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SEMINÁRIO TEOLÓGICO
GOEL
Pr. A. Carlos G. Bentes
DOUTOR EM TEOLOGIA
PhD em Teologia Sistemática
American Pontifical Catholic University
‫ל‬ ֵ‫א‬ֹ‫גּ‬‫ל‬ ֵ‫א‬ֹ‫גּ‬
HERSIAS CRISTOLÓGICAS
ENIPOSTASIA
PRÉ-LAPSARIANISMO E PÓS-LAPSARIANISMO
CRISTOLÓGICOS
IMPECABILIDADE DE CRISTO
“A SUA UNÇÃO VOS ENSINA A RESPEITO DE TODAS AS COISAS”
1 Jo 2.27
“A sabedoria é a coisa principal; adquire, pois, a sabedoria; sim com tudo o que possuis
adquire o conhecimento” (Pv 4.7)
2
SUMÁRIO
A NATUREZA PURA DE JESUS 3
OS EBIONITAS 4
O GNOSTICISMO 4
OS DOCETAS 6
MONARQUIANISMO 6
OS ARIANOS 9
OS APOLINARIANOS 11
OS NESTORIANOS 12
OS EUTIQUIANOS 13
ANIPOSTASIA 13
DESIPOSTASIA 16
ENIPOSTASIA 17
RAZÕES BÍBLICAS PARA A POSIÇÃO ORTODOXA TRADICIONAL 24
O NASCIMENTO VIRGINAL DE CRISTO 26
PÓS-LAPSARIANISMO X PRÉ-LAPSARIANISMO 28
PÓS-LAPSARIANISMO E PRÉ-LAPSARIANISMO CRISTOLÓGICO 32
A IMPECABILIDADE DE CRISTO 46
CONCLUSÃO: ERA POSSÍVEL JESUS PECAR? 57
BIOGRAFIA DO AUTOR 60
3
A NATUREZA PURA DE JESUS
PÓS-LAPSARIANISMO X PRÉ-LAPSARIANISMO
O presente artigo trata da natureza de Cristo à luz da doutrina da salvação.
Avaliamos as conexões soteriológicas envolvidas na rejeição pela igreja cristã de algumas
das principais heresias cristológicas dos primeiros séculos. Em seguida, vamos pesquisar
como a compreensão da obra salvífica de Cristo ajuda a definir se sua natureza era a que
Adão possuía antes da queda (pré-lapsariana) ou depois da mesma (pós-lapsariana).
É muito evidente nas Escrituras que os seguidores de Jesus o reconheciam como
Emanuel, “Deus conosco”. Seus seguidores tinham uma crença firme de que nele haviam
encontrado o próprio Yahweh. A reflexão neotestamentária sobre essa experiência e suas
implicações conduziu à opinião de que Ele é tanto Deus quanto Salvador (2Pe 1.1). Tão
comumente era Jesus avaliado como Messias ou Cristo, que a palavra “Cristo” se tornou
um nome pessoal. Era a asserção dos escritores do Novo Testamento de que Jesus de
Nazaré é divino.
A convicção inequívoca dos escritores do Novo Testamento no que concerne à
divindade de Jesus encontrou um destino diferente entre as mentalidades judaica e grega.
Algumas pessoas de herança judaica, com uma estrita formação monoteísta, evoluíram
em seu pensamento chegando a manter o que tem sido chamado de opinião adocionista.
Esta concepção, defendida pelos ebionitas, “compreendia a Jesus como um mero homem
que, por escrupulosa observância da lei, foi justificado e consequentemente se tornou o
Messias”. Por outro lado, a mentalidade grega, imbuída de racionalismo, imaginava o
aparente paradoxo divino-humano em termos metafísicos. Para eles, era importante
decidir sobre a identidade ontológica de Jesus de Nazaré. Essas preocupações gregas
reforçam as várias opiniões docetistas. Segundo o ponto de vista docético, o Cristo divino
não tinha um corpo humano real; era apenas uma aparência, um fantasma; sendo que
Cristo morreu, então Ele não era Deus, e se Ele era Deus, então não morreu.
Estudar a Pessoa Teantrópica do Filho de Deus é uma árdua missão e muitos Pais
da Igreja ao fazê-lo descambaram para a heresia. A primeira que surgiu nos dias do Novo
Testamento está narrada em 1Jo 4.1-3:
“Amados, não deis crédito a qualquer espírito; antes, provai os espíritos se
procedem de Deus, porque muitos falsos profetas têm saído pelo mundo fora. Nisto
reconheceis o Espírito de Deus: todo espírito que confessa que Jesus Cristo veio em carne
é de Deus; e todo espírito que não confessa a Jesus não procede de Deus; pelo contrário,
este é o espírito do Anticristo, a respeito do qual tendes ouvido que vem e,
presentemente, já está no mundo”.
A negação da existência física de Jesus foi a primeira precursora da heresia
docética que acossava a Igreja nos séculos II e III.
4
OS EBIONITAS
Os ebionitas surgiram no começo do segundo século. O nome é derivado de uma
palavra hebraica (‫ו‬ ֹ֜‫י‬ ְ‫ב‬ ֶ‫)א‬ ‘ebheyôn que significa “pobre” ou “indigente”, “miserável”,
“mendigo”. Eram judeus crentes que não conseguiram deixar as cerimônias mosaicas.
Segundo os seus ensinos, Cristo era somente homem. A crença na divindade de Cristo
lhes parecia incompatível com o monoteísmo. Alguns ensinavam que Jesus foi feito Filho
de Deus ao ser batizado por João Batista, quando o Espírito Santo desceu sobre ele,
porém este o abandonou no Calvário (1Jo 5.6-12). Criam que a fé não era suficiente para
a salvação, sendo preciso que os homens observassem a Lei.
Rejeitavam os escritos de Paulo, chamando-o de “apóstata da Lei”, todavia,
honravam a Tiago e Pedro.
O GNOSTICISMO
Gnosticismo (do grego γνωστικισμóς; transl.: (gnostikismós); de γνωσις (gnosis):
'conhecimento', (gnostikos): aquele que tem o conhecimento) é um conjunto de correntes
filosófico religiosas sincréticas que chegaram a mimetizar-se com o cristianismo nos
primeiros séculos de nossa era (sendo ele muitas vezes referenciado como "Alta
Teologia"), vindo a ser declarado como um pensamento herético após uma etapa em que
conheceu prestígio entre os intelectuais cristãos.
Este grupo extremamente “amorfo” surgiu provavelmente no primeiro século. Os
gnósticos pretendiam ter um conhecimento esotérico, secreto e especulativo de Deus. Na
busca de um conhecimento maior, o gnosticismo se caracterizava por ser altamente
especulativo, fazendo um sincretismo de elementos gregos, judeus, cristãos e orientais,
buscando uma explicação peculiar para a origem do mal. Irineu os retrata como hereges
que corromperam a doutrina cristã, mesclando-a com a filosofia pagã. No entanto, ao que
parece, muitos dos mestres gnósticos eram cristãos sinceros, desejosos de expressar o
evangelho de forma que parecesse satisfatório a seus contemporâneos. Contudo, foram
infelizes em sua tentativa, sacrificando o conceito bíblico do Logos divino em prol de
seus pressupostos filosóficos.
Uma das preocupações dominantes nos sistemas gnósticos era com a questão da
dualidade, caracterizada pela miséria e futilidade da vida humana neste mundo: vida
aprisionada pelo corpo material e o contraste com a ordem superior, inteiramente
espiritual, que não se comunica com a matéria.
A matéria é má, e Deus, o Pai Supremo (Bythos), é o Éon perfeito; por isso Deus
não pode ter criado o mundo; “o que Deus fez foi lançar uma série de emanações. Cada
uma dessas emanações distanciou-se mais de Deus, até que por último houve uma
emanação tão distante que pode tocar a matéria. Esta emanação [Demiurgo, identificado
como o Deus do Antigo Testamento] foi a que criou o mundo. Os gnósticos sustentavam
que cada emanação conhecia cada vez menos a Deus, até que lhe eram hostis. Assim
5
chegaram, finalmente, à conclusão de que o deus criador não só era distinto do Deus
verdadeiro, mas que o ignorava e lhe era ativamente hostil”.
Demiurgo, (em grego: δημιουργός) "Aurora do Mundo" de William Blake,1794
O termo Demiurgo deriva da forma latinizada do termo grego dēmiourgos
(δημιουργός), literalmente, "artesão", "alguém com habilidade específica", de dēmios do
povo, popular (dēmos, pessoas ou povo) e ourgos, trabalhador (ergon, trabalho).[37] No
gnosticismo, o Demiurgo não é Deus mas o arconte ou chefe da ordem dos espíritos
inferiores ou éons. De acordo com os gnósticos, o Demiurgo era capaz de dotar o homem
apenas com psiquê (alma sensível) - o pneuma (alma racional) seria adicionada por Deus.
Os gnósticos identificaram o Demiurgo com Jeová dos hebreus.
Para os gnósticos, Deus (Bythos) não tinha nada a ver com este universo, daí
possivelmente, a afirmação de João: “Todas as coisas foram feitas por intermédio dele, e
sem ele nada do que foi feito se fez” (Jo 1.3).
A respeito da Pessoa de Cristo, havia dentro do gnosticismo uma variedade de
ideias, a saber:
a) Jesus era uma das trinta emanações, “aeons”, do Deus bom (Bythos), emitidas
para entrarem em contato com a matéria que é má. Assim sendo, Jesus não é divino, é
apenas uma espécie de semideus, uma entidade entre Deus e os homens.
b) Partindo do princípio filosófico de que a matéria é essencialmente má,
afirmavam que Jesus não tinha corpo real; desse modo ele era uma espécie de fantasma,
sem carne e sangue reais. Jesus era uma ilusão; parecia homem, mas não era (docetismo);
o filho de Deus, que era real, apenas usava o Jesus humano como meio de expressão; a
encarnação, portanto, era apenas uma ilusão. Por trás desse conceito estava a concepção
de que Deus não pode sofrer; logo, se Cristo sofreu, ele não era Deus; e se ele era Deus,
não poderia sofrer. Então, o sofrimento de Cristo teria sido apenas na aparência, não real.
Inácio de Antioquia e Policarpo, bispo de Esmirna combateram ferreamente o docetismo:
“Qualquer que não confesse que Jesus Cristo veio em carne é um anticristo. E quem não
confessa o testemunho da cruz é do diabo”.
Alguns diziam que quando ele andava não deixava pegadas, porque seu corpo não
tinha peso nem substância. João, de modo especial, combateu esse tipo de conceito em
seus escritos, evidenciando que negar a verdadeira humanidade de Cristo equivalia a
negar um dos pontos centrais da fé cristã (Jo 1.14; 1Jo 4.1-3; Hb 2.14).
c) Jesus era um homem comum que foi usado pelo Espírito de Deus e abandonado
no Calvário, não havendo de fato encarnação (Jo 1.14; 20.31; Cl 1.19; 2.9; 1Jo 2.22; 4.1-
3,15; 5.1,5,6; 2Jo 7).
6
OS DOCETAS
Esta palavra vem do grego doketes, de dokein, que significa “parecer” (dokéo -
δοκέο), “crer numa aparência”. Os docetas apareceram no ano 70 da era cristã, e
existiram, aproximadamente, até o ano 170 d.C. Eles negavam a realidade da humanidade
de Cristo, dizendo que seu sofrimento e sua morte foram aparentes. Erraram ao permitir
que a filosofia gnóstica ditasse o significado dos dados bíblicos. Segundo a filosofia
docética, as coisas materiais eram, por natureza, más. O mal residia na matéria, e visto
que Jesus não tinha pecado, logo não tinha também corpo material. Os docetas negavam,
portanto, a humanidade de Jesus. Em última análise, o Cristo descrito pelos docetistas
não poderia salvar ninguém, pois a sua morte, num corpo humano, era a condição prévia
para destruir o domínio de Satanás sobre a humanidade (Hb 10.5; 2.14).
MONARQUIANISMO
O nome é derivado de duas palavras gregas: monos (μόνος) e arquê (αρχή), daí,
“Um só Princípio”, “Um só Deus”. O Monarquismo modalista foi a heresia mais
influente do terceiro século. O termo monarca em nossa língua descreve realeza. A
palavra monarca é um composto híbrido de um prefixo e uma raiz. O prefixo mono
significa “um” (uno). A raiz arch (ἀρχή) - significa “princípio” ou “chefe, governador”.
Quando combinados, mono-arch ou monarca quer dizer “um só chefe ou governador”. A
ideia de monarquismo, portanto, se refere a Deus como o único soberano.
Sua preocupação era a defesa do monoteísmo. Negando toda e qualquer ideia de
diversidade no Ser Divino, daí a tentativa de conciliar a doutrina do “Logos” com a
unicidade de Deus.
Os monarquianos criam numa espécie de divindade de Jesus (monarquianismo
dinâmico), contudo afirmavam ser a Trindade irreconciliável com a unidade de Deus.
Dentro dessa perspectiva não há relação trinitária, e está totalmente fora de questão a
doutrina da expiação e da intercessão do Espírito.
a) MONARQUIANISMO MODALISTA
O primeiro tipo de monarquismo a ameaçar a igreja foi chamado de monarquismo
modalístico. Essa visão era ligada a uma velha forma de panteísmo que via todo o mundo
ou a realidade como um modo ou nível de ser de Deus. Essa visão era popular tanto no
gnosticismo como no neopatonismo.
Seu principal representante foi Sabélio, presbítero de Ptolemaida (250), tendo
ensinado em Roma por volta do ano 215.
Esta forma de modalismo foi conhecida no Ocidente como “Patripassianismo” (O
Pai se encarnou e também sofreu), e no Oriente como “Sabelianismo”.
7
Para Sabélio não havia Trindade; Pai, Filho e Espírito Santo eram apenas nomes
diferentes para a mesma realidade; desse modo, os três eram apenas (πρόσωπατα,
semblantes, faces), e não seres independentes. Ele considerava as três Pessoas da
Trindade como três diferentes modos de ação ou manifestação divina, os quais Deus
assume sucessivamente, revelando-se como Pai na criação e na doação da Lei; como
Filho na encarnação e como Espírito na regeneração e santificação. Desse modo há
apenas uma única Pessoa; ficando a Trindade reduzida a três modos de manifestação. O
herético Sabélio argumentava que Cristo era de uma essência com Deus mas de modo de
ser inferior ao próprio Deus. Como os raios do sol compartilham uma essência ou
substância em comum com o sol, mas podem ser distinguidos do próprio sol, assim Cristo
compartilha a mesma essência com Deus, mas não é Deus.
Epifânio, bispo de Salamis, descrevendo os ensinamentos do Sabelianismo,
escreveu, por volta do ano 375:
“Ensinam que o Pai, o Filho e o Espírito Santo são uma só e a mesma essência, três
nomes apenas dados a uma só e a mesma substância”. Adiante Epifânio cita uma analogia
utilizada: “Tome-se o sol: o sol é uma só substância, mas com tríplice manifestação: Luz,
calor e globo solar. O calor é (análogo) o Espírito; a luz, ao Filho; enquanto o Pai é
representado pela verdadeira substância. Em certo momento, o Filho foi emitido como
um raio de luz; cumpriu no mundo o que cabia à dispensação do evangelho e à salvação
dos homens, e retirou-se para os céus, semelhante ao raio enviado pelo sol que é
incorporado a ele. O Espírito Santo é enviado mais sigilosamente ao mundo e,
sucessivamente, aos indivíduos dignos de o receberem...”.
Nesse esquema modalístico, tudo se pode dizer ser uma parte da essência de Deus.
Seu ser “emana” do centro de seu ser puro. Quanto mais longe daquele centro a emanação
está, menos puramente ela manifesta Deus. Matérias inertes, como rochas estão distantes
do cerne do ser divino, enquanto anjos, demiurgos, e outros seres espirituais estão mais
próximos do cerne divino. Jesus é um ser espírito ou demiurgo, próximo ao cerne do ser
divino, da mesma essência ou mesmo ser, radiando ou emanando do ser divino, mas ele
não é o ser divino. Jesus compartilha da “divindade” mas não é realmente Deus.
Implicações desta doutrina:
1) Não há Trindade;
2) As três formas de Revelação não são coeternas;
3) Há apenas três MODOS da mesma Pessoa, e não três Pessoas.
b) MONARQUIANISMO DINÂMICO
No quarto século a igreja enfrentou uma nova heresia disfarçada em forma
diferente de monarquianismo, chamada monarquianismo dinâmico. Era “dinâmico”
porque envolvia uma espécie de movimento ou mudança. Nessa visão Jesus não era Deus
eterno, e sim ele “se tornou” Deus via adoção, ele não era eterno, ele se tornou eterno.
Essa óptica foi patrocinada pelo herético Ário, que havia sido influenciado pelos ensinos
de Paulo de Samosata, bispo de Antioquia, por volta de 260 e também por Luciano de
Antioquia.
8
Paulo de Samosata ensinava que Jesus era originariamente um mero homem, sendo
elevado a uma posição superior no batismo, quando recebeu o poder (δύναμις) do céu.
Este poder, que passou a residir na pessoa humana de Jesus – como um mero recipiente,
qualificou-a para uma tarefa especial. Assim Jesus foi elevado a uma posição
intermediária entre Deus e os homens, no entanto Jesus não é essencialmente divino. A
consciência de ser o portador do Logos foi crescendo gradativamente em Jesus a partir de
seu batismo. O Logos o capacitou a exercer um ministério especial e era ele que
controlava todas as palavras e obras de Jesus.
Jesus era filho adotivo; portanto, sua “divindade” era apenas de honra, e não de
essência; ela ocorre pela graça.
Ário estava zeloso por preservar o puro monoteísmo. Ele via Cristo como a criatura
mais exaltada, na verdade a primeira criatura feita por Deus. Cristo foi criado e depois
ele, como criatura, criou o restante do mundo. Ário apelou a textos bíblicos que se
referem a Cristo como “gerado” e o “primogênito de toda a criação”. Em grego o termo
gerado significa “ser, tornar-se ou acontecer”. Em termos biológicos, ter sido gerado é ter
tido um começo no tempo. Se Cristo foi gerado, então ele deve tido um começo no tempo
e não ser eterno. Se ele não é eterno, então não pode ser Deus.
Para Ário, Jesus é preeminente e exaltado, mas originalmente não era Deus. Ele foi
adotado na divindade em virtude de sua perfeita obediência, pala qual demonstrou sua
“qualidade de ser uno” com o Pai. Ele é “um” com o Pai no objetivo e missão, mas não
no ser. Ário abraçou a fórmula aceita anteriormente em Antioquia, que Jesus é homoi-
ousios com Deus, que ele é “como” Deus.
Essa teologia adopcionista foi condenada no Sínodo de Antioquia (268), sendo ele
excomungado.
“Jesus é o primogênito da criação” - Cl 1.15.
Muitos dizem que Jesus não pode ser Deus porque é chamado, na Bíblia, de o
primogênito da criação de Deus, não sendo, portanto, eterno, mas criatura. Alguns ficam
confusos com a palavra primogênito pensando que deve significar “o primeiro criado”.
Isso implicaria Jesus ser apenas um ser criado, e não pré-existente ou eterno, ou Deus.
O texto diz que Jesus é o primogênito da criação, mas não que Ele é o primogênito
da criação. A Bíblia ensina que primogênito nem sempre significa ser o primeiro a ser
criado ou o primeiro de uma série. A palavra “primogênito” aparece como sendo uma
posição de destaque (Sl 89.27 [LXX Sl 88.28: κἀγὼ πρωτότοκον θήσοµαι αὐτόν,
ὑψηλὸν παρὰ τοῖς βασιλεῦσιν τῆς γῆς]; Hb 12.23 - πρωτοτόκων). Sabemos que o povo
de Israel não era o primeiro povo da terra; no entanto, por ter a primazia, Deus o chama
de primogênito (Êx 4.22 - LXX). O mesmo acontece com a tribo de Efraim. Embora
Efraim não fosse o primogênito de José, a sua tribo é chamada de primogênito (Jr 31.9 -
prōtótokon). Assim, a palavra “primogênito” traz consigo dois significados: O mais velho
de uma família (inclusive do gado) ou, ainda, o preeminente, isto é, o que tem a primazia
9
e o domínio. É exatamente nesse segundo sentido que se refere a Jesus, à luz do próprio
texto que vem logo em seguida (Cl 1.16-18). A expressão Ele é antes de todas as coisas, e
todas as coisas subsistem por Ele, afirma categoricamente que Jesus não faz parte da
criação, é um Ser à parte da criação. Isto está completamente dentro do contexto da Bíblia
(Is 9.6; Mq 5.2; Hb 13.8).
Quando Paulo declarou que Cristo era primogênito de toda a criação (Cl 1.15), ele
usou o termo grego prōtótokos - πρωτότοκος, que significa “herdeiro”, primeiro em
categoria, se quisesse dizer primeiro criado, o apóstolo usaria a palavra grega prōtóktistos
- πρωτόκτιστος (primeiro criado). A Bíblia não afirma em parte alguma que Deus “criou”
Jesus.
OS ARIANOS
Os arianos foram os seguidores de Ário, um presbítero em Alexandria (250-336). O
arianismo surgiu no ano 325. Ário negava a integridade e a perfeição da natureza divina
de Cristo. O Verbo (Logos), que se fez carne, segundo o Evangelho de João, não era
Deus, senão um dos seres mais alto do Criador. O Verbo não era, afinal, mais que uma
criatura de Deus. Os ensinos de Ário talvez sejam melhor entendido se listados em oito
declarações que se encaixam logicamente:
a) A característica fundamental de Deus é a solidão. Ele existe sozinho.
b) Dois poderes habitam em Deus: o Verbo e a Sabedoria
c) A Criação foi levada a efeito por uma substância independente, que Deus
criou.
d) A existência do Filho é diferente da existência Pai.
e) O Filho não é verdadeiramente Deus.
f) O Filho é uma criação perfeita do Pai.
g) O espírito humano de Cristo foi substituído pelo Logos.
h) O Espírito Santo é uma terceira substância criada.
O ponto focal de Ário é de que há um só Deus (Pai) não gerado, sem começo,
único, verdadeiro, único detentor de imortalidade. Para os arianos, Jesus Cristo não era da
mesma substância do Pai (ὁµοούσιος, “da mesma natureza”), mas, sim, de uma
substância similar (ὁµοιόυσιος, “de natureza semelhante”). Esse “iota (ι)” grego fazia
toda a diferença entre um cristianismo bíblico e um cristianismo forjado pela imaginação
do homem.
Alexandre, bispo de Alexandria, em 321, convocou um sínodo, que depôs Ário do
presbiterato e o excluiu da comunhão da Igreja. Em 325, no Concílio de Nicéia, Ário e
dois de seus amigos foram banidos para a Ilíaca, e seu ensinamento condenado.
Desta premissa, como observa Kelly J. N .D., decorrem quatro outras:
1. O Filho é uma criatura perfeita, distinta da criação, mas que veio à existência
pela vontade do Pai;
10
2. Como criatura, o Filho teve um começo. Logo, a afirmação de que ele era
coeterno com o Pai implicaria na existência de dois princípios, o que assinalaria uma
negação do monoteísmo;
3. O Filho não tem nenhuma comunhão substancial com o Pai. Ele é uma criatura
que recebeu o título de “Palavra” e “Sabedoria” de Deus porque participa da Palavra e
Sabedoria essenciais;
4. O Filho está sujeito a mudanças e ao pecado, tendo podido cair como o Diabo
caiu. Contudo Deus, prevendo sua firmeza de caráter, agiu previamente com sua graça.
Ário e seus discípulos, buscando apoio em textos tais como Jo 1.14; 3.16; Cl 1.15;
1 Jo 4.9, ensinavam que Deus o Pai criou o Filho primeiro, e, através do Filho criou o
Espírito, os homens e o mundo; portanto: Jesus é o primogênito do Pai e o Espírito é o
primogênito do Filho. O Filho foi criado do nada; ele veio à existência antes da fundação
do mundo, mas não é eterno, porque foi criado. Daí o “chavão” ariano: “Tempo houve em
que ele (o Filho) não existia”. Portanto, sendo o Filho criado, não é Deus.
Consequentemente, Jesus não é da mesma essência ou natureza do Pai. Atribuição de
títulos, “Deus” e “Filho”, feita a Jesus, era apenas de cortesia, resultante da graça.
O historiador W. Walter resume a posição de Ário:
“Para Ário, Cristo era, na verdade, Deus, em certo sentido, mas um Deus inferior,
de modo algum uno com o Pai em essência ou eternidade. Na encarnação, esse Logos
entrou em um corpo humano, tomando o lugar do espírito racional humano”.
O ponto de partida de Ário é ontológico, significando que termos como o “Filho”
não devem ser interpretados para definir a natureza essencial de Jesus.
A conexão soteriológica. O principal opositor de Ário, o pai da igreja Atanásio,
revelou em sua oposição que, embora Ário argumentasse a partir de uma perspectiva
ontológica, a essência do debate era soteriológica. Atanásio afirmava que a salvação só
pode ser trazida à humanidade por alguém que é verdadeiramente Deus. É verdade que a
opinião particular de Atanásio quanto à salvação, em que a humanidade é participante da
natureza divina, estava na essência do seu argumento; contudo, a posição central da
questão da salvação para o debate cristológico é inegável. Devemos lembrar-nos de que a
Igreja rejeitou o ponto de vista de Ário no Primeiro Concílio Ecumênico (325 d.C. em
Nicéia), decidindo que Jesus era gerado do Pai e da mesma substância do Pai. O concílio,
portanto, reconheceu a divindade de Jesus.
Paul Tillich especula que “A vitória do arianismo teria transformado o cristianismo
em apenas mais uma entre as religiões já existentes”.
Ário e seus seguidores foram condenados como heréticos no Concílio de Nicéia em
325. O credo Niceno declara que Jesus foi “gerado, não feito”. Aqui Jesus foi acreditado
ser eternamente gerado do Pai. A palavra grega gerado (begotten em inglês) foi usada não
em um sentido biológico ou qualquer sentido que implique que Cristo tivesse um começo
no tempo. Em vez disso o termo gerado teve um sentido filial, chamando atenção ao
11
relacionamento singular do Filho com o Pai. O Novo Testamento se refere a Cristo como
o “único-gerado” ou unigênito do Pai, o monogenēs, um termo que dá ênfase ao
relacionamento singular, uma vez por todas, entre o Filho e o Pai.
OS APOLINARIANOS
Apolinário, bispo de Laodiceia na Síria, viveu durante quase a totalidade do século
IV, e por isso acompanhou em primeira mão a controvérsia ariana.
O apolinarismo sustentava a distinção platônica entre soma σῶμα (corpo), psiquê
ψυχή (alma) e pneuma πνεῦμα (espírito), como sendo três sujeitos ou princípios distintos
na constituição do homem, admitia que Cristo tinha um corpo verdadeiro (soma) e alma
animal (psiquê), mas não um espírito racional, ou mente (pneuma ou nous). Mas se Jesus,
raciocinava Apolinário, tinha duas naturezas completas, devia ter um nous humano (νοῦς)
e também um nous divino. Isso ele achava um dualismo absurdo. O Eterno Filho, ou
Logos, tomava o lugar do nous (pneuma) humano. Dois seres perfeitos não podem se
tornar um só. Acreditava na definição da Divindade de Cristo, de conformidade com o
Credo de Nicéia, mas sustentava que Jesus, como homem, teria espírito, alma e corpo.
Acrescentar a essa Pessoa a divindade completa do Filho resultaria num ser de quatro
partes – uma monstruosidade. Para ele, a solução era esta: O Logos, representando a
divindade total do Filho, substituiu o espírito humano no homem Jesus.
Kelly acentua que Apolinário deixa claro seu pensamento nas seguintes
considerações:
“A carne, por depender de algum outro princípio de movimento e ação (qualquer
que seja este princípio) para se movimentar, não é por si só uma entidade viva completa,
mas, a fim de se tornar uma, entra em fusão com alguma outra coisa. Dessa maneira, ela
se uniu ao princípio celestial governante [isto é, o Logos] e fundiu-se com ele. Assim, a
partir do movimento do motor, foi composta uma única entidade viva – não duas
entidades, nem uma única composta de dois princípios completos e automáticos”.
Assim, para Apolinário há uma única vida; uma perfeita fusão do homem (carne)
com o divino, sendo a carne de Jesus glorificada pelo Logos, daí falar ele de “carne de
Deus”, “natureza encarnada da Palavra divina”.
As ideias de Apolinário foram rejeitadas pelos líderes da igreja na época. Eles
perceberam que não era só o nosso corpo humano que necessitava de salvação e ser
representado por Cristo na sua obra redentora, mas também nossa mente, nosso espírito e
nossa alma. Cristo tinha de ser plena e verdadeiramente humano para nos salvar (Hb
2.14-17).
A conexão soteriológica. Conquanto a solução ontológica de Apolinário parecesse
resolver a questão acerca da identidade de Jesus, como na controvérsia ariana o problema
soteriológico se tornou o teste para sua aceitação. Além de sua tendência docetista, a
opinião apolinarista foi também criticada por não refletir corretamente o ponto de vista
12
cristão de que Jesus é o portador da salvação. A ideia era a de que aquilo que o Logos
não assumiu na encarnação, neste caso o “espírito”, o Logos não podia redimir. O ponto
de vista foi explicitamente declarado por Gregório de Nazianzo como segue: “Se alguém
pôs nele a sua confiança como um homem sem uma mente humana, ele mesmo está
desprovido de mente e indigno da salvação. Porque o que ele não assumiu ele não curou;
é o que está unido à sua divindade que é salvo”. O ponto de vista de Apolinário foi
rejeitado no Segundo Concílio Ecumênico (em Constantinopla, 381 d.C.), confirmando a
posição nicena.
OS NESTORIANOS
Os nestorianos eram seguidores de Nestor (ou Nestório), bispo de Constantinopla.
Nestor fazia objeção à frase: “Mãe de Deus” (THEOTOKOS – θεοτόκος) e ensinava que
Maria devia ser chamada Christotokos – Χριστοτόκος, que significa “quem deu Cristo à
luz”. Negava a verdadeira união das naturezas humana e divina em Cristo, afirmando ou
dando a entender uma personalidade dupla em Cristo. O Logos habitava no homem
Cristo Jesus, de maneira que a união entre as duas naturezas era algo parecido com a
habitação do Espírito Santo.
Nestório, tentando refutar o eutiquianismo, ensinava que Jesus Cristo era
constituído de duas pessoas e de duas naturezas. Sustentava que cada uma das duas
naturezas de Jesus tinha sua própria subsistência e personalidade; a união entre elas não
era ontológica, mas apenas moral, simpática e afetiva.
A conexão soteriológica. O ponto de vista de Nestório foi rejeitado no Terceiro
Concílio Ecumênico reunido em Éfeso em 431 d.C. como dividindo Jesus em duas
pessoas. Todavia, a subentendida dimensão soteriológica é significativamente notada por
Grenz:
No fundamento da posição nestoriana jaz outra heresia, a antropologia
desenvolvida por Pelágio. Segundo a opinião teológica antagônica de Agostinho, a pessoa
humana é dotada por ocasião do nascimento de graça suficiente para reforçar a vontade
humana em sua batalha contra o pecado, o qual, por sua vez, não é uma condição do ser
mas jaz inteiramente na ação humana. Devido a esse dom, o indivíduo poderia
teoricamente atingir a perfeição. Nestório viu essa perfectível substância humana
revelada em Jesus. O homem Jesus empregou a dotação natural da graça sem falhar. Este
exercício de sua livre vontade efetuou a união voluntária entre Jesus e o Logos.
Os ensinos de Nestor foram rejeitados pelo Concílio de Éfeso (431) e de
Calcedônia (451). Cirilo de Alexandria foi o principal oponente de Nestor. Ele foi
mandado para um mosteiro em Antioquia, depois exilado (435/436) na distante cidade de
Petra, na Arábia, e finalmente foi para o oásis de Upper, no Egito, onde passaria o resto
de seus dias.
O nestorianismo permaneceu na Pérsia, onde seus seguidores estabeleceram um
eficiente trabalho missionário que permitiu sua proliferação na Arábia, Índia, Turquestão
e China, espalhando-se por diversas regiões da Ásia. Ainda hoje sobrevive o
nestorianismo (Caldeus Uniatos) na Mesopotâmia, Pérsia e Síria, havendo um grupo
alinhado com a Igreja de Roma e outro independente (Igreja Nestoriana Não unida).
13
OS EUTIQUIANOS
Os eutiquianos eram seguidores de Êutico. Êutico desenvolveu o que é chamado de
a heresia monofisista. O termo grego monophysite vem de monophysis, que quer dizer
“uma natureza ou substância”. Êutico argumentava que Cristo é uma pessoa com uma
natureza. Ele atacou a ideia de que Jesus é uma pessoa com duas naturezas, uma divina e
outra humana.
O eutiquianismo começou com asseveração de que o corpo de Jesus não era
idêntico ao nosso, fora especialmente criado para a missão que veio cumprir. Afirmavam
que não havia duas, mas apenas uma natureza em Cristo. Tudo acerca de Cristo era
Divino, mesmo Seu corpo. A união das duas naturezas constituiu uma terceira. Por isso
foram chamados de monofisitas, porque reduziram as duas naturezas de Cristo a uma só.
Jesus após a encarnação passou a ser uma só Pessoa com uma só natureza, uma
humanidade deificada, diferente de qualquer outra humanidade.
A conexão soteriológica. O que é importante para o propósito deste debate foram
as repercussões de Calcedônia com respeito à salvação. Os monotelistas, baseando-se em
Calcedônia, concluíram que Jesus tinha somente uma vontade, a saber, a vontade do
Logos. Em outras palavras, a obediência de Jesus era o resultado da força impulsora do
Logos. Aqui, outra vez, como na controvérsia apolinarista, a Igreja primitiva aplicou o
teste soteriológico para rejeitar a posição monotelista, argumentando que “a redenção
completa demanda uma completa encarnação, inclusive a concepção de uma vontade
humana”.
Em 451 d.C., o Concílio de Calcedônia condenou o eutiquianismo declarando que
em Cristo há duas naturezas distintas, uma humana e uma divina.
ANIPOSTASIA
MENTE
DIVINA
CÉREBRO
HUMANO
ALMA HUMANA
LOGOS
CORPO HUMANO
Hb 2.14; 10.5;
Mt 1.20,22; 2.1,13
A alma
humana de
Jesus era
impessoal.
Na união
hipostática há
uma só
personalidade
– a do Verbo
A Alma do
Verbo: Jo
10.11,15,17,18;
Mt 26.38; Jo
12.27; Is 53.11,12
O ESPÍRITO
HUMANO
Mt 27.50; Lc 23.46
JESUS O VERBO DE DEUS
ANIPOSTASIA
Ap 19.13
ὁ λόγος τοῦ θεοῦ
14
É muito fácil sumariar a doutrina estabelecida por Calcedônia: duas naturezas
numa só pessoa. Todavia, como podem duas naturezas constituir uma só Pessoa? Essa
dificuldade levou à introdução de um novo termo técnico na Cristologia, anypostasia. O
MEDIADOR (Goel) encarnado, o Ser Teantrópico, o Deus-homem, permanece uma
Pessoa porque a natureza humana que ele assumiu é “anipostática” ou “impessoal”.1
Jesus tinha espírito, alma e corpo humanos. O Verbo (Logos) encarnou numa
natureza humana completa, porém a alma humana de Jesus era impessoal (anipostasia).
O primeiro Adão teve o seu corpo formado do pó da terra e o seu espírito originado
do sopro de Deus. A alma de Adão surgiu como resultado da entrada do sopro de Deus
(Gn 2.7). O Segundo Adão (Cristo) teve o seu corpo formado no ventre da virgem Maria
por obra direta do Espírito Santo (Lc 1.34,35; Hb 10.5). Zacarias nos fala que Deus forma
o espírito do homem dentro dele (Zc 12.1). Deus formou ou criou um espírito humano
para o Filho de Deus encarnado. Todavia não houve um sopro de Deus para o corpo do
Segundo Adão, mas as Escrituras nos dizem: “O Verbo se fez carne”; o Logos, a Alma
Preexistente do Filho (Is 53.10-12; Jo 10.11,15-17), entrou naquele corpo formado pelo
Espírito Santo no ventre da Virgem.
Jesus deu a sua vida (alma-psiquê-nefesh) por nós e esta Alma era o Logos, a
segunda Pessoa da Trindade, a Alma Preexistente do Filho.
O mesmo (O Logos) que disse: “tenho sede” (Jo 19.28), disse também: “Antes que
Abraão existisse, eu sou” (Jo 8.58).
A união hipostática é a união das naturezas humana e divina na Pessoa única de
Jesus.
“Há somente uma Pessoa no Mediador (Goel), o Logos Imutável (A Personalidade
da Alma Preexistente do Filho). O Logos fornece a base da personalidade de Cristo” (L.
Berkhof).
Contudo a Pessoa do Mediador após a encarnação passou a ter uma natureza
humana. Havia naquele corpo, no ventre de Maria, um cérebro humano que como o nosso
acumularia conhecimento humano (Lc 2.52). Enquanto nós temos apenas conhecimento
humano acumulado no decorrer da nossa existência; Ele, todavia, além do conhecimento
natural possuía a presciência, a qual nunca perdeu, mesmo quando se fez carne.
Alguns (como Strong) ao afirmar que Jesus possuía uma alma humana chegam a
dizer que esta teria que ser impessoal [anipostasia].
O Logos antes da encarnação nunca possuiu um corpo humano, porém ao encarnar
passou a possuir, e mesmo após a sua morte e ressurreição continuou a ter e tê-lo-á para
sempre.
“Vede as minhas mãos e os meus pés, que sou eu mesmo; tocai-me e vede, pois um
espírito não tem carne nem ossos, como vedes que eu tenho. E, dizendo isso, mostrou-
lhes as mãos e os pés” (Lc 24.39,40).
O corpo humano glorificado de Cristo tornou-se uma revelação a todas hostes
angelicais (Sl 24; 1Tm 3.16). Na sua segunda Vinda, diz a Palavra:
“E, naquele dia, estarão os seus pés sobre o monte das Oliveiras, que está defronte
de Jerusalém para o oriente; e o monte das Oliveiras será fendido pelo meio, para o
oriente e para o ocidente, e haverá um vale muito grande; e metade do monte se apartará
para o norte, e a outra metade dele, para o sul” (Zc 14.4).
1
MACLEOD, Donald. A Pessoa de Cristo. São Paulo: Cultura Cristã, 2007, p. 215.
15
Ele será reconhecido pelos seus ferimentos (Zc 13.6) e como Filho de Davi
assentar-se-á sobre o trono de Davi (Lc 1.32).
Tomás de Aquino chegou a afirmar que a Pessoa do Logos tornou-se composta na
encarnação, e Sua união com a natureza humana “impediu” esta última de chegar a ter
uma personalidade independente. A natureza humana de Cristo recebeu em virtude de sua
união com o Logos, a graça da união que lhe comunicou uma dignidade especial, de
modo que até se tornou objeto de culto, e recebeu a graça habitual, que mantinha em sua
relação com Deus Pai.
Segundo a ortodoxia anipostática não houve tempo da alma humana tornar-se uma
pessoa independente do Logos. Aí entra o conceito de ANIPOSTASIA.
Foi o nosso Parente Remidor (Goel) tão completo quanto nós, passando a possuir
um espírito humano (Mt 27.50; Lc 23.46), uma alma humana [impessoal] e também um
corpo humano (Hb 2.14; 10.5; Mt 1.20,22; 2.1,13). A Cristologia de Alexandria insistia
que, embora o Logos tenha se unido à natureza humana, ele não uniu a um homem.
Mesmo após a encarnação, a personalidade do único Mediador (Goel) era a do Logos:
“Todos os dizeres contidos nos evangelhos devem ser aludidos a uma única Pessoa, à
hipóstase encarnada do Verbo”.
Todavia, o uso cristológico do termo exato anhypostatos (ἀνυπόστατος) é
surpreendentemente raro no grego da Patrística. Ele parece ocorrer anteriormente a
Leôncio de Bizâncio (485-543), e mesmo ele o usou somente para rejeitá-lo como
inadequado. Por volta do tempo da Reforma, entretanto, a ideia tinha se tornado um
elemento importante na dogmática da ortodoxia. O consenso é expresso por Heppe: “A
humanidade assumida pela Pessoa do Logos não é de um homem pessoal, mas uma
natureza humana sem subsistência pessoal”.2
Leôncio de Bizâncio contra a Cristologia
Alexandrina, rejeitou a ideia da impessoalidade da humanidade de Cristo.3
A Cristologia mais recente tem tendido a ser distintamente crítica à ideia de uma
humanidade impessoal. De acordo com R. C. Moberley, por exemplo, “não há e não pode
haver tal coisa como uma humanidade impessoal... A natureza humana que não é pessoal
não é uma natureza humana”. H. R. Mackintosh assim se expressa: “nenhum significado
real poderia ser ligado à “natureza humana” que não seja simplesmente um aspecto da
vida concreta de uma pessoa humana”. Esses sentimentos foram endossados por Donald
Baillie, que concluiu que poucos teólogos defenderiam a frase “humanidade impessoal”
ou hesitariam em falar de Jesus como um homem, “uma pessoa humana”.4
A ANIPOSTASIA negava, primeiramente, a existência autônoma e independente
de sua natureza humana. Neste sentido, a anipostasia foi ligada à negação de Cirilo do
Adocianismo que ele atribuiu a Nestório. Cristo tomou uma natureza humana, mas ele
não tomou um homem. Ele tomou a forma de um servo (Fp 2.7), mas não um servo. Sua
natureza humana certamente não existia num relacionamento de Eu-Tu com a sua
natureza divina; tal entendimento nos arrastaria para o mais claro Nestorianismo. É muito
mais seguro insistir que ele é uma Pessoa divina que, sem “adotar” uma pessoa humana
existente, assumiu a nossa natureza humana e entrou na esfera plena das experiências
humanas.
2
MACLEOD, Donald. A Pessoa de Cristo. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2007, p. 215,216.
3
OLSON, Roger E. História das Controvérsias na Teologia. São Paulo. Editora Vida, 2004, p. 250.
4
MACLEOD, Donald. Op. Cit., 2007, p. 216.
16
DESIPOSTASIA
MENTE
DIVINA
CÉREBRO
HUMANO
LOGOS
CORPO
HUMANO
Hb 2.14; 10.5;
Mt 1.20,22; 2.1,13
A Alma divina
do Logos
substitui a alma
humana de
Jesus.
Na união
hipostática há
uma só
personalidade –
a do Verbo
A Alma do Verbo:
Jo 10.11,15,17,18;
Mt 26.38; Jo 12.27;
Is 53.11,12
O ESPÍRITO
HUMANO
Mt 27.50; Lc 23.46
JESUS O VERBO DE DEUS
DESIPOSTASIA Ap 19.13
ὁ λόγος τοῦ θεοῦ
Esta posição é parecida com a Enipostasia.
A Enipostasia admite uma alma humana que é hipostatizada na Pessoa do Verbo
(Logos).
A Desipostasia (Neoapolinarianismo) afirma que Jesus não tinha uma alma
humana, mas que a Alma divina do Filho (o Logos) ocupou o lugar desta. Apesar desta
posição negar a existência da alma humana em Cristo, mantém, todavia, a
unipersonalidade de Jesus Cristo na encarnação. O ponto fraco neste pensamento é a não
existência da alma humana, enfraquecendo assim o conceito de uma natureza humana
completa em Jesus Cristo. Esta heresia é recente, parece ter surgido no fim do século XX.
Logos
Verbo
Espírito
Humano
Corpo
Humano
Alma
Humana
Impessoal
ANIPOSTASIA
17
A desipostasia sustenta a distinção tricótoma entre soma σῶμα (corpo), psiquê
ψυχή (alma) e pneuma πνεῦμα (espírito), como sendo três sujeitos ou princípios distintos
na constituição do homem, admite que Cristo tem um corpo verdadeiro (soma) e espírito
humano (pneuma), mas não uma alma humana (psiquê), ou mente humana (nous - νοῦς).
Mas se Jesus, raciocinam eles, tinha (ou tem) duas naturezas completas, devia ter um
nous (νοῦς humano e também um nous divino. Isso seria um dualismo absurdo. O Eterno
Filho, ou Logos, assume o lugar da alma (psiquê) humana. Dois seres perfeitos não
podem se tornar um só. A desipostasia acredita na definição da Divindade de Cristo, de
conformidade com o Credo de Nicéia, mas sustenta que Jesus, como homem, tem
espírito, alma e corpo, todavia esta alma é a Alma do Verbo. Acrescentar a essa Pessoa a
divindade completa do Filho resultaria num ser de quatro partes – uma monstruosidade.
Para os desipostáticos, a solução é: O Logos, representa a divindade total do Filho e
substituiu a alma humana no homem Jesus.
A tricotomia desipostática entende que não há a negação da humanidade de Jesus.
ENIPOSTASIA
MENTE
DIVINA
CÉREBRO
HUMANO
ALMA HUMANA
LOGOS
CORPO
HUMANO
Hb 2.14; 10.5;
Mt 1.20,22; 2.1,13
A alma humana
de Jesus foi
hipostatizada no
Verbo Eterno
Na união
hipostática há
uma só
personalidade –
a do Verbo.
A Alma do Verbo:
Jo 10.11,15,17,18;
Mt 26.38; Jo 12.27;
Is 53.11,12
O ESPÍRITO
HUMANO
Mt 27.50; Lc 23.46
JESUS O VERBO DE DEUS
ENIPOSTASIA
Ap 19.13
ὁ λόγος τοῦ θεοῦ=
Todavia, mesmo antes do surgimento da psicologia moderna e da resultante
confusão entre pessoa e personalidade, houve suspeita de que a anipostasia não fosse o
melhor termo para se aplicar à humanidade de Cristo, porque muitos teólogos preferem
falar dela como enipostática. O que é “enipostasia”? Esse termo foi cunhado pela
primeira vez por Leôncio de Bizâncio (475-543 d.C.), que na sua juventude aderiu à
heresia nestoriana (vamos falar dela mais à frente), mas depois voltou à ortodoxia bíblica.
Leôncio de Bizâncio introduziu o termo em sua obra Adversus Nestorianos et
Eutychianos, para comunicar a ideia de duas naturezas existindo numa Pessoa. Para a
Cristologia, isto significava que as duas naturezas, a divina e a humana, foram
hipostatizadas em uma hipóstase do LOGOS. Isso permitiu a Leôncio evitar o erro
Nestoriano de duas hipóstases, enquanto ao mesmo tempo contrariava o argumento
18
monofisista5
de que não pode haver algo como uma natureza sem uma pessoa (physis
anhypostatos): “A natureza pode somente existir individualmente num indivíduo e, daí,
uma natureza sem hipóstases seria uma abstração”.
Leôncio combateu essa heresia afirmando que, uma vez que Jesus era verdadeiro
homem, Ele tinha um corpo humano e uma alma humana. Caso contrário, sua natureza
humana seria incompleta, Ele seria meio homem, logo Jesus, por ter uma alma humana
tinha uma autoconsciência humana, mas esta, ressaltou Leôncio, não possuía existência
própria. Ela existia apenas no âmbito da união hipostática, isto é, da união perfeita entre a
natureza humana e a divina em uma única pessoa, o Cristo.
O termo usado por Leôncio para se referir à impossibilidade de a autoconsciência
humana de Cristo viver à parte de sua divindade chama-se anipostasia. Já o termo usado
para se referir ao fato de o “eu” humano autoconsciente de Cristo se achar presente e real
apenas no “eu” divino é enipostasia. No grego, en significa “no ou dentro”
(enhypostasia). Já o prefixo grego an de anipostasia (anhypostasia) quer dizer “sem”.
“A Fórmula de Calcedônia afirma a existência de uma única hypóstasis que
exemplifica as naturezas humana e divina. Essa hypóstasis é identificada como a Pessoa
de Cristo”. 6
“A doutrina da enipostasia afirma que natureza humana individual de Cristo – o
composto corpo-alma que foi o homem Jesus de Nazaré – não tinha hypóstasis, ou seja,
não subsistia em si mesmo, mas se tornou hipostático apenas na união com o logos”. 7
João de Damasco incorporou a palavra e o conceito enipostático em sua Exposição
da fé ortodoxa. “A santa Virgem”, ele escreve, “foi envolta pelo Poder e Sabedoria
enipostática do Deus altíssimo”. Ele elucida o conceito no restante da Exposição, estando
a mais plena afirmação no Livro III, Capítulo IX: 8
Porque a carne de Deus o Verbo não subsistia como uma subsistência além de
Deus o Verbo, mas, quando ela veio a existir, tornou-se uma subsistência numa
outra, ao invés de uma que tem uma subsistência independente. O motivo não
carece de subsistência totalmente, nem ainda há uma outra subsistência introduzida
na Trindade.
No quinto concílio de Constantinopla em 553, a doutrina de Leôncio de Bizâncio
conhecida como Enipostasia foi aceita como ortodoxa.
“O Logos eterno, o Filho de Deus, é o sujeito da encarnação”.9
Leôncio argumentou que, embora uma natureza – até mesmo humana – não possa
existir sem uma hipóstase, não precisa ter sua própria hipóstase. Ela pode ser
“hipostatizada” em outra. Ou seja, para Leôncio, “a natureza humana de Cristo não
ficou sem hipóstase, mas se tornou hipostática [personalizada] na Pessoa do Logos”. A
5
Monofisismo. [De mon(o)- + -fisi(o)- + -ismo.] . Substantivo masculino. 1.Doutrina daqueles que admitiam em Jesus Cristo
uma só natureza.
6
MORELAND, J. P., CRAIG, William Lane. Filosofia e Cosmovisão Cristã. São Paulo: Editora Vida Nova, 2005, p. 734.
7
MORELAND, J. P., CRAIG, William Lane. Op. Cit., p. 734.
8
MACLEOD, Donald. Op. Cit., p. 217.
9
OLSON, Roger E. História das Controvérsias na Teologia. São Paulo. Editora Vida, 2004, p. 250-254.
19
natureza humana de Cristo – a natureza humana plena e completa – não era anipostática
(impessoal), nem propriamente pessoal, mas enipostática, que significa “personalizada
na pessoa de outrem”.
“Ele tinha uma alma humana. Sem uma alma humana ele não teria sido
verdadeiramente humano. Dai a ideia de Apolinário, de que o Logos divino [a alma
divina do Filho] entrou num corpo humano, para ficar no lugar da alma, não é adequada.
O fato de que Jesus experimentou todas as emoções humanas, tal como raiva, medo,
alegria, pesada, e tristeza indica a plena humanidade do Seu homem interior. De
particular importância é a realidade da Sua experiência das emoções e as implicações
disso para nossa vida emocional.
O “Segundo Adão”: Através da sua natureza humana, Jesus Cristo demonstrou e
exemplificou o que é o homem vitorioso (Sl 8.4-8). Jesus conquistou o que foi perdido
por Adão: em um ambiente perfeito e sem pecado, Adão falhou, mas em um contexto
apodrecido pelo pecado, Jesus venceu. Sendo puro, inconquistável, manso e dominante,
Jesus revelou o que é o verdadeiro homem segundo o padrão divino.
O homem Jesus era plenamente Deus. Além de estabelecer a divindade do Filho
como um membro pré-encarnado da Trindade, a encarnação envolve a noção de que o
homem Jesus era também plenamente Deus. A maioria dos textos que comprovam a
divindade de Cristo da perspectiva do Logos tornando-se encarnado, também estabelece
este fato, desde que há uma unidade indivisível entre as duas naturezas de Jesus em só
uma pessoa. Entretanto, é útil anotar, que foi o homem Jesus, não só o Logos considerado
separadamente, que aceitou a adoração dos discípulos (Lucas 24.52). Foi Jesus como
homem, que também era o Filho, que reivindicou divindade (João 8.58)”.10
Na união hipostática a natureza humana de Cristo subsiste, é personalizada e
recebe sua existência concreta, na hipóstase de sua natureza divina. “Portanto, a
hipóstase em Cristo é a do Verbo eterno e nela subsistem o divino, bem como o
humano. É por isso que podemos dizer que há, em Cristo, uma ‘união enipostática’”.
Em outras palavras, para Leôncio a natureza humana de Cristo possuía tudo que
qualquer outro ser humano possui na sua condição não pecadora (inocência prístina),
exceto uma existência pessoal independente da Pessoa do Verbo Divino. Jesus Cristo
era e é a eterna Segunda Pessoa da Trindade – O Verbo, o Filho de Deus -, com uma
natureza humana e sua própria natureza divina, e é a “Pessoa” das duas naturezas. Jesus
certamente teve uma personalidade. “A natureza humana individual – o homem Jesus de
Nazaré – não poderia ter existido à parte de sua união com o Logos”. 11
A importância de enypostatos é a natureza humana de Cristo, embora não em si
mesma, mas em um indivíduo, é individualizada como natureza humana do Filho de
Deus. Nem por um simples instante ela existe como anhypostos ou não pessoal. Como
embrião, feto, infante, criança e homem ela é hipostatos [hipostatizada] na Segunda
Pessoa da Trindade. A carne é dele. A forma de um servo é dele. A semelhança de
homens é dele. A obediência até a morte é dele. Em toda conjuntura, como Barth
assinala, tem a ver não com um homem em que Deus mudou a si mesmo, mas com o
próprio Deus. Ele é um homem real somente como o Filho de Deus. Ele se tornou
homem, e ele é, irrevogável e inalienavelmente, homem. Tudo o que ele é e faz é
10
FERREIRA, Franklin, MYATT, Alan. Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova, 2007, p. 512,513.
11
MORELAND, J. P., CRAIG, William Lane. Op. Cit., p. 736.
20
modificado por sua humanidade tão certamente como por sua divindade. Ele pensa e
ama e deseja como homem, tão certamente como ele pensa, ama, e deseja como Deus.12
Ghiorghiu Florovsky também insiste: “não há nenhuma hipóstase humana em
Cristo” (Mondin).13
Brunner declara que o mistério da Pessoa de Jesus Cristo consiste em que, naquilo
em que nós temos uma pessoa pecaminosa, Ele tem, ou melhor, é a Pessoa divina do
Logos.14
No homem há duas substâncias, matéria e espírito, intimamente unidas, sendo que
há uma distinção entre espírito e alma. No homem o princípio de unidade, a pessoa, não
tem sua sede no corpo, mas na alma. No mediador, no nosso Goel, o princípio de
unidade, a pessoa, tem sua sede no Logos, na Alma Preexistente do Filho. Em nós seres
humanos a influência da alma sobre o corpo e do corpo sobre a alma é mistério, porém,
mistério maior encontramos na encarnação do Verbo de Deus. Tudo que acontece no
corpo e na alma é atribuído à pessoa; assim, tudo que se dá nas duas naturezas de Cristo é
atribuído à Sua Pessoa (O Logos). A Bíblia diz que Deus não pode ser tentado (Tg 1.13).
Mas o Deus Filho após a encarnação foi tentado (Hb 2.18). Tudo isso foi possível porque
o Verbo Preexistente tomou posse de um corpo humano. O objeto do nosso culto
religioso é o Deus e homem Jesus Cristo, mas a base sobre a qual o adoramos é a Pessoa
do Logos.
“Não foi o Trino Deus, mas a Segunda Pessoa da Trindade que assumiu a natureza
humana. Por essa razão, é melhor dizer que o Verbo se fez carne, do que dizer que Deus
se fez homem. Ao mesmo tempo, devemos lembrar que cada uma das Pessoas divinas
agiu na encarnação” (Mt 1.20; Lc 1.37; Jo 1.14; At 2,30; Rm 8.3; Gl 4.4; Fp 2.7).
Dois pontos adicionais podem ser mencionados em relação com a enipostasia.
1º) Em contraste com o pano de fundo da antropologia bíblica, a suposição da
natureza humana em união com o divino não é tão imprópria quanto pode parecer à
primeira vista. O homem foi feito à imagem de Deus (Gn 1.27). Como tal ele possui
espírito e razão. Como tal também ele possui a capacidade de comunhão com Deus.
Essas considerações significam que, em se tornando homem, o Verbo não é identificado
com alguma coisa que é uma contradição consigo mesmo. A Natureza humana tem a
capacidade de compartilhar do divino (2Pe 1.4), e isso sugere que há na encarnação um
elemento de apropriação que não existiria no caso de uma união entre Deus e qualquer
outra criatura.
2º) Em segundo lugar, a enipostasia apresenta uma limitação e uma definição de
Cristo. Sua humanidade é a de todo homem, mas ele não é todo homem. Ele é o homem
Cristo Jesus, e a única humanidade unida a ele hipostaticamente é a sua própria. Ele é o
único ser TEANTRÓPICO. A humanidade do nosso Goel foi hipostatizada na Pessoa
do Filho (O Logos), não na pessoa do Pai; e a divindade foi unida à humanidade não de
todo homem, mas na Pessoa de Jesus Cristo.
Segundo a doutrina da união hipostática conforme interpretada e afirmada pelo
quinto concílio ecumênico: “embora possamos nos aventurar no processo mental de ver
duas naturezas de Cristo na sua realidade, sempre devemos voltar à verdade
12
MACLEOD, Donald. Op. Cit., p. 218.
13
MONDIN, Battista. Os Grandes teólogos do Século Vinte. São Paulo: Edições Paulinas, Vol. 2, 1979-1980, p. 244.
14
BERKHOF, Louis. Teologia Sistemática. Luz Para o Caminho, 1990, p. 314.
21
fundamental de que ele é uma só Pessoa, o Logos que se fez homem, a quem pertencem
propriedades tanto divinas como humanas e de quem são as ações e palavras, divinas e
humanas, relatadas nas Escrituras”.
Lewis S. Chafer na sua Teologia Sistemática (pág. 286) faz a seguinte declaração:
“A natureza divina é eterna, mas a natureza humana se originou no tempo. Segue-se,
portanto, que a união das duas é por si mesma um evento no tempo, embora se destinasse
a continuar para sempre”. 15
Cristo como ser eterno, agindo como o eterno Espírito Pessoal é o arquétipo eterno
e original de todas as pessoas racionais finitas. Ele diz em oração ao Pai: “A glória que eu
tinha contigo antes que o mundo existisse”.
Ele que subsistia imutável na forma exata ou na realidade de Deus (Fp 2.6; Hb 1.3)
assumiu aquilo que é humano. Ele foi muito mais que um mero homem. Sua Pessoa
Preexistente é agora Teantrópica, Deus-Homem.
A expressão, união hipostática, é notavelmente teológica e se aplica apenas a Cristo
em quem, como ninguém mais, existe a união de duas naturezas distintas. Jesus é a
incomparável Pessoa Teantrópica, o Deus-Homem, o mediador e o notável Parente
Remidor (Goel). Embora a Sua Divindade seja eterna, a humanidade foi adquirida no
tempo. Portanto, a Pessoa Teantrópica que começou na encarnação permanecerá para
sempre.
Malquião e bispos reunidos em Antioquia em 268 d.C. puderam dizer:
“Reconhecemos entre Sua constituição (do Cristo) e a nossa apenas uma diferença, que
admitimos ser muito importante, a saber, que, nEle, o Logos divino é aquilo que o
homem interior (ho eso antropos) é em nós”. Com “homem interior”, eles parecem
indicar a mente ou alma superior e, substituindo-a pelo Verbo na estrutura do Ser
Encarnado, de acordo com este relato, preservar Sua unidade pessoal.
Atanásio resume sua posição, dizendo que estamos certos em nossa Teologia se ao
mesmo tempo em que distinguimos dois conjuntos de ações que Cristo realiza,
respectivamente como Deus e como Deus-feito-homem, também percebemos que esses
dois conjuntos procedem de uma mesma única Pessoa – O Verbo. Não existem duas
vontades de duas pessoas em Cristo, existem duas vontades em uma única pessoa – O
Verbo.
Depois de salvos nós passamos a ter duas naturezas: a divina através da habitação
do Espírito Santo e infelizmente a natureza pecaminosa continua existindo em nós até a
morte física. Temos duas vontades: uma que quer fazer o que agrada a Deus e outra que
desagrada a Deus, nem por isso somos duas pessoas. Continuamos sendo unipessoal.
Podemos perceber duas vontades no Verbo encarnado. Uma que se manifesta via
natureza humana e outra via natureza divina, porém há uma só personalidade que é a do
Logos Eterno.
15
CHAFER, Lewis Sperry. Teologia Sistemática. Vol. 1. Imprensa Batista Regular, 1986.
22
MENTE
DIVINA
CÉREBRO
HUMANO
ALMA HUMANA
LOGOS Alma Divina
CORPO
HUMANO
A mente do
Verbo sabe
tudo. (Jo 8.58)
O cérebro
humano
acumulava
conhecimento
Mc 13.32; Lc
2.52
O ESPÍRITO
HUMANO
Mt 27.50; Lc 23.46
JESUS O VERBO DE DEUS
JESUS
TEANTRÓPICO
Ap 19.13
ὁ λόγος τοῦ θεοῦ
Duas naturezas:
1. Divina e
2. Humana
Uma só
personalidade,
a do Verbo.
Não existem duas
vontades de duas
pessoas em Cristo,
existem duas
vontades em uma
única pessoa – O
Verbo.
O Logos continua sendo aquilo que era; o que aconteceu foi que, por ocasião da
encarnação, embora continuasse a existir eternamente na forma de Deus, Ele acrescentou
a sua natureza divina a natureza humana. Tanto antes quanto depois da encarnação Ele
era a mesma Pessoa, inalterada na essência de Sua deidade. A única diferença era que o
Verbo havia-se corporificado. O corpo era o corpo do Verbo, não de algum homem, e, na
união, as duas naturezas formaram um único ser concreto (sem esquecer que Ele já era
um ser concreto antes da encarnação – possuía pessoalidade). O nosso Emanuel foi um
(prósōpon) e não “bipessoal” (diprósōpon - διπρόσωπον). A hipóstase do Verbo era um
sujeito metafísico único em Cristo.
“As duas naturezas de Cristo estão unidas numa única pessoa” (Hilário).
“Cristo é uma só Pessoa de dupla substância; sendo tanto Deus quanto homem.
Mediador entre Deus e o homem, Ele reúne ambas as naturezas em unicidade de pessoa”
(Agostinho).
“Aquele que Se tornou homem na forma de servo é, Aquele que na forma de Deus
criou o homem” (Tomo de Leão).
“O Logos eterno, o Filho de Deus, é o sujeito da encarnação”.16
Portanto, em Cristo se dá somente um centro hipostático, o Verbo, que ocupa
também o lugar da personalidade da alma humana ou a sua alma humana foi
hipostatizada (personalizada) pelo Verbo. Este centro é a fonte única da vida do Deus-
Homem, nas duas naturezas. O fundamento ontológico desta proposição jaz no fato de
que o homem é a imagem de Deus, criado em imitação à Alma do Verbo Eterno. O
original (A Pessoa do Verbo) pode ocupar o lugar da cópia (da personalidade da alma
humana) na encarnação do Filho de Deus. Ou a alma humana de Cristo foi hipostatizada
no Verbo.
16
OLSON, Roger E. História das Controvérsias na Teologia. São Paulo. Editora Vida, 2004, p. 250-254.
23
"As duas naturezas passaram por dois estados - da concepção à morte e da
exaltação até hoje. Princípio também frisado pelos reformadores, ele enfatiza o fato de
que as duas naturezas de Cristo passaram por dois estados - um da sua concepção no
ventre de Maria até a sua ressurreição, e o outro a partir da sua ressurreição e ascensão
(At 2.22-36; 2Co 8.9 e Fp 2.5-11). Jesus ressuscitou corporalmente, mas seu corpo, neste
novo estado, foi glorificado. O mesmo corpo, mas glorificado".17
Falando novamente sobre seu corpo, podemos afirmar que o Filho de Deus não está
confinado à sua humanidade que assumiu.
Embora o corpo de Cristo esteja no céu e não habite mais na terra, ainda assim o
filho de Deus está na Igreja e em toda parte.
A natureza divina está em toda parte em virtude de sua imensidade e sempre tem a
humanidade unida a ela. Mas a humanidade não está presente em todos os lugares que a
divindade preenche.
O Verbo Divino preenche todas as coisas, mas a humanidade hipostaticamente
unida à divindade é confinada a seu próprio lugar.
A unidade da Pessoa Teantrópica é retida de tal maneira que as propriedades das
duas naturezas permanecem distintas, mas não misturadas.
Não separamos a divindade da humanidade do Verbo de Deus. A sua humanidade é
sustentada na Pessoa do Verbo e sua divindade não é limitada pelo seu corpo humano,
pois a divindade do Verbo preenche todas as coisas.
As faculdades da divindade do Verbo Eterno aperfeiçoam a natureza humana em
vez de destruí-la. É impossível fazer a humanidade coextensiva com a divindade sem
torná-la infinita e assim destruí-la.
A hipóstase divina do Verbo Eterno não impede que o corpo assumido na
encarnação seja um corpo humano.
Alguém que está em toda parte não tem para onde ir! A hipóstase divina de Cristo
não poderia ascender porque ela é infinita e já teria ocupado tudo. Mas a humanidade de
Cristo tinha e tem dimensões fixas e verdadeiramente ascendeu ao céu.
At 1.11: "Varões galileus, por que ficais aí olhando para o céu? Esse Jesus, que
dentre vós foi elevado para o céu, há de vir assim como para o céu o vistes ir". Este texto
é uma referência ao seu corpo.
Mt 28.20: "Ensinando-os a observar todas as coisas que eu vos tenho mandado; e
eis que eu estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos". Este texto, com
certeza, nos fala da sua ubiquidade divina.
A divindade do Verbo Eterno faz com seja possível que sua natureza divina esteja
em toda parte e ao mesmo tempo habite num corpo humano limitado.
Beza afirmou: "A substância do corpo de Cristo estava ausente do céu quando
Jesus, no corpo, estava na terra, e agora que ele está no céu, a substância deste corpo está
ausente da terra".18
17
https://peregrinodecristo.blogspot.com/2012/01/jesus-100-homem-e-100-deus.html.
18
BARRETT, Matthew. Teologia Reformada.1ª ed. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2017, p. 294
24
RAZÕES BÍBLICAS PARA A POSIÇÃO ORTODOXA TRADICIONAL
A posição ortodoxa tradicional — de que Jesus esta geneticamente ligado a Adão
por intermédio de Maria — fica demonstrada a partir de vários fatos.
Primeiro, Jesus e considerado o “filho de [...] Adão,” que é o primeiro nome da
sua árvore genealógica (Lc 3.23, 38). Isto indica, tal qual ocorre com todas as demais
pessoas da lista, que Jesus foi um descendente genético de Adão.
Segundo, como já foi visto, Jesus foi a “semente da mulher”, ou “nascido de
mulher” (cf. G1 4.4), uma expressão que, biblicamente sempre implica ligação genética, a
partir de Genesis 3.15 em diante. Na verdade, quando Eva teve o seu primeiro filho (Sete)
depois de Caim ter assassinado o seu irmão Abel, a sua afirmação indica que ela esperava
que este próprio filho fosse o redentor: “E tornou Adão a conhecer a sua mulher; e ela
teve um filho e chamou o seu nome Sete; porque, disse ela, Deus me deu outra semente
(σπέρµα - spérma) em lugar de Abel; porquanto Caim o matou.” (Gn 4.25). [spérma -
esperma].
Gálatas 3.16-18: 16. Ora, a Abraão e a seu descendente (σπέρματι - spérmati)
foram feitas as promessas; não diz: E a seus descendentes (σπέρμασιν - spérmaçin), como
falando de muitos, mas como de um só: E a teu descendente (σπέρματι), que é Cristo. 17.
E digo isto: Ao testamento anteriormente confirmado por Deus, a lei, que veio
quatrocentos e trinta anos depois, não invalida, de forma a tornar inoperante a promessa.
18. Pois se da lei provém a herança, já não provém mais da promessa; mas Deus, pela
promessa, a deu gratuitamente a Abraão.
Descendente (σπέρµα). Ao pé da letra, o texto original diz “semente”. Tanto em
hebraico como em grego, “semente”, quando aplicado a pessoas, é um substantivo
coletivo que designa “descendência, descendentes”. Este é o sentido dessa palavra na
promessa feita a Abraão em Gn 12.7 (ver também Gn 13.15; 17.2; 22.17-18; 24.7).
Seguindo métodos de interpretação que eram usados em seu tempo, Paulo entende essa
palavra no sentido singular, como referência a uma só pessoa, o “descendente”, isto é,
Cristo.
Terceiro, como já foi observado, o corpo humano de Jesus foi “nascido de mulher”
(G1 4.4), e não diretamente criado por Deus. A palavra “nascer” (ginomai, no grego)
significa “gerar” ou “causar existência.” Isto favorece em muito uma ligação física com
Maria, e não uma criação separada no seu ventre.
Quarto, Jesus veio dos lombos de Davi (1Reis 8.19), um termo que tem um
significado claramente genético. A palavra hebraica para lombos (chalats) significa
"separar por puxão,” “descascar,” “arrancar,” ou “entregar.” Todas estas acepções se
encaixam com a ideia clássica da existência da uma ligação física (genética) entre a mãe
(Maria) e o filho (Jesus).
Quinto, Jesus foi o último Adão (e não um novo Adão), um termo que indica
sequência ou continuidade. O mesmo é verdade para a comparação íntima entre aquilo
que Adão fez e o que Cristo realizou pela humanidade como um todo em Romanos 5.12-
25
21. Na qualidade de primeiro e último, tanto Adão como Cristo permanecem como os
cabeças de uma mesma “raça” humana, um para a condenação e o outro para a salvação.
Isto também revela uma continuidade física entre Cristo e Adão que não seria possível
caso Jesus representasse uma criação especial no ventre de Maria, a qual, por
conseguinte, não guardaria qualquer relação genética com ela.
Sexto, Jesus era judeu, e como tal, Ele tinha componente genéticos dessa etnia,
sendo a “semente” de Abraão (Rm 4.13; Hb 2.14-17). Ele aparentemente tinha uma
feição tipicamente judia, pois a mulher no poço de Samaria imediatamente o reconheceu
como judeu: “Como, sendo tu judeu, me pedes de beber a mim, que sou mulher
samaritana”? (Jo 4.9).
Sétimo, uma vez mais, Jesus não poderia ser o mediador (Goel) da raça de Adão se
não fosse geneticamente membro dela. A Bíblia, por sua vez, declara que “há um só Deus
e um só mediador (Goel) entre Deus e os homens, Jesus Cristo, homem” (1Tm 2.5).
Oitavo, o livro de Hebreus afirma que “visto como os filhos participam da carne e
do sangue, também ele participou das mesmas coisas, para que, pela morte, aniquilasse o
que tinha o império da morte, isto é, o diabo” (2.14). Traduzindo para uma terminologia
cientifica moderna, uma amostra de Jesus teria comprovado a sua ligação com Maria. Em
suma, Ele era seu parente consanguíneo. Hebreus, ainda, acrescenta: “Pelo que convinha
que, em tudo, fosse semelhante aos irmãos, para ser misericordioso e fiel sumo sacerdote
naquilo que e de Deus, para expiar os pecados do povo” (2.17).
Sucintamente falando, Ele não poderia nos salvar se não fosse, de fato, um de nós.
Nono, Jesus tinha carne “humana” (Jo 1.14), o que denota que Ele compartilhava
da nossa natureza, salvo a nossa pecaminosidade (Hb 4.15). Na sua encarnação, Ele
tomou sobre si a nossa natureza humana, tornando-se um de nós (Fp 2.7).
Décimo, Jesus é chamado de homem (1Tm 2.5), e os homens tiveram o seu
“primeiro” representante em Adão (1Co 15.47). Isto implica a sua unidade com Adão e,
portanto, a sua capacidade de redimir qualquer pessoa que faça parte da sua
descendência. Isto não seria possível, caso Jesus não fosse verdadeiramente descendente
de Adão.
Concluindo, negar a humanidade (1Jo 4.1ss) ou a divindade (Cl 2.8,9) de Cristo se
constitui em grave erro doutrinário. Negar a sua ligação genética com Adão é, implícita e
logicamente, negar a sua humanidade. Portanto, apesar desta posição se mostrar bastante
atraente, ela representa um sério engano. A natureza miraculosa da concepção virginal de
Jesus não vem do fato dela ser uma criação direta de um ser humano completamente
novo, ex nihilo, mas sim, do fato de Deus ter agido de forma sobrenatural na fertilização
de um óvulo no ventre de Maria, dispensando a necessidade natural de um
espermatozoide masculino. Qualquer afirmação de que os genes de Maria não estavam
em Jesus é uma negação da sua genuína humanidade e, consequentemente, da
possibilidade da nossa redenção.
26
Se, como propõe a perspectiva da criação intrauterina, Maria deu a luz ao Senhor
Jesus sem que Ele tenha sido seu descendente genético, isto seria o mesmo que
afirmarmos que um embrião gerado por pais caucasoides, ao ser implantado no útero de
uma mulher negra, fosse considerado, ao nascer, de origem africana. Maria era
simplesmente um canal para algo que, geneticamente, era totalmente alheio a ela. O bebe
de Maria foi “nascido” dela (G1 4.4), era “semelhante” a ela (Hb 2.17) e, portanto,
compartilhava da sua natureza humana, tal qual todos os descendentes físicos
compartilham da natureza de suas genitoras.
O NASCIMENTO VIRGINAL DE CRISTO
O nascimento virginal de Cristo é uma das doutrinas bíblicas fundamentais à fé
cristã. Desde as primeiras décadas da história da igreja esta doutrina é sustentada e
ensinada pelos Apóstolos e Pais da igreja; cito aqui Inácio de Antioquia: “Oculto dos
príncipes deste mundo havia a virgindade de Maria e o seu parto... Dou glória a Jesus
Cristo, o Deus que conferiu tal sabedoria a ti; pois tenho percebido no tocante o nosso
Senhor, de que Ele pertence verdadeiramente à raça de Davi segundo a carne, mas Filho
de Deus por vontade e poder divino, verdadeiramente nascido de uma virgem e batizado
por João”. “Nasceu do Espírito Santo e da Virgem Maria”.
Jesus é uma pessoa absolutamente única, como verdadeiro Deus e vero homem; a
Sua entrada neste mundo foi diferente dos demais homens. Os Evangelistas Mateus e
Lucas esclarecem inequivocamente a forma miraculosa do nascimento Virginal de Cristo
o qual se harmoniza com tudo que conhecemos e cremos sobre a Sua pessoa e natureza.
(Mt 1.18-25; Lc 1.26-38) A polêmica sobre a tradução por “virgem” ou “jovem” do
termo hebraico em Is 7.14, em nada afeta o caso, pois é muito claro os textos de Mateus e
Lucas citados acima.
A seguir apresentarei alguns argumentos sobre a importância do nascimento
virginal de Cristo dentro da formação sistemática das doutrinas cristãs:
1. As naturezas de duas vidas (pai e mãe) unidas pela concepção do embrião
determinam a natureza do ser gerado por elas. Somente um ser gerado pelo divino e pelo
humano pode ser divino e humano. Se Jesus não tivesse nascido de mãe virgem Ele
pertenceria à mesma classe dos demais filhos de José e Maria. Mas é justamente o seu
parentesco divino e humano, combinados que estabelece a categoria de Sua Pessoa. Se
Jesus tivesse tido um pai humano logo Ele seria igual a qualquer um de nós e não
teríamos argumentos suficientes para defender tanto a ausência de pecado em Sua
natureza, quanto a Sua divindade Pessoal. (Lc 1.35; Hb 2.14).
2. A forma como Jesus entrou na vida humana difere de nós, no que tange o
Seu nascimento virginal. A concepção sobrenatural é concordante com o nascimento de
uma pessoa sobrenatural, fato que harmoniza com a doutrina da Trindade. Porque se
Jesus não é uma pessoa sobrenatural logo não existe a segunda Pessoa da Trindade; e
consequentemente não haveria Trindade. Concluímos que caso nos faltasse esse elo
doutrinário do nascimento virginal de Jesus Cristo a doutrina da trindade seria
questionável. (Is 9.6).
27
3. É de suma importância para doutrina da expiação o respaldo oferecido pela
doutrina do Nascimento Virginal de Cristo. Champion faz a seguinte afirmação sobre
esse assunto: “Quanto menos vemos da Divindade de Cristo em Seu nascimento
sobrenatural, menos vemos dessa Divindade em Sua morte expiatória. Quando perdemos
de vista o Cristo histórico dos Evangelhos e a Sua Concepção Miraculosa, conforme ali
registrada, nem sombra de divindade resta para efetuar nossa redenção”. Somente um
Sumo Sacerdote perfeito, santo e inculpável, com natureza divina e humana poderia fazer
uma expiação perfeita pelos pecadores imperfeitos. Hb 8.26-28. Cremos no Nascimento
Virginal de Cristo Jesus porque nenhuma objeção foi levantada que fosse suficiente ou
concludente.
LOGOS
ESPÍRITO
HUMANO
CORPO
HUMANO
ALMA
HUMANA
LOGOS
DEUS GERA
CRISTO
A ENCARNAÇÃO DO LOGOS
Hb 2.14; 10.5;
Zc 12.1
Hb 2.14: Portanto, visto como os filhos são participantes
comuns de carne e sangue, também ele semelhantemente
participou das mesmas coisas.
Hb 10.5: Pelo que, entrando no
mundo, diz: Sacrifício e oferta
não quiseste, mas um corpo me
preparaste.
28
PÓS-LAPSARIANISMO X PRÉ-LAPSARIANISMO 19
O primeiro Adão teve o seu corpo formado do pó da terra e a sua alma originada
do sopro de Deus (espírito). A alma de Adão surgiu como resultado da entrada do sopro
de Deus (Gn 2.7). O Segundo Adão (Cristo) teve o seu corpo formado no ventre da
virgem Maria por obra direta do Espírito Santo (Lc 1.34,35; Hb 10.5). Zacarias nos fala
que Deus forma o espírito do homem dentro dele (Zc 12.1). Deus formou ou criou um
espírito humano para o Filho de Deus encarnado. Todavia não houve um sopro de Deus
para o corpo do Segundo Adão, mas as Escrituras nos dizem: “O Verbo se fez carne”; o
Logos, a Alma Preexistente do Filho, entrou naquele corpo formado pelo Espírito Santo
no ventre da Virgem.
ESPÍRITO
PÓ DA
TERRA
CORPO
ESPÍRITO
CORPO
ALMA
DEUS CRIA O HOMEM
LOGOS
ESPÍRITO
HUMANO
CORPO
HUMANO
ALMA
HUMANA
LOGOS
DEUS GERA
CRISTO
A ENCARNAÇÃO DO LOGOS
Hb 2.14; 10.5;
Zc 12.1
Hb 2.14: Portanto, visto como os filhos são participantes
comuns de carne e sangue, também ele semelhantemente
participou das mesmas coisas.
Hb 10.5: Pelo que, entrando no
mundo, diz: Sacrifício e oferta
não quiseste, mas um corpo me
preparaste.
DEFINIÇÃO DOS TERMOS “NATUREZA” E “PESSOA”.
Com vistas à adequada compreensão da doutrina, é necessário saber o sentido
exato dos termos “natureza” e “pessoa”, como são empregados neste contexto. O termo
“natureza” denota a soma total de todas as qualidades de uma coisa, daquilo que faz uma
coisa ser o que é. Uma natureza é uma substância possuída em comum, incluindo todas as
qualidades essenciais da referida substância. O termo “pessoa” denota uma substancia
completa, dotada de razão e, consequentemente, um sujeito responsável por suas ações. A
personalidade não é parte essencial e integrante da natureza mas é, por assim dizer, o
término para o qual ela tende. Uma pessoa é uma natureza acrescida de algo, a saber, uma
subsistência ou individualidade independente. Pois bem, “o Logos assumiu uma natureza
humana não personalizada, que não existia por si mesma”.20
19
Este estudo é um apanhado geral de vários estudos: A natureza humana de Cristo - Pré-lapsariana ou Pós-lapsariana? Pr.
Daniel Spencer; A NATUREZA HUMANA DE JESUS (Entrevista Dr. Amin Rodor).
http://www.entrevistas.criacionismo.com.br/2010/11/natureza-humana-de-jesus.html; NATUREZA PÓS-LAPSARIANA DE
CRISTO. https://bispomoreno.wordpress.com/2018/10/10/o-cristo-pecado/. O HOMEM JESUS.
http://www.revistaadventista.com.br/blog/2017/06/09/nosso-perfeito-salvador/. Jesus nasceu com uma natureza
pecaminosa?.. http://www.cacp.org.br/jesus-nasceu-com-uma-natureza-pecaminosa/.
20
BERKHOF, Louis. Teologia Sistemática. Luz Para o Caminho, 1990, p. 313.
29
A humanidade criada e decaída
A humanidade
criada
A humanidade
decaída
Termo latino
Livre-arbítrio sim sim liberum arbitrium
Liberdade sim não libertas
A capacidade
de pecar
sim sim posse peccare
A capacidade
de não pecar
sim não posse non eccare
A incapacidade
de não pecar
não sim non posse non
peccare
Cristo não
encarnado
Cristo encarnado
Livre-arbítrio sim É Soberano
Liberdade sim É Soberano
A capacidade
de pecar
não Ele poderia pecar? Não
A capacidade
de não pecar
sim Ele poderia não pecar? sim
A incapacidade
de não pecar
não Não
Ele não pecaria porque é Deus
Há quatro possibilidades relativas ao pecado no ser humano e em Jesus homem:
1. Posso pecar
2. Não posso não pecar
3. Posso não pecar
4. Não posso pecar
30
Para começar cito um texto da internet:
"O que é a natureza pecaminosa?"21
Resposta: A natureza pecaminosa é aquele aspecto no homem que o faz rebelde
contra Deus. Quando falamos da natureza pecaminosa, referimo-nos ao fato de que temos
uma inclinação natural ao pecado; dada a escolha de fazer a vontade de Deus ou a nossa,
naturalmente escolheremos fazer a nossa.
Prova dessa natureza é abundante. Ninguém tem que ensinar uma criança a mentir
ou ser egoísta; em vez disso, temos que nos esforçar para ensinar as crianças a dizer a
verdade e colocar os outros em primeiro lugar. O comportamento pecaminoso vem
naturalmente. O jornal está cheio de exemplos trágicos da humanidade agindo mal. Onde
quer que as pessoas estejam, há problemas. Charles Spurgeon disse: “Como o sal
tempera cada gota no Atlântico, o pecado afeta todos os átomos da nossa natureza.
Está tão tristemente lá, tão abundantemente lá, que se você não puder detectá-lo,
então está enganado”.
A Bíblia explica a razão do problema. A humanidade é pecadora, não apenas na
teoria ou na prática, mas por natureza. O pecado faz parte da própria fibra do nosso ser. A
Bíblia fala da “carne pecaminosa” em Romanos 8.3. É a nossa “natureza terrena” que
produz a lista de pecados em Colossenses 3.5. E Romanos 6.6 fala do “corpo do pecado”.
A existência de carne e osso que vivemos nesta terra é moldada por nossa natureza
pecaminosa e corrupta. O primeiro tópico da Tulip; Depravação Total nos ensina que o
ser humano foi atingido em toda a sua natureza (corpo, alma e espírito).
A natureza pecaminosa é universal na humanidade. Todos nós temos uma natureza
pecaminosa, e ela afeta cada parte do nosso ser. Essa é a doutrina da depravação total, e é
bíblica. Todos nós nos desviamos (Isaías 53.6). Paulo admite: “eu, todavia, sou carnal,
vendido à escravidão do pecado” (Romanos 7.14). Paulo continua: “de mim mesmo, com
a mente, sou escravo da lei de Deus, mas, segundo a carne, da lei do pecado” (Romanos
7.25). Salomão concorda: “Não há homem justo sobre a terra que faça o bem e que não
peque” (Eclesiastes 7.20). O apóstolo João talvez ponha a questão da maneira mais
franca: “Se dissermos que não temos pecado nenhum, a nós mesmos nos enganamos, e a
verdade não está em nós” (1Jo 1.8).
Até as crianças têm uma natureza pecaminosa. Davi insiste no fato de que nasceu
com o pecado já em ação dentro dele: "Eu nasci na iniquidade, e em pecado me concebeu
minha mãe" (Salmos 51.5). Em outra passagem, Davi declara: “Desviam-se os ímpios
desde a sua concepção; nascem e já se desencaminham, proferindo mentiras” (Salmo
58.3).
De onde veio a natureza pecaminosa? As Escrituras dizem que Deus criou os
humanos bons e sem uma natureza pecaminosa: “Criou Deus, pois, o homem à sua
imagem, à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou” (Gênesis 1.27). No
entanto, Gênesis 3 registra a desobediência de Adão e Eva. Por aquela ação, o pecado
entrou em sua natureza. Eles foram imediatamente atingidos por uma sensação de
vergonha e inaptidão, e esconderam-se da presença de Deus (Gênesis 3.8). Quando
tiveram filhos, a imagem e a semelhança de Adão foram transmitidas aos seus
21
https://www.gotquestions.org/Portugues/natureza-pecaminosa.html.
31
descendentes (Gênesis 5.3). A natureza pecaminosa manifestou-se no início da
genealogia: o primeiro filho nascido de Adão e Eva, Caim, tornou-se o primeiro assassino
(Gênesis 4.8).
De geração em geração, a natureza pecaminosa foi passada para toda a
humanidade: “Portanto, assim como por um só homem entrou o pecado no mundo, e pelo
pecado, a morte, assim também a morte passou a todos os homens, porque todos
pecaram” (Romanos 5.12). Este versículo também apresenta a verdade inquietante de que
a natureza do pecado leva inexoravelmente à morte (ver também Romanos 6.23 e Efésios
2.1).
Outras consequências da natureza pecaminosa são a hostilidade para com Deus e a
ignorância de Sua verdade. Paulo diz: “Por isso, o pendor da carne é inimizade contra
Deus, pois não está sujeito à lei de Deus, nem mesmo pode estar. Portanto, os que estão
na carne não podem agradar a Deus” (Romanos 8.7-8). Além disso, “o homem natural
não aceita as coisas do Espírito de Deus, porque lhe são loucura; e não pode entendê-las,
porque elas se discernem espiritualmente” (1 Coríntios 2.14).
Há apenas uma pessoa na história do mundo que não tem uma natureza
pecaminosa: Jesus Cristo. Seu nascimento virginal permitiu que entrasse em nosso
mundo sem ser contaminado pela maldição transmitida por Adão. Jesus então viveu uma
vida sem pecado de perfeição absoluta. Ele era “o Santo e o Justo” (Atos 3.14) que “não
tinha pecado” (2 Coríntios 5.21). Isso permitiu que Jesus fosse sacrificado na cruz como
nosso perfeito substituto, “um cordeiro defeito e sem mácula” (1 Pedro 1.19). João
Calvino coloca isso em perspectiva: “Certamente, Cristo é muito mais poderoso para
salvar do que Adão foi para arruinar.”
É através de Cristo que nascemos de novo. “O que é nascido da carne é carne; e o
que é nascido do Espírito é espírito” (João 3.6). Quando nascemos de Adão, herdamos
sua natureza pecaminosa; mas quando nascemos de novo em Cristo, herdamos uma nova
natureza: “E, assim, se alguém está em Cristo, é nova criatura; as coisas antigas já
passaram; eis que se fizeram novas” (2 Coríntios 5.17).
Não perdemos a nossa natureza pecaminosa quando recebemos a Cristo. A Bíblia
diz que o pecado permanece em nós e que uma luta com essa velha natureza continuará
enquanto estivermos neste mundo. Paulo lamentou sua luta pessoal em Romanos 7.15–
25. No entanto, temos ajuda na batalha - ajuda divina. O Espírito de Deus habita em cada
crente e fornece o poder de que precisamos para vencer a atração da natureza pecaminosa
dentro de nós. “Todo aquele que é nascido de Deus não vive na prática de pecado; pois o
que permanece nele é a divina semente; ora, esse não pode viver pecando, porque é
nascido de Deus” (1 João 3.9). O plano final de Deus para nós é a santificação total
quando virmos Cristo (1 Tessalonicenses 3.13; 1 João 3.2).
Através de Sua obra consumada na cruz, Jesus satisfez a ira de Deus contra o
pecado e deu aos crentes a vitória sobre sua natureza pecaminosa: “carregando ele mesmo
em seu corpo, sobre o madeiro, os nossos pecados, para que nós, mortos para os pecados,
vivamos para a justiça” (1 Pedro 2.24). Em Sua ressurreição, Jesus oferece vida a todos
os que estão amarrados pela carne corrupta. Aqueles que são nascidos de novo agora têm
esta ordem: "Assim também vós considerai-vos mortos para o pecado, mas vivos para
Deus, em Cristo Jesus" (Romanos 6.11).
32
PÓS-LAPSARIANISMO E PRÉ-LAPSARIANISMO CRISTOLÓGICO
O argumento fundamental para o ponto de vista da “natureza caída” [ou pós-
lapsariana] é o de que Jesus de alguma forma assumiu a carne pecaminosa caída sem ser
um pecador. Esta opinião baseia-se na premissa de que “uma pessoa nascida com carne
pecaminosa não precisa ser um pecador”. Por carne pecaminosa se quer dizer “a condição
humana em todos os seus aspectos, conforme afetada pela queda de Adão e Eva”. O
grande princípio que serve de base para a posição “caída” é o de que o testemunho dos
escritores do Novo Testamento sugere que Jesus não tinha nenhuma vantagem física,
emocional ou moral sobre seus contemporâneos. Parece aceitável concluir, partindo da
perspectiva dos defensores da “natureza caída”, que tanto quanto diz respeito à
humanidade de Jesus, Ele era exatamente semelhante a qualquer ser humano depois
de Adão e Eva. Estas convicções fundamentais da posição da “natureza caída” são
de natureza ontológica. Mas que possível visão de salvação confere tal ontologia?
Exploraremos estes assuntos. O motivo pelo qual estamos escolhendo enfatizar o
problema soteriológico, em vez de ontológico, é o de que, em nossa opinião, o primeiro é
menos inviável na Bíblia. Ontologicamente somos semelhantes ao nosso Cristo.
Soteriologicamente Jesus é extremamente diferente de qualquer ser humano.
Rm 8.3: "Porquanto o que era impossível à lei, visto como estava enferma pela
carne, Deus, enviando o seu Filho em semelhança (ὁμοιώματι) da carne do pecado, pelo
pecado condenou o pecado na carne".
Nascido com carne pecaminosa (corpo físico pós-queda) mas não um pecador (sem
natureza pecaminosa). Várias passagens escriturísticas são reunidas em apoio à ideia de
que Jesus nasceu com carne pecaminosa (carne aqui é sinônimo de corpo - soma). O
nascimento virginal de Jesus (Mt 1.16,18-25; Lc 1.26-38; 3.23); sua autodescrição como
Filho do homem (Mt 8.20; 24.27); e a analogia Adão/Cristo de Paulo (Rm 5) são usados
para apoiar a solidariedade ou unidade de Jesus com a raça humana. Esta solidariedade,
MENTE
DIVINA
CÉREBRO
HUMANO
ALMA HUMANA
LOGOS
CORPO
HUMANO
Hb 2.14; 10.5;
Mt 1.20,22; 2.1,13
Jesus não
possuía natureza
pecaminosa. Ele
era semelhante a
Adão antes da
queda.
O seu corpo
humano vindo
através de
Maria era de
essência
herdada pós
queda.
A Alma do Verbo:
Jo 10.11,15,17,18;
Mt 26.38; Jo 12.27;
Is 53.11,12
O ESPÍRITO
HUMANO
Mt 27.50; Lc 23.46
JESUS O VERBO DE DEUS
PÓS-
LAPSARIANISMO
X
PRÉ-
LAPSARIANISMO
33
porém, é interpretada ontologicamente; portanto, a noção de hereditariedade se destaca
nestes argumentos. Desse modo, no que concerne ao nascimento virginal, “Nenhuma
evidência bíblica sugere que a corrente de hereditariedade humana foi interrompida entre
Maria e Jesus”; além disso, o segundo Adão “é um descendente hereditário, nascido de
mulher”. Semelhantemente, passagens-chaves de Hebreus 2 são tratadas nos termos da
solidariedade ou unidade ontológica entre Jesus e os seres humanos pós-queda (natureza
pós-lapsariana). Assim, “todos vêm de um só…” (v. 11) significa hereditariedade humana
comum; “carne e sangue” (v. 14) significa a mesma natureza; e “em seu mais imediato e
óbvio sentido, os versos 16-18 parecem afirmar que Cristo assumiu a natureza humana
comum a toda a humanidade pós-Queda” (v. 17 semelhante - ὁμοιωθῆναι).
Rm 8.3,4: 3. "Porquanto o que era impossível à lei, visto que se achava fraca pela
carne, Deus, enviando o seu próprio Filho em semelhança (ὁμοιώματι) da carne do
pecado, e por causa do pecado, na carne condenou o pecado. 4. para que a justa exigência
da lei se cumprisse em nós, que não andamos segundo a carne, mas segundo o Espírito".
Adão era perfeito, todavia esta perfeição não era absoluta, pois pecou e morreu. Se
fosse perfeição absoluta não pecaria e nem morreria. O último Adão, Cristo, assumiu um
corpo humano sem natureza pecaminosa, porém semelhante a carne pecaminosa, pois
morreu na cruz. Se tivesse assumido uma carne pura (físico) não morreria.
A encarnação consistiu em tomar uma "carne pecadora", inteiramente semelhante à
de todos os pecadores e sintetizando em si todas as carnes pecadoras. Era a condição para
que a condenação do pecado pudesse cumprir-se na carne de Cristo, e a vida (zōē) abrir
caminho para si.
Jesus encarnou para ser o nosso Goel - Parente Remidor.
A Igreja primitiva rejeitou a posição monotelista, argumentando que “a redenção
completa demanda uma completa encarnação. Aquilo que o Logos não assumiu na
encarnação, o Logos não podia redimir. Ele deu seu espírito para resgatar o nosso
espírito, ele deu a sua alma para resgatar nossa alma e deu seu corpo para resgatar nosso
corpo.
As verdades envolvidas neste tema estão prefiguradas no Antigo Testamento:
a) A lei que governa aquele que vai remir (Lv 25.25-55);
b) O exemplo do Remidor (o livro de Rute);
O tipo de redenção é muito simples; mas o antítipo conforme representado por
Cristo na cruz é realmente complexo, embora siga implicitamente as mesmas linhas
encontradas no tipo. As linhas do tipo são:
a) O remidor (Goel) tem de ser um parente (Lv 25.48,49; Rt 3.12,13);
b) O remidor tem de ser capaz de remir (Rt 4.4-6; Jr 50.34);
c) A redenção é efetuada pelo remidor (Goel), pelo cumprimento das devidas
exigências (Lv 25.27). Jesus é o nosso Goel, o nosso Parente Remidor. Três elementos
foram perdidos na Queda: A alma, o corpo e a terra, Jesus como Parente Remidor pagou
o preço do Resgate – o seu sangue. Assim, hoje já temos a redenção da alma e no dia do
arrebatamento teremos a redenção do corpo (Rm 8.19-23). E num futuro próximo,
teremos a redenção da terra (Mt 19.28; Ap 5).
34
Cristo é o Parente Remidor – Goel, capaz de pagar o preço – o seu sangue. Ele
abrirá os selos da Escritura da Redenção da terra, Ele reinará para todo sempre (Ap 5;
11.15). Como Parente Remidor ele tinha que ser o Cordeiro Imaculado para efetuar a
completa redenção.
Basicamente, em que consiste a posição pós-queda (pós-lapsariana) em relação
à natureza humana de Jesus?
Pós-lapsariana significa depois do lapso, depois da queda, da entrada do pecado,
registrada em Gênesis 3. Fundamentalmente os defensores da teoria pós-lapsariana
insistem que, na encarnação, Jesus assumiu a natureza humana,
tanto física como moral e espiritual, com todas as características da humanidade caída.
Assim, nesta formulação, Jesus, em termos de forma e essência, foi exatamente como
qualquer um de nós – cem por cento igual. Absolutamente em nada diferente de qualquer
outra criatura nascida no planeta Terra. A. T. Jones, um dos pioneiros desta noção,
escreveu: “Em Sua natureza humana, não há uma partícula de diferença entre Ele [Jesus]
e vós” (General Conference Bulletin, 1895, p. 231, 233, 436, citado em G. Knight, From
1888 to Apostasy, p. 136.).
O ponto de vista da “natureza não caída” (pré-lapsariana) argumenta primariamente
a partir da natureza do pecado. Se o pecado fosse simplesmente uma questão de atos,
então seria possível a compreensão de Jesus como nascido com carne pecaminosa, sem,
contudo, ser um pecador. Mas partindo da perspectiva da posição da “natureza não
caída”, “simplesmente não é verdade que o pecado não está presente até que a pessoa
cometa o primeiro ato pecaminoso. Os homens são nascidos pecadores.” Portanto, Jesus
não podia ter nascido com carne pecaminosa.
A ideia de que Cristo tinha uma natureza humana igual a nossa é importante de ser
analisada pois os perfeccionistas alegam que se Cristo tem uma natureza igual à nossa e
ele pode viver sem pecar então nós também podemos viver sem pecar imitando a Cristo.
Mesmo Cristo sendo 100% humano você e eu não somos iguais a ele. De acordo
com a Bíblia Jesus é 100% Deus e 100% humano (Teantrópico). Ele é o único ser
teantrópico, isto é, Ele é Deus e homem ao mesmo tempo, e nós somos apenas homens.
João 1.1 nos diz que Ele era o Verbo e no verso 14 o Verbo se fez carne. O verbo era
Deus e estava com Deus. O verbo refere-se a Jesus. A natureza humana de Cristo é muito
diferente da nossa. Vamos ler Lucas 1.35: "Respondeu-lhe o anjo: Virá sobre ti o Espírito
Santo, e o poder do Altíssimo te cobrirá com a sua sombra; por isso o que há de nascer
será chamado santo, Filho de Deus.
Na criação, o homem foi feito à imagem e semelhança divina. Na encarnação, Deus
se fez à imagem e semelhança da humanidade. Esse mistério de poder, amor e graça
infinitos esconde e revela segredos da Onipotência que só podem ser desvendados à luz
das Escrituras.
Ao adentrar esse território sagrado, “bem faremos em levar a sério as palavras de
Moisés, junto à sarça ardente: ‘Tira a sandália dos pés, porque o lugar em que estás é
terra santa’ (Êx 3.5)”. Porém, não devemos recuar desse tema, pois o estudo da
35
encarnação de Cristo é campo frutífero, que recompensará o pesquisador que cavar fundo
em busca de verdades ocultas”.
No processo de “escavação” dessas preciosas “verdades ocultas”, algumas
perguntas desafiam o intérprete da Palavra de Deus: Com qual natureza humana Cristo
encarnou? Tinha Ele propensões para o pecado como todos nós? Ou Ele possuía uma
natureza moral isenta de tendências para o mal?
O tema da natureza humana de Cristo se divide em basicamente dois segmentos:
pré-lapsarianismo e pós-lapsarianismo. Os pré-lapsarianos entendem que Jesus encarnou
com uma natureza humana semelhante à de Adão antes da queda; portanto, diferente da
nossa. O resultado dessa visão é a ênfase em Cristo como nosso substituto no processo da
salvação.
Os pós-lapsarianos, por sua vez, creem que Jesus encarnou com uma natureza
moral semelhante à de Adão depois da queda. Isso o tornaria igual a qualquer ser humano
com tendências pecaminosas. Para os pós-lapsarianos, Cristo tinha natureza pecaminosa,
mas não era pecador, pelo fato de não ter cometido nenhum ato pecaminoso. Assim, se
Cristo não cometeu pecado, mesmo tendo propensões como as nossas, inevitavelmente
todo ser humano, para ser salvo, precisa passar no mesmo teste em que Jesus foi
aprovado. Ou seja, nesse caso, a salvação depende da obediência humana. Nesse
paradigma, a ênfase soteriológica recai sobre o papel de Cristo como modelo de
comportamento e no esforço humano em seguir as exigências divinas.
A grosso modo, no pré-lapsarianismo, a natureza humana de Cristo é totalmente
diferente da nossa; no pós-lapsarianismo, é exatamente igual. Em qual das duas posições
está o tesouro da verdade? Só um exame sério e desapaixonado do tema na Bíblia.
A Bíblia revela que, do ponto de vista físico, Cristo parecia com a humanidade
pós-pecado (Pós-lapsarianismo - 2Co 5.21). As Escrituras evidenciam que o corpo de
Cristo, exatamente como o nosso, estava sujeito a necessidades físicas e a
suscetibilidades emocionais, como fome (Mt 4.2), sede (Jo 19.28), cansaço (Jo 4.6), dor
(Jo 18.22; 19.2,3), angústia (Mt 26.37) e morte (Lc 23.46). Entendemos que Cristo
herdou um corpo humano pós-queda, porém sem natureza pecaminosa.
O primeiro ponto é que você e eu somos gerados e como Jesus foi gerado é
importantíssimo para entendermos até que ponto nós somos semelhantes a Jesus e até que
ponto somos diferentes. Você e eu somos resultado da união do óvulo de uma mãe
pecadora e do espermatozoide de um pai pecador então nós não temos escapatória, nós
somos pecadores desde a concepção. De acordo com salmo 51 verso 5 em pecado me
concebeu a minha mãe. Jesus não é o resultado da união do óvulo de uma mulher
pecadora e do espermatozoide homem pecador, Jesus é resultado da atuação do Espírito
Santo no ventre de Maria.
Isaías capítulo 53.1-5: 1. Quem deu crédito à nossa pregação? e a quem se
manifestou o braço do Senhor? 2. Pois foi crescendo como renovo perante ele, e como
raiz que sai duma terra seca; não tinha formosura nem beleza; e quando olhávamos para
ele, nenhuma beleza víamos, para que o desejássemos. 3. Era desprezado, e rejeitado dos
homens; homem de dores, e experimentado nos sofrimentos; e, como um de quem os
homens escondiam o rosto, era desprezado, e não fizemos dele caso algum. 4.
Verdadeiramente ele tomou sobre si as nossas enfermidades, e carregou com as nossas
dores; e nós o reputávamos por aflito, ferido de Deus, e oprimido. 5. Mas ele foi ferido
36
por causa das nossas transgressões, e esmagado por causa das nossas iniquidades; o
castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados.
Fisicamente Jesus veio com as características físicas de Adão após a queda, através
de Maria, porém moral e espiritualmente veio com as características de Adão antes da
queda, isto é, sem natureza pecaminosa, sem inclinação para o pecado.
A Bíblia trata a condição natural do homem sob o pecado em termos nada
elogiosos (ver Jr 17.9; Sl 51.5; Rm 7.14). No seu âmago, a natureza humana foi
corrompida. Desde então, o pecado alcançou o homem holisticamente: espírito, alma e
corpo foram afetados e infectados pelo pecado. Com relação ao primeiro Adão, os
homens nada receberam dele senão a culpa e a sentença de morte. O egoísmo,
profundamente arraigado em nosso ser, nos veio por herança.
Embora Jesus não fosse um pecador, como corretamente entendido pelo pós-
lapsarianismo, teria Ele sido, realmente, participante da natureza humana corrompida,
com tendências, propensões para o pecado e inclinada para o mal?
Em segundo lugar, Hebreus 2.14 declara que Jesus participou de carne e sangue.
Embora o texto basicamente fale de Jesus participando da natureza humana, por si
mesmo não caracteriza exaustivamente a humanidade de Jesus. Se compreendemos a
natureza humana de Jesus como uma exata participação ontológica em todos os aspectos
da vida humana, como faz a posição da natureza caída, então Ele deve ter experimentado
provações e enfrentado tentações da maneira como todos nós. Falando sobre a tentação
escreve Tiago: “Cada um é tentado pela sua própria cobiça, quando esta o atrai e seduz”
(Tg 1.14). Sobre este ponto, sabemos pelos evangelhos que Jesus não era atraído para o
pecado desta maneira. Então ele extrai a implicação ontológica. Neste sentido podemos
afirmar que Jesus estava livre da mancha do pecado original, que é proveniente da
propensão para o pecado que todos os seres humanos herdam de Adão. Jesus não era
atraído para o pecado por um mau desejo inerente dentro de sua natureza humana.
Esta conclusão é contrária a Hebreus 4.15, onde se afirma que Jesus foi tentado em
todos os pontos como nós somos? Não necessariamente. Hebreus 4.15 simplesmente
declara que Jesus foi tentado tal como os seres humanos são tentados. Tinha Jesus que ter
a má propensão em sua natureza humana a fim de ser tentado como são os seres
humanos? Não, Adão foi tentado humanamente, mas ele não tinha as más propensões
quando foi tentado.
Em terceiro lugar, o que dizer de Romanos 8.3?
"Porquanto o que era impossível à lei, visto como estava enferma pela carne, Deus,
enviando o seu Filho em semelhança da carne do pecado, pelo pecado condenou o pecado
na carne" (Rm 8.3).
É dito que Jesus partilhou de todas as nossas condições. Ostensivamente, isto deve
incluir nossa propensão para o pecado, sendo que “da ‘carne’ surgia para Ele as mesmas
tentações que para nós”. Aqui, novamente se pensa que isto estaria incorreto em vista do
fato de Paulo, que claramente ensinou que Jesus “não conheceu pecado” (2Co 5.21), não
dizer que Jesus veio “em carne pecaminosa”, sendo que em sua opinião isto “poderia
indicar que havia pecado nele”. Paulo pretende apagar tal inferência com a frase “em
semelhança de carne pecaminosa” (ὁμοιώματι σαρκὸς ἁμαρτίας).
Deve ser notado que a posição caída também crê que Jesus nunca pecou. Sendo
este o caso, parece que eles são capazes de reter esta crença e dizer, ao mesmo tempo, que
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Natureza de Cristo e Heresias Cristológicas

  • 1. 1 SEMINÁRIO TEOLÓGICO GOEL Pr. A. Carlos G. Bentes DOUTOR EM TEOLOGIA PhD em Teologia Sistemática American Pontifical Catholic University ‫ל‬ ֵ‫א‬ֹ‫גּ‬‫ל‬ ֵ‫א‬ֹ‫גּ‬ HERSIAS CRISTOLÓGICAS ENIPOSTASIA PRÉ-LAPSARIANISMO E PÓS-LAPSARIANISMO CRISTOLÓGICOS IMPECABILIDADE DE CRISTO “A SUA UNÇÃO VOS ENSINA A RESPEITO DE TODAS AS COISAS” 1 Jo 2.27 “A sabedoria é a coisa principal; adquire, pois, a sabedoria; sim com tudo o que possuis adquire o conhecimento” (Pv 4.7)
  • 2. 2 SUMÁRIO A NATUREZA PURA DE JESUS 3 OS EBIONITAS 4 O GNOSTICISMO 4 OS DOCETAS 6 MONARQUIANISMO 6 OS ARIANOS 9 OS APOLINARIANOS 11 OS NESTORIANOS 12 OS EUTIQUIANOS 13 ANIPOSTASIA 13 DESIPOSTASIA 16 ENIPOSTASIA 17 RAZÕES BÍBLICAS PARA A POSIÇÃO ORTODOXA TRADICIONAL 24 O NASCIMENTO VIRGINAL DE CRISTO 26 PÓS-LAPSARIANISMO X PRÉ-LAPSARIANISMO 28 PÓS-LAPSARIANISMO E PRÉ-LAPSARIANISMO CRISTOLÓGICO 32 A IMPECABILIDADE DE CRISTO 46 CONCLUSÃO: ERA POSSÍVEL JESUS PECAR? 57 BIOGRAFIA DO AUTOR 60
  • 3. 3 A NATUREZA PURA DE JESUS PÓS-LAPSARIANISMO X PRÉ-LAPSARIANISMO O presente artigo trata da natureza de Cristo à luz da doutrina da salvação. Avaliamos as conexões soteriológicas envolvidas na rejeição pela igreja cristã de algumas das principais heresias cristológicas dos primeiros séculos. Em seguida, vamos pesquisar como a compreensão da obra salvífica de Cristo ajuda a definir se sua natureza era a que Adão possuía antes da queda (pré-lapsariana) ou depois da mesma (pós-lapsariana). É muito evidente nas Escrituras que os seguidores de Jesus o reconheciam como Emanuel, “Deus conosco”. Seus seguidores tinham uma crença firme de que nele haviam encontrado o próprio Yahweh. A reflexão neotestamentária sobre essa experiência e suas implicações conduziu à opinião de que Ele é tanto Deus quanto Salvador (2Pe 1.1). Tão comumente era Jesus avaliado como Messias ou Cristo, que a palavra “Cristo” se tornou um nome pessoal. Era a asserção dos escritores do Novo Testamento de que Jesus de Nazaré é divino. A convicção inequívoca dos escritores do Novo Testamento no que concerne à divindade de Jesus encontrou um destino diferente entre as mentalidades judaica e grega. Algumas pessoas de herança judaica, com uma estrita formação monoteísta, evoluíram em seu pensamento chegando a manter o que tem sido chamado de opinião adocionista. Esta concepção, defendida pelos ebionitas, “compreendia a Jesus como um mero homem que, por escrupulosa observância da lei, foi justificado e consequentemente se tornou o Messias”. Por outro lado, a mentalidade grega, imbuída de racionalismo, imaginava o aparente paradoxo divino-humano em termos metafísicos. Para eles, era importante decidir sobre a identidade ontológica de Jesus de Nazaré. Essas preocupações gregas reforçam as várias opiniões docetistas. Segundo o ponto de vista docético, o Cristo divino não tinha um corpo humano real; era apenas uma aparência, um fantasma; sendo que Cristo morreu, então Ele não era Deus, e se Ele era Deus, então não morreu. Estudar a Pessoa Teantrópica do Filho de Deus é uma árdua missão e muitos Pais da Igreja ao fazê-lo descambaram para a heresia. A primeira que surgiu nos dias do Novo Testamento está narrada em 1Jo 4.1-3: “Amados, não deis crédito a qualquer espírito; antes, provai os espíritos se procedem de Deus, porque muitos falsos profetas têm saído pelo mundo fora. Nisto reconheceis o Espírito de Deus: todo espírito que confessa que Jesus Cristo veio em carne é de Deus; e todo espírito que não confessa a Jesus não procede de Deus; pelo contrário, este é o espírito do Anticristo, a respeito do qual tendes ouvido que vem e, presentemente, já está no mundo”. A negação da existência física de Jesus foi a primeira precursora da heresia docética que acossava a Igreja nos séculos II e III.
  • 4. 4 OS EBIONITAS Os ebionitas surgiram no começo do segundo século. O nome é derivado de uma palavra hebraica (‫ו‬ ֹ֜‫י‬ ְ‫ב‬ ֶ‫)א‬ ‘ebheyôn que significa “pobre” ou “indigente”, “miserável”, “mendigo”. Eram judeus crentes que não conseguiram deixar as cerimônias mosaicas. Segundo os seus ensinos, Cristo era somente homem. A crença na divindade de Cristo lhes parecia incompatível com o monoteísmo. Alguns ensinavam que Jesus foi feito Filho de Deus ao ser batizado por João Batista, quando o Espírito Santo desceu sobre ele, porém este o abandonou no Calvário (1Jo 5.6-12). Criam que a fé não era suficiente para a salvação, sendo preciso que os homens observassem a Lei. Rejeitavam os escritos de Paulo, chamando-o de “apóstata da Lei”, todavia, honravam a Tiago e Pedro. O GNOSTICISMO Gnosticismo (do grego γνωστικισμóς; transl.: (gnostikismós); de γνωσις (gnosis): 'conhecimento', (gnostikos): aquele que tem o conhecimento) é um conjunto de correntes filosófico religiosas sincréticas que chegaram a mimetizar-se com o cristianismo nos primeiros séculos de nossa era (sendo ele muitas vezes referenciado como "Alta Teologia"), vindo a ser declarado como um pensamento herético após uma etapa em que conheceu prestígio entre os intelectuais cristãos. Este grupo extremamente “amorfo” surgiu provavelmente no primeiro século. Os gnósticos pretendiam ter um conhecimento esotérico, secreto e especulativo de Deus. Na busca de um conhecimento maior, o gnosticismo se caracterizava por ser altamente especulativo, fazendo um sincretismo de elementos gregos, judeus, cristãos e orientais, buscando uma explicação peculiar para a origem do mal. Irineu os retrata como hereges que corromperam a doutrina cristã, mesclando-a com a filosofia pagã. No entanto, ao que parece, muitos dos mestres gnósticos eram cristãos sinceros, desejosos de expressar o evangelho de forma que parecesse satisfatório a seus contemporâneos. Contudo, foram infelizes em sua tentativa, sacrificando o conceito bíblico do Logos divino em prol de seus pressupostos filosóficos. Uma das preocupações dominantes nos sistemas gnósticos era com a questão da dualidade, caracterizada pela miséria e futilidade da vida humana neste mundo: vida aprisionada pelo corpo material e o contraste com a ordem superior, inteiramente espiritual, que não se comunica com a matéria. A matéria é má, e Deus, o Pai Supremo (Bythos), é o Éon perfeito; por isso Deus não pode ter criado o mundo; “o que Deus fez foi lançar uma série de emanações. Cada uma dessas emanações distanciou-se mais de Deus, até que por último houve uma emanação tão distante que pode tocar a matéria. Esta emanação [Demiurgo, identificado como o Deus do Antigo Testamento] foi a que criou o mundo. Os gnósticos sustentavam que cada emanação conhecia cada vez menos a Deus, até que lhe eram hostis. Assim
  • 5. 5 chegaram, finalmente, à conclusão de que o deus criador não só era distinto do Deus verdadeiro, mas que o ignorava e lhe era ativamente hostil”. Demiurgo, (em grego: δημιουργός) "Aurora do Mundo" de William Blake,1794 O termo Demiurgo deriva da forma latinizada do termo grego dēmiourgos (δημιουργός), literalmente, "artesão", "alguém com habilidade específica", de dēmios do povo, popular (dēmos, pessoas ou povo) e ourgos, trabalhador (ergon, trabalho).[37] No gnosticismo, o Demiurgo não é Deus mas o arconte ou chefe da ordem dos espíritos inferiores ou éons. De acordo com os gnósticos, o Demiurgo era capaz de dotar o homem apenas com psiquê (alma sensível) - o pneuma (alma racional) seria adicionada por Deus. Os gnósticos identificaram o Demiurgo com Jeová dos hebreus. Para os gnósticos, Deus (Bythos) não tinha nada a ver com este universo, daí possivelmente, a afirmação de João: “Todas as coisas foram feitas por intermédio dele, e sem ele nada do que foi feito se fez” (Jo 1.3). A respeito da Pessoa de Cristo, havia dentro do gnosticismo uma variedade de ideias, a saber: a) Jesus era uma das trinta emanações, “aeons”, do Deus bom (Bythos), emitidas para entrarem em contato com a matéria que é má. Assim sendo, Jesus não é divino, é apenas uma espécie de semideus, uma entidade entre Deus e os homens. b) Partindo do princípio filosófico de que a matéria é essencialmente má, afirmavam que Jesus não tinha corpo real; desse modo ele era uma espécie de fantasma, sem carne e sangue reais. Jesus era uma ilusão; parecia homem, mas não era (docetismo); o filho de Deus, que era real, apenas usava o Jesus humano como meio de expressão; a encarnação, portanto, era apenas uma ilusão. Por trás desse conceito estava a concepção de que Deus não pode sofrer; logo, se Cristo sofreu, ele não era Deus; e se ele era Deus, não poderia sofrer. Então, o sofrimento de Cristo teria sido apenas na aparência, não real. Inácio de Antioquia e Policarpo, bispo de Esmirna combateram ferreamente o docetismo: “Qualquer que não confesse que Jesus Cristo veio em carne é um anticristo. E quem não confessa o testemunho da cruz é do diabo”. Alguns diziam que quando ele andava não deixava pegadas, porque seu corpo não tinha peso nem substância. João, de modo especial, combateu esse tipo de conceito em seus escritos, evidenciando que negar a verdadeira humanidade de Cristo equivalia a negar um dos pontos centrais da fé cristã (Jo 1.14; 1Jo 4.1-3; Hb 2.14). c) Jesus era um homem comum que foi usado pelo Espírito de Deus e abandonado no Calvário, não havendo de fato encarnação (Jo 1.14; 20.31; Cl 1.19; 2.9; 1Jo 2.22; 4.1- 3,15; 5.1,5,6; 2Jo 7).
  • 6. 6 OS DOCETAS Esta palavra vem do grego doketes, de dokein, que significa “parecer” (dokéo - δοκέο), “crer numa aparência”. Os docetas apareceram no ano 70 da era cristã, e existiram, aproximadamente, até o ano 170 d.C. Eles negavam a realidade da humanidade de Cristo, dizendo que seu sofrimento e sua morte foram aparentes. Erraram ao permitir que a filosofia gnóstica ditasse o significado dos dados bíblicos. Segundo a filosofia docética, as coisas materiais eram, por natureza, más. O mal residia na matéria, e visto que Jesus não tinha pecado, logo não tinha também corpo material. Os docetas negavam, portanto, a humanidade de Jesus. Em última análise, o Cristo descrito pelos docetistas não poderia salvar ninguém, pois a sua morte, num corpo humano, era a condição prévia para destruir o domínio de Satanás sobre a humanidade (Hb 10.5; 2.14). MONARQUIANISMO O nome é derivado de duas palavras gregas: monos (μόνος) e arquê (αρχή), daí, “Um só Princípio”, “Um só Deus”. O Monarquismo modalista foi a heresia mais influente do terceiro século. O termo monarca em nossa língua descreve realeza. A palavra monarca é um composto híbrido de um prefixo e uma raiz. O prefixo mono significa “um” (uno). A raiz arch (ἀρχή) - significa “princípio” ou “chefe, governador”. Quando combinados, mono-arch ou monarca quer dizer “um só chefe ou governador”. A ideia de monarquismo, portanto, se refere a Deus como o único soberano. Sua preocupação era a defesa do monoteísmo. Negando toda e qualquer ideia de diversidade no Ser Divino, daí a tentativa de conciliar a doutrina do “Logos” com a unicidade de Deus. Os monarquianos criam numa espécie de divindade de Jesus (monarquianismo dinâmico), contudo afirmavam ser a Trindade irreconciliável com a unidade de Deus. Dentro dessa perspectiva não há relação trinitária, e está totalmente fora de questão a doutrina da expiação e da intercessão do Espírito. a) MONARQUIANISMO MODALISTA O primeiro tipo de monarquismo a ameaçar a igreja foi chamado de monarquismo modalístico. Essa visão era ligada a uma velha forma de panteísmo que via todo o mundo ou a realidade como um modo ou nível de ser de Deus. Essa visão era popular tanto no gnosticismo como no neopatonismo. Seu principal representante foi Sabélio, presbítero de Ptolemaida (250), tendo ensinado em Roma por volta do ano 215. Esta forma de modalismo foi conhecida no Ocidente como “Patripassianismo” (O Pai se encarnou e também sofreu), e no Oriente como “Sabelianismo”.
  • 7. 7 Para Sabélio não havia Trindade; Pai, Filho e Espírito Santo eram apenas nomes diferentes para a mesma realidade; desse modo, os três eram apenas (πρόσωπατα, semblantes, faces), e não seres independentes. Ele considerava as três Pessoas da Trindade como três diferentes modos de ação ou manifestação divina, os quais Deus assume sucessivamente, revelando-se como Pai na criação e na doação da Lei; como Filho na encarnação e como Espírito na regeneração e santificação. Desse modo há apenas uma única Pessoa; ficando a Trindade reduzida a três modos de manifestação. O herético Sabélio argumentava que Cristo era de uma essência com Deus mas de modo de ser inferior ao próprio Deus. Como os raios do sol compartilham uma essência ou substância em comum com o sol, mas podem ser distinguidos do próprio sol, assim Cristo compartilha a mesma essência com Deus, mas não é Deus. Epifânio, bispo de Salamis, descrevendo os ensinamentos do Sabelianismo, escreveu, por volta do ano 375: “Ensinam que o Pai, o Filho e o Espírito Santo são uma só e a mesma essência, três nomes apenas dados a uma só e a mesma substância”. Adiante Epifânio cita uma analogia utilizada: “Tome-se o sol: o sol é uma só substância, mas com tríplice manifestação: Luz, calor e globo solar. O calor é (análogo) o Espírito; a luz, ao Filho; enquanto o Pai é representado pela verdadeira substância. Em certo momento, o Filho foi emitido como um raio de luz; cumpriu no mundo o que cabia à dispensação do evangelho e à salvação dos homens, e retirou-se para os céus, semelhante ao raio enviado pelo sol que é incorporado a ele. O Espírito Santo é enviado mais sigilosamente ao mundo e, sucessivamente, aos indivíduos dignos de o receberem...”. Nesse esquema modalístico, tudo se pode dizer ser uma parte da essência de Deus. Seu ser “emana” do centro de seu ser puro. Quanto mais longe daquele centro a emanação está, menos puramente ela manifesta Deus. Matérias inertes, como rochas estão distantes do cerne do ser divino, enquanto anjos, demiurgos, e outros seres espirituais estão mais próximos do cerne divino. Jesus é um ser espírito ou demiurgo, próximo ao cerne do ser divino, da mesma essência ou mesmo ser, radiando ou emanando do ser divino, mas ele não é o ser divino. Jesus compartilha da “divindade” mas não é realmente Deus. Implicações desta doutrina: 1) Não há Trindade; 2) As três formas de Revelação não são coeternas; 3) Há apenas três MODOS da mesma Pessoa, e não três Pessoas. b) MONARQUIANISMO DINÂMICO No quarto século a igreja enfrentou uma nova heresia disfarçada em forma diferente de monarquianismo, chamada monarquianismo dinâmico. Era “dinâmico” porque envolvia uma espécie de movimento ou mudança. Nessa visão Jesus não era Deus eterno, e sim ele “se tornou” Deus via adoção, ele não era eterno, ele se tornou eterno. Essa óptica foi patrocinada pelo herético Ário, que havia sido influenciado pelos ensinos de Paulo de Samosata, bispo de Antioquia, por volta de 260 e também por Luciano de Antioquia.
  • 8. 8 Paulo de Samosata ensinava que Jesus era originariamente um mero homem, sendo elevado a uma posição superior no batismo, quando recebeu o poder (δύναμις) do céu. Este poder, que passou a residir na pessoa humana de Jesus – como um mero recipiente, qualificou-a para uma tarefa especial. Assim Jesus foi elevado a uma posição intermediária entre Deus e os homens, no entanto Jesus não é essencialmente divino. A consciência de ser o portador do Logos foi crescendo gradativamente em Jesus a partir de seu batismo. O Logos o capacitou a exercer um ministério especial e era ele que controlava todas as palavras e obras de Jesus. Jesus era filho adotivo; portanto, sua “divindade” era apenas de honra, e não de essência; ela ocorre pela graça. Ário estava zeloso por preservar o puro monoteísmo. Ele via Cristo como a criatura mais exaltada, na verdade a primeira criatura feita por Deus. Cristo foi criado e depois ele, como criatura, criou o restante do mundo. Ário apelou a textos bíblicos que se referem a Cristo como “gerado” e o “primogênito de toda a criação”. Em grego o termo gerado significa “ser, tornar-se ou acontecer”. Em termos biológicos, ter sido gerado é ter tido um começo no tempo. Se Cristo foi gerado, então ele deve tido um começo no tempo e não ser eterno. Se ele não é eterno, então não pode ser Deus. Para Ário, Jesus é preeminente e exaltado, mas originalmente não era Deus. Ele foi adotado na divindade em virtude de sua perfeita obediência, pala qual demonstrou sua “qualidade de ser uno” com o Pai. Ele é “um” com o Pai no objetivo e missão, mas não no ser. Ário abraçou a fórmula aceita anteriormente em Antioquia, que Jesus é homoi- ousios com Deus, que ele é “como” Deus. Essa teologia adopcionista foi condenada no Sínodo de Antioquia (268), sendo ele excomungado. “Jesus é o primogênito da criação” - Cl 1.15. Muitos dizem que Jesus não pode ser Deus porque é chamado, na Bíblia, de o primogênito da criação de Deus, não sendo, portanto, eterno, mas criatura. Alguns ficam confusos com a palavra primogênito pensando que deve significar “o primeiro criado”. Isso implicaria Jesus ser apenas um ser criado, e não pré-existente ou eterno, ou Deus. O texto diz que Jesus é o primogênito da criação, mas não que Ele é o primogênito da criação. A Bíblia ensina que primogênito nem sempre significa ser o primeiro a ser criado ou o primeiro de uma série. A palavra “primogênito” aparece como sendo uma posição de destaque (Sl 89.27 [LXX Sl 88.28: κἀγὼ πρωτότοκον θήσοµαι αὐτόν, ὑψηλὸν παρὰ τοῖς βασιλεῦσιν τῆς γῆς]; Hb 12.23 - πρωτοτόκων). Sabemos que o povo de Israel não era o primeiro povo da terra; no entanto, por ter a primazia, Deus o chama de primogênito (Êx 4.22 - LXX). O mesmo acontece com a tribo de Efraim. Embora Efraim não fosse o primogênito de José, a sua tribo é chamada de primogênito (Jr 31.9 - prōtótokon). Assim, a palavra “primogênito” traz consigo dois significados: O mais velho de uma família (inclusive do gado) ou, ainda, o preeminente, isto é, o que tem a primazia
  • 9. 9 e o domínio. É exatamente nesse segundo sentido que se refere a Jesus, à luz do próprio texto que vem logo em seguida (Cl 1.16-18). A expressão Ele é antes de todas as coisas, e todas as coisas subsistem por Ele, afirma categoricamente que Jesus não faz parte da criação, é um Ser à parte da criação. Isto está completamente dentro do contexto da Bíblia (Is 9.6; Mq 5.2; Hb 13.8). Quando Paulo declarou que Cristo era primogênito de toda a criação (Cl 1.15), ele usou o termo grego prōtótokos - πρωτότοκος, que significa “herdeiro”, primeiro em categoria, se quisesse dizer primeiro criado, o apóstolo usaria a palavra grega prōtóktistos - πρωτόκτιστος (primeiro criado). A Bíblia não afirma em parte alguma que Deus “criou” Jesus. OS ARIANOS Os arianos foram os seguidores de Ário, um presbítero em Alexandria (250-336). O arianismo surgiu no ano 325. Ário negava a integridade e a perfeição da natureza divina de Cristo. O Verbo (Logos), que se fez carne, segundo o Evangelho de João, não era Deus, senão um dos seres mais alto do Criador. O Verbo não era, afinal, mais que uma criatura de Deus. Os ensinos de Ário talvez sejam melhor entendido se listados em oito declarações que se encaixam logicamente: a) A característica fundamental de Deus é a solidão. Ele existe sozinho. b) Dois poderes habitam em Deus: o Verbo e a Sabedoria c) A Criação foi levada a efeito por uma substância independente, que Deus criou. d) A existência do Filho é diferente da existência Pai. e) O Filho não é verdadeiramente Deus. f) O Filho é uma criação perfeita do Pai. g) O espírito humano de Cristo foi substituído pelo Logos. h) O Espírito Santo é uma terceira substância criada. O ponto focal de Ário é de que há um só Deus (Pai) não gerado, sem começo, único, verdadeiro, único detentor de imortalidade. Para os arianos, Jesus Cristo não era da mesma substância do Pai (ὁµοούσιος, “da mesma natureza”), mas, sim, de uma substância similar (ὁµοιόυσιος, “de natureza semelhante”). Esse “iota (ι)” grego fazia toda a diferença entre um cristianismo bíblico e um cristianismo forjado pela imaginação do homem. Alexandre, bispo de Alexandria, em 321, convocou um sínodo, que depôs Ário do presbiterato e o excluiu da comunhão da Igreja. Em 325, no Concílio de Nicéia, Ário e dois de seus amigos foram banidos para a Ilíaca, e seu ensinamento condenado. Desta premissa, como observa Kelly J. N .D., decorrem quatro outras: 1. O Filho é uma criatura perfeita, distinta da criação, mas que veio à existência pela vontade do Pai;
  • 10. 10 2. Como criatura, o Filho teve um começo. Logo, a afirmação de que ele era coeterno com o Pai implicaria na existência de dois princípios, o que assinalaria uma negação do monoteísmo; 3. O Filho não tem nenhuma comunhão substancial com o Pai. Ele é uma criatura que recebeu o título de “Palavra” e “Sabedoria” de Deus porque participa da Palavra e Sabedoria essenciais; 4. O Filho está sujeito a mudanças e ao pecado, tendo podido cair como o Diabo caiu. Contudo Deus, prevendo sua firmeza de caráter, agiu previamente com sua graça. Ário e seus discípulos, buscando apoio em textos tais como Jo 1.14; 3.16; Cl 1.15; 1 Jo 4.9, ensinavam que Deus o Pai criou o Filho primeiro, e, através do Filho criou o Espírito, os homens e o mundo; portanto: Jesus é o primogênito do Pai e o Espírito é o primogênito do Filho. O Filho foi criado do nada; ele veio à existência antes da fundação do mundo, mas não é eterno, porque foi criado. Daí o “chavão” ariano: “Tempo houve em que ele (o Filho) não existia”. Portanto, sendo o Filho criado, não é Deus. Consequentemente, Jesus não é da mesma essência ou natureza do Pai. Atribuição de títulos, “Deus” e “Filho”, feita a Jesus, era apenas de cortesia, resultante da graça. O historiador W. Walter resume a posição de Ário: “Para Ário, Cristo era, na verdade, Deus, em certo sentido, mas um Deus inferior, de modo algum uno com o Pai em essência ou eternidade. Na encarnação, esse Logos entrou em um corpo humano, tomando o lugar do espírito racional humano”. O ponto de partida de Ário é ontológico, significando que termos como o “Filho” não devem ser interpretados para definir a natureza essencial de Jesus. A conexão soteriológica. O principal opositor de Ário, o pai da igreja Atanásio, revelou em sua oposição que, embora Ário argumentasse a partir de uma perspectiva ontológica, a essência do debate era soteriológica. Atanásio afirmava que a salvação só pode ser trazida à humanidade por alguém que é verdadeiramente Deus. É verdade que a opinião particular de Atanásio quanto à salvação, em que a humanidade é participante da natureza divina, estava na essência do seu argumento; contudo, a posição central da questão da salvação para o debate cristológico é inegável. Devemos lembrar-nos de que a Igreja rejeitou o ponto de vista de Ário no Primeiro Concílio Ecumênico (325 d.C. em Nicéia), decidindo que Jesus era gerado do Pai e da mesma substância do Pai. O concílio, portanto, reconheceu a divindade de Jesus. Paul Tillich especula que “A vitória do arianismo teria transformado o cristianismo em apenas mais uma entre as religiões já existentes”. Ário e seus seguidores foram condenados como heréticos no Concílio de Nicéia em 325. O credo Niceno declara que Jesus foi “gerado, não feito”. Aqui Jesus foi acreditado ser eternamente gerado do Pai. A palavra grega gerado (begotten em inglês) foi usada não em um sentido biológico ou qualquer sentido que implique que Cristo tivesse um começo no tempo. Em vez disso o termo gerado teve um sentido filial, chamando atenção ao
  • 11. 11 relacionamento singular do Filho com o Pai. O Novo Testamento se refere a Cristo como o “único-gerado” ou unigênito do Pai, o monogenēs, um termo que dá ênfase ao relacionamento singular, uma vez por todas, entre o Filho e o Pai. OS APOLINARIANOS Apolinário, bispo de Laodiceia na Síria, viveu durante quase a totalidade do século IV, e por isso acompanhou em primeira mão a controvérsia ariana. O apolinarismo sustentava a distinção platônica entre soma σῶμα (corpo), psiquê ψυχή (alma) e pneuma πνεῦμα (espírito), como sendo três sujeitos ou princípios distintos na constituição do homem, admitia que Cristo tinha um corpo verdadeiro (soma) e alma animal (psiquê), mas não um espírito racional, ou mente (pneuma ou nous). Mas se Jesus, raciocinava Apolinário, tinha duas naturezas completas, devia ter um nous humano (νοῦς) e também um nous divino. Isso ele achava um dualismo absurdo. O Eterno Filho, ou Logos, tomava o lugar do nous (pneuma) humano. Dois seres perfeitos não podem se tornar um só. Acreditava na definição da Divindade de Cristo, de conformidade com o Credo de Nicéia, mas sustentava que Jesus, como homem, teria espírito, alma e corpo. Acrescentar a essa Pessoa a divindade completa do Filho resultaria num ser de quatro partes – uma monstruosidade. Para ele, a solução era esta: O Logos, representando a divindade total do Filho, substituiu o espírito humano no homem Jesus. Kelly acentua que Apolinário deixa claro seu pensamento nas seguintes considerações: “A carne, por depender de algum outro princípio de movimento e ação (qualquer que seja este princípio) para se movimentar, não é por si só uma entidade viva completa, mas, a fim de se tornar uma, entra em fusão com alguma outra coisa. Dessa maneira, ela se uniu ao princípio celestial governante [isto é, o Logos] e fundiu-se com ele. Assim, a partir do movimento do motor, foi composta uma única entidade viva – não duas entidades, nem uma única composta de dois princípios completos e automáticos”. Assim, para Apolinário há uma única vida; uma perfeita fusão do homem (carne) com o divino, sendo a carne de Jesus glorificada pelo Logos, daí falar ele de “carne de Deus”, “natureza encarnada da Palavra divina”. As ideias de Apolinário foram rejeitadas pelos líderes da igreja na época. Eles perceberam que não era só o nosso corpo humano que necessitava de salvação e ser representado por Cristo na sua obra redentora, mas também nossa mente, nosso espírito e nossa alma. Cristo tinha de ser plena e verdadeiramente humano para nos salvar (Hb 2.14-17). A conexão soteriológica. Conquanto a solução ontológica de Apolinário parecesse resolver a questão acerca da identidade de Jesus, como na controvérsia ariana o problema soteriológico se tornou o teste para sua aceitação. Além de sua tendência docetista, a opinião apolinarista foi também criticada por não refletir corretamente o ponto de vista
  • 12. 12 cristão de que Jesus é o portador da salvação. A ideia era a de que aquilo que o Logos não assumiu na encarnação, neste caso o “espírito”, o Logos não podia redimir. O ponto de vista foi explicitamente declarado por Gregório de Nazianzo como segue: “Se alguém pôs nele a sua confiança como um homem sem uma mente humana, ele mesmo está desprovido de mente e indigno da salvação. Porque o que ele não assumiu ele não curou; é o que está unido à sua divindade que é salvo”. O ponto de vista de Apolinário foi rejeitado no Segundo Concílio Ecumênico (em Constantinopla, 381 d.C.), confirmando a posição nicena. OS NESTORIANOS Os nestorianos eram seguidores de Nestor (ou Nestório), bispo de Constantinopla. Nestor fazia objeção à frase: “Mãe de Deus” (THEOTOKOS – θεοτόκος) e ensinava que Maria devia ser chamada Christotokos – Χριστοτόκος, que significa “quem deu Cristo à luz”. Negava a verdadeira união das naturezas humana e divina em Cristo, afirmando ou dando a entender uma personalidade dupla em Cristo. O Logos habitava no homem Cristo Jesus, de maneira que a união entre as duas naturezas era algo parecido com a habitação do Espírito Santo. Nestório, tentando refutar o eutiquianismo, ensinava que Jesus Cristo era constituído de duas pessoas e de duas naturezas. Sustentava que cada uma das duas naturezas de Jesus tinha sua própria subsistência e personalidade; a união entre elas não era ontológica, mas apenas moral, simpática e afetiva. A conexão soteriológica. O ponto de vista de Nestório foi rejeitado no Terceiro Concílio Ecumênico reunido em Éfeso em 431 d.C. como dividindo Jesus em duas pessoas. Todavia, a subentendida dimensão soteriológica é significativamente notada por Grenz: No fundamento da posição nestoriana jaz outra heresia, a antropologia desenvolvida por Pelágio. Segundo a opinião teológica antagônica de Agostinho, a pessoa humana é dotada por ocasião do nascimento de graça suficiente para reforçar a vontade humana em sua batalha contra o pecado, o qual, por sua vez, não é uma condição do ser mas jaz inteiramente na ação humana. Devido a esse dom, o indivíduo poderia teoricamente atingir a perfeição. Nestório viu essa perfectível substância humana revelada em Jesus. O homem Jesus empregou a dotação natural da graça sem falhar. Este exercício de sua livre vontade efetuou a união voluntária entre Jesus e o Logos. Os ensinos de Nestor foram rejeitados pelo Concílio de Éfeso (431) e de Calcedônia (451). Cirilo de Alexandria foi o principal oponente de Nestor. Ele foi mandado para um mosteiro em Antioquia, depois exilado (435/436) na distante cidade de Petra, na Arábia, e finalmente foi para o oásis de Upper, no Egito, onde passaria o resto de seus dias. O nestorianismo permaneceu na Pérsia, onde seus seguidores estabeleceram um eficiente trabalho missionário que permitiu sua proliferação na Arábia, Índia, Turquestão e China, espalhando-se por diversas regiões da Ásia. Ainda hoje sobrevive o nestorianismo (Caldeus Uniatos) na Mesopotâmia, Pérsia e Síria, havendo um grupo alinhado com a Igreja de Roma e outro independente (Igreja Nestoriana Não unida).
  • 13. 13 OS EUTIQUIANOS Os eutiquianos eram seguidores de Êutico. Êutico desenvolveu o que é chamado de a heresia monofisista. O termo grego monophysite vem de monophysis, que quer dizer “uma natureza ou substância”. Êutico argumentava que Cristo é uma pessoa com uma natureza. Ele atacou a ideia de que Jesus é uma pessoa com duas naturezas, uma divina e outra humana. O eutiquianismo começou com asseveração de que o corpo de Jesus não era idêntico ao nosso, fora especialmente criado para a missão que veio cumprir. Afirmavam que não havia duas, mas apenas uma natureza em Cristo. Tudo acerca de Cristo era Divino, mesmo Seu corpo. A união das duas naturezas constituiu uma terceira. Por isso foram chamados de monofisitas, porque reduziram as duas naturezas de Cristo a uma só. Jesus após a encarnação passou a ser uma só Pessoa com uma só natureza, uma humanidade deificada, diferente de qualquer outra humanidade. A conexão soteriológica. O que é importante para o propósito deste debate foram as repercussões de Calcedônia com respeito à salvação. Os monotelistas, baseando-se em Calcedônia, concluíram que Jesus tinha somente uma vontade, a saber, a vontade do Logos. Em outras palavras, a obediência de Jesus era o resultado da força impulsora do Logos. Aqui, outra vez, como na controvérsia apolinarista, a Igreja primitiva aplicou o teste soteriológico para rejeitar a posição monotelista, argumentando que “a redenção completa demanda uma completa encarnação, inclusive a concepção de uma vontade humana”. Em 451 d.C., o Concílio de Calcedônia condenou o eutiquianismo declarando que em Cristo há duas naturezas distintas, uma humana e uma divina. ANIPOSTASIA MENTE DIVINA CÉREBRO HUMANO ALMA HUMANA LOGOS CORPO HUMANO Hb 2.14; 10.5; Mt 1.20,22; 2.1,13 A alma humana de Jesus era impessoal. Na união hipostática há uma só personalidade – a do Verbo A Alma do Verbo: Jo 10.11,15,17,18; Mt 26.38; Jo 12.27; Is 53.11,12 O ESPÍRITO HUMANO Mt 27.50; Lc 23.46 JESUS O VERBO DE DEUS ANIPOSTASIA Ap 19.13 ὁ λόγος τοῦ θεοῦ
  • 14. 14 É muito fácil sumariar a doutrina estabelecida por Calcedônia: duas naturezas numa só pessoa. Todavia, como podem duas naturezas constituir uma só Pessoa? Essa dificuldade levou à introdução de um novo termo técnico na Cristologia, anypostasia. O MEDIADOR (Goel) encarnado, o Ser Teantrópico, o Deus-homem, permanece uma Pessoa porque a natureza humana que ele assumiu é “anipostática” ou “impessoal”.1 Jesus tinha espírito, alma e corpo humanos. O Verbo (Logos) encarnou numa natureza humana completa, porém a alma humana de Jesus era impessoal (anipostasia). O primeiro Adão teve o seu corpo formado do pó da terra e o seu espírito originado do sopro de Deus. A alma de Adão surgiu como resultado da entrada do sopro de Deus (Gn 2.7). O Segundo Adão (Cristo) teve o seu corpo formado no ventre da virgem Maria por obra direta do Espírito Santo (Lc 1.34,35; Hb 10.5). Zacarias nos fala que Deus forma o espírito do homem dentro dele (Zc 12.1). Deus formou ou criou um espírito humano para o Filho de Deus encarnado. Todavia não houve um sopro de Deus para o corpo do Segundo Adão, mas as Escrituras nos dizem: “O Verbo se fez carne”; o Logos, a Alma Preexistente do Filho (Is 53.10-12; Jo 10.11,15-17), entrou naquele corpo formado pelo Espírito Santo no ventre da Virgem. Jesus deu a sua vida (alma-psiquê-nefesh) por nós e esta Alma era o Logos, a segunda Pessoa da Trindade, a Alma Preexistente do Filho. O mesmo (O Logos) que disse: “tenho sede” (Jo 19.28), disse também: “Antes que Abraão existisse, eu sou” (Jo 8.58). A união hipostática é a união das naturezas humana e divina na Pessoa única de Jesus. “Há somente uma Pessoa no Mediador (Goel), o Logos Imutável (A Personalidade da Alma Preexistente do Filho). O Logos fornece a base da personalidade de Cristo” (L. Berkhof). Contudo a Pessoa do Mediador após a encarnação passou a ter uma natureza humana. Havia naquele corpo, no ventre de Maria, um cérebro humano que como o nosso acumularia conhecimento humano (Lc 2.52). Enquanto nós temos apenas conhecimento humano acumulado no decorrer da nossa existência; Ele, todavia, além do conhecimento natural possuía a presciência, a qual nunca perdeu, mesmo quando se fez carne. Alguns (como Strong) ao afirmar que Jesus possuía uma alma humana chegam a dizer que esta teria que ser impessoal [anipostasia]. O Logos antes da encarnação nunca possuiu um corpo humano, porém ao encarnar passou a possuir, e mesmo após a sua morte e ressurreição continuou a ter e tê-lo-á para sempre. “Vede as minhas mãos e os meus pés, que sou eu mesmo; tocai-me e vede, pois um espírito não tem carne nem ossos, como vedes que eu tenho. E, dizendo isso, mostrou- lhes as mãos e os pés” (Lc 24.39,40). O corpo humano glorificado de Cristo tornou-se uma revelação a todas hostes angelicais (Sl 24; 1Tm 3.16). Na sua segunda Vinda, diz a Palavra: “E, naquele dia, estarão os seus pés sobre o monte das Oliveiras, que está defronte de Jerusalém para o oriente; e o monte das Oliveiras será fendido pelo meio, para o oriente e para o ocidente, e haverá um vale muito grande; e metade do monte se apartará para o norte, e a outra metade dele, para o sul” (Zc 14.4). 1 MACLEOD, Donald. A Pessoa de Cristo. São Paulo: Cultura Cristã, 2007, p. 215.
  • 15. 15 Ele será reconhecido pelos seus ferimentos (Zc 13.6) e como Filho de Davi assentar-se-á sobre o trono de Davi (Lc 1.32). Tomás de Aquino chegou a afirmar que a Pessoa do Logos tornou-se composta na encarnação, e Sua união com a natureza humana “impediu” esta última de chegar a ter uma personalidade independente. A natureza humana de Cristo recebeu em virtude de sua união com o Logos, a graça da união que lhe comunicou uma dignidade especial, de modo que até se tornou objeto de culto, e recebeu a graça habitual, que mantinha em sua relação com Deus Pai. Segundo a ortodoxia anipostática não houve tempo da alma humana tornar-se uma pessoa independente do Logos. Aí entra o conceito de ANIPOSTASIA. Foi o nosso Parente Remidor (Goel) tão completo quanto nós, passando a possuir um espírito humano (Mt 27.50; Lc 23.46), uma alma humana [impessoal] e também um corpo humano (Hb 2.14; 10.5; Mt 1.20,22; 2.1,13). A Cristologia de Alexandria insistia que, embora o Logos tenha se unido à natureza humana, ele não uniu a um homem. Mesmo após a encarnação, a personalidade do único Mediador (Goel) era a do Logos: “Todos os dizeres contidos nos evangelhos devem ser aludidos a uma única Pessoa, à hipóstase encarnada do Verbo”. Todavia, o uso cristológico do termo exato anhypostatos (ἀνυπόστατος) é surpreendentemente raro no grego da Patrística. Ele parece ocorrer anteriormente a Leôncio de Bizâncio (485-543), e mesmo ele o usou somente para rejeitá-lo como inadequado. Por volta do tempo da Reforma, entretanto, a ideia tinha se tornado um elemento importante na dogmática da ortodoxia. O consenso é expresso por Heppe: “A humanidade assumida pela Pessoa do Logos não é de um homem pessoal, mas uma natureza humana sem subsistência pessoal”.2 Leôncio de Bizâncio contra a Cristologia Alexandrina, rejeitou a ideia da impessoalidade da humanidade de Cristo.3 A Cristologia mais recente tem tendido a ser distintamente crítica à ideia de uma humanidade impessoal. De acordo com R. C. Moberley, por exemplo, “não há e não pode haver tal coisa como uma humanidade impessoal... A natureza humana que não é pessoal não é uma natureza humana”. H. R. Mackintosh assim se expressa: “nenhum significado real poderia ser ligado à “natureza humana” que não seja simplesmente um aspecto da vida concreta de uma pessoa humana”. Esses sentimentos foram endossados por Donald Baillie, que concluiu que poucos teólogos defenderiam a frase “humanidade impessoal” ou hesitariam em falar de Jesus como um homem, “uma pessoa humana”.4 A ANIPOSTASIA negava, primeiramente, a existência autônoma e independente de sua natureza humana. Neste sentido, a anipostasia foi ligada à negação de Cirilo do Adocianismo que ele atribuiu a Nestório. Cristo tomou uma natureza humana, mas ele não tomou um homem. Ele tomou a forma de um servo (Fp 2.7), mas não um servo. Sua natureza humana certamente não existia num relacionamento de Eu-Tu com a sua natureza divina; tal entendimento nos arrastaria para o mais claro Nestorianismo. É muito mais seguro insistir que ele é uma Pessoa divina que, sem “adotar” uma pessoa humana existente, assumiu a nossa natureza humana e entrou na esfera plena das experiências humanas. 2 MACLEOD, Donald. A Pessoa de Cristo. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2007, p. 215,216. 3 OLSON, Roger E. História das Controvérsias na Teologia. São Paulo. Editora Vida, 2004, p. 250. 4 MACLEOD, Donald. Op. Cit., 2007, p. 216.
  • 16. 16 DESIPOSTASIA MENTE DIVINA CÉREBRO HUMANO LOGOS CORPO HUMANO Hb 2.14; 10.5; Mt 1.20,22; 2.1,13 A Alma divina do Logos substitui a alma humana de Jesus. Na união hipostática há uma só personalidade – a do Verbo A Alma do Verbo: Jo 10.11,15,17,18; Mt 26.38; Jo 12.27; Is 53.11,12 O ESPÍRITO HUMANO Mt 27.50; Lc 23.46 JESUS O VERBO DE DEUS DESIPOSTASIA Ap 19.13 ὁ λόγος τοῦ θεοῦ Esta posição é parecida com a Enipostasia. A Enipostasia admite uma alma humana que é hipostatizada na Pessoa do Verbo (Logos). A Desipostasia (Neoapolinarianismo) afirma que Jesus não tinha uma alma humana, mas que a Alma divina do Filho (o Logos) ocupou o lugar desta. Apesar desta posição negar a existência da alma humana em Cristo, mantém, todavia, a unipersonalidade de Jesus Cristo na encarnação. O ponto fraco neste pensamento é a não existência da alma humana, enfraquecendo assim o conceito de uma natureza humana completa em Jesus Cristo. Esta heresia é recente, parece ter surgido no fim do século XX. Logos Verbo Espírito Humano Corpo Humano Alma Humana Impessoal ANIPOSTASIA
  • 17. 17 A desipostasia sustenta a distinção tricótoma entre soma σῶμα (corpo), psiquê ψυχή (alma) e pneuma πνεῦμα (espírito), como sendo três sujeitos ou princípios distintos na constituição do homem, admite que Cristo tem um corpo verdadeiro (soma) e espírito humano (pneuma), mas não uma alma humana (psiquê), ou mente humana (nous - νοῦς). Mas se Jesus, raciocinam eles, tinha (ou tem) duas naturezas completas, devia ter um nous (νοῦς humano e também um nous divino. Isso seria um dualismo absurdo. O Eterno Filho, ou Logos, assume o lugar da alma (psiquê) humana. Dois seres perfeitos não podem se tornar um só. A desipostasia acredita na definição da Divindade de Cristo, de conformidade com o Credo de Nicéia, mas sustenta que Jesus, como homem, tem espírito, alma e corpo, todavia esta alma é a Alma do Verbo. Acrescentar a essa Pessoa a divindade completa do Filho resultaria num ser de quatro partes – uma monstruosidade. Para os desipostáticos, a solução é: O Logos, representa a divindade total do Filho e substituiu a alma humana no homem Jesus. A tricotomia desipostática entende que não há a negação da humanidade de Jesus. ENIPOSTASIA MENTE DIVINA CÉREBRO HUMANO ALMA HUMANA LOGOS CORPO HUMANO Hb 2.14; 10.5; Mt 1.20,22; 2.1,13 A alma humana de Jesus foi hipostatizada no Verbo Eterno Na união hipostática há uma só personalidade – a do Verbo. A Alma do Verbo: Jo 10.11,15,17,18; Mt 26.38; Jo 12.27; Is 53.11,12 O ESPÍRITO HUMANO Mt 27.50; Lc 23.46 JESUS O VERBO DE DEUS ENIPOSTASIA Ap 19.13 ὁ λόγος τοῦ θεοῦ= Todavia, mesmo antes do surgimento da psicologia moderna e da resultante confusão entre pessoa e personalidade, houve suspeita de que a anipostasia não fosse o melhor termo para se aplicar à humanidade de Cristo, porque muitos teólogos preferem falar dela como enipostática. O que é “enipostasia”? Esse termo foi cunhado pela primeira vez por Leôncio de Bizâncio (475-543 d.C.), que na sua juventude aderiu à heresia nestoriana (vamos falar dela mais à frente), mas depois voltou à ortodoxia bíblica. Leôncio de Bizâncio introduziu o termo em sua obra Adversus Nestorianos et Eutychianos, para comunicar a ideia de duas naturezas existindo numa Pessoa. Para a Cristologia, isto significava que as duas naturezas, a divina e a humana, foram hipostatizadas em uma hipóstase do LOGOS. Isso permitiu a Leôncio evitar o erro Nestoriano de duas hipóstases, enquanto ao mesmo tempo contrariava o argumento
  • 18. 18 monofisista5 de que não pode haver algo como uma natureza sem uma pessoa (physis anhypostatos): “A natureza pode somente existir individualmente num indivíduo e, daí, uma natureza sem hipóstases seria uma abstração”. Leôncio combateu essa heresia afirmando que, uma vez que Jesus era verdadeiro homem, Ele tinha um corpo humano e uma alma humana. Caso contrário, sua natureza humana seria incompleta, Ele seria meio homem, logo Jesus, por ter uma alma humana tinha uma autoconsciência humana, mas esta, ressaltou Leôncio, não possuía existência própria. Ela existia apenas no âmbito da união hipostática, isto é, da união perfeita entre a natureza humana e a divina em uma única pessoa, o Cristo. O termo usado por Leôncio para se referir à impossibilidade de a autoconsciência humana de Cristo viver à parte de sua divindade chama-se anipostasia. Já o termo usado para se referir ao fato de o “eu” humano autoconsciente de Cristo se achar presente e real apenas no “eu” divino é enipostasia. No grego, en significa “no ou dentro” (enhypostasia). Já o prefixo grego an de anipostasia (anhypostasia) quer dizer “sem”. “A Fórmula de Calcedônia afirma a existência de uma única hypóstasis que exemplifica as naturezas humana e divina. Essa hypóstasis é identificada como a Pessoa de Cristo”. 6 “A doutrina da enipostasia afirma que natureza humana individual de Cristo – o composto corpo-alma que foi o homem Jesus de Nazaré – não tinha hypóstasis, ou seja, não subsistia em si mesmo, mas se tornou hipostático apenas na união com o logos”. 7 João de Damasco incorporou a palavra e o conceito enipostático em sua Exposição da fé ortodoxa. “A santa Virgem”, ele escreve, “foi envolta pelo Poder e Sabedoria enipostática do Deus altíssimo”. Ele elucida o conceito no restante da Exposição, estando a mais plena afirmação no Livro III, Capítulo IX: 8 Porque a carne de Deus o Verbo não subsistia como uma subsistência além de Deus o Verbo, mas, quando ela veio a existir, tornou-se uma subsistência numa outra, ao invés de uma que tem uma subsistência independente. O motivo não carece de subsistência totalmente, nem ainda há uma outra subsistência introduzida na Trindade. No quinto concílio de Constantinopla em 553, a doutrina de Leôncio de Bizâncio conhecida como Enipostasia foi aceita como ortodoxa. “O Logos eterno, o Filho de Deus, é o sujeito da encarnação”.9 Leôncio argumentou que, embora uma natureza – até mesmo humana – não possa existir sem uma hipóstase, não precisa ter sua própria hipóstase. Ela pode ser “hipostatizada” em outra. Ou seja, para Leôncio, “a natureza humana de Cristo não ficou sem hipóstase, mas se tornou hipostática [personalizada] na Pessoa do Logos”. A 5 Monofisismo. [De mon(o)- + -fisi(o)- + -ismo.] . Substantivo masculino. 1.Doutrina daqueles que admitiam em Jesus Cristo uma só natureza. 6 MORELAND, J. P., CRAIG, William Lane. Filosofia e Cosmovisão Cristã. São Paulo: Editora Vida Nova, 2005, p. 734. 7 MORELAND, J. P., CRAIG, William Lane. Op. Cit., p. 734. 8 MACLEOD, Donald. Op. Cit., p. 217. 9 OLSON, Roger E. História das Controvérsias na Teologia. São Paulo. Editora Vida, 2004, p. 250-254.
  • 19. 19 natureza humana de Cristo – a natureza humana plena e completa – não era anipostática (impessoal), nem propriamente pessoal, mas enipostática, que significa “personalizada na pessoa de outrem”. “Ele tinha uma alma humana. Sem uma alma humana ele não teria sido verdadeiramente humano. Dai a ideia de Apolinário, de que o Logos divino [a alma divina do Filho] entrou num corpo humano, para ficar no lugar da alma, não é adequada. O fato de que Jesus experimentou todas as emoções humanas, tal como raiva, medo, alegria, pesada, e tristeza indica a plena humanidade do Seu homem interior. De particular importância é a realidade da Sua experiência das emoções e as implicações disso para nossa vida emocional. O “Segundo Adão”: Através da sua natureza humana, Jesus Cristo demonstrou e exemplificou o que é o homem vitorioso (Sl 8.4-8). Jesus conquistou o que foi perdido por Adão: em um ambiente perfeito e sem pecado, Adão falhou, mas em um contexto apodrecido pelo pecado, Jesus venceu. Sendo puro, inconquistável, manso e dominante, Jesus revelou o que é o verdadeiro homem segundo o padrão divino. O homem Jesus era plenamente Deus. Além de estabelecer a divindade do Filho como um membro pré-encarnado da Trindade, a encarnação envolve a noção de que o homem Jesus era também plenamente Deus. A maioria dos textos que comprovam a divindade de Cristo da perspectiva do Logos tornando-se encarnado, também estabelece este fato, desde que há uma unidade indivisível entre as duas naturezas de Jesus em só uma pessoa. Entretanto, é útil anotar, que foi o homem Jesus, não só o Logos considerado separadamente, que aceitou a adoração dos discípulos (Lucas 24.52). Foi Jesus como homem, que também era o Filho, que reivindicou divindade (João 8.58)”.10 Na união hipostática a natureza humana de Cristo subsiste, é personalizada e recebe sua existência concreta, na hipóstase de sua natureza divina. “Portanto, a hipóstase em Cristo é a do Verbo eterno e nela subsistem o divino, bem como o humano. É por isso que podemos dizer que há, em Cristo, uma ‘união enipostática’”. Em outras palavras, para Leôncio a natureza humana de Cristo possuía tudo que qualquer outro ser humano possui na sua condição não pecadora (inocência prístina), exceto uma existência pessoal independente da Pessoa do Verbo Divino. Jesus Cristo era e é a eterna Segunda Pessoa da Trindade – O Verbo, o Filho de Deus -, com uma natureza humana e sua própria natureza divina, e é a “Pessoa” das duas naturezas. Jesus certamente teve uma personalidade. “A natureza humana individual – o homem Jesus de Nazaré – não poderia ter existido à parte de sua união com o Logos”. 11 A importância de enypostatos é a natureza humana de Cristo, embora não em si mesma, mas em um indivíduo, é individualizada como natureza humana do Filho de Deus. Nem por um simples instante ela existe como anhypostos ou não pessoal. Como embrião, feto, infante, criança e homem ela é hipostatos [hipostatizada] na Segunda Pessoa da Trindade. A carne é dele. A forma de um servo é dele. A semelhança de homens é dele. A obediência até a morte é dele. Em toda conjuntura, como Barth assinala, tem a ver não com um homem em que Deus mudou a si mesmo, mas com o próprio Deus. Ele é um homem real somente como o Filho de Deus. Ele se tornou homem, e ele é, irrevogável e inalienavelmente, homem. Tudo o que ele é e faz é 10 FERREIRA, Franklin, MYATT, Alan. Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova, 2007, p. 512,513. 11 MORELAND, J. P., CRAIG, William Lane. Op. Cit., p. 736.
  • 20. 20 modificado por sua humanidade tão certamente como por sua divindade. Ele pensa e ama e deseja como homem, tão certamente como ele pensa, ama, e deseja como Deus.12 Ghiorghiu Florovsky também insiste: “não há nenhuma hipóstase humana em Cristo” (Mondin).13 Brunner declara que o mistério da Pessoa de Jesus Cristo consiste em que, naquilo em que nós temos uma pessoa pecaminosa, Ele tem, ou melhor, é a Pessoa divina do Logos.14 No homem há duas substâncias, matéria e espírito, intimamente unidas, sendo que há uma distinção entre espírito e alma. No homem o princípio de unidade, a pessoa, não tem sua sede no corpo, mas na alma. No mediador, no nosso Goel, o princípio de unidade, a pessoa, tem sua sede no Logos, na Alma Preexistente do Filho. Em nós seres humanos a influência da alma sobre o corpo e do corpo sobre a alma é mistério, porém, mistério maior encontramos na encarnação do Verbo de Deus. Tudo que acontece no corpo e na alma é atribuído à pessoa; assim, tudo que se dá nas duas naturezas de Cristo é atribuído à Sua Pessoa (O Logos). A Bíblia diz que Deus não pode ser tentado (Tg 1.13). Mas o Deus Filho após a encarnação foi tentado (Hb 2.18). Tudo isso foi possível porque o Verbo Preexistente tomou posse de um corpo humano. O objeto do nosso culto religioso é o Deus e homem Jesus Cristo, mas a base sobre a qual o adoramos é a Pessoa do Logos. “Não foi o Trino Deus, mas a Segunda Pessoa da Trindade que assumiu a natureza humana. Por essa razão, é melhor dizer que o Verbo se fez carne, do que dizer que Deus se fez homem. Ao mesmo tempo, devemos lembrar que cada uma das Pessoas divinas agiu na encarnação” (Mt 1.20; Lc 1.37; Jo 1.14; At 2,30; Rm 8.3; Gl 4.4; Fp 2.7). Dois pontos adicionais podem ser mencionados em relação com a enipostasia. 1º) Em contraste com o pano de fundo da antropologia bíblica, a suposição da natureza humana em união com o divino não é tão imprópria quanto pode parecer à primeira vista. O homem foi feito à imagem de Deus (Gn 1.27). Como tal ele possui espírito e razão. Como tal também ele possui a capacidade de comunhão com Deus. Essas considerações significam que, em se tornando homem, o Verbo não é identificado com alguma coisa que é uma contradição consigo mesmo. A Natureza humana tem a capacidade de compartilhar do divino (2Pe 1.4), e isso sugere que há na encarnação um elemento de apropriação que não existiria no caso de uma união entre Deus e qualquer outra criatura. 2º) Em segundo lugar, a enipostasia apresenta uma limitação e uma definição de Cristo. Sua humanidade é a de todo homem, mas ele não é todo homem. Ele é o homem Cristo Jesus, e a única humanidade unida a ele hipostaticamente é a sua própria. Ele é o único ser TEANTRÓPICO. A humanidade do nosso Goel foi hipostatizada na Pessoa do Filho (O Logos), não na pessoa do Pai; e a divindade foi unida à humanidade não de todo homem, mas na Pessoa de Jesus Cristo. Segundo a doutrina da união hipostática conforme interpretada e afirmada pelo quinto concílio ecumênico: “embora possamos nos aventurar no processo mental de ver duas naturezas de Cristo na sua realidade, sempre devemos voltar à verdade 12 MACLEOD, Donald. Op. Cit., p. 218. 13 MONDIN, Battista. Os Grandes teólogos do Século Vinte. São Paulo: Edições Paulinas, Vol. 2, 1979-1980, p. 244. 14 BERKHOF, Louis. Teologia Sistemática. Luz Para o Caminho, 1990, p. 314.
  • 21. 21 fundamental de que ele é uma só Pessoa, o Logos que se fez homem, a quem pertencem propriedades tanto divinas como humanas e de quem são as ações e palavras, divinas e humanas, relatadas nas Escrituras”. Lewis S. Chafer na sua Teologia Sistemática (pág. 286) faz a seguinte declaração: “A natureza divina é eterna, mas a natureza humana se originou no tempo. Segue-se, portanto, que a união das duas é por si mesma um evento no tempo, embora se destinasse a continuar para sempre”. 15 Cristo como ser eterno, agindo como o eterno Espírito Pessoal é o arquétipo eterno e original de todas as pessoas racionais finitas. Ele diz em oração ao Pai: “A glória que eu tinha contigo antes que o mundo existisse”. Ele que subsistia imutável na forma exata ou na realidade de Deus (Fp 2.6; Hb 1.3) assumiu aquilo que é humano. Ele foi muito mais que um mero homem. Sua Pessoa Preexistente é agora Teantrópica, Deus-Homem. A expressão, união hipostática, é notavelmente teológica e se aplica apenas a Cristo em quem, como ninguém mais, existe a união de duas naturezas distintas. Jesus é a incomparável Pessoa Teantrópica, o Deus-Homem, o mediador e o notável Parente Remidor (Goel). Embora a Sua Divindade seja eterna, a humanidade foi adquirida no tempo. Portanto, a Pessoa Teantrópica que começou na encarnação permanecerá para sempre. Malquião e bispos reunidos em Antioquia em 268 d.C. puderam dizer: “Reconhecemos entre Sua constituição (do Cristo) e a nossa apenas uma diferença, que admitimos ser muito importante, a saber, que, nEle, o Logos divino é aquilo que o homem interior (ho eso antropos) é em nós”. Com “homem interior”, eles parecem indicar a mente ou alma superior e, substituindo-a pelo Verbo na estrutura do Ser Encarnado, de acordo com este relato, preservar Sua unidade pessoal. Atanásio resume sua posição, dizendo que estamos certos em nossa Teologia se ao mesmo tempo em que distinguimos dois conjuntos de ações que Cristo realiza, respectivamente como Deus e como Deus-feito-homem, também percebemos que esses dois conjuntos procedem de uma mesma única Pessoa – O Verbo. Não existem duas vontades de duas pessoas em Cristo, existem duas vontades em uma única pessoa – O Verbo. Depois de salvos nós passamos a ter duas naturezas: a divina através da habitação do Espírito Santo e infelizmente a natureza pecaminosa continua existindo em nós até a morte física. Temos duas vontades: uma que quer fazer o que agrada a Deus e outra que desagrada a Deus, nem por isso somos duas pessoas. Continuamos sendo unipessoal. Podemos perceber duas vontades no Verbo encarnado. Uma que se manifesta via natureza humana e outra via natureza divina, porém há uma só personalidade que é a do Logos Eterno. 15 CHAFER, Lewis Sperry. Teologia Sistemática. Vol. 1. Imprensa Batista Regular, 1986.
  • 22. 22 MENTE DIVINA CÉREBRO HUMANO ALMA HUMANA LOGOS Alma Divina CORPO HUMANO A mente do Verbo sabe tudo. (Jo 8.58) O cérebro humano acumulava conhecimento Mc 13.32; Lc 2.52 O ESPÍRITO HUMANO Mt 27.50; Lc 23.46 JESUS O VERBO DE DEUS JESUS TEANTRÓPICO Ap 19.13 ὁ λόγος τοῦ θεοῦ Duas naturezas: 1. Divina e 2. Humana Uma só personalidade, a do Verbo. Não existem duas vontades de duas pessoas em Cristo, existem duas vontades em uma única pessoa – O Verbo. O Logos continua sendo aquilo que era; o que aconteceu foi que, por ocasião da encarnação, embora continuasse a existir eternamente na forma de Deus, Ele acrescentou a sua natureza divina a natureza humana. Tanto antes quanto depois da encarnação Ele era a mesma Pessoa, inalterada na essência de Sua deidade. A única diferença era que o Verbo havia-se corporificado. O corpo era o corpo do Verbo, não de algum homem, e, na união, as duas naturezas formaram um único ser concreto (sem esquecer que Ele já era um ser concreto antes da encarnação – possuía pessoalidade). O nosso Emanuel foi um (prósōpon) e não “bipessoal” (diprósōpon - διπρόσωπον). A hipóstase do Verbo era um sujeito metafísico único em Cristo. “As duas naturezas de Cristo estão unidas numa única pessoa” (Hilário). “Cristo é uma só Pessoa de dupla substância; sendo tanto Deus quanto homem. Mediador entre Deus e o homem, Ele reúne ambas as naturezas em unicidade de pessoa” (Agostinho). “Aquele que Se tornou homem na forma de servo é, Aquele que na forma de Deus criou o homem” (Tomo de Leão). “O Logos eterno, o Filho de Deus, é o sujeito da encarnação”.16 Portanto, em Cristo se dá somente um centro hipostático, o Verbo, que ocupa também o lugar da personalidade da alma humana ou a sua alma humana foi hipostatizada (personalizada) pelo Verbo. Este centro é a fonte única da vida do Deus- Homem, nas duas naturezas. O fundamento ontológico desta proposição jaz no fato de que o homem é a imagem de Deus, criado em imitação à Alma do Verbo Eterno. O original (A Pessoa do Verbo) pode ocupar o lugar da cópia (da personalidade da alma humana) na encarnação do Filho de Deus. Ou a alma humana de Cristo foi hipostatizada no Verbo. 16 OLSON, Roger E. História das Controvérsias na Teologia. São Paulo. Editora Vida, 2004, p. 250-254.
  • 23. 23 "As duas naturezas passaram por dois estados - da concepção à morte e da exaltação até hoje. Princípio também frisado pelos reformadores, ele enfatiza o fato de que as duas naturezas de Cristo passaram por dois estados - um da sua concepção no ventre de Maria até a sua ressurreição, e o outro a partir da sua ressurreição e ascensão (At 2.22-36; 2Co 8.9 e Fp 2.5-11). Jesus ressuscitou corporalmente, mas seu corpo, neste novo estado, foi glorificado. O mesmo corpo, mas glorificado".17 Falando novamente sobre seu corpo, podemos afirmar que o Filho de Deus não está confinado à sua humanidade que assumiu. Embora o corpo de Cristo esteja no céu e não habite mais na terra, ainda assim o filho de Deus está na Igreja e em toda parte. A natureza divina está em toda parte em virtude de sua imensidade e sempre tem a humanidade unida a ela. Mas a humanidade não está presente em todos os lugares que a divindade preenche. O Verbo Divino preenche todas as coisas, mas a humanidade hipostaticamente unida à divindade é confinada a seu próprio lugar. A unidade da Pessoa Teantrópica é retida de tal maneira que as propriedades das duas naturezas permanecem distintas, mas não misturadas. Não separamos a divindade da humanidade do Verbo de Deus. A sua humanidade é sustentada na Pessoa do Verbo e sua divindade não é limitada pelo seu corpo humano, pois a divindade do Verbo preenche todas as coisas. As faculdades da divindade do Verbo Eterno aperfeiçoam a natureza humana em vez de destruí-la. É impossível fazer a humanidade coextensiva com a divindade sem torná-la infinita e assim destruí-la. A hipóstase divina do Verbo Eterno não impede que o corpo assumido na encarnação seja um corpo humano. Alguém que está em toda parte não tem para onde ir! A hipóstase divina de Cristo não poderia ascender porque ela é infinita e já teria ocupado tudo. Mas a humanidade de Cristo tinha e tem dimensões fixas e verdadeiramente ascendeu ao céu. At 1.11: "Varões galileus, por que ficais aí olhando para o céu? Esse Jesus, que dentre vós foi elevado para o céu, há de vir assim como para o céu o vistes ir". Este texto é uma referência ao seu corpo. Mt 28.20: "Ensinando-os a observar todas as coisas que eu vos tenho mandado; e eis que eu estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos". Este texto, com certeza, nos fala da sua ubiquidade divina. A divindade do Verbo Eterno faz com seja possível que sua natureza divina esteja em toda parte e ao mesmo tempo habite num corpo humano limitado. Beza afirmou: "A substância do corpo de Cristo estava ausente do céu quando Jesus, no corpo, estava na terra, e agora que ele está no céu, a substância deste corpo está ausente da terra".18 17 https://peregrinodecristo.blogspot.com/2012/01/jesus-100-homem-e-100-deus.html. 18 BARRETT, Matthew. Teologia Reformada.1ª ed. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2017, p. 294
  • 24. 24 RAZÕES BÍBLICAS PARA A POSIÇÃO ORTODOXA TRADICIONAL A posição ortodoxa tradicional — de que Jesus esta geneticamente ligado a Adão por intermédio de Maria — fica demonstrada a partir de vários fatos. Primeiro, Jesus e considerado o “filho de [...] Adão,” que é o primeiro nome da sua árvore genealógica (Lc 3.23, 38). Isto indica, tal qual ocorre com todas as demais pessoas da lista, que Jesus foi um descendente genético de Adão. Segundo, como já foi visto, Jesus foi a “semente da mulher”, ou “nascido de mulher” (cf. G1 4.4), uma expressão que, biblicamente sempre implica ligação genética, a partir de Genesis 3.15 em diante. Na verdade, quando Eva teve o seu primeiro filho (Sete) depois de Caim ter assassinado o seu irmão Abel, a sua afirmação indica que ela esperava que este próprio filho fosse o redentor: “E tornou Adão a conhecer a sua mulher; e ela teve um filho e chamou o seu nome Sete; porque, disse ela, Deus me deu outra semente (σπέρµα - spérma) em lugar de Abel; porquanto Caim o matou.” (Gn 4.25). [spérma - esperma]. Gálatas 3.16-18: 16. Ora, a Abraão e a seu descendente (σπέρματι - spérmati) foram feitas as promessas; não diz: E a seus descendentes (σπέρμασιν - spérmaçin), como falando de muitos, mas como de um só: E a teu descendente (σπέρματι), que é Cristo. 17. E digo isto: Ao testamento anteriormente confirmado por Deus, a lei, que veio quatrocentos e trinta anos depois, não invalida, de forma a tornar inoperante a promessa. 18. Pois se da lei provém a herança, já não provém mais da promessa; mas Deus, pela promessa, a deu gratuitamente a Abraão. Descendente (σπέρµα). Ao pé da letra, o texto original diz “semente”. Tanto em hebraico como em grego, “semente”, quando aplicado a pessoas, é um substantivo coletivo que designa “descendência, descendentes”. Este é o sentido dessa palavra na promessa feita a Abraão em Gn 12.7 (ver também Gn 13.15; 17.2; 22.17-18; 24.7). Seguindo métodos de interpretação que eram usados em seu tempo, Paulo entende essa palavra no sentido singular, como referência a uma só pessoa, o “descendente”, isto é, Cristo. Terceiro, como já foi observado, o corpo humano de Jesus foi “nascido de mulher” (G1 4.4), e não diretamente criado por Deus. A palavra “nascer” (ginomai, no grego) significa “gerar” ou “causar existência.” Isto favorece em muito uma ligação física com Maria, e não uma criação separada no seu ventre. Quarto, Jesus veio dos lombos de Davi (1Reis 8.19), um termo que tem um significado claramente genético. A palavra hebraica para lombos (chalats) significa "separar por puxão,” “descascar,” “arrancar,” ou “entregar.” Todas estas acepções se encaixam com a ideia clássica da existência da uma ligação física (genética) entre a mãe (Maria) e o filho (Jesus). Quinto, Jesus foi o último Adão (e não um novo Adão), um termo que indica sequência ou continuidade. O mesmo é verdade para a comparação íntima entre aquilo que Adão fez e o que Cristo realizou pela humanidade como um todo em Romanos 5.12-
  • 25. 25 21. Na qualidade de primeiro e último, tanto Adão como Cristo permanecem como os cabeças de uma mesma “raça” humana, um para a condenação e o outro para a salvação. Isto também revela uma continuidade física entre Cristo e Adão que não seria possível caso Jesus representasse uma criação especial no ventre de Maria, a qual, por conseguinte, não guardaria qualquer relação genética com ela. Sexto, Jesus era judeu, e como tal, Ele tinha componente genéticos dessa etnia, sendo a “semente” de Abraão (Rm 4.13; Hb 2.14-17). Ele aparentemente tinha uma feição tipicamente judia, pois a mulher no poço de Samaria imediatamente o reconheceu como judeu: “Como, sendo tu judeu, me pedes de beber a mim, que sou mulher samaritana”? (Jo 4.9). Sétimo, uma vez mais, Jesus não poderia ser o mediador (Goel) da raça de Adão se não fosse geneticamente membro dela. A Bíblia, por sua vez, declara que “há um só Deus e um só mediador (Goel) entre Deus e os homens, Jesus Cristo, homem” (1Tm 2.5). Oitavo, o livro de Hebreus afirma que “visto como os filhos participam da carne e do sangue, também ele participou das mesmas coisas, para que, pela morte, aniquilasse o que tinha o império da morte, isto é, o diabo” (2.14). Traduzindo para uma terminologia cientifica moderna, uma amostra de Jesus teria comprovado a sua ligação com Maria. Em suma, Ele era seu parente consanguíneo. Hebreus, ainda, acrescenta: “Pelo que convinha que, em tudo, fosse semelhante aos irmãos, para ser misericordioso e fiel sumo sacerdote naquilo que e de Deus, para expiar os pecados do povo” (2.17). Sucintamente falando, Ele não poderia nos salvar se não fosse, de fato, um de nós. Nono, Jesus tinha carne “humana” (Jo 1.14), o que denota que Ele compartilhava da nossa natureza, salvo a nossa pecaminosidade (Hb 4.15). Na sua encarnação, Ele tomou sobre si a nossa natureza humana, tornando-se um de nós (Fp 2.7). Décimo, Jesus é chamado de homem (1Tm 2.5), e os homens tiveram o seu “primeiro” representante em Adão (1Co 15.47). Isto implica a sua unidade com Adão e, portanto, a sua capacidade de redimir qualquer pessoa que faça parte da sua descendência. Isto não seria possível, caso Jesus não fosse verdadeiramente descendente de Adão. Concluindo, negar a humanidade (1Jo 4.1ss) ou a divindade (Cl 2.8,9) de Cristo se constitui em grave erro doutrinário. Negar a sua ligação genética com Adão é, implícita e logicamente, negar a sua humanidade. Portanto, apesar desta posição se mostrar bastante atraente, ela representa um sério engano. A natureza miraculosa da concepção virginal de Jesus não vem do fato dela ser uma criação direta de um ser humano completamente novo, ex nihilo, mas sim, do fato de Deus ter agido de forma sobrenatural na fertilização de um óvulo no ventre de Maria, dispensando a necessidade natural de um espermatozoide masculino. Qualquer afirmação de que os genes de Maria não estavam em Jesus é uma negação da sua genuína humanidade e, consequentemente, da possibilidade da nossa redenção.
  • 26. 26 Se, como propõe a perspectiva da criação intrauterina, Maria deu a luz ao Senhor Jesus sem que Ele tenha sido seu descendente genético, isto seria o mesmo que afirmarmos que um embrião gerado por pais caucasoides, ao ser implantado no útero de uma mulher negra, fosse considerado, ao nascer, de origem africana. Maria era simplesmente um canal para algo que, geneticamente, era totalmente alheio a ela. O bebe de Maria foi “nascido” dela (G1 4.4), era “semelhante” a ela (Hb 2.17) e, portanto, compartilhava da sua natureza humana, tal qual todos os descendentes físicos compartilham da natureza de suas genitoras. O NASCIMENTO VIRGINAL DE CRISTO O nascimento virginal de Cristo é uma das doutrinas bíblicas fundamentais à fé cristã. Desde as primeiras décadas da história da igreja esta doutrina é sustentada e ensinada pelos Apóstolos e Pais da igreja; cito aqui Inácio de Antioquia: “Oculto dos príncipes deste mundo havia a virgindade de Maria e o seu parto... Dou glória a Jesus Cristo, o Deus que conferiu tal sabedoria a ti; pois tenho percebido no tocante o nosso Senhor, de que Ele pertence verdadeiramente à raça de Davi segundo a carne, mas Filho de Deus por vontade e poder divino, verdadeiramente nascido de uma virgem e batizado por João”. “Nasceu do Espírito Santo e da Virgem Maria”. Jesus é uma pessoa absolutamente única, como verdadeiro Deus e vero homem; a Sua entrada neste mundo foi diferente dos demais homens. Os Evangelistas Mateus e Lucas esclarecem inequivocamente a forma miraculosa do nascimento Virginal de Cristo o qual se harmoniza com tudo que conhecemos e cremos sobre a Sua pessoa e natureza. (Mt 1.18-25; Lc 1.26-38) A polêmica sobre a tradução por “virgem” ou “jovem” do termo hebraico em Is 7.14, em nada afeta o caso, pois é muito claro os textos de Mateus e Lucas citados acima. A seguir apresentarei alguns argumentos sobre a importância do nascimento virginal de Cristo dentro da formação sistemática das doutrinas cristãs: 1. As naturezas de duas vidas (pai e mãe) unidas pela concepção do embrião determinam a natureza do ser gerado por elas. Somente um ser gerado pelo divino e pelo humano pode ser divino e humano. Se Jesus não tivesse nascido de mãe virgem Ele pertenceria à mesma classe dos demais filhos de José e Maria. Mas é justamente o seu parentesco divino e humano, combinados que estabelece a categoria de Sua Pessoa. Se Jesus tivesse tido um pai humano logo Ele seria igual a qualquer um de nós e não teríamos argumentos suficientes para defender tanto a ausência de pecado em Sua natureza, quanto a Sua divindade Pessoal. (Lc 1.35; Hb 2.14). 2. A forma como Jesus entrou na vida humana difere de nós, no que tange o Seu nascimento virginal. A concepção sobrenatural é concordante com o nascimento de uma pessoa sobrenatural, fato que harmoniza com a doutrina da Trindade. Porque se Jesus não é uma pessoa sobrenatural logo não existe a segunda Pessoa da Trindade; e consequentemente não haveria Trindade. Concluímos que caso nos faltasse esse elo doutrinário do nascimento virginal de Jesus Cristo a doutrina da trindade seria questionável. (Is 9.6).
  • 27. 27 3. É de suma importância para doutrina da expiação o respaldo oferecido pela doutrina do Nascimento Virginal de Cristo. Champion faz a seguinte afirmação sobre esse assunto: “Quanto menos vemos da Divindade de Cristo em Seu nascimento sobrenatural, menos vemos dessa Divindade em Sua morte expiatória. Quando perdemos de vista o Cristo histórico dos Evangelhos e a Sua Concepção Miraculosa, conforme ali registrada, nem sombra de divindade resta para efetuar nossa redenção”. Somente um Sumo Sacerdote perfeito, santo e inculpável, com natureza divina e humana poderia fazer uma expiação perfeita pelos pecadores imperfeitos. Hb 8.26-28. Cremos no Nascimento Virginal de Cristo Jesus porque nenhuma objeção foi levantada que fosse suficiente ou concludente. LOGOS ESPÍRITO HUMANO CORPO HUMANO ALMA HUMANA LOGOS DEUS GERA CRISTO A ENCARNAÇÃO DO LOGOS Hb 2.14; 10.5; Zc 12.1 Hb 2.14: Portanto, visto como os filhos são participantes comuns de carne e sangue, também ele semelhantemente participou das mesmas coisas. Hb 10.5: Pelo que, entrando no mundo, diz: Sacrifício e oferta não quiseste, mas um corpo me preparaste.
  • 28. 28 PÓS-LAPSARIANISMO X PRÉ-LAPSARIANISMO 19 O primeiro Adão teve o seu corpo formado do pó da terra e a sua alma originada do sopro de Deus (espírito). A alma de Adão surgiu como resultado da entrada do sopro de Deus (Gn 2.7). O Segundo Adão (Cristo) teve o seu corpo formado no ventre da virgem Maria por obra direta do Espírito Santo (Lc 1.34,35; Hb 10.5). Zacarias nos fala que Deus forma o espírito do homem dentro dele (Zc 12.1). Deus formou ou criou um espírito humano para o Filho de Deus encarnado. Todavia não houve um sopro de Deus para o corpo do Segundo Adão, mas as Escrituras nos dizem: “O Verbo se fez carne”; o Logos, a Alma Preexistente do Filho, entrou naquele corpo formado pelo Espírito Santo no ventre da Virgem. ESPÍRITO PÓ DA TERRA CORPO ESPÍRITO CORPO ALMA DEUS CRIA O HOMEM LOGOS ESPÍRITO HUMANO CORPO HUMANO ALMA HUMANA LOGOS DEUS GERA CRISTO A ENCARNAÇÃO DO LOGOS Hb 2.14; 10.5; Zc 12.1 Hb 2.14: Portanto, visto como os filhos são participantes comuns de carne e sangue, também ele semelhantemente participou das mesmas coisas. Hb 10.5: Pelo que, entrando no mundo, diz: Sacrifício e oferta não quiseste, mas um corpo me preparaste. DEFINIÇÃO DOS TERMOS “NATUREZA” E “PESSOA”. Com vistas à adequada compreensão da doutrina, é necessário saber o sentido exato dos termos “natureza” e “pessoa”, como são empregados neste contexto. O termo “natureza” denota a soma total de todas as qualidades de uma coisa, daquilo que faz uma coisa ser o que é. Uma natureza é uma substância possuída em comum, incluindo todas as qualidades essenciais da referida substância. O termo “pessoa” denota uma substancia completa, dotada de razão e, consequentemente, um sujeito responsável por suas ações. A personalidade não é parte essencial e integrante da natureza mas é, por assim dizer, o término para o qual ela tende. Uma pessoa é uma natureza acrescida de algo, a saber, uma subsistência ou individualidade independente. Pois bem, “o Logos assumiu uma natureza humana não personalizada, que não existia por si mesma”.20 19 Este estudo é um apanhado geral de vários estudos: A natureza humana de Cristo - Pré-lapsariana ou Pós-lapsariana? Pr. Daniel Spencer; A NATUREZA HUMANA DE JESUS (Entrevista Dr. Amin Rodor). http://www.entrevistas.criacionismo.com.br/2010/11/natureza-humana-de-jesus.html; NATUREZA PÓS-LAPSARIANA DE CRISTO. https://bispomoreno.wordpress.com/2018/10/10/o-cristo-pecado/. O HOMEM JESUS. http://www.revistaadventista.com.br/blog/2017/06/09/nosso-perfeito-salvador/. Jesus nasceu com uma natureza pecaminosa?.. http://www.cacp.org.br/jesus-nasceu-com-uma-natureza-pecaminosa/. 20 BERKHOF, Louis. Teologia Sistemática. Luz Para o Caminho, 1990, p. 313.
  • 29. 29 A humanidade criada e decaída A humanidade criada A humanidade decaída Termo latino Livre-arbítrio sim sim liberum arbitrium Liberdade sim não libertas A capacidade de pecar sim sim posse peccare A capacidade de não pecar sim não posse non eccare A incapacidade de não pecar não sim non posse non peccare Cristo não encarnado Cristo encarnado Livre-arbítrio sim É Soberano Liberdade sim É Soberano A capacidade de pecar não Ele poderia pecar? Não A capacidade de não pecar sim Ele poderia não pecar? sim A incapacidade de não pecar não Não Ele não pecaria porque é Deus Há quatro possibilidades relativas ao pecado no ser humano e em Jesus homem: 1. Posso pecar 2. Não posso não pecar 3. Posso não pecar 4. Não posso pecar
  • 30. 30 Para começar cito um texto da internet: "O que é a natureza pecaminosa?"21 Resposta: A natureza pecaminosa é aquele aspecto no homem que o faz rebelde contra Deus. Quando falamos da natureza pecaminosa, referimo-nos ao fato de que temos uma inclinação natural ao pecado; dada a escolha de fazer a vontade de Deus ou a nossa, naturalmente escolheremos fazer a nossa. Prova dessa natureza é abundante. Ninguém tem que ensinar uma criança a mentir ou ser egoísta; em vez disso, temos que nos esforçar para ensinar as crianças a dizer a verdade e colocar os outros em primeiro lugar. O comportamento pecaminoso vem naturalmente. O jornal está cheio de exemplos trágicos da humanidade agindo mal. Onde quer que as pessoas estejam, há problemas. Charles Spurgeon disse: “Como o sal tempera cada gota no Atlântico, o pecado afeta todos os átomos da nossa natureza. Está tão tristemente lá, tão abundantemente lá, que se você não puder detectá-lo, então está enganado”. A Bíblia explica a razão do problema. A humanidade é pecadora, não apenas na teoria ou na prática, mas por natureza. O pecado faz parte da própria fibra do nosso ser. A Bíblia fala da “carne pecaminosa” em Romanos 8.3. É a nossa “natureza terrena” que produz a lista de pecados em Colossenses 3.5. E Romanos 6.6 fala do “corpo do pecado”. A existência de carne e osso que vivemos nesta terra é moldada por nossa natureza pecaminosa e corrupta. O primeiro tópico da Tulip; Depravação Total nos ensina que o ser humano foi atingido em toda a sua natureza (corpo, alma e espírito). A natureza pecaminosa é universal na humanidade. Todos nós temos uma natureza pecaminosa, e ela afeta cada parte do nosso ser. Essa é a doutrina da depravação total, e é bíblica. Todos nós nos desviamos (Isaías 53.6). Paulo admite: “eu, todavia, sou carnal, vendido à escravidão do pecado” (Romanos 7.14). Paulo continua: “de mim mesmo, com a mente, sou escravo da lei de Deus, mas, segundo a carne, da lei do pecado” (Romanos 7.25). Salomão concorda: “Não há homem justo sobre a terra que faça o bem e que não peque” (Eclesiastes 7.20). O apóstolo João talvez ponha a questão da maneira mais franca: “Se dissermos que não temos pecado nenhum, a nós mesmos nos enganamos, e a verdade não está em nós” (1Jo 1.8). Até as crianças têm uma natureza pecaminosa. Davi insiste no fato de que nasceu com o pecado já em ação dentro dele: "Eu nasci na iniquidade, e em pecado me concebeu minha mãe" (Salmos 51.5). Em outra passagem, Davi declara: “Desviam-se os ímpios desde a sua concepção; nascem e já se desencaminham, proferindo mentiras” (Salmo 58.3). De onde veio a natureza pecaminosa? As Escrituras dizem que Deus criou os humanos bons e sem uma natureza pecaminosa: “Criou Deus, pois, o homem à sua imagem, à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou” (Gênesis 1.27). No entanto, Gênesis 3 registra a desobediência de Adão e Eva. Por aquela ação, o pecado entrou em sua natureza. Eles foram imediatamente atingidos por uma sensação de vergonha e inaptidão, e esconderam-se da presença de Deus (Gênesis 3.8). Quando tiveram filhos, a imagem e a semelhança de Adão foram transmitidas aos seus 21 https://www.gotquestions.org/Portugues/natureza-pecaminosa.html.
  • 31. 31 descendentes (Gênesis 5.3). A natureza pecaminosa manifestou-se no início da genealogia: o primeiro filho nascido de Adão e Eva, Caim, tornou-se o primeiro assassino (Gênesis 4.8). De geração em geração, a natureza pecaminosa foi passada para toda a humanidade: “Portanto, assim como por um só homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado, a morte, assim também a morte passou a todos os homens, porque todos pecaram” (Romanos 5.12). Este versículo também apresenta a verdade inquietante de que a natureza do pecado leva inexoravelmente à morte (ver também Romanos 6.23 e Efésios 2.1). Outras consequências da natureza pecaminosa são a hostilidade para com Deus e a ignorância de Sua verdade. Paulo diz: “Por isso, o pendor da carne é inimizade contra Deus, pois não está sujeito à lei de Deus, nem mesmo pode estar. Portanto, os que estão na carne não podem agradar a Deus” (Romanos 8.7-8). Além disso, “o homem natural não aceita as coisas do Espírito de Deus, porque lhe são loucura; e não pode entendê-las, porque elas se discernem espiritualmente” (1 Coríntios 2.14). Há apenas uma pessoa na história do mundo que não tem uma natureza pecaminosa: Jesus Cristo. Seu nascimento virginal permitiu que entrasse em nosso mundo sem ser contaminado pela maldição transmitida por Adão. Jesus então viveu uma vida sem pecado de perfeição absoluta. Ele era “o Santo e o Justo” (Atos 3.14) que “não tinha pecado” (2 Coríntios 5.21). Isso permitiu que Jesus fosse sacrificado na cruz como nosso perfeito substituto, “um cordeiro defeito e sem mácula” (1 Pedro 1.19). João Calvino coloca isso em perspectiva: “Certamente, Cristo é muito mais poderoso para salvar do que Adão foi para arruinar.” É através de Cristo que nascemos de novo. “O que é nascido da carne é carne; e o que é nascido do Espírito é espírito” (João 3.6). Quando nascemos de Adão, herdamos sua natureza pecaminosa; mas quando nascemos de novo em Cristo, herdamos uma nova natureza: “E, assim, se alguém está em Cristo, é nova criatura; as coisas antigas já passaram; eis que se fizeram novas” (2 Coríntios 5.17). Não perdemos a nossa natureza pecaminosa quando recebemos a Cristo. A Bíblia diz que o pecado permanece em nós e que uma luta com essa velha natureza continuará enquanto estivermos neste mundo. Paulo lamentou sua luta pessoal em Romanos 7.15– 25. No entanto, temos ajuda na batalha - ajuda divina. O Espírito de Deus habita em cada crente e fornece o poder de que precisamos para vencer a atração da natureza pecaminosa dentro de nós. “Todo aquele que é nascido de Deus não vive na prática de pecado; pois o que permanece nele é a divina semente; ora, esse não pode viver pecando, porque é nascido de Deus” (1 João 3.9). O plano final de Deus para nós é a santificação total quando virmos Cristo (1 Tessalonicenses 3.13; 1 João 3.2). Através de Sua obra consumada na cruz, Jesus satisfez a ira de Deus contra o pecado e deu aos crentes a vitória sobre sua natureza pecaminosa: “carregando ele mesmo em seu corpo, sobre o madeiro, os nossos pecados, para que nós, mortos para os pecados, vivamos para a justiça” (1 Pedro 2.24). Em Sua ressurreição, Jesus oferece vida a todos os que estão amarrados pela carne corrupta. Aqueles que são nascidos de novo agora têm esta ordem: "Assim também vós considerai-vos mortos para o pecado, mas vivos para Deus, em Cristo Jesus" (Romanos 6.11).
  • 32. 32 PÓS-LAPSARIANISMO E PRÉ-LAPSARIANISMO CRISTOLÓGICO O argumento fundamental para o ponto de vista da “natureza caída” [ou pós- lapsariana] é o de que Jesus de alguma forma assumiu a carne pecaminosa caída sem ser um pecador. Esta opinião baseia-se na premissa de que “uma pessoa nascida com carne pecaminosa não precisa ser um pecador”. Por carne pecaminosa se quer dizer “a condição humana em todos os seus aspectos, conforme afetada pela queda de Adão e Eva”. O grande princípio que serve de base para a posição “caída” é o de que o testemunho dos escritores do Novo Testamento sugere que Jesus não tinha nenhuma vantagem física, emocional ou moral sobre seus contemporâneos. Parece aceitável concluir, partindo da perspectiva dos defensores da “natureza caída”, que tanto quanto diz respeito à humanidade de Jesus, Ele era exatamente semelhante a qualquer ser humano depois de Adão e Eva. Estas convicções fundamentais da posição da “natureza caída” são de natureza ontológica. Mas que possível visão de salvação confere tal ontologia? Exploraremos estes assuntos. O motivo pelo qual estamos escolhendo enfatizar o problema soteriológico, em vez de ontológico, é o de que, em nossa opinião, o primeiro é menos inviável na Bíblia. Ontologicamente somos semelhantes ao nosso Cristo. Soteriologicamente Jesus é extremamente diferente de qualquer ser humano. Rm 8.3: "Porquanto o que era impossível à lei, visto como estava enferma pela carne, Deus, enviando o seu Filho em semelhança (ὁμοιώματι) da carne do pecado, pelo pecado condenou o pecado na carne". Nascido com carne pecaminosa (corpo físico pós-queda) mas não um pecador (sem natureza pecaminosa). Várias passagens escriturísticas são reunidas em apoio à ideia de que Jesus nasceu com carne pecaminosa (carne aqui é sinônimo de corpo - soma). O nascimento virginal de Jesus (Mt 1.16,18-25; Lc 1.26-38; 3.23); sua autodescrição como Filho do homem (Mt 8.20; 24.27); e a analogia Adão/Cristo de Paulo (Rm 5) são usados para apoiar a solidariedade ou unidade de Jesus com a raça humana. Esta solidariedade, MENTE DIVINA CÉREBRO HUMANO ALMA HUMANA LOGOS CORPO HUMANO Hb 2.14; 10.5; Mt 1.20,22; 2.1,13 Jesus não possuía natureza pecaminosa. Ele era semelhante a Adão antes da queda. O seu corpo humano vindo através de Maria era de essência herdada pós queda. A Alma do Verbo: Jo 10.11,15,17,18; Mt 26.38; Jo 12.27; Is 53.11,12 O ESPÍRITO HUMANO Mt 27.50; Lc 23.46 JESUS O VERBO DE DEUS PÓS- LAPSARIANISMO X PRÉ- LAPSARIANISMO
  • 33. 33 porém, é interpretada ontologicamente; portanto, a noção de hereditariedade se destaca nestes argumentos. Desse modo, no que concerne ao nascimento virginal, “Nenhuma evidência bíblica sugere que a corrente de hereditariedade humana foi interrompida entre Maria e Jesus”; além disso, o segundo Adão “é um descendente hereditário, nascido de mulher”. Semelhantemente, passagens-chaves de Hebreus 2 são tratadas nos termos da solidariedade ou unidade ontológica entre Jesus e os seres humanos pós-queda (natureza pós-lapsariana). Assim, “todos vêm de um só…” (v. 11) significa hereditariedade humana comum; “carne e sangue” (v. 14) significa a mesma natureza; e “em seu mais imediato e óbvio sentido, os versos 16-18 parecem afirmar que Cristo assumiu a natureza humana comum a toda a humanidade pós-Queda” (v. 17 semelhante - ὁμοιωθῆναι). Rm 8.3,4: 3. "Porquanto o que era impossível à lei, visto que se achava fraca pela carne, Deus, enviando o seu próprio Filho em semelhança (ὁμοιώματι) da carne do pecado, e por causa do pecado, na carne condenou o pecado. 4. para que a justa exigência da lei se cumprisse em nós, que não andamos segundo a carne, mas segundo o Espírito". Adão era perfeito, todavia esta perfeição não era absoluta, pois pecou e morreu. Se fosse perfeição absoluta não pecaria e nem morreria. O último Adão, Cristo, assumiu um corpo humano sem natureza pecaminosa, porém semelhante a carne pecaminosa, pois morreu na cruz. Se tivesse assumido uma carne pura (físico) não morreria. A encarnação consistiu em tomar uma "carne pecadora", inteiramente semelhante à de todos os pecadores e sintetizando em si todas as carnes pecadoras. Era a condição para que a condenação do pecado pudesse cumprir-se na carne de Cristo, e a vida (zōē) abrir caminho para si. Jesus encarnou para ser o nosso Goel - Parente Remidor. A Igreja primitiva rejeitou a posição monotelista, argumentando que “a redenção completa demanda uma completa encarnação. Aquilo que o Logos não assumiu na encarnação, o Logos não podia redimir. Ele deu seu espírito para resgatar o nosso espírito, ele deu a sua alma para resgatar nossa alma e deu seu corpo para resgatar nosso corpo. As verdades envolvidas neste tema estão prefiguradas no Antigo Testamento: a) A lei que governa aquele que vai remir (Lv 25.25-55); b) O exemplo do Remidor (o livro de Rute); O tipo de redenção é muito simples; mas o antítipo conforme representado por Cristo na cruz é realmente complexo, embora siga implicitamente as mesmas linhas encontradas no tipo. As linhas do tipo são: a) O remidor (Goel) tem de ser um parente (Lv 25.48,49; Rt 3.12,13); b) O remidor tem de ser capaz de remir (Rt 4.4-6; Jr 50.34); c) A redenção é efetuada pelo remidor (Goel), pelo cumprimento das devidas exigências (Lv 25.27). Jesus é o nosso Goel, o nosso Parente Remidor. Três elementos foram perdidos na Queda: A alma, o corpo e a terra, Jesus como Parente Remidor pagou o preço do Resgate – o seu sangue. Assim, hoje já temos a redenção da alma e no dia do arrebatamento teremos a redenção do corpo (Rm 8.19-23). E num futuro próximo, teremos a redenção da terra (Mt 19.28; Ap 5).
  • 34. 34 Cristo é o Parente Remidor – Goel, capaz de pagar o preço – o seu sangue. Ele abrirá os selos da Escritura da Redenção da terra, Ele reinará para todo sempre (Ap 5; 11.15). Como Parente Remidor ele tinha que ser o Cordeiro Imaculado para efetuar a completa redenção. Basicamente, em que consiste a posição pós-queda (pós-lapsariana) em relação à natureza humana de Jesus? Pós-lapsariana significa depois do lapso, depois da queda, da entrada do pecado, registrada em Gênesis 3. Fundamentalmente os defensores da teoria pós-lapsariana insistem que, na encarnação, Jesus assumiu a natureza humana, tanto física como moral e espiritual, com todas as características da humanidade caída. Assim, nesta formulação, Jesus, em termos de forma e essência, foi exatamente como qualquer um de nós – cem por cento igual. Absolutamente em nada diferente de qualquer outra criatura nascida no planeta Terra. A. T. Jones, um dos pioneiros desta noção, escreveu: “Em Sua natureza humana, não há uma partícula de diferença entre Ele [Jesus] e vós” (General Conference Bulletin, 1895, p. 231, 233, 436, citado em G. Knight, From 1888 to Apostasy, p. 136.). O ponto de vista da “natureza não caída” (pré-lapsariana) argumenta primariamente a partir da natureza do pecado. Se o pecado fosse simplesmente uma questão de atos, então seria possível a compreensão de Jesus como nascido com carne pecaminosa, sem, contudo, ser um pecador. Mas partindo da perspectiva da posição da “natureza não caída”, “simplesmente não é verdade que o pecado não está presente até que a pessoa cometa o primeiro ato pecaminoso. Os homens são nascidos pecadores.” Portanto, Jesus não podia ter nascido com carne pecaminosa. A ideia de que Cristo tinha uma natureza humana igual a nossa é importante de ser analisada pois os perfeccionistas alegam que se Cristo tem uma natureza igual à nossa e ele pode viver sem pecar então nós também podemos viver sem pecar imitando a Cristo. Mesmo Cristo sendo 100% humano você e eu não somos iguais a ele. De acordo com a Bíblia Jesus é 100% Deus e 100% humano (Teantrópico). Ele é o único ser teantrópico, isto é, Ele é Deus e homem ao mesmo tempo, e nós somos apenas homens. João 1.1 nos diz que Ele era o Verbo e no verso 14 o Verbo se fez carne. O verbo era Deus e estava com Deus. O verbo refere-se a Jesus. A natureza humana de Cristo é muito diferente da nossa. Vamos ler Lucas 1.35: "Respondeu-lhe o anjo: Virá sobre ti o Espírito Santo, e o poder do Altíssimo te cobrirá com a sua sombra; por isso o que há de nascer será chamado santo, Filho de Deus. Na criação, o homem foi feito à imagem e semelhança divina. Na encarnação, Deus se fez à imagem e semelhança da humanidade. Esse mistério de poder, amor e graça infinitos esconde e revela segredos da Onipotência que só podem ser desvendados à luz das Escrituras. Ao adentrar esse território sagrado, “bem faremos em levar a sério as palavras de Moisés, junto à sarça ardente: ‘Tira a sandália dos pés, porque o lugar em que estás é terra santa’ (Êx 3.5)”. Porém, não devemos recuar desse tema, pois o estudo da
  • 35. 35 encarnação de Cristo é campo frutífero, que recompensará o pesquisador que cavar fundo em busca de verdades ocultas”. No processo de “escavação” dessas preciosas “verdades ocultas”, algumas perguntas desafiam o intérprete da Palavra de Deus: Com qual natureza humana Cristo encarnou? Tinha Ele propensões para o pecado como todos nós? Ou Ele possuía uma natureza moral isenta de tendências para o mal? O tema da natureza humana de Cristo se divide em basicamente dois segmentos: pré-lapsarianismo e pós-lapsarianismo. Os pré-lapsarianos entendem que Jesus encarnou com uma natureza humana semelhante à de Adão antes da queda; portanto, diferente da nossa. O resultado dessa visão é a ênfase em Cristo como nosso substituto no processo da salvação. Os pós-lapsarianos, por sua vez, creem que Jesus encarnou com uma natureza moral semelhante à de Adão depois da queda. Isso o tornaria igual a qualquer ser humano com tendências pecaminosas. Para os pós-lapsarianos, Cristo tinha natureza pecaminosa, mas não era pecador, pelo fato de não ter cometido nenhum ato pecaminoso. Assim, se Cristo não cometeu pecado, mesmo tendo propensões como as nossas, inevitavelmente todo ser humano, para ser salvo, precisa passar no mesmo teste em que Jesus foi aprovado. Ou seja, nesse caso, a salvação depende da obediência humana. Nesse paradigma, a ênfase soteriológica recai sobre o papel de Cristo como modelo de comportamento e no esforço humano em seguir as exigências divinas. A grosso modo, no pré-lapsarianismo, a natureza humana de Cristo é totalmente diferente da nossa; no pós-lapsarianismo, é exatamente igual. Em qual das duas posições está o tesouro da verdade? Só um exame sério e desapaixonado do tema na Bíblia. A Bíblia revela que, do ponto de vista físico, Cristo parecia com a humanidade pós-pecado (Pós-lapsarianismo - 2Co 5.21). As Escrituras evidenciam que o corpo de Cristo, exatamente como o nosso, estava sujeito a necessidades físicas e a suscetibilidades emocionais, como fome (Mt 4.2), sede (Jo 19.28), cansaço (Jo 4.6), dor (Jo 18.22; 19.2,3), angústia (Mt 26.37) e morte (Lc 23.46). Entendemos que Cristo herdou um corpo humano pós-queda, porém sem natureza pecaminosa. O primeiro ponto é que você e eu somos gerados e como Jesus foi gerado é importantíssimo para entendermos até que ponto nós somos semelhantes a Jesus e até que ponto somos diferentes. Você e eu somos resultado da união do óvulo de uma mãe pecadora e do espermatozoide de um pai pecador então nós não temos escapatória, nós somos pecadores desde a concepção. De acordo com salmo 51 verso 5 em pecado me concebeu a minha mãe. Jesus não é o resultado da união do óvulo de uma mulher pecadora e do espermatozoide homem pecador, Jesus é resultado da atuação do Espírito Santo no ventre de Maria. Isaías capítulo 53.1-5: 1. Quem deu crédito à nossa pregação? e a quem se manifestou o braço do Senhor? 2. Pois foi crescendo como renovo perante ele, e como raiz que sai duma terra seca; não tinha formosura nem beleza; e quando olhávamos para ele, nenhuma beleza víamos, para que o desejássemos. 3. Era desprezado, e rejeitado dos homens; homem de dores, e experimentado nos sofrimentos; e, como um de quem os homens escondiam o rosto, era desprezado, e não fizemos dele caso algum. 4. Verdadeiramente ele tomou sobre si as nossas enfermidades, e carregou com as nossas dores; e nós o reputávamos por aflito, ferido de Deus, e oprimido. 5. Mas ele foi ferido
  • 36. 36 por causa das nossas transgressões, e esmagado por causa das nossas iniquidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados. Fisicamente Jesus veio com as características físicas de Adão após a queda, através de Maria, porém moral e espiritualmente veio com as características de Adão antes da queda, isto é, sem natureza pecaminosa, sem inclinação para o pecado. A Bíblia trata a condição natural do homem sob o pecado em termos nada elogiosos (ver Jr 17.9; Sl 51.5; Rm 7.14). No seu âmago, a natureza humana foi corrompida. Desde então, o pecado alcançou o homem holisticamente: espírito, alma e corpo foram afetados e infectados pelo pecado. Com relação ao primeiro Adão, os homens nada receberam dele senão a culpa e a sentença de morte. O egoísmo, profundamente arraigado em nosso ser, nos veio por herança. Embora Jesus não fosse um pecador, como corretamente entendido pelo pós- lapsarianismo, teria Ele sido, realmente, participante da natureza humana corrompida, com tendências, propensões para o pecado e inclinada para o mal? Em segundo lugar, Hebreus 2.14 declara que Jesus participou de carne e sangue. Embora o texto basicamente fale de Jesus participando da natureza humana, por si mesmo não caracteriza exaustivamente a humanidade de Jesus. Se compreendemos a natureza humana de Jesus como uma exata participação ontológica em todos os aspectos da vida humana, como faz a posição da natureza caída, então Ele deve ter experimentado provações e enfrentado tentações da maneira como todos nós. Falando sobre a tentação escreve Tiago: “Cada um é tentado pela sua própria cobiça, quando esta o atrai e seduz” (Tg 1.14). Sobre este ponto, sabemos pelos evangelhos que Jesus não era atraído para o pecado desta maneira. Então ele extrai a implicação ontológica. Neste sentido podemos afirmar que Jesus estava livre da mancha do pecado original, que é proveniente da propensão para o pecado que todos os seres humanos herdam de Adão. Jesus não era atraído para o pecado por um mau desejo inerente dentro de sua natureza humana. Esta conclusão é contrária a Hebreus 4.15, onde se afirma que Jesus foi tentado em todos os pontos como nós somos? Não necessariamente. Hebreus 4.15 simplesmente declara que Jesus foi tentado tal como os seres humanos são tentados. Tinha Jesus que ter a má propensão em sua natureza humana a fim de ser tentado como são os seres humanos? Não, Adão foi tentado humanamente, mas ele não tinha as más propensões quando foi tentado. Em terceiro lugar, o que dizer de Romanos 8.3? "Porquanto o que era impossível à lei, visto como estava enferma pela carne, Deus, enviando o seu Filho em semelhança da carne do pecado, pelo pecado condenou o pecado na carne" (Rm 8.3). É dito que Jesus partilhou de todas as nossas condições. Ostensivamente, isto deve incluir nossa propensão para o pecado, sendo que “da ‘carne’ surgia para Ele as mesmas tentações que para nós”. Aqui, novamente se pensa que isto estaria incorreto em vista do fato de Paulo, que claramente ensinou que Jesus “não conheceu pecado” (2Co 5.21), não dizer que Jesus veio “em carne pecaminosa”, sendo que em sua opinião isto “poderia indicar que havia pecado nele”. Paulo pretende apagar tal inferência com a frase “em semelhança de carne pecaminosa” (ὁμοιώματι σαρκὸς ἁμαρτίας). Deve ser notado que a posição caída também crê que Jesus nunca pecou. Sendo este o caso, parece que eles são capazes de reter esta crença e dizer, ao mesmo tempo, que