O texto argumenta que o termo "excluídos" não é apropriado para se referir aos moradores de favelas e bairros pobres, já que eles nunca estiveram incluídos entre as classes mais abastadas. A desigualdade social é resultado do sistema econômico capitalista, que concentra riqueza e dificulta a ascensão dos mais pobres, e não de decisões pessoais de excluir certos grupos.
2.
Titulo: antecipa ao leitora questão que será analisada
no texto ( exclusão social)
Por que considerar "excluídos" aqueles que nunca
estiveram de fato "incluídos"?
Olho: explicita a perspectiva analítica que será
defendida pelo autor. No caso, Ferreira Gullar discorda
do uso do termo “excluídos” para fazer referencia a
moradores de bairros carentes.
Exclusão social, o que é
isso?
3. O autor do olho não costuma ser o articulista e sim o
editor do jornal ou revista onde o texto será publicado.
DE ALGUM tempo para cá, a parte da sociedade que mora
em favelas e bairros pobres é qualificada como "excluída".
Ou seja, os moradores da Rocinha e do Vidigal, por
exemplo, não vivem ali porque não dispõem de recursos
para morar em Ipanema ou Leblon, e sim porque foram
excluídos da comunidade dos ricos.
4.
E eu, com minha mania de fazer perguntas
desagradáveis, indago: mas alguma vez aquele
pessoal da Rocinha morou nos bairros de classe
média alta e dos milionários? Afora um ou outro que
possa ter se arruinado socialmente ou que tenha
optado por residir ali, todos os demais foram levados
a isso por sua condição econômica ou porque ali
nasceram. Então por que considerá-los "excluídos",
se nunca estiveram "incluídos"?
5.
1º parágrafo: contextualização da questão que será
analisada. Início da análise do autor pelo uso de
termos associados a 1ª pessoa do singular.
O parágrafo termina com a explicitação de uma
pergunta retórica que define a questão central a ser
respondida pela análise argumentativa apresentada
no texto.
6.
É interessante observar como a argumentação
construída por Ferreira Gullar se apoia em sua série
de perguntas retóricas.
7. No meu pouco entendimento, excluído é quem pertenceu a uma
entidade ou a comunidade e dela foi expulso ou impedido de
nela continuar. Quem nunca pertenceu às classes remediadas ou
abastadas não pode ter sido excluído delas. Mais apropriado
seria dizer que nunca foi incluído. Ainda assim, se não me
equivoco, incorreríamos em erro. Senão, vejamos: a Rocinha, o
Vidigal, o Borel e a favela da Maré fazem parte da cidade do Rio
de Janeiro, não fazem? Seria correto afirmar, então, quer seja do
ponto de vista urbanístico, quer do demográfico e social, que o
Rio são apenas os bairros em que reside a parte mais abastada da
população? Se fizermos isso, então, sim, estaremos excluindo
parte considerável do território e da gente que constitui a cidade
do Rio e que, portanto, pertence a ela.
8.
2º Parágrafo: Ferreira Gullar começa a desenvolver sua
argumentação por meio do raciocínio: analisa o sentido
que o termo excluído tem originalmente, para
demonstrar que não é possível considerar “excluído”
quem nunca foi “incluído”.
Uma nova pergunta retórica é introduzida, para que o
leitor compreenda melhor as razões que levam o autor a
rejeitar a designação de excluídos para os moradores de
bairros pobres.
9.
A análise é retomada, para dar prosseguimento à
argumentação por raciocínio lógico iniciada neste
parágrafo.
Argumentação por raciocínio lógico: o autor do texto
busca demonstrar, por meio da criação de nexos causais
( relações de causa e efeito ) que a conclusão a que
chegou é necessária, e não fruto de uma interpretação
pessoal facilmente contestável.
10. Consideremos agora a questão de outro ponto de vista. Nos
morros e favelas da cidade residem cerca de 1 milhão de
pessoas, que têm vida social ativa, pois
trabalham, estudam, participam de organizações comunitárias e
recreativas. A maioria delas trabalha fora de sua comunidade, no
comércio, na indústria, no serviço público, ou desenvolve
atividade informal. Logo, participa da vida econômica, cultural e
esportiva da cidade. Em que sentido, então, essa gente estaria
excluída? Não resta dúvida de que as famílias faveladas, na sua
ampla maioria, vivem em condições precárias, tanto no que se
refere ao conforto domiciliar quanto à alimentação, às condições
de higiene e saneamento, educação, saúde e segurança. Mas não
estão excluídas da preocupação dos políticos que, na época das
eleições, vão até lá em busca de votos
11.
Há, nessa comunidade, cabos eleitorais, pessoas que atuam
em associações de bairro e fazem a ligação com os centros
políticos de poder. É certo que a grande maioria dessa
gente não participa da vida política, mas isso ocorre
também com as demais pessoas, morem onde morarem.
Por todas essas razões, somos obrigados a concluir que os
pobres e favelados estão incluídos na vida
econômica, social e política da sociedade.
12.
3º parágrafo: proposição de uma nova perspectiva de
análise. Ferreira Gullar continua a recorrer a
construção de relações de causa e consequência para
convencer o leitor, baseando-se em novo argumento
por raciocínio lógico: se, nos bairros onde moram os
ditos “excluídos”, há quase 1 milhão de pessoas que
participam da vida econômica, cultural e esportiva
da cidade, então não podem ser consideradas
excluídas.
13. Uma terceira pergunta retórica aparece no texto, agora
para fazer com que o leitor chegue à mesma conclusão
do articulista sobre a participação intensa dessas pessoas
em todas as esferas da vida na cidade. A argumentação
por raciocínio lógico é retomada e inclui alguns
exemplos de aspectos que a vida dos moradores de
bairros de periferia carece de condições semelhantes às
desfrutadas por moradores de outros bairros.
14.
Essa concessão argumentativa é feita para evitar um
possível contra-argumento que procure justificar
considerá-los “excluídos” por que não vivem nas
mesmas condições das pessoas que moram em bairros
de maior prestígio.
O parágrafo termina com a afirmação da tese inicial.
15.
No entanto, isso não significa que estejam em pé de
igualdade com as pessoas das classes médias e ricas. Não
estão e, na sua grande maioria, descendem de gerações de
brasileiros que tampouco gozaram dessa igualdade. Muitos
descendem de antigos escravos e de brancos pobres
que, pela carência de meios e pela desigualdade que rege o
processo social, jamais tiveram possibilidade de ascender
econômica e socialmente. Eles não foram excluídos
simplesmente porque jamais estiveram incluídos entre os
mais ou menos privilegiados.
16.
4º parágrafo: o autor do texto expande a análise que
faz das diferenças entre moradores de bairros mais
pobres e mais ricos. Introduz, como argumento para
sustentar o raciocínio apresentado, informações de
natureza histórica. É possível observar, portanto, que
a argumentação por raciocínio lógico pode se apoiar
em exemplos.
17.
(como no 3º§) ou recorrer ao resgate de informações
históricas a serem apresentadas ao leitor como
“prova” do que se afirma. É com base nessas
informações que a tese inicial, referida no olho, é
reafirmada.
18.
Por que, então, cientistas políticos, sociólogos e jornalistas,
entre outros, falam de exclusão social? Por ignorância não
será, já que todos eles estão a par do que, bem ou mal,
tentei demonstrar aqui. Creio que, consciente ou
inconscientemente, procura-se levar a sociedade a pensar
que a desigualdade social não é consequência de fatores
objetivos, do sistema econômico, mas sim resultado da
deliberação de pessoas cruéis que empurram os mais fracos
para fora da sociedade e os condenam à miséria.
19.
5º parágrafo: introduzido pela quarta pergunta
retórica, que encaminha à reflexão do leitor do texto
para aquilo que Ferreira Gullar vai apresentar como
verdadeira razão para o uso da expressão “exclusão
social”. A análise continua a ser desenvolvida por meio
de raciocínio lógico.
20. Em vez de admitir que esse sistema, por visar acima de tudo o
lucro e ser, por definição, concentrador da riqueza, é que
dificulta, ainda que não impeça, a ascensão dos mais
pobres, procura-se fazer crer que a desigualdade é fruto de
decisões pessoais. Ignora-se que, no sistema capitalista, quem
não tem emprego também está incluído nele, como exército de
reserva de mão-de-obra, com a função de pressionar o
trabalhador e limitar-lhe as reivindicações. A eliminação da
miséria beneficia o sistema pois amplia o mercado consumidor.
O empresário pode ser, como você ou eu, bom ou mau, generoso
ou sovina, mas, como disse Marx, "o capital governa o
capitalista". O problema está no sistema, não nas pessoas.
21. 6º parágrafo: o autor identifica os fatores que mantêm a
desigualdade social observada no país. Está preparando o
terreno em termos argumentativo, para trazer ao texto a
contribuição, por meio de um argumento por citação, de
uma autoridade no estudo das relações de poder ao longo
da história da humanidade: Karl Marx. Com base nessa
citação e no raciocínio desenvolvido até este momento,
Ferreira Gullar expõe a tese principal de seu artigo:
22.
O problema da sociedade não está nas pessoas
(“excluídas”) e sim no sistema capitalista que produz tal
exclusão para favorecer o ganho de capital.