As associações empresariais AEP, AIP e CIP reconhecem a necessidade de reduzir o défice público, mas criticam o aumento da carga fiscal sobre famílias e empresas proposto no Orçamento de Estado para 2011. Elas pedem que eventuais desvios sejam corrigidos pelo corte de despesa pública e que os recursos sejam usados para estimular a exportação e apoiar os mais vulneráveis.
1. Posição Conjunta da AEP, AIP e CIP
Sobre a proposta de Orçamento de Estado para 2011
A PROPOSTA de Orçamento do Estado para 2011 apresentada pelo Governo reflecte a necessidade de uma forte
redução do défice público, a concretizar através da tomada de medidas drásticas, tanto do lado das despesas como no
das receitas, que terão, inevitavelmente, um efeito recessivo sobre a economia portuguesa.
A necessidade de medidas tão drásticas não se justifica nem pela conjuntura económica nem pela assunção de metas
mais ambiciosas, mas sim pela imperiosa necessidade de estabilizar as finanças públicas, sem o que poderíamos ter o
corte do financiamento externo à economia portuguesa. Tais medidas têm de ser agora mais pesadas devido a políticas
económicas e, em particular, políticas orçamentais erradas, nas últimas décadas, tudo agravado pela derrapagem da
execução orçamental de 2010, resultante da incapacidade de contenção da despesa corrente primária, que pôs em
causa o cumprimento do objectivo fixado para o défice.
A AEP – Associação Empresarial de Portugal, a AIP – Associação Industrial Portuguesa e a CIP – Confederação da
Indústria Portuguesa reconhecem, contudo, que é imperativo cumprir rigorosamente as metas de consolidação
orçamental a que Portugal se comprometeu, sob pena de, a breve trecho, sofrermos consequências, derivadas do corte
de financiamento externo, ainda mais penalizadoras para a economia e, em particular, para o emprego.
A AEP, a AIP e a CIP constatam que é proposto um contributo substancial da redução da despesa para o reequilíbrio
orçamental. De facto, a redução de mais de 4500 milhões de euros na despesa corrente primária, a concretizar-se, será
algo inédito na economia portuguesa. Ainda que grande parte deste esforço assuma um carácter conjuntural, podendo
ser facilmente reversível a prazo, estão previstas algumas medidas estruturais. Neste aspecto, consideramos que o
anúncio da extinção ou fusão de diversos institutos e outros organismos públicos, se tiver sido resultante da necessária
reflexão, é um sinal positivo, ainda que notoriamente insuficiente, a exigir um estudo e soluções que abranjam a
organização do Governo e das autarquias. Está em causa redefinir a missão e as funções do Estado. Para já, espera-se
que a reorganização prevista, ao incluir a extinção de serviços socialmente inúteis, não afecte o funcionamento das
empresas.
A AEP, a AIP e a CIP reafirmam assim que a sustentabilidade das finanças públicas passa, fundamentalmente, pela
reforma do papel do Estado e, consequentemente, por uma reforma profunda de toda a Administração Pública e do
Sector Empresarial do Estado, incluindo empresas públicas, regionais e municipais. Esperam, por isso, a maior
determinação do Governo e dos partidos do arco democrático neste domínio, até porque uma Reforma para o Século
XXI não se compadece com medidas circunstanciais.
A redução prevista para o défice orçamental resulta ainda, em mais de um terço, do aumento da receita corrente,
implicando um novo e forte aumento da carga fiscal sobre as famílias e as empresas.
Apesar deste aumento se focalizar na tributação indirecta, desejavelmente, com efeitos menos negativos sobre a
competitividade, a proposta de aumento da taxa normal do IVA e, sobretudo, as alterações de taxas aplicáveis a muitos
produtos do sector da alimentação e bebidas e diversas outras medidas penalizam directamente as empresas.
Isto decorre quer do aumento da tributação directa que sobre elas incide, designadamente pelo efeito da limitação da
despesa fiscal, quer do acréscimo de custos que acarretam, a que acresce a retracção do mercado doméstico,
principalmente o que é servido pelas empresas do sector agro alimentar. A AEP, a AIP e a CIP não podem deixar de
deplorar o recurso a este tipo de medidas que, prejudicando a competitividade das empresas, tornarão mais difícil a
recuperação das exportações, do investimento e do emprego.
AO CONTRÁRIO, a AEP, a AIP e a CIP consideram positiva a inclusão neste Orçamento de medidas de estímulo à
recapitalização das empresas, pondo fim à discriminação negativa do recurso ao financiamento por parte dos sócios.
Outras medidas de estímulo às exportações e ao investimento, propostas pela AEP, AIP e CIP em devido tempo, com
um impacto diminuto sobre o défice, deveriam ter sido consideradas, como forma de compatibilizar a consolidação
orçamental com o incentivo à competitividade das empresas, apoiando a recuperação económica baseada no aumento
das exportações.
2. Por outro lado, a assunção de um cenário macroeconómico muito exigente, sobretudo no que se refere à previsão da
redução das importações e do crescimento do produto, torna os riscos inerentes à execução orçamental, ao longo de
2011, particularmente elevados, apesar da previsão das receitas se basear em pressupostos credíveis. A AEP, a AIP e
a CIP registam o optimismo do Governo no que se refere às exportações, o que consideram positivo pelo
reconhecimento que será o sector privado, através das exportações, a ser o real motor do crescimento da economia.
Neste quadro julgamos ser decisivo alterar drasticamente as políticas públicas que favorecem a actual economia dual,
constituída pelo universo das empresas não transaccionáveis, e pelo universo das empresas de bens transaccionáveis,
por quanto na configuração actual se torna mais difícil vencer o desafio da exportação.
POR TUDO ISTO, a AEP, a AIP e a CIP consideram imprescindível que se prevejam mecanismos no sentido de
assegurar que qualquer desvio que se venha a registar na execução do Orçamento seja acomodado do lado da
despesa. É, pois, para nós claro que todo o esforço adicional que eventualmente tenha de ser feito deverá vir da
redução da despesa pública, sendo impensável continuar a corrigir o desequilíbrio orçamental pelo lado das receitas.
FINALMENTE, a AEP, a AIP e a CIP não entendem que o Orçamento do Estado para 2011 continue a persistir na
prossecução de grandes projectos em infra-estruturas incompatíveis com a grave situação financeira que neste
momento o País atravessa.
Os recursos disponíveis deverão ser prioritariamente canalizados para o estímulo aos sectores transaccionáveis com o
consequente aumento da capacidade exportadora e da redução do peso das importações na economia, bem como para
o apoio aos grupos socialmente mais débeis.
A AEP, a AIP e a CIP concluem que existe margem de manobra para melhorar a presente proposta de Orçamento do
Estado para 2011, corrigindo alguns dos seus aspectos mais negativos, mas entendem ser seu dever para com os
portugueses alertar todos os partidos políticos para as graves implicações que a sua não aprovação teria sobre a
confiança dos empresários e dos mercados financeiros na economia portuguesa, com consequências imprevisíveis para
a economia nacional, para a sustentabilidade social, para a própria República e, acima de tudo, para a soberania
nacional.
21-10-2010