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A dimensão humana de Deus em Feuerbach
1. COMUNICAÇÃO ORAL
A DIMENSÃO DO DIVINO EM LUDWIG FEUERBACH
INTRODUÇÃO
Nos dias de hoje muito se tem escrito e discutido sobre se Deus existe e caso exista como ele
seria. Mas este não é um debate novo e nem tampouco estritamente filosófico. Atualmente a
existência de Deus ultrapassou a seara religiosa e ganhou conotação científica adentrando na
seara do conhecimento comandado pelo empirismo. O desafio é provar pela experiência a
existência do Criador.
Mas no campo filosófico, o alemão Ludwig Feuerbach ( no século 19 ), ao analisar a religião
cristã, foi impiedoso e em detrimento da fé, trabalhou com a noção de que Deus seria o
interior do homem projetado para o exterior. Nesse processo de projeção do homem em Deus
reside, para Feuerbach, uma alienação fundamental, pois, embora a religião seja a relação do
homem consigo mesmo, ela é experienciada como uma relação do homem com outra coisa,
externa a ele. Sua essência torna-se outro ser. E aí a alienação será fatal, pois "para enriquecer
Deus, o homem deve empobrecer-se; para que Deus seja tudo, o homem deve ser nada".
O filósofo alemão, Ludwig Andreas Feuerbach nasceu na Baviera, em 29 de julho de 1804.
Desde jovem, a religião foi alvo de seus estudos e de suas atenções, empenhando-se
grandemente à sua afirmação e explicação. Iniciou seus estudos de teologia protestante em
Heidelberg, com o intuito de ser pastor evangélico. Em 1824 continuou seus estudos em
Berlim, e mais tarde decide-se pela filosofia, seguindo durante dois anos os cursos de Hegel, de
quem sofreu forte influência. Em 1828 concluiu sua dissertação sob o título “Sobre a Razão
Una, Universal, Infinita” e, no ano seguinte, foi designado como professor adjunto da
universidade de Erlangen, onde exerceu livre docência até 1836.
Entretanto, Feuerbach, antes discípulo de Hegel, vai se distanciando da filosofia hegeliana,
distanciamento que acabou sendo uma crítica de Hegel e que encontrou sua forma mais
expressiva com o escrito “Contribuição à Crítica da Filosofia Hegeliana” (1839). Para Hegel, a
consciência do homem a respeito de Deus é a autoconsciência de Deus, enquanto que para
Feuerbach, o Ser Absoluto, o Deus dos homens é o próprio ser. Conforme o homem pensa e
sente, assim é o seu Deus. a consciência de Deus é a autoconsciência do homem. Pelo seu
Deus conhece-se o homem e pelo homem conhece-se o seu Deus.
No ano de 1841, Feuerbach escreve a sua principal obra “A Essência do Cristianismo”.
Feuerbach, agora crítico e inimigo de Hegel, ao quebrar e inverter o sistema hegeliano,
implanta uma nova filosofia e se torna precursor da esquerda hegeliana. Ele rejeita o sistema
hegeliano e afirma que o infinito encontra-se no próprio homem como espécie e não no
transcendente, como postulara Hegel. Na obra “A Essência do Cristianismo”, Feuerbach
2. desenvolve toda a sua teoria acerca do problema da religião e propõe uma solução de reduzir
toda a teologia à antropologia.
Para o filósofo alemão, discípulo de Hegel, este seria o pecado fatal da religião cristã (e
possivelmente de toda religião). Antes de Feuerbach, muitos grandes autores como Platão e
Aristóteles, na antigüidade; Santo Agostinho de Hipona, Santo Anselmo de Aosta e São Tomás
de Aquino, dentre outros, na filosofia medieval; Descartes, Kant e Hegel na modernidade,
lançaram-se no campo da investigação pela existência deste ser supremo e absoluto e da
dimensão religiosa do ser humano. O pensamento feuerbachiano, no entanto, é totalmente
novo em relação aos filósofos acima citados, propondo uma exaltação humana através do
ateísmo, procurando demonstrar que o Deus que o homem crê nada mais é que a essência
genérica humana objetivada. A relação entre o humano e o divino não é nada recente, vem
desde os primórdios, e, na história da filosofia, são vários os autores que se lançaram na busca
de uma solução para o problema da existência de Deus e da manifestação do fenômeno
religioso no ser humano. Este problema, no entanto, por nenhum autor foi solucionado
definitivamente. E justamente por isso se apresenta como um tema tão instigante.
O surgimento da filosofia, rompendo com a mitologia e a religião grega, parece, num
primeiro momento, uma separação drástica e inconciliável entre o saber filosófico e a crença
num ser superior, já que os primeiros filósofos propunham um elemento físico como princípio
do qual se originou tudo o que existe, em oposição à concepção mitológica anterior. No
entanto, o fato é que o problema da existência de Deus e de sua manifestação no ser humano
não foi nem analisado pelos primeiros filósofos. A Filosofia afirma, sempre mais
marcadamente, o seu rompimento com a mitologia e a religião grega, todavia, sem propor-se
ainda, explicitamente, o problema de Deus: de sua existência e de sua essência.
Nem a razão, nem a experiência são capazes de embasar com segurança a afirmação de que
Deus existe. Para a razão, é tanto provável quanto improvável que Deus exista [...] Kant
garante espaço para a religião em seu pensamento justamente naquela zona a qual não
podem chegar nem a nossa experiência, nem a nossa razão. E justamente este vácuo é que
pode ser preenchido pela fé religiosa.
Este trabalho tem como objetivo expor as principais idéias do filósofo alemão Ludwig
Feuerbach a respeito da religião. O cristianismo, foi o centro da atividade intelectual e da
“perdição” do ousado filósofo que rompeu com o pensamento de seu mestre Hegel e
transformou a religião num fenômeno antropológico, uma espécie de expressão da natureza
humana.
Feuerbach considera a religião a essência imediata do ser humano, acreditando assim poder
explicitar os "tesouros escondidos no homem". Reduz atributos divinos da teologia a atributos
humanos da antropologia. Sua filosofia procura transformar a teologia de Hegel em uma
antropologia baseada no mesmo princípio, a unidade do limite e do infinito. Compondo a
esquerda hegeliana, Feuerbach defende a idéia de que para Hegel a religião não é razão, e sim
representação, sendo então redutível ao mito.
Em sua obra-prima, “A Essência do Cristianismo”, Feuerbach afirma que “O homem se
distingue do animal pela consciência.”
3. Em outra passagem afirma: “Consciência é a característica de um ser perfeito”. O homem tem
consciência de si através do objeto. Ou seja, o outro: o eu e o tu, na visão positivista.
A trindade humana - amor, razão e vontade - é a essência do próprio homem, é o homem
completo:
- a força do pensamento é a luz do conhecimento, a razão;
- a força da vontade é a energia do caráter;
- a força do coração é o amor.
É impossível, afirma Feuerbach, nos remetendo à Descartes, quando fala que Deus só pode ser
um ser perfeitíssimo, ser consciente de uma perfeição como imperfeição; impossível sentir o
sentimento como limitado, impossível pensar o pensamento como limitado.
Assim, o Ser Absoluto, o Deus do homem, é a sua própria essência. Feuerbach, já no início de
sua obra, antropologiza a Trindade cristã em amor, razão e vontade, o que nada mais é do que
a nossa própria essência. Feuerbach, tornou-se maldito por ter ousado dizer que o temos de
melhor, de mais sublime, enfim nossa essência, dizemos que é Deus. Ou seja, projetamos
nossa essência em Deus e nos esquecemos que isto somos nós mesmos, nos anulando. Por
outro lado, ele também afirma que isto é positivo, pois nos faz lembrar e ter consciência do
melhor de nós mesmos.
Feuerbach continua na linha cartesiana: “o divino só pode ser conhecido pelo divino”. Isto
quer dizer: se não tivéssemos o divino em nós, não poderíamos falar, exprimir ou
experimentar o divino. E o divino não é razão, é sentimento: “a essência divina que o
sentimento percebe é em verdade apenas a essência do sentimento arrebatada e encantada
consigo mesma – o sentimento embriagado de amor e felicidade”. O autor constata que fez-se
do sentimento a parte principal da religião, bem como a essência objetiva dela. “O sentimento
é transformado num órgão do infinito, da essência subjetiva da religião, o objeto da mesma
perde seu valor objetivo”. E no objeto religioso a consciência coincide com a consciência de si
mesmo, o seu íntimo. Já num objeto sensorial, a consciência está fora, e no religioso, o objeto
está dentro do próprio homem, sendo sua essência. Assim, amparado em Agostinho que diz
que “Deus é mais próximo, mais íntimo e por isso, mais facilmente reconhecível que as coisas
sensoriais e corporais”, Feuerbach resume sua visão antropológica da religião:
“A consciência de Deus é a consciência que o homem tem de si mesmo; o conhecimento de
Deus é o conhecimento que o homem tem de si mesmo. Pelo Deus conheces o homem e vice-
versa pelo homem conheces o seu Deus; ambos são a mesma coisa. [...] A religião é uma
revelação solene das preciosidades ocultas do homem, a confissão dos seus mais íntimos
pensamentos...”
Nesse sentido, a religião tornou-se, para Feuerbach, uma idolatria, pois o homem adora a sua
própria essência: “os predicados divinos são qualidades da essência humana” e “na religião, o
homem ao relacionar-se com Deus, relaciona-se com a sua própria essência”.
Feuerbach percebe a necessidade existente no homem da religião – “o sentimento religioso é
o mais alto sentimento de conveniência” - uma vez que ela lhe serve como alívio frente às
angústias, à dor e ao sofrimento da existência, que a natureza somente provoca e não alivia. O
homem é dependente da natureza para existir. A natureza é sentida como necessidade, e é ai
que surge a religião, opondo-se entre o querer e o poder, pensamento e o ser. Diante da
natureza, o homem sente-se limitado, finito, já a religião teria a possibilidade da onipotência e
da infinitude de Deus para oferecer ao homem. Os desejos do homem estariam assim
4. representados enquanto possibilidade na figura de Deus, que é a representação imaginária da
realização de todos os desejos humanos, superando os limites que a natureza lhe impõe. Deus
domina a natureza, pois para o homem, ele é quem a cria. Assim sendo, Feuerbach desloca a
divindade de um Deus externo ao homem para o interior do próprio homem. Ele é o Deus dele
mesmo, e diz: "O Ser Absoluto, o Deus do homem é o próprio ser do homem." Deus é então a
consciência que o homem tem de si mesmo, de seu ser. A exemplo disto, a perfeição divina
nada mais é do que o desejo do homem de ser perfeito e a consciência que tem de si,
enquanto um ser imperfeito. O amor, a crença, o desejo, etc., atribuídos a Deus, que segundo
Feuerbach, deveriam voltar-se para o próprio homem e para seu igual. Acredita que o homem
deveria acreditar nele mesmo. No entanto, este filósofo aponta um erro na religião, que é a
ilusão que ela cria. Ao mesmo tempo que oferece um sentido de vida para o homem e uma
forma de ele lidar com suas limitações, a religião acaba por distânciá-lo dele mesmo,
exteriorizando a própria divindade.
A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica com a análise textual de obras do filósofo
alemão, entre elas, A essência do cristianismo e Preleções sobre a essência da religião.
Em sua obra “A essência do Cristianismo”, Ludwig Feuerbach apresenta uma crítica radical da
teologia. Ele mesmo denomina o seu método de histórico-filosófico como uma oposição à
mera análise histórica do cristianismo. Ele explica que a intenção de seu trabalho não era
destruir mas sim redescobrir a religião e os seus segredos. “Deus é autoconsciência,
conhecimento de Deus é autoconhecimento”.
“Deus é a mais alta subjetividade do homem, abstraída de si mesmo.”
“Este é o mistério da religião: o homem projeta o seu ser na objetividade e então se
transforma a si mesmo num objeto face a esta imagem de si mesmo, assim convertida em
sujeito.” (Trechos de “A Essência do Cristianismo” de L. Feuerbach)
A teologia afirma que Deus criou o homem à sua imagem e semelhança, Feuerbach, ao
contrário, vai afirmar que o homem criou Deus à sua imagem e semelhança.Através de sua
interpretação antropológica da religião, o autor cria uma nova religião que, como pura
antropologia, é atéia, se baseia no relacionamento do homem consigo mesmo, com sua
essência. Conforme Feuerbach, o que ontem ainda era religião não é mais hoje e o que é tido
hoje por ateísmo será amanhã tido por religião. Para ele, a religião (cristã) é falsa, pois consiste
no relacionamento do homem consigo mesmo, com a sua essência, como se fosse outra
essência, diversa da dele. No fato de identificar os predicados humanos e ao mesmo tempo
divinos, consiste a verdade da religião; na intenção de distingui-los, a sua falsidade. Na
verdade, todos os predicados que o homem atribui a Deus pertencem ao próprio homem.
O ateísmo se revela, assim, como o processo de redescoberta da dignidade do homem:
para que o homem seja, é necessário destruir sua criação, Deus. A destruição da religião
significa para o homem a reconquista de sua essência perdida e, neste sentido, o ateísmo
emerge como o postulado que vai tornar possível uma construção futura da humanidade digna
do próprio homem.
A tarefa da filosofia, segundo Feuerbach, seria, então, mostrar ao homem que o Deus
objetivo não passa do ser do próprio homem enquanto espécie, enquanto gênero. Por isto, a
filosofia viria, geralmente, após a religião. A religião, enquanto negação do homem, realidade
5. invertida, em que a criatura do ser humano se sobrepõe ao próprio ser humano. A filosofia,
enquanto reinversão da realidade religiosa, devolvendo ao homem as suas capacidades,
enriquecidas, no entanto, com o potencial humano desvendado na consciência religiosa.
CONCLUSÃO
Na área de um problema em que a maioria das teorias filosóficas não convergem para
um mesmo ponto, ou, pelo menos não utilizam os mesmos argumentos para a defesa da
posição que sustentam, o presente estudo monográfico buscou identificar os principais pontos
da argumentação do filósofo alemão Ludwig Andreas Feuerbach para a solução atéia que
propõe para o problema da existência de um ser objetivo transcendente, dotado dos atributos
de ilimitabilidade, supremacia e infinitude.
A partir da pesquisa realizada, pode-se dizer que o pensamento deste autor é de uma
importância considerável no campo da história da filosofia, uma vez que é transitório entre o
idealismo e o materialismo. Feuerbach não foge totalmente ao idealismo, pois sua crítica
permanece no plano do idealismo: ele utiliza-se do método dialético de Hegel, só invertendo o
seu esquema - parte do finito e coloca o infinito no finito, ao contrário de Hegel. Porém, não
fica só no ideal, mas valoriza o material, o humano, o terrestre, em oposição ao divino
transcendente.
Por muitos autores, Feuerbach é considerado o pai do ateísmo moderno,
influenciando autores importantíssimos dentro do pensamento filosófico, dentre os quais
podemos destacar Karl Marx, que aceita tranqüilamente a teoria da projeção da essência
humana, da criação de Deus por parte do homem, tanto que afirma na "Crítica da Filosofia do
Estado de Hegel" que, com Feuerbach, para a Alemanha, a crítica da religião está
essencialmente terminada.
A maior contribuição, no entanto, da tese ateísta defendida por Feuerbach é em
relação à antropologia. Com seu ateísmo antropológico, o autor afirma o sujeito humano como
portador de todos os atributos divinos que a teologia e a tradição atribuem a um sujeito
divino. Segundo essa teoria, a essência do gênero humano, constituída pelas forças da razão,
da vontade e do amor, goza dos atributos de infinitude, ilimitabilidade e, portanto, de
perfeição. O homem, aqui, é elevado a Deus, é a medida de todas as coisas. Dentro dessa
perspectiva, a teologia perde todo o seu valor. Além disso, é vista como alienadora, como
sustentadora intencional de um estranhamento do homem em relação a si mesmo. A teologia
vai de encontro ao curso natural, que seria o conhecimento, por parte do homem, da sua
essência, e mantém a alienação provocada pela ingenuidade do homem. Percebe-se desta
maneira que o ateísmo feuerbachiano é, ao mesmo tempo, um humanismo. Porém, um
humanismo reducionista e excludente, pois propõe um dilema: ou afirmação do homem e
negação de Deus ou afirmação de Deus e negação do homem. O ateísmo reducionista de
Feuerbach nega a possibilidade de uma comunhão entre o sujeito Deus e o sujeito homem. A
libertação completa do homem, conforme essa teoria, só será alcançada quando este suprimir
a Deus e atribuir as qualidades divinas ao sujeito humano.