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« As Confissões de Caim » 
A noite chegava devagar, e à minha frente a minha mágoa, que me percorria a alma inteira, por te ter deixado ali assim, sozinha, desprotegida, tão frágil mas ao mesmo tempo tão forte! Os teus cabelos de cor doirada faziam-me lembrar o ouro com que desejava te presentear, até ao fim da minha vida! 
Os teus olhos grandes azuis imensos, faziam-me lembrar o mar, e com isso vinham as recordações dos tempos em que era ainda um menino, que brincava com as pedrinhas reluzentes, e conchas e estrelinhas que se encontravam na areia, lá na ilha onde eu vivia. 
Era um país pequeno aquele mas tão belo, tão perfeito que até me vêm as lágrimas aos olhos cada vez que penso ou que olho para ti. 
Deves estar a perguntar-te porquê que choro ao olhar-te, ou porque fico tão triste cada vez que te vejo! Não tenho nada contar ti, nunca tive, pelo contrário! Mas a verdade é que essa tua beleza, que até a mais grava tristeza consegue enganar é tanta, tão pura, tão frágil, que me faz ter medo, me de me entregar, e depois cair e nunca mais me levantar! 
Sabes? Já tive uma experiência assim quando sai da minha ilha. Desde muito cedo tive de aprender a lidar com as coisas más da vida. 
A minha família era muito pobre, havia dias que nem tinhamos o que comer, e eramos 8 irmãos, vê lá tu! 
A minha mãe nunca tinha trabalhado, deves estar a perguntar a ti mesma porquê, mas naquele tempo era assim, os homens não queriam que as mulheres trabalhassem, machismo dizes tu? Talvez, não sei. 
O que é certo é que as mulheres tinham que ficar em casa a cuidar dos filhos, do marido e a fazer todo o trabalho de um lar! 
O meu pai era um homem bom, eusei que sim, e amava-nos, embora não o demonstra-se, mas tinha-se perdido com a bebida, depois de ter perdido a perna na primeira guerra mundial. 
Acho que esse foi mesmo o motivo que o levou a agarrar-se a essa porcaria, de tal modo que chegava a ter dias que até batia na minha mãe, pela mais pequena coisa que ela pudesse dizer! 
A mim, nunca me tocou!! 
Talvez fosse por eu ser assim, magrinho, franzino, de olhos verde-água, e tão branquinho, tão branquinho, que tal como a minha mãe dizia, quase que parecia um anjo que deus mandou para a alegrar, já que os seus dias eram tão escuros, tão descoloridos e desprovidos de qualquer felicidade, tão tristes... 
No outro dia, quando já estava sóbrio, lá vinha ele agarrar-se a ela, pedindo-lhe desculpa. E ela, bem, ela desculpava-o. Por vezes sentia tal revolta cá dentro que tinha que me agarrar com
todas as minhas forças ao meu amuleto da sorte, não fosse ele tão resistente, até podia partir! 
Naquela altura não entendia o porquê da minha mãezinha, que era tão linda, tão jovem, tão elegante, perdoar sempre o meu pai, que era um bêbado, um brutamontes, uma criaturazinha mesquinha e, da pior espécie! Hoje, percebo porquê! 
Era o AMOR, não fosse o amor que ela nutria por ele tão grande, com certeza há muito que já o teria deixado. 
Talvez te estejas a perguntar como é eu descobrir que era devido ao AMOR, afinal, ainda era eu tão jovem pra falar de algo tão grande! 
Mas a verdade é que mesmo sendo assim tão novo o conheci, naquela linda manhã, em que te vi pela primeira vez! Estavas tu sentada num banquinho de pedra, lá no jardim principal da nossa humilde cidade, a olhar as crianças brincarem, a rirem, a confraternizarem, numa tão grande harmonia que me é impossível de descrever. 
De repente, uma criança suja, de roupas rasgadas e mais magro que a própria magreza, aproximou-se dos outros meninos, que há já uns minutos que a olhavam com desdém. 
Um dos meninos que brincava no parque chegou-se à frente, empurrando a outra criancinha, deitando-a ao chão. 
De imediato esta começou a chorar, e foi ai que me apaixonei por ti! 
Ainda me lembro como se fosse hoje, levantaste-te e dirigiste-te a ela, as outras crianças foram desaparecendo aos poucos, com um sentimento de culpa que só visto, o modo como a olhaste... 
Meu Deus! 
O teu olhar de esperança fez o seu pequeno coração sobressaltar, e encher-se de alegria ao ponto da criança se agarrar a ti de tal modo que era difícil de apartar. 
Acariciaste-lhe os cabelos longos negros, grossos, olhaste bem fundo nos seus olhos verdes e disseste-lhe: - Não tenhas mais medo, agora estás comigo! 
E levaste-o contigo para tua casa, e criaste-o, e deste-lhe um nome, e hoje ele é esse lindo jovem que se encontra mesmo à minha frente! 
Tão perfeitinho, tão robusto! 
E tudo graças a ti. 
Como podia não me apaixonar? 
IMPOSSÍVEL! 
Percebes agora o porquê de te ter deixado sozinha naquele dia? 
Em que me pediste para ficar? 
Tenho medo de me entregar, tal como me entreguei ao meu pai quando ele pediu para me perdoar. 
Sabes? 
É que apesar da revolta eu fi-lo, e a revolta passou a amor, e o amor tornou-se grande, enorme, e tudo o que via à minha frente era ele, e íamos brincar, e íamos pescar, e íamos viajar, e tudo era tão perfeito... 
Até que ele me deixou, partiu lá com a amante, prostituta de luxo dizia-se! E deixou-nos a todos na miséria, e à minha mãe
também, que mais tarde morreu, tal era a sua tristeza! Tinha eu na altura 11 anos. 
Percebes agora porque tenho tanto medo? 
A minha vida nunca foi fácil, a minha infância, se é que lhe posso assim chamar, teve uma duração muito curta, pois como vês, desde muito novo a vida deixou-me sem mãe, sem pai e mais, com 7 irmãos para cuidar! 
Sendo o mais velho, cabia-me a mim! 
Tive de sair da escola, e ir trabalhar, fui para as minas, era o que rendia mais na altura. E só fui para lá porque o dono era grande amigo da minha mãe, senão jamais teria entrado! 
Ganhava bem, mas também trabalhava que me fartava. 
Quando chegava a casa era um alívio, mesmo com os meus irmãos e irmãs a berrar aos meus ouvidos! 
Achava-o belo. 
Detestava as minas como detestava o estupor do meu pai, mas um dia iria-me vingar! 
Cada vez que via um cadáver sair do poço lá em baixo, ou porque tinha havido um derrubamento ou uma explosão, estremecia de medo, e ficava parado, a pensar no que aconteceria se tivesse sido comigo. 
- E os meus irmãozinhos? 
Perguntava. 
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E dai, talvez não, senão... 
Quem iria alimentar os meus irmãos? 
Era eu! 
Oh, que porcaria de vida! 
Não, não podia desistir, por mais que me custasse! 
Passado uns dias, e estando eu já mais conformado com a minha sina, chegou uma carta da senhora Prym, minha ex-professora, dizendo assim: 
Querido Caim: 
Espero que tu e os teus irmãos se encontrem bem e de saúde. Na altura não entendi o porquê de teres saído da escola, sendo tu tão bom aluno, e foi por isso que te deixei de falar! 
Peço-te desculpa. 
Hoje sei da tua situação, como poderia eu adivinhar? 
Afinal, nunca ninguém me disse!! 
Ainda estás a trabalhar nas minas? 
Suponho que sim já que precisas do dinheiro não é? 
Mas não me alargando mais e indo direta ao assunto; Fiquei a saber que vai haver uma vaga aqui na cidade para assistente do bibliotecário. 
Sabes aquele senhor gordo, que mais parece um barril, de grandes bigodes e cabelos cinzentos e grisalhos? Chamam-lhe o “bola de pêlo”? 
Pois é, bom homem, mas a sua idade já não permite que ele suba escada, desça escada para arrumar os livros, nem a sua visão que os olhe, para ver o correto lugar!
Sendo assim ele pôs um anúncio, precisa de um jovem que saiba ler e escrever bem e perceba bem de números e outras coisas assim. 
Ainda não o colocou no jornal da cidade pois devia-me um favor e então disse-lhe para esperar, e falei-lhe em ti! 
Acho que é um desperdício enorme estares ai nas minas, para além de não falar no risco que corres só mesmo por entrar para lá! 
Bem, o que dizes? 
Espero que a tua resposta seja afirmativa e que estes ouvidos, que já não são o que eram hã uns anos atrás, possam ouvir um sim, e estes olhos que já tão mal veem possam ver essa tua carinha de felicidade quando entrares pela minha porta. 
Sem mais nada a tratar, me despeço, na esperança que me procures o mais rapidamente possível. 
A tua professora e amiga: 
Isabella Prym 
O rapaz estava de facto tão excitado, tão extasiado com tal notícia que até se esquecera dos biberões das bebés no fogão, não fosse o irmão dele a alertá-lo! 
- Poça Francisco, o que foi agora? 
Francisco era o irmão mais velho, a seguir a ele, tinha 9 anos. E desde há algum tempo que também vinha a ajudar nas lidas domésticas. 
Afinal não era burrinho nenhum! 
- O que foi? 
O que foi é que te esqueceste dos biberões das meninas ao lume, se não fosse eu a notar a esta hora sabe-se lá o que teria acontecido! 
- Oh meu Deus, que fiz eu? 
Perdoa-me! 
-Fogo, também não precisas de exagerar. 
Não aconteceu nada de grave! 
Calma! 
-Ok, desculpa. 
- Tudo bem , mas afinal o que aconteceu pra te deixar assim nesse estado? 
- Pois, foi uma carta que recebi hoje da senhora Prym! 
- A tua ex-professora? 
- Que tem, que tem? 
- Calma, vou-te contar! 
- Anda la mas é, senão ainda morro de curiosidade! 
- Ai francisco, que tu és demais, haha, disse rindo. 
Bem, é o seguinte, a senhora Prym fez-me uma proposta. 
Pelos vistos parece que o senhor Tom, aquele lá da biblioteca da cidade, sabes? O “bola de pêlo”, está a precisar de um assistente, e então, sendo eu muito bom na leitura, na escrita e na matemática a senhorita lembrou-se de mim! 
- Uii, que boa notícia! 
Já não tínhamos uma assim há muito tempo! 
-Achas que deva aceitar então? 
- Tás louco?
Vai mas é já para lá, antes que ponham outro! 
- E as crianças? 
- Vai! Não te preocupes que eu olho por elas. 
- Obrigado francisco, nunca o esquecerei. 
- Vá, para com essas lamechices vai lá. - Obrigado irmão! 
Nisto dei-lhe um abraço e saí a correr. 
Chegando a casa da senhora Prym, virei-me para ela e disse: - Senhora Prym, infelizmente a minha mãe morreu como sabe, tal como o meu amor, que foi quase todo junto com ela! 
Mas quero que saiba, que se houvesse alguém a quem conceder esse meu “amor perdido”, seria com certeza a si! 
É de muito bom grado que aceito a sua proposta, e obrigado! 
A mulher quase que vibrava, tal era a emoção. 
Virou-se para mim, abraçou-me e disse-me: 
- Filho, óh filho, eu amo-te! 
Obrigada por teres feito esta velha feliz! 
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O senhor Tom já sabia por isso nem disse nada! 
-Jesus! Havia tanto para fazer, mas não me importava, sabes porquê? 
Porque pela primeira vez desde há muito tempo estava feliz! 
-Nossa! 
Que história Caím! 
-É verdade Mariana, e tinha que ta contar para perceberes o porquê de te ter deixado sozinha. - Oh, esquece isso, já passou querido! 
Deves ser muito forte para ter passado por isso tudo e estares aqui assim hoje! 
E todos os teus irmãos estarem bem na vida. 
- Foi difícil sabes? 
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E o teu pai? Nunca mais deu noticias? 
- Deu, escreveu-me uns anos mais tarde, já eu ganhava mais que o presidente de lá do meu sitio, como escritor de teses politico ambientais e livros sobre os direitos humanos e assim! 
-Uau, sempre foste muito esperto não é? 
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Acho que foi isso que me ajudou. 
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Despediram-se de seguida, e foi cada um para sua casa. Mariana ficou a noite toda a pensar em Caím, e na sua triste história bem como na declaração que este lhe havia feito, e Caím em Mariana. 
No outro dia, levantou-se bem cedo, pôs o vestido mais bonito que tinha, bem como as pinturas mais leves e foi ao seu encontro! 
Os seus olhos colaram a ela, mal a viram entrar na editora, Sim, porque ele agora editava livros! 
- Mariana! 
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Caím, passei toda a noite a pensar em ti, quero casar contigo! Amo-te, juro por tudo que há de mais sagrado, posso não ser perfeita, nem estou lá perto, mas prometo amar-te e respeitar-te e ficar a teu lado até aos últimos dias da minha vida! 
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E como alguém um dia me disse, a dor só se ultrapassa salvando uma vida! 
E eu, apesar de poder estragar a dele, não o vou fazer. 
Vou-o poupar, vou-o salvar! 
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Passado uns dias, já estava ele com tudo preparado para se casar com Mariana, tinha chegado ao dia de ir tomar café com o pai. Mariana, tal como dissera foi com ele, a acompanhá-lo e para dar apoio. 
Quando chegou lá, àquele café velho, cheio de gente bronca, ressabiada, viu um velho vagabundo, de faces rosadas, olhos verdes como o mar, cabelos brancos, grisalhos e de imediato reconheceu. Era o seu pai. 
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Mas proíbo-te de fazeres parte da minha. Se até agora vivi sem ti, agora também me desenrasco. 
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E nisto saiu, deixando o pai paralisado, ainda não se acreditando no que acontecera. 
- Estiveste muito bem Caim. Disse mariana! 
- Teve que ser, já estou muito mais aliviado. Agora sim, posso seguir em frente e ser feliz! 
Contigo do meu lado.
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Reza a história que tiveram doze filhos, será? 
Moral da História: Não é à toa que se diz, “Quem espera sempre alcança”, e quem o bem pratica jamais se prejudica! (Mas este já é meu, hehehe). Adeus, e até uma próxima!

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As Confissões de Caim: Uma História de Superar o Medo

  • 1. « As Confissões de Caim » A noite chegava devagar, e à minha frente a minha mágoa, que me percorria a alma inteira, por te ter deixado ali assim, sozinha, desprotegida, tão frágil mas ao mesmo tempo tão forte! Os teus cabelos de cor doirada faziam-me lembrar o ouro com que desejava te presentear, até ao fim da minha vida! Os teus olhos grandes azuis imensos, faziam-me lembrar o mar, e com isso vinham as recordações dos tempos em que era ainda um menino, que brincava com as pedrinhas reluzentes, e conchas e estrelinhas que se encontravam na areia, lá na ilha onde eu vivia. Era um país pequeno aquele mas tão belo, tão perfeito que até me vêm as lágrimas aos olhos cada vez que penso ou que olho para ti. Deves estar a perguntar-te porquê que choro ao olhar-te, ou porque fico tão triste cada vez que te vejo! Não tenho nada contar ti, nunca tive, pelo contrário! Mas a verdade é que essa tua beleza, que até a mais grava tristeza consegue enganar é tanta, tão pura, tão frágil, que me faz ter medo, me de me entregar, e depois cair e nunca mais me levantar! Sabes? Já tive uma experiência assim quando sai da minha ilha. Desde muito cedo tive de aprender a lidar com as coisas más da vida. A minha família era muito pobre, havia dias que nem tinhamos o que comer, e eramos 8 irmãos, vê lá tu! A minha mãe nunca tinha trabalhado, deves estar a perguntar a ti mesma porquê, mas naquele tempo era assim, os homens não queriam que as mulheres trabalhassem, machismo dizes tu? Talvez, não sei. O que é certo é que as mulheres tinham que ficar em casa a cuidar dos filhos, do marido e a fazer todo o trabalho de um lar! O meu pai era um homem bom, eusei que sim, e amava-nos, embora não o demonstra-se, mas tinha-se perdido com a bebida, depois de ter perdido a perna na primeira guerra mundial. Acho que esse foi mesmo o motivo que o levou a agarrar-se a essa porcaria, de tal modo que chegava a ter dias que até batia na minha mãe, pela mais pequena coisa que ela pudesse dizer! A mim, nunca me tocou!! Talvez fosse por eu ser assim, magrinho, franzino, de olhos verde-água, e tão branquinho, tão branquinho, que tal como a minha mãe dizia, quase que parecia um anjo que deus mandou para a alegrar, já que os seus dias eram tão escuros, tão descoloridos e desprovidos de qualquer felicidade, tão tristes... No outro dia, quando já estava sóbrio, lá vinha ele agarrar-se a ela, pedindo-lhe desculpa. E ela, bem, ela desculpava-o. Por vezes sentia tal revolta cá dentro que tinha que me agarrar com
  • 2. todas as minhas forças ao meu amuleto da sorte, não fosse ele tão resistente, até podia partir! Naquela altura não entendia o porquê da minha mãezinha, que era tão linda, tão jovem, tão elegante, perdoar sempre o meu pai, que era um bêbado, um brutamontes, uma criaturazinha mesquinha e, da pior espécie! Hoje, percebo porquê! Era o AMOR, não fosse o amor que ela nutria por ele tão grande, com certeza há muito que já o teria deixado. Talvez te estejas a perguntar como é eu descobrir que era devido ao AMOR, afinal, ainda era eu tão jovem pra falar de algo tão grande! Mas a verdade é que mesmo sendo assim tão novo o conheci, naquela linda manhã, em que te vi pela primeira vez! Estavas tu sentada num banquinho de pedra, lá no jardim principal da nossa humilde cidade, a olhar as crianças brincarem, a rirem, a confraternizarem, numa tão grande harmonia que me é impossível de descrever. De repente, uma criança suja, de roupas rasgadas e mais magro que a própria magreza, aproximou-se dos outros meninos, que há já uns minutos que a olhavam com desdém. Um dos meninos que brincava no parque chegou-se à frente, empurrando a outra criancinha, deitando-a ao chão. De imediato esta começou a chorar, e foi ai que me apaixonei por ti! Ainda me lembro como se fosse hoje, levantaste-te e dirigiste-te a ela, as outras crianças foram desaparecendo aos poucos, com um sentimento de culpa que só visto, o modo como a olhaste... Meu Deus! O teu olhar de esperança fez o seu pequeno coração sobressaltar, e encher-se de alegria ao ponto da criança se agarrar a ti de tal modo que era difícil de apartar. Acariciaste-lhe os cabelos longos negros, grossos, olhaste bem fundo nos seus olhos verdes e disseste-lhe: - Não tenhas mais medo, agora estás comigo! E levaste-o contigo para tua casa, e criaste-o, e deste-lhe um nome, e hoje ele é esse lindo jovem que se encontra mesmo à minha frente! Tão perfeitinho, tão robusto! E tudo graças a ti. Como podia não me apaixonar? IMPOSSÍVEL! Percebes agora o porquê de te ter deixado sozinha naquele dia? Em que me pediste para ficar? Tenho medo de me entregar, tal como me entreguei ao meu pai quando ele pediu para me perdoar. Sabes? É que apesar da revolta eu fi-lo, e a revolta passou a amor, e o amor tornou-se grande, enorme, e tudo o que via à minha frente era ele, e íamos brincar, e íamos pescar, e íamos viajar, e tudo era tão perfeito... Até que ele me deixou, partiu lá com a amante, prostituta de luxo dizia-se! E deixou-nos a todos na miséria, e à minha mãe
  • 3. também, que mais tarde morreu, tal era a sua tristeza! Tinha eu na altura 11 anos. Percebes agora porque tenho tanto medo? A minha vida nunca foi fácil, a minha infância, se é que lhe posso assim chamar, teve uma duração muito curta, pois como vês, desde muito novo a vida deixou-me sem mãe, sem pai e mais, com 7 irmãos para cuidar! Sendo o mais velho, cabia-me a mim! Tive de sair da escola, e ir trabalhar, fui para as minas, era o que rendia mais na altura. E só fui para lá porque o dono era grande amigo da minha mãe, senão jamais teria entrado! Ganhava bem, mas também trabalhava que me fartava. Quando chegava a casa era um alívio, mesmo com os meus irmãos e irmãs a berrar aos meus ouvidos! Achava-o belo. Detestava as minas como detestava o estupor do meu pai, mas um dia iria-me vingar! Cada vez que via um cadáver sair do poço lá em baixo, ou porque tinha havido um derrubamento ou uma explosão, estremecia de medo, e ficava parado, a pensar no que aconteceria se tivesse sido comigo. - E os meus irmãozinhos? Perguntava. Não, já não aguentava mais! Tinha de sair dali o quanto antes. E dai, talvez não, senão... Quem iria alimentar os meus irmãos? Era eu! Oh, que porcaria de vida! Não, não podia desistir, por mais que me custasse! Passado uns dias, e estando eu já mais conformado com a minha sina, chegou uma carta da senhora Prym, minha ex-professora, dizendo assim: Querido Caim: Espero que tu e os teus irmãos se encontrem bem e de saúde. Na altura não entendi o porquê de teres saído da escola, sendo tu tão bom aluno, e foi por isso que te deixei de falar! Peço-te desculpa. Hoje sei da tua situação, como poderia eu adivinhar? Afinal, nunca ninguém me disse!! Ainda estás a trabalhar nas minas? Suponho que sim já que precisas do dinheiro não é? Mas não me alargando mais e indo direta ao assunto; Fiquei a saber que vai haver uma vaga aqui na cidade para assistente do bibliotecário. Sabes aquele senhor gordo, que mais parece um barril, de grandes bigodes e cabelos cinzentos e grisalhos? Chamam-lhe o “bola de pêlo”? Pois é, bom homem, mas a sua idade já não permite que ele suba escada, desça escada para arrumar os livros, nem a sua visão que os olhe, para ver o correto lugar!
  • 4. Sendo assim ele pôs um anúncio, precisa de um jovem que saiba ler e escrever bem e perceba bem de números e outras coisas assim. Ainda não o colocou no jornal da cidade pois devia-me um favor e então disse-lhe para esperar, e falei-lhe em ti! Acho que é um desperdício enorme estares ai nas minas, para além de não falar no risco que corres só mesmo por entrar para lá! Bem, o que dizes? Espero que a tua resposta seja afirmativa e que estes ouvidos, que já não são o que eram hã uns anos atrás, possam ouvir um sim, e estes olhos que já tão mal veem possam ver essa tua carinha de felicidade quando entrares pela minha porta. Sem mais nada a tratar, me despeço, na esperança que me procures o mais rapidamente possível. A tua professora e amiga: Isabella Prym O rapaz estava de facto tão excitado, tão extasiado com tal notícia que até se esquecera dos biberões das bebés no fogão, não fosse o irmão dele a alertá-lo! - Poça Francisco, o que foi agora? Francisco era o irmão mais velho, a seguir a ele, tinha 9 anos. E desde há algum tempo que também vinha a ajudar nas lidas domésticas. Afinal não era burrinho nenhum! - O que foi? O que foi é que te esqueceste dos biberões das meninas ao lume, se não fosse eu a notar a esta hora sabe-se lá o que teria acontecido! - Oh meu Deus, que fiz eu? Perdoa-me! -Fogo, também não precisas de exagerar. Não aconteceu nada de grave! Calma! -Ok, desculpa. - Tudo bem , mas afinal o que aconteceu pra te deixar assim nesse estado? - Pois, foi uma carta que recebi hoje da senhora Prym! - A tua ex-professora? - Que tem, que tem? - Calma, vou-te contar! - Anda la mas é, senão ainda morro de curiosidade! - Ai francisco, que tu és demais, haha, disse rindo. Bem, é o seguinte, a senhora Prym fez-me uma proposta. Pelos vistos parece que o senhor Tom, aquele lá da biblioteca da cidade, sabes? O “bola de pêlo”, está a precisar de um assistente, e então, sendo eu muito bom na leitura, na escrita e na matemática a senhorita lembrou-se de mim! - Uii, que boa notícia! Já não tínhamos uma assim há muito tempo! -Achas que deva aceitar então? - Tás louco?
  • 5. Vai mas é já para lá, antes que ponham outro! - E as crianças? - Vai! Não te preocupes que eu olho por elas. - Obrigado francisco, nunca o esquecerei. - Vá, para com essas lamechices vai lá. - Obrigado irmão! Nisto dei-lhe um abraço e saí a correr. Chegando a casa da senhora Prym, virei-me para ela e disse: - Senhora Prym, infelizmente a minha mãe morreu como sabe, tal como o meu amor, que foi quase todo junto com ela! Mas quero que saiba, que se houvesse alguém a quem conceder esse meu “amor perdido”, seria com certeza a si! É de muito bom grado que aceito a sua proposta, e obrigado! A mulher quase que vibrava, tal era a emoção. Virou-se para mim, abraçou-me e disse-me: - Filho, óh filho, eu amo-te! Obrigada por teres feito esta velha feliz! - De nada, e sai pela porta fora dirigindo-me para a biblioteca. O senhor Tom já sabia por isso nem disse nada! -Jesus! Havia tanto para fazer, mas não me importava, sabes porquê? Porque pela primeira vez desde há muito tempo estava feliz! -Nossa! Que história Caím! -É verdade Mariana, e tinha que ta contar para perceberes o porquê de te ter deixado sozinha. - Oh, esquece isso, já passou querido! Deves ser muito forte para ter passado por isso tudo e estares aqui assim hoje! E todos os teus irmãos estarem bem na vida. - Foi difícil sabes? Mas graças a Deus conseguimos! - Que bom! E o teu pai? Nunca mais deu noticias? - Deu, escreveu-me uns anos mais tarde, já eu ganhava mais que o presidente de lá do meu sitio, como escritor de teses politico ambientais e livros sobre os direitos humanos e assim! -Uau, sempre foste muito esperto não é? - Sim, talvez até demais para a minha idade! Acho que foi isso que me ajudou. - Fico tão contente por ti! Mas o que ele disse? - Quem? - O teu pai, ora! -Ah esse! Pediu-me perdão por tudo. Disse que tinha largado a tal prostituta, Sylvie pelo que me disse. - E tu? -Disse-lhe para ir pastar! -Wow, disseste isso ao teu pai? - Claro, que querias que dissesse? -Nada, nada. - Mas vou tomar café com ele esta semana!
  • 6. - A sério? -Sim. -E que lhe vais dizer? -Depois vês! - Ok. Despediram-se de seguida, e foi cada um para sua casa. Mariana ficou a noite toda a pensar em Caím, e na sua triste história bem como na declaração que este lhe havia feito, e Caím em Mariana. No outro dia, levantou-se bem cedo, pôs o vestido mais bonito que tinha, bem como as pinturas mais leves e foi ao seu encontro! Os seus olhos colaram a ela, mal a viram entrar na editora, Sim, porque ele agora editava livros! - Mariana! A gaguejar disse: -Tátátás tão linda! - Oh, obrigada Caím! És tão querido! - De nada. Ele ainda não tinha recuperado, tal era a beleza que estava à sua frente, quando ela disse: Caím, passei toda a noite a pensar em ti, quero casar contigo! Amo-te, juro por tudo que há de mais sagrado, posso não ser perfeita, nem estou lá perto, mas prometo amar-te e respeitar-te e ficar a teu lado até aos últimos dias da minha vida! Não te vou desiludir nunca, acredita! Caím nem podia acreditar no que ouvia e então disse: -Meu amor, essa foi a coisa mais bonita que me disseram até hoje! E há tanto tempo que a esperava ouvir! Só que pensei que nunca viesse. - Tás a ver? Enganaste-te parvinho. E então, aceitas-me como tua mulher? - Mais que tudo no mundo minha querida! E nisto deram os dois um beijo apaixonado. -Ouve, disse Mariana! Vou contigo ter com o teu pai, sei que deve ser difícil para ti. - Sim, obrigado. - E já decidiste o que vais fazer? - já, vou perdoá-lo! - O quê? Porquê? Porque acho que é a única forma de o ensinar! A vingança não é o caminho. E como alguém um dia me disse, a dor só se ultrapassa salvando uma vida! E eu, apesar de poder estragar a dele, não o vou fazer. Vou-o poupar, vou-o salvar! Penso que é o melhor castigo! - Oh meu amor, és tão sábio! - Não, sou justo!
  • 7. Passado uns dias, já estava ele com tudo preparado para se casar com Mariana, tinha chegado ao dia de ir tomar café com o pai. Mariana, tal como dissera foi com ele, a acompanhá-lo e para dar apoio. Quando chegou lá, àquele café velho, cheio de gente bronca, ressabiada, viu um velho vagabundo, de faces rosadas, olhos verdes como o mar, cabelos brancos, grisalhos e de imediato reconheceu. Era o seu pai. O coração batia-lhe cada vez mais forte, e Mariana apertava-lhe a mão com cada vez mais força! Finalmente ganhou coragem, deu-lhe uma palmada nas costas e disse: -Pai! O velho virou-se e disse: - Filho, meu filho como cresceste, como estás belo! - Deixa-te disso e vamos mas é ao que interessa! -Oh filho, eu nem tenho palavras para justificar o que fiz, se arrependimento matasse, já eu estava... - Pois, pois, pára lá com isso. Farto de lengalengas ando eu. - Mas oh filho eu.. -Nem mas nem meio mas.. Que me queres? -Dizer-te que aceito o castigo que me queres dar. Podes-me matar! - Matar? -Sim, de facto era o que merecias. Afinal, mataste a mãe! -Pára! -Não! Mataste a mãe e mataste-nos a nós por dentro. -Por favor. - Devia mesmo te matar, por tudo o que fizeste. Mas sabes o que vou fazer? Vou perdoar-te! -Perdoar? Disse espantado. -Sim, não olhes assim pra mim! Vou perdoar-te e seguir em frente e casar com a minha linda noiva que está aqui à tua frente. Chama-se Mariana já agora! - Que linda filho! - Sim, mas nunca a vais conhecer. Salvei-te a vida, sim! Não te vou matar! Mas proíbo-te de fazeres parte da minha. Se até agora vivi sem ti, agora também me desenrasco. - Não por favor! - Adeus Pai! Sê feliz! E nisto saiu, deixando o pai paralisado, ainda não se acreditando no que acontecera. - Estiveste muito bem Caim. Disse mariana! - Teve que ser, já estou muito mais aliviado. Agora sim, posso seguir em frente e ser feliz! Contigo do meu lado.
  • 8. - Meu amor! E foi o que aconteceu. Passado dois dias casaram-se, na igreja principal da cidade. Chegaram em dois cavalos brancos e o vestido dela tinha ouro, e foram para uma ilha, bem longe e viveram felizes para sempre! Reza a história que tiveram doze filhos, será? Moral da História: Não é à toa que se diz, “Quem espera sempre alcança”, e quem o bem pratica jamais se prejudica! (Mas este já é meu, hehehe). Adeus, e até uma próxima!