APELAÇÕES CÍVEIS — AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS — ARTIGO 37, § 6º, DA CF — FLAGRANTE DE TRÁFICO DE DROGAS FORJADO POR SERVIDOR DO MUNICÍPIO NO EXERCÍCIO DA FUNÇÃO — PRISÃO — DANOS MORAIS
COMPROVADOS — QUANTUM INDENIZATÓRIO ARBITRADO
DEVIDAMENTE — ADEQUAÇÃO DOS CONSECTÁRIOS
LEGAIS — DANOS MATERIAIS — DECRÉSCIMO NO
PATRIMÔNIO NÃO DEMONSTRADO — HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS MANTIDOS — RECURSOS DESPROVIDOS E
REMESSA PARCIALMENTE PROVIDA.
Apelação cível. ação de obrigação de fazer cc indenização por danos morais e ...
Apelações cíveis — ação de reparação de danos flagrante forjado
1. Apelação Cível n. 2008.065287-2, da Abelardo Luz
Relator: Des. Cláudio Barreto Dutra
APELAÇÕES CÍVEIS — AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS
— ARTIGO 37, § 6º, DA CF — FLAGRANTE DE TRÁFICO DE
DROGAS FORJADO POR SERVIDOR DO MUNICÍPIO NO
EXERCÍCIO DA FUNÇÃO — PRISÃO — DANOS MORAIS
COMPROVADOS — QUANTUM INDENIZATÓRIO ARBITRADO
DEVIDAMENTE — ADEQUAÇÃO DOS CONSECTÁRIOS
LEGAIS — DANOS MATERIAIS — DECRÉSCIMO NO
PATRIMÔNIO NÃO DEMONSTRADO — HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS MANTIDOS — RECURSOS DESPROVIDOS E
REMESSA PARCIALMENTE PROVIDA.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n.
2008.065287-2, da comarca da Abelardo Luz (Vara Única), em que é apte/apdo
Olides Alberto Sansigolo, e apdo/apte Município de Abelardo Luz:
ACORDAM, em Quarta Câmara de Direito Público, por votação
unânime, rejeitar a preliminar, negar provimento aos recursos e dar parcial provimento
à remessa. Custas legais.
RELATÓRIO
OLIDES ALBERTO SANSIGOLO ajuizou ação indenizatória contra
MUNICÍPIO DE ABELARDO LUZ, sustentando que foi preso em flagrante em
28.12.05 sob o fundamento de que seriam suas 6 (seis) pedras de "crack",
encontradas no interior de seu estabelecimento comercial, tendo sido indiciado pela
prática do crime de tráfico de entorpecentes..
Asseverou que foi denunciado pela prática do referido delito e absolvido,
porque restou comprovado que Gilson Goubert de Souza, chefe da vigilância sanitária
municipal na ocasião, forjou o flagrante colocando as drogas no estabelecimento
comercial do autor com o objetivo de incriminá-lo.
Salientou, ainda, que Gilson foi denunciado por tráfico de drogas e
condenado pelo Tribunal de Justiça.
Requereu a indenização por danos materiais e morais (fls. 02/20).
Citado, o Município apresentou contestação, arguindo, preliminarmente,
a sua ilegitimidade passiva. No mérito, aduziu que o valor pedido a título de danos
2. materiais e morais é exorbitante (fls. 205/214).
A juíza julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial
para condenar o réu ao pagamento de indenização, a título de danos morais, no valor
de r$ 83.000,00 (oitenta e três mil reais); acrescido de juros de mora (1% ao mês), a
contar do evento danoso e de correção monetária (inpc/ibge), a partir do arbitramento.
Tendo em vista que o autor decaiu de parte substancial de seu pedido, condenou-o
ao pagamento de 30% das despesas processuais e de honorários advocatícios, estes
fixados em R$ 830,00. condenou, ainda, o réu ao pagamento de honorários
advocatícios em favor do procurador da autora, fixados em R$ 2.905,00, isentado-o
do pagamento dos 70% restantes das despesas processuais (fls. 253/264).
O autor apelou sustentando a) o aumento do valor fixado a título de
danos morais; b) que o apelado deve ser condenado ao pagamento de danos
materiais, pois contratou advogado para defendê-lo na ação penal; e c) a majoração
do valor arbitrado nos honorários advocatícios (fls. 272/277).
O Município também interpôs recurso de apelação argumentando que o
valor fixado a título de danos morais foi exorbitante (fls. 284/287).
Com as contrarrazões do autor (fls. 292/296) , a douta
Procuradoria-Geral de Justiça deixou de manifestar-se sobre o mérito (fls. 303/305).
VOTO
Inicialmente, necessário historiar os fatos.
O autor ajuizou ação de reparação de danos, informando que foi preso
em flagrante em 28.12.05 sob o fundamento de que seriam suas 6 (seis) pedras de
"crack", encontradas no interior de seu estabelecimento comercial, tendo sido
indiciado pela prática do crime de tráfico de entorpecentes.
O autor foi denunciado pela prática do referido delito (ação penal n.
001.05001561-4) e após 28 (vinte e oito) dias de prisão, foi absolvido, porque restou
comprovado que Gilson Goubert de Souza, chefe da vigilância sanitária municipal na
ocasião, forjou o flagrante colocando as drogas no estabelecimento comercial do
autor com o objetivo de incriminá-lo.
Gilson foi denunciado por tráfico de drogas e condenado pelo Tribunal
de Justiça (ACP n. 2006.039542-6 - fls. 155/189).
Os recursos serão analisados em conjunto com o reexame necessário.
Preliminarmente, não há que se falar em ilegitimidade passiva porque o
autor não fundamentou seus pedidos na prisão ilegal e, sim, no ato ilícito praticado
por preposto do Município de Abelardo Luz.
1. Da responsabilidade civil:
Sobre a responsabilidade civil do Estado, dispõe o artigo 37, § 6º, da
Constituição Federal:
A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de
legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao
seguinte:
[...]
Gabinete Des. Cláudio Barreto Dutra
CFJ
3. § 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras
de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade,
causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos
casos de dolo ou culpa.
Consoante se depreende da leitura do dispositivo supracitado, a
responsabilidade civil por ato de seus agentes, é objetiva, encontrando fundamento
na teoria do risco administrativo. Assim, é dever do Estado indenizar os prejuízos a
que houver dado causa, bastando ao lesado a comprovação do evento danoso e da
ofensa suportada, bem como do nexo entre este e a conduta do agente público.
No caso, o autor foi preso em flagrante, motivo pelo qual teve contra si
instaurado um processo criminal por tráfico de drogas e ficando preso por 28 (vinte e
oito) dias, por possuir em seu estabelecimento comercial 6 (seis) pedras de crack.
Restou comprovada a responsabilidade do preposto do município de
Abelardo Luz pela prática do delito narrado na inicial - flagrante forjado -, questão já
decidida na esfera criminal (fls. 155/189), estando, assim, presente o nexo de
causalidade entre o ato ilícito do servidor e o dano causado.
2. Dos danos morais:
O dano moral decorre do próprio sofrimento dos autor em decorrência
da prisão por causa de flagrante forjado.
No que tange ao quantum indenizatorio a título de danos morais,
doutrina e jurisprudência fixaram entendimento no sentido de que deve ser arbitrado
objetivando servir de lenitivo à dor sofrida pela vítima, sem que isso configure seu
enriquecimento sem causa.
Em razão disso, na ausência de elementos objetivos para a fixação do
valor indenizatório, deve o magistrado considerar a extensão do dano, a culpa do
agente, bem como a condição econômica das partes envolvidas, a fim de arbitrar o
montante devido.
Na hipótese, a fixação da quantia em R$ 83.000,00 (oitenta e três mil
reais) encontra-se adequada, uma vez que suficiente para amenizar os danos
suportados pelo autor.
No que concerne aos consectários legais, merece pequeno reparo em
sede de remessa.
Isso porque, recentemente, o Colendo Grupo de Câmaras de Direito
Público deste Tribunal, ao julgar os Embargos Infringentes n. 2010.029337-6, firmou
posicionamento no sentido de que a verba indenizatória por danos morais deve ser
acrescida de juros moratórios e correção monetária contados a partir da data em que
ocorre o arbitramento do quantum.
Confira-se:
EMBARGOS INFRINGENTES - VOTO VENCIDO O QUAL APLICAVA O DIES
A QUO DE INCIDÊNCIA DOS JUROS MORATÓRIOS, TRATANDO-SE DE AÇÃO
DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS, COMO DA DATA DO ILÍCITO - VOTOS
MAJORITÁRIOS QUE O FAZIAM INCIDIR DESDE A DATA DO ARBITRAMENTO -
PREVALÊNCIA DESTES DEVIDA - DATA ESTA A QUAL A OBRIGAÇÃO SE
TORNOU LÍQUIDA E CERTA - VOTOS MAJORITÁRIOS MANTIDOS - RECURSO
IMPROVIDO.
Gabinete Des. Cláudio Barreto Dutra
CFJ
4. "Em tema de indenização por danos morais, tanto a correção monetária quanto
os juros de mora devem incidir a partir da data da decisão judicial que fixa o valor da
reparação, pois que somente nesse momento temporal a obrigação tornou-se líquida
e certa, não se podendo cogitar da existência de mora do réu-devedor antes de
verificadas estas duas condições, sendo inadequado aplicar-se à espécie a Súmula
54, do Superior Tribunal de Justiça." (AC n. 2009.018696-7, rel. Des. Newton Janke,
de Capinzal).
Assim considerando, caso confirmada a sentença em sede recursal, os juros
moratórios e a correção monetária são devidos desde a data da publicação da
sentença. Diversamente, caso majorado, minorado ou fixado o valor do dano moral
em sede recursal, deverão estes encargos incidir a partir da data do arbitramento
operado pelo novo julgamento. (Rel. Des. Sérgio Roberto Baasch Luz, julgado em
15.09.2010)
Esclarece-se, por fim, que, a partir da vigência do atual Código Civil,
faz-se o uso da Taxa Selic como fator de atualização monetária, englobando ela, os
juros moratórios. Veja-se: ACV. 2010.068662-9, de Criciúma, Rel. Des. Sérgio
Roberto Baasch Luz, Primeira Câmara de Direito Público, julgada em 23.11.2010.
3) Dos danos materiais:
Requer o autor que o réu seja condenado a pagar o valor de R$
18.000,00 (dezoito mil reais), sob o fundamento de que teve que contratar advogado
para defendê-lo em processo criminal, tendo sido estipulado o valor acima citado.
Sem razão, porém.
O autor juntou, para comprovar o alegado, o contrato de prestação de
serviços profissionais (fl. 192).
Contudo, no caso de danos materiais, é imprescindível que se comprove
o efetivo prejuízo da vítima em decorrência da ação ou omissão do agente causador
do dano, sem o qual, não há que se falar em dever de indenizar.
No caso dos autos, inexiste qualquer comprovação acerca do
desembolso do valor acordado, o que seria facilmente evidenciado com a
apresentação de um recibo. Pelo contrário, o apelante alega que o valor não foi
remunerado, não restando demonstrado o decréscimo no seu patrimônio.
Confira-se:
Imprescindível para o reconhecimento do direito do autor aos danos materiais a
prova do decréscimo ocorrido em seu patrimônio (ACV n. 2010.053710-6, de
Biguaçu, Rel. Des. Fernando Carioni, Terceira Câmara de Direito Civil, julgada em
20.10.2010)
Ademais, tal documento foi produzido unilateralmente, não está datado,
bem como o valor pactuado é superior daquele previsto na tabela da OAB.
4) Dos honorários advocatícios:
No que diz respeito aos honorários advocatícios, observa-se que o valor
fixado pelo magistrado - R$ 830,00 (para o autor pagar) e R$ 2.905,00 (para o réu
pagar) -, apresenta-se razoável e em conformidade com o disposto no artigo 20, §§ 3º
e 4º, do Código de Processo Civil.
DECISÃO
Gabinete Des. Cláudio Barreto Dutra
CFJ
5. Ante o exposto, rejeita-se a preliminar, nega-se provimento aos recursos
e dá-se parcial provimento à remessa.
Participaram do julgamento, realizado no dia 24 de fevereiro de 2011, os
Exmos. Des. José Volpato de Souza e Rodrigo Collaço.
Funcionou como representante do Ministério Público o Exmo. Dr.
Antenor Chinato Ribeiro.
Gabinete Des. Cláudio Barreto Dutra
CFJ
6. Florianópolis, 28 de fevereiro de 2011.
Cláudio Barreto Dutra
PRESIDENTE E RELATOR
Gabinete Des. Cláudio Barreto Dutra
CFJ