O documento trata de uma reclamação constitucional proposta por servidores públicos municipais contra decisão judicial que condicionou o recebimento do salário mínimo à carga horária de 40 horas semanais. A ministra relatora negou seguimento à reclamação por entender que a decisão questionada não contrariou estritamente a Súmula Vinculante 16, que garante o salário mínimo sobre o total da remuneração.
1. RECLAMAÇÃO 19.446 CEARÁ
RELATORA : MIN. ROSA WEBER
RECLTE.(S) :MARIA BRAGA RUFINO E OUTRO(A/S)
ADV.(A/S) :VALDECY DA COSTA ALVES E OUTRO(A/S)
RECLDO.(A/S) :JUÍZA DE DIREITO DA VARA ÚNICA DA
COMARCA DE PENTECOSTE
ADV.(A/S) :SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
INTDO.(A/S) :SINDICATO DOS SERVIDORES MUNICIPAIS DE
PENTECOSTE - SINDSEP
ADV.(A/S) :SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
INTDO.(A/S) :MUNICÍPIO DE PENTECOSTE
PROC.(A/S)(ES) :PROCURADOR-GERAL DO MUNICÍPIO DE
PENTECOSTE
Vistos etc.
1. Trata-se de reclamação constitucional, com pedido de medida
liminar, proposta por Maria Braga Rufino e Outro(a/s), em face de decisão
proferida pelo Juízo de Direito da Vara Única da Comarca de
Pentecoste/CE, nos autos da execução de sentença 905-75.2007.8.06.0144/0,
que teria importado em violação da Súmula Vinculante 16.
Os reclamantes narram que o Tribunal de Justiça do Estado do Ceará
deu parcial provimento a recurso de apelação em mandado de segurança
para garantir aos autores, servidores públicos do Município de
Pentecostes, o recebimento do salário mínimo, independentemente da
jornada de trabalho. Afirmam ter sido negado seguimento aos recursos
especial e extraordinário manejados pelo Município, bem como aos
agravos destinados a destrancá-los. Indicam que, em fevereiro de 2014, o
Município de Pentecoste passou a cumprir o comando da decisão
executada, realizando o pagamento do salário mínimo aos servidores
para a jornada de trabalho de 20 horas semanais.
Segundo apontam, em agosto de 2014, ao apreciar petição
protocolada pela Municipalidade, nos autos da execução de sentença, a
autoridade reclamada condicionou o recebimento do salário mínimo ao
cumprimento da jornada de trabalho de 40 horas semanais. Entendem
que tal decisão teria violado a Súmula Vinculante 16, bem como o art. 7º,
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2. RCL 19446 / CE
IV, da Constituição Federal.
Conforme relatado, diante da recusa dos servidores de cumprir a
jornada de trabalho de 40 horas semanais, o Município de Pentecoste
passou a pagar remuneração equivalente a meio salário mínimo.
Invocam precedentes, nos quais esta Suprema Corte, com base na
Súmula Vinculante 16, teria firmado o entendimento de que o pagamento
de vencimentos não pode ter valor inferior ao salário mínimo,
independentemente da jornada de trabalho do servidor.
Requerem, liminarmente, a suspensão dos efeitos do despacho
proferido em 12.8.2014, nos autos da execução de sentença, no qual
determinado o cumprimento da jornada de trabalho de 8 horas diárias.
Por fim, pugnam pela cassação da decisão reclamada, “(…) que determinou
que os reclamantes trabalhassem jornada diária de 08 horas, equivalente a 40
horas semanais, para ter direito a receber como remuneração, valor igual ao
salário mínimo nacional”
Solicitadas informações, não foram recebidas, consoante certidão de
fls (e-STF, doc. 21).
É o relatório.
Decido.
2. A reclamação é ação autônoma de impugnação dotada de perfil
constitucional prevista no texto original da Carta Política de 1988 para a
preservação da competência e garantia da autoridade das decisões do
Supremo Tribunal Federal (art. 102, “l” , da Lei Maior), e a configurar,
ainda, desde o advento da Emenda Constitucional nº 45/2004,
instrumento de combate a ato administrativo ou decisão judicial que
contrarie ou indevidamente aplique súmula vinculante, aprovada, de
ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos membros
desta Suprema Corte, após reiteradas decisões sobre a matéria (art. 103-A,
§ 3º, da Magna Carta).
Dentro dessa moldura, não sendo, a reclamação, sucedâneo recursal,
inviável cogitar, nesta via processual, da alegada ofensa, por parte da
decisão reclamada, ao art. 7º, IV, da Constituição Federal.
3. Alega-se, ainda, afronta à Súmula Vinculante 16, verbis:
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“Os artigos 7º, IV, e 39, § 3º (redação da EC 19/98), da
Constituição, referem-se ao total da remuneração percebida
pelo servidor público.”
4. Para melhor compreensão da controvérsia, transcrevo o ato
impugnado:
“Trata-se de execução de sentença, onde ficara
determinado que o Município de PENTECOSTE pagará aos
servidores municipais ocupantes de cargo público (aprovados
em concurso público) que estejam percebendo vencimentos
inferiores ao mínimo legal, os vencimentos equivalentes ao
salário mínimo nacionalmente unificado.
De sorte que cabe aos servidores públicos municipais
concursados ( excetuando-se aqui, os servidores integrantes dos
cargos de magistério, bem como os servidores em cargo de
comissão ou contrato temporário), o percebimento do salário
mínimo nacional independentemente de sua jornada de
trabalho. Os servidores estão vinculados à jornada de trabalho
prevista em seus respectivos editais. Não sendo possível pela
editalidade a alteração desta jornada, não podendo haver
redução ou majoração da carga horária de trabalho de cada
servidor, que deverá obedecer o edital do concurso. Me referi
aqui à alteração unilateral da jornada de trabalho. (decisão de
fls. 508 destes autos)
Porém dos documentos juntados às fls. 602/1033, verifico
que houve alteração de carga horária dos servidores realizadas
de FORMA BILATERAL por solicitação dos próprios
servidores, através de competentes atos administrativos e com
aquiescência do Município de Pentecoste.
A Lei Municipal 538 de 20/01/2003 prevê em seu artigo 56,
§ 1º e 2º, que os servidores públicos municipais poderiam optar,
a qualquer tempo, na dependência do interesse da Prefeitura,
pela mudança de jornada de trabalho pra oito horas diárias com
os vencimentos correspondentes.
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Dos documentos colacionados, extrai-se que a opção dos
servidores fora formalizada através de suas respectivas
portarias, fls. 602/1033.
É entendimento pacífico no STJ que não há direito
adquirido a regime jurídico instituído por Lei. Assim, nada
impede que lei introduza alteração para estabelecer jornada de
trabalho de 40 horas semanais aos servidores do Município,
facultando-lhes a escolha pela jornada reduzida de 06 ou 04
horas diárias ou 08 horas diárias.
Ademais, não houve violação ao princípio da
irredutibilidade de vencimentos, posto que a sentença de fls.
12/15 determinou o pagamento de vencimentos equivalentes ao
salário mínimo, nacionalmente unificado.
Os servidores cumpriam a jornada reduzida em virtude
de resoluções anteriores à Lei n. 538, editadas pelo Município
de Pentecoste mediante os critérios de
oportunidade e conveniência, e que restaram superadas pelo
advento da nova lei. Ademais, conforme já decidido pelo
Supremo Tribunal Federal em diversas
oportunidades, não há direito adquirido dos servidores a
regime jurídico, não se justificando a continuidade da jornada
de 30 (trinta) horas semanais.
DIANTE DO QUE DETERMINO O RETORNO
IMEDIATO DE TODOS OS SERVIDORES EFETIVOS
CONSTANTES NA LISTAGEM DE FLS. 576/595, UMA VEZ
QUE TIVERAM SUAS JORNADAS DE TRABALHO
ALTERADAS PARA OITO HORAS DIÁRIAS DEVENDO
SEREM REASSUMDAS SUAS FUNÇÕES EM EXPEDIENTE
INTEGRAL.
OFICIE-SE O MUNICÍPIO DE PENTECOSTE.
OFICIE-SE TAMBÉM O SINDSEP, através de seu
Presidente. PARA QUE PROVDENCIE A DIVULGAÇÃO
DESTA DECISÃO DENTRE SEUS ASSOCIADOS, PARA QUE
AQUELES CUJOS NOMES ESTEJAM INCLUSOS NA LISTA
DAS PORTARIAS APRESENTADAS ÀS FLS. 602/1033,
REASSUMAM SUAS FUNÇÕES EM JORNADA DE 08 HORAS
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DIÁRIAS IMEDIATAMENTE, SOB PENA DF APLICAÇÃO DE
MULTA DIÁRIA NO VALOR DE RS 2.000,00 ( dois mil reais).
A Secretaria da Vara Única deverá INTIMAR as partes
para tomarem ciência desta decisão.”
5. Consoante emerge do excerto transcrito, o Juízo da Vara Única da
Comarca de Pentecoste entende que o percebimento do salário mínimo
nacional independe da jornada de trabalho, e que, em regra, os servidores
estão vinculados à jornada definida no edital dos respectivos concursos.
Concluiu, no entanto, ter ocorrido a alteração bilateral da jornada de
trabalho de parte dos servidores do Município, porquanto, nos termos da
Lei Municipal 538/2003, formalizaram a opção pela ampliação da jornada
para 8 horas.
Ressaltou não haver violação ao princípio da irredutibilidade de
vencimentos, determinando, por fim, o retorno imediato, aos respectivos
cargos, dos então exequentes, para que reassumissem suas funções “em
jornada de 8 horas diárias”.
6. Não há, na decisão reclamada, posicionamento expresso acerca da
possibilidade de o total remuneratório dos servidores ser inferior ao
salário mínimo. A autoridade reclamada se limitou a determinar, em sede
de execução de sentença, a quantidade de horas a serem cumpridas pelos
servidores municipais que, diante do novo regime jurídico, optaram pela
ampliação da carga horária de trabalho.
Já a Súmula Vinculante nº 16 dispõe que a garantia constitucional do
salário mínimo corresponde ao total da remuneração do servidor, e não
ao vencimento básico.
Impõe-se, pois, reconhecer a ausência de estrita aderência entre o ato
reclamado e o enunciado constante da Súmula Vinculante 16.
7. Sabido que a via estreita da reclamação não pode ser utilizada
para reexame do ato reclamado, porquanto não se presta à substituição
de espécie recursal, não compete ao STF, na presente ação, aferir o acerto,
ou não, do decidido, quanto à modificação da jornada de trabalho dos
reclamantes.
7. Ante o exposto, nego seguimento à reclamação (arts. 38 da Lei
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6. RCL 19446 / CE
8.038/1990 e 21, § 1º, do RISTF), restando prejudicado exame do pedido
liminar.
Publique-se.
Brasília, 09 de março de 2015.
Ministra Rosa Weber
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