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EINSTEIN, Albert. A Teoria da Relatividade Especial e Geral. Rio de Janeiro:
Contraponto, 1999.
Resumo por: Carlos Jorge Burke – www.cburke.com.br
OBS: Se desejar, solicitar arquivo pelo blog.

“Nota para 15ª edição. Nesta edição, acrescentei, como um quinto apêndice, uma
apresentação de minhas convicções sobre o problema do espaço em geral e sobre as
modificações graduais de nossas idéias a respeito dele, que resultaram da influência do
ponto de vista relativístico. Quis mostrar que o espaço-tempo não é necessariamente
algo a que possamos atribuir uma existência separada e independente dos objetos da
realidade física. Objetos físicos não estão no espaço. Estes objetos são espacialmente
estendidos. Assim, o conceito de "espaço vazio" perde seu significado. Julho de 1952”.

“Agora podemos ver como é vantajoso para a descrição de posições que, através de
números que indicam as medidas, consigamos nos libertar da existência de lugares
marcados e nomeados sobre o corpo rígido a que a indicação do lugar se refere. A física
das medidas consegue isso com o emprego do sistema cartesiano de coordenadas.
Este sistema consiste de três paredes planas, perpendiculares entre si e unidas de
maneira a formar um corpo rígido. A posição de um evento qualquer em relação ao
sistema de coordenadas é descrito, no essencial, indicando-se os comprimentos das três
perpendiculares, ou coordenadas (x, y, z), que podem ligar o evento àquelas três paredes
planas. Os comprimentos destas três perpendiculares podem ser determinados por uma
série de manipulações com réguas rígidas; tais manipulações são determinadas de
acordo com as leis e os métodos da geometria euclidiana.
Nas aplicações práticas, aquelas paredes rígidas que formam o sistema de coordenadas
quase nunca existem na realidade; também as coordenadas não são determinadas através
de construções com estacas rígidas, mas sim indiretamente. Porém, o sentido físico das
especificações de posição sempre deve ser buscado conforme as discussões precedentes,
se não quisermos que os resultados da física e da astronomia se percam na imprecisão.
(nota 4. Só na segunda parte deste livro, quando tratarmos da Teoria da Relatividade
Geral, será necessário aperfeiçoar e modificar estes conceitos).
Chegamos assim ao seguinte resultado: toda descrição de eventos no espaço necessita
de um corpo rígido com o qual os eventos são espacialmente relacionados. Toda e
qualquer relação pressupõe que, para os "segmentos de reta", valem as leis da geometria
euclidiana, sendo o "segmento" representado por duas marcas sobre um corpo rígido”.
(pág. 15s).

“Sem me preocupar muito e sem oferecer explicações detalhadas, eu poderia definir da
seguinte forma a tarefa da mecânica: "A mecânica tem que descrever como os corpos,
com o tempo, modificam sua posição no espaço". Neste caso, estaria onerando minha
consciência com alguns pecados graves contra o espírito santo da clareza; estes pecados
precisam logo ser desmascarados.
Não está claro o que devemos compreender aqui por "posição" e "espaço". Suponhamos
que eu me encontre junto à janela do vagão de um trem que viaja uniformemente e que
deixe cair uma pedra sobre o leito da estrada, sem lhe conferir nenhum impulso inicial.
Então (abstraindo do efeito da resistência do ar) eu vejo a pedra cair em linha reta. Um
pedestre que esteja observando minha ação a partir do solo observa que a pedra cai à
terra percorrendo um arco de parábola. Pergunto-me, então: as "posições" seguidas pela
pedra estão situadas, "na realidade", sobre uma reta ou sobre uma parábola? Além disso,
o que significa aqui movimento "no espaço"? De acordo com as reflexões do item 2 (o
sistema de coordenadas – grifo meu), a resposta é evidente. Comecemos, portanto, por
deixar de lado esta obscura palavra "espaço", com a qual, para sermos sinceros, não
somos capazes de imaginar coisa alguma; em lugar de espaço falaremos em
"movimento em relação a um corpo de referência praticamente rígido". As posições em
relação ao corpo de referência (que, em nosso exemplo, pode ser ou o vagão ou o solo)
já foram definidas expressamente no parágrafo anterior. Introduzindo, em lugar de
"corpo de referência", o conceito de "sistema de coordenadas", que é mais vantajoso
para a descrição matemática, podemos dizer: em relação a um sistema de coordenadas
rigidamente ligado ao vagão, a pedra descreve uma reta; em relação a um sistema
rigidamente ligado ao solo, ela descreve uma parábola. Com este exemplo, vemos
claramente que não existe uma trajetória em si, mas apenas uma trajetória em relação a
um determinado corpo de referência”. (pág. 16s)

“Como todos sabem, a lei fundamental da mecânica de Galileu-Newton, conhecida
como lei da inércia, diz o seguinte: um corpo suficientemente afastado de outros corpos
permanece em estado de repouso ou de movimento retilíneo uniforme. Esta proposição
não somente enuncia algo sobre o movimento dos corpos, mas nos diz também que
corpos de referência, ou sistemas de coordenadas, são admissíveis e podem ser
empregados para a descrição mecânica. Corpos aos quais a lei da inércia se aplica com
grande aproximação são as estrelas fixas visíveis. Ora, se empregarmos um sistema de
coordenadas rigidamente ligado à Terra, toda estrela fixa descreve em relação a ele no
correr de um dia (astronômico) um círculo de raio imenso, o que está em contradição
com a lei da inércia. Se, portanto, quisermos conservar esta lei, só podemos relacionar
os movimentos a sistemas de coordenadas em relação aos quais as estrelas fixas não
executam movimentos circulares. Chamamos de "sistema de coordenadas galileano" um
sistema de coordenadas cujo estado de movimento é tal que, relativamente a ele, a lei da
inércia é válida. As leis de Galileu-Newton são válidas apenas para os sistemas de
coordenadas galileanos.” (pág. 18)

“O princípio da relatividade (no sentido restrito):
A fim de conseguirmos o máximo de clareza possível, partimos mais uma vez do
exemplo do vagão que se movimenta uniformemente pela estrada de ferro.
Denominamos seu movimento de movimento de translação uniforme ("uniforme"
porque ocorre com velocidade e direção constantes; de "translação" porque, embora o
vagão mude de posição relativamente ao leito da estrada, ele não executa movimento de
rotação). Suponhamos um corvo que, em relação ao leito da estrada sulca os ares num
movimento retilíneo e uniforme.
Para um observador situado no vagão, o movimento do corvo, embora seja um
movimento com uma velocidade e uma direção diferentes, é também um movimento
retilíneo e uniforme. Expressando isto em termos abstratos: se uma massa m se
movimenta de maneira retilínea e uniforme em relação a um sistema de coordenadas K,
ela também se movimenta de maneira retilínea e uniforme em relação a um segundo
sistema de coordenadas K', caso este último realize em relação a K um movimento de
translação uniforme. Levando em conta o que foi estabelecido no parágrafo precedente,
daí resulta que: se K for um sistema de coordenadas galileano, todo outro sistema de
coordenadas K' que executa em relação a K um movimento de translação uniforme
também é um sistema de coordenadas galileano. Em relação a K', as leis da mecânica de
Galileu-Newton são tão válidas como em relação a K.
Daremos um passo a mais em direção à generalização enunciando a seguinte
proposição: se K' é um sistema de coordenadas que efetua um movimento uniforme e
sem rotação em relação a K, os fenômenos da natureza que se desenrolam em relação a
K' obedecem exatamente às mesmas leis que em relação a K. Chamamos este enunciado
de "princípio da relatividade" (no sentido restrito).

Enquanto todos estavam convencidos de que os fenômenos da natureza podiam ser
representados com auxílio da mecânica clássica, a validade deste princípio da
relatividade nunca foi posta em dúvida. Mas, os novos desenvolvimentos da
eletrodinâmica e da óptica foram tornando cada vez mais claro que a mecânica clássica
era uma base insuficiente para a descrição de todos os fenômenos físicos. Com isto,
também passou a ser discutida a questão da validade do princípio da relatividade, e a
possibilidade de a resposta ser negativa não parecia excluída.” (pág. 18s).

“Suponhamos que o trem de que tantas vezes já falamos se desloque sobre os trilhos
com velocidade constante v, em metros por segundo, por exemplo. Suponhamos ainda
que, no trem, um homem percorra o vagão no sentido do comprimento deste e na
mesma direção de seu movimento, andando com a velocidade w. Quão rapidamente, ou
com que velocidade W, o homem, durante sua marcha, avança em relação ao leito da
estrada? A única resposta possível parece resultar da seguinte consideração:
Se o homem permanecesse parado durante um segundo, em relação ao leito da estrada
ele avançaria uma distância igual à velocidade do trem, v. Mas, na realidade, por estar
marchando, durante este segundo ele percorre em relação ao vagão, e por conseguinte
também em relação ao leito da estrada, a distância w. No segundo que escolhemos,
portanto, ele percorre ao todo, em relação ao leito da estrada, a distância W = v + w.
Mais tarde veremos que este resultado, que expressa o teorema da adição das
velocidades de acordo com a mecânica clássica, não pode ser sustentado. Portanto, na
verdade, a lei que acabamos de escrever não é exata. Mas, por enquanto, admitiremos
que ela seja válida.” (pág. 21s).

“Dificilmente existirá na física uma lei mais simples do que aquela que diz que a luz se
propaga no espaço vazio. Toda criança de escola sabe, ou julga saber, que a propagação
se dá em linha reta e com uma velocidade c = 300.000 km/s. Sabemos com grande
exatidão que esta velocidade é a mesma para todas as cores; se assim não fosse, quando
uma estrela fixa fosse eclipsada por sua companheira obscura, o mínimo de emissão não
seria observado ao mesmo tempo para as diversas cores. Por uma consideração
semelhante, ligada à observação de estrelas duplas, o astrônomo holandês De Sitter
também pôde demonstrar que a velocidade de propagação da luz não pode depender da
velocidade de movimento do corpo que a emite. Admitir que esta velocidade de
propagação dependa da direção "no espaço" é uma coisa, em si, pouco provável.
Em resumo, admitamos que o menino da escola esteja certo quando acredita na lei
simples da velocidade constante da luz c (no vácuo). Quem haveria de imaginar que
uma lei tão simples iria trazer as maiores dificuldades para o físico consciencioso!
Vejamos como essas dificuldades se manifestam.
Naturalmente, o fenômeno da propagação da luz, como qualquer outro fenômeno, deve
referir-se a um corpo de referência rígido (sistema de coordenadas). Para cumprir esse
papel, escolhamos novamente o leito da nossa estrada. Imaginemos que, de alguma
maneira, o ar sobre o mesmo tenha sido retirado. Suponhamos que, sobre o leito da
estrada, seja emitido um raio de luz cuja frente, segundo o que foi dito anteriormente,
propaga-se com a velocidade c em relação ao leito da estrada. Sobre os trilhos,
imaginemos mais uma vez o nosso vagão de estrada de ferro, viajando na mesma
direção em que o raio luminoso se propaga, se bem que, evidentemente, de uma maneira
muito mais lenta. Queremos saber qual é a velocidade de propagação do raio luminoso
em relação ao vagão. É fácil entender que aqui se pode empregar a consideração do item
precedente, pois o homem que se movimentava relativamente ao vagão desempenha o
papel do raio luminoso. Em lugar da velocidade W deste em relação ao leito da estrada
entra aqui a velocidade da luz em relação ao mesmo; w é a velocidade da luz em relação
ao vagão, para a qual vale: w = c – v.
A velocidade de propagação do raio luminoso em relação ao vagão, portanto, resulta ser
menor do que c.
Mas, este resultado está em contradição com o princípio da relatividade apresentado no
item 5 (o princípio da relatividade (no sentido restrito – grifo meu). Com efeito, a lei da
propagação da luz no vácuo, como qualquer outra lei geral da natureza, deveria ser a
mesma caso tomássemos o vagão ou os trilhos como corpo de referência. Mas isto,
segundo nossas considerações, parece impossível. Se todo raio luminoso se propaga em
relação ao solo com a velocidade c, parece que, justamente por isso, a lei da propagação
da luz em relação ao vagão tem que ser diferente. Isso está em contradição com o
princípio da relatividade.
Diante deste dilema, parece ser inevitável abrir mão ou do princípio da relatividade ou
da simplicidade da lei da propagação da luz no vácuo. O leitor que acompanhou com
atenção as considerações anteriores certamente esperará que o princípio da relatividade,
que à nossa mente se apresenta como tão natural e simples, e como quase inelutável,
seja mantido, e que a lei da propagação da luz no vácuo seja substituída por uma lei
mais complicada, porém compatível com o princípio da relatividade. No entanto, o
desenvolvimento da física teórica mostra que este caminho não é viável. Com efeito, os
estudos pioneiros de H. A. Lorentz sobre os fenômenos eletrodinâmicos e ópticos em
corpos em movimento mostraram que as experiências neste terreno conduzem
necessariamente a uma teoria dos fenômenos eletromagnéticos que tem como
conseqüência inevitável a constância da velocidade da luz no vácuo. Por isso, os
teóricos mais eminentes estavam mais inclinados a abandonar o princípio da
relatividade, apesar de não se haver encontrado um único fato experimental que
estivesse em contradição com este princípio.
Aqui entrou em cena a Teoria da Relatividade. Por uma análise dos conceitos físicos de
tempo e de espaço demonstrou-se que não existe incompatibilidade entre o princípio da
relatividade e a lei da propagação da luz. Pelo contrário, por uma adesão firme e
sistemática a estas duas leis se pode chegar a uma teoria lógica que está ao abrigo de
toda objeção. Passaremos a expor as idéias fundamentais desta teoria, que, para
distinguir da teoria mais geral a ser discutida adiante, é chamada de "Teoria da
Relatividade Especial".” (pág. 22ss).

“Imagino que em dois lugares A e B, situados sobre o leito de nossa estrada e muito
distantes um do outro, caiu um raio sobre os trilhos. Acrescento a informação de que os
dois raios ocorreram simultaneamente. Se agora eu lhe perguntar, prezado leitor, se esta
afirmação tem sentido, você me há de responder com um categórico "sim". Mas, se eu
insistir em que você me explique melhor o sentido da afirmação, depois de refletir um
pouco você há de perceber que a resposta a esta pergunta não é tão simples como parece
à primeira vista.
Após algum tempo, talvez lhe ocorra a seguinte resposta:
"Em si, o significado da afirmação é claro e não necessita de outros esclarecimentos;
mas eu teria que refletir um pouco se recebesse a tarefa de determinar, através de
observações, se neste caso concreto os dois fenômenos foram simultâneos ou não". Não
posso me dar por satisfeito com esta resposta, pela seguinte razão. Admitindo que um
hábil meteorologista, através de engenhosas considerações, tenha chegado à conclusão
de que nos lugares A e B o raio tenha sempre que cair ao mesmo tempo, surge a tarefa
de verificar se este resultado teórico corresponde ou não à realidade. A situação é
análoga em todas as proposições físicas nas quais o conceito de "simultâneo"
desempenha algum papel. Para o físico, o conceito só passa a existir quando há a
possibilidade de verificar, no caso concreto, se o conceito se aplica ou não. Existe, pois,
a necessidade de uma definição de simultaneidade tal que ela nos forneça o método por
meio do qual, no caso com que nos ocupamos, se possa verificar por meio de
experimentos se os dois raios caíram simultaneamente ou não. Enquanto esta exigência
não for cumprida, como físico (aliás, como não-físico também!) estou sendo vítima de
uma ilusão se acredito poder ligar um sentido à afirmação da simultaneidade. (Se você
não conseguir concordar com isto, prezado leitor, é preferível que não continue a ler.)
Depois de algum tempo de reflexão, você me propõe o seguinte para constatar a
simultaneidade. Vamos medir a reta AB ao longo da via férrea e colocar um observador
no centro M dessa distância, provido de um dispositivo (por exemplo, dois espelhos
com inclinação de 90° um em relação ao outro) que lhe permita uma visão óptica
simultânea dos dois lugares. Se este observador perceber os dois raios ao mesmo tempo,
eles são simultâneos.
Fico muito satisfeito com esta proposta. Porém, não posso considerar o assunto como
inteiramente esclarecido. Sinto-me impelido a fazer a seguinte objeção: "Sua definição
seria perfeitamente correta se eu já soubesse que a luz (que transmite ao observador em
M a percepção dos raios) se move sobre a reta A - M com a mesma velocidade que
sobre a reta B - M. Uma verificação desta hipótese só seria possível se já dispuséssemos
dos meios para medir o tempo. Parece então que caímos em um círculo vicioso".
Depois de refletir um pouco mais, com razão você me lançará um certo olhar de
desprezo, explicando: "Mesmo assim, mantenho minha definição de há pouco, porque
na verdade ela não faz nenhuma suposição sobre a luz. À definição da simultaneidade
só se pode impor uma única condição, a saber, que em todos os casos reais ela me
forneça um meio empírico para decidir se o conceito a ser definido é ou não aplicável. É
indiscutível que minha definição cumpre esta condição. Afirmar que a luz emprega o
mesmo tempo para percorrer os caminhos A - M e B - M não é, na verdade, nenhuma
suposição ou hipótese sobre a natureza física da luz, mas sim uma estipulação que posso
fazer livremente para chegar a uma definição da simultaneidade".
É claro que esta definição pode ser empregada para dar um sentido exato à afirmação da
simultaneidade não apenas de dois, mas de quantos eventos quisermos, quaisquer que
sejam as posições relativas dos lugares em relação ao corpo de referência (em nosso
caso, o leito da estrada). Assim, chegamos também a uma definição do "tempo" na
física. Imaginemos, com efeito, que coloquemos nos pontos A, B, C dos trilhos (que é
aqui o sistema de coordenadas) relógios de igual construção e de tal modo acertados que
as posições de seus ponteiros sejam simultaneamente (no sentido acima) as mesmas.
Então entendemos por "tempo" de um evento a indicação (posição dos ponteiros)
daqueles relógios que estão na vizinhança (espacial) imediata do evento. Desta maneira,
a cada evento é atribuído um valor do tempo, que em princípio pode ser observado.
Esta convenção ainda contém uma hipótese física, cuja validade dificilmente pode ser
posta em dúvida, se não houver razões empíricas para isto. Com efeito, admite-se que se
todos esses relógios forem construídos de forma idêntica eles terão o "mesmo ritmo".
Em termos mais precisos: se dois relógios em repouso forem colocados em diferentes
lugares do corpo de referência - de modo que uma configuração dos ponteiros de um
deles é simultânea (no sentido acima) com a mesma configuração dos ponteiros do
outro -, então as próprias configurações dos ponteiros são simultâneas (no sentido da
definição acima).” (pág. 24ss).

“Quando dizemos que os raios que caíram em A e B são simultâneos em relação ao leito
da estrada, isto significa que os raios luminosos que partiram de A e B irão encontrar-se
no ponto médio M do trajeto A-B do leito da estrada. Seja M' o ponto médio da
distância A-B do trem em movimento. Embora, no momento da queda dos raios (nota 7
– observado do leito da estrada), esse ponto M' do trem em movimento coincida com o
ponto M, na figura ele se movimenta para a direita com a velocidade v do trem. Se o
observador que se encontra em M' no trem não possuísse essa velocidade, ele
permaneceria em M. Os raios luminosos provenientes de A e B haveriam de alcançá-lo
simultaneamente, isto é, os dois raios haveriam de encontrar-se exatamente onde ele
haveria de estar. Na verdade, porém, ele se movimenta ao encontro do raio luminoso
procedente de B, ao mesmo tempo que se afasta do raio luminoso procedente de A.
Portanto, o observador verá o raio luminoso procedennte de B antes de ver o raio que
procede de A. Os observadores que se utilizam do trem como corpo de referência
devem, por conseguinte, chegar à conclusão de que o raio que caiu em B ocorreu antes
do raio que caiu em A.
Chegamos a um importante resultado: eventos que são simultâneos em relação ao leito
da estrada não são simultâneos em relação ao trem, e vice-versa (relatividade da
simultaneidade). Cada corpo de referência (sistema de coordenadas) possui seu tempo
próprio. Uma especificação temporal só tem sentido quando se indica o corpo de
referência ao qual esta indicação se refere.
Antes da Teoria da Relatividade, a física sempre admitia tacitamente que o significado
das indicações de tempo era absoluto, isto é, que elas não dependiam do estado de
movimento do corpo de referência. Mas acabamos de ver que esta suposição é
incompatível com a definição tão natural de simultaneidade; se a rejeitarmos,
desaparece o conflito exposto no item 7 (A aparente incompatibilidade entre a lei da
propagação da luz e o princípio da relatividade – grifo meu) entre a lei da propagação da
luz no vácuo e o princípio da relatividade.
Com efeito, fomos levados a este conflito pelas considerações do item 6 (O teorema das
adições das velocidades segundo a mecânica clássica – grifo meu), que não podem mais
ser mantidas. Ali chegamos à conclusão de que o homem no vagão, que percorre em
relação a este a distância w em um segundo, também percorreria esta distância em um
segundo em relação ao leito da estrada. Mas a duração de um determinado evento no
vagão, de acordo com as considerações que acabamos de apresentar, não pode ser
considerada igual à duração do mesmo evento quando se considera o leito da estrada
como corpo de referência. Portanto, não se pode afirmar que, em sua caminhada, o
homem percorre em relação aos trilhos a distância w num tempo que - medido a partir
da estrada - é igual a um segundo.
O raciocínio do item 6 baseia-se, aliás, em uma segunda suposição. Embora, antes do
estabelecimento da Teoria da Relatividade, ela fosse sempre tacitamente aceita, à luz de
uma reflexão atenta se manifesta como arbitrária.” (pág. 28s)

“Consideremos dois pontos determinados do trem (nota 8: Por exemplo, o meio do
primeiro e do centésimo vagão) que se locomove com velocidade v ao longo do leito da
estrada, e nos interroguemos sobre a distância que os separa. Já sabemos que, para
medir uma distância, temos necessidade de um corpo de referência em relação ao qual a
distância é medida. A maneira mais simples é considerar o próprio trem como corpo de
referência (sistema de coordenadas). Um observador que viaja no trem mede a distância
aplicando sua régua, em linha reta, ao longo do piso dos vagões, tantas vezes quantas
forem necessárias para chegar de um dos pontos marcados ao outro. O número que
indica quantas vezes a régua teve que ser aplicada é a distância procurada.

A situação é diferente quando a distância deve ser avaliada a partir do leito da estrada.
Neste caso, podemos empregar o seguinte método. Chamando de A' e B' os dois pontos
do trem cuja distância queremos medir, estes dois pontos se movem ao longo do leito da
estrada com a velocidade v. Ocupemo-nos primeiramente com os pontos A e B do leito
da estrada, diante dos quais, em um determinado momento t, os dois pontos A' e B'
estão justamente passando (vistos do leito da estrada). Em virtude da definição do
tempo dada no item 8 (sobre o conceito de tempo na física – grifo meu), a distância
entre estes dois pontos A e B pode ser determinada. A seguir, a distância destes dois
pontos A e B é medida aplicando-se a unidade de medida um certo número de vezes ao
longo do leito da estrada.
Não está de maneira alguma provado a priori que esta última medida deva dar o mesmo
resultado que a primeira. Medido sobre o leito da estrada, o comprimento do trem pode
ser diferente da medida de comprimento obtida desde o próprio trem. Esta circunstância
levanta uma segunda objeção contra o raciocínio do item 6 (O teorema da adição de
velocidades segundo a mecânica clássica), aparentemente tão claro. Com efeito, se o
passageiro percorre no vagão a distância w em uma unidade de tempo, medida a partir
do trem, a distância não tem necessariamente que ser igual a w, quando medida a partir
do leito da estrada.” (pág. 29s).

“Das considerações precedentes pode-se ver claramente que a Teoria da Relatividade
(Especial) surgiu da eletrodinâmica e da óptica. Nestes domínios ela não modificou
muita coisa nos enunciados da teoria, mas simplificou significativamente o edifício
teórico, isto é, a derivação das leis. O que é ainda incomparavelmente mais importante:
reduziu drasticamente o número das hipóteses mutuamente independentes sobre as
quais a teoria repousa. Ela tornou a teoria de Maxwell-Lorentz tão plausível, que teria
sido universalmente aceita pelos físicos mesmo que a experiência não tivesse falado
com tanta eloqüência em seu favor.
A mecânica clássica tinha necessidade de ser modificada a fim de poder ficar em
harmonia com a Teoria da Relatividade Especial. Mas esta modificação só afeta
substancialmente as leis no caso de movimentos rápidos, nos quais as velocidades v da
matéria não são pequenas demais em comparação com a velocidade da luz. A
experiência nos mostra que movimentos rápidos assim só ocorrem com elétrons e íons;
nos outros movimentos, os desvios em relação às leis da mecânica clássica são
pequenos demais para que possam ser percebidos na prática.” (pág. 41)


“O resultado de caráter geral mais importante a que a Teoria da Relatividade nos
conduziu refere-se ao conceito de massa. A física pré-relativística conhece dois
princípios de conservação de fundamental importância: a lei de conservação da energia
e a lei de conservação da massa. Estes dois princípios fundamentais aparecem como
inteiramente independentes um do outro. Na Teoria da Relatividade eles são fundidos
em um princípio único.” (pág. 42)

“A questão de saber até que ponto a Teoria da Relatividade é apoiada pela experiência
não é simples de ser respondida, por uma razão que já foi mencionada quando
discutimos o experimento fundamental de Fizeau. A Teoria da Relatividaade Especial
teve como ponto de partida a teoria de Maxwell-Lorentz dos fenômenos
eletromagnéticos. Por conseguinte, todos os fatos experimentais que confirmam aquela
teoria eletromagnética confirmam também a Teoria da Relatividade. Menciono aqui
como especialmente importante o fato de que a Teoria da Relatividade permite prever,
de maneira particularmente simples e coerente com a experiência, os efeitos produzidos
na luz que nos chega das estrelas fixas por causa do movimento relativo da Terra em
relação a estas estrelas. Trata-se do deslocamento anual da posição aparente das estrelas
fixas em conseqüência do movimento da Terra ao redor do Sol (aberração) e da
influência da componente radial dos movimentos das estrelas fixas em relação à Terra
sobre a cor da luz que chega até nós; esta última influência se manifesta em um pequeno
desvio das linhas espectrais da luz que nos atinge vinda de uma estrela fixa, em relação
à posição das mesmas linhas espectrais produzidas por uma fonte terrestre (princípio de
Doppler). Os argumentos experimentais em favor da teoria de Maxwell-Lorentz, que
são ao mesmo tempo argumentos em favor da Teoria da Relatividade, são por demais
numerosos para serem apresentados aqui. Efetivamente, eles limitam de tal forma as
possibilidades teóricas que nenhuma outra teoria pôde manter-se de pé diante da
experiência, a não ser a teoria de Maxwell-Lorentz.
Mas existem duas classes de fatos experimentais que a teoria de Maxwell-Lorentz só
pode acomodar se apelar para hipóteses auxiliares que, em si - isto é, sem utilizar a
Teoria da Relatividade -, nos parecem estranhas.
Sabemos que os raios catódicos e os assim chamados raios Beta emitidos pelas
substâncias radioativas consistem de corpúsculos elétricos negativos (elétrons) de
pequeníssima inércia e grande velocidade. Estudando o desvio dessas radiações sob a
influência de campos elétricos e magnéticos pode-se determinar com grande precisão a
lei de movimento desses corpúsculos.
No estudo teórico dos elétrons apareceu a dificuldade de que, sozinha, a eletrodinâmica
não consegue explicar sua natureza. Pois, como as massas elétricas de mesmo sinal se
repelem, as massas negativas que constituem o elétron deveriam separar-se sob a
influência de sua interação mútua, se entre elas não atuassem também forças de outra
espécie cuja natureza até hoje permanece obscura (Nota 13: A Teoria da Relatividade
Geral sugere a idéia de que as massas elétricas de um elétron são mantidas juntas por
meio de forças gravitacionais).” (pág. 45s).

“Um misterioso pavor toma conta do não-matemático sempre que ele escuta esta
palavra "quadridimensional", um sentimento não muito diferente daquele que o teatro
de fantasmas costuma provocar nas pessoas. No entanto, nada é mais banal do que
afirmar que o mundo em que vivemos é um contínuo espaço-temporal de quatro
dimensões.
O espaço é um contínuo tridimensional. Isto significa que podemos descrever a posição
de qualquer ponto (em repouso) por meio de três números (coordenadas) x, y, z, e que
para cada ponto existe um número qualquer de pontos "vizinhos" cuja posição pode ser
determinada por coordenadas x¹, y¹, z¹, tão próximas quanto quisermos das coordenadas
x, y, z do primeiro ponto. Por causa desta última propriedade falamos de "contínuo", e
por causa das três dimensões falamos de "tridimensional".
De maneira análoga, o mundo dos eventos físicos, que Minkowski chama simplesmente
o "mundo", ou "universo", é naturalmente de quatro dimensões no sentido espaço-
temporal. Pois ele se compõe de eventos individuais, cada um dos quais descrito por
quatro números, a saber, as três coordenadas espaciais x, y, z e uma coordenada
temporal, o valor do tempo t. Neste sentido, o "universo" é também um contínuo; para
cada evento existem tantos eventos "vizinhos" (realizados ou, pelo menos, imaginados)
quantos desejarmos, cujas coordenadas x¹, y¹, z¹ diferem das coordenadas do evento
original considerado x, y, z, t tão pouco quanto quisermos. O fato de não estarmos
habituados a considerar o universo como um contínuo quadridimensional ocorre porque
na física pré-relativística o tempo desempenha um papel diferente, mais independente
em relação às coordenadas espaciais. Por isso, nos habituamos a considerar o tempo
como um contínuo independente. De acordo com a física clássica, o tempo é absoluto,
isto é, independente da posição e do estado de movimento do sistema de referência. Isto
fica manifesto na última equação das transformações de Galileu (t' = t).” (pág. 49s).

“As leis da natureza que satisfazem às exigências da Teoria da Relatividade (Especial)
assumem então formas matemáticas nas quais a coordenada do tempo desempenha
exatamente o mesmo papel que as três coordenadas do espaço. Do ponto de vista
formal, estas quatro coordenadas correspondem exatamente às três coordenadas
espaciais da geometria euclidiana. Mesmo ao não-matemático se tornará evidente que
este conhecimento puramente formal pode trazer uma extraordinária contribuição para a
clareza da teoria.
Essas escassas informações dão ao leitor apenas uma vaga idéia do importante
pensamento de Minkowski, sem o qual a Teoria da Relatividade Geral, cujas idéias
básicas desenvolveremos a seguir, talvez houvesse permanecido esquecida até hoje.
Mas, como uma compreensão mais aprofundada deste assunto - que não é de fácil
acesso ao leitor que não disponha de um treinamento matemático - não é indispensável
para compreender as idéias básicas nem da Teoria da Relatividade Especial nem da
Geral, deixo-o de lado por enquanto, para só retomar a ele no final deste pequeno livro.”
(pág. 50s).

Segunda parte

A TEORIA DA RELATIVIDADE GERAL

“A tese fundamental em torno da qual giraram todas as considerações que fizemos até
este momento foi o princípio da relatividade especial, isto é, o princípio da relatividade
física de todo movimento uniforme. Analisemos mais uma vez seu conteúdo.
Sempre foi evidente o fato de que, por seu próprio conceito, todo e qualquer movimento
só pode ser concebido como um movimento relativo. No exemplo tantas vezes utilizado
do leito da estrada e do vagão da estrada de ferro, o movimento que ocorre pode com
igual razão ser descrito sob qualquer uma destas duas formas: (a) o vagão se move em
relação ao leito da estrada; (b) o leito da estrada se move em relação ao vagão.
No caso (a) é o leito da estrada que serve como corpo de referência, no caso (b) o corpo
de referência é o vagão. Quando se trata apenas de constatar ou descrever o movimento,
em princípio é indiferente a que corpo de referência o movimento está relacionado.
Como vimos, isso é evidente e não pode ser confundido com a proposição muito mais
ampla que denominamos "princípio da relatividade" e que tomamos como base de
nossas pesquisas.
O princípio de que nos utilizamos não se limita a afirmar que, para a descrição de
qualquer evento, podemos escolher como corpo de referência tanto o vagão quanto o
leito da estrada (pois também isso é evidente). O princípio afirma mais: se formularmos
as leis gerais da natureza, tal como elas resultam da experiência, servindo-nos (a) do
leito da estrada como corpo de referência e (b) do vagão como corpo de referência, estas
leis gerais da natureza (por exemplo, as leis da mecânica ou a lei da propagação da luz
no vácuo) têm exatamente a mesma forma nos dois casos. Também podemos expressar
isso da seguinte maneira: para a descrição física dos eventos da natureza nenhum corpo
de referência K ou K' é privilegiado em relação a outros. Ao contrário do enunciado
anterior, este último não tem necessariamente que ser verdadeiro a priori, pois não está
contido nos conceitos de "movimento" ou de "corpo de referência", nem pode ser
derivado deles. Só a experiência pode decidir se ele está certo ou errado.” (pág. 53s).

“Mas, até agora, não afirmamos de forma alguma a equivalência de todos os corpos de
referência K no que diz respeito à formulação das leis da natureza. Nosso caminho foi o
seguinte. Primeiramente, partimos da suposição de que existe um corpo de referência K
em um estado de movimento tal que, em relação a ele, é válido o princípio fundamental
de Galileu: um ponto material abandonado a si mesmo e suficientemente afastado de
todos os outros pontos materiais efetua um movimento uniforme e retilíneo.
Relativamente a K (corpo de referência galileano), as leis da natureza devem ser as mais
simples possíveis. Mas, além de K também devem ser privilegiados neste sentido todos
aqueles corpos de referência K' que, em relação a K, executam um movimento retilíneo,
uniforme e isento de rotação, os quais, no tocante à formulação das leis da natureza, são
perfeitamente equivalentes a K. Todos esses corpos de referência são considerados
corpos de referência galileanos. Só para eles foi admitido como válido o princípio da
relatividade, não para os outros (os que executam outros tipos de movimento). Neste
sentido é que falamos do princípio da relatividade especial ou da Teoria da Relatividade
Especial.
Em oposição a isto, queremos entender por "princípio da relatividade geral" a seguinte
afirmação: todos os corpos de referência K, K' etc. são equivalentes para a descrição da
natureza (ou para a formulação das leis gerais da natureza), qualquer que seja seu estado
de movimento. Temos que observar desde logo que esta formulação terá que ser
substituída por outra, mais abstrata, por razões que só se tornarão claras mais adiante.
Depois de se haver comprovado o princípio da relatividade especial, é tentador para
toda mente que aspira à generalização dar o passo em direção ao princípio da
relatividade geral. Mas, uma consideração simples e na aparência muito verossímil faz
com que de início esta tentativa nos pareça sem chance de sucesso. Basta que, em
pensamento, o leitor se imagine transportado para o vagão que viaja uniformemente
sobre a estrada de ferro e com que tantas vezes já nos ocupamos. Enquanto o vagão
viajar uniformemente, o viajante que se encontra no seu interior nada percebe do seu
movimento. Por isso, ele não encontra dificuldade em imaginar que o vagão está em
repouso, mas que o leito da estrada está em movimento. Esta interpretação, aliás, é
perfeitamente justificada do ponto de vista físico, de acordo com o princípio da
relatividade especial.
Mas, se o movimento do vagão passa a não ser uniforme - por exemplo, em
conseqüência de uma violenta freada -, o viajante experimenta um forte puxão para a
frente. O movimento acelerado do vagão se manifesta no comportamento mecânico dos
corpos em relação a ele; o comportamento mecânico já não é o mesmo do caso
considerado anteriormente, e por isso nos parece impossível que, em relação ao vagão
em movimento não uniforme, se apliquem as mesmas leis mecânicas que em relação ao
vagão em repouso ou em movimento uniforme. De qualquer forma, é claro que em
relação ao vagão em movimento não uniforme não vale o princípio fundamental de
Galileu. Por isso nos sentimos de imediato forçados a, contrariamente ao princípio da
relatividade geral, atribuir ao movimento não uniforme uma espécie de realidade física
absoluta. No que segue logo veremos que esta conclusão não é convincente.” (pág. 54s).
“Quando se pergunta: "Por que, quando levantamos uma pedra e depois a largamos, ela
cai por terra?", geralmente se responde: "Porque a Terra a atrai". A física moderna
responde de maneira um pouco diferente, pela seguinte razão: um estudo mais
cuidadoso dos fenômenos eletromagnéticos levou à concepção de que não existe uma
ação direta à distância. Quando, por exemplo, um ímã atrai um pedaço de ferro, não nos
devemos dar por satisfeitos com a idéia de que o ímã, através do espaço vazio entre eles,
atue diretamente sobre o ferro, mas imaginamos com Faraday que o ímã cria sempre, no
espaço circundante que o envolve, algo fisicamente real, a que damos o nome de
"campo magnético". Este campo, por sua vez, atua sobre o pedaço de ferro, de modo
que ele tende a mover-se em direção ao ímã. Não tentaremos justificar aqui este
conceito intermediário, em si arbitrário. Limitamo-nos a observar que, com auxílio dele,
podemos representar teoricamente - de maneira muito mais satisfatória do que sem ele -
os fenômenos eletromagnéticos, sobretudo a propagação das ondas eletromagnéticas.
Interpretamos os efeitos da gravitação de maneira semelhante.
A ação da Terra sobre a pedra ocorre de maneira indireta. A Terra cria em sua
vizinhança um campo gravitacional. Este atua sobre a pedra e ocasiona o movimento de
queda. Sabemos pela experiência que a intensidade da ação sobre um corpo diminui
quando nos afastamos mais e mais da Terra, de acordo com uma lei bem determinada.
Segundo o nosso ponto de vista, isto significa: a lei que rege as propriedades espaciais
do campo gravitacional deve ser uma lei bem determinada, para representar
corretamente a diminuição do efeito da gravitação com a distância ao corpo que exerce
a ação. Devemos imaginar algo assim: o corpo (por exemplo, a Terra) gera diretamente
o campo em sua imediata vizinhança; a intensidade e a direção do campo em pontos
mais distantes são então determinadas pela lei que rege as propriedades espaciais dos
campos gravitacionais.” (pág. 56s).

“O campo gravitacional, ao contrário do campo elétrico e magnético, apresenta uma
propriedade extremamente notável, que é de fundamental importância para o que segue.
Corpos que se movimentam sob a ação exclusiva do campo gravitacional experimentam
uma aceleração que não depende em absoluto nem do material nem do estado físico do
corpo. Um pedaço de chumbo e um pedaço de madeira, por exemplo, caem no campo
gravitacional (no vácuo) exatamente da mesma maneira, se os deixarmos cair sem
velocidade inicial ou ainda com igual velocidade inicial. (...).
Se, como mostra a experiência, para um dado campo gravitacional a aceleração deve ser
sempre a mesma, independentemente da natureza e do estado do corpo, então a relação
entre a massa gravitacional e a massa inercial também deve ser a mesma para todos os
corpos. Por meio de uma escolha adequada das unidades, podemos fazer com que esta
relação seja igual a um. Vale então o princípio: a massa gravitacional e a massa inercial
de um corpo são iguais uma à outra.
Até hoje a mecânica, na verdade, registrou este importante princípio, mas não o
interpretou. Não podemos chegar a uma interpretação satisfatória senão quando
reconhecermos este fato: conforme as circunstâncias, a mesma qualidade do corpo se
manifesta ora como "inércia" ora como "gravidade" ("peso").” (pág. 56ss).

“Imaginemos uma vasta porção de espaço vazio, tão afastada das estrelas e de outras
massas significativas que, com suficiente exatidão, nos encontremos diante do caso
previsto pelo princípio fundamental de Galileu. Então é possível, para essa parte do
mundo, escolher um corpo de referência galileano relativamente ao qual os pontos em
repouso permanecem em repouso e os pontos em movimento permanecem em
movimento retilíneo uniforme. Como corpo de referência imaginemos uma ampla caixa
com a forma de um aposento; dentro dela, suponhamos que se encontre um observador
provido de aparelhos. Para este observador, evidentemente, não existe gravidade (peso).
Ele terá que se prender ao chão com fios se não quiser que, com o mais leve golpe
contra o chão, seu corpo saia flutuando lentamente em direção ao teto do aposento.

Suponhamos que, bem no centro do teto da caixa, esteja afixado um gancho com uma
corda, e que um ser cuja natureza não nos interessa esteja puxando a corda com uma
força constante. Então a caixa, juntamente com o observador, começará a mover-se para
"cima" em um movimento uniformemente acelerado. Com o correr do tempo sua
velocidade irá assumir valores fantásticos, caso observemos tudo isso a partir de um
outro corpo de referência que não está sendo puxado por uma corda.
Mas como é que o homem dentro da caixa considera o que está acontecendo? A
aceleração da caixa é transmitida a ele pelo piso, que exerce uma pressão contra seus
pés. Portanto, ele tem que absorver esta pressão com as pernas, se não quiser estatelar-
se no chão de corpo inteiro. Assim, ele se encontra dentro da caixa exatamente como
uma pessoa dentro de um aposento de uma casa em nossa Terra. Se ele soltar um corpo
que antes estava segurando com a mão, a aceleração da caixa deixa de ser transmitida a
este corpo; por isso o corpo irá se aproximando do piso da caixa em movimento relativo
acelerado. O observador, além do mais, há de convencer-se que a aceleração do corpo
em direção ao piso é sempre a mesma, qualquer que seja o corpo com que ele realize a
experiência.
Com base em seus conhecimentos sobre o campo gravitacional, tais como foram
discutidos no último item (O campo gravitacional – grifo meu), o homem chegará à
conclusão de que, junto com a caixa, ele se encontra em um campo gravitacional que é
constante no tempo. Por um momento, ficará admirado querendo saber por que a caixa
não cai neste campo gravitacional. Mas então ele descobre o gancho no meio do teto e a
corda tensa que está fixa nele, e conclui logicamente que a caixa se encontra em repouso
suspensa no campo gravitacional.
Temos o direito de zombar do homem dentro da caixa e dizer que sua conclusão está
errada? Se quisermos ser coerentes, acredito que não podemos fazê-lo; temos que
reconhecer, pelo contrário, que sua maneira de ver as coisas não contraria nem a razão
nem as leis conhecidas da mecânica. Mesmo que a caixa esteja acelerada em relação ao
"espaço galileano" que consideramos inicialmente, podemos no entanto considerá-la
como em repouso. Temos, portanto, uma boa razão para estender o princípio da
relatividade a corpos de referência acelerados uns em relação aos outros, e ganhamos
assim um poderoso argumento em favor de um postulado da relatividade geral.
Observe-se que a possibilidade deste ponto de vista se baseia na propriedade
fundamental do campo gravitacional de conferir a todos os corpos a mesma aceleração,
ou, o que significa o mesmo, na proposição da igualdade entre a massa inercial e a
massa gravitacional. Se não existisse essa lei da natureza, o homem na caixa acelerada
não poderia interpretar o comportamento dos corpos de sua vizinhança pela suposição
da existência de um campo gravitacional e não teria nenhuma razão experimental para
considerar seu corpo de referência como estando "em repouso".” (pág. 59s).

“Suponhamos que o homem na caixa prenda na face interna do teto da caixa uma corda,
e que na extremidade livre desta ele amarre um corpo. Por influência deste, a corda
ficará tensa e pendurada "verticalmente". Perguntemo-nos pela causa da tensão da
corda. O homem na caixa dirá: "O corpo suspenso experimenta no campo gravitacional
uma força para baixo, que é equilibrada pela tensão da corda; o que determina o valor
da tensão da corda é a massa gravitacional do corpo suspenso". Mas, por outro lado, um
observador que flutue livremente no espaço há de considerar a situação da seguinte
maneira: "A corda é forçada a acompanhar o movimento acelerado da caixa e transmite
este movimento ao corpo preso a ela. A tensão na corda tem justamente o valor
necessário para produzir a aceleração deste último. O que determina o valor da tensão
na corda é a massa inercial do corpo". Vemos, por este exemplo, que nossa extensão do
princípio da relatividade faz aparecer como necessária a afirmação da igualdade entre a
massa inercial e a massa gravitacional. Com isto obtivemos uma interpretação física
desta proposição.” (pág. 60).

“Suponhamos que eu me encontre diante de um fogão a gás. Sobre o mesmo encontram-
se, lado a lado, duas panelas muito parecidas, a ponto de poderem ser confundidas uma
com a outra. Ambas estão cheias de água até a metade. Observo que de uma das
panelas, de forma contínua, está escapando vapor, e da outra não. Fico admirado com
isto, mesmo que nunca tenha visto antes um fogão a gás ou uma panela. Mas se agora
percebo que sob a primeira panela existe alguma coisa com um brilho azulado, e sob a
outra não, o meu espanto desaparece, mesmo que eu nunca tenha visto antes uma chama
de gás. Pois só posso dizer que é esta coisa azulada que provoca a saída de vapor, ou
pelo menos é a sua possível causa. Mas, se não percebo em nenhuma das panelas aquela
coisa azulada e vejo que de uma delas se desprende vapor e da outra não, então ficarei
admirado e insatisfeito até que eu perceba uma circunstância qualquer que possa ser
responsabilizada pelo comportamento diferente das duas panelas.
Analogamente, procuro em vão na mecânica clássica (ou na Teoria da Relatividade
Especial) alguma coisa real a que possa atribuir a diferença de comportamento dos
corpos em relação aos sistemas de referência K e K'. Newton já havia percebido esta
objeção, que em vão procurou atenuar. Mas foi E. Mach quem a percebeu com mais
clareza, exigindo por isso que a mecânica fosse estabelecida sobre uma nova base. Esta
objeção não pode ser evitada a não ser por uma física que esteja de acordo com o
princípio da relatividade geral. Pois as equações de uma tal física são válidas para todo
corpo de referência, qualquer que seja o estado de movimento em que o mesmo se
encontre.” (pág. 62s).

“As considerações do item 20 (A igualdade entre a massa inercial e a massa
gravitacional... grifo meu) mostram que o princípio da relatividade geral nos dá
condições para deduzir propriedades do campo gravitacional através de procedimentos
puramente teóricos. Com efeito, suponhamos que seja conhecida a evolução espaço-
temporal de um fenômeno qualquer da natureza, tal como ele se desenrola num domínio
galileano relativamente a um corpo de referência galileano K. Por meio de operações
puramente teóricas, isto é, simplesmente através do cálculo, é possível neste caso
determinar como esse processo natural conhecido aparece quando observado de um
corpo de referência K' que está acelerado em relação a K. Mas, como existe um campo
gravitacional em relação a este novo corpo de referência K', nossas considerações nos
dizem como o campo gravitacional influencia o fenômeno estudado.
Aprendemos, por exemplo, que um corpo que, em relação a K, executa um movimento
retilíneo uniforme (de acordo com o princípio de Galileu), em relação ao corpo de
referência acelerado K' (caixa) executa um movimento acelerado, com uma trajetória
em geral curvilínea. Esta aceleração ou esta curvatura corresponde à influência que o
campo gravitacional existente em relação a K' exerce sobre o corpo em movimento. Já
sabemos que o campo gravitacional influencia desta maneira o movimento dos corpos,
de modo que, em princípio, nossa consideração não traz nada de essencialmente novo.
Mas chegamos a um novo resultado de fundamental importância quando aplicamos
considerações análogas a um raio luminoso. Em relação ao corpo de referência
galileano K a luz se propaga em linha reta com a velocidade c. Em relação à caixa
acelerada (corpo de referência K'), como não é difícil concluirmos, a trajetória do
mesmo raio luminoso já não é mais uma reta. Daí devemos concluir que em um campo
gravitacional os raios luminosos em geral se propagam segundo linhas curvas. Este é
um resultado de grande importância, sob dois aspectos.
Com efeito, em primeiro lugar ele pode ser confrontado com a realidade. Embora um
exame detalhado nos mostre que a curvatura dos raios luminosos fornecida pela Teoria
da Relatividade Geral é extremamente pequena para os campos gravitacionais de que
dispomos na prática, ela deve atingir 1,7 segundo de arco para os raios luminosos que
passam nas proximidades do Sol. Isto deveria se manifestar pelo fato de que as estrelas
fixas que aparecem próximas ao Sol, e que durante os eclipses totais do Sol são
acessíveis à observação, se afastam aparentemente do Sol por aquele valor, em relação à
posição por elas ocupada no céu quando o Sol se encontra em outra região do
firmamento. O teste do acerto ou não acerto desta previsão é uma tarefa de extrema
importância, cuja solução pelos astrônomos pode ser esperada para breve (nota 16: A
existência do desvio luminoso exigido pela teoria foi constatada por meio de fotografias
no eclipse total do Sol de 30 de maio de 1919, por duas expedições organizadas pela
Royal Society [e pela Royal Astroonomical Society], sob a direção dos astrônomos
Eddington e Crommelin).
Mas, em segundo lugar, este resultado mostra que a lei já tantas vezes mencionada da
constância da velocidade da luz no vácuo, que constitui uma das duas colunas básicas
da Teoria da Relatividade Especial, não pode, segundo a Teoria da Relatividade Geral,
ter pretensões a uma validade absoluta. Com efeito, só pode ocorrer uma curvatura dos
raios luminosos quando a velocidade de propagação da luz variar com a posição. Poder-
se-ia então pensar que, com esta conclusão, a Teoria da Relatividade Especial, e com ela
a Teoria da Relatividade em si, estaria refutada. Tal coisa não acontece. O que se pode
concluir é apenas que a Teoria da Relatividade Especial não pode ter pretensões a um
domínio de validade ilimitado; seus resultados valem apenas na medida em que a
influência dos campos gravitacionais sobre os fenômenos (por exemplo, os fenômenos
luminosos) possa ser desprezada.
Como os adversários da Teoria da Relatividade afirmaram freqüentemente que a Teoria
da Relatividade Especial é anulada pela Teoria da Relatividade Geral, desejo recorrer
aqui a uma comparação para tornar clara qual é a verdadeira situação. Antes de ser
estabelecida a eletrodinâmica, as leis da eletrostática eram consideradas como sendo
simplesmente as leis da eletricidade. Hoje sabemos que a eletrostática só pode fornecer
corretamente os campos elétricos no caso, nunca estritamente concretizado, de as
massas elétricas estarem perfeitamente em repouso umas em relação às outras e ao
sistema de coordenadas. Será que por isso a eletrostática foi jogada no lixo pelas
equações de campo da eletrodinâmica de Maxwell? De forma alguma! A eletrostática
está contida como caso-limite na eletrodinâmica; as leis desta última levam diretamente
às da primeira no caso em que os campos não variam no tempo. Este é o mais belo
destino que uma teoria física pode ter: quando ela abre caminho para o estabelecimento
de uma teoria mais ampla, na qual continua a viver como um caso particular.” (pág.
63ss).

“Na primeira parte deste livro pudemos servir-nos de coordenadas espaço-temporais
capazes de permitir uma interpretação física simples e direta, e que segundo o item 26
(O contínuo espaço-temporal da Teoria da Relatividade Especial considerada como um
contínuo euclidiano – grifo meu) podem ser consideradas como coordenadas cartesianas
quadridimensionais. Isto foi possível em virtude da lei da constância da velocidade da
luz, a qual, porém, segundo o item 21 (Até que ponto os fundamentos da mecânica
clássica e a Teoria da Relatividade Especial são insatisfatórios? – grifo meu), não pode
ser mantida na Teoria da Relatividade Geral. Pelo contrário, segundo esta última teoria,
chegamos ao resultado de que quando existe um campo gravitacional a velocidade da
luz depende sempre das coordenadas. Além disso, "em um exemplo especial, vimos no
item 23 (O comportamento dos relógios e réguas em um corpo de referência em rotação
– grifo meu) que a existência de um campo gravitacional torna impossível aquela
definição das coordenadas e do tempo que nos havia levado ao nosso objetivo na Teoria
da Relatividade Especial.” (pág. 78).

“Quando anteriormente descrevíamos o movimento de um ponto material em relação a
um corpo de referência, não estávamos indicando outra coisa senão os encontros deste
ponto com determinados pontos do corpo de referência. Também as indicações de
tempo correspondentes podem ser reduzidas à constatação de encontros do corpo com
relógios, juntamente com a constatação do encontro de ponteiros com determinados
pontos dos mostradores. O caso não é diferente nas medições espaciais por meio de
réguas, como podemos nos convencer com um pouco de reflexão.” (pág. 80).

“Estamos agora em condições de substituir por uma formulação exata a formulação
provisória do princípio da relatividade geral dada no item 18 (O princípio da
relatividade especial e geral – grifo meu). A versão que adotamos então - "todos os
corpos de referência K, K' etc. são equivalentes para a descrição da natureza (ou para a
formulação das leis gerais da natureza), qualquer que seja seu estado de movimento" -
não pode mais ser mantida, porque na descrição espaço-temporal geralmente não é
possível empregar corpos rígidos, no sentido do método seguido na Teoria da
Relatividade Especial. O corpo de referência tem que ser substituído pelo sistema de
coordenadas gaussianas. À idéia fundamental do princípio da relatividade geral
corresponde o seguinte enunciado: "Todos os sistemas de coordenadas gausssianos são
essencialmente equivalentes para a formulação das leis gerais da natureza".” (pág.
80s).

“Se não quisermos renunciar à nossa maneira de ver habitual (tridimensional),
poderemos caracterizar da seguinte maneira esse desenvolvimento da idéia básica da
Teoria da Reelatividade Geral: a Teoria da Relatividade Especial refere-se a regiões
galileanas, isto é, a regiões onde não existe campo gravitacional. Como corpo de
referência serve um corpo de referência galileano, isto é, um corpo rígido num estado de
movimento tal que, relativamente a ele, seja válido o princípio de Galileu do movimento
retilíneo uniforme de pontos materiais "isolados".
Certas considerações sugerem que relacionemos essas mesmas regiões galileanas
também a corpos de referência não galileanos. Relativamente a estes, existe então um
campo gravitacional de tipo especial (...).
Mas, nos campos gravitacionais não existem corpos rígidos com propriedades
euclidianas; por isso, a ficção do corpo de referência rígido não funciona na Teoria da
Relatividade Geral. Também a marcha dos relógios é influenciada pelos campos
gravitacionais, de tal forma que uma definição física do tempo que seja feita
diretamente com auxílio de relógios não possui de forma alguma o mesmo grau de
evidência que na Teoria da Relatividade Especial.
Por isso, utilizamos corpos de referência não rígidos, que não apenas têm um
movimento arbitrário, mas que também, durante o movimento, passam por mudanças
arbitrárias de forma. Para definir o tempo servimo-nos de relógios cuja marcha está
sujeita a uma lei qualquer, por mais irregular que seja. Devemos imaginar cada um dos
relógios como estando fixo a um ponto do corpo de referência não rígido. A única
condição que eles devem satisfazer é que as indicações simultaneamente observáveis de
relógios localmente próximos difiram infinitamente pouco umas das outras. Este corpo
de referência não rígido, que não sem razão poderíamos denominar "molusco de
referência", equivale no essencial a um sistema de coordenadas gaussiano
quadridimensional qualquer. O que confere ao "molusco" um certo atrativo em relação
ao sistema de coordenadas gaussiano é a conservação formal (a rigor, injustificada) da
existência separada das coordenadas espaciais em face da coordenada temporal. Todo
ponto do molusco é tratado como um ponto espacial, todo ponto material que está em
repouso (em relação a ele) é considerado simplesmente como estando em repouso
enquanto o molusco for considerado como corpo de referência. O princípio da
relatividade geral exige que todos esses moluscos possam, com igual direito e com igual
êxito, ser empregados como corpos de referência na formulação das leis gerais da
natureza; as leis devem ser totalmente independentes da escolha do molusco.
O grande poder inerente ao princípio da relatividade geral reside na grande restrição que
isto impõe às leis da natureza.” (pág. 81ss).

“Do que ficou dito concluímos que é possível imaginar espaços fechados que não
possuem limites. Entre estes, o espaço esférico (ou o elíptico) destaca-se por sua
simplicidade, já que todos os seus pontos são equivalentes. Coloca-se então, a
astrônomos e físicos, a interessantíssima questão de saber se o Universo em que
vivemos é infinito ou, à maneira do mundo esférico, finito. Nossa experiência nem de
longe é suficiente para responder a esta pergunta. Mas a Teoria da Relatividade Geral
permite respondê-Ia com bastante segurança; (...). (pág. 92).

“De acordo com a Teoria da Relatividade Geral, as propriedades geométricas do espaço
não são independentes da matéria, mas são por ela condicionadas. Só poderemos,
portanto, afirmar alguma coisa sobre a estrutura geométrica do Universo quando
construirmos nossas considerações admitindo que seja conhecido o estado da matéria.
Sabemos pela experiência que, para um sistema de coordenadas convenientemente
escolhido, as velocidades das estrelas são pequenas em relação à velocidade da
propagação da luz. Em primeira e grosseira aproximação podemos, por conseguinte,
conhecer a constituição do Universo tratando a matéria como imóvel.
Já sabemos por nossas considerações anteriores que o comportamento de réguas e
relógios é influenciado pelos campos gravitacionais, isto é, pela distribuição da matéria.
Daí já se pode concluir que em nosso Universo não é correto falar em uma validade
exata da geometria euclidiana. Mas não é impossível que nosso Universo pouco difira
de um Universo euclidiano, concepção que parece tanto mais provável porque o cálculo
mostra que mesmo massas do tamanho do nosso Sol exercem uma influência mínima
sobre a métrica do espaço circundante. Poderíamos imaginar que nosso Universo, do
ponto de vista geométrico, se comporta de maneira análoga a uma superfície que, em
detalhe, possui curvas e irregularidades, mas que em nenhuma parte difere
consideravelmente de um plano, mais ou menos como a superfície de um lago
encrespada por pequenas ondas. Um Universo assim poderia ser adequadamente
denominado um Universo quase-euclidiano. Espacialmente, ele seria infinito. Mas os
cálculos mostram que em um Universo quase-euclidiano a densidade média da matéria
teria que ser nula. Um Universo assim, portanto, não poderia estar povoado em toda
parte por matéria; (...).
Se existir no Universo uma densidade média de matéria diferente de zero, mesmo que
difira muito pouco de zero, então o Universo não é quase-euclidiano. Os cálculos
mostram, pelo contrário, que no caso de uma distribuição uniforme da matéria ele teria
necessariamente que ser esférico (ou elíptico). Efetivamente, como a distribuição
detalhada da matéria é irregular, o Universo real diferirá em detalhes do comportamento
esférico, ou seja, ele será um Universo quase-esférico. Mas terá que necessariamente ser
finito. A Teoria chega mesmo a fornecer uma relação simples entre a extensão espacial
do Universo e a densidade média da matéria.” (pág. 92ss).

“Do ponto de vista de uma teoria do conhecimento esquemática, o processo de
desenvolvimento de uma ciência experimental costuma ser imaginado como um
contínuo processo de indução. As teorias emergem como resumos de uma grande
quantidade de experiências transformadas em leis experimentais, a partir das quais as
leis gerais são determinadas por comparação. A evolução da ciência, de acordo com este
modo de ver, assemelha-se a um trabalho de catalogação, um produto meramente
empírico.
Mas esta concepção não esgota em absoluto todo o processo real. Com efeito, ela deixa
de considerar o papel importante que a intuição e o pensamento dedutivo desempenham
no desenvolvimento de uma ciência exata. Pois, logo que uma ciência tenha deixado
para trás a sua fase mais primitiva, os progressos teóricos não são mais realizados por
um simples trabalho de ordenação. Pelo contrário, o pesquisador, estimulado pelos fatos
da experiência, desenvolve um sistema de pensamento que o mais das vezes baseia-se
logicamente em um pequeno número de suposições fundamentais, os assim chamados
axiomas. Um tal sistema de pensamento é denominado uma teoria. A razão de existir da
teoria decorre do fato de ela estabelecer uma ligação entre um grande número de
experiências isoladas; é aí que reside sua "verdade".
Ora, para o mesmo complexo de fatos experimentais podem existir diferentes teorias,
consideravelmente distintas umas das outras. No que diz respeito às conseqüências que
são acessíveis à experiência, as teorias podem concordar de forma tão ampla que fica
difícil encontrar outras conseqüências capazes de estabelecer experimentalmente a
distinção entre elas. Um destes casos de interesse geral nós encontramos, por exemplo,
no terreno da biologia, onde se defrontam, por um lado, a teoria de Darwin da evolução
das espécies pela seleção natural na luta pela existência e, por outro, a teoria da
evolução baseada na hipótese da transmissão hereditária dos caracteres adquiridos.
Outro caso em que há ampla concordância das conseqüências é apresentado pela
mecânica newtoniana, de um lado, e a Teoria da Relatividade Geral, do outro. Esta
concordância vai tão longe que até hoje não foi possível encontrar senão poucas
conseqüências da Teoria da Relatividade Geral acessíveis à experiência que não tenham
sido previstas também pela física pré-relativística - não obstante a profunda diferença
dos pressupostos básicos das duas teorias.” (pág. 101s).


“Desde que foi publicada a primeira edição deste livro, nosso conhecimento sobre a
estrutura do espaço como um todo (o "problema cosmológico") passou por um
importante desenvolvimento, que não podemos deixar de mencionar mesmo em uma
apresentação popular do assunto.

Minhas primeiras considerações sobre o assunto baseavam-se em duas hipóteses:
1. Existe em todo o espaço uma densidade média diferente de zero, que é a mesma em
toda parte.

2. O tamanho (ou o raio) do Universo independe do tempo.

De acordo com a Teoria da Relatividade Geral estas duas hipóteses comprovaram-se
compatíveis uma com a outra, mas isso só ocorria quando às equações de campo se
acrescentava um termo hipotético, que nem era exigido pela teoria em si nem parecia
evidente do ponto de vista teórico ("termo cosmológico das equações de campo").
A segunda hipótese se me afigurava então indispensável, pois parecia-me que, se ela
fosse rejeitada, iríamos cair em especulações sem fim.
Porém, já na década de 1920 o matemático russo Friedman descobriu que, do ponto de
vista teórico, era mais natural uma suposição diferente. Percebeu que, caso
resolvêssemos deixar de lado a segunda hipótese, era possível manter a primeira
hipótese sem que fosse preciso se introduzir nas equações do campo gravitacional o
termo cosmológico, em si pouco natural. Com efeito, as equações de campo originais
admitem uma solução em que o "raio do Universo" depende do tempo (espaço em
expansão). Neste sentido pode-se afirmar, com Friedman, que a teoria exige uma
expansão do espaço.
Poucos anos mais tarde, Hubble, através de seus estudos espectrais sobre as nebulosas
extragalácticas ("vias lácteas"), demonstrou que as linhas espectrais por elas emitidas
apresentam um deslocamento para o vermelho que aumenta regularmente com a
distância da nebulosa. De acordo com nossos conhecimentos atuais sobre o princípio de
Doppler, este deslocamento só pode ser interpretado como um movimento de expansão
do sistema estelar como um todo - como, segundo Friedman, as equações do campo
gravitacional exigem. Neste sentido, a descoberta de Hubble pode ser interpretada como
uma confirmação da teoria.
Mas resulta daí uma curiosa dificuldade. A interpretação (teoricamente quase
indubitável) dos deslocamentos das linhas descobertos por Hubble como uma expansão
do Universo leva a um início da expansão situado há "apenas" 109 anos atrás, enquanto
a astronomia física faz parecer provável que a evolução das estrelas e dos sistemas
estelares exige tempos consideravelmente maiores. No presente, ainda não sabemos
com certeza como é possível superar estas incongruências.
Deve-se observar também que a teoria do Universo em expansão, juntamente com os
dados empíricos da astronomia, não nos permite concluir se o espaço (tridimensional) é
finito ou infinito, enquanto a hipótese primitiva do espaço estático implicava um espaço
fechado (finito).” (pág. 109s).

“O que caracteriza a física newtoniana é que, além da matéria, ela é obrigada a atribuir
ao espaço e ao tempo uma existência real independente. Pois na lei do movimento de
Newton figura o conceito de aceleração. Mas aceleração, nessa teoria, só pode significar
"aceleração em relação ao espaço". O espaço newtoniano deve, portanto, ser
considerado como estando "em repouso", ou pelo menos como "não acelerado", para
que se possa atribuir um sentido à aceleração mencionada na lei do movimento. O
mesmo vale a respeito do tempo, que também entra no conceito de aceleração. Newton
mesmo, assim como seus contemporâneos dotados de senso crítico, sentiu-se
constrangido em atribuir tanto ao espaço em si como ao seu estado de movimento uma
realidade física; na época, porém, não havia outra saída, se se queria atribuir à mecânica
um sentido claro.
Já é bastante pretensioso termos que atribuir ao espaço em geral uma realidade física,
sobretudo ao espaço vazio. Desde os tempos mais antigos, os filósofos manifestaram
resistência contra esta pretensão. Descartes raciocinava mais ou menos da seguinte
maneira: o espaço é idêntico à extensão, mas a extensão está ligada a corpos. Portanto,
não há espaço sem corpos, isto é, não existe espaço vazio. O ponto fraco desta
argumentação reside principalmente no seguinte: está correto que o conceito de
extensão deve sua origem às experiências feitas com o ato de colocar corpos sólidos em
contato, mas daí não podemos inferir que o conceito de extensão não esteja justificado
nos casos que não motivaram a formação do conceito. Uma tal ampliação de um
conceito também pode ser justificada indiretamente pelo valor que ele demonstra para a
compreensão de dados empíricos. Afirmar que a extensão está ligada ao corpo é, em si,
algo sem fundamento. Porém, veremos mais adiante que a Teoria da Relatividade Geral
confirma indiretamente a concepção de Descartes. O que levou Descartes à sua
concepção tão atraente foi certamente o sentimento de que não se pode, fora do caso de
imperiosa necessidade, atribuir realidade a uma coisa que não é "diretamente acessível"
à experiência, como ocorre com o espaço.
A origem psicológica da noção de espaço, ou da necessidade desta noção, não é tão
manifesta como poderia parecer em razão de nossos hábitos de pensar. Os antigos
geômetras tratam de objetos criados pela mente (reta, ponto, superfície), mas não do
espaço como tal, como o fez mais tarde a geometria analítica. Mas o conceito de espaço
nos é sugerido por certas experiências primitivas. Suponha-se que tenhamos construído
uma caixa; dentro dela podemos guardar objetos numa certa ordem, de maneira que a
caixa fica cheia. A possibilidade de fazer tais arrumações é uma propriedade do objeto
corporal chamado caixa, algo que é dado com a caixa, o "espaço encerrado" pela caixa.
Este espaço é diferente para diferentes caixas, algo que muito naturalmente nós
imaginamos como independente do fato de na caixa estarem ou não estarem guardados
objetos. Quando a caixa não contém objeto nenhum, seu espaço nos parece "vazio".
Até aqui, nosso conceito de espaço está ligado à caixa. Mas é fácil comprovar que as
possibilidades de ocupação que constituem o espaço da caixa são independentes da
espessura de suas paredes. Não se pode reduzir essa espessura à zero, sem que com isso
o "espaço" desapareça? A naturalidade de uma tal passagem ao limite é evidente.
Agora, em nossa mente, o espaço existe sem a caixa, como objeto independente, o que
no entanto nos parece tão irreal quando esquecemos a maneira como este conceito se
originou. Compreende-se que Descartes tenha experimentado certa repugnância em
considerar o espaço como um objeto independente dos objetos corporais, como uma
coisa que possa existir sem matéria. (O que, no entanto, não o impede de tratar o espaço
como um conceito fundamental em sua geometria analítica.) Mas uma olhada no vácuo
do barômetro de mercúrio deve certamente ter jogado por terra as resistências dos
últimos cartesianos. Não podemos, entretanto, negar que, já neste estágio primitivo, no
conceito de espaço, ou no espaço imaginado como um objeto real independente, há algo
de insatisfatório.” (pág. 111s).

“Quando uma caixa menor c se encontra em repouso relativo no interior do espaço
vazio de uma caixa maior C, então o espaço vazio de c é uma parte do espaço vazio de
C, e a ambas as caixas pertence o mesmo espaço que as contém. Mas a noção já se torna
menos simples quando c está em movimento em relação a C. Então nos inclinamos a
pensar que c encerra sempre o mesmo espaço, mas ocupando uma parte variável do
espaço C. Somos forçados a atribuir a cada caixa um espaço particular (que não é
concebido como limitado) e admitir que estes dois espaços estão em movimento um em
relação ao outro.
Antes de nossa atenção ter sido despertada para esta complicação, o espaço aparece
como um meio limitado (recipiente) no qual os objetos corporais se deslocam. Ora,
devemos pensar que existe um número infinito de espaços em movimento uns em
relação aos outros. O conceito de espaço como algo que existe objetivamente e
independentemente das coisas já estava presente no pensamento pré-científico, mas isso
não ocorre com a idéia de existir um número infinito de espaços movendo-se uns em
relação aos outros. Esta última idéia, de certo, é logicamente inevitável, porém durante
muito tempo ela não desempenhou nenhum papel importante nem mesmo no
pensamento científico.
Mas, que dizer da origem psicológica do conceito de tempo? Este conceito está
indubitavelmente ligado ao fato de nos "lembrarmos", bem como à distinção entre as
experiências sensoriais e a lembrança destas experiências. Em si é duvidoso que a
distinção entre experiências sensoriais e a lembrança (ou a simples idéia) delas seja para
nós um dado psicológico imediato. Todo mundo passou alguma vez pela experiência de
ficar em dúvida se experimentou algo com seus sentidos ou se simplesmente sonhou
com isso. Provavelmente esta distinção só surge como um resultado de uma atividade
ordenadora da mente.
Ao ato de "lembrar" é associada uma experiência que é considerada como "anterior"
quando comparada com as "experiências presentes". Este é um princípio conceitual de
ordem para experiências (imaginadas) cuja possibilidade de realização dá lugar ao
conceito subjetivo de tempo, isto é, àquele conceito de tempo que se refere à ordem das
experiências vividas pelo indivíduo.
(...). Um exemplo. A pessoa A ("eu") tem a experiência de que "relampeja". A pessoa A
vivencia também um comportamento da pessoa B que estabelece uma conexão entre
este comportamento e a experiência de que "relampeja". Para a pessoa A surge a idéia
de que também outras pessoas participam da experiência "relampeja". O "relampeja" já
não é visto mais, exclusivamente, como uma experiência pessoal, mas sim como uma
experiência (talvez apenas uma "experiência potencial") de outras pessoas. Nasce assim
a concepção de que o "relampeja", que originalmente entrou na consciência como uma
"experiência", agora é concebido também como um "evento" (objetivo). É ao conjunto
de todos os eventos que nos referimos quando falamos do "mundo exterior real".
(...).
Para chegarmos a uma objetivação do mundo temos necessidade de uma idéia
construtiva suplementar: o evento está localizado também no espaço, e não apenas no
tempo.” (pág. 114ss)

“Todos estes conceitos de natureza espacial já pertencem ao pensamento pré-científico,
ao lado dos conceitos provenientes da esfera psicológica, como dor, meta, finalidade
etc. Para o pensamento físico, como para o pensamento científico em geral, é
característico tentar arranjar-se apenas com os conceitos "de natureza espacial",
buscando expressar por meio deles todas as relações que possuem caráter de lei. O
físico procura reduzir cores e tons a vibrações, o fisiologista procura reduzir
pensamento e dor a processos nervosos, de tal maneira que o psíquico como tal seja
eliminado do encadeamento causal do ser, de modo que ele, por conseguinte, não se
manifeste em parte alguma como um elo independente nas ligações causais. Esta
atitude, que em princípio considera possível abranger todas as relações empregando
exclusivamente conceitos "de natureza espacial", é certamente o que entendemos hoje
por "materialismo" (depois que a "matéria" perdeu seu papel de conceito fundamental).
Por que é necessário fazer com que os conceitos fundamentais do pensamento científico
desçam do olimpo platônico e tentar descobrir-lhes a origem terrena? A resposta é: para
livrar estes conceitos dos tabus que aderiram a eles, de modo a adquirirmos maior
liberdade na formação dos conceitos. Este é, em primeira linha, o mérito imperecível de
D. Hume e E. Mach, o de haverem introduzido esta reflexão crítica.
A ciência tomou os conceitos de espaço, tempo, objeto material (incluindo o importante
caso particular dos "corpos sólidos") do pensamento pré-científico, os tornou mais
precisos e os modificou. Sua primeira realização importante foi desenvolver a geometria
euclidiana, cuja formulação axiomática não nos deve fazer perder de vista sua origem
empírica (a possibilidade de transportar e justapor corpos sólidos). De origem empírica
são também as três dimensões do espaço, assim como seu caráter euclidiano (ele pode
ser preenchido sem lacunas por "cubos" idênticos).
O caráter sutil do conceito de espaço tornou-se mais claro quando se descobriu que não
existem corpos absolutamente rígidos. Todos os corpos são elasticamente deformáveis e
modificam seus volumes com a variação da temperatura. As figuras cujas possíveis
congruências deveriam ser descritas pela geometria euclidiana não podem, por
conseguinte, ser especificadas fora do contexto da física. Mas, como a física já tem que
fazer uso da geometria na fixação de seus conceitos, o conteúdo empírico da geometria
não pode ser especificado e examinado a não ser dentro da moldura da física como um
todo.
Neste contexto devem ser pensados também o atomismo e sua concepção de
divisibilidade finita, pois os espaços de extensão subatômica não podem ser medidos. O
atomismo nos obriga também a abandonar em princípio a idéia de superfícies limítrofes
(de corpos sólidos) nítida e estaticamente definidas. Rigorosamente falando, não
existem leis independentes para as possíveis configurações de corpos sólidos que tocam
uns nos outros, mesmo no domínio macroscópico.
Apesar de tudo, ninguém pensou em abandonar o conceito de espaço, que parecia
indispensável ao sistema global das ciências naturais, tão bem-sucedido na prática.
Mach, no século XIX, foi o único a pensar seriamente em uma eliminação do conceito
de espaço, tentando substituí-lo pela noção da totalidade das distâncias instantâneas
entre todos os pontos materiais (ele fez essa tentativa com o objetivo de chegar a uma
concepção satisfatória da inércia).” (pág. 116ss).

/

“Na mecânica newtoniana, o espaço e o tempo desempenham um duplo papel. Primeiro,
como suporte ou moldura do acontecer físico, em relação ao qual os eventos são
descritos por meio das coordenadas do espaço e do tempo. A matéria, em princípio, é
considerada como consistindo de "pontos materiais", cujos movimentos constituem o
acontecer físico. Quando imaginamos a matéria como contínua, isto de certa forma é
feito como algo provisório, nos casos em que não queremos ou não podemos descrever
sua estrutura discreta. Neste caso, pequenas partes de matéria (elementos de volume)
são tratadas como pontos materiais, ao menos na medida em que se trata apenas dos
movimentos, e não de processos cuja redução a movimentos não é por enquanto
possível ou oportuna (por exemplo, variações de temperatura, processos químicos). O
segundo papel do espaço e do tempo é o de "sistema inercial". Os sistemas inerciais
eram considerados como preferíveis a todos os sistemas de referência, porque em
relação a eles a lei da inércia é considerada válida.
O essencial, nisto tudo, é que a "realidade física", imaginada como independente dos
sujeitos que a experimentam, era por um lado entendida - pelo menos em princípio -
como formada de espaço e tempo, e por outro, como pontos materiais de existência
permanente movendo-se em relação ao espaço e tempo. A idéia da existência
independente do espaço e tempo pode ser expressa desta maneira drástica: caso a
matéria desaparecesse, restariam apenas espaço e tempo (como uma espécie de palco
para o acontecer físico).” (pág. 118s).

“É uma característica dos campos mencionados que eles ocorrem apenas no interior de
uma massa ponderável; eles não pretendem outra coisa senão descrever um estado desta
matéria. Onde não existia matéria, aí também - de acordo com a gênese do conceito de
campo - não podia existir campo. Mas então, no primeiro quartel do século XIX,
verificou-se que os fenômenos de interferência e de propagação da luz podiam ser
explicados com admirável clareza se se considerasse a luz como um campo de ondas
perfeitamente análogo ao campo das oscilações mecânicas em um sólido elástico. Foi
necessário introduzir um campo que era capaz de existir também no espaço vazio, na
ausência de matéria ponderável.
Este estado de coisas criou uma situação paradoxal, porque o conceito de campo, de
acordo com sua origem, parecia restrito a descrever os estados no interior de um corpo
ponderável. Tanto mais certo isto se afigurava porque se estava convencido de que todo
campo devia ser considerado como um estado capaz de ser interpretado mecanicamente,
o que exigia presença de matéria. Assim se começou a sentir a necessidade de admitir
em toda parte, também no espaço considerado vazio, a existência de uma matéria, que
recebeu o nome de "éter".” (pág. 120).

“A teoria do éter fez nascer a seguinte questão: do ponto de vista mecânico, como se
comporta o éter em relação aos corpos ponderáveis? Participará ele dos movimentos dos
corpos, ou suas partículas estão em repouso umas em relação às outras? Muitas
experiências engenhosas foram empreendidas para responder a esta questão. Como fatos
importantes, neste contexto, entraram em pauta também a aberração das estrelas fixas
em conseqüência do movimento anual da Terra, assim como o "efeito Doppler"
(influência do movimento relativo das estrelas fixas sobre a freqüência da luz que chega
até nós e que possui uma freqüência de emissão conhecida). Os resultados desses fatos e
experiências (com exceção de uma única, a experiência de Michelson-Morley) foram
explicados por H. A. Lorentz pela admissão de que o éter não participa dos movimentos
dos corpos ponderáveis, e que suas partes não executam qualquer movimento relativo
umas em relação às outras. O éter aparecia assim, de certa maneira, como a
personificação de um espaço em repouso absoluto. Mas a investigação de Lorentz deu
outros frutos. Ela explicou os processos eletromagnéticos e ópticos então conhecidos no
interior de corpos ponderáveis supondo que a influência da matéria ponderável sobre o
campo elétrico (e vice-versa) deve ser atribuída apenas ao fato de as partículas da
matéria carregarem cargas elétricas, que participam de seus movimentos. Com
reeferência ao experimento de Michelson e Morley, H. A. Loorentz demonstrou que seu
resultado, pelo menos, não está em contradição com a teoria do éter em repouso.
Não obstante todos esses belos resultados, a situação da teoria não era plenamente
satisfatória, pela seguinte razão. A mecânica clássica, incontestavelmente válida com
grande precisão, postula a equivalência de todos os sistemas inerciais (ou espaços
inerciais) para a formulação das leis naturais (invariância das leis da natureza quando se
passa de um sistema inercial a outro). Os experimentos eletromagnéticos e ópticos
demonstravam a mesma coisa, com considerável exatidão. Mas o fundamento da teoria
eletromagnética postulava o privilégio de um sistema inercial particular, a saber, o do
éter luminoso em repouso. Esta concepção dos fundamentos teóricos era por demais
insatisfatória. Não haveria uma modificação que levasse em conta - como a mecânica
clássica - a equivalência dos sistemas inerciais (princípio da relatividade especial)?
A resposta a esta pergunta é a Teoria da Relatividade Especial. Esta toma da teoria de
Maxwell-Lorentz o pressuposto da constância da velocidade da luz no espaço vazio.
Para harmonizá-la com a equivalência dos sistemas inerciais (princípio da relatividade
especial) deve-se renunciar ao caráter absoluto da simultaneidade; resultam daí, além
disso, as transformações de Lorentz para o tempo e para as coordenadas espaciais
quando se passa de um sistema inercial para outro. Todo o conteúdo da Teoria da
Relatividade Especial está incluído no seguinte postulado: as leis naturais são
invariantes em relação às transformações de Lorentz. O importante desta exigência
consiste em que ela limita de uma forma determinada as leis naturais possíveis.
Qual a posição da Teoria da Relatividade Especial em relação ao problema do espaço?
Primeiro precisamos evitar a opinião de que foi esta teoria que introduziu o caráter qua
dridimensional do mundo real. Também na mecânica clássica o evento é localizado
através de quatro números, isto é, de três coordenadas espaciais e uma coordenada
temporal; a totalidade dos "eventos" físicos é imaginada, portanto, como imersa em uma
variedade quadridimensional contínua. Mas, de acordo com a mecânica clássica, este
contínuo quadridiimensional fica objetivamente decomposto em um tempo
unidimensional e em seções (cortes) espaciais tridimensionais, os quais só contêm
eventos simultâneos. Esta decomposição é a mesma para todos os sistemas inerciais. A
simultaneidade de dois eventos em relação a um sistema inercial acarreta a
simultaneidade destes eventos em relação a todos os sistemas inerciais. É isto que se
quer dizer quando se afirma que o tempo da mecânica clássica é absoluto. De acordo
com a Teoria da Relatividade Especial a coisa é diferente. A idéia de uma totalidade de
eventos que são simultâneos com um evento determinado existe, é verdade, em relação
a um sistema inercial particular, porém não é mais independente da escolha do sistema
inercial. O contínuo quadridimensional já não se decompõe mais objetivamente em
seções que contêm todos os eventos simultâneos. O "agora" deixa de ter seu significado
objetivo para o mundo espacialmente estendido. Isto implica que devemos considerar
espaço e tempo como um contínuo quadridimensional objetivamente indissociável, se
quisermos expressar o conteúdo das relações objetivas sem cair em uma desnecessária
arbitrariedade.
Ao apontar a equivalência física de todos os sistemas inerciais, a Teoria da Relatividade
Especial tornou manifesta a insustentabilidade da hipótese de um éter em repouso. Por
isso foi necessário renunciar à idéia de que o campo eletromagnético deva ser
considerado como um estado de um substrato material. O campo passou a ser um
elemento irredutível da descrição física, irredutível no mesmo sentido que o conceito de
matéria na teoria de Newton.” (pág. 121ss).

“Agora estamos preparados para ver em que medida a transição para a Teoria da
Relatividade Geral modifica o conceito de espaço. De acordo com a mecânica clássica e
com a Teoria da Relatividade Especial, o espaço (espaço-tempo) tem uma existência
independente em relação à matéria ou ao campo. Para que possamos descrever aquilo
que o preenche e que depende das coordenadas, o espaço-tempo ou o sistema inercial
com suas propriedades métricas já tem que ser pensado como existindo de antemão,
porque do contrário a descrição daquilo que "enche o espaço" não teria sentido.” (pág.
128).

“Descartes, assim, não estava tão errado quando julgava dever excluir a existência de
um espaço vazio. A opinião pode parecer absurda enquanto enxergamos a realidade
física exclusivamente nos corpos ponderáveis. Só a idéia do campo como maneira de
representar a realidade, combinada com o princípio da relatividade geral, mostra o
verdadeiro núcleo da idéia de Descartes: não existe espaço "vazio de campo".” (pág.
129).

“Para a reflexão geral que acabamos de apresentar, a questão da lei particular do campo
é secundária. A questão principal, atualmente, é saber se uma teoria de campo como a
que consideramos aqui pode realmente levar ao objetivo. Refiro-me a uma teoria que
descreve a realidade física de maneira exaustiva (incluindo o espaço a quatro
dimensões) por meio de um campo. A atual geração de físicos inclina-se a responder
negativamente a esta pergunta; em conexão com a forma atual da teoria quântica, esses
físicos acreditam que o estado de um sistema não pode ser caracterizado direta mas,
apenas, indiretamente, mediante a especificação da estatística dos resultados de medidas
realizadas no sistema; predomina a convicção de que a natureza dupla (estrutura
corpuscular e estrutura ondulatória), solidamente provada pela experiência, só pode ser
a1cançada através desse enfraquecimento do conceito de realidade. Sou de opinião que,
no momento, uma renúncia teórica tão ampla não possui base suficiente em nosso
conhecimento real, e que não deveríamos desistir de levar até o fim o caminho da teoria
do campo relativístico.” (pág. 130).

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EINSTEIN - A Teoria da Relatividade

  • 1. EINSTEIN, Albert. A Teoria da Relatividade Especial e Geral. Rio de Janeiro: Contraponto, 1999. Resumo por: Carlos Jorge Burke – www.cburke.com.br OBS: Se desejar, solicitar arquivo pelo blog. “Nota para 15ª edição. Nesta edição, acrescentei, como um quinto apêndice, uma apresentação de minhas convicções sobre o problema do espaço em geral e sobre as modificações graduais de nossas idéias a respeito dele, que resultaram da influência do ponto de vista relativístico. Quis mostrar que o espaço-tempo não é necessariamente algo a que possamos atribuir uma existência separada e independente dos objetos da realidade física. Objetos físicos não estão no espaço. Estes objetos são espacialmente estendidos. Assim, o conceito de "espaço vazio" perde seu significado. Julho de 1952”. “Agora podemos ver como é vantajoso para a descrição de posições que, através de números que indicam as medidas, consigamos nos libertar da existência de lugares marcados e nomeados sobre o corpo rígido a que a indicação do lugar se refere. A física das medidas consegue isso com o emprego do sistema cartesiano de coordenadas. Este sistema consiste de três paredes planas, perpendiculares entre si e unidas de maneira a formar um corpo rígido. A posição de um evento qualquer em relação ao sistema de coordenadas é descrito, no essencial, indicando-se os comprimentos das três perpendiculares, ou coordenadas (x, y, z), que podem ligar o evento àquelas três paredes planas. Os comprimentos destas três perpendiculares podem ser determinados por uma série de manipulações com réguas rígidas; tais manipulações são determinadas de acordo com as leis e os métodos da geometria euclidiana. Nas aplicações práticas, aquelas paredes rígidas que formam o sistema de coordenadas quase nunca existem na realidade; também as coordenadas não são determinadas através de construções com estacas rígidas, mas sim indiretamente. Porém, o sentido físico das especificações de posição sempre deve ser buscado conforme as discussões precedentes, se não quisermos que os resultados da física e da astronomia se percam na imprecisão. (nota 4. Só na segunda parte deste livro, quando tratarmos da Teoria da Relatividade Geral, será necessário aperfeiçoar e modificar estes conceitos). Chegamos assim ao seguinte resultado: toda descrição de eventos no espaço necessita de um corpo rígido com o qual os eventos são espacialmente relacionados. Toda e qualquer relação pressupõe que, para os "segmentos de reta", valem as leis da geometria euclidiana, sendo o "segmento" representado por duas marcas sobre um corpo rígido”. (pág. 15s). “Sem me preocupar muito e sem oferecer explicações detalhadas, eu poderia definir da seguinte forma a tarefa da mecânica: "A mecânica tem que descrever como os corpos, com o tempo, modificam sua posição no espaço". Neste caso, estaria onerando minha consciência com alguns pecados graves contra o espírito santo da clareza; estes pecados precisam logo ser desmascarados. Não está claro o que devemos compreender aqui por "posição" e "espaço". Suponhamos que eu me encontre junto à janela do vagão de um trem que viaja uniformemente e que deixe cair uma pedra sobre o leito da estrada, sem lhe conferir nenhum impulso inicial. Então (abstraindo do efeito da resistência do ar) eu vejo a pedra cair em linha reta. Um pedestre que esteja observando minha ação a partir do solo observa que a pedra cai à terra percorrendo um arco de parábola. Pergunto-me, então: as "posições" seguidas pela pedra estão situadas, "na realidade", sobre uma reta ou sobre uma parábola? Além disso, o que significa aqui movimento "no espaço"? De acordo com as reflexões do item 2 (o
  • 2. sistema de coordenadas – grifo meu), a resposta é evidente. Comecemos, portanto, por deixar de lado esta obscura palavra "espaço", com a qual, para sermos sinceros, não somos capazes de imaginar coisa alguma; em lugar de espaço falaremos em "movimento em relação a um corpo de referência praticamente rígido". As posições em relação ao corpo de referência (que, em nosso exemplo, pode ser ou o vagão ou o solo) já foram definidas expressamente no parágrafo anterior. Introduzindo, em lugar de "corpo de referência", o conceito de "sistema de coordenadas", que é mais vantajoso para a descrição matemática, podemos dizer: em relação a um sistema de coordenadas rigidamente ligado ao vagão, a pedra descreve uma reta; em relação a um sistema rigidamente ligado ao solo, ela descreve uma parábola. Com este exemplo, vemos claramente que não existe uma trajetória em si, mas apenas uma trajetória em relação a um determinado corpo de referência”. (pág. 16s) “Como todos sabem, a lei fundamental da mecânica de Galileu-Newton, conhecida como lei da inércia, diz o seguinte: um corpo suficientemente afastado de outros corpos permanece em estado de repouso ou de movimento retilíneo uniforme. Esta proposição não somente enuncia algo sobre o movimento dos corpos, mas nos diz também que corpos de referência, ou sistemas de coordenadas, são admissíveis e podem ser empregados para a descrição mecânica. Corpos aos quais a lei da inércia se aplica com grande aproximação são as estrelas fixas visíveis. Ora, se empregarmos um sistema de coordenadas rigidamente ligado à Terra, toda estrela fixa descreve em relação a ele no correr de um dia (astronômico) um círculo de raio imenso, o que está em contradição com a lei da inércia. Se, portanto, quisermos conservar esta lei, só podemos relacionar os movimentos a sistemas de coordenadas em relação aos quais as estrelas fixas não executam movimentos circulares. Chamamos de "sistema de coordenadas galileano" um sistema de coordenadas cujo estado de movimento é tal que, relativamente a ele, a lei da inércia é válida. As leis de Galileu-Newton são válidas apenas para os sistemas de coordenadas galileanos.” (pág. 18) “O princípio da relatividade (no sentido restrito): A fim de conseguirmos o máximo de clareza possível, partimos mais uma vez do exemplo do vagão que se movimenta uniformemente pela estrada de ferro. Denominamos seu movimento de movimento de translação uniforme ("uniforme" porque ocorre com velocidade e direção constantes; de "translação" porque, embora o vagão mude de posição relativamente ao leito da estrada, ele não executa movimento de rotação). Suponhamos um corvo que, em relação ao leito da estrada sulca os ares num movimento retilíneo e uniforme. Para um observador situado no vagão, o movimento do corvo, embora seja um movimento com uma velocidade e uma direção diferentes, é também um movimento retilíneo e uniforme. Expressando isto em termos abstratos: se uma massa m se movimenta de maneira retilínea e uniforme em relação a um sistema de coordenadas K, ela também se movimenta de maneira retilínea e uniforme em relação a um segundo sistema de coordenadas K', caso este último realize em relação a K um movimento de translação uniforme. Levando em conta o que foi estabelecido no parágrafo precedente, daí resulta que: se K for um sistema de coordenadas galileano, todo outro sistema de coordenadas K' que executa em relação a K um movimento de translação uniforme também é um sistema de coordenadas galileano. Em relação a K', as leis da mecânica de Galileu-Newton são tão válidas como em relação a K. Daremos um passo a mais em direção à generalização enunciando a seguinte proposição: se K' é um sistema de coordenadas que efetua um movimento uniforme e
  • 3. sem rotação em relação a K, os fenômenos da natureza que se desenrolam em relação a K' obedecem exatamente às mesmas leis que em relação a K. Chamamos este enunciado de "princípio da relatividade" (no sentido restrito). Enquanto todos estavam convencidos de que os fenômenos da natureza podiam ser representados com auxílio da mecânica clássica, a validade deste princípio da relatividade nunca foi posta em dúvida. Mas, os novos desenvolvimentos da eletrodinâmica e da óptica foram tornando cada vez mais claro que a mecânica clássica era uma base insuficiente para a descrição de todos os fenômenos físicos. Com isto, também passou a ser discutida a questão da validade do princípio da relatividade, e a possibilidade de a resposta ser negativa não parecia excluída.” (pág. 18s). “Suponhamos que o trem de que tantas vezes já falamos se desloque sobre os trilhos com velocidade constante v, em metros por segundo, por exemplo. Suponhamos ainda que, no trem, um homem percorra o vagão no sentido do comprimento deste e na mesma direção de seu movimento, andando com a velocidade w. Quão rapidamente, ou com que velocidade W, o homem, durante sua marcha, avança em relação ao leito da estrada? A única resposta possível parece resultar da seguinte consideração: Se o homem permanecesse parado durante um segundo, em relação ao leito da estrada ele avançaria uma distância igual à velocidade do trem, v. Mas, na realidade, por estar marchando, durante este segundo ele percorre em relação ao vagão, e por conseguinte também em relação ao leito da estrada, a distância w. No segundo que escolhemos, portanto, ele percorre ao todo, em relação ao leito da estrada, a distância W = v + w. Mais tarde veremos que este resultado, que expressa o teorema da adição das velocidades de acordo com a mecânica clássica, não pode ser sustentado. Portanto, na verdade, a lei que acabamos de escrever não é exata. Mas, por enquanto, admitiremos que ela seja válida.” (pág. 21s). “Dificilmente existirá na física uma lei mais simples do que aquela que diz que a luz se propaga no espaço vazio. Toda criança de escola sabe, ou julga saber, que a propagação se dá em linha reta e com uma velocidade c = 300.000 km/s. Sabemos com grande exatidão que esta velocidade é a mesma para todas as cores; se assim não fosse, quando uma estrela fixa fosse eclipsada por sua companheira obscura, o mínimo de emissão não seria observado ao mesmo tempo para as diversas cores. Por uma consideração semelhante, ligada à observação de estrelas duplas, o astrônomo holandês De Sitter também pôde demonstrar que a velocidade de propagação da luz não pode depender da velocidade de movimento do corpo que a emite. Admitir que esta velocidade de propagação dependa da direção "no espaço" é uma coisa, em si, pouco provável. Em resumo, admitamos que o menino da escola esteja certo quando acredita na lei simples da velocidade constante da luz c (no vácuo). Quem haveria de imaginar que uma lei tão simples iria trazer as maiores dificuldades para o físico consciencioso! Vejamos como essas dificuldades se manifestam. Naturalmente, o fenômeno da propagação da luz, como qualquer outro fenômeno, deve referir-se a um corpo de referência rígido (sistema de coordenadas). Para cumprir esse papel, escolhamos novamente o leito da nossa estrada. Imaginemos que, de alguma maneira, o ar sobre o mesmo tenha sido retirado. Suponhamos que, sobre o leito da estrada, seja emitido um raio de luz cuja frente, segundo o que foi dito anteriormente, propaga-se com a velocidade c em relação ao leito da estrada. Sobre os trilhos, imaginemos mais uma vez o nosso vagão de estrada de ferro, viajando na mesma direção em que o raio luminoso se propaga, se bem que, evidentemente, de uma maneira
  • 4. muito mais lenta. Queremos saber qual é a velocidade de propagação do raio luminoso em relação ao vagão. É fácil entender que aqui se pode empregar a consideração do item precedente, pois o homem que se movimentava relativamente ao vagão desempenha o papel do raio luminoso. Em lugar da velocidade W deste em relação ao leito da estrada entra aqui a velocidade da luz em relação ao mesmo; w é a velocidade da luz em relação ao vagão, para a qual vale: w = c – v. A velocidade de propagação do raio luminoso em relação ao vagão, portanto, resulta ser menor do que c. Mas, este resultado está em contradição com o princípio da relatividade apresentado no item 5 (o princípio da relatividade (no sentido restrito – grifo meu). Com efeito, a lei da propagação da luz no vácuo, como qualquer outra lei geral da natureza, deveria ser a mesma caso tomássemos o vagão ou os trilhos como corpo de referência. Mas isto, segundo nossas considerações, parece impossível. Se todo raio luminoso se propaga em relação ao solo com a velocidade c, parece que, justamente por isso, a lei da propagação da luz em relação ao vagão tem que ser diferente. Isso está em contradição com o princípio da relatividade. Diante deste dilema, parece ser inevitável abrir mão ou do princípio da relatividade ou da simplicidade da lei da propagação da luz no vácuo. O leitor que acompanhou com atenção as considerações anteriores certamente esperará que o princípio da relatividade, que à nossa mente se apresenta como tão natural e simples, e como quase inelutável, seja mantido, e que a lei da propagação da luz no vácuo seja substituída por uma lei mais complicada, porém compatível com o princípio da relatividade. No entanto, o desenvolvimento da física teórica mostra que este caminho não é viável. Com efeito, os estudos pioneiros de H. A. Lorentz sobre os fenômenos eletrodinâmicos e ópticos em corpos em movimento mostraram que as experiências neste terreno conduzem necessariamente a uma teoria dos fenômenos eletromagnéticos que tem como conseqüência inevitável a constância da velocidade da luz no vácuo. Por isso, os teóricos mais eminentes estavam mais inclinados a abandonar o princípio da relatividade, apesar de não se haver encontrado um único fato experimental que estivesse em contradição com este princípio. Aqui entrou em cena a Teoria da Relatividade. Por uma análise dos conceitos físicos de tempo e de espaço demonstrou-se que não existe incompatibilidade entre o princípio da relatividade e a lei da propagação da luz. Pelo contrário, por uma adesão firme e sistemática a estas duas leis se pode chegar a uma teoria lógica que está ao abrigo de toda objeção. Passaremos a expor as idéias fundamentais desta teoria, que, para distinguir da teoria mais geral a ser discutida adiante, é chamada de "Teoria da Relatividade Especial".” (pág. 22ss). “Imagino que em dois lugares A e B, situados sobre o leito de nossa estrada e muito distantes um do outro, caiu um raio sobre os trilhos. Acrescento a informação de que os dois raios ocorreram simultaneamente. Se agora eu lhe perguntar, prezado leitor, se esta afirmação tem sentido, você me há de responder com um categórico "sim". Mas, se eu insistir em que você me explique melhor o sentido da afirmação, depois de refletir um pouco você há de perceber que a resposta a esta pergunta não é tão simples como parece à primeira vista. Após algum tempo, talvez lhe ocorra a seguinte resposta: "Em si, o significado da afirmação é claro e não necessita de outros esclarecimentos; mas eu teria que refletir um pouco se recebesse a tarefa de determinar, através de observações, se neste caso concreto os dois fenômenos foram simultâneos ou não". Não posso me dar por satisfeito com esta resposta, pela seguinte razão. Admitindo que um
  • 5. hábil meteorologista, através de engenhosas considerações, tenha chegado à conclusão de que nos lugares A e B o raio tenha sempre que cair ao mesmo tempo, surge a tarefa de verificar se este resultado teórico corresponde ou não à realidade. A situação é análoga em todas as proposições físicas nas quais o conceito de "simultâneo" desempenha algum papel. Para o físico, o conceito só passa a existir quando há a possibilidade de verificar, no caso concreto, se o conceito se aplica ou não. Existe, pois, a necessidade de uma definição de simultaneidade tal que ela nos forneça o método por meio do qual, no caso com que nos ocupamos, se possa verificar por meio de experimentos se os dois raios caíram simultaneamente ou não. Enquanto esta exigência não for cumprida, como físico (aliás, como não-físico também!) estou sendo vítima de uma ilusão se acredito poder ligar um sentido à afirmação da simultaneidade. (Se você não conseguir concordar com isto, prezado leitor, é preferível que não continue a ler.) Depois de algum tempo de reflexão, você me propõe o seguinte para constatar a simultaneidade. Vamos medir a reta AB ao longo da via férrea e colocar um observador no centro M dessa distância, provido de um dispositivo (por exemplo, dois espelhos com inclinação de 90° um em relação ao outro) que lhe permita uma visão óptica simultânea dos dois lugares. Se este observador perceber os dois raios ao mesmo tempo, eles são simultâneos. Fico muito satisfeito com esta proposta. Porém, não posso considerar o assunto como inteiramente esclarecido. Sinto-me impelido a fazer a seguinte objeção: "Sua definição seria perfeitamente correta se eu já soubesse que a luz (que transmite ao observador em M a percepção dos raios) se move sobre a reta A - M com a mesma velocidade que sobre a reta B - M. Uma verificação desta hipótese só seria possível se já dispuséssemos dos meios para medir o tempo. Parece então que caímos em um círculo vicioso". Depois de refletir um pouco mais, com razão você me lançará um certo olhar de desprezo, explicando: "Mesmo assim, mantenho minha definição de há pouco, porque na verdade ela não faz nenhuma suposição sobre a luz. À definição da simultaneidade só se pode impor uma única condição, a saber, que em todos os casos reais ela me forneça um meio empírico para decidir se o conceito a ser definido é ou não aplicável. É indiscutível que minha definição cumpre esta condição. Afirmar que a luz emprega o mesmo tempo para percorrer os caminhos A - M e B - M não é, na verdade, nenhuma suposição ou hipótese sobre a natureza física da luz, mas sim uma estipulação que posso fazer livremente para chegar a uma definição da simultaneidade". É claro que esta definição pode ser empregada para dar um sentido exato à afirmação da simultaneidade não apenas de dois, mas de quantos eventos quisermos, quaisquer que sejam as posições relativas dos lugares em relação ao corpo de referência (em nosso caso, o leito da estrada). Assim, chegamos também a uma definição do "tempo" na física. Imaginemos, com efeito, que coloquemos nos pontos A, B, C dos trilhos (que é aqui o sistema de coordenadas) relógios de igual construção e de tal modo acertados que as posições de seus ponteiros sejam simultaneamente (no sentido acima) as mesmas. Então entendemos por "tempo" de um evento a indicação (posição dos ponteiros) daqueles relógios que estão na vizinhança (espacial) imediata do evento. Desta maneira, a cada evento é atribuído um valor do tempo, que em princípio pode ser observado. Esta convenção ainda contém uma hipótese física, cuja validade dificilmente pode ser posta em dúvida, se não houver razões empíricas para isto. Com efeito, admite-se que se todos esses relógios forem construídos de forma idêntica eles terão o "mesmo ritmo". Em termos mais precisos: se dois relógios em repouso forem colocados em diferentes lugares do corpo de referência - de modo que uma configuração dos ponteiros de um deles é simultânea (no sentido acima) com a mesma configuração dos ponteiros do
  • 6. outro -, então as próprias configurações dos ponteiros são simultâneas (no sentido da definição acima).” (pág. 24ss). “Quando dizemos que os raios que caíram em A e B são simultâneos em relação ao leito da estrada, isto significa que os raios luminosos que partiram de A e B irão encontrar-se no ponto médio M do trajeto A-B do leito da estrada. Seja M' o ponto médio da distância A-B do trem em movimento. Embora, no momento da queda dos raios (nota 7 – observado do leito da estrada), esse ponto M' do trem em movimento coincida com o ponto M, na figura ele se movimenta para a direita com a velocidade v do trem. Se o observador que se encontra em M' no trem não possuísse essa velocidade, ele permaneceria em M. Os raios luminosos provenientes de A e B haveriam de alcançá-lo simultaneamente, isto é, os dois raios haveriam de encontrar-se exatamente onde ele haveria de estar. Na verdade, porém, ele se movimenta ao encontro do raio luminoso procedente de B, ao mesmo tempo que se afasta do raio luminoso procedente de A. Portanto, o observador verá o raio luminoso procedennte de B antes de ver o raio que procede de A. Os observadores que se utilizam do trem como corpo de referência devem, por conseguinte, chegar à conclusão de que o raio que caiu em B ocorreu antes do raio que caiu em A. Chegamos a um importante resultado: eventos que são simultâneos em relação ao leito da estrada não são simultâneos em relação ao trem, e vice-versa (relatividade da simultaneidade). Cada corpo de referência (sistema de coordenadas) possui seu tempo próprio. Uma especificação temporal só tem sentido quando se indica o corpo de referência ao qual esta indicação se refere. Antes da Teoria da Relatividade, a física sempre admitia tacitamente que o significado das indicações de tempo era absoluto, isto é, que elas não dependiam do estado de movimento do corpo de referência. Mas acabamos de ver que esta suposição é incompatível com a definição tão natural de simultaneidade; se a rejeitarmos, desaparece o conflito exposto no item 7 (A aparente incompatibilidade entre a lei da propagação da luz e o princípio da relatividade – grifo meu) entre a lei da propagação da luz no vácuo e o princípio da relatividade. Com efeito, fomos levados a este conflito pelas considerações do item 6 (O teorema das adições das velocidades segundo a mecânica clássica – grifo meu), que não podem mais ser mantidas. Ali chegamos à conclusão de que o homem no vagão, que percorre em relação a este a distância w em um segundo, também percorreria esta distância em um segundo em relação ao leito da estrada. Mas a duração de um determinado evento no vagão, de acordo com as considerações que acabamos de apresentar, não pode ser considerada igual à duração do mesmo evento quando se considera o leito da estrada como corpo de referência. Portanto, não se pode afirmar que, em sua caminhada, o homem percorre em relação aos trilhos a distância w num tempo que - medido a partir da estrada - é igual a um segundo. O raciocínio do item 6 baseia-se, aliás, em uma segunda suposição. Embora, antes do estabelecimento da Teoria da Relatividade, ela fosse sempre tacitamente aceita, à luz de uma reflexão atenta se manifesta como arbitrária.” (pág. 28s) “Consideremos dois pontos determinados do trem (nota 8: Por exemplo, o meio do primeiro e do centésimo vagão) que se locomove com velocidade v ao longo do leito da estrada, e nos interroguemos sobre a distância que os separa. Já sabemos que, para medir uma distância, temos necessidade de um corpo de referência em relação ao qual a distância é medida. A maneira mais simples é considerar o próprio trem como corpo de referência (sistema de coordenadas). Um observador que viaja no trem mede a distância
  • 7. aplicando sua régua, em linha reta, ao longo do piso dos vagões, tantas vezes quantas forem necessárias para chegar de um dos pontos marcados ao outro. O número que indica quantas vezes a régua teve que ser aplicada é a distância procurada. A situação é diferente quando a distância deve ser avaliada a partir do leito da estrada. Neste caso, podemos empregar o seguinte método. Chamando de A' e B' os dois pontos do trem cuja distância queremos medir, estes dois pontos se movem ao longo do leito da estrada com a velocidade v. Ocupemo-nos primeiramente com os pontos A e B do leito da estrada, diante dos quais, em um determinado momento t, os dois pontos A' e B' estão justamente passando (vistos do leito da estrada). Em virtude da definição do tempo dada no item 8 (sobre o conceito de tempo na física – grifo meu), a distância entre estes dois pontos A e B pode ser determinada. A seguir, a distância destes dois pontos A e B é medida aplicando-se a unidade de medida um certo número de vezes ao longo do leito da estrada. Não está de maneira alguma provado a priori que esta última medida deva dar o mesmo resultado que a primeira. Medido sobre o leito da estrada, o comprimento do trem pode ser diferente da medida de comprimento obtida desde o próprio trem. Esta circunstância levanta uma segunda objeção contra o raciocínio do item 6 (O teorema da adição de velocidades segundo a mecânica clássica), aparentemente tão claro. Com efeito, se o passageiro percorre no vagão a distância w em uma unidade de tempo, medida a partir do trem, a distância não tem necessariamente que ser igual a w, quando medida a partir do leito da estrada.” (pág. 29s). “Das considerações precedentes pode-se ver claramente que a Teoria da Relatividade (Especial) surgiu da eletrodinâmica e da óptica. Nestes domínios ela não modificou muita coisa nos enunciados da teoria, mas simplificou significativamente o edifício teórico, isto é, a derivação das leis. O que é ainda incomparavelmente mais importante: reduziu drasticamente o número das hipóteses mutuamente independentes sobre as quais a teoria repousa. Ela tornou a teoria de Maxwell-Lorentz tão plausível, que teria sido universalmente aceita pelos físicos mesmo que a experiência não tivesse falado com tanta eloqüência em seu favor. A mecânica clássica tinha necessidade de ser modificada a fim de poder ficar em harmonia com a Teoria da Relatividade Especial. Mas esta modificação só afeta substancialmente as leis no caso de movimentos rápidos, nos quais as velocidades v da matéria não são pequenas demais em comparação com a velocidade da luz. A experiência nos mostra que movimentos rápidos assim só ocorrem com elétrons e íons; nos outros movimentos, os desvios em relação às leis da mecânica clássica são pequenos demais para que possam ser percebidos na prática.” (pág. 41) “O resultado de caráter geral mais importante a que a Teoria da Relatividade nos conduziu refere-se ao conceito de massa. A física pré-relativística conhece dois princípios de conservação de fundamental importância: a lei de conservação da energia e a lei de conservação da massa. Estes dois princípios fundamentais aparecem como inteiramente independentes um do outro. Na Teoria da Relatividade eles são fundidos em um princípio único.” (pág. 42) “A questão de saber até que ponto a Teoria da Relatividade é apoiada pela experiência não é simples de ser respondida, por uma razão que já foi mencionada quando discutimos o experimento fundamental de Fizeau. A Teoria da Relatividaade Especial
  • 8. teve como ponto de partida a teoria de Maxwell-Lorentz dos fenômenos eletromagnéticos. Por conseguinte, todos os fatos experimentais que confirmam aquela teoria eletromagnética confirmam também a Teoria da Relatividade. Menciono aqui como especialmente importante o fato de que a Teoria da Relatividade permite prever, de maneira particularmente simples e coerente com a experiência, os efeitos produzidos na luz que nos chega das estrelas fixas por causa do movimento relativo da Terra em relação a estas estrelas. Trata-se do deslocamento anual da posição aparente das estrelas fixas em conseqüência do movimento da Terra ao redor do Sol (aberração) e da influência da componente radial dos movimentos das estrelas fixas em relação à Terra sobre a cor da luz que chega até nós; esta última influência se manifesta em um pequeno desvio das linhas espectrais da luz que nos atinge vinda de uma estrela fixa, em relação à posição das mesmas linhas espectrais produzidas por uma fonte terrestre (princípio de Doppler). Os argumentos experimentais em favor da teoria de Maxwell-Lorentz, que são ao mesmo tempo argumentos em favor da Teoria da Relatividade, são por demais numerosos para serem apresentados aqui. Efetivamente, eles limitam de tal forma as possibilidades teóricas que nenhuma outra teoria pôde manter-se de pé diante da experiência, a não ser a teoria de Maxwell-Lorentz. Mas existem duas classes de fatos experimentais que a teoria de Maxwell-Lorentz só pode acomodar se apelar para hipóteses auxiliares que, em si - isto é, sem utilizar a Teoria da Relatividade -, nos parecem estranhas. Sabemos que os raios catódicos e os assim chamados raios Beta emitidos pelas substâncias radioativas consistem de corpúsculos elétricos negativos (elétrons) de pequeníssima inércia e grande velocidade. Estudando o desvio dessas radiações sob a influência de campos elétricos e magnéticos pode-se determinar com grande precisão a lei de movimento desses corpúsculos. No estudo teórico dos elétrons apareceu a dificuldade de que, sozinha, a eletrodinâmica não consegue explicar sua natureza. Pois, como as massas elétricas de mesmo sinal se repelem, as massas negativas que constituem o elétron deveriam separar-se sob a influência de sua interação mútua, se entre elas não atuassem também forças de outra espécie cuja natureza até hoje permanece obscura (Nota 13: A Teoria da Relatividade Geral sugere a idéia de que as massas elétricas de um elétron são mantidas juntas por meio de forças gravitacionais).” (pág. 45s). “Um misterioso pavor toma conta do não-matemático sempre que ele escuta esta palavra "quadridimensional", um sentimento não muito diferente daquele que o teatro de fantasmas costuma provocar nas pessoas. No entanto, nada é mais banal do que afirmar que o mundo em que vivemos é um contínuo espaço-temporal de quatro dimensões. O espaço é um contínuo tridimensional. Isto significa que podemos descrever a posição de qualquer ponto (em repouso) por meio de três números (coordenadas) x, y, z, e que para cada ponto existe um número qualquer de pontos "vizinhos" cuja posição pode ser determinada por coordenadas x¹, y¹, z¹, tão próximas quanto quisermos das coordenadas x, y, z do primeiro ponto. Por causa desta última propriedade falamos de "contínuo", e por causa das três dimensões falamos de "tridimensional". De maneira análoga, o mundo dos eventos físicos, que Minkowski chama simplesmente o "mundo", ou "universo", é naturalmente de quatro dimensões no sentido espaço- temporal. Pois ele se compõe de eventos individuais, cada um dos quais descrito por quatro números, a saber, as três coordenadas espaciais x, y, z e uma coordenada temporal, o valor do tempo t. Neste sentido, o "universo" é também um contínuo; para cada evento existem tantos eventos "vizinhos" (realizados ou, pelo menos, imaginados)
  • 9. quantos desejarmos, cujas coordenadas x¹, y¹, z¹ diferem das coordenadas do evento original considerado x, y, z, t tão pouco quanto quisermos. O fato de não estarmos habituados a considerar o universo como um contínuo quadridimensional ocorre porque na física pré-relativística o tempo desempenha um papel diferente, mais independente em relação às coordenadas espaciais. Por isso, nos habituamos a considerar o tempo como um contínuo independente. De acordo com a física clássica, o tempo é absoluto, isto é, independente da posição e do estado de movimento do sistema de referência. Isto fica manifesto na última equação das transformações de Galileu (t' = t).” (pág. 49s). “As leis da natureza que satisfazem às exigências da Teoria da Relatividade (Especial) assumem então formas matemáticas nas quais a coordenada do tempo desempenha exatamente o mesmo papel que as três coordenadas do espaço. Do ponto de vista formal, estas quatro coordenadas correspondem exatamente às três coordenadas espaciais da geometria euclidiana. Mesmo ao não-matemático se tornará evidente que este conhecimento puramente formal pode trazer uma extraordinária contribuição para a clareza da teoria. Essas escassas informações dão ao leitor apenas uma vaga idéia do importante pensamento de Minkowski, sem o qual a Teoria da Relatividade Geral, cujas idéias básicas desenvolveremos a seguir, talvez houvesse permanecido esquecida até hoje. Mas, como uma compreensão mais aprofundada deste assunto - que não é de fácil acesso ao leitor que não disponha de um treinamento matemático - não é indispensável para compreender as idéias básicas nem da Teoria da Relatividade Especial nem da Geral, deixo-o de lado por enquanto, para só retomar a ele no final deste pequeno livro.” (pág. 50s). Segunda parte A TEORIA DA RELATIVIDADE GERAL “A tese fundamental em torno da qual giraram todas as considerações que fizemos até este momento foi o princípio da relatividade especial, isto é, o princípio da relatividade física de todo movimento uniforme. Analisemos mais uma vez seu conteúdo. Sempre foi evidente o fato de que, por seu próprio conceito, todo e qualquer movimento só pode ser concebido como um movimento relativo. No exemplo tantas vezes utilizado do leito da estrada e do vagão da estrada de ferro, o movimento que ocorre pode com igual razão ser descrito sob qualquer uma destas duas formas: (a) o vagão se move em relação ao leito da estrada; (b) o leito da estrada se move em relação ao vagão. No caso (a) é o leito da estrada que serve como corpo de referência, no caso (b) o corpo de referência é o vagão. Quando se trata apenas de constatar ou descrever o movimento, em princípio é indiferente a que corpo de referência o movimento está relacionado. Como vimos, isso é evidente e não pode ser confundido com a proposição muito mais ampla que denominamos "princípio da relatividade" e que tomamos como base de nossas pesquisas. O princípio de que nos utilizamos não se limita a afirmar que, para a descrição de qualquer evento, podemos escolher como corpo de referência tanto o vagão quanto o leito da estrada (pois também isso é evidente). O princípio afirma mais: se formularmos as leis gerais da natureza, tal como elas resultam da experiência, servindo-nos (a) do leito da estrada como corpo de referência e (b) do vagão como corpo de referência, estas leis gerais da natureza (por exemplo, as leis da mecânica ou a lei da propagação da luz no vácuo) têm exatamente a mesma forma nos dois casos. Também podemos expressar
  • 10. isso da seguinte maneira: para a descrição física dos eventos da natureza nenhum corpo de referência K ou K' é privilegiado em relação a outros. Ao contrário do enunciado anterior, este último não tem necessariamente que ser verdadeiro a priori, pois não está contido nos conceitos de "movimento" ou de "corpo de referência", nem pode ser derivado deles. Só a experiência pode decidir se ele está certo ou errado.” (pág. 53s). “Mas, até agora, não afirmamos de forma alguma a equivalência de todos os corpos de referência K no que diz respeito à formulação das leis da natureza. Nosso caminho foi o seguinte. Primeiramente, partimos da suposição de que existe um corpo de referência K em um estado de movimento tal que, em relação a ele, é válido o princípio fundamental de Galileu: um ponto material abandonado a si mesmo e suficientemente afastado de todos os outros pontos materiais efetua um movimento uniforme e retilíneo. Relativamente a K (corpo de referência galileano), as leis da natureza devem ser as mais simples possíveis. Mas, além de K também devem ser privilegiados neste sentido todos aqueles corpos de referência K' que, em relação a K, executam um movimento retilíneo, uniforme e isento de rotação, os quais, no tocante à formulação das leis da natureza, são perfeitamente equivalentes a K. Todos esses corpos de referência são considerados corpos de referência galileanos. Só para eles foi admitido como válido o princípio da relatividade, não para os outros (os que executam outros tipos de movimento). Neste sentido é que falamos do princípio da relatividade especial ou da Teoria da Relatividade Especial. Em oposição a isto, queremos entender por "princípio da relatividade geral" a seguinte afirmação: todos os corpos de referência K, K' etc. são equivalentes para a descrição da natureza (ou para a formulação das leis gerais da natureza), qualquer que seja seu estado de movimento. Temos que observar desde logo que esta formulação terá que ser substituída por outra, mais abstrata, por razões que só se tornarão claras mais adiante. Depois de se haver comprovado o princípio da relatividade especial, é tentador para toda mente que aspira à generalização dar o passo em direção ao princípio da relatividade geral. Mas, uma consideração simples e na aparência muito verossímil faz com que de início esta tentativa nos pareça sem chance de sucesso. Basta que, em pensamento, o leitor se imagine transportado para o vagão que viaja uniformemente sobre a estrada de ferro e com que tantas vezes já nos ocupamos. Enquanto o vagão viajar uniformemente, o viajante que se encontra no seu interior nada percebe do seu movimento. Por isso, ele não encontra dificuldade em imaginar que o vagão está em repouso, mas que o leito da estrada está em movimento. Esta interpretação, aliás, é perfeitamente justificada do ponto de vista físico, de acordo com o princípio da relatividade especial. Mas, se o movimento do vagão passa a não ser uniforme - por exemplo, em conseqüência de uma violenta freada -, o viajante experimenta um forte puxão para a frente. O movimento acelerado do vagão se manifesta no comportamento mecânico dos corpos em relação a ele; o comportamento mecânico já não é o mesmo do caso considerado anteriormente, e por isso nos parece impossível que, em relação ao vagão em movimento não uniforme, se apliquem as mesmas leis mecânicas que em relação ao vagão em repouso ou em movimento uniforme. De qualquer forma, é claro que em relação ao vagão em movimento não uniforme não vale o princípio fundamental de Galileu. Por isso nos sentimos de imediato forçados a, contrariamente ao princípio da relatividade geral, atribuir ao movimento não uniforme uma espécie de realidade física absoluta. No que segue logo veremos que esta conclusão não é convincente.” (pág. 54s).
  • 11. “Quando se pergunta: "Por que, quando levantamos uma pedra e depois a largamos, ela cai por terra?", geralmente se responde: "Porque a Terra a atrai". A física moderna responde de maneira um pouco diferente, pela seguinte razão: um estudo mais cuidadoso dos fenômenos eletromagnéticos levou à concepção de que não existe uma ação direta à distância. Quando, por exemplo, um ímã atrai um pedaço de ferro, não nos devemos dar por satisfeitos com a idéia de que o ímã, através do espaço vazio entre eles, atue diretamente sobre o ferro, mas imaginamos com Faraday que o ímã cria sempre, no espaço circundante que o envolve, algo fisicamente real, a que damos o nome de "campo magnético". Este campo, por sua vez, atua sobre o pedaço de ferro, de modo que ele tende a mover-se em direção ao ímã. Não tentaremos justificar aqui este conceito intermediário, em si arbitrário. Limitamo-nos a observar que, com auxílio dele, podemos representar teoricamente - de maneira muito mais satisfatória do que sem ele - os fenômenos eletromagnéticos, sobretudo a propagação das ondas eletromagnéticas. Interpretamos os efeitos da gravitação de maneira semelhante. A ação da Terra sobre a pedra ocorre de maneira indireta. A Terra cria em sua vizinhança um campo gravitacional. Este atua sobre a pedra e ocasiona o movimento de queda. Sabemos pela experiência que a intensidade da ação sobre um corpo diminui quando nos afastamos mais e mais da Terra, de acordo com uma lei bem determinada. Segundo o nosso ponto de vista, isto significa: a lei que rege as propriedades espaciais do campo gravitacional deve ser uma lei bem determinada, para representar corretamente a diminuição do efeito da gravitação com a distância ao corpo que exerce a ação. Devemos imaginar algo assim: o corpo (por exemplo, a Terra) gera diretamente o campo em sua imediata vizinhança; a intensidade e a direção do campo em pontos mais distantes são então determinadas pela lei que rege as propriedades espaciais dos campos gravitacionais.” (pág. 56s). “O campo gravitacional, ao contrário do campo elétrico e magnético, apresenta uma propriedade extremamente notável, que é de fundamental importância para o que segue. Corpos que se movimentam sob a ação exclusiva do campo gravitacional experimentam uma aceleração que não depende em absoluto nem do material nem do estado físico do corpo. Um pedaço de chumbo e um pedaço de madeira, por exemplo, caem no campo gravitacional (no vácuo) exatamente da mesma maneira, se os deixarmos cair sem velocidade inicial ou ainda com igual velocidade inicial. (...). Se, como mostra a experiência, para um dado campo gravitacional a aceleração deve ser sempre a mesma, independentemente da natureza e do estado do corpo, então a relação entre a massa gravitacional e a massa inercial também deve ser a mesma para todos os corpos. Por meio de uma escolha adequada das unidades, podemos fazer com que esta relação seja igual a um. Vale então o princípio: a massa gravitacional e a massa inercial de um corpo são iguais uma à outra. Até hoje a mecânica, na verdade, registrou este importante princípio, mas não o interpretou. Não podemos chegar a uma interpretação satisfatória senão quando reconhecermos este fato: conforme as circunstâncias, a mesma qualidade do corpo se manifesta ora como "inércia" ora como "gravidade" ("peso").” (pág. 56ss). “Imaginemos uma vasta porção de espaço vazio, tão afastada das estrelas e de outras massas significativas que, com suficiente exatidão, nos encontremos diante do caso previsto pelo princípio fundamental de Galileu. Então é possível, para essa parte do mundo, escolher um corpo de referência galileano relativamente ao qual os pontos em repouso permanecem em repouso e os pontos em movimento permanecem em movimento retilíneo uniforme. Como corpo de referência imaginemos uma ampla caixa
  • 12. com a forma de um aposento; dentro dela, suponhamos que se encontre um observador provido de aparelhos. Para este observador, evidentemente, não existe gravidade (peso). Ele terá que se prender ao chão com fios se não quiser que, com o mais leve golpe contra o chão, seu corpo saia flutuando lentamente em direção ao teto do aposento. Suponhamos que, bem no centro do teto da caixa, esteja afixado um gancho com uma corda, e que um ser cuja natureza não nos interessa esteja puxando a corda com uma força constante. Então a caixa, juntamente com o observador, começará a mover-se para "cima" em um movimento uniformemente acelerado. Com o correr do tempo sua velocidade irá assumir valores fantásticos, caso observemos tudo isso a partir de um outro corpo de referência que não está sendo puxado por uma corda. Mas como é que o homem dentro da caixa considera o que está acontecendo? A aceleração da caixa é transmitida a ele pelo piso, que exerce uma pressão contra seus pés. Portanto, ele tem que absorver esta pressão com as pernas, se não quiser estatelar- se no chão de corpo inteiro. Assim, ele se encontra dentro da caixa exatamente como uma pessoa dentro de um aposento de uma casa em nossa Terra. Se ele soltar um corpo que antes estava segurando com a mão, a aceleração da caixa deixa de ser transmitida a este corpo; por isso o corpo irá se aproximando do piso da caixa em movimento relativo acelerado. O observador, além do mais, há de convencer-se que a aceleração do corpo em direção ao piso é sempre a mesma, qualquer que seja o corpo com que ele realize a experiência. Com base em seus conhecimentos sobre o campo gravitacional, tais como foram discutidos no último item (O campo gravitacional – grifo meu), o homem chegará à conclusão de que, junto com a caixa, ele se encontra em um campo gravitacional que é constante no tempo. Por um momento, ficará admirado querendo saber por que a caixa não cai neste campo gravitacional. Mas então ele descobre o gancho no meio do teto e a corda tensa que está fixa nele, e conclui logicamente que a caixa se encontra em repouso suspensa no campo gravitacional. Temos o direito de zombar do homem dentro da caixa e dizer que sua conclusão está errada? Se quisermos ser coerentes, acredito que não podemos fazê-lo; temos que reconhecer, pelo contrário, que sua maneira de ver as coisas não contraria nem a razão nem as leis conhecidas da mecânica. Mesmo que a caixa esteja acelerada em relação ao "espaço galileano" que consideramos inicialmente, podemos no entanto considerá-la como em repouso. Temos, portanto, uma boa razão para estender o princípio da relatividade a corpos de referência acelerados uns em relação aos outros, e ganhamos assim um poderoso argumento em favor de um postulado da relatividade geral. Observe-se que a possibilidade deste ponto de vista se baseia na propriedade fundamental do campo gravitacional de conferir a todos os corpos a mesma aceleração, ou, o que significa o mesmo, na proposição da igualdade entre a massa inercial e a massa gravitacional. Se não existisse essa lei da natureza, o homem na caixa acelerada não poderia interpretar o comportamento dos corpos de sua vizinhança pela suposição da existência de um campo gravitacional e não teria nenhuma razão experimental para considerar seu corpo de referência como estando "em repouso".” (pág. 59s). “Suponhamos que o homem na caixa prenda na face interna do teto da caixa uma corda, e que na extremidade livre desta ele amarre um corpo. Por influência deste, a corda ficará tensa e pendurada "verticalmente". Perguntemo-nos pela causa da tensão da corda. O homem na caixa dirá: "O corpo suspenso experimenta no campo gravitacional uma força para baixo, que é equilibrada pela tensão da corda; o que determina o valor da tensão da corda é a massa gravitacional do corpo suspenso". Mas, por outro lado, um
  • 13. observador que flutue livremente no espaço há de considerar a situação da seguinte maneira: "A corda é forçada a acompanhar o movimento acelerado da caixa e transmite este movimento ao corpo preso a ela. A tensão na corda tem justamente o valor necessário para produzir a aceleração deste último. O que determina o valor da tensão na corda é a massa inercial do corpo". Vemos, por este exemplo, que nossa extensão do princípio da relatividade faz aparecer como necessária a afirmação da igualdade entre a massa inercial e a massa gravitacional. Com isto obtivemos uma interpretação física desta proposição.” (pág. 60). “Suponhamos que eu me encontre diante de um fogão a gás. Sobre o mesmo encontram- se, lado a lado, duas panelas muito parecidas, a ponto de poderem ser confundidas uma com a outra. Ambas estão cheias de água até a metade. Observo que de uma das panelas, de forma contínua, está escapando vapor, e da outra não. Fico admirado com isto, mesmo que nunca tenha visto antes um fogão a gás ou uma panela. Mas se agora percebo que sob a primeira panela existe alguma coisa com um brilho azulado, e sob a outra não, o meu espanto desaparece, mesmo que eu nunca tenha visto antes uma chama de gás. Pois só posso dizer que é esta coisa azulada que provoca a saída de vapor, ou pelo menos é a sua possível causa. Mas, se não percebo em nenhuma das panelas aquela coisa azulada e vejo que de uma delas se desprende vapor e da outra não, então ficarei admirado e insatisfeito até que eu perceba uma circunstância qualquer que possa ser responsabilizada pelo comportamento diferente das duas panelas. Analogamente, procuro em vão na mecânica clássica (ou na Teoria da Relatividade Especial) alguma coisa real a que possa atribuir a diferença de comportamento dos corpos em relação aos sistemas de referência K e K'. Newton já havia percebido esta objeção, que em vão procurou atenuar. Mas foi E. Mach quem a percebeu com mais clareza, exigindo por isso que a mecânica fosse estabelecida sobre uma nova base. Esta objeção não pode ser evitada a não ser por uma física que esteja de acordo com o princípio da relatividade geral. Pois as equações de uma tal física são válidas para todo corpo de referência, qualquer que seja o estado de movimento em que o mesmo se encontre.” (pág. 62s). “As considerações do item 20 (A igualdade entre a massa inercial e a massa gravitacional... grifo meu) mostram que o princípio da relatividade geral nos dá condições para deduzir propriedades do campo gravitacional através de procedimentos puramente teóricos. Com efeito, suponhamos que seja conhecida a evolução espaço- temporal de um fenômeno qualquer da natureza, tal como ele se desenrola num domínio galileano relativamente a um corpo de referência galileano K. Por meio de operações puramente teóricas, isto é, simplesmente através do cálculo, é possível neste caso determinar como esse processo natural conhecido aparece quando observado de um corpo de referência K' que está acelerado em relação a K. Mas, como existe um campo gravitacional em relação a este novo corpo de referência K', nossas considerações nos dizem como o campo gravitacional influencia o fenômeno estudado. Aprendemos, por exemplo, que um corpo que, em relação a K, executa um movimento retilíneo uniforme (de acordo com o princípio de Galileu), em relação ao corpo de referência acelerado K' (caixa) executa um movimento acelerado, com uma trajetória em geral curvilínea. Esta aceleração ou esta curvatura corresponde à influência que o campo gravitacional existente em relação a K' exerce sobre o corpo em movimento. Já sabemos que o campo gravitacional influencia desta maneira o movimento dos corpos, de modo que, em princípio, nossa consideração não traz nada de essencialmente novo.
  • 14. Mas chegamos a um novo resultado de fundamental importância quando aplicamos considerações análogas a um raio luminoso. Em relação ao corpo de referência galileano K a luz se propaga em linha reta com a velocidade c. Em relação à caixa acelerada (corpo de referência K'), como não é difícil concluirmos, a trajetória do mesmo raio luminoso já não é mais uma reta. Daí devemos concluir que em um campo gravitacional os raios luminosos em geral se propagam segundo linhas curvas. Este é um resultado de grande importância, sob dois aspectos. Com efeito, em primeiro lugar ele pode ser confrontado com a realidade. Embora um exame detalhado nos mostre que a curvatura dos raios luminosos fornecida pela Teoria da Relatividade Geral é extremamente pequena para os campos gravitacionais de que dispomos na prática, ela deve atingir 1,7 segundo de arco para os raios luminosos que passam nas proximidades do Sol. Isto deveria se manifestar pelo fato de que as estrelas fixas que aparecem próximas ao Sol, e que durante os eclipses totais do Sol são acessíveis à observação, se afastam aparentemente do Sol por aquele valor, em relação à posição por elas ocupada no céu quando o Sol se encontra em outra região do firmamento. O teste do acerto ou não acerto desta previsão é uma tarefa de extrema importância, cuja solução pelos astrônomos pode ser esperada para breve (nota 16: A existência do desvio luminoso exigido pela teoria foi constatada por meio de fotografias no eclipse total do Sol de 30 de maio de 1919, por duas expedições organizadas pela Royal Society [e pela Royal Astroonomical Society], sob a direção dos astrônomos Eddington e Crommelin). Mas, em segundo lugar, este resultado mostra que a lei já tantas vezes mencionada da constância da velocidade da luz no vácuo, que constitui uma das duas colunas básicas da Teoria da Relatividade Especial, não pode, segundo a Teoria da Relatividade Geral, ter pretensões a uma validade absoluta. Com efeito, só pode ocorrer uma curvatura dos raios luminosos quando a velocidade de propagação da luz variar com a posição. Poder- se-ia então pensar que, com esta conclusão, a Teoria da Relatividade Especial, e com ela a Teoria da Relatividade em si, estaria refutada. Tal coisa não acontece. O que se pode concluir é apenas que a Teoria da Relatividade Especial não pode ter pretensões a um domínio de validade ilimitado; seus resultados valem apenas na medida em que a influência dos campos gravitacionais sobre os fenômenos (por exemplo, os fenômenos luminosos) possa ser desprezada. Como os adversários da Teoria da Relatividade afirmaram freqüentemente que a Teoria da Relatividade Especial é anulada pela Teoria da Relatividade Geral, desejo recorrer aqui a uma comparação para tornar clara qual é a verdadeira situação. Antes de ser estabelecida a eletrodinâmica, as leis da eletrostática eram consideradas como sendo simplesmente as leis da eletricidade. Hoje sabemos que a eletrostática só pode fornecer corretamente os campos elétricos no caso, nunca estritamente concretizado, de as massas elétricas estarem perfeitamente em repouso umas em relação às outras e ao sistema de coordenadas. Será que por isso a eletrostática foi jogada no lixo pelas equações de campo da eletrodinâmica de Maxwell? De forma alguma! A eletrostática está contida como caso-limite na eletrodinâmica; as leis desta última levam diretamente às da primeira no caso em que os campos não variam no tempo. Este é o mais belo destino que uma teoria física pode ter: quando ela abre caminho para o estabelecimento de uma teoria mais ampla, na qual continua a viver como um caso particular.” (pág. 63ss). “Na primeira parte deste livro pudemos servir-nos de coordenadas espaço-temporais capazes de permitir uma interpretação física simples e direta, e que segundo o item 26 (O contínuo espaço-temporal da Teoria da Relatividade Especial considerada como um
  • 15. contínuo euclidiano – grifo meu) podem ser consideradas como coordenadas cartesianas quadridimensionais. Isto foi possível em virtude da lei da constância da velocidade da luz, a qual, porém, segundo o item 21 (Até que ponto os fundamentos da mecânica clássica e a Teoria da Relatividade Especial são insatisfatórios? – grifo meu), não pode ser mantida na Teoria da Relatividade Geral. Pelo contrário, segundo esta última teoria, chegamos ao resultado de que quando existe um campo gravitacional a velocidade da luz depende sempre das coordenadas. Além disso, "em um exemplo especial, vimos no item 23 (O comportamento dos relógios e réguas em um corpo de referência em rotação – grifo meu) que a existência de um campo gravitacional torna impossível aquela definição das coordenadas e do tempo que nos havia levado ao nosso objetivo na Teoria da Relatividade Especial.” (pág. 78). “Quando anteriormente descrevíamos o movimento de um ponto material em relação a um corpo de referência, não estávamos indicando outra coisa senão os encontros deste ponto com determinados pontos do corpo de referência. Também as indicações de tempo correspondentes podem ser reduzidas à constatação de encontros do corpo com relógios, juntamente com a constatação do encontro de ponteiros com determinados pontos dos mostradores. O caso não é diferente nas medições espaciais por meio de réguas, como podemos nos convencer com um pouco de reflexão.” (pág. 80). “Estamos agora em condições de substituir por uma formulação exata a formulação provisória do princípio da relatividade geral dada no item 18 (O princípio da relatividade especial e geral – grifo meu). A versão que adotamos então - "todos os corpos de referência K, K' etc. são equivalentes para a descrição da natureza (ou para a formulação das leis gerais da natureza), qualquer que seja seu estado de movimento" - não pode mais ser mantida, porque na descrição espaço-temporal geralmente não é possível empregar corpos rígidos, no sentido do método seguido na Teoria da Relatividade Especial. O corpo de referência tem que ser substituído pelo sistema de coordenadas gaussianas. À idéia fundamental do princípio da relatividade geral corresponde o seguinte enunciado: "Todos os sistemas de coordenadas gausssianos são essencialmente equivalentes para a formulação das leis gerais da natureza".” (pág. 80s). “Se não quisermos renunciar à nossa maneira de ver habitual (tridimensional), poderemos caracterizar da seguinte maneira esse desenvolvimento da idéia básica da Teoria da Reelatividade Geral: a Teoria da Relatividade Especial refere-se a regiões galileanas, isto é, a regiões onde não existe campo gravitacional. Como corpo de referência serve um corpo de referência galileano, isto é, um corpo rígido num estado de movimento tal que, relativamente a ele, seja válido o princípio de Galileu do movimento retilíneo uniforme de pontos materiais "isolados". Certas considerações sugerem que relacionemos essas mesmas regiões galileanas também a corpos de referência não galileanos. Relativamente a estes, existe então um campo gravitacional de tipo especial (...). Mas, nos campos gravitacionais não existem corpos rígidos com propriedades euclidianas; por isso, a ficção do corpo de referência rígido não funciona na Teoria da Relatividade Geral. Também a marcha dos relógios é influenciada pelos campos gravitacionais, de tal forma que uma definição física do tempo que seja feita diretamente com auxílio de relógios não possui de forma alguma o mesmo grau de evidência que na Teoria da Relatividade Especial.
  • 16. Por isso, utilizamos corpos de referência não rígidos, que não apenas têm um movimento arbitrário, mas que também, durante o movimento, passam por mudanças arbitrárias de forma. Para definir o tempo servimo-nos de relógios cuja marcha está sujeita a uma lei qualquer, por mais irregular que seja. Devemos imaginar cada um dos relógios como estando fixo a um ponto do corpo de referência não rígido. A única condição que eles devem satisfazer é que as indicações simultaneamente observáveis de relógios localmente próximos difiram infinitamente pouco umas das outras. Este corpo de referência não rígido, que não sem razão poderíamos denominar "molusco de referência", equivale no essencial a um sistema de coordenadas gaussiano quadridimensional qualquer. O que confere ao "molusco" um certo atrativo em relação ao sistema de coordenadas gaussiano é a conservação formal (a rigor, injustificada) da existência separada das coordenadas espaciais em face da coordenada temporal. Todo ponto do molusco é tratado como um ponto espacial, todo ponto material que está em repouso (em relação a ele) é considerado simplesmente como estando em repouso enquanto o molusco for considerado como corpo de referência. O princípio da relatividade geral exige que todos esses moluscos possam, com igual direito e com igual êxito, ser empregados como corpos de referência na formulação das leis gerais da natureza; as leis devem ser totalmente independentes da escolha do molusco. O grande poder inerente ao princípio da relatividade geral reside na grande restrição que isto impõe às leis da natureza.” (pág. 81ss). “Do que ficou dito concluímos que é possível imaginar espaços fechados que não possuem limites. Entre estes, o espaço esférico (ou o elíptico) destaca-se por sua simplicidade, já que todos os seus pontos são equivalentes. Coloca-se então, a astrônomos e físicos, a interessantíssima questão de saber se o Universo em que vivemos é infinito ou, à maneira do mundo esférico, finito. Nossa experiência nem de longe é suficiente para responder a esta pergunta. Mas a Teoria da Relatividade Geral permite respondê-Ia com bastante segurança; (...). (pág. 92). “De acordo com a Teoria da Relatividade Geral, as propriedades geométricas do espaço não são independentes da matéria, mas são por ela condicionadas. Só poderemos, portanto, afirmar alguma coisa sobre a estrutura geométrica do Universo quando construirmos nossas considerações admitindo que seja conhecido o estado da matéria. Sabemos pela experiência que, para um sistema de coordenadas convenientemente escolhido, as velocidades das estrelas são pequenas em relação à velocidade da propagação da luz. Em primeira e grosseira aproximação podemos, por conseguinte, conhecer a constituição do Universo tratando a matéria como imóvel. Já sabemos por nossas considerações anteriores que o comportamento de réguas e relógios é influenciado pelos campos gravitacionais, isto é, pela distribuição da matéria. Daí já se pode concluir que em nosso Universo não é correto falar em uma validade exata da geometria euclidiana. Mas não é impossível que nosso Universo pouco difira de um Universo euclidiano, concepção que parece tanto mais provável porque o cálculo mostra que mesmo massas do tamanho do nosso Sol exercem uma influência mínima sobre a métrica do espaço circundante. Poderíamos imaginar que nosso Universo, do ponto de vista geométrico, se comporta de maneira análoga a uma superfície que, em detalhe, possui curvas e irregularidades, mas que em nenhuma parte difere consideravelmente de um plano, mais ou menos como a superfície de um lago encrespada por pequenas ondas. Um Universo assim poderia ser adequadamente denominado um Universo quase-euclidiano. Espacialmente, ele seria infinito. Mas os cálculos mostram que em um Universo quase-euclidiano a densidade média da matéria
  • 17. teria que ser nula. Um Universo assim, portanto, não poderia estar povoado em toda parte por matéria; (...). Se existir no Universo uma densidade média de matéria diferente de zero, mesmo que difira muito pouco de zero, então o Universo não é quase-euclidiano. Os cálculos mostram, pelo contrário, que no caso de uma distribuição uniforme da matéria ele teria necessariamente que ser esférico (ou elíptico). Efetivamente, como a distribuição detalhada da matéria é irregular, o Universo real diferirá em detalhes do comportamento esférico, ou seja, ele será um Universo quase-esférico. Mas terá que necessariamente ser finito. A Teoria chega mesmo a fornecer uma relação simples entre a extensão espacial do Universo e a densidade média da matéria.” (pág. 92ss). “Do ponto de vista de uma teoria do conhecimento esquemática, o processo de desenvolvimento de uma ciência experimental costuma ser imaginado como um contínuo processo de indução. As teorias emergem como resumos de uma grande quantidade de experiências transformadas em leis experimentais, a partir das quais as leis gerais são determinadas por comparação. A evolução da ciência, de acordo com este modo de ver, assemelha-se a um trabalho de catalogação, um produto meramente empírico. Mas esta concepção não esgota em absoluto todo o processo real. Com efeito, ela deixa de considerar o papel importante que a intuição e o pensamento dedutivo desempenham no desenvolvimento de uma ciência exata. Pois, logo que uma ciência tenha deixado para trás a sua fase mais primitiva, os progressos teóricos não são mais realizados por um simples trabalho de ordenação. Pelo contrário, o pesquisador, estimulado pelos fatos da experiência, desenvolve um sistema de pensamento que o mais das vezes baseia-se logicamente em um pequeno número de suposições fundamentais, os assim chamados axiomas. Um tal sistema de pensamento é denominado uma teoria. A razão de existir da teoria decorre do fato de ela estabelecer uma ligação entre um grande número de experiências isoladas; é aí que reside sua "verdade". Ora, para o mesmo complexo de fatos experimentais podem existir diferentes teorias, consideravelmente distintas umas das outras. No que diz respeito às conseqüências que são acessíveis à experiência, as teorias podem concordar de forma tão ampla que fica difícil encontrar outras conseqüências capazes de estabelecer experimentalmente a distinção entre elas. Um destes casos de interesse geral nós encontramos, por exemplo, no terreno da biologia, onde se defrontam, por um lado, a teoria de Darwin da evolução das espécies pela seleção natural na luta pela existência e, por outro, a teoria da evolução baseada na hipótese da transmissão hereditária dos caracteres adquiridos. Outro caso em que há ampla concordância das conseqüências é apresentado pela mecânica newtoniana, de um lado, e a Teoria da Relatividade Geral, do outro. Esta concordância vai tão longe que até hoje não foi possível encontrar senão poucas conseqüências da Teoria da Relatividade Geral acessíveis à experiência que não tenham sido previstas também pela física pré-relativística - não obstante a profunda diferença dos pressupostos básicos das duas teorias.” (pág. 101s). “Desde que foi publicada a primeira edição deste livro, nosso conhecimento sobre a estrutura do espaço como um todo (o "problema cosmológico") passou por um importante desenvolvimento, que não podemos deixar de mencionar mesmo em uma apresentação popular do assunto. Minhas primeiras considerações sobre o assunto baseavam-se em duas hipóteses:
  • 18. 1. Existe em todo o espaço uma densidade média diferente de zero, que é a mesma em toda parte. 2. O tamanho (ou o raio) do Universo independe do tempo. De acordo com a Teoria da Relatividade Geral estas duas hipóteses comprovaram-se compatíveis uma com a outra, mas isso só ocorria quando às equações de campo se acrescentava um termo hipotético, que nem era exigido pela teoria em si nem parecia evidente do ponto de vista teórico ("termo cosmológico das equações de campo"). A segunda hipótese se me afigurava então indispensável, pois parecia-me que, se ela fosse rejeitada, iríamos cair em especulações sem fim. Porém, já na década de 1920 o matemático russo Friedman descobriu que, do ponto de vista teórico, era mais natural uma suposição diferente. Percebeu que, caso resolvêssemos deixar de lado a segunda hipótese, era possível manter a primeira hipótese sem que fosse preciso se introduzir nas equações do campo gravitacional o termo cosmológico, em si pouco natural. Com efeito, as equações de campo originais admitem uma solução em que o "raio do Universo" depende do tempo (espaço em expansão). Neste sentido pode-se afirmar, com Friedman, que a teoria exige uma expansão do espaço. Poucos anos mais tarde, Hubble, através de seus estudos espectrais sobre as nebulosas extragalácticas ("vias lácteas"), demonstrou que as linhas espectrais por elas emitidas apresentam um deslocamento para o vermelho que aumenta regularmente com a distância da nebulosa. De acordo com nossos conhecimentos atuais sobre o princípio de Doppler, este deslocamento só pode ser interpretado como um movimento de expansão do sistema estelar como um todo - como, segundo Friedman, as equações do campo gravitacional exigem. Neste sentido, a descoberta de Hubble pode ser interpretada como uma confirmação da teoria. Mas resulta daí uma curiosa dificuldade. A interpretação (teoricamente quase indubitável) dos deslocamentos das linhas descobertos por Hubble como uma expansão do Universo leva a um início da expansão situado há "apenas" 109 anos atrás, enquanto a astronomia física faz parecer provável que a evolução das estrelas e dos sistemas estelares exige tempos consideravelmente maiores. No presente, ainda não sabemos com certeza como é possível superar estas incongruências. Deve-se observar também que a teoria do Universo em expansão, juntamente com os dados empíricos da astronomia, não nos permite concluir se o espaço (tridimensional) é finito ou infinito, enquanto a hipótese primitiva do espaço estático implicava um espaço fechado (finito).” (pág. 109s). “O que caracteriza a física newtoniana é que, além da matéria, ela é obrigada a atribuir ao espaço e ao tempo uma existência real independente. Pois na lei do movimento de Newton figura o conceito de aceleração. Mas aceleração, nessa teoria, só pode significar "aceleração em relação ao espaço". O espaço newtoniano deve, portanto, ser considerado como estando "em repouso", ou pelo menos como "não acelerado", para que se possa atribuir um sentido à aceleração mencionada na lei do movimento. O mesmo vale a respeito do tempo, que também entra no conceito de aceleração. Newton mesmo, assim como seus contemporâneos dotados de senso crítico, sentiu-se constrangido em atribuir tanto ao espaço em si como ao seu estado de movimento uma realidade física; na época, porém, não havia outra saída, se se queria atribuir à mecânica um sentido claro.
  • 19. Já é bastante pretensioso termos que atribuir ao espaço em geral uma realidade física, sobretudo ao espaço vazio. Desde os tempos mais antigos, os filósofos manifestaram resistência contra esta pretensão. Descartes raciocinava mais ou menos da seguinte maneira: o espaço é idêntico à extensão, mas a extensão está ligada a corpos. Portanto, não há espaço sem corpos, isto é, não existe espaço vazio. O ponto fraco desta argumentação reside principalmente no seguinte: está correto que o conceito de extensão deve sua origem às experiências feitas com o ato de colocar corpos sólidos em contato, mas daí não podemos inferir que o conceito de extensão não esteja justificado nos casos que não motivaram a formação do conceito. Uma tal ampliação de um conceito também pode ser justificada indiretamente pelo valor que ele demonstra para a compreensão de dados empíricos. Afirmar que a extensão está ligada ao corpo é, em si, algo sem fundamento. Porém, veremos mais adiante que a Teoria da Relatividade Geral confirma indiretamente a concepção de Descartes. O que levou Descartes à sua concepção tão atraente foi certamente o sentimento de que não se pode, fora do caso de imperiosa necessidade, atribuir realidade a uma coisa que não é "diretamente acessível" à experiência, como ocorre com o espaço. A origem psicológica da noção de espaço, ou da necessidade desta noção, não é tão manifesta como poderia parecer em razão de nossos hábitos de pensar. Os antigos geômetras tratam de objetos criados pela mente (reta, ponto, superfície), mas não do espaço como tal, como o fez mais tarde a geometria analítica. Mas o conceito de espaço nos é sugerido por certas experiências primitivas. Suponha-se que tenhamos construído uma caixa; dentro dela podemos guardar objetos numa certa ordem, de maneira que a caixa fica cheia. A possibilidade de fazer tais arrumações é uma propriedade do objeto corporal chamado caixa, algo que é dado com a caixa, o "espaço encerrado" pela caixa. Este espaço é diferente para diferentes caixas, algo que muito naturalmente nós imaginamos como independente do fato de na caixa estarem ou não estarem guardados objetos. Quando a caixa não contém objeto nenhum, seu espaço nos parece "vazio". Até aqui, nosso conceito de espaço está ligado à caixa. Mas é fácil comprovar que as possibilidades de ocupação que constituem o espaço da caixa são independentes da espessura de suas paredes. Não se pode reduzir essa espessura à zero, sem que com isso o "espaço" desapareça? A naturalidade de uma tal passagem ao limite é evidente. Agora, em nossa mente, o espaço existe sem a caixa, como objeto independente, o que no entanto nos parece tão irreal quando esquecemos a maneira como este conceito se originou. Compreende-se que Descartes tenha experimentado certa repugnância em considerar o espaço como um objeto independente dos objetos corporais, como uma coisa que possa existir sem matéria. (O que, no entanto, não o impede de tratar o espaço como um conceito fundamental em sua geometria analítica.) Mas uma olhada no vácuo do barômetro de mercúrio deve certamente ter jogado por terra as resistências dos últimos cartesianos. Não podemos, entretanto, negar que, já neste estágio primitivo, no conceito de espaço, ou no espaço imaginado como um objeto real independente, há algo de insatisfatório.” (pág. 111s). “Quando uma caixa menor c se encontra em repouso relativo no interior do espaço vazio de uma caixa maior C, então o espaço vazio de c é uma parte do espaço vazio de C, e a ambas as caixas pertence o mesmo espaço que as contém. Mas a noção já se torna menos simples quando c está em movimento em relação a C. Então nos inclinamos a pensar que c encerra sempre o mesmo espaço, mas ocupando uma parte variável do espaço C. Somos forçados a atribuir a cada caixa um espaço particular (que não é concebido como limitado) e admitir que estes dois espaços estão em movimento um em relação ao outro.
  • 20. Antes de nossa atenção ter sido despertada para esta complicação, o espaço aparece como um meio limitado (recipiente) no qual os objetos corporais se deslocam. Ora, devemos pensar que existe um número infinito de espaços em movimento uns em relação aos outros. O conceito de espaço como algo que existe objetivamente e independentemente das coisas já estava presente no pensamento pré-científico, mas isso não ocorre com a idéia de existir um número infinito de espaços movendo-se uns em relação aos outros. Esta última idéia, de certo, é logicamente inevitável, porém durante muito tempo ela não desempenhou nenhum papel importante nem mesmo no pensamento científico. Mas, que dizer da origem psicológica do conceito de tempo? Este conceito está indubitavelmente ligado ao fato de nos "lembrarmos", bem como à distinção entre as experiências sensoriais e a lembrança destas experiências. Em si é duvidoso que a distinção entre experiências sensoriais e a lembrança (ou a simples idéia) delas seja para nós um dado psicológico imediato. Todo mundo passou alguma vez pela experiência de ficar em dúvida se experimentou algo com seus sentidos ou se simplesmente sonhou com isso. Provavelmente esta distinção só surge como um resultado de uma atividade ordenadora da mente. Ao ato de "lembrar" é associada uma experiência que é considerada como "anterior" quando comparada com as "experiências presentes". Este é um princípio conceitual de ordem para experiências (imaginadas) cuja possibilidade de realização dá lugar ao conceito subjetivo de tempo, isto é, àquele conceito de tempo que se refere à ordem das experiências vividas pelo indivíduo. (...). Um exemplo. A pessoa A ("eu") tem a experiência de que "relampeja". A pessoa A vivencia também um comportamento da pessoa B que estabelece uma conexão entre este comportamento e a experiência de que "relampeja". Para a pessoa A surge a idéia de que também outras pessoas participam da experiência "relampeja". O "relampeja" já não é visto mais, exclusivamente, como uma experiência pessoal, mas sim como uma experiência (talvez apenas uma "experiência potencial") de outras pessoas. Nasce assim a concepção de que o "relampeja", que originalmente entrou na consciência como uma "experiência", agora é concebido também como um "evento" (objetivo). É ao conjunto de todos os eventos que nos referimos quando falamos do "mundo exterior real". (...). Para chegarmos a uma objetivação do mundo temos necessidade de uma idéia construtiva suplementar: o evento está localizado também no espaço, e não apenas no tempo.” (pág. 114ss) “Todos estes conceitos de natureza espacial já pertencem ao pensamento pré-científico, ao lado dos conceitos provenientes da esfera psicológica, como dor, meta, finalidade etc. Para o pensamento físico, como para o pensamento científico em geral, é característico tentar arranjar-se apenas com os conceitos "de natureza espacial", buscando expressar por meio deles todas as relações que possuem caráter de lei. O físico procura reduzir cores e tons a vibrações, o fisiologista procura reduzir pensamento e dor a processos nervosos, de tal maneira que o psíquico como tal seja eliminado do encadeamento causal do ser, de modo que ele, por conseguinte, não se manifeste em parte alguma como um elo independente nas ligações causais. Esta atitude, que em princípio considera possível abranger todas as relações empregando exclusivamente conceitos "de natureza espacial", é certamente o que entendemos hoje por "materialismo" (depois que a "matéria" perdeu seu papel de conceito fundamental). Por que é necessário fazer com que os conceitos fundamentais do pensamento científico desçam do olimpo platônico e tentar descobrir-lhes a origem terrena? A resposta é: para
  • 21. livrar estes conceitos dos tabus que aderiram a eles, de modo a adquirirmos maior liberdade na formação dos conceitos. Este é, em primeira linha, o mérito imperecível de D. Hume e E. Mach, o de haverem introduzido esta reflexão crítica. A ciência tomou os conceitos de espaço, tempo, objeto material (incluindo o importante caso particular dos "corpos sólidos") do pensamento pré-científico, os tornou mais precisos e os modificou. Sua primeira realização importante foi desenvolver a geometria euclidiana, cuja formulação axiomática não nos deve fazer perder de vista sua origem empírica (a possibilidade de transportar e justapor corpos sólidos). De origem empírica são também as três dimensões do espaço, assim como seu caráter euclidiano (ele pode ser preenchido sem lacunas por "cubos" idênticos). O caráter sutil do conceito de espaço tornou-se mais claro quando se descobriu que não existem corpos absolutamente rígidos. Todos os corpos são elasticamente deformáveis e modificam seus volumes com a variação da temperatura. As figuras cujas possíveis congruências deveriam ser descritas pela geometria euclidiana não podem, por conseguinte, ser especificadas fora do contexto da física. Mas, como a física já tem que fazer uso da geometria na fixação de seus conceitos, o conteúdo empírico da geometria não pode ser especificado e examinado a não ser dentro da moldura da física como um todo. Neste contexto devem ser pensados também o atomismo e sua concepção de divisibilidade finita, pois os espaços de extensão subatômica não podem ser medidos. O atomismo nos obriga também a abandonar em princípio a idéia de superfícies limítrofes (de corpos sólidos) nítida e estaticamente definidas. Rigorosamente falando, não existem leis independentes para as possíveis configurações de corpos sólidos que tocam uns nos outros, mesmo no domínio macroscópico. Apesar de tudo, ninguém pensou em abandonar o conceito de espaço, que parecia indispensável ao sistema global das ciências naturais, tão bem-sucedido na prática. Mach, no século XIX, foi o único a pensar seriamente em uma eliminação do conceito de espaço, tentando substituí-lo pela noção da totalidade das distâncias instantâneas entre todos os pontos materiais (ele fez essa tentativa com o objetivo de chegar a uma concepção satisfatória da inércia).” (pág. 116ss). / “Na mecânica newtoniana, o espaço e o tempo desempenham um duplo papel. Primeiro, como suporte ou moldura do acontecer físico, em relação ao qual os eventos são descritos por meio das coordenadas do espaço e do tempo. A matéria, em princípio, é considerada como consistindo de "pontos materiais", cujos movimentos constituem o acontecer físico. Quando imaginamos a matéria como contínua, isto de certa forma é feito como algo provisório, nos casos em que não queremos ou não podemos descrever sua estrutura discreta. Neste caso, pequenas partes de matéria (elementos de volume) são tratadas como pontos materiais, ao menos na medida em que se trata apenas dos movimentos, e não de processos cuja redução a movimentos não é por enquanto possível ou oportuna (por exemplo, variações de temperatura, processos químicos). O segundo papel do espaço e do tempo é o de "sistema inercial". Os sistemas inerciais eram considerados como preferíveis a todos os sistemas de referência, porque em relação a eles a lei da inércia é considerada válida. O essencial, nisto tudo, é que a "realidade física", imaginada como independente dos sujeitos que a experimentam, era por um lado entendida - pelo menos em princípio - como formada de espaço e tempo, e por outro, como pontos materiais de existência permanente movendo-se em relação ao espaço e tempo. A idéia da existência
  • 22. independente do espaço e tempo pode ser expressa desta maneira drástica: caso a matéria desaparecesse, restariam apenas espaço e tempo (como uma espécie de palco para o acontecer físico).” (pág. 118s). “É uma característica dos campos mencionados que eles ocorrem apenas no interior de uma massa ponderável; eles não pretendem outra coisa senão descrever um estado desta matéria. Onde não existia matéria, aí também - de acordo com a gênese do conceito de campo - não podia existir campo. Mas então, no primeiro quartel do século XIX, verificou-se que os fenômenos de interferência e de propagação da luz podiam ser explicados com admirável clareza se se considerasse a luz como um campo de ondas perfeitamente análogo ao campo das oscilações mecânicas em um sólido elástico. Foi necessário introduzir um campo que era capaz de existir também no espaço vazio, na ausência de matéria ponderável. Este estado de coisas criou uma situação paradoxal, porque o conceito de campo, de acordo com sua origem, parecia restrito a descrever os estados no interior de um corpo ponderável. Tanto mais certo isto se afigurava porque se estava convencido de que todo campo devia ser considerado como um estado capaz de ser interpretado mecanicamente, o que exigia presença de matéria. Assim se começou a sentir a necessidade de admitir em toda parte, também no espaço considerado vazio, a existência de uma matéria, que recebeu o nome de "éter".” (pág. 120). “A teoria do éter fez nascer a seguinte questão: do ponto de vista mecânico, como se comporta o éter em relação aos corpos ponderáveis? Participará ele dos movimentos dos corpos, ou suas partículas estão em repouso umas em relação às outras? Muitas experiências engenhosas foram empreendidas para responder a esta questão. Como fatos importantes, neste contexto, entraram em pauta também a aberração das estrelas fixas em conseqüência do movimento anual da Terra, assim como o "efeito Doppler" (influência do movimento relativo das estrelas fixas sobre a freqüência da luz que chega até nós e que possui uma freqüência de emissão conhecida). Os resultados desses fatos e experiências (com exceção de uma única, a experiência de Michelson-Morley) foram explicados por H. A. Lorentz pela admissão de que o éter não participa dos movimentos dos corpos ponderáveis, e que suas partes não executam qualquer movimento relativo umas em relação às outras. O éter aparecia assim, de certa maneira, como a personificação de um espaço em repouso absoluto. Mas a investigação de Lorentz deu outros frutos. Ela explicou os processos eletromagnéticos e ópticos então conhecidos no interior de corpos ponderáveis supondo que a influência da matéria ponderável sobre o campo elétrico (e vice-versa) deve ser atribuída apenas ao fato de as partículas da matéria carregarem cargas elétricas, que participam de seus movimentos. Com reeferência ao experimento de Michelson e Morley, H. A. Loorentz demonstrou que seu resultado, pelo menos, não está em contradição com a teoria do éter em repouso. Não obstante todos esses belos resultados, a situação da teoria não era plenamente satisfatória, pela seguinte razão. A mecânica clássica, incontestavelmente válida com grande precisão, postula a equivalência de todos os sistemas inerciais (ou espaços inerciais) para a formulação das leis naturais (invariância das leis da natureza quando se passa de um sistema inercial a outro). Os experimentos eletromagnéticos e ópticos demonstravam a mesma coisa, com considerável exatidão. Mas o fundamento da teoria eletromagnética postulava o privilégio de um sistema inercial particular, a saber, o do éter luminoso em repouso. Esta concepção dos fundamentos teóricos era por demais insatisfatória. Não haveria uma modificação que levasse em conta - como a mecânica clássica - a equivalência dos sistemas inerciais (princípio da relatividade especial)?
  • 23. A resposta a esta pergunta é a Teoria da Relatividade Especial. Esta toma da teoria de Maxwell-Lorentz o pressuposto da constância da velocidade da luz no espaço vazio. Para harmonizá-la com a equivalência dos sistemas inerciais (princípio da relatividade especial) deve-se renunciar ao caráter absoluto da simultaneidade; resultam daí, além disso, as transformações de Lorentz para o tempo e para as coordenadas espaciais quando se passa de um sistema inercial para outro. Todo o conteúdo da Teoria da Relatividade Especial está incluído no seguinte postulado: as leis naturais são invariantes em relação às transformações de Lorentz. O importante desta exigência consiste em que ela limita de uma forma determinada as leis naturais possíveis. Qual a posição da Teoria da Relatividade Especial em relação ao problema do espaço? Primeiro precisamos evitar a opinião de que foi esta teoria que introduziu o caráter qua dridimensional do mundo real. Também na mecânica clássica o evento é localizado através de quatro números, isto é, de três coordenadas espaciais e uma coordenada temporal; a totalidade dos "eventos" físicos é imaginada, portanto, como imersa em uma variedade quadridimensional contínua. Mas, de acordo com a mecânica clássica, este contínuo quadridiimensional fica objetivamente decomposto em um tempo unidimensional e em seções (cortes) espaciais tridimensionais, os quais só contêm eventos simultâneos. Esta decomposição é a mesma para todos os sistemas inerciais. A simultaneidade de dois eventos em relação a um sistema inercial acarreta a simultaneidade destes eventos em relação a todos os sistemas inerciais. É isto que se quer dizer quando se afirma que o tempo da mecânica clássica é absoluto. De acordo com a Teoria da Relatividade Especial a coisa é diferente. A idéia de uma totalidade de eventos que são simultâneos com um evento determinado existe, é verdade, em relação a um sistema inercial particular, porém não é mais independente da escolha do sistema inercial. O contínuo quadridimensional já não se decompõe mais objetivamente em seções que contêm todos os eventos simultâneos. O "agora" deixa de ter seu significado objetivo para o mundo espacialmente estendido. Isto implica que devemos considerar espaço e tempo como um contínuo quadridimensional objetivamente indissociável, se quisermos expressar o conteúdo das relações objetivas sem cair em uma desnecessária arbitrariedade. Ao apontar a equivalência física de todos os sistemas inerciais, a Teoria da Relatividade Especial tornou manifesta a insustentabilidade da hipótese de um éter em repouso. Por isso foi necessário renunciar à idéia de que o campo eletromagnético deva ser considerado como um estado de um substrato material. O campo passou a ser um elemento irredutível da descrição física, irredutível no mesmo sentido que o conceito de matéria na teoria de Newton.” (pág. 121ss). “Agora estamos preparados para ver em que medida a transição para a Teoria da Relatividade Geral modifica o conceito de espaço. De acordo com a mecânica clássica e com a Teoria da Relatividade Especial, o espaço (espaço-tempo) tem uma existência independente em relação à matéria ou ao campo. Para que possamos descrever aquilo que o preenche e que depende das coordenadas, o espaço-tempo ou o sistema inercial com suas propriedades métricas já tem que ser pensado como existindo de antemão, porque do contrário a descrição daquilo que "enche o espaço" não teria sentido.” (pág. 128). “Descartes, assim, não estava tão errado quando julgava dever excluir a existência de um espaço vazio. A opinião pode parecer absurda enquanto enxergamos a realidade física exclusivamente nos corpos ponderáveis. Só a idéia do campo como maneira de representar a realidade, combinada com o princípio da relatividade geral, mostra o
  • 24. verdadeiro núcleo da idéia de Descartes: não existe espaço "vazio de campo".” (pág. 129). “Para a reflexão geral que acabamos de apresentar, a questão da lei particular do campo é secundária. A questão principal, atualmente, é saber se uma teoria de campo como a que consideramos aqui pode realmente levar ao objetivo. Refiro-me a uma teoria que descreve a realidade física de maneira exaustiva (incluindo o espaço a quatro dimensões) por meio de um campo. A atual geração de físicos inclina-se a responder negativamente a esta pergunta; em conexão com a forma atual da teoria quântica, esses físicos acreditam que o estado de um sistema não pode ser caracterizado direta mas, apenas, indiretamente, mediante a especificação da estatística dos resultados de medidas realizadas no sistema; predomina a convicção de que a natureza dupla (estrutura corpuscular e estrutura ondulatória), solidamente provada pela experiência, só pode ser a1cançada através desse enfraquecimento do conceito de realidade. Sou de opinião que, no momento, uma renúncia teórica tão ampla não possui base suficiente em nosso conhecimento real, e que não deveríamos desistir de levar até o fim o caminho da teoria do campo relativístico.” (pág. 130).