1) O documento descreve o contexto histórico-cultural do Rococó e do Neoclassicismo no século XVIII, incluindo o Iluminismo e a Revolução Francesa.
2) Aborda as características da pintura Rococó e Neoclássica, bem como da arquitetura Neoclássica.
3) Discutem-se os "salões" como locais de encontro da elite cultural e artística da época.
1. HCA – Módulo 6: A Cultura do Salão Módulo 6
Dylan Bonnet
A CULTURA DO SALÃO
CONTEXTO HISTÓRICO-CULTURAL
O período em que se inserem o Rococó e o Neoclassicismo pertence ao final da Idade Moderna e ao preliminar da Idade Contemporânea, ou seja, entre o séc. XVIII e inícios do séc. XIX.
O século XVIII pode definir-se sinteticamente como o Século das Luzes. Esta expressão realça aquilo que ficou conhecido como o Iluminismo – as luzes da razão (movimento que defendia o pensamento racional, a liberdade e o progresso científico como único caminho para o bem-estar e a felicidade do Homem.). Os elementos que definem o Iluminismo não constituem, por si só, uma novidade. O que, até então, não era mais do que um objeto de especulação filosófica minoritária, passa a ser difundido, essencialmente nas camadas sociais privilegiadas, nomeadamente na burguesia. A França foi o país que mais eficaz e decisivamente contribuiu para a criação de uma unidade de ressonância da cultura iluminista. O século XVIII foi dominado, principalmente por uma cultura francesa e pela sua língua, principal instrumento de difusão do Iluminismo pelo Mundo.
A criação na América do Norte de um Estado Republicano Federal por via da Revolução dos emigrantes europeus (1783) foi outro dos acontecimentos de maior importância do século XVIII. A França havia seguido com enorme interesse os sucessos da América – o povo americano incarnava o ideal do Iluminismo, “homem da natureza”, guiado pela razão e em luta contra a opressão. Assim, em 1789 marca-se o início da Idade Contemporânea com a Revolução Francesa, que culminou com a Tomada da Bastilha e a Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão. O novo modelo de Estado saído da Revolução não podia ser senão burguês e nele se viriam a centrar todas as prerrogativas da nova classe dominante. O próprio crescimento demográfico e económico contribui para uma rutura social e cultural, com a implementação de novos valores políticos, morais e sociais.
Após a morte de Luís XIV, Versalhes permaneceu como o centro de uma França dominante. Em Versalhes Luís XV, preservou o luxo e o refinamento do seu bisavô, numa época em que os “salões”, promovidos pelas mulheres aristocratas da corte, reuniam a elite cultural e artística onde, por entre jogos galantes de vaidade e sedução, se discutia literatura, filosofia, ciência ou arte, para além de temas mundanos.
No entanto, o fausto os exageros financeiros da corte causaram descontentamento do terceiro estado e filósofos como Montesquieu, Voltaire ou Rousseau denunciaram a imoralidade da monarquia, colocando-se na base da Revolução Francesa, como resposta à cítica social.
Assim os iluministas, que defendiam a razão, o progresso e a fé no Homem, contestando as injustiças sociais, o absolutismo tirânico e a intolerância religiosa, encontraram no lema da Revolução Francesa – “Liberdade, Igualdade, Fraternidade” – o fundamento da sua intervenção. Estes filósofos preconizaram um estado republicano, democrático, laico e burguês, defendendo um mundo fundado no progresso científico, no liberalismo político, na educação do povo, na razão, ética e conhecimento. Estes
O Baloiço, Jean-Honoré Fragonard, 1768
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ideais levaram à progressiva implementação do liberalismo (doutrina política que defendia os direitos e as liberdades individuais, a livre concorrência e a igualdade dos indivíduos perante a lei.)
A sociedade estratificara-se em classe – capitalistas, burgueses e trabalhadores –, num fenómeno a que não era alheia outra grande revolução: a Revolução Industrial, ocorrida nos finais do séc. XVIII.
Após os períodos de agitação política e social (inclusive o rei e a rainha guilhotinados) emerge a figura do general Napoleão Bonaparte, que se fez coroar imperador em 1804 e iniciou um programa de campanhas militares expansionistas, por toda a Europa, destituindo as monarquias absolutistas e difundindo os ideais da Revolução Francesa. Em 1812, Napoleão é obrigado a exilar-se na Ilha Elba, após uma derrota infringida pelos exércitos aliados que ocuparam Paris. Três anos depois, o Imperador forma aquilo a que chamamos de “Governo dos Cem Dias”, precisamente o tempo que decorreu até à Batalha de Waterloo, onde foi definitivamente derrotado pela Coligação dos Aliados.
Pode-se dizer que o Neoclassicismo é o culminar dos ideais Iluministas a partir, aproximadamente de 1750. Abandona-se o Rococó por ser uma arte sensual ligada à classe aristocrática, e cheia de frivolidade. No seu lugar procura-se uma arte que apele não aos sentidos, mas à razão; que não seja superficial, mas com conteúdo moral, sóbrio, sério e objetivo. Como protesto contra a artificialidade e falsidade do Rococó, a Antiguidade apresenta-se aos olhos dos cidadãos do séc. XVIII como um momento idílico em que se havia conseguido manter uma sólida estrutura social baseada na liberdade política e individual e na igualdade entre todos os cidadãos. O Neoclassicismo foi uma arte ao serviço da nova classe social ascendente: a burguesia.
A rápida propagação da arte neoclássica na Europa, a partir de meados do séc. XVIII, deveu-se, em primeiro lugar, à difusão das descobertas arqueológicas de Pompeia e Herculano e ao aparecimento de um número considerável de publicações, assim como da uniformização do ensino académico. As descobertas arqueológicas foram consequência do crescente interesse pelo antigo e da procura de um mercado em ascensão. Porém, ao mesmo tempo, contribuíram para um melhor conhecimento do mundo clássico e determinaram a predileção por certos temas e estilos plásticos. Este estilo neoclássico surge, assim, não só como consequência das descobertas arqueológicas, mas graças à valorização do passado que se fundamentou nas ideias iluministas.
Paris e Roma foram os dois grandes centros de irradiação do Neoclassicismo. A capital francesa era o coração da Revolução e símbolo maior dos ideais de “liberdade, fraternidade e progresso”, e Roma representava a tradição clássica no seu maior esplendor.
O “Salão” passa a incorporar novas finalidades. Destinados, agora, a exibir os trabalhos finais dos alunos da Academia, acabavam por ser pretexto para reunir artistas, colecionadores, críticos de arte e toda a elite cultural da época que assumia os mesmos valores e conceitos estáticos, segundo os padrões do Classicismo. O reconhecimento de um artista passava, agora, pela exposição e avaliação dos seus trabalhos nos salões.
PINTURA DO ROCOCÓ | PINTURA NEOCLÁSSICA
Rococó: A pintura do século XVIII é a que melhor representa a dispersão do estilo Barroco e o início da arte do Iluminismo. Enquanto o Barroco eclodiu em Roma para exprimir os mistérios religiosos, o Rococó foi um movimento parisiense que se desenvolveu no seio da aristocracia galante como um estilo estritamente secular. O Rococó (do francês Rocaille) consistiu num sistema artístico eminentemente ornamental que se afastou de toda a ordem, regularidade e simetria e se aplicou a toda a decoração de interiores, mobiliário e ourivesarias, adotando formas caprichosas vegetais, minerais e animais, mantendo efeitos artificiais, grotescos ou fantasiosos.
Alguns temas aparecem pela primeira vez, como as festas galantes, enquanto os temas tradicionais se valorizam e adquirem um marco distante das soluções do Barroco. Surgem outras temáticas presentes na pintura, como o pastoril (banhistas, refeições
A Consagração do Imperador Napoleão I e a Coroação de Imperatriz Josefina, Jacques-Louis David, 1806-1807
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campestres erotismo dos lugares escondidos, cenas de caça,…); o lúdico (o jogo é uma temática muito desenvolvida nesta época, como cenas de jogos amorosos, dialética entre o desejo e a aparência – Fragonard, Ingres, Boucher); o erotismo (o Rococó faz emergir o trinfo da voluptuosidade, uma ideia do amor e do prazer através da sugestão – o amor galante); o retrato (em França o retrato implica um maior realce das personagens e uma fuga à naturalidade, contrastando com o Barroco, que era mais realista); a paisagem (descobre-se, no séc. XVIII a poesia da paisagem, sendo a paisagem urbana uma novidade deste século e um “cartão de visita” de cada cidade.); a decoração (resume-se, com a decoração, o próprio conceito do Rococó: a pintura decorativa utiliza todas as temáticas citadas).
As novas técnicas e a gama cromática utilizadas foram essenciais no efeito das obras. Surge o pastel e valoriza-se a aguarela. Os tons pasteis também emergem na paleta cromática dos pintores: o colorido sério, solene, o castanho, a púrpura, o azul-escuro e dourado do Barroco são substituídos pelas cores claras. As representações do Rococó fogem do Barroco solene, onde as cores tinham um valor simbólico. Destacam-se na pintura Rococó: Fragonard (O Ferrolho), Chardin (A Raia) e Boucher.
Neoclássico: A recusa da frivolidade e sensualidade da arte rococó é acompanhada do abandono das suas características estilísticas. A nobreza dos novos temas deve ser tratada com um estilo direto e natural, simples e claro, oposto a qualquer deformação. Assim, a arte rococó cede lugar a uma pintura de superfícies planas e contornos firmes. Eliminam-se as composições baseadas nas diagonais, dominando a horizontalidade e a tendência para a apresentação frontal das personagens. Concede-se grande importância à linha, à clareza e vigor do traço, desaparecendo os esfumados e as cores pastel, substituídas por cores nítidas, obtidas através das cores primárias. A pintura Neoclássica apresenta-se principalmente mitológica e daí surgem as alegorias. Do Classicismo greco-romano, os artistas importaram a monumentalidade das obras, as composições simples e equilibradas, o aperfeiçoamento técnico, o desenho rigoroso e linear e um cuidadoso tratamento da luz. A razão guiava. Assim, a reprodução plástica com o único propósito de atingir o ideal clássico de beleza. Destaca-se na pintura Neoclássica Jacques-Louis David, o “artista oficial” da Revolução e o criador da iconografia imperial de Napoleão, da qual se destaca A Consagração do Imperador Napoleão I e a Coroação de Imperatriz Josefina, pintada à escala real. A arte de David é puramente linear, com uma renúncia absoluta aos efeitos pictóricos. Valeu-se de meios artísticos puramente racionais, metódicos e puritanos. David representa desta forma, eximiamente o ideal artístico da sua época: a forma é um veículo, um meio para um fim, sendo totalmente clássico na sua composição frontal, na sua ação concentrada, nas expressões elevadas e nos elementos secundários bem precisos. A luz, a cor e a simplicidade do cenário destacam a cena principal, criando um ambiente límpido. Ingres (O Banho Turco)
ARQUITETURA NEOCLÁSSICA
Os arquitetos neoclássicos têm como orientação estética a predominância do racional sobre os excessos barrocos. A procura de uma arquitetura de pureza primitiva conduz à simplificação: em vez de uma arte resultante da fusão da pintura, escultura e arquitetura, prefere-se uma construção sem ornamentos, que produza efeitos de solidez, solenidade e severidade.
Assim, começa-se a eliminar as extravagâncias do Rococó, desaparecendo as plantas irregulares e as soluções curvas e adotando- se a arquitetura clássica grega, preferencialmente da ordem dórica, por ser considerada a expressão mais pura do ideal arquitetónico. Sublinha-se que o Neoclássico não pratica a cópia da arquitetura clássica, mas sim a sua interpretação aliada aos princípios do iluminismo e à prática construtiva racional segundos as técnicas mais avançadas.
Os edifícios adotam plantas em cruz grega e passam aa transmitir a sensação de grandiosidade e robustez, reforçada pelas suas grandes dimensões (Hospital St.º António no Porto). A “grande arquitetura” que durante o Barroco era representada pelas encomendas monárquicas e da Igreja, a partir da segunda metade do séc. XVIII vê-se suplantada por edifícios públicos que nascem do ideário político, social e cultural do Iluminismo (museus, hospitais, bibliotecas, teatros, prisões etc..).
Destacam-se características formais da arquitetura Neoclássica, tais que:
Horizontalidade dos edifícios;
Balaustradas no lugar do telhado para aumentar a sensação de horizontalidade;
Entablamentos salientes;
Primeiro piso com pedra saliente e/ou de outro tom de cor (aparelho almofadado);
Frontão na fachada principal;
Frontões curvos/triangulares nas janelas;
Grinaldas por entre os pisos.
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URBANISMO POMBALINO
Após o violento terramoto que assolou Lisboa a 1 de novembro de 1755, a capital ficara destroçada. Seguido o desastre, o Marquês de Pombal mobilizou toda a nação para os esforços de reconstrução, celebrizando a expressão “enterrem-se os mortos e cuide-se dos vivos”. Para tal, nomeou o engenheiro militar Manuel da Maia, a quem encarregou de propor soluções para o desastre. As plantas de Eugénio dos Santos e Carlos Mardel ditaram o plano definitivo da cidade. Seguindo os ideais iluministas da época, Lisboa passou a possuir ruas geometricamente organizadas numa malha urbana regularizada e filha da razão, com quarteirões retangulares de prédios de habitação, cujos pisos térreos seriam dedicados ao comércio. As ruas foram, assim, hierarquizadas através da sua largura e em função da sua importância. “Encomendaram-se fachadas em série” que seguiam um modelo quase idêntico, valorizando a evolução industrial. Destas forma, Lisboa passou a possuir um plano urbanístico com as primeiras infraestruturas de saneamento de esgotos, a ter preocupações antissísmicas e providenciar dispositivos de combate a incêndios. A Baixa Pombalina ficou na vanguarda do urbanismo da época.