2. Recebe o nome de Tratado de
Petrópolis o documento firmado entre a
Bolívia e o Brasil a 17 de novembro de
1903. Assinado naquela cidade do
estado do Rio de Janeiro, este tratado
tornou oficial a anexação do atual
estado do Acre ao território brasileiro.
3. Surgimento da questão
Desde a segunda metade do século XIX,
alguns brasileiros, sobretudo nordestinos
fustigados por sucessivas secas em suas áreas
instalam-se na bacia do rio Acre, para se
dedicar à atividade extrativista (leia-se
extração do látex, matéria-prima da
borracha, obtido das seringueiras, árvores
nativas do lugar). Sem conhecer ou se
importar com títulos de propriedade, estes
migrantes começam a ocupar as terras, cuja
maior parte pertencia à Bolívia. As fronteiras
permaneciam inexatas, apesar de
estabelecidas reiteradas vezes por tratados
internacionais.
4. A Bolívia, no entanto, jamais exercera ali
sua soberania. A área entre os rios Javari
e Madeira constava nos mapas locais
como “tierras non descubiertas”.
Habitando em sua grande parte os
altiplanos, os bolivianos não se
mostravam aptos ou mesmo interessados
em tomar posse daquela isolada região
de planície. Como consequencia, as
incursões populacionais nessas áreas não
preocupavam os países vizinhos. Este era
o cenário na região enquanto a
borracha era apenas um item exótico
das exportações amazônicas.
5. A riqueza da borracha
No entanto, as mudanças trazidas
pela Revolução Industrial fizeram com que a
região do Acre atraísse a atenção de governos e
particulares. Mais precisamente, a borracha
começou a ser empregada em larga escala na
indústria, principalmente na fabricação de pneus
de veículos, motocicletas e bicicletas, uma
prática viabilizada pelo processo de
vulcanização inventado por Charles Goodyear
em 1839. Desse modo, torna-se inevitável uma
corrida ao chamado “ouro negro” da Amazônia,
já valorizado graças ao incremento da produção
de calçados e das exigências do maquinário
empregado no processo de industrialização em si.
6. A reação boliviana
Assim, em 1898, as autoridades bolivianas
deixam de lado a indiferença em relação
à ocupação brasileira da fronteira. O que
antes eram “simples escaramuças locais”
envolvendo seringueiros brasileiros e
vizinhos bolivianos toma a forma de
conflito internacional
7. Em 1899 os bolivianos fundam Puerto Alonso, nome
dado em homenagem ao então Presidente Severo
Fernandes Alonso. O governo brasileiro não se
manifesta, buscando uma posição inerte em
relação à questão. Naquele momento,
predominava o entendimento vindo do Tratado de
Ayacucho, de 1867, onde Brasil e Bolívia
entendiam que o Acre era território boliviano. A
falta de reação brasileira era interpretada por
seringalistas e seringueiros como a oficialização da
soberania estrangeira na região, alimentando a
primeira insurreição acreana. Em 1º de maio de
1899, cerca de quinze mil brasileiros, a maioria
residentes na região, sob o comando do
advogado José Carvalho e com o apoio do
governo do Estado do Amazonas, levantaram-se
contra os bolivianos.
8. Os seringueiros se revoltam
A segunda insurreição deu-se em 14 de julho
de 1899, chefiada pelo jornalista espanhol
Luiz Galvez Rodrigues de Arias. Em Puerto
Alonso, já rebatizada Porto Acre, Galvez
hasteia a bandeira acreana, proclamando a
criação do Estado Independente do Acre. As
autoridades federais brasileiras, ainda
buscando preservar o conteúdo do Tratado
de Ayacucho, interpretam o gesto como
uma invasão territorial à Bolívia e enviam
forças para desbaratar o Estado
Independente. Assim, a 15 de março de 1900,
o Brasil promove a transição política,
passando o controle da região à Bolívia.
9. O Bolivian Syndicate
Aparentemente resolvida a questão, eis que
vem à tona a existência de um acordo militar
entre norte-americanos e bolivianos
envolvendo a região, o que
levantou preocupações do governo
brasileiro. Em 1901, a Bolívia, presidida pelo
General José Manuel Pando, estava ansiosa
por se livrar dos problemas de administração
das terras consideradas acreanas pelos
brasileiros. Com isso, elas foram arrendadas a
um sindicato de capitalistas majoritariamente
norte-americanos e ingleses, o Bolivian
Syndicate, que por trinta anos assumiria o
controle total sobre a região, incluindo a
movimentação alfandegária e militar.
10. Para o lado brasileiro, tal acordo
significava uma ameaça às soberanias
tanto da Bolívia quanto do Brasil. As
tentativas diplomáticas do Brasil para
conseguir a anulação do contrato
provocaram a pronta reação das
autoridades governamentais em
Washington e Londres. Em resposta, o
presidente Campos Sales decide fechar o
rio Amazonas e seus afluentes à
navegação, ignorando os protestos dos
EUA, Grã-Bretanha, França e Alemanha.
11. O Barão do Rio Branco assume
Quando a controvérsia em torno do Bolivian
Syndicate acirrou-se, surgiu na cena política
a figura de José Maria da Silva Paranhos, o
Barão do Rio Branco, que havia sido
convidado pelo Presidente Rodrigues Alves a
assumir a pasta do Ministério das Relações
Exteriores e, de imediato estudar o tema
delicado. Rio Branco decidiu interpretar o
Tratado de 1867 ao pé da letra, e declarou o
território do Acre litigioso com relação ao
Brasil e ao Peru, com quem a Bolívia acabara
de firmar um tratado para submetê-lo à
arbitragem da Argentina.
12. O Barão do Rio Branco assume
Quando a controvérsia em torno do
Bolivian Syndicate acirrou-se, surgiu na
cena política a figura de José Maria da
Silva Paranhos, o Barão do Rio Branco, que
havia sido convidado pelo Presidente
Rodrigues Alves a assumir a pasta do
Ministério das Relações Exteriores e, de
imediato estudar o tema delicado. Rio
Branco decidiu interpretar o Tratado de
1867 ao pé da letra, e declarou o território
do Acre litigioso com relação ao Brasil e ao
Peru, com quem a Bolívia acabara de
firmar um tratado para submetê-lo à
arbitragem da Argentina.
13. Com o real intento de forçar a Bolívia a
negociar, o Barão apresentou a proposta
de permuta de territórios ou de compra do
Acre pelo Brasil, que assumiria o
compromisso de acertar-se com o Bolivian
Syndicate. Ambas as propostas foram
rechaçadas pela Bolívia, que se fiava no
apoio norte-americano.
14. Brasileiros contra bolivianos
Enquanto isso, no Acre, o gaúcho Plácido de
Castro inicia um movimento armado contra a
Bolívia, pela posse da região. As tropas
bolivianas são derrotadas, e é proclamada,
pela terceira e última vez, o Estado
Independente do Acre, o
que soluciona militarmente o litígio. O
presidente boliviano, General Pando,
percebendo que não poderia manter o
controle sobre o Acre, busca finalmente o
entendimento diplomático. Em 21 de março de
1903, ele concordou com a ocupação e
administração brasileira na região até a
conclusão dos termos do acordo que
culminaria com o Tratado de Petrópolis,
assinado meses depois.
15. O tratado
Por esse instrumento, ficou acordado que a
Bolívia receberia compensações territoriais
em vários pontos da fronteira com o Brasil. O
governo brasileiro se comprometeria a
construir a Estrada de ferro Madeira-Mamoré,
e preservaria a liberdade de trânsito pela
ferrovia e pelos rios até o oceano Atlântico,
facilitando o escoamento das exportações
bolivianas. Como não havia equivalência
entre as áreas permutadas, estabeleceu-se,
ainda, uma indenização de dois milhões de
libras esterlinas, a ser paga pelo Brasil em
duas parcelas.
16. A Bolívia cederia a parte meridional do
Acre, reconhecidamente boliviana, mas
povoada por brasileiros, e desistiria da
reclamação da outra parte do território
mais ao norte, também ocupada só por
brasileiros. O Bolivian Syndicate aceitou a
rescisão contratual mediante uma
compensação financeira de 114.000,00
libras esterlinas, em distrato assinado em
26 de fevereiro de 1903.
17. O Tratado de Petrópolis praticamente selou
o destino do Acre, que até hoje permanece
como integrante da federação brasileira de
modo praticamente incontroverso. O Peru
seguiria mais alguns anos manifestando-se
diplomaticamente por direitos na região,
mas acabaria chegando a um acordo com
as autoridades brasileiras.