinquenta e oito centavos),
monetariamente corrigidos e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, ambos
a partir da data desta sentença;
c) CONDENAR: Marcos Rodrigues Montecarlense - ME, solidariamente,
ao ressarcimento dos danos causados ao erário municipal montecarlense,
conforme exposto no item II 2.4-Ressarcimento, no valor de R$ 3.949,58 (três
mil novecentos e quarenta e nove reais e cinquenta e oito centavos),
monetariamente corrigidos e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, ambos
a partir da data desta sentença, e ao pagamento de multa civil no valor de
R$5.000,00 (cinco mil reais); e, PROIBIR a empresa ré de contratar com o
Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta
ou indiretamente, pelo prazo de três anos;
d) CONDENAR: Marcos Rodrigues, solidariamente, ao ressarcimento dos
danos causados ao erário municipal montecarlense, conforme exposto no item II
2.4-Ressarcimento, no valor de R$ 3.949,58 (três mil novecentos e quarenta e
nove reais e cinquenta e oito centavos), monetariamente corrigidos e acrescidos
de juros de mora de 1% ao mês, ambos a partir da data desta sentença, e ao
pagamento de multa civil no valor de R$5.000,00 (cinco mil reais); PROIBIR o
Gabinete Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva
4. réu de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais
ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa
jurídica da qual seja sócio majoritário pelo prazo de 03 (três) anos; e,
DECRETAR a suspensão de seus direitos políticos por 03 (três) anos.
Em conseqüência, JULGO o processo com resolução de mérito.
Tendo em vista a sucumbência, condeno os réus, solidariamente, ao
pagamento das despesas processuais. Sem honorários.
Após o trânsito em julgado, oficie-se a Justiça Eleitoral comunicando a
suspensão dos direitos políticos dos réus Marcos Leal Nunes e Marcos
Rodrigues. (f. 516/537)
Marcos Leal Nunes, em apelação, reitera o argumento de que não
houve dolo, intenção de obter vantagem patrimonial ou má-fé (f. 560/570).
Com as contrarrazões (f. 579/583 e 595/600), os autos ascenderam,
pronunciando-se a d. Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Dr.
Paulo Cezar Ramos de Oliveira, pelo desprovimento do recurso (f. 607/613).
VOTO
A sentença prolatada pelo MM. Juiz Márcio Umberto Bragaglia
merece ser confirmada por seus próprios fundamentos, os quais adoto como
razão de decidir:
Efetivamente a Município de Monte Carlo-SC contratou com a empresa
Marcos Rodrigues Montecarlense - ME, de propriedade do terceiro requerido,
através da modalidade de convite, o serviço de mão-de-obra para construção de
calçamento em diversas ruas do município de Monte Carlo-SC, no valor de Cr$
69.700,00 m² (sessenta e nove mil e setecentos cruzeiros) por metro quadrado
de calçamento.
Percebe-se que processo licitatório foi assentado sob o número 017/93 e
realizado integralmente na data de 05/04/1993, e que o requerido Marcos Leal
Nunes ordenou o pagamento de valores acima do licitado, conforme se verifica
pelas notas de empenho (fls. 29/63), sem o necessário aditamento da licitação.
Percebe-se também que, extreme de dúvidas os valores constantes no
empenho 438 são referentes a serviços efetuados antes mesmo da efetivação
do processo licitatório conforme depreende-se das notas fiscais e laudo de
serviço subscritos pelo réu Aury Roque Haslinger, nele inseridas (fls. 17/18).
A justificativa apresentada pelo réu Marcos Leal Nunes, então
Prefeito Municipal de Monte Carlo, sobre tais pagamentos realizados antes
da licitação foi a seguinte: "O Município, emancipado no ano de 1992, teve
como primeiro administrador o Requerido que, enfrentando toda sorte de
percalços, falta de infra-estrutura, bens e materiais para a busca do bem
comum, trilhou, inobstante, sempre o caminho da lealdade, honestidade e
moralidade. Inicialmente e, no legítimo interesse de implantar melhorias
no município, foram iniciados serviços de calçamento. Contratado um dos
requeridos para executar serviços, em valores aquém do mínimo
estabelecido para a exigência de licitação e, nos valores constantes do
Gabinete Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva
5. laudo de serviço, que empenhado restou pago. Os serviços executados
antes do citado processo licitatório se referem a contratação do licitante
ainda no ano de 1992, pelo município de Campos Novos, tendo o
prestador de serviços somente acabado a obra no ano de 1993. Como
houve a emancipação do município de Monte Carlo, desmembrando-se de
Campos Novos, os serviços contratados por este, encerrados no exercício
de 1993, no território desmembrado, restou por este suportado (Monte
Carlo). Com efeito, sem qualquer objetivo de dar contornos de legalidade a
serviços não licitados, o que objetivou a Administração de Monte Carlo,
mediante tratativas com o município de Campos Novos, foi a liquidação
dos serviços iniciados por contratação de Campos Novos, de serviços no
território que posteriormente passou a compor o município de Monte
Carlo". (f. 146).
Surpreende o fato de que tais alegações, que não se nega têm em si
alguma densidade no campo do razoável (pois de fato houve desmembramento
do Município naquela época), tenham vindo aos autos desacompanhadas de
qualquer documentação que pudesse comprovar que os serviços
anteriores à licitação eram mesmo reflexos de contratação anterior ao
desmembramento do Município. Não se pode dar crédito à tese meramente
por ter sido alegada, sem qualquer comprovação no campo documental...
Além disso, convém anotar que, conforme bem ressaltou o Ministério
Público em manifestação de fls. 433, os serviços realizados antes da
licitação foram objeto o aludido certame, o que, se por um lado não
invalida completamente o argumento do réu, por outro o torna irrelevante
neste ponto.
Pelo que há nos autos é de se concluir que houve efetivamente
valores pagos pelo Município e anteriores ao procedimento licitatório sem
qualquer justificativa lícita comprovada para dispensa do mesmo.
O fato narrado e não negado na sua essência, ainda que impugnado por
justificativas baseadas no suposto interesse público, por si só, demonstra que
houve, em algum momento, ilegalidade no processo de contratação e
pagamento.
Os documentos constantes dos autos levam à conclusão de que
realmente houve a prática de ato de improbidade administrativa, tendo em vista
que os pagamentos foram realizados antes do final do processo de licitação,
causando prejuízos presumidos aos cofres públicos e violação à moralidade
administrativa.
As notas fiscais emitidas pela empresa requerida referem-se
exclusivamente aos serviços de mão-de-obra na construção de
calçamento. No entanto o laudo de serviço (fl. 18), correspondente a nota
nº 438 é do dia 01/04/93, dia no início do processo licitatório,
posteriormente o laudo de serviço (fl. 23) é do dia 06/04/93, apenas um dia
após o término da licitação, deixando claras as irregularidades.
Nas demais notas fiscais a quantidade em metros quadrados é
cobrada em valor muito superior ao licitado, superior, inclusive, ao maior
preço licitado em alguns casos.
Gabinete Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva
6. Os réus reconhecem a efetivação de pagamentos e recebimentos dos
valores narrados na inicial, atribuindo tal majoração à outras benfeitorias
necessárias para a realização da obra, entretanto, não apresentaram
qualquer prova documental do alegado, o que, diante dos princípios que
devem pautar a administração pública, torna impossível seu
reconhecimento; mormente pelo fato de que os documentos indicam que
os valores pagos eram exclusivamente referentes aos serviços de mão-de-obra
para construção de calçamento, conforme especificado desde o
convite para licitação.
A Lei nº 8.429/92 dispõe sobre a improbidade administrativa. Vejamos:
Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao
erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda
patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou
haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:
I - facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao
patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou
valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º
desta lei;
[...]
VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo
indevidamente;
[...]
XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça
ilicitamente;
[...]
Diante dos documentos juntados aos autos, fica claro que houve
lesão ao erário e, especificamente, a incorporação irregular ao patrimônio
particular de verbas públicas, pela via de pagamento de valores acima do
licitado.
Portanto, verifica-se a realidade dos fatos narrados na exordial e a
existência do ilícito, no caso, improbidade administrativa.
O réu Marcos Leal Nunes era o prefeito do Município de Monte Carlo-
SC e, nessa condição, outorgou as notas de empenho como ordenador
das despesas. Conforme dito alhures, o réu diz não ter agido com dolo de
dilapidar o erário.
Entretanto, diferente do que quer fazer crer o réu, ao administrador
público são vedados atos perfunctórios; pelo contrário, devem
obrigatoriamente ser pautados pelos interesses coletivos, os quais, por
sua vez são indisponíveis.
Perfeitamente plausível que uma obra de engenharia civil não seja
realizada apenas com mão-de-obra de calçamento. O que não se pode
conceber é que uma licitação, onde todos os documentos indicam para a
efetivação única de seu objetivo precípuo, abarque outros diversos
custos. Ressalte-se, custos que não foram sequer demonstrados nos
autos pelos réus! Ou, ainda, pagamentos feitos por obras realizadas antes
da licitação, levando o número do processo licitatório apenas para
Gabinete Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva
7. maquiar, simular uma situação de legalidade que, pelo que consta (ou
melhor, pelo que deixou de constar) no caderno processual, não existiu.
Os argumentos do ex-prefeito são descabidos, posto que se trata de
atos da administração pública, cuja prática deve ser promovida por seus
administradores pautando-se pelos princípios administrativos insculpidos
na Constituição Federal:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes
da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos
princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência
[...]
Não se pode olvidar que é poder/dever do administrador público,
desde sua posse ao tão honroso munus, buscar, dioturnamente, através
de seus atos, a efetivação dos princípios norteadores da administração
dos interesses da coletividade.
Portanto, verifica-se que há responsabilidade de Marcos Leal Nunes
na prática dos atos de improbidade administrativa, ao autorizar os
pagamentos, bem como, os empenhos das notas fiscais da empresa
Marcos Rodrigues Montecarlense - ME pela mão-de-obra na construção
de calçamento, em discordância com as estritas especificações do
processo licitatório.
[...]
A responsabilidade do co-réu Aury Roque Haslinger foi muito bem
esmiuçada nas alegações finais de fls. 423-438, cujo trecho abaixo (fls. 432 e
ss.) cito para adotar como razões adicionais de decidir, considerando sa
preciosa análise da distribuição das responsabilidades realizada pelo douto
Promotor de Justiça Dr. Cássio Antônio Ribas Gomes: "Consta que no dia 1º de
abril de 1993, o requerido Marcos Leal Nunes, então Prefeito do Município de
Monte Carlo – SC, encetou licitação na modalidade Convite sob n. 017/93, para
contratação de serviços de calçamento nas ruas (então denominadas) N-14, S-
4, Avenida Presidente Kennedy, ruas N-S, N-2, N-4, S-7, S-9 e S-10, sem
discriminação das áreas a pavimentar. Desde logo, saltam aos olhos as
irregularidades porque no dia 5 do mesmo mês foram apresentadas propostas
pelas empresas convidadas, oportunidade em que, julgadas, sagrou-se
vencedora a firma requerida Marcos Rodrigues Montecarlense – ME, de
propriedade do demandado Marcos Rodrigues, que cotou preço de Cr$
69.700,00 (sessenta e nove mil e setecentos cruzeiros) por metro quadrado de
calçamento. Sucedeu, contudo, que o processo licitatório foi levado a efeito
quando já havia sido contratada a empresa ora requerida para a realização, ao
menos, de parte dos preditos serviços, que foram iniciados antes do lançamento
do Convite. Para a fraude concorreram os requeridos Marcos Leal e Aury
porquanto, ao mesmo tempo em que lançada a licitação, o requerido
Marcos Leal Nunes, na condição de Prefeito, e o requerido Aury Roque
Haslinger, na qualidade de Secretário de Obras do Município, deram azo
ao pagamento à empresa demandada de serviços de construção de 155,00
(cento e cinquenta e cinco metros quadrados) de calçamento na rua N-14,
serviços objeto da aludida licitação, no valor total de Cr$ 11.000.000 (onze
Gabinete Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva
8. milhões de cruzeiros), prestados antes do início do certame e por força de
ajuste entre os referidos demandados e o requerido Marcos Rodrigues,
proprietário da contratada, conforme revelam a nota de empenho nº 438.
Isso porque na referida nota de empenho, em que figurou como ordenador
da despesa o demandado Marcos Leal Nunes, foi feita referência ao
Convite nº 017/93, ao laudo de recebimento dos serviços subscrito pelo
requerido Aury e à nota fiscal nº 000018, estes datados de 1º.4.94, ou seja,
anteriores à abertura e julgamento das propostas do Convite. A união de
vontades entre Marcos Leal e Aury mirando realizar e maquiar contração
direta é inequívoca ante o fato de que, sendo Prefeito e Secretário de
Obras de Monte Carlo, a contratação dos serviços era vinculada à
necessidade apontada por este e à ratificação daquele, o que está
delineado no recebimento dos serviços pelo ex-Secretário e ordenamento
da despesas pelo ex-Alcaide, não se olvidando que o lançamento do
Convite e o pagamento de parcela dos serviços na mesma data se nota
conhecimento e congresso de intentos. Ainda, serve como prova da prévia
contratação da empresa pertencente ao requerido Marcos Rodrigues e da
simulação da licitação, o recebimento pelo demandado Aury de outra parte dos
serviços licitados, traduzida em 630m2 (seiscentos e trinta metros quadrados)
de calçamento na Avenida Presidente Kennedy, no valor de Cr$ 43.911.000,00
(quarenta e três milhões e novecentos e onze mil cruzeiros), no dia 6 de abril de
1993, apenas um dia após a abertura e julgamento das propostas atinentes ao
Convite e no mesmo dia da emissão de nota fiscal pela empresa, que ensejou o
empenho (nº 459) e autorização de pagamento no dia seguinte. Concluindo, é
impossível a conclusão de tais trabalhos na hipótese da contratação ter
emergido do Convite 017/93 face o curtíssimo espaço de tempo decorrido entre
a escolha do vencedor e a constatação da prestação dos servidos pelo
requerido Aury Roque Haslinger [...]". (f. 433).
De fato, conforme bem percebeu o ilustre Promotor de Justiça, a
mera comparação entre as datas os eventos em debate (serviços
realizados, pagamentos determinados e licitação realizada) já demonstra
que realmente os réus uniram suas vontades e ações na empreitada
fraudulenta. Realmente, são mais que suficientes as provas contidas nos
autos de que Marcos Leal Nunes inseriu nas notas de empenho de nº 438 e
459 referências à licitação mesmo já realizados os serviços antes da
conclusão do processo licitatório com verificação do vencedor,
cometendo inclusive, ao que tudo indica, falsidade ideológica que visava
simular regularidade nas despesas decorrentes dos serviços realizados
sem licitação. Ora, se, conforme os réus sustentaram inclusive em seus
depoimentos pessoais (colhidos às fls. respectivamente) as obras
anteriores à licitação derivavam de contratos firmados entre a empresa ré
e o Município de Campos Novos, antes da emancipação de Monte Carlo,
onde estão as cópias destes contratos, a especificação clara de seu
objeto, formas de pagamento e valores?
Em relação ao segundo fato relevante (sendo o primeiro a execução
de serviços antes de encerrada a licitação), o pagamento dos serviços
realizados em valores superiores aos previstos no edital, melhor sorte não
Gabinete Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva
9. socorre os réus, porque igualmente a documentação que acompanhou a
inicial em suporte à descrição fática não foi impugnada suficientemente
pelo teor das defesas. Sigo citando a bem lançada manifestação ministerial em
alegações finais, neste ponto, mais uma vez adotando seu teor como
complemento às razões de decidir, porque realmente o Parquet realçou toda a
prova com sólidos argumentos: "Não bastasse, o requerido Marcos Leal
Nunes em parte dos serviços executados pela empresa demandada
permitiu/autorizou que se pagasse valor superior ao proposto pela
contratada e até superior àquele proposto pela empresa que cotou o maior
preço no certame (Natalino Meira Padilha ME – Cr$ 75.000,00) resultando
prejuízo aos cofres públicos no montante equivalente a 830,97 UFIR
(oitocentos e trinta vírgula noventa e sete unidades fiscais de referência)
apontado em Auditoria levada a efeito pelo E. Tribunal de Contas do
Estado, que responsabilizou o ex-Alcaide pelo dano, no concernente às
notas de empenho, notas fiscais, e valores consignados às fls. 06/07. Frise-se
que as majorações de preços ocorreram em desacordo com o ato
convocatório da licitação e, por conseguinte, em afronta à legislação,
resultando em vantagens indevidas à empresa requerida e ao demandado
Marcos Rodrigues, o que ocorreu com a consciência deste que fez inserir
nas notas fiscais supraditas valores unitários maiores que os efetivamente
devidos, logrando enriquecer-se ilegitimamente com o recebimento de
numerário "extra". [...] Por sua vez, Marcos Leal Nunes admite a contratação
direta ao argumentar que as obras os serviços de calçamento levados a efeito
no ano de 1992 foram contratadas pelo Município de Campos Novos e apenas
encerraram no ano de 1993, tendo confirmado que o Município de Monte Carlo
suportou as despeas inerentes à contratação com a liquidação das despesas e
emissão dos empenhos para obras e serviços realizados antes da Licitação –
convite 017/93." (f. 434).
[...]
Finalmente, convém registrar que os exatos fatos em exame nesta
sentença foram apreciados pelo egrégio Tribunal de Justiça de Santa
Catarina, na seara criminal, ao julgar o Processo Crime 2001.001960-0,
relatado pelo eminente Desembargador Sérgio Paladino, o que resultou na
condenação dos réus pessoas físicas naquele contexto. Ainda que, na
hipótese, não haja vínculo determinante entre as jurisdições em questão,
parece-me que a análise dos fatos realizada naqueles autos pela distinta Corte
Catarinense, como sempre, sintetizou com maestria o lamentável evento
criminoso e aplicou o direito muito perfeitamente, razão pela qual cito trechos da
análise de mérito, compatível minha decisão nestes autos com a proferida pela
Superior Instância:
"No mérito, procede a imputação quanto ao crime de
responsabilidade descrito no art. 1º, inciso I, do Decreto-lei n. 201/67, na
modalidade desvio, também denominado peculato, pois emergem dos
autos provas seguras quer da materialidade, quer da autoria, consistentes
nas cópias das notas fiscais emitidas pela empresa Marcos Rodrigues
Montecarlense – ME (fls. 18 e 132), pertencente ao co-réu Marcos
Rodrigues, nas notas de empenho de fls. 17 e 131, e nos laudos de serviço
Gabinete Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva
10. de fls. 19 e 133, elementos que, secundados pelo relatório da auditoria
realizada pelo corpo técnico do Tribunal de Contas do Estado (fls. 61/69,
73/83, 84/89, 91/104), fornecem ao julgador a certeza necessária de que o
então prefeito, Marcos Leal Nunes, e o secretário de obras, Aury,
desviaram rendas públicas em proveito do co-réu Marcos Rodrigues,
mediante o pagamento de importância superior à licitada e em datas
anteriores ao certame, que se destinava à contratação da feitura do
calçamento de ruas do município de Monte Carlo. Aflora do caderno
processual que no dia 5 de abril de 1993 a Prefeitura Municipal de Monte Carlo
abriu e encerrou licitação, na modalidade convite, visando à pavimentação de
algumas ruas. Apresentadas as propostas, sagrou-se vencedora Marcos
Rodrigues Montecarlense – ME, em virtude de haver proposto o menor preço,
qual seja, Cr$ 69.700,00 (sessenta e nove mil e setecentos cruzeiros) por metro
quadrado de calçamento, inexistindo menção ao valor total da obra. Entretanto,
de acordo com a nota da empenho (fl. 131), a nota fiscal (fl. 132) e o laudo de
serviços (fl. 133), parte das obras então licitadas — calçamento de 155 m2 na
rua N-4 — já haviam sido realizadas pela empresa Marcos Rodrigues
Montecarlense – ME em 1º de abril do mesmo ano, por preço superior àquele
que venceu o certame, qual seja, Cr$ 71.350,00 (setenta e um mil e trezentos e
cinqüenta cruzeiros). Já em 6 de abril de 1993, dia imediato ao da abertura das
propostas, a mesma empresa Marcos Rodrigues Montecarlense – ME contratou
com a Prefeitura a obra referente ao calçamento de 630 m2 na rua Presidente
Kennedy, pelo valor de Cr$ 50.418.200,00 (cinqüenta milhões, quatrocentos e
dezoito mil e duzentos cruzeiros), cujo metro quadrado custou aos cofres
públicos o montante de Cr$ 80.028,88 (oitenta mil e vinte e oito cruzeiros). De
outro vértice, a prova da autoria do crime perpetrado por Marcos Leal Nunes
reside nas assinaturas que apôs nas notas de empenho (fls. 17 e 131), por ele
confirmadas na oportunidade em que prestou declarações em juízo, quando
também admitiu ter ordenado as referidas despesas (fls. 119/120). O co-réu
Aury igualmente não negou a autoria, tendo confessado que emitiu os laudos de
serviço de fls. 19 e 133 (fls. 121/122). Gize-se que os depoimentos das
testemunhas que indicaram não contribuíram para a elucidação do fato
criminoso (fls. 229/233). Abordando o fato típico para cuja apuração instaurou-se
esta ação penal, sublinha Antônio Tito Costa: "O crime consiste em
apropriação ou desvio de bens públicos ou rendas públicas, em proveito do
agente ou de terceiros. Trata-se, aqui, de peculato, à semelhança do que vem
disposto no Cód. Penal de 1940, art. 312. Se o Prefeito é o administrador da
coisa pública municipal, ou indiretamente, da estadual ou da federal,
apropriando-se dela, ou desviando-a, em proveito próprio ou alheio, pratica em
tese o delito. Coisa pública, aqui, tomada em sentido amplo, posto que o
preceito fala em bens ou rendas. Apropriar-se quer dizer tornar próprio, fazer
seu, apossar-se, tomar para si; enquanto que desviar significa tirar do caminho,
afastar, desencaminhar, alterar a direção ou o destino — dos bens ou das
rendas públicas" (Responsabilidade de prefeitos e vereadores, 2ª ed., rev. e
ampl., São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, 1988, p. 35). Segundo o escólio de
Rui Stoco, "quando o administrador, o Chefe do Poder Executivo de um
município, desvia-se e distrai-se de suas atribuições e do mister para o qual foi
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11. eleito, bandeando-se para a prática delituosa e insultando e traindo a confiança
daqueles que lhe outorgaram o mandato, ofende e fere profundamente cada
membro daquela comunidade e trai o voto que obteve na urna. Omissis. Esse o
sentido da punição nos delitos funcionais. Serve para dar uma satisfação não
só à sociedade como um todo, mas e principalmente, à própria comunidade
ofendida. E mais, há de servir de exemplo e desestímulo àqueles que, na
mesma comunidade, buscam se eleger para fins escusos. A reprimenda não
terá apenas caráter retributivo e preventivo mas, também, profilático e
educativo. Omissis. O uso da máquina administrativa para fins pessoais, a
apropriação ou o desvio de verbas públicas em proveito próprio, o peculato, e
outras práticas ilícitas de natureza funcional constituem os mais graves crimes
que um administrador pode cometer" (RBCCrim 10/286). Evidencia-se, portanto,
que Marcos Leal Nunes serviu-se do cargo que exercia para desviar verba
pública em proveito alheio, impondo-se, em razão disso, o reconhecimento de
sua responsabilidade pelo cometimento do delito. Outrossim, patenteia-se a
participação de Aury na empreitada que culminou na infração ao art. 1º, inciso I,
do Decreto-lei n. 201/67, porquanto "'é inafastável a possibilidade de co-autoria
nos crimes de responsabilidade funcional' (TJSP – HC – rel. Camargo Sampaio
– RT 513/391)" (Franco, Alberto Silva; Ninno, Jefferson; Silva Júnior, José;
Betanho, Luiz Carlos; Moraes, Maurício Zanoide de; Podval, Roberto; Stoco,
Rui; Feltrin, Sebastião Oscar, e Ninno, Wilson, Leis penais especiais e sua
interpretação jurisprudencial, volume 1, 7ª ed., rev., atual. e ampl., São Paulo,
Ed. Revista dos Tribunais, 2001, p. 2764), desde que saiba da condição pessoal
ostentada pelo funcionário, particularidade constatada no caso concreto, pois
Aury tinha conhecimento de que o co-réu era o prefeito municipal. O dolo,
elemento subjetivo do tipo que se exterioriza por meio da apropriação
indevida ou desvio, com o fim de proveito, causando dano à
Administração, seja pela diminuição efetiva do patrimônio, seja pela falta
ou aumento devido, restou plenamente configurado, eis que o então
prefeito e o co-réu tinham ciência de tudo e quiseram tanto pagar a mais
pelo serviço realizado, quanto vincular uma nota de empenho a uma
licitação concluída posteriormente, criando versão fantasiosa que, por
óbvio, causou prejuízo ao erário. No concernente ao crime de falsidade
ideológica (art. 299 do Código Penal) atribuído aos réus, extrai-se da exordial
acusatória que emitiram, em nota de empenho (fl. 131), declaração falsa com o
intuito de alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante, qual seja, o
desvio de verba pública em proveito próprio ou alheio, como descrito acima. Em
que pese ao fato dos documentos juntados ao processo comprovarem que o
artifício narrado foi realmente utilizado pelo então Prefeito Marcos Leal Nunes e
pelo co-réu Aury, evidencia-se, igualmente, que o falso foi perpetrado apenas
para encaminhar o futuro desvio de verbas públicas. Logo, se a intenção dos
agentes era apenas alcançar o intento criminoso de maior monta, a falsidade
constituiu-se em crime-meio, que resultou no peculato, crime-fim, tendo sido por
este absorvido, motivo pelo qual a punição adstringe-se ao delito de
responsabilidade, na trilha de precedente desta Corte, cuja ementa tem o teor
seguinte: "Se o crime de falsidade ideológica constitui meio para a execução da
apropriação da verba pública, não passa ele de ato anterior impunível,
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12. resolvendo-se a concorrência de normas pela consunção" [PCR n. 359
(88.091539-0), de Tijucas, rel. Dr. Nilton Macedo Machado]. No mesmo
sentido decidiu esta Câmara no PCR n. 04.011756-6, de Piçarras, rel. Des.
Torres Marques. Em face disso, assentada a responsabilidade penal dos réus
pelo cometimento do crime descrito no art. 1º, inciso I, do Decreto-lei n. 201/67,
aplica-se-lhes as sanções correspondentes." (Processo-crime nº 2001.001960-
0, De Fraiburgo, julgado em 21/06/2005).
Convém anotar, por derradeiro, o ato de improbidade causador de prejuízo
ao erário, fere diretamente o princípio da moralidade administrativa, previsto no
art. 37 da CF/88, pois agride o senso do mais simples cidadão o fato do
administrador usar a coisa pública sem o devido cuidado e vinculado a terceiros
que agem em seu próprio benefício, o administrador aplicando mal o dinheiro
público e o particular aproveitando-se disso para enriquecimento ilícito.
II.2 – DAS PENAS E RESSARCIMENTO
A Lei nº 8.429/92, que trata da improbidade administrativa traz em seu art.
12 as possíveis sanções legais aplicáveis a este ilícito. Tendo os réus deste
processo infringido o art. 10 da referida lei, devem ser aplicadas as sanções
elencadas no inciso II do art. 12. Vejamos:
Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas,
previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade
sujeito às seguintes cominações:
[...]
II - na hipótese do art. 10, ressarcimento integral do dano, perda dos bens
ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta
circunstância, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de
cinco a oito anos, pagamento de multa civil de até duas vezes o valor do dano e
proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos
fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de
pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos;
[...]
Para aplicação das penas, deverá ser levado em conta extensão do dano
causado e o proveito obtido por cada agente.
II.2.1 – MARCOS LEAL NUNES:
Por ter sido importante responsável pela improbidade, estando no cargo
de Prefeito, ser pessoa física em exercício de função pública, o réu pode ser
condenado a todas as sanções previstas no inciso supracitado, já que não
alcançado o fato pela prescrição.
Por já se ter passado muito tempo desde os fatos, o réu não exerce mais
a função de prefeito e, portanto, não pode ser condenado à perda de função
pública, obviamente.
Como já restou comprovado, o réu foi responsável pela improbidade, e
não há óbice à suspensão dos seus direitos políticos, porém, pelo princípio da
proporcionalidade, deve ser aplicado o período mínimo determinado na lei, ou
seja, 03 (três) anos.
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13. O réu também deve ser condenado ao pagamento de multa civil de até
duas vezes o valor da remuneração percebida. Mais uma vez, observando-se a
extensão dos danos, o proveito obtido pelos agentes e a proporção solidária
entre eles, a multa aplicada será no valor de (R$ 5.000,00 - cinco mil reais).
Além disso, o réu deverá ser proibido de contratar com o Poder Público ou
receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente,
ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo
prazo de três anos.
Finalmente, é o réu condenado a indenizar o dano solidariamente com os
demais réus, no valor apontado na inicial, conforme item II 2.4 Do
Ressarcimento, adiante.
[...]
II.2.4 – Do ressarcimento:
Comprovado o dano ao patrimônio público, impõe-se a condenação ao
ressarcimento deste, com solidariedade entre os réus pois todos deram causa,
cada qual em sua esfera de ação, ao resultado danoso.
Segundo os levantamentos contábeis do Tribunal de Contas do
Estado (fl. 84), no mês de abril de 1993, foram pagos valores a maior no
montante de 830,9761 (oitocentos e trinta, nove mil setecentos e sessenta
e um) UFIRs, equivalentes à época da propositura da ação ao valor de
R$815,00 (oitocentos e quinze reais). No escopo de proferir a sentença
desde logo líquida, foram atualizados os valores acrescidos de juros
legais desde a citação resultando no montante de R$ 3.949,58 (três mil
novecentos e quarenta e nove reais e cinquenta e oito centavos) – cujo
cálculo segue em anexo. Eis o montante a ser ressarcido, evidentemente
corrigido monetariamente e acrescido de juros de mora de 1% ao mês, ambos a
partir da data desta sentença. (grifou-se)
O ilustre magistrado, como de costume, analisou os fatos de forma
vertical, exaurindo todas as alegações dos réus.
O dolo está efetivamente demonstrado.
Causa perplexidade o argumento de que não houve prejuízo ao
erário e enriquecimento ilícito de terceiro, já que esses fatos ficaram
evidenciados tanto perante o Tribunal de Contas quanto no juízo criminal, como
destacado na sentença.
No que tange às penalidades, é preciso registrar que o
sancionamento deve ser realizado à luz do princípio da proporcionalidade, sob a
ótica da proibição de excesso punitivo, em sua tríplice configuração: adequação,
necessidade e proporcionalidade em sentido estrito.
A respeito, ensina o Ministro Gilmar Mendes:
O subprincípio da adequação (Geeignetheit) exige que as medidas
interventivas adotadas mostrem-se aptas a atingir os objetivos
pretendidos. O subprincípio da necessidade (Notwendigkeit oder
Erforderlichkeit) significa que nenhum meio menos gravoso para o
indivíduo revelar-se-ia igualmente eficaz na consecução dos objetivos
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14. pretendidos. Em outros termos, o meio não será necessário se o objetivo
almejado puder ser alcançado com a adoção de medida se revele a um só
tempo adequada e menos onerosa.
Um juízo definitivo sobre a proporcionalidade da medida há também de
resultar da rigorosa ponderação e do possível equilíbrio entre o significado
da intervenção para o atingido e os objetivos perseguidos pelo legislador
(proporcionalidade em sentido estrito). (Grifou-se) (Voto-vista proferido no
RE n. 349.703, j. 3-12-2008).
A pena no âmbito da improbidade deve servir ao alcance dos fins
almejados (retribuição ao agente que cometeu o ato ímprobo e prevenção de
novos desvios); deve ser a menos gravosa apta a atingir esses fins; e deve
respeitar o equilíbrio entre o prejuízo causado à Administração e aquele que será
imposto ao agente.
O magistrado ponderou essas premissas e, a meu sentir, fixou
sanções adequadas.
Em caso semelhante, em que também foi realizada licitação para
acobertar contrato irregular prévio, esta Câmara fixou penalidades similares –
AC n. 2008.027100-5, de minha relatoria.
Voto pelo desprovimento do recurso.
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