O documento discute como o modelo de educação atual, com professor, sala de aula e livros, foi sobrecarregado ao longo do tempo com novas tarefas sem mudanças significativas. Uma inovação disruptiva no setor educacional poderia focar na aprendizagem individual ao invés do ensino, usando diagnósticos e ferramentas adequadas para cada estudante.
Inovação disruptiva pode transformar o setor de educação
1. opinião
Kip Garland
kgarland@iseed.com.br
Foto: Ricardo Benichio
Kip Garland é
professor da é difícil, mas valE a pEna
E
fundação dom
cabral, fundador
da innovationseed. u já escrevi nesta coluna sobre o conceito de inovação No começo do século 20, com a transformação industrial em
escreve mensalmente
na crn brasil disruptiva, que é o tipo mais difícil para empresas já es- pleno vapor, foi dada uma nova tarefa a este padrão educacional:
tabelecidas. Isso porque ela começa com produtos mais formar trabalhadores e ensinar habilidades básicas (alfabetiza-
simples, com lucros menores, em mercados piores. Com- ção, cálculos etc). O importante a notar é que o modelo acrescen-
panhias bem situadas simplesmente não conseguem prio- tou esta tarefa em cima da tarefa anterior (formar cidadãos). E
rizar projetos “piores”, em cima de oportunidades de in- agora tinha que cumprir duas funções!
vestir em melhorias no negócio principal, que normalmente Depois do término da segunda guerra mundial, com tan-
tem retornos mais expressivos, com menos riscos. Porém, há tos homens voltando de guerra que precisavam ser empre-
vários estudos que comprovam que é a inovação disruptiva que gados, foi dada mais uma tarefa fundamental ao modelo de
criou quase todas as grandes oportunidades de criação de nova educação. As escolas expandiram suas matérias para incluir
riqueza econômica. Resumindo a ópera: inovação disruptiva é artes, música, esportes e até profissões técnicas e domésticas
muito difícil, mais vale a pena. (no colégio, eu mesmo tive que fazer cursos de costura, cozi-
O setor de educação nos dá um exemplo ótimo para olhar as nha, mecânica etc, em paralelo aos cursos de preparação para
possibilidades e talvez seja o setor mais importante para o futuro faculdade). De novo, esta nova tarefa foi dada sem abrir mão
do Brasil. A possibilidade do País mudar de patamar depende das anteriores, e sem grandes mudanças do modelo em si (pro-
nitidamente dele. Entretanto, é um setor com muito pouca ino- fessor, sala e livro). O modelo estava bem cheio de tarefas.
vação. O modelo de educação – professor, turma de alunos, livro Nos últimos 20 anos, mais uma atribuição fundamental foi
e sala de aula – mudou muito pouco nos últimos 200 anos. As colocada em cima deste padrão cada vez mais frágil: a elimina-
poucas tentativas de incorporar tecnologia aparentemente tem ção de pobreza e da desigualdade. Nos últimos anos, programas
mais o efeito de deixar o aluno fazer “chats” e responder e-mails de governo e as próprias crenças dos indivíduos deram esta tarefa
durante uma aula chata do que realmente inovar no modelo de ao modelo educacional para equilibrar as vantagens econômicas
aprendizagem. Dada a importância des- e sociais. Realmente, este modelo educa-
te setor, acho que um olhar dos potencias cional está mesmo sobrecarregado.
Companhias bem situadas
para inovação disruptiva vale a pena. Não são necessárias “melhorias” no
simplesmente não conseguem
O modelo atual de educação come- modelo (melhores professores, salas e livros),
priorizar projetos “piores”,
çou no século 19. Naquela época, estava
em cima de oportunidades de mas, de fato, um novo modelo mais ade-
em pleno crescimento um novo modelo quado à variedade, quantidade e impor-
investir em melhorias no
político: a democracia. Ela nasceu no tância das tarefas que ele tem que cumprir.
negócio principal, que
século 17, como um experimento muito A inovação disruptiva gera a oportunidade
normalmente tem retornos
arriscado. Nunca antes a seleção dos po- de fazer isto. Neste conceito, o modelo fo-
mais expressivos,
deres nacionais foi dada ao “povo”. Isto cado no professor vira um padrão focado
com menos riscos
sempre foi feito por um superior, ou uma no diagnóstico do aluno e a facilitação de
classe de elite. Os proponentes do modelo democrático ( Jeffer- ferramentas e processos de aprendizagem, que combinam com o
son, Washington, etc.) tinham muito medo do experimento, tipo de inteligência dominante do aluno (existem sete tipos de inte-
achando que, se o “povo” não tivesse uma formação adequa- ligências). Em vez de forçar todos no mesmo formato, este diagnós-
da, o modelo poderia quebrar por não escolher bem os líderes tico do aluno o ajudará a enxergar as ferramentas e processos de
políticos (um claro problema que sofremos no Brasil). Para aprendizagem que funcionam melhor para ele. A mudança para
aliviar a questão, eles criaram um modelo de educação univer- esta plataforma educacional será disruptiva, pois elimina a neces-
sal, financiado pelo governo, usando um formato massificado sidade de salas e infraestrutura tão cara, e é focada no estilo de
(um professor e muitos alunos). Importante notar que o modelo aprendizagem do aluno, em vez do ensino do professor.
não nasceu para formar pessoas para empregos e profissões, Precisamos repensar o modelo educacional como um
mas para criar um cidadão melhor, com maior capacidade de todo, em vez de continuar investindo recursos na melhoria do
escolher seus líderes. modelo atual.
16 dezembro 2011 www.crn.com.br