A realidade das escolas públicas brasileiras revela uma parcela significativa de crianças que apresentam dificuldades em seu processo de construção de conhecimentos e, estas dificuldades parecem se concentrar no processo de aquisição da leitura e da escrita e da construção dos conhecimentos matemáticos. Tal realidade pode ser comprovada pelos inúmeros programas governamentais que têm sido criados na última década voltados para a formação inicial de professores para os anos iniciais de escolaridade.
BRINCANDO E APRENDENDO: UMA ARTICULAÇÃO POSSÍVEL ENTRE EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA E GRADUAÇÃO
1. Práticas de ensino na formação inicial do professorado
INFORME DE EXPERIÊNCIA
BRINCANDO E APRENDENDO: UMA ARTICULAÇÃO POSSÍVEL
ENTRE EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA E GRADUAÇÃO
Ribeiro, Maria Teresa de Moura
mterib@hotmail.com
Universidade de Taubaté
Teixeira, Myrian Boal
myrianboal@hotmail.com
Universidade de Taubaté
Palavras-chave: formação inicial – ensino e aprendizagem – metodologia de ensino
A realidade das escolas públicas brasileiras revela uma parcela significativa de
crianças que apresentam dificuldades em seu processo de construção de
conhecimentos e, estas dificuldades parecem se concentrar no processo de
aquisição da leitura e da escrita e da construção dos conhecimentos
matemáticos. Tal realidade pode ser comprovada pelos inúmeros programas
governamentais que têm sido criados na última década voltados para a
formação inicial de professores para os anos iniciais de escolaridade.
Acreditamos, como Lima (2002) que “toda criança pode aprender a ler e a
escrever, mas não em qualquer situação”, pois esta é uma aprendizagem,
assim como os conhecimentos matemáticos, que necessita da mediação de
alguém que planeje e tenha a intenção de ensinar, proporcionando um contexto
que atenda as necessidades individuais e respeite o desenvolvimento dos
períodos da vida humana.As crianças que apresentam alguma dificuldade de
aprendizagem, em seu percurso escolar, possuirão melhores condições de
aprendizagem se a elas forem oferecidas, além de um ambiente onde
predominem boas relações afetivas, uma gama de recursos pedagógicos que
lhes permitam ampliar seu repertório de vivências simbólicas e culturais,
proporcionando práticas embasadas em atividades culturais que se manifestam
no dia-a-dia, como as brincadeiras, os jogos, rituais do folclore, formas variadas
de expressão das emoções e da comunicação entre as pessoas, a arte em
suas diferentes linguagens e materiais, etc.
No processo educativo, cada pessoa sofre influências de tudo e de todos que a
cercam e, de sua parte, exerce, também, influência sobre a outra pessoa com
quem está em contato. Dessa forma, o aluno e o professor precisam trabalhar
em busca do mesmo objetivo – a construção do conhecimento. Os alunos, em
especial, pertencem a um grupo e precisam sentir que fazem parte dele, para
2. que possam, então, pensar e agir dentro dos padrões estabelecidos pelo grupo
e passem a ter um sentimento de “nós” que, segundo Wallon (1979) pode ter
um sentido de “nós todos (...) sentido de reunião, solidariedade”.
A escola precisa ser, então, um meio que possibilite à criança aprender na
relação com o outro, sendo um espaço significativo para a construção da
aprendizagem. É nesse espaço que os alunos podem estabelecer as relações
entre os conhecimentos veiculados nas aulas e sua experiência do contexto
social. A escola deveria analisar os conteúdos escolares para determinar sua
complexidade estrutural e definir as competências operatórias necessárias para
sua assimilação. Isso exige compreensão do processo ativo por meio do qual a
criança constrói seu pensamento lógico e adquire um conhecimento com poder
de generalização pela própria atividade que cria, compara, exclui, ordena,
formula hipóteses, comprova e recria.
A sala de aula é um ponto de encontro entre o professor e o aluno, de
interação numa ação compartilhada. O professor é aquele que detém a
liderança e a responsabilidade de dinamizar o processo de ensino e de
aprendizagem. Ele deve conduzir esse processo como tarefa interessante,
estimuladora, permitindo que a criança entre em contato e interaja com o
conhecimento.
O curso de Pedagogia, ao formar professores para os anos iniciais do Ensino
Fundamental necessita oferecer subsídios para uma prática pedagógica efetiva
e atenta às especificidades da criança, de forma que nossos alunos saibam
atuar também com aquelas que necessitam de um olhar diferenciado do
professor. Atuando como professoras de Metodologia de Ensino em uma
universidade pública municipal do interior paulista e pensando nessa
necessidade de formação aos futuros pedagogos, propusemos à Pró-reitoria de
Extensão, o desenvolvimento do Projeto Serviço de Apoio Pedagógico a
crianças dos anos iniciais do Ensino Fundamental (SAP), cujas atividades vêm
sendo realizadas desde o ano de 2007, seguindo ao longo desses anos,
modelos diferentes de atuação, mas sempre tendo como enfoque principal a
atuação dos alunos do curso de Pedagogia em atividades docentes, sob a
supervisão das professoras coordenadoras.
Em 2009, submetemos a CAPES um projeto institucional para parceria com o
Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID), vinculado à
Pró-Reitoria de Graduação, o qual foi aprovado e ampliado em 2011,
envolvendo 70 alunos do Departamento de Pedagogia. Este Programa tem por
objetivo incentivar a formação docente, por meio da atuação dos discentes em
escolas públicas de ensino básico de forma a aprimorar sua formação e
contribuir para a melhoria da qualidade dessas escolas. Acreditamos que os
discentes da Pedagogia muito têm a ganhar com a oportunidade de trabalhar
com essa realidade, sob a supervisão direta dos professores do curso,
atividade que é proporcionada tanto pelo SAP quanto pelo PIBID.
No ano de 2013, fizemos uma tentativa de vincular as duas propostas – SAP e
PIBID – por meio da atuação numa escola pública que se tornou escola de
aplicação da universidade neste mesmo ano, que passaremos a identificar
nesse trabalho como Projeto SAP/PIBID. Estiveram envolvidos um aluno
bolsista da Pró-Reitoria de Extensão, uma aluna bolsista do PIBID e alunos
voluntários sob a coordenação de duas professoras do Departamento de
Pedagogia - coordenadoras do SAP e do PIBID, cinco professores, a equipe
3. de gestão e doze alunos da escola parceira, selecionados por seus próprios
professores, por apresentarem dificuldades no processo educativo.
A escola pública atendida é também parceira da universidade no PIBID por
meio dos subprojetos de Biologia, Educação Física e Pedagogia.
As atividades deste Projeto têm sido desenvolvidas na Brinquedoteca do
Departamento, que possui uma ampla gama de materiais didáticos e jogos
apropriados para a construção do conhecimento pelas crianças.
Entendemos a criança como um sujeito ativo, como alguém que aprende em
interação com o objeto e com o outro. Partindo desses pressupostos,
organizamos no Projeto SAP/PIBID situações pedagógicas, a fim de oferecer
às crianças, condições que favoreçam o seu processo de aprendizagem.
Os encontros do SAP/PIBID seguem uma rotina que inclui inicialmente o tempo
da brincadeira livre (cerca de 15 minutos), a roda de conversa inicial para
planejar as atividades que serão realizadas no dia, o tempo de realizar as
atividades, o tempo de avaliar as atividades do dia e de organizar o espaço.
Buscamos planejar as atividades a partir de temas trazidos pelas crianças ou
cujo interesse é observado nos momentos de brincadeira livre.
O aluno com dificuldades em seu percurso escolar tem necessidade de adquirir
confiança em si mesmo, tem necessidade de ser aceito tal como ele é. É
necessário compreender os sentimentos que manifesta em relação à
aprendizagem. Por esta razão, partimos do pressuposto que nossos encontros
precisam se pautar numa ação compartilhada entre professores (discentes da
Pedagogia) e alunos, levando todos os envolvidos a sentirem entusiasmo pela
própria aprendizagem.
Buscamos desenvolver um trabalho baseado nas inter-relações entre os
elementos cognitivos, afetivos e sociais da aprendizagem, resgatando a
confiança, o interesse e a necessidade e o desejo de aprender. O aspecto
afetivo leva em conta a autoestima e o autoconhecimento, permitindo à criança
expressar seus sentimentos. Na medida em que o professor garanta esse clima
de aceitação, a criança terá condições de expressar suas ideias, tornando sua
aprendizagem significativa. O aspecto social implica em cooperação entre
professor-criança e criança-criança, por meio da comunicação e aceitação
mútua, desenvolvendo uma relação pessoal com todos os envolvidos. O
aspecto cognitivo permite a operacionalização do pensamento e da
comunicação, possibilitando a expressão, a escrita e o confronto de opiniões.
Nesse sentido, procuramos construir estratégias de ação que levem as
crianças a aprenderem a aprender, de forma a se desenvolverem
continuamente, por meio da vivência de situações lúdicas que permitam a
comunicação e a expressividade, possibilitem os usos sociais da escrita
relacionados às vivências culturais das crianças; proporcionem experiências de
sucesso que permitiam a melhoria de sua autoestima e estimulem as boas
relações interpessoais.
Consideramos ainda, que estabelecer uma excelente relação com a equipe
escolar e com os responsáveis pelas crianças participantes do Projeto
SAP/PIBID tem sido um elemento facilitador do trabalho que desenvolvemos.
Esse vínculo tem se concretizado por meio de reuniões periódicas e da
participação de representantes da escola e da família em eventos festivos
organizados para as crianças no Departamento de Pedagogia, como por
exemplo, Festa Junina e Festa de Encerramento do ano letivo.
4. A realização do Projeto tem permitido a observação direta da atuação de
nossos alunos com as crianças, o que favorece as discussões sobre a prática
docente, em especial junto a crianças que apresentam alguma dificuldade para
aprender. Questões como a indisciplina, a ausência de limites, o
relacionamento interpessoal, a relação professor-aluno, a organização do
espaço da sala de aula, o planejamento do trabalho, o envolvimento do
professor nas atividades, a busca de atividades interessantes, a discussão
sobre os conteúdos escolares, o uso do tempo, a importância da rotina escolar
e outras pertinentes à relação ensino-aprendizagem, encontraram no cotidiano
do projeto e no cotidiano das aulas de metodologia de ensino, o espaço
adequado de reflexão entre a teoria e a prática, o que “[...] permite superar a
visão da prática como campo de aplicação das teorias científicas,
reconhecendo-a como âmbito criador de um conhecimento próprio, ligado à
ação e construído no próprio exercício da docência.” (Ribeiro, Maria Teresa de
Moura, Teixeira, Myrian Boal, Ambrosetti, Neusa Banhara, 2004)
Gostaríamos de acrescentar, algumas considerações em relação às
contribuições que este Projeto tem trazido para as crianças envolvidas, para
nosso curso de formação de professores e para o papel da Universidade.
Nossa experiência com as crianças vem mostrando que aprender precisa ser
algo prazeroso para elas e que lhes indique o sentido das atividades escolares.
Não há como discordar que é necessário criar condições para que a
experimentação, a exploração e a interação com o mundo do conhecimento
ocorra na escola. A criança precisa ser encorajada a expressar seus
sentimentos, desejos e necessidades. A aceitação da criança como ela é,
resgata positivamente sua autoestima e promove a interação grupal, levando à
interação com todos. A sinceridade, a amizade e a confiança nas crianças,
estimulam e desenvolvem a construção de sua aprendizagem.
Da mesma forma, os alunos do curso de Pedagogia, necessitam em sua
formação, de experiências que lhes permitam estabelecer pontes entre a teoria
que estudam nas aulas e a prática que irão vivenciar nas escolas. Poder
vivenciar esta relação sob a supervisão dos professores do curso tem sido,
certamente, uma oportunidade privilegiada para sua formação, pois vem
proporcionando uma nova maneira de olhar para a realidade: um processo
pautado no diálogo, na troca de saberes e na valorização do saber advindo da
prática. Esta formação precisa estar articulada num processo de ação-reflexão-
ação de forma a garantir ao professor maior sintonia com os percursos do
processo ensino-aprendizagem, possibilitando considerar a escola como um
lugar de aplicação de saberes científicos e também de produção de saberes
oriundos da prática pedagógica.
Além disso, a participação de discentes em projetos extensionistas e
programas que lhes permitem a atuação em contato direto com a comunidade
possibilita que se tornem profissionais melhores, sempre que seja pressuposto
deste trabalho, a premissa freireana de que quem ensina aprende e quem
aprende ensina. Temos assim os projetos extensionistas e os que permitem a
inserção do futuro professor na realidade escolar como um lócus privilegiado
para o exercício de preparação profissional.
Cabe ainda considerar que a oportunidade de vincular as ações de formação
inicial de professores com a escola pública cumpre uma das missões da
universidade, qual seja, reafirmar seu compromisso e seu papel frente aos
5. problemas sociais, levando, por meio da extensão, o ensino e a pesquisa à
comunidade.
Referências bibliográficas
LIMA, E. S. (2002). Quando a criança não aprende a ler a escrever. (p. 5). São
Paulo: Editora Sobradinho.
RIBEIRO, M. T. de M.; TEIXEIRA, M. B. e AMBROSETTI, N. B. Educação
continuada: o olhar do professor. In: ALVES, C. P. e SASS, O. (orgs.). (2004).
Formação de professores e campos do conhecimento. (p. 14). São Paulo: Casa
do Psicólogo.
WALLON, H. (1979). Psicologia e educação da criança. (p.74). Lisboa: Editorial
Vega.