O documento discute como a advocacia é uma profissão absorvente que requer dedicação de tempo, mas que o sucesso profissional e pessoal depende da capacidade de conciliar a vida profissional com atividades extraprofissionais. O autor observou que advogados realizados dedicam tempo a filantropia, voluntariado, família e hobbies. Ele próprio encontrou gratificação ao se envolver com um clube náutico, demonstrando que é possível organizar o tempo para ter uma vida preenchida além da profissão.
1. A vida para além do Direito
Como advertência prévia, gostaria de esclarecer que o autor destas
linhas não tem qualquer formação em psicologia nem desenvolveu uma
atividade profissional que o tenha levado a tratar com especial
profundidade de temas laborais relacionados com a organização do
trabalho, pelo que as reflexões abaixo são meramente fruto do que me
foi possível observar durante praticamente trinta anos de Advocacia e
da minha experiência pessoal.
A Advocacia é reconhecidamente, e com independência do contexto em
que seja praticada, uma atividade profissional altamente absorvente,
que requer uma grande dedicação, de tempo e esforço, por parte de
quem a exerce. O exercício da Advocacia, quer seja em prática
individual, numa sociedade de Advogados ou no seio de uma empresa,
sujeita normalmente o Advogado a constrangimentos de tempo e a
uma pressão, por vezes enorme, que condicionam a sua disponibilidade
de tempo para dedicar a outras atividades.
De resto, a revolução operada na nossa profissão nas últimas três
décadas em resultado da introdução de novas tecnologias, que puseram
à nossa disposição recursos inimagináveis pouco tempo antes, levou
também a uma espectativa de disponibilidade constante e imediata por
parte do Advogado, o que terá contribuído para um cada vez maior
condicionamento do Advogado pela sua atividade profissional, que
agora nos acompanha em todo o momento e para todo o lugar.
Neste cenário poder-se-ia supor que uma carreira profissional de
sucesso na Advocacia implicaria necessariamente uma dedicação a esta
atividade que dificilmente seria conciliável com atividades extra-
profissionais.
Este será efetivamente um pressuposto para muitos, que têm o seu
quotidiano dirigido exclusivamente em função da sua atividade
profissional, não encontrando tempo ou animo para se dedicar a outras
atividades.
2. No entanto, o que ao longo dos anos me foi dado observar, vendo o
exemplo dos Advogados mais realizados profissional e pessoalmente
com que me cruzei, parece indicar justamente o contrário.
São inúmeros os casos de Advogados que se dedicam à filantropia
(devolvendo à sociedade parte daquilo que recebem), à colaboração
pro-bono com instituições de interesse publico, ao estudo de temas não
relacionados com matérias jurídicas, à politica e à vida cívica, à pratica
de atividades espirituais, desportivas ou recreativas, às artes e a uma
enorme variedade de outras atividades extra-profissionais ou que
simplesmente dedicam uma parte muito substancial do seu tempo às
suas Famílias, conciliando isso com carreiras de enorme sucesso e que
lhes são gratificantes.
O seu sucesso e realização profissional e pessoal parece estar mesmo
ligado de forma necessária à conciliação da sua vida profissional com
essas outras atividades.
Sendo praticante de vela, segui esse exemplo envolvendo-me ao longo
dos anos nas atividades do Clube Naval de Cascais, onde ocupo
atualmente os cargos de vice-presidente do seu Conselho Geral e de
membro da sua Comissão Executiva. O desempenho de funções junto
desta instituição, que desenvolve uma atividade diversificada, pautada
por princípios de responsabilidade social e sustentabilidade, e que
compreende entre outros, uma escola de vela e equipas de competição,
a organização de eventos desportivos nacionais e internacionais,
atividade de desporto escolar, o projeto Vela Sem Limites - que permite
a prática gratuita de vela adaptada a pessoas com deficiência do
Concelho de Cascais - e um centro de mergulho, tem-se revelado
enormemente gratificante.
O segredo desta conciliação entre atividades profissionais e extra-
profissionais assenta quase sempre numa organização e gestão eficiente
do tempo e na capacidade de estabelecer adequadamente prioridades.
Este exercício, para que uns estarão por natureza mais predispostos,
está na verdade ao alcance de todos. Será quase sempre possível
organizar e gerir de forma mais eficaz o nosso tempo. Seja através de
um melhor planeamento, seja através do recurso às novas tecnologias,
que deveremos utilizar em nosso benefício, sem que nos escravizemos
por elas.
Estou assim convencido que o nosso sucesso profissional, realização
pessoal e em ultima análise, felicidade, depende em muito da
capacidade que tenhamos de levar também uma vida preenchida,
intensa e gratificante para além do Direito.
Francisco Brito e Abreu