Como a estratégia equivocada destrói a riqueza do acionista
1. Artigo
Como a estratégia
equivocada destrói a
riqueza do acionista
Divulgação
por Oscar Malvessi*
A punição para quem O aprendizado que o caso da Sadia fáceis e resultados ilusórios são possíveis
não adota formalmente traz tem sido perigosamente ignorado por de obter, mas podem deixar a empresa
muitas empresas tradicionais consideradas vulnerável e ser engolida.
a geração de valor ao
sólidas, mas que podem se desmanchar Vamos à análise dos fatos e seu histó-
acionista pode demorar, no ar ao primeiro sopro dos ventos de rico: o que aconteceu com a riqueza dos
mas aparece. Soluções uma crise. Lucros no curto prazo, como acionistas da Sadia? Em 1º de setembro
fáceis e resultados os trimestrais, vêm e vão; sustentáveis são de 2008, seu valor de mercado era de
ilusórios são possíveis de aqueles com foco em geração de valor R$ 7,1 bilhões. Com a notícia dos deri-
com visão de longo prazo e perenidade. vativos divulgada pela empresa em 25 de
obter, mas podem deixar
O que cria valor ao acionista, assim, é setembro de 2008, seu valor despencou,
a empresa vulnerável e a correta e consistente orientação na for- chegando, em 30 de dezembro de 2008
ser engolida mulação estratégica com decisões focadas (ou seja, em apenas três meses), a R$ 2,7
em geração de valor. Implica em uma bilhões, equivalentes a 38% do valor origi-
dedicação operacional incessante para au- nal. Diante dessa situação, procura-se res-
mentar a produtividade dos ativos, geren- ponder a questões como:
ciando com excelência cada uma das ope- • Quais os motivos para essa expres-
rações por meio da remuneração variável siva destruição de riqueza? Eles são devi-
da gestão, vinculando-a não ao lucro de dos às decisões internas da empresa ou a
um simples trimestre, mas ao mérito dos fatores externos?
resultados econômicos, ou seja, geração • Qual é o nível ideal de liquidez que
de valor a longo prazo. uma empresa deve manter? Ela deve pro-
A punição para quem não adota for- curar ser conservadora ou deve adotar
malmente a geração de valor ao acionista políticas mais agressivas ou especulativas?
pode demorar, mas aparece. Soluções • Adotar estratégias diferentes às do
Tabela 1 – Empresas: comportamento dos capitais operacionais e dos
ativos financeiros
Médias das empresas 1996/2000 1996/2007 2000/2003 2000/2007
Capitais operacionais 86% 88% 88% 89%
Ativos financeiros 14% 12% 12% 11%
Capital total 100% 100% 100% 100%
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2. mercado faz a empresa ser mais competi- financeira com características mais agressi- Sabe-se que empresas competitivas
tiva e contribui eficazmente para o cresci- vas em relação ao mercado, dado que seu mantêm-se atentas a estratégias inovado-
mento de suas operações? comportamento apresentou as seguintes ras que garantam sucesso com sustenta-
• Os resultados de uma política agres- proporções (conforme a Tabela 6): bilidade em suas atividades core business.
siva visando ganhos financeiros expres- • 46% para o patrimônio líquido (PL); Vendem-se aquelas não core, obtendo
sivos criam valor ao acionista ou podem • 26% para os financiamentos de longo como consequência aumento na riqueza
destruir sua riqueza? prazo (FLP); aos acionistas, herdeiros e stakeholders.
• É uma estratégia de sucesso a em- • 28% para os financiamentos de curto Analisando-se o comportamento histó-
presa manter, por um período superior a prazo (FCP). rico das demonstrações financeiras publi-
12 anos, valores investidos no mercado Se compararmos que naquele período cadas (Balanço Patrimonial, Resultados e
financeiro que equivalem a 36% do valor a Sadia tinha 64% do capital empregado Fluxo de Caixa), parece que a Sadia, na rea-
do seu capital empregado? investido nas atividades operacionais lidade, acabou por montar uma armadilha,
• É sustentável manter somente 64% (Tabela 2) em contraste com a estrutura de que foi imperceptível para ela própria.
do capital nas suas atividades operacionais capital de 72% (PL + FLP), é possível con- Como isso foi possível? Será que ocor-
e, ao mesmo tempo, adotar níveis superio- cluir que a Sadia dispunha de recursos mais reu algo totalmente inesperado? Todos
res de alavancagem financeira? do que suficientes para bancar os investi- sabem que, em negócios, as relações entre
• Será que obter receitas financeiras mentos necessários do capital operacional. os níveis de risco-retorno são indissolúveis.
expressivas é a melhor alternativa de Portanto, será que havia necessidade Sua análise, controle, definição e formas
ganhos, quando comparado aos resul- de manter e ainda assim buscar emprésti- de mitigar o nível de exposição da em-
tados das atividades operacionais, as ati- mos de curto prazo no nível de 28% das presa aos diversos riscos são opções dos
vidades core? obrigações totais e, ao mesmo tempo (vide gestores de cada empresa.
• São os ganhos financeiros ou os resul- Tabela 6), aplicar no mercado financeiro, A notícia divulgada pela Sadia nos jor-
tados operacionais (foco no core business) mantendo ativos financeiros no valor equi- nais em 25 de setembro de 2008 comu-
que criam valor ao acionista? valente a 36% dos ativos totais? (Tabela 2.) nicando sua exposição nas operações em
Diante dessas relações, percebe-se que derivativos “tóxicos” e relatando, na opor-
O nível de informações da estrutura alavancar financeiramente a empresa vi- tunidade, um prejuízo financeiro na ordem
das demonstrações financeiras sando obter receitas financeiras a qualquer de R$ 760 milhões surpreendeu tanto os
Respostas às perguntas podem ser custo foi um objetivo desejado. Esse fato analistas quanto os investidores menos
obtidas pela análise criteriosa do compor- ficou demonstrado pela excessiva atenção informados sobre os fundamentos da Sadia.
tamento das demonstrações financeiras dada aos resultados das operações finan- Sinalizou uma situação delicada, uma
pela estrutura dos seus ativos, passivos e ceiras (conforme a Tabela 3). Assim, pode- imensa perda originada no risco de suas
resultados da Sadia publicados no período se também inferir que houve maior dire- atividades financeiras que, até então, não
de 1996 a 2007. cionamento ao financeiro em detrimento tinham sido percebidas por não estarem
Avaliados com base na análise finan- das atividades operacionais. transparentes nas demonstrações financei-
ceira tradicional, podem ser considera- Assim sendo, será que a vocação da ras, nem mesmo em suas notas explica-
dos adequados os resultados, entretanto, empresa ficou dividida? tivas2. Também apontou que a estratégia
quando se decompõem os lucros totais da Qual foi a importância dada às ativida- adotada pela gestão da Sadia estava focada
Sadia, identifica-se que as receitas finan- des operacionais em face do impacto recor- no financeiro, entendendo-se que seus re-
ceiras contribuíram em média com 43% e rente dos resultados financeiros obtidos? sultados poderiam estar sub judice, uma vez
os resultados das atividades operacionais, Será que os gestores imaginaram que que naquele comunicado estava exposto
somente com 57%1. poderiam criar valor ao acionista se dedi- um potencial de risco financeiro que já
Pode-se concluir que o direciona- cando a outras atividades que não o seu estava assumindo, enfim, a vocação finan-
mento estratégico da Sadia foi alocar, de core business? ceira em contraste com as atividades core.
maneira mais significativa do que a média
das empresas, seus recursos para aplica-
Tabela 2 – Sadia: comportamento dos capitais operacionais e dos
ções financeiras. Este viés foi ainda mais
ativos financeiros
expressivo no período de 1996 a 2000.
Comportamento da alavancagem Sadia 1996-2000 1996-2007 2000-2003 2000-2007
financeira e do capital empregado Capitais operacionais 68% 64% 62% 63%
Observa-se, no período de 1996 a Ativos financeiros 32% 36% 38% 37%
2007, que a estrutura de financiamento Capital total 100% 100% 100% 100%
da Sadia possuía um nível de alavancagem
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3. Artigo
As informações obtidas das essa distância fica ainda maior no período tamento dos recursos aplicados pelas
demonstrações financeiras das de 2006 a 2008, quando a Perdigão reage empresas da amostra e na Tabela 2 pela
empresas apresentam evidências com sua estratégia, obtendo um cresci- Sadia. O capital operacional refere-se ao
de comportamento mento operacional de suas vendas líquidas capital de giro operacional mais os ativos
O desfecho e a abertura das informa- 73% superior ao da Sadia. não circulantes e os “ativos financeiros”
ções das demonstrações financeiras publi- Dessa forma, o comportamento e o ao valor das disponibilidades e aplica-
cadas poderão ser entendidos com maior crescimento operacional comparados entre ções financeiras.
profundidade por meio dos dados histó- as duas empresas expõem o direciona- Nessa tabela, observa-se que, entre
ricos atualizados, compreendendo o pe- mento e a estratégia adotada pela Sadia, 1996 a 2000, logo após o Plano Real, as
ríodo de 1996 até 2007, de acordo com uma vez que as atividades financeiras his- empresas tinham, em média, do capital
a análise das Tabelas de 1 a 7, em que toricamente sempre tiveram participação total empregado, 14% dos seus recursos
se demonstram as evoluções, as composi- relevante nos seus negócios. Essa situação em ativos financeiros e 86% nas suas ati-
ções, os contrastes e seu comportamento deve ter proporcionado tanto aos gestores vidades operacionais, tendo, no período
econômico-financeiro no tempo. quanto aos acionistas o entendimento de de análise de 2000/2007, diminuído a
Assim, considerando-se o ocorrido, que a empresa sabia ganhar dinheiro com proporção de ativos financeiros para 11%,
pode-se inferir que houve uma excessiva o financeiro, ou seja, contabilmente ganha- aumentando a proporção dos capitais ope-
confiança nos resultados históricos obtidos vam mais dinheiro nas atividades financei- racionais para 89% do capital investido.
pelas operações financeiras. Esse fato não ras que na própria atividade operacional. Assim, comparando o comportamento
deve ter sido captado pelos modelos de Analisando-se as evidências empíricas médio das empresas com o da Sadia da
riscos utilizados ou mesmo pelo nível de constantes do banco de dados3 e com- Tabela 2, observa-se que, historicamente, a
governança corporativa da empresa, ins- parando-as com as da Sadia, foi possível Sadia esteve sempre exposta com índices
trumentos que no seu conjunto se revela- identificar algumas informações relevantes de aplicação de recursos em ativos finan-
ram falhos e inseguros, tendo como resul- e de comportamentos distintos. Assim, as ceiros expressivamente altos, variando de
tado perdas financeiras muito expressivas informações da Sadia podem ser com- 32% a 37% e com índices de aplicação de
e, por consequência, destruição relevante paradas e contrastadas com as das 35 recursos nas suas atividades operacionais
da riqueza do acionista. empresas do estudo atualizado para o ano oscilando de 68% a 63%, somente.
Percebe-se, inclusive, que as comple- de 2007, como pode ser observado nas Contrastando-se o comportamento da
xidades dos instrumentos financeiros se tabelas comparativas a seguir, em que se Sadia com o da média das empresas, veri-
intensificaram mais do que a capacidade decompõem a análise e o comportamento fica-se a expressiva diferença nos índices
técnica e operacional dos seus gestores das empresas em quatro períodos distin- de aplicação de recursos em ativos finan-
em administrá-los. tos, iniciando-se em 1996. ceiros e sua preferência e opção estratégica
A fragilidade e o risco financeiro incor- A primeira comparação está demons- pelas aplicações financeiras em detrimento
rido em suas decisões financeiras em meio trada na Tabela 1. Refere-se ao compor- do investimento em ativos operacionais.
às turbulências dos mercados levaram a
Sadia a um nível inesperado de endivida- Tabela 3 – Sadia: comportamento do lucro operacional e das
mento no curto prazo, um excessivo e peri-
receitas financeiras
goso nível de alavancagem financeira. Esse
endividamento surgiu das expressivas per-
das financeiras dos contratos de derivativos Sadia 1996-2000 1996-2007 2000-2003 2000-2007
“tóxicos”, ocasionando progressiva perda Lucro operacional 44% 57% 52% 60%
do valor de mercado da companhia, uma Receitas financeiras 56% 43% 48% 40%
vez que, em 30 de dezembro de 2008, a Resultado total 100% 100% 100% 100%
Sadia valia somente 38% do seu valor de
três meses antes (1º de setembro de 2008).
Embora anteriormente a Sadia tenha
crescido em suas atividades operacionais, Tabela 4 – Empresas: comportamento do lucro operacional e das
observa-se que, no período de 2000 a receitas financeiras
2005, ela não conseguiu crescer em ven-
das líquidas mais que a sua concorrente, a Médias das empresas 1996-2000 1996-2007 2000-2003 2000-2007
Perdigão. Nessa fase, a Sadia perdeu 15% Lucro operacional 66% 82% 81% 86%
do crescimento das vendas. Receitas financeiras 34% 18% 19% 14%
Entretanto, quando se analisa o com- Resultado total 100% 100% 100% 100%
portamento do crescimento de vendas,
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4. Essa diferença representa um índice 226% ceiros, a 11% no período de 2000 a 2007. representava 44%, os financiamentos de
superior em ativos financeiros. Assim, os níveis observados de lucro L. P., 19% e os financiamentos de C. P.,
Assim, avaliando-se os percentuais des- operacional e das receitas financeiras 37%, embora os recursos aplicados nos
tinados à produção com a aplicação finan- denotam a grande diferença entre o com- ativos financeiros equivalessem a 32% do
ceira e o desempenho que esses capitais portamento da Sadia e o das empresas. capital (vide a Tabela 2).
trouxeram aos resultados, é possível de- Percebe-se que as empresas deixam claro É possível verificar uma mudança no per-
monstrar que não houve sustentabilidade a consistência das suas políticas e estraté- fil e na composição dos financiamentos da
econômico-financeira da empresa e que gias, estando apropriadas e em consonância Sadia (2000/2007), a qual, embora alavan-
houve sim destruição da riqueza acionista. com a política de investimentos em ativos cada e agressiva, apresenta a seguinte estru-
A Tabela 3 demonstra o comporta- voltados às atividades operacionais, soma- tura: o P. L. foi para 46%, os financiamentos
mento histórico dos resultados totais da das a níveis mais conservadores em aplica- de L. P., para 28% e os de C. P. diminuíram,
Sadia e as proporções, em cada período, ções de curto prazo em ativos financeiros. passando a representar 26%, apesar de que
entre o lucro operacional e as receitas Sabe-se que o uso da alavancagem os recursos investidos nos ativos financeiros
financeiras obtidas. financeira mais agressiva ou conservadora terem aumentado para 37%.
No período de 1996 a 2000, constata- e suas relações risco-retorno são definidos Nota-se que o endividamento de curto
se que as receitas financeiras da Sadia pelos gestores da companhia, portanto, prazo da Sadia sempre foi o dobro da
chegaram a representar 56% do total dos define-se a política e são determinados os média das empresas, apontando um dife-
seus lucros, em comparação aos 34% nas níveis de recursos próprios e de terceiros. rencial expressivo de risco e relevante dife-
médias das empresas, diminuindo para Na Tabela 5, se observa que a média rença no nível da alavancagem financeira.
40% no período de 2000 a 2007. das empresas apresenta um comporta- Diante desses dados, cabe questionar:
Fica evidente que esse comportamento mento apropriado e constante nos perío- como seriam os ganhos efetivamente líqui-
sempre foi excessivamente superior e dis- dos analisados, indicando a importância e a dos das receitas financeiras da Sadia se eles
tante das médias das empresas, porque, coerência da política de alavancagem finan- fossem reanalisados com o foco na meto-
nelas, as receitas financeiras estiveram em ceira e o equilíbrio da estrutura de capital, dologia de Criação de Valor ao Acionista
18% no período de 1996 a 2007, caindo, dadas as relações risco-retorno assumidas. ou VEC®? Será que eles seriam iguais aos
no último período, para 14%, de acordo Já na Tabela 6, os dados demonstram divulgados pelas demonstrações financeiras
com a Tabela 4. que a Sadia possuía uma alavancagem fi- publicadas quando se usa a análise tradicio-
Constata-se que os resultados da nanceira mais agressiva e uma estrutura de nal de indicadores financeiros?
Tabela 4 estão alinhados com o comporta- capital em que a composição do P. L. era Com os dados publicados, pode-se
mento dos recursos aplicados pelas médias inferior, em torno de um terço do mesmo verificar que o montante das receitas
das empresas observados na Tabela 1, na índice, quando comparada com as médias financeiras acumuladas durante o pe-
qual se verifica que os capitais operacionais das empresas (Tabela 5). ríodo de 2000/2008 foi mais que sufi-
corresponderam a 89% e os ativos finan- Entre 1996 e 2000, o P. L. da Sadia ciente para suportar as perdas em 2008.
Numa análise simples comparando a
Tabela 5 – Empresas: comportamento da estrutura de financiamento soma das receitas financeiras acumula-
das e o valor das perdas financeiras com
entre o capital próprio e o de terceiros
as operações dos derivativos “tóxicos”,
Médias das empresas 1996-2000 1996-2007 2000-2003 2000-2007 haveria um ganho contábil de aproxima-
Patrimônio líquido 62% 62% 57% 61% damente R$ 1,5 bilhão. Mas cabe salien-
Endividamento LP 22% 24% 26% 26%
tar que esse cálculo é somente uma ex-
pressão contábil que não representa o
Endividamento CP 16% 14% 17% 13%
verdadeiro lucro econômico.
Obrigações totais 100% 100% 100% 100%
Com certeza, essa não é a melhor ou
a mais correta forma técnica de se apurar
o resultado econômico de uma operação,
Tabela 6 – Sadia: comportamento da estrutura de financiamento tanto é que ela mostra um resultado enga-
noso, falso e ilusório.
Sadia 1996-2000 1996-2007 2000-2003 2000-2007 Quando se adotam conceitos contem-
Patrimônio líquido 44% 46% 41% 46% porâneos de finanças corporativas, uma
Endividamento LP 19% 26% 25% 28% das melhores opções disponíveis de men-
Endividamento CP 37% 28% 34% 26% suração é a aplicação da metodologia da
Obrigações totais 100% 100% 100% 100% Criação de Valor ao Acionista4.
Dessa maneira, os resultados gerados
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5. Artigo
serão muito diferentes daqueles publicados por R$ 5,0 bilhões deste crescimento. A operação de associação da
pelas demonstrações financeiras (Tabela 3), Já o montante de R$ 4,7 bilhões de Perdigão com a Sadia
uma vez que o método sugerido propor- despesas financeiras do ano de 2008 Assim, após muitas negociações, surge
ciona uma mensuração verdadeira, eficiente representou o equivalente a quatro anos o fato relevante publicado no dia 20 de
e transparente do que realmente acontece de geração futura do Ebitda. maio de 2009 comunicando a associação
com o resultado econômico da empresa. Portanto, o reflexo da estratégia ado- entre a Perdigão e a Sadia, resultando na
Quando se aplica a Criação de Valor tada pela Sadia se traduziu rapidamente nova empresa, a BRF – Brasil Foods S.A.,
ao Acionista, apura-se o valor efetivo dos em uma alavancagem financeira de curto com negociação das ações no Novo Mer-
resultados operacionais, ou seja, o verda- prazo sem precedentes e uma destruição cado da Bovespa.
deiro lucro econômico de uma empresa. de riqueza do acionista enorme espelhada Como resultado da operação, efetuou-
Buscam-se respostas claras para per- no seu novo valor de mercado em dezem- se a incorporação das ações da Sadia pela
guntas como: bro de 2008. BRF, com uma relação de substituição de
• As receitas financeiras líquidas obti- Assim, o reflexo da fragilidade finan- ações correspondente a 0,132998 ação
das pela aplicação dos ativos financeiros ceira percebida pelo mercado e demons- ordinária de emissão da BRF para cada
conseguem remunerar o custo do capi- trada pela Sadia com a publicação das de- ação ordinária ou preferencial de emissão
tal (WACC) da empresa, criam ou des- monstrações financeiras de dezembro de da Sadia.
troem valor? 2008 pode ser avaliada observando-se o Com a troca de ações definidas e efe-
• As receitas financeiras obtidas supor- comportamento de algumas contas como: tuadas entre as companhias, restou para a
tam os impostos sobre a receita e o Im- a) Tinha um P. L. de R$ 3,2 bilhões em Sadia ser minoritária com somente 32%
posto de Renda? dezembro de 2007, caiu para R$ 411 milhões do capital na nova BRF e os acionistas da
• Os resultados financeiros encontra- em função do elevadíssimo prejuízo de 2008; Perdigão ficaram com a ampla maioria, ou
dos são os contábeis ou são efetivamente b) O endividamento financeiro em 68% das ações ordinárias.
econômicos, Criam Valor ao Acionista? 2007 era de R$ 3,7 bilhões, cresceu de Analisadas essas informações e dada a
Portanto, conclui-se que o impacto das forma vertiginosa para R$ 11,3 bilhões, operação concretizada, faz-se necessário
receitas financeiras nos resultados da Sadia principalmente em função das operações refletir sobre qual é o conhecimento e
destruiu de forma expressiva o valor e a dos derivativos em 2008; aprendizado que o caso da Sadia traz.
riqueza do acionista. c) O resultado financeiro era positivo Conclui-se que somente com a análise
Agora, comparando-se as informações em R$ 132 milhões em 2007, cresceu do comportamento histórico estruturado
anteriores com as mais recentes publicadas expressivamente para R$ 3,9 bilhões de e criterioso foi possível desvendar as deci-
pela companhia (12/2007, 3° Trim./2008 despesas financeiras líquidas em 2008; sões e avaliar o impacto que ocasionaram
e 12/2008), percebe-se, no item “a” da d) O lucro líquido foi de R$ 768 na destruição da riqueza dos acionistas.
Tabela 7, a relevante transformação que milhões em 2007, representando um Análises com consistência estratégica
houve no comportamento quanto aos re- lucro por ação de R$ 1,14, entretanto, o em finanças corporativas exigem conhe-
sultados operacionais quanto nas receitas prejuízo de 2008 alcançou o expressivo cimento, atualização, profundidade téc-
financeiras, em que novamente ela cres- valor negativo de R$ 2,5 bilhões ou um nica e períodos longos de avaliação, em
ceu significativamente no 3º trimestre de prejuízo por ação de R$ 3,69. vez de lucros no curto prazo, como os
2008 e em dezembro de 2008, mas em
detrimento dos respectivos resultados core,
que diminuíram ao invés de aumentar. Tabela 7 – Sadia: comportamento dos resultados e da estrutura de
Mas a grande transformação da perda financiamento de 2007 e 2008
da Sadia com os derivativos “tóxicos” está
na nova estrutura de financiamento. Con- Sadia 12/2007 3º Trim./2008 12/2008 Var. 2007-2008
forme o item “b” da Tabela 7, o P. L. caiu
a) Resultados
de 54% em 2007 para somente 17% em
Lucro operacional 82% 62% 46% -43,4%
2008, ao mesmo tempo em que houve
Receitas financeiras 18% 38% 54% 198,0%
um expressivo crescimento no endivida-
Total 100% 100% 100%
mento de curto prazo, de 14% para 49%.
Quando se analisa esse mesmo im- b) Estrutura de financiamento
pacto em termos monetários, nota-se que
Patrimônio líquido 54% 35% 17% -68,2%
o endividamento de L. P. da Sadia cresceu Endividamento LP 32% 33% 34% 6,9%
em R$ 6,6 bilhões, saindo de R$ 3,9 bilhões Endividamento CP 14% 32% 49% 250,0%
em 2007 para R$ 10,5 bilhões em 2008; já Obrigações totais 100% 100% 100%
o endividamento de C. P. foi responsável
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6. trimestrais, que vêm e vão. Notas
É pré-condição para enfrentar os cres-
centes desafios decisões estratégicas com
um processo estruturado e organizado 1
Todos os valores e percentuais apresentados neste texto estão atualizados para moeda
na busca incessante de crescimento sus- constante. Foram estruturados com a abordagem conceitual do lucro econômico, foco na meto-
tentado, com inovação diferenciada, ava- dologia VEC® – Valor Econômico Criado ou Criação de Valor ao Acionista.
liando o risco, a alavancagem operacional VEC® é marca registrada da Oscar Malvessi Consultoria em Valor.
e financeira, aliados a uma forte cultura de 2
Somente após o ocorrido, as demonstrações financeiras de dezembro de 2008 revelaram nas
gestão orientada para valor e não a meros notas explicativas a situação dos contratos de derivativos e os respectivos registros das obriga-
ções e suas perdas financeiras de maneira transparente, agora evidenciando e qualificando os
lucros ou Ebitda.
tipos de operações envolvidas.
Assim, governança corporativa5, a dura
3
O banco de dados utilizado foi a quinta atualização da Tese de Doutorado de Oscar Malvessi
disciplina no bom gerenciamento das ati-
(FGV-Eaesp-2001), sobre o tema “Criação de Valor ao Acionista – A Experiência das Empresas
vidades operacionais, com pessoas treina-
de Capital Aberto no Brasil”.
das e motivadas, com decisões focadas em 4
Ou Valor Econômico Criado (VEC®). Denominação utilizada na Tese de Doutorado (FGV-
geração de valor, deverão se traduzir na Eaesp-2001) de Oscar Malvessi, em artigos, reportagens publicadas e trabalhos, visando expres-
busca da excelência em produtividade dos sar o uso da metodologia de Criação de Valor ao Acionista. Esse conceito é conhecido por Eco-
ativos e dos capitais empregados. nomic Profit ou Lucro Econômico e pela sigla EVA™ (Economic Value Added ou Valor Econômico
Entretanto, é condição relevante o dire- Adicionado).
cionamento e mudança da cultura para a 5
Governança corporativa: o tema é amplamente tratado no novo código de melhores práticas
remuneração com mérito, ou seja, a remu- de governança corporativa do IBGC, em www.ibgc.org.br.
neração variável aos gestores vinculada
não ao lucro de um mero trimestre, mas
à geração de valor a longo prazo, fatores
Bibliografia
primordiais que, se bem definidos e orien-
tados, podem garantir a sustentabilidade, a
perenidade e o sucesso de uma empresa.
• BRIGHAM, E. F.; EHRHARDT, M. C. Financial management: theory and practice. 13. ed. South-
O risco e a provável perda de valor
Western Learning, 2010.
da empresa no mercado para aqueles que
• COPELAND T., KOLLET T, & MURRIN J. Valuation – Measuring and managing the value of Com-
desconsideram os fundamentos econômi-
panies. 3. ed. New York: John Wiley & Sons, Inc. 2000;
cos da Criação de Valor ao Acionista e não
• DAMODARAN, A. Avaliação de empresas. 2. ed. São Paulo: Pearson Education do Brasil
tomam providências em tempo são laten- Ltda., 2002.
tes. Empresas consideradas extraordinárias
• HIGGINS, R. C. Análise para administração financeira. 8. ed. Rio de Janeiro: McGraw-Hill
também tropeçam e podem tomar deci- Ltda., 2008.
sões equivocadas, levando-as ao declínio.
• IBGC – Instituto de Governança Corporativa. Código das melhores práticas de governança
Assim, a punição para aqueles que des- corporativa. 4. ed. São Paulo. IBGC. 2009.
considerarem a Criação de Valor ao Acio-
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nista pode demorar, mas o desenrolar dos SP, n. 93, dez. 2005.
fatos comprovam essa necessidade.
• MALVESSI, O. É o EBITDA um bom indicador para a gestão financeira e útil para a remuneração
variável nas empresas? Revista IBEFNews-SP, n. 102, dez. 2006.
• MALVESSI, O. EBITDA: será esse um bom indicador para a gestão financeira e útil para a
remuneração variável nas empresas? RI – Relações com Investidores, Rio de Janeiro, n. 96, fev.
2006. Obs.: A pauta da edição desta revista é: “Celeuma Contábil EBITDA – Qual o Valor dessa
Métrica?” Foram publicados ao todo quatro artigos sobre o EBITDA.
• MALVESSI, O. Gestão financeira: EBITDA é bom indicador. Gazeta Mercantil, São Paulo, 8
jun. 2006.
* Oscar Malvessi, sócio titular da firma de • MARTIN, J. D.; PETTY, J. W. Value based management. The corporate response to the sharehol-
consultoria especializada em Criação de der revolution. Boston. Harvard Business School Press. 2004.
Valor – Oscar Malvessi Consultoria em Valor.
• MARTINS, E. (Org.). Avaliação de empresas: da mensuração contábil à econômica. São Paulo:
Professor adjunto de Finanças Corporati-
Atlas, 2001.
vas na FGV-Eaesp, coordenador do curso de
F&A no GVPEC-Eaesp e pesquisador sênior • PALEPU, K. G.; HEALY, P. M.; BERNARD, V. L. Business analysis & valuation: using financial
do GVcepe – Centro de Estudos em Private statements. 3. ed. Thomson South-Western, 2004.
Equity e Venture Capital da Eaesp (e-mail: • STEWART,III G. B. The Quest for Value. A guide for senior managers. New York: Harper
oscar@oscarmalvessi.com.br). Business, 1991.
IBEF NEWS • Agosto 2010
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