Este documento descreve um caso clínico de icterícia neonatal causada por incompatibilidade sanguínea materno-fetal. O recém-nascido apresentou icterícia zona III aos 18 horas de vida e exames revelaram níveis elevados de bilirrubina indireta e compatibilidade sanguínea negativa entre mãe e filho. O bebê foi submetido a fototerapia e exsanguineotransfusão para tratar a hiperbilirrubinemia causada pela incompatibilidade ABO.
Uso de Células-Tronco Mesenquimais e Oxigenoterapia Hiperbárica
Ictericia neonata l
1. ICTERÍCIA NEONATALICTERÍCIA NEONATAL
Ana Paula Ribeiro Gomes
Juliana Antunes Borba
Cristiana S. Campos
Coordenação: Luciana Sugai
Escola Superior de Ciências da Saúde
HRAS – Internato/Pediatria
Agosto, 2007
www.paulomargotto.com.br
2. ICTERÍCIA DO RNICTERÍCIA DO RN
Metade a 2/3 do total dos RN têm icterícia
visível durante os primeiros dias de vida.
Todos os RN têm bilirrubina plasmática
mais alta do que o adulto.
A bilirrubinemia atinge um pico e
decresce em uma semana.
3. DEFINIÇÃO EDEFINIÇÃO E
ORIGEM DA BILIRRUBINAORIGEM DA BILIRRUBINA
Pigmento amarelo-alaranjado, produto da
degradação da hemoglobina liberada dos
eritrócitos apreendidos pelas células do sistema
retículo-endotelial.
Oxidação do grupo heme e saída do ferro
(hemoxigenase).
Redução da biliverdina até bilirrubina
(biliverdina redutase).
No adulto, 1% da hemoglobina existente é
degradada diariamente. No RN a produção é 2x
superior.
4. ORIGEM DAORIGEM DA
BILIRRUBINABILIRRUBINA
Outras fontes que originam bilirrubina:
1. Destruição de eritrócitos imaturos recém-
formados.
2. Degradação intracorpuscular da
hemoglobina na medusa óssea.
3. Degradação do heme livre no fígado.
4. Destruição de outras proteínas que
contenham o grupo prostético heme
(mioglobina, catalase e peroxidases).
5. TRANSPORTE DATRANSPORTE DA
BILIRRUBINA NO PLASMABILIRRUBINA NO PLASMA
Liberada na forma lipossolúvel, desconjugada
(bilirrubina indireta).
Liga-se principalmente à albumina. Fatores que
interferem com o complexo:
PH
IG
Substâncias presentes no soro(cefalosporinas,
furosemida, ácidos graxos, sulfas)
Desligada da albumina = fração livre ( 1% da BI).
Toxicidade.
6. CAPTAÇÃO E CONJUGAÇÃOCAPTAÇÃO E CONJUGAÇÃO
DA BILIRRUBINADA BILIRRUBINA
Desliga-se da albumina.
Levada pelas ligandinas Y e Z até o
retículo endoplasmático para conjugação.
Combina-se com ácido glicurônico
(glicuroniltransferase) Pigmento
hidrossolúvel e polar ( bilirrubina direta).
7. EXCREÇÃO DAEXCREÇÃO DA
BILIRRUBINABILIRRUBINA
Reduzida à estercobilina / urobilina no
intestino.
Pequena quantidade é hidrolizada à BI (B-
glicuronidase) e reabsorvida pela
circulação entero-hepática.
No RN há diminuição da flora bacteriana
e aumento da B-glicuronidase.
8.
9. METABOLISMO FETALMETABOLISMO FETAL
E NO RECÉM-NASCIDOE NO RECÉM-NASCIDO
Metabolismo fetal
Na vida fetal precoce a BI é transportada ligada à alfa-
feto-proteína (pouca albumina).
BI é excretada pela placenta.
No RN
Diminuição da captação hepática de bilirrubina.
Diminuição da capacidade de conjugação
(glicuroniltransferase).
Meia vida mais curta das hemácias.
Maiores índices hematimétricos.
Exacerbação da circulação entero-hepática
10. OUTROS FATORES ASSOCIADOS AOOUTROS FATORES ASSOCIADOS AO
AUMENTO DA BILIRRUBINA NEONATALAUMENTO DA BILIRRUBINA NEONATAL
Inferência genética (orientais, indígenas Norte-
Americanos e gregos).
Fatores maternos (diabetes, deficiência de Zn e
Mg; uso de ocitocina; diazepam; bupivacaína; e
betametasona).
Fatores perinatais: Hipóxia, clampeamento
tardio do cordão; coleções sangüíneas; jejum;
deprivação calórica; estase meconial.
11. Icterícia neonatalIcterícia neonatal
Mais visível quanto maior o tecido
celular subcutâneo.
Aparente a partir de níveis de 5mg/dl
(zona I)
15 mg/dl: Zona II
A partir de 20mg/dl: Zona V
Progressão crânio-caudal
12. Zonas de KramerZonas de Kramer
RN termo RN Baixo peso
Zona cutânea Bilirrubina (mg/100ml) Bilirrubina (mg/100ml)
Limites Média Limites Média
1 4,3 - 7,8 5,9 (±0,3) 4,1 - 7,5 -
2 5,4 - 12,2 8,9 (±1,7) 5,6 - 12,1 9,4 (±1,9)
3 8,1 - 16,5 11,8 (±1,8) 7,1 - 14,8 11,4 (±2,3)
4 11,1 - 18,3 15,0 (±1,7) 9,3 - 18,4 13,3 (±2,1)
5 15 - 10,5 -
Zonas dérmicas de progressão craniocaudal da icterícia.
-Cabeça e pescoço
-Tronco até umbigo
-Hipogástrico e coxas
-Mãos e pés incluindo palmas e plantas
Adaptado de: Kramer, L.: Advancement of dermal icterus in the jaundiced newborn, Am. J. Dis. Child. , 118:454-458,1969
13. EFEITOS NOCIVOS DAEFEITOS NOCIVOS DA
HIPERBILIRRUBINEMIAHIPERBILIRRUBINEMIA
A bilirrubina indireta pode ser tóxica.
Kernicterus: Impregnação de BI no
cérebro, associada a níveis superiores a 20
mg/dl.
Encefalopatia bilirrubínica: Quadro
clínico neurológico relativo à impregnação
de bilirrubina.
14. FATORES COADJUVANTES NAFATORES COADJUVANTES NA
ENCEFALOPATIAENCEFALOPATIA
Imaturidade.
Hiper-hemólise de qualquer etiologia.
Hipóxia neonatal.
Acidose.
Hipoalbuminemia.
Infecções graves.
Presença de certas drogas ou substâncias
no plasma.
15. CARACTERIZAÇÃO DACARACTERIZAÇÃO DA
ENCEFALOPATIAENCEFALOPATIA
Fase 1: Hipotonia, letargia, má sucção,
choro agudo.
Fase 2: Hipertonia, com tendência a
espasticidade e febre.
Fase 3: Aparente melhora.
Fase 4: Sinais de paralisia cerebral; perda
da audição; distúrbios extra-piramidais; e
mais raramente diminuição do QI.
17. FOTOTERAPIAFOTOTERAPIA
É o tratamento mais utilizado.
Torna a BI mais hidrossolúvel, sendo
eliminada sem conjugação.
Indicações: Levar em consideração as
causas, a idade pós-natal e a concentração
de bilirrubina sérica.
18. Indicação de Fototerapia
RN a termo, saudáveis, sem Doença Hemolítica
RN < 2500g ao nascer c/ 24 h de vida não são saudáveis
Horas de Vida BI
24 – 48 h > 15
> 48 h > 18
19. Indicação de Fototerapia
RN < 2500 g ao nascer
Fototerapia Precoce: RN < 1000g – BI de 5 – 6 mg%
Peso (g) 24-48h 72-96h > 96 h
< 1500g 6 8 8
15001-2000 8 10 10
2001-2500 12 14 14
20. EXSANGÜINEOTRANSFUSÃOEXSANGÜINEOTRANSFUSÃO
Remove parcialmente hemácias
hemolisadas; anticorpos ligados ou não às
hemácias; bilirrubina plasmática.
Diminui rapidamente os níveis séricos de
bilirrubina.
Indicação precoce nos casos em que ocorre
aumento da hemólise.
21. EXSANGÜINEOTRANSFUSÃOEXSANGÜINEOTRANSFUSÃO
IndicaçõesIndicações
BI> 4,5 ou HT < 11mg/dl na vigência de Coombs
direto positivo.
Velocidade de aumento da BI superior a 0,5mg/dl/h
se HT entre 11 e 13 ou superior a 1mg/dl/h.
Elevação importante da BI.
Refratariedade à fototerapia intensiva por 12h.
Sinais de comprometimento neurológico.
Indicações relativas
Reticulocitose
Hemoglobina = 13g/dl e caindo em 24h
RNPT ou com comorbidades neonatais (asfixia perinatal,
hipotermia, hemólise, hipoalbuminemia,, infecções,
hipoglicemia)
22. Indicação de Exsanguineotransfusão
Precoce: - Nascidos até 24 h de vida:
Bilirrubina Indireta > 0,5 mg%/h
Campello (2004)
Horas de Vida BI
< 12 h > 10
< 18 h > 12
< 24 h > 14
23. RN com peso ao nascer < 2500g
De Carvalho (2001), Maisels (2001)
Peso ao Nascer Sem Complicação Com complicação
Gramas Bilirrubina Indireta (mg%) Bilirrubina Indireta (mg%)*
< 1000 g 10 10
1000 – 1249 g 13 10
1250 – 1499 g 15 13
1500 – 1999 g 17 15
2000 – 2499 g 18 17
> 2500 g 22 20
De forma geral, para os RN pré-termos, a ET deve ser realizada
quando a bilirrubina sérica atingir a metade da idade gestacional
(Não realizamos ET com nível de bilirrubina abaixo de 10 mg%
* Complicação: Sepses, hipoxemia, acidose
24. Nível de Bilirrubina Total Plasmática
até 48 h (mg/dl)
Nível de Bilirrubina Total Plasmática
≥ 96 h (mg/dl)
Risco para DNIB*
(segundo AAP**)
Fototerapia Exsanguineo Fototerapia Exsanguineo
Alto Risco (presença de
risco para DNIB em RN de
35 – 37 sem IG)
11 18 15 19
Moderado Risco
(35 – 37 sem IG sem risco
de DNIB)
13 20 18 22,5
Baixo Risco (RN de termo
sem risco para DNIB)
15 22 21 25
OS NÍVEIS DE BILIRRUBINA TOTAL SÉRICA QUE DEFINEM INTERVENÇÃO EM RN PRÉ-
TERMO (Academia America de Pediatria, 2004)
*DNIB: disfunção neurológica induzida pela bilirrubina
**anemia hemolítica isoimune,deficiência de G6PD, significante letargia, sepses,
acidose, asfixia, instabilidade de temperatura e albumina sérica <3g%
26. CASO ICASO I
RNT, AIG, do sexo masculino, nascido de
parto normal com 37 semanas e 4 dias de
idade gestacional (DUM), líquido amniótico
claro e sem grumos, chorou logo ao nascer,
não necessitando de manobras de
reanimação. Ao exame físico ainda na sala de
parto apresentava, bossa serossanguínea em
parietais, sem malformações evidentes.
Apgar de 7/9. Foi amamentado nas
primeiras 2 horas após o parto e após este
período foi encaminhado ao ALCON.
27. CASO I (Cont.)CASO I (Cont.)
Mãe G2 P1 A1, refere ter feito pré-natal
(7 consultas), porém sem cartão de
acompanhamento.
Teste rápido realizado na sala de parto:
não reagente.
Colhido sangue de RN para Tipagem
sanguínea, Coombs direto e TORCHS.
28. Caso I (Cont.)Caso I (Cont.)
No ALCON, RN evoluiu com boa
sucção ao seio materno, eliminação de
mecônio e diurese presente. Com cerca
de 18 horas de vida apresentou icterícia
zona III de Kramer.
29. Caso I (Cont.)Caso I (Cont.)
Solicitado hemograma completo e
bioquímica sérica que revelaram:
Hemoglobina de 11 g/dl, HT: 38%,
Reticulócitos: 9%, leucócitos de 15.000,
Plaquetas: 250.000. BI: 17 mg%; BD:
0,5mg%.
31. Caso I (Cont.)Caso I (Cont.)
Colocado sob fototerapia azul e realizada
exsanguineotransfusão.
Exames colhidos ao nascimento revelaram:
Mãe: O +, CI positivo (1/64)
RN: O Negativo, CD positivo.
Exames laboratoriais sorológicos revelaram
sorologias não reagentes.
Incompatibilidade por determinantes
antigênicos menores (Subgrupos)
32. ICTERÍCIA PRECOCEICTERÍCIA PRECOCE
Antes de 24h de vida
SEMPRE patológica
Mais freqüentemente relacionada com
doença hemolítica.
Investigação : Coombs direto;
Hemograma com contagem de
reticulócitos; alteração na forma das
hemácias; TSRN; e bilirrubinemia.
33. ICTERÍCIA PrecoceICTERÍCIA Precoce
Hemólise
Incompatibilidade ABO, RH ou por
determinantes antigênicos menores (subgrupos C.
E, Kell, Duffy etc).
Hemoglobinopatias
Deficiência de G6PD (glicose-6-fosfato-
desidrogenase)
Infecções congênitas
CMV, rubéola, toxoplasmose ...
Sepse neonatal
Hematomas, equimoses ...
34. Caso IICaso II
RNPT de 34 semanas e 3 dias, AIG, do sexo
masculino, em aleitamento materno
exclusivo, desenvolve icterícia no segundo
dia de vida que se intensifica no dia
seguinte, zona II de Kramer.
Exames laboratoriais revelam BI de
13mg/dl, BT de 13,7 mg/dl, hemoglobina de
16 g/dl e reticulócitos de 5%. Mãe A negativo
e RN O positivo, coombs direto e indireto
negativos.
Icterícia fisiológica
35. ICTERÍCIA TARDIAICTERÍCIA TARDIA
Após 24h
Icterícia fisiológica
Inicia-se após as primeiras 24 horas de vida,
apresenta um pico e regressão espontânea.
É mais visível quanto maior o tecido celular
subcutâneo.
Níveis de no máximo 12mg/dl para o RNT e de
15mg/dl no RNPT, com duração de 1 semana e 2
semanas respectivamente.
Velocidade de aumento da bilirrubina inferior à
5mg/dl em 24h.
36. ICTERÍCIA TARDIAICTERÍCIA TARDIA
Formas mais prolongadasFormas mais prolongadas
Icterícia pelo aleitamento materno
Reabsorção intestinal de bilirrubina
aumentada.
Icterícia do leite materno
Após segunda semana (mais tardia e
exacerbada)
Presença de inibidores da conjugação no leite
materno.
Hipotireoidismo
37. Caso IIICaso III
RN com 30 dias de vida, nascido de
parto normal, a termo, sem
intercorrência pré ou perinatais é
levado à consulta de rotina quando
observa-se ao exame físico icterícia
discreta. Mãe relata que lactente
apresenta urina escura que mancha
fralda.
Exames laboratoriais revelam:
BI: 1mg/dl e BT: 9mg/dl
38. Icterícia tardiaIcterícia tardia
ColestáticaColestática
Após a segunda semana de vida
Início insidioso
> 20% da BT composta por BD ou BD >
2mg/dl
Principais causas:
Hepatite neonatal
Atresia de vias biliares extra-hepáticas
Na atresia de vias biliares estabelecer
diagnóstico antes de 8 semanas para
intervenção cirúrgica (Kasai) oportuna,
prevenindo a evolução irreversível para
cirrose biliar.