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BEBENDO EMOÇÕES: COCA-COLA E A
               PSICOLOGIA DO CONSUMIDOR
                                       Josir Schöpping 1
                                 Cláudia Regina Pinto Michelli 2

RESUMO

O consumo e as suas razões é objeto de estudo de várias áreas do conhecimento, como o
marketing, a psicologia, a pedagogia, a economia, a filosofia e a sociologia. Para compreender
o consumismo, que é um fenômeno do nosso tempo, é fundamental o estudo da psicologia do
consumidor, que se orienta por obras de autores que buscaram compreender a mente humana,
como Freud, Jung e Maslow, entre outros. A Coca-cola é, provavelmente, o produto mais
conhecido e consumido no mundo, e é acessível a praticamente todas as classes sociais, além
de estar presente em todos os países, desde os locais mais remotos do globo terrestre. O
presente trabalho busca discutir através de levantamento bibliográfico e análise de
documentários relacionados à marca “Coca-cola”, um breve histórico da marca, como o uso
do produto interfere na vida dos consumidores e de que forma a marca pode ser entendida
como “mito”.

Palavras chave: Publicidade. Marketing. Psicologia. Mitologia. Consumismo


1. INTRODUÇÃO

       Com o surgimento da Revolução Industrial (século XVIII), a oferta de produtos foi
tornando-se cada vez maior. No fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945) houve o
crescimento da concorrência, e a partir daí, com o leque cada vez maior de itens de consumo
no mercado, veio o marketing.

        Um dos produtos de consumo mais conhecidos do mundo é a Coca-cola. Segundo a
consultoria InterBrand, ela é a marca mais valiosa do mercado mundial, avaliada em US$ 71,8
bilhões, aumento de 2% em relação ao levantamento anterior, quando valia US$ 70,4 bilhões.
Certamente, a Coca-cola é a responsável pelo surgimento da publicidade moderna, conforme
foi citado no documentário Mundo-Cola – Água, Açúcar e Marketing (1998).

        A publicidade americana, mais especificamente, nasceu com a indústria de elixires.
Afinal, para vender produtos como máquinas de costura, em 1865, não era necessária
divulgação. Os elixires eram algo que ninguém precisava, como nos mostra o documentário
Mundo Cola - 1998. Então, era preciso divulgar propriedades exageradas. A Coca-cola, no
início percebida, apenas, como um elixir medicinal pelo seu inventor, o farmacêutico John S.
Pemberton, começou, desta maneira, a usar de vários meios de divulgação.
        Neste sentido e através de um levantamento bibliográfico e análise de documentários
relacionados à marca “Coca-cola”, faremos um breve histórico da marca, discutindo como o

1
  Bacharel em Comunicação Social (Publicidade e Propaganda) e Pós-Graduando em Metodologia de Ensino de
Filosofia e Sociologia.
2
  Mestre em Educação, Especialista em Psicopedagogia, Licenciada em Normal Superior Anos Iniciais do
Ensino Fundamental.
2



uso do produto interfere na vida dos consumidores e de que forma a marca pode ser entendida
como mito.

        Conforme o documentário Mundo Cola (1998) - que por sua vez é baseado no livro
Por Deus, pela Pátria e pela Coca-cola, de Mark Pendergrast (1993) - não levou muito tempo
até que o novo dono da marca, Asa Candler, descobrisse que poderia lucrar muito mais com o
produto, vendendo-o para gente saudável, deixando de lado a característica inicial de um
tônico para o cérebro, voltado para homens de negócios, e passou a usar o conceito de uma
bebida “deliciosa e refrescante”, sugestão vinda principalmente de mulheres que
experimentaram o tônico. Após isto, cartazes com imagens de mulheres começaram a ser
usadas para divulgar a bebida. E assim, a empresa passou a vender muito mais que um
simples produto: passou a disseminar uma imagem, que se espalhou pelo mundo e se
transformou em um mito de consumo do nosso tempo.

       Certamente, podemos compreender muito sobre como o consumidor pensa, por meio
da história da Coca-cola, pois foi, talvez, a primeira marca que usou mecanismos da
psicologia em benefício da construção da sua imagem. Porém, podemos perceber que algumas
destas descobertas foram feitas ao acaso, muitas em conjunto com o surgimento de novas
tecnologias como o cinema e a TV. Algumas associações psicológicas com a marca foram
aparecendo por meio de algumas ações da empresa que visava, apenas, conquistar uma fatia
mais ampla do mercado e a empatia do seu público. Conforme o documentário Mundo-Cola
(1998), ao vender a Coca-cola - durante a Segunda Guerra Mundial - a um preço diminuto
para todo soldado americano, não importando onde estivesse, a empresa, provavelmente, não
soubesse que estava dando um enorme passo na construção de um mito, que tem na sua
relação com o país de origem – os Estados Unidos – um importante fator que agrega valor
enorme ao conceito da marca.

        Atualmente, existem várias teorias dentro do marketing para compreender o
consumidor, dentro de três áreas principais: a teoria psicanalítica, a da psicologia social e a do
fator-traço. (Blackwell e outros autores: 2005).

       Porém, sabemos que discutir a mente humana é sempre algo difícil e complexo. As
motivações humanas são variadas, distintas, e podem apresentar mudanças significativas de
um país para outro, pois o fator cultural é vital para o processo do consumo. A Coca-cola é um
fenômeno mundial – em alguns países mais, em outros menos - embora tenha conseguido
firmar-se em todas as regiões, desde os Shoppings Centers e botequins até em locais remotos,
onde o deserto reina. Onde o consumidor está a Coca-cola está presente, como uma espécie de
deus, onde ser onipresente faz parte da sua divindade.

         A partir da compreensão das relações psicológicas e emocionais com este produto, que
está em toda a parte do mundo, podemos ficar mais próximos de entender o fenômeno do
consumismo, que é uma preocupação do nosso tempo. Hoje, mais do que comprar um
produto, as pessoas desejam possuir e ser, ou seja, desejam construir uma identidade com base
naquilo que possuem e consomem. Todo este processo da busca de uma identidade, de uma
satisfação de desejos – alguns ocultos para o consumidor – provoca uma espécie de frenesi
coletivo, onde as pessoas, hipnotizadas pelos poderes “mágicos” dos bens de consumo
ofertados em todos os cantos, espaços e ambientes do planeta – inclusive virtuais – agem sem
refletir, o que ocasiona, muitas vezes, danos para a saúde, para o bem-estar financeiro e para o
meio ambiente.
3



2. BREVE HISTÓRICO DA COCA-COLA

      A história da Coca-cola começou em 1886, quando John Pemberton, um farmacêutico
da cidade de Atlanta, criou uma bebida e chamou-a de “tônico para o cérebro”. O
farmacêutico, ao pesquisar a cura para dores de cabeça, criou uma mistura líquida de cor
caramelo que incluía extrato de noz-de-cola, um estimulante com alto teor de cafeína, e
também extrato de folhas de coca (Mundo-Cola, 1998).

       Em anúncios divulgados nos jornais, em 1886, aparecia a famosa frase: "Coca-Cola
Delicious! Refreshing! Exularating Invigorating!" (Coca-Cola Deliciosa! Refrescante!
Alegre! Tonificante). Surgiu também, nessa época, o slogan da Coca-Cola: "Drink Coca-
Cola" (Beba Coca-Cola). (Lima, Renata. Extraído do site: O Fascinante Mundo das
Coleções).

       Pemberton, por conta de dificuldades financeiras, vendeu, em 1891, a empresa para
Asa Candler, que era um grande vendedor e homem de negócios. A partir daí, a marca firmou-
se, expandindo-se e ganhando visibilidade. (Mundo-Cola, 1998).

        Segundo        o     site     oficial    do       fabricante     –      Coca-cola
Brasil, e o documentário Mundo-Cola (1998), em 1895, a Coca-Cola já era vendida em todos
os estados e territórios americanos. Por conta disto apareceram as imitações, entre elas a
Pepsi-Cola. A empresa, insatisfeita com o fato, veiculava anúncios enaltecendo a sua
autenticidade, (Mundo-Cola, 1998). Para criar um diferencial em relação aos imitadores e
para o consumidor reconhecer facilmente o produto, foi iniciada, em 1916, a fabricação da
famosa garrafa “Contour”. A embalagem foi escolhida por causa de sua aparência atrativa,
design original e pelo fato principal de, mesmo no escuro, ou de olhos vendados, o
consumidor poder identificá-la.

        Robert Woodruff foi um dos maiores nomes da Coca-Cola, tido como um gênio do
Marketing. Seu pai comprou a empresa de Candler em 1918, e Robert assumiu a presidência
cinco anos depois. Woodruff consolidou a marca e a liderança da Coca-Cola em todo o
mundo, durante os 60 anos em que ficou no comando da empresa, pois ele percebeu muitas
oportunidades de expansão, conquistando novos mercados com campanhas inovadoras.
(extraído do site original do fabricante - Coca-Cola Brasil, 1998).

        Segundo o documentário Mundo-Cola, (1998), em 1941 os Estados Unidos entram na
Segunda Guerra Mundial, enviando milhares de homens e mulheres para as frentes de
combate, e a Coca-Cola acompanhou esses combatentes. Woodruff determinou que o produto
fosse vendido por um preço acessível para todo soldado norte-americano, onde quer que
esteja, em qualquer parte do mundo. Foi durante a guerra que os europeus experimentaram a
bebida, e a partir daí, a empresa fez muitos negócios pelo mundo. A visão de Woodruff, de
que uma Coca-cola deveria estar sempre ao alcance das pessoas foi tornando-se uma realidade
cada vez maior.

       Os anos 80 - época em que se inicia o chamado "culto ao corpo"- trouxeram mudanças
e transformações na empresa. Segundo Ana Lúcia de Castro, no artigo “Culto ao corpo,
identidades e estilos de vida”, o culto ao corpo é entendido como um tipo de relação dos
indívíduos com seus corpos que tem como preocupação básica o seu modelamento, a fim de
aproximá-lo o máximo possível do padrão de beleza estabelecido. A empresa lançou, em
1982, a Diet Coke, à base de aspartame, que logo se transformou no terceiro refrigerante mais
4



vendido nos Estados Unidos (Silva, Chrystiane - Veja on-line – O light caducou. 2007).

        Em 1981, o cubano Roberto C. Goizueta torna-se o principal executivo da companhia.
Ele faz uma revisão da estratégia da empresa, adotando a filosofia de "assumir riscos de forma
inteligente" e, ainda, organizando as inúmeras fábricas engarrafadoras dos Estados Unidos em
uma única empresa. (Extraído do site original do fabricante - Coca-Cola Brasil).

        Em 1985 uma decisão da empresa entrou para a história da marca: a mudança do sabor
da Coca-cola, a primeira alteração na fórmula em 99 anos. Na fase de testes, os consumidores
demonstraram gostar muito do novo sabor. No mundo real isso não aconteceu, pois havia uma
relação emocional muito forte com a fórmula original. Os consumidores pediram o retorno da
antiga fórmula. A fórmula original retornou ao mercado, amparada por uma grande campanha
de marketing, como Coca-cola Classic. (Extraído do site original do fabricante - Coca-Cola
Brasil). Este fato instiga a acreditar que o consumidor não busca apenas o melhor sabor em
uma bebida. Ele busca manter uma relação com essas sensações que o produto provoca e,
portanto, alterar o sabor da Coca-cola significou para muitas pessoas algo como a perda de
um “ente querido”. A Classic foi a “ressurreição” de um produto admirado em todo o mundo.

      Atualmente, somente no Brasil, a Coca-Cola fatura cerca de R$ 17,7 bilhões, como
conseqüência de 10,6 bilhões de litros de bebidas consumidos (Extraído do site “Mundo do
Marketing” dados coletados por Sylvia de Sá do ano de 2010.).



3. COMPREENDENDO O CONSUMO E A FORMA DE PENSAR DO CONSUMIDOR

      Para entender toda a relação entre o consumidor e o produto entramos no campo do
comportamento do consumidor, onde está a psicologia do consumidor. Segundo Michael R.
Solomon (2002:24):
                       O campo do comportamento do consumidor abrange uma ampla área: é o estudo dos
                       processos envolvidos quando indivíduos ou grupos selecionam, compram, usam ou
                       dispõem de produtos, serviços, ideias ou experiências para satisfazer necessidades e
                       desejos […] As necessidades e desejos a serem satisfeitos vão de fome e sede até
                       amor, status ou ainda realização espiritual.

       Solomon (2002:28) exemplifica este comportamento citando os produtos de cola: “O
Mundo da Coca-cola em Las Vegas atrai milhões de visitantes por ano. Os expositores
perguntam: 'O que a Coca-cola significa para você?', e muitas das respostas falam de fortes
ligações emocionais com a marca”.

       Esta colocação de Solomon evidencia que os motivos que levam alguém a adquirir um
determinado produto envolve muitos fatores, incluindo, entre eles, os fatores psicológicos.
Solomon (2002:29) esclarece: “Uma das premissas fundamentais do moderno campo do
comportamento do consumidor é a de que as pessoas muitas vezes compram produtos não
pelo que eles fazem, mas sim pelo que eles significam”.

       Ou seja: existe um relacionamento, muitas vezes até afetivo, entre o consumidor e o
produto consumido. Solomon (2002:29) apresenta alguns tipos de relacionamento que uma
pessoa pode ter com um produto:
                       - Ligação de autoconceito – o produto ajuda a estabelecer a identidade do usuário.
                       - Ligação nostálgica – o produto atua como um elo com um eu do passado.
5


                      - Interdependência – o produto faz parte da rotina diária do usuário.
                      - Amor – o produto promove elos emocionais de afeto, paixão ou outra emoção
                      intensa.

       Quando temos o primeiro contato com um produto, fatores como a embalagem e as
cores são as primeiras coisas que exercem influência em nossa mente. As cores tem muita
importância na embalagem de um produto, pois provocam efeitos psicológicos nas pessoas.

        De acordo com o documentário Mundo-Cola (1998), a cor vermelha da Coca-cola foi
usada ao acaso, não foi uma estratégia. Mas, mesmo assim, ela foi fundamental para o
reconhecimento da marca, e possui vários significados, em especial pelo uso conjunto com a
cor branca. O vermelho é uma das cores que mais chamam a atenção, e é especialmente
atraente para crianças e adolescentes. O branco lembra-nos pureza, limpeza, o que é muito
conveniente para uma bebida que tem como objetivo mercadológico substituir a água e outras
bebidas no posto de maior consumo no planeta.

        No livro “Psicodinâmica das Cores em Publicidade”, Farina (1975:59) explica-nos
sobre a associação das cores com a psicologia. Ele cita uma pesquisa de Bamz, que alia o
fator idade à preferência que o indivíduo manifesta por determinada cor. Segundo esta
pesquisa, o vermelho corresponderia ao período de 1 a 10 anos, idade da efervescência e da
espontaneidade. Portanto, percebemos a importância da cor vermelha para a Coca-cola, já que
o documentário Mundo Cola (1998) aponta o fato de que um dos fatores do sucesso
mercadológico do produto deve-se ao fato da descoberta da importância das crianças para a
manutenção da marca:
                      O governo americano chegou a processar a Coca em um julgamento em 1911. Não
                      deveria haver cafeína em uma bebida servida às crianças. E a defesa da Coca foi
                      dizer que as crianças não bebiam o refrigerante. O que era ridículo, pois bebiam.
                      Mas desde 1911 criou-se uma regra implícita na empresa de jamais mostrar uma
                      criança menor de 12 anos bebendo o refrigerante nos anúncios. E isso criou um
                      dilema: Como iam atrair as crianças? A resposta da Coca foi usar modelos no limite
                      da idade, mas sem ultrapassá-los. […] Eles sabiam que acostumar a garotada desde
                      cedo com a Coca-cola é a melhor garantia de ter consumidores no futuro.

       Não há dúvida que a descoberta das crianças como principal público da marca se
revelou fundamental para o sucesso desta bebida no mundo todo, desde a sua criação até hoje.

       Ainda sobre as cores, Farina (1975:74) explica-nos:

                      As cores constituem estímulos psicológicos para a sensibilidade humana, influindo
                      no indivíduo, para gostar ou não de algo, para negar ou afirmar, para se abster ou
                      agir. Muitas preferências sobre as cores se baseiam em associações ou experiências
                      agradáveis tidas no passado e, portanto, torna-se difícil mudarem as preferências
                      sobre as mesmas.

        Mais adiante, o autor (1975:74) nos apresenta o que os cientistas estabelecem a
respeito do significado psicológico das cores. Sobre o branco e o vermelho, ele afirma:
                      BRANCO: Associação material – batismo, casamento, cisne, lírio, primeira
                      comunhão, neve, nuvens em tempo claro, areia clara.
                      Associação afetiva – ordem, simplicidade, limpeza, bem, pensamento, juventude,
                      otimismo, piedade, paz, pureza, inocência, dignidade, afirmação, modéstia, deleite,
                      despertar.
                      VERMELHO: Associação material – rubi, cereja, guerra, luta, sinal de parada,
6


                       perigo, vida, sol, fogo, chama, sangue, combate, lábios, mulher, ferida, rochas
                       vermelhas.
                       Associação afetiva – dinamismo, força, baixeza, energia, revolta, movimento,
                       barbarismo, coragem, furor, esplendor, intensidade, paixão, vulgaridade, poderio,
                       vigor, glória, calor, violência, dureza, excitação, ira, interdição.

       A Coca-cola usa o vermelho e o branco nas suas embalagens, e estas cores são
fortemente associadas à marca. Ao olharmos o uso conjunto destas cores, imediatamente
associamos ao produto. A energia do vermelho lembra-nos a própria energia da juventude e os
esportes. A Coca-cola sempre está presente nos grandes eventos esportivos. O branco lembra-
nos de fatos importantes da infância e de ritos de passagem: batismo, primeira comunhão,
casamento. E é associado a simplicidade, limpeza, juventude, inocência. Um trecho do
documentário deixa-nos claro que a marca explorou em sua publicidade estes aspectos
emocionais: “Mas a imagem da Coca também evocava a nostalgia de uma vida mais simples.
[…] Por duas décadas os anúncios da Coca-cola e momentos especiais da vida ficaram
imutáveis”.

       Para tentarmos compreender as necessidades do consumidor, com base na psicologia,
e o seu relacionamento com o produto Coca-cola, é fundamental apresentar a teoria de
Abraham Maslow, que formulou uma hierarquia de necessidades biogênicas e psicogênicas,
em que níveis de motivos são especificados. Podemos ver que a bebida procura suprir muito
mais do que a necessidade de saciar a sede.

      Abaixo, uma figura da hierarquia das necessidades de Maslow, extraída do livro de
Solomon (2002:100).




Figura 1 – Níveis de necessidades na hierarquia de Maslow. Fonte: O comportamento do consumidor
(Solomon:2002).

       Solomon (2002:100) faz uma importante observação sobre a teoria de Maslow:

                       A lição básica da hierarquia de Maslow é a de que devemos primeiro satisfazer as
                       necessidades básicas antes de avançarmos um degrau (isto é, um homem faminto
7


                       não está interessado em símbolo de status, amizade ou autorrealização). Isso implica
                       que os consumidores valorizam diferentes atributos de um produto, dependendo do
                       que está disponível para eles no momento. […] A aplicação desta hierarquia pelos
                       profissionais de marketing tem sido um pouco simplista, especialmente porque o
                       mesmo produto ou atividade pode satisfazer várias necessidades diferentes.

       A Coca-cola ocupou, e ainda ocupa, a base da pirâmide das necessidades. Como
podemos observar na Figura 1, ela ocupa o lugar das necessidades fisiológicas, pois mata a
sede, e também funciona – pelo menos vendia este conceito - como um remédio. Como
observou Solomon (2002), o mesmo produto pode satisfazer outras necessidades. Neste caso,
ela ocupa também o lugar da associação, pois a sua publicidade, em especial os anúncios de
TV, demonstra isso. As pessoas felizes, reunidas, vivendo e sorrindo, sempre associadas ao
consumo do produto.

        A partir deste ponto, podemos perceber que mais do que um produto, o consumidor
quer adquirir uma identidade, quer mais do que apenas, saciar desejos primários. Baudrillard
(1995) apud Giglio (2002:237) coloca a questão de maneira clara ao definir que o consumo
transformou-se na moral do mundo contemporâneo:

                       O homem ocidental perdeu primeiramente seu sobrenome como padrão de
                       identidade. Posterior, mas não completamente, perdeu sua profissão como indicador
                       de identidade. Agora sua identidade é dada pelos bens que possui e essa forma de
                       definição de 'quem sou eu' constitui o âmago do consumismo.

        Os meios de comunicação de massa, por meio da propaganda, influenciam fortemente
o comportamento de toda a sociedade e, na maioria das vezes, as pessoas nem sequer
percebem a influência exercida. Pedrinho A. Guareschi, no livro Sociologia Crítica –
Alternativa de Mudança (1990:111), chama a atenção para o que ele chama de comunicação
afetiva, inconsciente, conotativa:

                       É a comunicação baseada não na razão e nas qualidades objetivas do objeto, mas
                       numa relação secundária, construída através de ligações e relações estabelecidas
                       com as forças básicas, geralmente inconscientes, existentes em toda a pessoa
                       humana. Essas forças básicas são os desejos e aspirações que todos nós possuímos,
                       como, por exemplo o desejo de realização, o desejo de sucesso, o desejo de
                       liberdade, o desejo de estima, desejo de amar e ser amado, a força sexual, o desejo
                       de prestígio, de aceitação, de ser identificado e aceito como pessoa humana. Todos
                       nós temos esses desejos, forças e aspirações, e estão ligados ao mais profundo de
                       nosso ser.

       O consumidor não busca apenas “matar a sede” como razão do consumo da coca-cola
ou, no caso de adquirir (consumir) marcas de automóveis, de um meio de locomoção. Ele
busca “ser alguém”, ou melhor, busca um “eu” idealizado ao consumir. Existe o “eu real” e o
“eu desejado”. O “eu real” é o que somos realmente. O “eu desejado” é o que almejamos ser.
Ao beber uma Coca-cola, queremos nos sentir parte de um grande grupo mundial, feito de
pessoas jovens, ativas e divertidas. Ao encontrá-la em um local distante, ela nos proporciona
uma sensação de segurança e bem-estar. Ganhamos afeto por meio do consumo do produto.

       Marilena Chauí (2009:294) salienta o que é feito na propaganda moderna, e alerta para
o esvaziamento de alguns conteúdos a partir do consumismo:

                       Em outras palavras, a propaganda ou publicidade comercial passou a vender
                       imagens e signos e não as próprias mercadorias. […] A propaganda comercial
                       também se apropria de atitudes, opiniões e posições críticas ou radicais existentes na
8


                       sociedade, esvazia seu conteúdo social ou político e as investe num produto,
                       transformando-as em moda consumível e passageira. Feminismo, guerrilha
                       revolucionária, movimentos culturais de periferia, liberação sexual, direitos
                       humanos, etc. são transformados em qualidades que vendem um produto.

        O investimento em propaganda tem como alvo todos as pessoas que assistem e
escutam, ou seja, que são atingidas por sensações visuais ou auditivas (e até mesmo outras
sensações, como o cheiro). A forma como ela chega a cada sujeito certamente passará pela
subjetividade, ou seja, por aquilo que é próprio de cada indivíduo. Porém, existem questões
que o consumidor investe para estar inserido num grupo, seja isto a favor do produto ou
contra ele.

        Segundo Blackwell e outros autores (2005:220), os analistas de consumo se
aproximam das respostas dos porquês dos gostos das pessoas ao empregar as três grandes
teorias: psicanalítica, psicologia social e fator-traço:

                       A Teoria Psicanalítica de Freud reconhece que a personalidade humana consiste em
                       id, ego e superego. O id é a fonte da energia psíquica e busca de gratificação
                       imediata para as necessidades biológicas e instintivas. O superego representa normas
                       pessoais e sociais e funciona como um obstáculo ético ao comportamento. O ego
                       media as demandas hedônicas do id e as proibições morais do superego. A interação
                       dinâmica desses elementos resulta nas motivações inconscientes que se manifestam
                       no comportamento humano observado. Sigmund Freud acreditava que a
                       personalidade é derivada do conflito entre o desejo para satisfazer as necessidades
                       materiais e a necessidade de ser um membro da sociedade.
                       A psicologia social reconhece a interdependência entre o indivíduo e a sociedade. O
                       indivíduo esforça-se para atender as necessidades da sociedade, enquanto a
                       sociedade auxilia o indivíduo a atingir seus objetivos. A teoria é então a combinação
                       de elementos sociológicos e psicológicos.
                       A Teoria do fator-traço é um enfoque quantitativo da personalidade, o qual postula
                       que a personalidade individual inclui as predisposições chamadas características
                       pessoais. Uma característica pessoal é qualquer forma perceptível e relativamente
                       duradoura na qual os indivíduos diferem uns dos outros. […] Os analistas de
                       consumo podem identificar traços muito úteis no planejamento de marketing, como
                       adoção de risco, autoconsciência e necessidade de reconhecimento […] Alguns
                       anúncios fazem uso da tendência de alguns consumidores de comprar e possuir
                       produtos que são uma extensão de si próprios ou um reflexo do que gostariam de ser.

        Segundo Giglio (2002:59), “uma das teorias mais conhecidas e utilizadas em
marketing é a da psicodinâmica de Freud”. O autor alerta para o fato de que “qualquer
tentativa de resumir a obra de Freud está fadada ao fracasso”. A aplicação das teorias de Freud
voltada para o consumo certamente gera algumas polêmicas, dúvidas e revela “um certo
desconhecimento sobre os fundamentos dela e uma inconsistência do uso de seus
pressupostos”, segundo Giglio. Portanto, vamos comentar as formas mais usuais da teoria de
Freud usadas na área de consumo, já que este autor não possui obras voltadas para esta área.
O que existem são adaptações voltadas para a compreensão deste processo.

        De acordo com Giglio (2003:60) “profissionais de marketing têm utilizado o conceito
de inconsciente para criar as mais diversas explicações sobre os motivos do consumo”. E o
autor faz uma interpretação sobre esta conceito, ressaltando que “o consumo seria explicado
[…] como o comportamento resultante desses conteúdos inconscientes, isto é, o
comportamento de consumo é uma das formas de satisfação dos desejos inconscientes”
(2003:61).

       A partir daí, temos várias formas de explicar esta teoria aplicada ao consumo da Coca-
9



cola; algumas já explicadas anteriormente, como a necessidade de se criar uma identidade por
meio do consumo do produto. Mais adiante, vamos explorar a associação da mitologia com o
consumo, que tem na teoria dos arquétipos, de Carl Jung, a principal base.

        O consumidor faz associações entre o uso do produto e desejos presentes em seu
inconsciente. Giglio cita o exemplo de um carro, que é um dos objetos de consumo mais
desejados. E diz que “se um carro tem como propósito transportar o sujeito de maneira mais
rápida, não é este o argumento de venda”. A aquisição de um carro busca atender desejos
como sucesso afetivo, de demonstrar poder, virilidade, entre outras tantas associações. No
caso da Coca-cola, temos os desejos de associação (amizade, inclusão social), da lembrança
de momentos importantes da vida, de consumir algo “proibido” (em especial nos primeiros
anos de história da bebida), de sentir-se como parte do “sonho americano” e do “modo
americano de vida”. No caso dos produtos de baixa caloria temos o desejo de expressar saúde,
cuidado com o corpo, de um modo de vida ligado ao esporte e hábitos saudáveis.

        Para compreender porque os consumidores variam em suas decisões de compra
individuais é importante saber o que representam, também, os valores. Blackwell (2005:223)
define:

                      Os valores representam as crenças dos consumidores sobre a vida e os
                      comportamentos aceitáveis. Diferentemente das atitudes, os valores transcendem as
                      situações ou eventos e são mais duradouros pelo fato de serem mais centrais na
                      estrutura da personalidade. Os valores representam três requisitos universais da
                      existência humana: necessidades biológicas, requisitos de interações sociais
                      coordenadas e demandas pela sobrevivência e funcionamento do grupo”.

       A Coca-cola, por manter uma associação com os EUA, incorporou à marca muito dos
valores associados a este país, valores como democracia, da importância da prosperidade
individual por meio do trabalho duro, da igualdade de direitos, etc.

        O conceito de estilo de vida é muito popular na compreensão do consumidor entre os
profissionais de marketing. Segundo Blackwell (2005:228):

                       O estilo de vida é um constructo sumário definido como padrões nos quais as
                       pessoas vivem e gastam tempo e dinheiro, refletindo as atividades, os interesses e as
                       opiniões (AIOs) das pessoas, assim como as variáveis demográficas […] Os valores
                       são relativamente permanentes; os estilos de vida mudam mais rapidamente.

 Com o advento do culto ao corpo, a partir dos anos 80, a companhia de refrigerantes lançou a
linha de baixas calorias, cuja publicidade procurou associar ao estilo de vida saudável. A
empresa, progressivamente, comprou empresas de sucos naturais. Recentemente, foi lançado
um produto da Coca-cola com vitaminas e sais minerais. O produto clássico ainda é o
principal da empresa, e a sua publicidade procura sempre usar pessoas magras e saudáveis
associadas ao produto, explorando a alegria e a energia ao usá-lo, já que cada vez mais o
consumo de refrigerantes é percebido como pouco saudável. Certamente, fortalecendo-se esta
tendência, a Coca-cola clássica terá uma forte diminuição de consumo. Porém, os novos
produtos da empresa vão garantir este desejo de estilo de vida saudável, preservando, ao
mesmo tempo, as já tradicionais características do produto.
Além dos fatores relacionados a psicologia, também há outra questão, no qual atribuímos
importância relacionada ao consumo: o Mito.
10




4. A COCA-COLA COMO MITO

        Há uma grande relação entre as mulheres e a Coca-cola, estabelecida logo no início da
história do produto. De acordo com o documentário Mundo-Cola (1998), além do interesse
das mulheres, em especial, pelo tônico, que virou uma bebida “deliciosa e refrescante”, a
marca optou por diferenciar a garrafa, com a intenção de combater a concorrência. Devido a
isso, a garrafa adquiriu contornos femininos. No início do documentário Mundo-Cola (1998),
um trabalhador aposentado da Coca-cola, Warren Portwood, diz que: “A Coca-cola é o meu
amigo. Está em toda a parte, como uma mãe”. Certamente, podemos perceber, por meio
destes exemplos, que esta associação da Coca como mulher, ou mãe, tornou-se comum entre
os consumidores. Portanto, vários aspectos são agregados à marca por meio desta ligação
psicológica. Pensamentos como: “a Coca-cola está em toda parte”, “ela sacia a sua sede”, ela
é como a sua mãe”, estão presentes na forma de pensar de muitos consumidores. É importante
lembrar que o primeiro contato de um bebê com a sua mãe é por meio do leite materno, que
nutre e tira a sede do bebê. É o primeiro estágio de socialização do bebê. Com certeza, um
produto que constrói a sua identidade em torno dos atributos de uma mulher, de uma mãe, e
mata a sede, dando energia a pessoa, poderá obter sucesso, pois está explorando uma ligação
emocional como base da constituição do sujeito e com forte presença em questões do
inconsciente.

       Durante décadas os cartazes da Coca-cola usaram mulheres para divulgar os produtos.
Estes anúncios foram os primeiros passos na construção da Coca-cola como um mito. A
ligação das consumidoras com a Coca foi muito importante para o produto desde o início,
pois foram elas que acharam a bebida saborosa para ser consumida sempre, não só como um
tônico energizante, um “remédio”. Isto foi se fortalecendo ao longo da história da marca, e
ajudou a construir uma forte relação emocional com o produto, e transformando a Coca-cola
em um mito. E um mito feminino, como o livro de Sal Randazzo (1996) ajuda-nos a entender.

       Na mitologia podemos encontrar explicações para a ligação emocional do consumidor
com a Coca-cola. Randazzo (1996:11) afirma que “os produtos são mais sedutores quando
chegam envolvidos em mundos míticos e encarnados por personagens heróicos”. E Randazzo
(1996:12) explica que “as mesmas imagens universais (arquetípicas) que fornecem a base de
muitas das nossas mitologias culturais também são os alicerces de inúmeras imagens usadas
em publicidade”.

        A Coca-cola começou a construir a sua mitologia desde a sua criação. Na segunda
guerra mundial, ela fortaleceu a sua imagem como um símbolo da cultura americana. A Coca-
cola, como um deus (ou deusa), começou a tornar-se presente em todos os lugares do mundo,
desde os mais remotos. E na guerra, longe de casa, todo soldado americano poderia encontrá-
la a um preço acessível. Muitos enredos míticos foram construídos em torno deste produto
durante a guerra e ao longo da história, como o caso citado no documentário Mundo-Cola
(1998), onde um soldado, após ser atingido e ferido, tocou ao acaso em uma garrafa de Coca-
cola, e a lembrança de casa que o produto proporcionou fez com que ele mantivesse a
esperança e permanecesse vivo, até ser resgatado. Um enredo digno dos fantásticos relatos
oriundos da mitologia.

       Após o término da Segunda Guerra, a Coca-cola agregou à marca um importante
conceito que persiste até hoje: o de um dos símbolos do império americano. Portanto, ela tem
a imagem relacionada com muitas coisas que representam, principalmente, o chamado sonho
11



americano, ou o estilo americano de vida. No documentário Mundo Cola (1998) é citado este
fato:

                      Vemos a imensa popularidade dos produtos americanos. E uma das questões é:
                      porquê? Parte da resposta é que estamos vendendo os próprios EUA. E os EUA são
                      um produto realmente incrível. Um produto que reúne oportunidade e um pouco
                      mais de justiça social do que muitos países possuem. Representa um monte de coisas
                      boas que eu, você e muita gente valoriza.

       O mundo começou, de maneira progressiva, a perceber este produto como dotado de
poderes míticos. Ela foi, inclusive, incorporada a muitas mitologias locais. O documentário
Mundo Cola (1998) mostra que, muitas vezes, a Coca é associada a uma divindade, sendo que
no México, por exemplo, é utilizada em rituais de xamãs:
                      A Coca foi incorporada e muitos rituais, incluindo o ritual de cura dos xamãs e as
                      purificações que fazem com o cacau. Teve um impacto tão grande nas comunidades
                      indígenas e tamanha influência que se tornou uma espécie de água sagrada […].

       Em outro trecho do documentário, um antropólogo comenta:
                      Quando as pessoas tinham alguma noção verdadeira de divindade sua identidade
                      costumava ser moldada em relação a esta divindade. Como esse conceito foi
                      substituído pela noção de que você pode se construir a partir daquilo que deseja ser,
                      por meio do consumo, podemos dizer que o consumismo entrou no lugar de uma
                      ideologia mais antiga. Se eu tenho um Mercedes Benz e um Rolex, se tiro férias em
                      San Moritz, é assim que me mostro ao mundo... o tipo de pessoa que sou. Eu sou
                      aquilo que consumo. Essa imagem não diz nada sobre o meu caráter ou como me
                      relaciono com as pessoas, mas eu ganho uma identidade que é constituída a partir de
                      marcas. É a isso que o consumismo nos leva. E ele é, neste sentido, uma nova
                      religião.

       Por ser cultuado o consumo, o produto é “endeusado”. Do necessário, passa a ser
fundamental o seu uso, e isso fará a diferença na vida dos consumidores. Assim como o culto
a qualquer entidade faz a diferença na vida e no viver de cada um.

        Solomon (2002), citando Joseph Campbell, autor do livro “Miths, dreams and
religion”, explica-nos sobre as funções e a estrutura dos mitos:

                      Os mitos têm quatro funções inter relacionadas em uma cultura:
                      1. Metafísica: ajudam a explicar as origens da existência.
                      2. Cosmológica: enfatizam que todos os componentes do universo são parte de um
                      único cenário.
                      3. Sociológica: mantém a ordem social autorizando um código social a ser seguido
                      pelos membros de uma cultura .
                      4. Psicológica: fornecem modelos para conduta pessoal.

       Podemos encontrar algumas destas funções e estruturas dos mitos dentro da história e
publicidade da Coca-cola. Em um dos comerciais mais famosos da bebida - segundo o
documentário Mundo-Cola (1998) - várias pessoas, de várias etnias, cantam: “Eu queria
comprar um lar para o mundo e mobiliá-lo com amor”. E também: “Eu queria ensinar o
mundo a cantar em total harmonia. Eu queria pagar uma Coca para o mundo e lhe fazer
companhia.”. Neste anúncio, que é considerado um dos mais bem sucedidos da história
(Mundo-Cola, 1998), fica evidente o uso da função cosmológica, onde, por meio do consumo
do produto, todos sentem-se como parte de uma mesma família, do universo. Este anúncio, e
o fato de que podemos encontrar o refrigerante em qualquer local do mundo, atuaram
12



conjuntamente para construir e reforçar o processo de mitificação da Coca-cola.

       A função sociológica, por sua vez, é derivada do fato de que a Coca-cola é um símbolo
dos Estados Unidos, e muitas das coisas atribuídas ao país mais rico do mundo - cuja cultura,
padrões de comportamento, visão política e social é assimilada por outros países – são
agregadas ao produto.

        A função psicológica, por sua vez, é frequente em vários anúncios ao longo da história
do refrigerante, e é comumente usada na publicidade moderna. No início, a Coca-cola era
usada por seus poderes “energizantes”. Os produtos usados na sua fórmula – a folha de coca e
a noz-de-cola - criaram uma aura de coisa proibida, de subversão, o que sempre atraiu os
jovens. Segundo é descrito no documentário Mundo-Cola (1998) “é uma ironia que a Coca-
cola seja feita sem cocaína desde 1903, e que as pessoas continuem achando que ela contém
alguma droga”. O documentário diz que na produção da Coca-cola “é usada folha de coca até
hoje, mas toda a cocaína é retirada”. Muitas mulheres jovens consumiam o produto em
conjunto com comprimidos, e segundo o documentário Mundo-Cola, muitas usavam a
seguinte frase na época: “meninas decentes não devem tomar duas aspirinas e Coca, porque
isso faz você cometer loucuras”. O que em alguns casos instigavam-nas a cometer “algo
proibido” fazendo beber o produto junto com este medicamento.

       Randazzo (1996:11), citando a obra de Carl Jung, apontou que “os mitos, assim como
os sonhos, são na verdade projeções que emanam da alma ou da psique inconsciente”. E,
ainda, salientou que “os mitos representam sonhos coletivos […] e que, de alguma forma
funcionam como instintos ao moldarem o nosso comportamento”.

       Por meio de Randazzo (1996), que tem na obra de Jung as bases do seu livro, podemos
compreender que uma das associações mitológicas mais profundas com a marca Coca-cola é a
imagem baseada no arquétipo da Grande Mãe, que “aparece em todas as mitologias culturais e
que representa o instinto nutricional presente em todos nós”. A Coca-cola incorpora traços
arquetípicos e instintivos da Grande Mãe, como o de uma mãe cuidadosa, amorosa, e dotada
de enorme ternura, como pode-se concluir observando a história da marca.

        Outro arquétipo feminino associado com a Coca-cola é o da “Donzela”, usado nos
primórdios da publicidade da marca. O produto era associado “com lindas e saudáveis garotas
tipicamente americanas”, de acordo com Randazzo. E segundo ele, uma imagem permaneceu
constante mesmo com o passar dos anos: “a Garota Coca-cola é alguém que você pode levar
para casa e apresentar à sua mãe”. Nos primeiros tempos era associada ao mito da “Donzela”;
agora é associada à imagem da “Grande Mãe”, pela sensação de bem estar quando presente,
de segurança, aconchego, de boas lembranças, como de forma geral as mães significam para
seus filhos.

       Podemos perceber que, uma questão importante e que pode estar associado à marca ao
sucesso foi relacionar-se a um mito. Pelo caráter simbólico, pelo endeusamento da marca e
pelo efeito que ela provoca simbolicamente na vida das pessoas. Através de ritos a marca está
presente, seja em festas simples até cerimônias ou eventos que reúnem um grande público a
coca cola reúne pessoas e gerações.


5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
13



       Na construção de uma marca, o uso de teorias da psicologia são de fundamental
importância, afinal, sabe-se que com o advento do marketing as pessoas não adquirem os
produtos pelos seus benefícios em si, mas sim, por ligações emocionais que, na maioria das
vezes, estão no inconsciente das pessoas, e que tem na obra de Freud, entre outros, um dos
principais suportes para o entendimento destas relações.

       As marcas mais conhecidas do mundo tem uma associação com a mitologia, onde a
obra de Carl Jung, sobre os arquétipos e o inconsciente coletivo, é fundamental para
compreender como se dá esta relação. As marcas possuem enredos míticos, que são
incorporados à sua imagem. Randazzo lembra-nos que “em certo sentido, praticamente toda a
publicidade é uma forma de criar mitos. Cada anúncio e cada comercial é uma mitologia
individual, que também contribui para a mitologia geral da marca”. (1996, p. 86.)

        A publicidade moderna explora toda esta gama de necessidades inconscientes em
benefício dos seus produtos, já que os atributos apenas racionais podem não garantir uma
marca forte e competitiva. O apelo emocional, a ligação afetiva com os produtos são mais
duradouras do que a maioria dos argumentos racionais. A TV, o cinema, as imagens de
anúncios em revistas e na internet constroem uma história emocional, mitológica, que penetra
na mente do consumidor e transforma os produtos em personificações do desejo inconsciente
ou, de certa maneira, aparentemente consciente, onde sabe-se que, muitas vezes, a mensagem
enviada pelo possuidor do produto é entendida por outros consumidores como uma espécie de
código linguístico, por exemplo, “Eu sou sociável, sou jovem, alegre, tenho um estilo de vida
americano, portanto, bebo Coca-cola”. “Eu sou poderoso e viril, portanto, tenho uma Ferrari”.
“Eu sou uma mãe cuidados e zelosa pela minha família, portando, uso OMO”. “Eu sou
moderno, ligado em novas tecnologias, inteligente e descolado, rico, portanto, uso um
computador da Apple”.

       A preocupação em relação a estes desejos é que eles podem fugir do controle do
indivíduo e da sociedade. Estamos em uma era em que os nossos desejos de consumos
parecem ser insaciáveis.

       No livro Filosofando – introdução à filosofia, Aranha e Martins falam sobre a
sociedade pós-moderna: o hiperconsumo, que é um fenômeno muito discutido por pensadores
dos nosso tempo:

                      O filósofo Gilles Lipovetsky, por exemplo, prefere não demonizar o consumo, mas
                      aceitá-lo como fenômeno do nosso tempo. Ele observa que, desde o final dos anos
                      1970, devido às técnicas de marketing e de preços mais baixos, os bens se tornaram
                      acessíveis a maior número de pessoas, inclusive as de menor poder aquisitivo, ávidas
                      de compras nos grandes magazines. Desse modo, surgiu uma nova fase de consumo
                      mais intimista e personalizada. Por destacar no consumo o processo de
                      personalização, Lipovetsky recusa-se a aplicar à sociedade pós moderna o conceito
                      marcuseano de unidimensionalidade. Também critica Foucault , identificando que
                      houve uma redução progressiva do processo disciplinar no trabalho. […] Apesar de
                      considerar o consumidor mais crítico, Lipovetsky reconhece o poder massificante da
                      publicidade e os malefícios do hiperconsumismo, entendido como a ilusão de que a
                      mercadoria nos garantiria a felicidade. […] O risco é deixar que o consumo se
                      converta no sentido principal da vida das pessoas.

       Ficam as perguntas: muitas pessoas não estão consumindo para se transformarem em
algo que não são ou que nunca serão? A publicidade excessiva, que invade todos os nossos
espaços, não está criando uma geração cada vez maior de pessoas que preferem o prazer do
14



consumo ao invés de procurarem relações sociais verdadeiras e de procurar transformar o seu
país, em detrimento de beberam na fonte da felicidade alheia? Onde está o limite das nossas
ilusões e onde começam os sonhos de verdade, que podem melhorar as nossas vidas e a nossa
humanidade? O nosso desejo de consumir além do que necessitamos não está prejudicando os
recursos naturais do nosso planeta?
        Um dos caminhos que podemos seguir é o de educar as pessoas para o consumo.
Cientes do real motivo pelo qual consomem, elas podem tornar-se mais responsáveis. E este é
um desafio para os primeiros anos de escola, e que se deve estender até a vida adulta.


                                     REFERÊNCIAS

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dominando o planeta. DLI Productions. s.d.

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à filosofia. 4. ed. São Paulo: Moderna, 2009.

BLACKWELL, Roger D.; MINIARD, Paul W.; ENGEL, James F. Comportamento do
consumidor. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2005.

CASTRO, Ana Lúcia de. Culto ao corpo: identidades e estilos de vida. VIII Congresso Luso-
Afro-Brasileiro de Ciências Sociais. Centro de Estudos Sociais, Faculdade de Economia,
Universidade de Coimbra. 2004.

COCA-COLA BRASIL. A história da Coca-cola no mundo. Disponível em:
<http://www.cocacolabrasil.com.br/conteudos.asp?item=2&secao=39&conteudo=103&qtd_c
onteudos=1> Acesso em 5 out. 2011.

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GIGLIO, Ernesto M. O comportamento do consumidor. 2. ed. São Paulo: Pioneira
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GUARESCHI, Pedrinho A. Sociologia Crítica: Alternativa de Mudança. 31. ed. Porto
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LIMA, Renata. O fascinante mundo das coleções: Coca-Cola. Disponível em:
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15



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poder do mito e do simbolismo para criar marcas de sucesso. Rio de Janeiro: Rocco, 1996.

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em             <http://www.mundodomarketing.com.br/9,17564,coca-cola-brasil-impulsiona-
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SOLOMON, Michael R. O comportamento do consumidor: comprando possuindo e sendo. 5.
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BEBENDO EMOÇÕES: COCA-COLA E A PSICOLOGIA DO CONSUMIDOR

  • 1. BEBENDO EMOÇÕES: COCA-COLA E A PSICOLOGIA DO CONSUMIDOR Josir Schöpping 1 Cláudia Regina Pinto Michelli 2 RESUMO O consumo e as suas razões é objeto de estudo de várias áreas do conhecimento, como o marketing, a psicologia, a pedagogia, a economia, a filosofia e a sociologia. Para compreender o consumismo, que é um fenômeno do nosso tempo, é fundamental o estudo da psicologia do consumidor, que se orienta por obras de autores que buscaram compreender a mente humana, como Freud, Jung e Maslow, entre outros. A Coca-cola é, provavelmente, o produto mais conhecido e consumido no mundo, e é acessível a praticamente todas as classes sociais, além de estar presente em todos os países, desde os locais mais remotos do globo terrestre. O presente trabalho busca discutir através de levantamento bibliográfico e análise de documentários relacionados à marca “Coca-cola”, um breve histórico da marca, como o uso do produto interfere na vida dos consumidores e de que forma a marca pode ser entendida como “mito”. Palavras chave: Publicidade. Marketing. Psicologia. Mitologia. Consumismo 1. INTRODUÇÃO Com o surgimento da Revolução Industrial (século XVIII), a oferta de produtos foi tornando-se cada vez maior. No fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945) houve o crescimento da concorrência, e a partir daí, com o leque cada vez maior de itens de consumo no mercado, veio o marketing. Um dos produtos de consumo mais conhecidos do mundo é a Coca-cola. Segundo a consultoria InterBrand, ela é a marca mais valiosa do mercado mundial, avaliada em US$ 71,8 bilhões, aumento de 2% em relação ao levantamento anterior, quando valia US$ 70,4 bilhões. Certamente, a Coca-cola é a responsável pelo surgimento da publicidade moderna, conforme foi citado no documentário Mundo-Cola – Água, Açúcar e Marketing (1998). A publicidade americana, mais especificamente, nasceu com a indústria de elixires. Afinal, para vender produtos como máquinas de costura, em 1865, não era necessária divulgação. Os elixires eram algo que ninguém precisava, como nos mostra o documentário Mundo Cola - 1998. Então, era preciso divulgar propriedades exageradas. A Coca-cola, no início percebida, apenas, como um elixir medicinal pelo seu inventor, o farmacêutico John S. Pemberton, começou, desta maneira, a usar de vários meios de divulgação. Neste sentido e através de um levantamento bibliográfico e análise de documentários relacionados à marca “Coca-cola”, faremos um breve histórico da marca, discutindo como o 1 Bacharel em Comunicação Social (Publicidade e Propaganda) e Pós-Graduando em Metodologia de Ensino de Filosofia e Sociologia. 2 Mestre em Educação, Especialista em Psicopedagogia, Licenciada em Normal Superior Anos Iniciais do Ensino Fundamental.
  • 2. 2 uso do produto interfere na vida dos consumidores e de que forma a marca pode ser entendida como mito. Conforme o documentário Mundo Cola (1998) - que por sua vez é baseado no livro Por Deus, pela Pátria e pela Coca-cola, de Mark Pendergrast (1993) - não levou muito tempo até que o novo dono da marca, Asa Candler, descobrisse que poderia lucrar muito mais com o produto, vendendo-o para gente saudável, deixando de lado a característica inicial de um tônico para o cérebro, voltado para homens de negócios, e passou a usar o conceito de uma bebida “deliciosa e refrescante”, sugestão vinda principalmente de mulheres que experimentaram o tônico. Após isto, cartazes com imagens de mulheres começaram a ser usadas para divulgar a bebida. E assim, a empresa passou a vender muito mais que um simples produto: passou a disseminar uma imagem, que se espalhou pelo mundo e se transformou em um mito de consumo do nosso tempo. Certamente, podemos compreender muito sobre como o consumidor pensa, por meio da história da Coca-cola, pois foi, talvez, a primeira marca que usou mecanismos da psicologia em benefício da construção da sua imagem. Porém, podemos perceber que algumas destas descobertas foram feitas ao acaso, muitas em conjunto com o surgimento de novas tecnologias como o cinema e a TV. Algumas associações psicológicas com a marca foram aparecendo por meio de algumas ações da empresa que visava, apenas, conquistar uma fatia mais ampla do mercado e a empatia do seu público. Conforme o documentário Mundo-Cola (1998), ao vender a Coca-cola - durante a Segunda Guerra Mundial - a um preço diminuto para todo soldado americano, não importando onde estivesse, a empresa, provavelmente, não soubesse que estava dando um enorme passo na construção de um mito, que tem na sua relação com o país de origem – os Estados Unidos – um importante fator que agrega valor enorme ao conceito da marca. Atualmente, existem várias teorias dentro do marketing para compreender o consumidor, dentro de três áreas principais: a teoria psicanalítica, a da psicologia social e a do fator-traço. (Blackwell e outros autores: 2005). Porém, sabemos que discutir a mente humana é sempre algo difícil e complexo. As motivações humanas são variadas, distintas, e podem apresentar mudanças significativas de um país para outro, pois o fator cultural é vital para o processo do consumo. A Coca-cola é um fenômeno mundial – em alguns países mais, em outros menos - embora tenha conseguido firmar-se em todas as regiões, desde os Shoppings Centers e botequins até em locais remotos, onde o deserto reina. Onde o consumidor está a Coca-cola está presente, como uma espécie de deus, onde ser onipresente faz parte da sua divindade. A partir da compreensão das relações psicológicas e emocionais com este produto, que está em toda a parte do mundo, podemos ficar mais próximos de entender o fenômeno do consumismo, que é uma preocupação do nosso tempo. Hoje, mais do que comprar um produto, as pessoas desejam possuir e ser, ou seja, desejam construir uma identidade com base naquilo que possuem e consomem. Todo este processo da busca de uma identidade, de uma satisfação de desejos – alguns ocultos para o consumidor – provoca uma espécie de frenesi coletivo, onde as pessoas, hipnotizadas pelos poderes “mágicos” dos bens de consumo ofertados em todos os cantos, espaços e ambientes do planeta – inclusive virtuais – agem sem refletir, o que ocasiona, muitas vezes, danos para a saúde, para o bem-estar financeiro e para o meio ambiente.
  • 3. 3 2. BREVE HISTÓRICO DA COCA-COLA A história da Coca-cola começou em 1886, quando John Pemberton, um farmacêutico da cidade de Atlanta, criou uma bebida e chamou-a de “tônico para o cérebro”. O farmacêutico, ao pesquisar a cura para dores de cabeça, criou uma mistura líquida de cor caramelo que incluía extrato de noz-de-cola, um estimulante com alto teor de cafeína, e também extrato de folhas de coca (Mundo-Cola, 1998). Em anúncios divulgados nos jornais, em 1886, aparecia a famosa frase: "Coca-Cola Delicious! Refreshing! Exularating Invigorating!" (Coca-Cola Deliciosa! Refrescante! Alegre! Tonificante). Surgiu também, nessa época, o slogan da Coca-Cola: "Drink Coca- Cola" (Beba Coca-Cola). (Lima, Renata. Extraído do site: O Fascinante Mundo das Coleções). Pemberton, por conta de dificuldades financeiras, vendeu, em 1891, a empresa para Asa Candler, que era um grande vendedor e homem de negócios. A partir daí, a marca firmou- se, expandindo-se e ganhando visibilidade. (Mundo-Cola, 1998). Segundo o site oficial do fabricante – Coca-cola Brasil, e o documentário Mundo-Cola (1998), em 1895, a Coca-Cola já era vendida em todos os estados e territórios americanos. Por conta disto apareceram as imitações, entre elas a Pepsi-Cola. A empresa, insatisfeita com o fato, veiculava anúncios enaltecendo a sua autenticidade, (Mundo-Cola, 1998). Para criar um diferencial em relação aos imitadores e para o consumidor reconhecer facilmente o produto, foi iniciada, em 1916, a fabricação da famosa garrafa “Contour”. A embalagem foi escolhida por causa de sua aparência atrativa, design original e pelo fato principal de, mesmo no escuro, ou de olhos vendados, o consumidor poder identificá-la. Robert Woodruff foi um dos maiores nomes da Coca-Cola, tido como um gênio do Marketing. Seu pai comprou a empresa de Candler em 1918, e Robert assumiu a presidência cinco anos depois. Woodruff consolidou a marca e a liderança da Coca-Cola em todo o mundo, durante os 60 anos em que ficou no comando da empresa, pois ele percebeu muitas oportunidades de expansão, conquistando novos mercados com campanhas inovadoras. (extraído do site original do fabricante - Coca-Cola Brasil, 1998). Segundo o documentário Mundo-Cola, (1998), em 1941 os Estados Unidos entram na Segunda Guerra Mundial, enviando milhares de homens e mulheres para as frentes de combate, e a Coca-Cola acompanhou esses combatentes. Woodruff determinou que o produto fosse vendido por um preço acessível para todo soldado norte-americano, onde quer que esteja, em qualquer parte do mundo. Foi durante a guerra que os europeus experimentaram a bebida, e a partir daí, a empresa fez muitos negócios pelo mundo. A visão de Woodruff, de que uma Coca-cola deveria estar sempre ao alcance das pessoas foi tornando-se uma realidade cada vez maior. Os anos 80 - época em que se inicia o chamado "culto ao corpo"- trouxeram mudanças e transformações na empresa. Segundo Ana Lúcia de Castro, no artigo “Culto ao corpo, identidades e estilos de vida”, o culto ao corpo é entendido como um tipo de relação dos indívíduos com seus corpos que tem como preocupação básica o seu modelamento, a fim de aproximá-lo o máximo possível do padrão de beleza estabelecido. A empresa lançou, em 1982, a Diet Coke, à base de aspartame, que logo se transformou no terceiro refrigerante mais
  • 4. 4 vendido nos Estados Unidos (Silva, Chrystiane - Veja on-line – O light caducou. 2007). Em 1981, o cubano Roberto C. Goizueta torna-se o principal executivo da companhia. Ele faz uma revisão da estratégia da empresa, adotando a filosofia de "assumir riscos de forma inteligente" e, ainda, organizando as inúmeras fábricas engarrafadoras dos Estados Unidos em uma única empresa. (Extraído do site original do fabricante - Coca-Cola Brasil). Em 1985 uma decisão da empresa entrou para a história da marca: a mudança do sabor da Coca-cola, a primeira alteração na fórmula em 99 anos. Na fase de testes, os consumidores demonstraram gostar muito do novo sabor. No mundo real isso não aconteceu, pois havia uma relação emocional muito forte com a fórmula original. Os consumidores pediram o retorno da antiga fórmula. A fórmula original retornou ao mercado, amparada por uma grande campanha de marketing, como Coca-cola Classic. (Extraído do site original do fabricante - Coca-Cola Brasil). Este fato instiga a acreditar que o consumidor não busca apenas o melhor sabor em uma bebida. Ele busca manter uma relação com essas sensações que o produto provoca e, portanto, alterar o sabor da Coca-cola significou para muitas pessoas algo como a perda de um “ente querido”. A Classic foi a “ressurreição” de um produto admirado em todo o mundo. Atualmente, somente no Brasil, a Coca-Cola fatura cerca de R$ 17,7 bilhões, como conseqüência de 10,6 bilhões de litros de bebidas consumidos (Extraído do site “Mundo do Marketing” dados coletados por Sylvia de Sá do ano de 2010.). 3. COMPREENDENDO O CONSUMO E A FORMA DE PENSAR DO CONSUMIDOR Para entender toda a relação entre o consumidor e o produto entramos no campo do comportamento do consumidor, onde está a psicologia do consumidor. Segundo Michael R. Solomon (2002:24): O campo do comportamento do consumidor abrange uma ampla área: é o estudo dos processos envolvidos quando indivíduos ou grupos selecionam, compram, usam ou dispõem de produtos, serviços, ideias ou experiências para satisfazer necessidades e desejos […] As necessidades e desejos a serem satisfeitos vão de fome e sede até amor, status ou ainda realização espiritual. Solomon (2002:28) exemplifica este comportamento citando os produtos de cola: “O Mundo da Coca-cola em Las Vegas atrai milhões de visitantes por ano. Os expositores perguntam: 'O que a Coca-cola significa para você?', e muitas das respostas falam de fortes ligações emocionais com a marca”. Esta colocação de Solomon evidencia que os motivos que levam alguém a adquirir um determinado produto envolve muitos fatores, incluindo, entre eles, os fatores psicológicos. Solomon (2002:29) esclarece: “Uma das premissas fundamentais do moderno campo do comportamento do consumidor é a de que as pessoas muitas vezes compram produtos não pelo que eles fazem, mas sim pelo que eles significam”. Ou seja: existe um relacionamento, muitas vezes até afetivo, entre o consumidor e o produto consumido. Solomon (2002:29) apresenta alguns tipos de relacionamento que uma pessoa pode ter com um produto: - Ligação de autoconceito – o produto ajuda a estabelecer a identidade do usuário. - Ligação nostálgica – o produto atua como um elo com um eu do passado.
  • 5. 5 - Interdependência – o produto faz parte da rotina diária do usuário. - Amor – o produto promove elos emocionais de afeto, paixão ou outra emoção intensa. Quando temos o primeiro contato com um produto, fatores como a embalagem e as cores são as primeiras coisas que exercem influência em nossa mente. As cores tem muita importância na embalagem de um produto, pois provocam efeitos psicológicos nas pessoas. De acordo com o documentário Mundo-Cola (1998), a cor vermelha da Coca-cola foi usada ao acaso, não foi uma estratégia. Mas, mesmo assim, ela foi fundamental para o reconhecimento da marca, e possui vários significados, em especial pelo uso conjunto com a cor branca. O vermelho é uma das cores que mais chamam a atenção, e é especialmente atraente para crianças e adolescentes. O branco lembra-nos pureza, limpeza, o que é muito conveniente para uma bebida que tem como objetivo mercadológico substituir a água e outras bebidas no posto de maior consumo no planeta. No livro “Psicodinâmica das Cores em Publicidade”, Farina (1975:59) explica-nos sobre a associação das cores com a psicologia. Ele cita uma pesquisa de Bamz, que alia o fator idade à preferência que o indivíduo manifesta por determinada cor. Segundo esta pesquisa, o vermelho corresponderia ao período de 1 a 10 anos, idade da efervescência e da espontaneidade. Portanto, percebemos a importância da cor vermelha para a Coca-cola, já que o documentário Mundo Cola (1998) aponta o fato de que um dos fatores do sucesso mercadológico do produto deve-se ao fato da descoberta da importância das crianças para a manutenção da marca: O governo americano chegou a processar a Coca em um julgamento em 1911. Não deveria haver cafeína em uma bebida servida às crianças. E a defesa da Coca foi dizer que as crianças não bebiam o refrigerante. O que era ridículo, pois bebiam. Mas desde 1911 criou-se uma regra implícita na empresa de jamais mostrar uma criança menor de 12 anos bebendo o refrigerante nos anúncios. E isso criou um dilema: Como iam atrair as crianças? A resposta da Coca foi usar modelos no limite da idade, mas sem ultrapassá-los. […] Eles sabiam que acostumar a garotada desde cedo com a Coca-cola é a melhor garantia de ter consumidores no futuro. Não há dúvida que a descoberta das crianças como principal público da marca se revelou fundamental para o sucesso desta bebida no mundo todo, desde a sua criação até hoje. Ainda sobre as cores, Farina (1975:74) explica-nos: As cores constituem estímulos psicológicos para a sensibilidade humana, influindo no indivíduo, para gostar ou não de algo, para negar ou afirmar, para se abster ou agir. Muitas preferências sobre as cores se baseiam em associações ou experiências agradáveis tidas no passado e, portanto, torna-se difícil mudarem as preferências sobre as mesmas. Mais adiante, o autor (1975:74) nos apresenta o que os cientistas estabelecem a respeito do significado psicológico das cores. Sobre o branco e o vermelho, ele afirma: BRANCO: Associação material – batismo, casamento, cisne, lírio, primeira comunhão, neve, nuvens em tempo claro, areia clara. Associação afetiva – ordem, simplicidade, limpeza, bem, pensamento, juventude, otimismo, piedade, paz, pureza, inocência, dignidade, afirmação, modéstia, deleite, despertar. VERMELHO: Associação material – rubi, cereja, guerra, luta, sinal de parada,
  • 6. 6 perigo, vida, sol, fogo, chama, sangue, combate, lábios, mulher, ferida, rochas vermelhas. Associação afetiva – dinamismo, força, baixeza, energia, revolta, movimento, barbarismo, coragem, furor, esplendor, intensidade, paixão, vulgaridade, poderio, vigor, glória, calor, violência, dureza, excitação, ira, interdição. A Coca-cola usa o vermelho e o branco nas suas embalagens, e estas cores são fortemente associadas à marca. Ao olharmos o uso conjunto destas cores, imediatamente associamos ao produto. A energia do vermelho lembra-nos a própria energia da juventude e os esportes. A Coca-cola sempre está presente nos grandes eventos esportivos. O branco lembra- nos de fatos importantes da infância e de ritos de passagem: batismo, primeira comunhão, casamento. E é associado a simplicidade, limpeza, juventude, inocência. Um trecho do documentário deixa-nos claro que a marca explorou em sua publicidade estes aspectos emocionais: “Mas a imagem da Coca também evocava a nostalgia de uma vida mais simples. […] Por duas décadas os anúncios da Coca-cola e momentos especiais da vida ficaram imutáveis”. Para tentarmos compreender as necessidades do consumidor, com base na psicologia, e o seu relacionamento com o produto Coca-cola, é fundamental apresentar a teoria de Abraham Maslow, que formulou uma hierarquia de necessidades biogênicas e psicogênicas, em que níveis de motivos são especificados. Podemos ver que a bebida procura suprir muito mais do que a necessidade de saciar a sede. Abaixo, uma figura da hierarquia das necessidades de Maslow, extraída do livro de Solomon (2002:100). Figura 1 – Níveis de necessidades na hierarquia de Maslow. Fonte: O comportamento do consumidor (Solomon:2002). Solomon (2002:100) faz uma importante observação sobre a teoria de Maslow: A lição básica da hierarquia de Maslow é a de que devemos primeiro satisfazer as necessidades básicas antes de avançarmos um degrau (isto é, um homem faminto
  • 7. 7 não está interessado em símbolo de status, amizade ou autorrealização). Isso implica que os consumidores valorizam diferentes atributos de um produto, dependendo do que está disponível para eles no momento. […] A aplicação desta hierarquia pelos profissionais de marketing tem sido um pouco simplista, especialmente porque o mesmo produto ou atividade pode satisfazer várias necessidades diferentes. A Coca-cola ocupou, e ainda ocupa, a base da pirâmide das necessidades. Como podemos observar na Figura 1, ela ocupa o lugar das necessidades fisiológicas, pois mata a sede, e também funciona – pelo menos vendia este conceito - como um remédio. Como observou Solomon (2002), o mesmo produto pode satisfazer outras necessidades. Neste caso, ela ocupa também o lugar da associação, pois a sua publicidade, em especial os anúncios de TV, demonstra isso. As pessoas felizes, reunidas, vivendo e sorrindo, sempre associadas ao consumo do produto. A partir deste ponto, podemos perceber que mais do que um produto, o consumidor quer adquirir uma identidade, quer mais do que apenas, saciar desejos primários. Baudrillard (1995) apud Giglio (2002:237) coloca a questão de maneira clara ao definir que o consumo transformou-se na moral do mundo contemporâneo: O homem ocidental perdeu primeiramente seu sobrenome como padrão de identidade. Posterior, mas não completamente, perdeu sua profissão como indicador de identidade. Agora sua identidade é dada pelos bens que possui e essa forma de definição de 'quem sou eu' constitui o âmago do consumismo. Os meios de comunicação de massa, por meio da propaganda, influenciam fortemente o comportamento de toda a sociedade e, na maioria das vezes, as pessoas nem sequer percebem a influência exercida. Pedrinho A. Guareschi, no livro Sociologia Crítica – Alternativa de Mudança (1990:111), chama a atenção para o que ele chama de comunicação afetiva, inconsciente, conotativa: É a comunicação baseada não na razão e nas qualidades objetivas do objeto, mas numa relação secundária, construída através de ligações e relações estabelecidas com as forças básicas, geralmente inconscientes, existentes em toda a pessoa humana. Essas forças básicas são os desejos e aspirações que todos nós possuímos, como, por exemplo o desejo de realização, o desejo de sucesso, o desejo de liberdade, o desejo de estima, desejo de amar e ser amado, a força sexual, o desejo de prestígio, de aceitação, de ser identificado e aceito como pessoa humana. Todos nós temos esses desejos, forças e aspirações, e estão ligados ao mais profundo de nosso ser. O consumidor não busca apenas “matar a sede” como razão do consumo da coca-cola ou, no caso de adquirir (consumir) marcas de automóveis, de um meio de locomoção. Ele busca “ser alguém”, ou melhor, busca um “eu” idealizado ao consumir. Existe o “eu real” e o “eu desejado”. O “eu real” é o que somos realmente. O “eu desejado” é o que almejamos ser. Ao beber uma Coca-cola, queremos nos sentir parte de um grande grupo mundial, feito de pessoas jovens, ativas e divertidas. Ao encontrá-la em um local distante, ela nos proporciona uma sensação de segurança e bem-estar. Ganhamos afeto por meio do consumo do produto. Marilena Chauí (2009:294) salienta o que é feito na propaganda moderna, e alerta para o esvaziamento de alguns conteúdos a partir do consumismo: Em outras palavras, a propaganda ou publicidade comercial passou a vender imagens e signos e não as próprias mercadorias. […] A propaganda comercial também se apropria de atitudes, opiniões e posições críticas ou radicais existentes na
  • 8. 8 sociedade, esvazia seu conteúdo social ou político e as investe num produto, transformando-as em moda consumível e passageira. Feminismo, guerrilha revolucionária, movimentos culturais de periferia, liberação sexual, direitos humanos, etc. são transformados em qualidades que vendem um produto. O investimento em propaganda tem como alvo todos as pessoas que assistem e escutam, ou seja, que são atingidas por sensações visuais ou auditivas (e até mesmo outras sensações, como o cheiro). A forma como ela chega a cada sujeito certamente passará pela subjetividade, ou seja, por aquilo que é próprio de cada indivíduo. Porém, existem questões que o consumidor investe para estar inserido num grupo, seja isto a favor do produto ou contra ele. Segundo Blackwell e outros autores (2005:220), os analistas de consumo se aproximam das respostas dos porquês dos gostos das pessoas ao empregar as três grandes teorias: psicanalítica, psicologia social e fator-traço: A Teoria Psicanalítica de Freud reconhece que a personalidade humana consiste em id, ego e superego. O id é a fonte da energia psíquica e busca de gratificação imediata para as necessidades biológicas e instintivas. O superego representa normas pessoais e sociais e funciona como um obstáculo ético ao comportamento. O ego media as demandas hedônicas do id e as proibições morais do superego. A interação dinâmica desses elementos resulta nas motivações inconscientes que se manifestam no comportamento humano observado. Sigmund Freud acreditava que a personalidade é derivada do conflito entre o desejo para satisfazer as necessidades materiais e a necessidade de ser um membro da sociedade. A psicologia social reconhece a interdependência entre o indivíduo e a sociedade. O indivíduo esforça-se para atender as necessidades da sociedade, enquanto a sociedade auxilia o indivíduo a atingir seus objetivos. A teoria é então a combinação de elementos sociológicos e psicológicos. A Teoria do fator-traço é um enfoque quantitativo da personalidade, o qual postula que a personalidade individual inclui as predisposições chamadas características pessoais. Uma característica pessoal é qualquer forma perceptível e relativamente duradoura na qual os indivíduos diferem uns dos outros. […] Os analistas de consumo podem identificar traços muito úteis no planejamento de marketing, como adoção de risco, autoconsciência e necessidade de reconhecimento […] Alguns anúncios fazem uso da tendência de alguns consumidores de comprar e possuir produtos que são uma extensão de si próprios ou um reflexo do que gostariam de ser. Segundo Giglio (2002:59), “uma das teorias mais conhecidas e utilizadas em marketing é a da psicodinâmica de Freud”. O autor alerta para o fato de que “qualquer tentativa de resumir a obra de Freud está fadada ao fracasso”. A aplicação das teorias de Freud voltada para o consumo certamente gera algumas polêmicas, dúvidas e revela “um certo desconhecimento sobre os fundamentos dela e uma inconsistência do uso de seus pressupostos”, segundo Giglio. Portanto, vamos comentar as formas mais usuais da teoria de Freud usadas na área de consumo, já que este autor não possui obras voltadas para esta área. O que existem são adaptações voltadas para a compreensão deste processo. De acordo com Giglio (2003:60) “profissionais de marketing têm utilizado o conceito de inconsciente para criar as mais diversas explicações sobre os motivos do consumo”. E o autor faz uma interpretação sobre esta conceito, ressaltando que “o consumo seria explicado […] como o comportamento resultante desses conteúdos inconscientes, isto é, o comportamento de consumo é uma das formas de satisfação dos desejos inconscientes” (2003:61). A partir daí, temos várias formas de explicar esta teoria aplicada ao consumo da Coca-
  • 9. 9 cola; algumas já explicadas anteriormente, como a necessidade de se criar uma identidade por meio do consumo do produto. Mais adiante, vamos explorar a associação da mitologia com o consumo, que tem na teoria dos arquétipos, de Carl Jung, a principal base. O consumidor faz associações entre o uso do produto e desejos presentes em seu inconsciente. Giglio cita o exemplo de um carro, que é um dos objetos de consumo mais desejados. E diz que “se um carro tem como propósito transportar o sujeito de maneira mais rápida, não é este o argumento de venda”. A aquisição de um carro busca atender desejos como sucesso afetivo, de demonstrar poder, virilidade, entre outras tantas associações. No caso da Coca-cola, temos os desejos de associação (amizade, inclusão social), da lembrança de momentos importantes da vida, de consumir algo “proibido” (em especial nos primeiros anos de história da bebida), de sentir-se como parte do “sonho americano” e do “modo americano de vida”. No caso dos produtos de baixa caloria temos o desejo de expressar saúde, cuidado com o corpo, de um modo de vida ligado ao esporte e hábitos saudáveis. Para compreender porque os consumidores variam em suas decisões de compra individuais é importante saber o que representam, também, os valores. Blackwell (2005:223) define: Os valores representam as crenças dos consumidores sobre a vida e os comportamentos aceitáveis. Diferentemente das atitudes, os valores transcendem as situações ou eventos e são mais duradouros pelo fato de serem mais centrais na estrutura da personalidade. Os valores representam três requisitos universais da existência humana: necessidades biológicas, requisitos de interações sociais coordenadas e demandas pela sobrevivência e funcionamento do grupo”. A Coca-cola, por manter uma associação com os EUA, incorporou à marca muito dos valores associados a este país, valores como democracia, da importância da prosperidade individual por meio do trabalho duro, da igualdade de direitos, etc. O conceito de estilo de vida é muito popular na compreensão do consumidor entre os profissionais de marketing. Segundo Blackwell (2005:228): O estilo de vida é um constructo sumário definido como padrões nos quais as pessoas vivem e gastam tempo e dinheiro, refletindo as atividades, os interesses e as opiniões (AIOs) das pessoas, assim como as variáveis demográficas […] Os valores são relativamente permanentes; os estilos de vida mudam mais rapidamente. Com o advento do culto ao corpo, a partir dos anos 80, a companhia de refrigerantes lançou a linha de baixas calorias, cuja publicidade procurou associar ao estilo de vida saudável. A empresa, progressivamente, comprou empresas de sucos naturais. Recentemente, foi lançado um produto da Coca-cola com vitaminas e sais minerais. O produto clássico ainda é o principal da empresa, e a sua publicidade procura sempre usar pessoas magras e saudáveis associadas ao produto, explorando a alegria e a energia ao usá-lo, já que cada vez mais o consumo de refrigerantes é percebido como pouco saudável. Certamente, fortalecendo-se esta tendência, a Coca-cola clássica terá uma forte diminuição de consumo. Porém, os novos produtos da empresa vão garantir este desejo de estilo de vida saudável, preservando, ao mesmo tempo, as já tradicionais características do produto. Além dos fatores relacionados a psicologia, também há outra questão, no qual atribuímos importância relacionada ao consumo: o Mito.
  • 10. 10 4. A COCA-COLA COMO MITO Há uma grande relação entre as mulheres e a Coca-cola, estabelecida logo no início da história do produto. De acordo com o documentário Mundo-Cola (1998), além do interesse das mulheres, em especial, pelo tônico, que virou uma bebida “deliciosa e refrescante”, a marca optou por diferenciar a garrafa, com a intenção de combater a concorrência. Devido a isso, a garrafa adquiriu contornos femininos. No início do documentário Mundo-Cola (1998), um trabalhador aposentado da Coca-cola, Warren Portwood, diz que: “A Coca-cola é o meu amigo. Está em toda a parte, como uma mãe”. Certamente, podemos perceber, por meio destes exemplos, que esta associação da Coca como mulher, ou mãe, tornou-se comum entre os consumidores. Portanto, vários aspectos são agregados à marca por meio desta ligação psicológica. Pensamentos como: “a Coca-cola está em toda parte”, “ela sacia a sua sede”, ela é como a sua mãe”, estão presentes na forma de pensar de muitos consumidores. É importante lembrar que o primeiro contato de um bebê com a sua mãe é por meio do leite materno, que nutre e tira a sede do bebê. É o primeiro estágio de socialização do bebê. Com certeza, um produto que constrói a sua identidade em torno dos atributos de uma mulher, de uma mãe, e mata a sede, dando energia a pessoa, poderá obter sucesso, pois está explorando uma ligação emocional como base da constituição do sujeito e com forte presença em questões do inconsciente. Durante décadas os cartazes da Coca-cola usaram mulheres para divulgar os produtos. Estes anúncios foram os primeiros passos na construção da Coca-cola como um mito. A ligação das consumidoras com a Coca foi muito importante para o produto desde o início, pois foram elas que acharam a bebida saborosa para ser consumida sempre, não só como um tônico energizante, um “remédio”. Isto foi se fortalecendo ao longo da história da marca, e ajudou a construir uma forte relação emocional com o produto, e transformando a Coca-cola em um mito. E um mito feminino, como o livro de Sal Randazzo (1996) ajuda-nos a entender. Na mitologia podemos encontrar explicações para a ligação emocional do consumidor com a Coca-cola. Randazzo (1996:11) afirma que “os produtos são mais sedutores quando chegam envolvidos em mundos míticos e encarnados por personagens heróicos”. E Randazzo (1996:12) explica que “as mesmas imagens universais (arquetípicas) que fornecem a base de muitas das nossas mitologias culturais também são os alicerces de inúmeras imagens usadas em publicidade”. A Coca-cola começou a construir a sua mitologia desde a sua criação. Na segunda guerra mundial, ela fortaleceu a sua imagem como um símbolo da cultura americana. A Coca- cola, como um deus (ou deusa), começou a tornar-se presente em todos os lugares do mundo, desde os mais remotos. E na guerra, longe de casa, todo soldado americano poderia encontrá- la a um preço acessível. Muitos enredos míticos foram construídos em torno deste produto durante a guerra e ao longo da história, como o caso citado no documentário Mundo-Cola (1998), onde um soldado, após ser atingido e ferido, tocou ao acaso em uma garrafa de Coca- cola, e a lembrança de casa que o produto proporcionou fez com que ele mantivesse a esperança e permanecesse vivo, até ser resgatado. Um enredo digno dos fantásticos relatos oriundos da mitologia. Após o término da Segunda Guerra, a Coca-cola agregou à marca um importante conceito que persiste até hoje: o de um dos símbolos do império americano. Portanto, ela tem a imagem relacionada com muitas coisas que representam, principalmente, o chamado sonho
  • 11. 11 americano, ou o estilo americano de vida. No documentário Mundo Cola (1998) é citado este fato: Vemos a imensa popularidade dos produtos americanos. E uma das questões é: porquê? Parte da resposta é que estamos vendendo os próprios EUA. E os EUA são um produto realmente incrível. Um produto que reúne oportunidade e um pouco mais de justiça social do que muitos países possuem. Representa um monte de coisas boas que eu, você e muita gente valoriza. O mundo começou, de maneira progressiva, a perceber este produto como dotado de poderes míticos. Ela foi, inclusive, incorporada a muitas mitologias locais. O documentário Mundo Cola (1998) mostra que, muitas vezes, a Coca é associada a uma divindade, sendo que no México, por exemplo, é utilizada em rituais de xamãs: A Coca foi incorporada e muitos rituais, incluindo o ritual de cura dos xamãs e as purificações que fazem com o cacau. Teve um impacto tão grande nas comunidades indígenas e tamanha influência que se tornou uma espécie de água sagrada […]. Em outro trecho do documentário, um antropólogo comenta: Quando as pessoas tinham alguma noção verdadeira de divindade sua identidade costumava ser moldada em relação a esta divindade. Como esse conceito foi substituído pela noção de que você pode se construir a partir daquilo que deseja ser, por meio do consumo, podemos dizer que o consumismo entrou no lugar de uma ideologia mais antiga. Se eu tenho um Mercedes Benz e um Rolex, se tiro férias em San Moritz, é assim que me mostro ao mundo... o tipo de pessoa que sou. Eu sou aquilo que consumo. Essa imagem não diz nada sobre o meu caráter ou como me relaciono com as pessoas, mas eu ganho uma identidade que é constituída a partir de marcas. É a isso que o consumismo nos leva. E ele é, neste sentido, uma nova religião. Por ser cultuado o consumo, o produto é “endeusado”. Do necessário, passa a ser fundamental o seu uso, e isso fará a diferença na vida dos consumidores. Assim como o culto a qualquer entidade faz a diferença na vida e no viver de cada um. Solomon (2002), citando Joseph Campbell, autor do livro “Miths, dreams and religion”, explica-nos sobre as funções e a estrutura dos mitos: Os mitos têm quatro funções inter relacionadas em uma cultura: 1. Metafísica: ajudam a explicar as origens da existência. 2. Cosmológica: enfatizam que todos os componentes do universo são parte de um único cenário. 3. Sociológica: mantém a ordem social autorizando um código social a ser seguido pelos membros de uma cultura . 4. Psicológica: fornecem modelos para conduta pessoal. Podemos encontrar algumas destas funções e estruturas dos mitos dentro da história e publicidade da Coca-cola. Em um dos comerciais mais famosos da bebida - segundo o documentário Mundo-Cola (1998) - várias pessoas, de várias etnias, cantam: “Eu queria comprar um lar para o mundo e mobiliá-lo com amor”. E também: “Eu queria ensinar o mundo a cantar em total harmonia. Eu queria pagar uma Coca para o mundo e lhe fazer companhia.”. Neste anúncio, que é considerado um dos mais bem sucedidos da história (Mundo-Cola, 1998), fica evidente o uso da função cosmológica, onde, por meio do consumo do produto, todos sentem-se como parte de uma mesma família, do universo. Este anúncio, e o fato de que podemos encontrar o refrigerante em qualquer local do mundo, atuaram
  • 12. 12 conjuntamente para construir e reforçar o processo de mitificação da Coca-cola. A função sociológica, por sua vez, é derivada do fato de que a Coca-cola é um símbolo dos Estados Unidos, e muitas das coisas atribuídas ao país mais rico do mundo - cuja cultura, padrões de comportamento, visão política e social é assimilada por outros países – são agregadas ao produto. A função psicológica, por sua vez, é frequente em vários anúncios ao longo da história do refrigerante, e é comumente usada na publicidade moderna. No início, a Coca-cola era usada por seus poderes “energizantes”. Os produtos usados na sua fórmula – a folha de coca e a noz-de-cola - criaram uma aura de coisa proibida, de subversão, o que sempre atraiu os jovens. Segundo é descrito no documentário Mundo-Cola (1998) “é uma ironia que a Coca- cola seja feita sem cocaína desde 1903, e que as pessoas continuem achando que ela contém alguma droga”. O documentário diz que na produção da Coca-cola “é usada folha de coca até hoje, mas toda a cocaína é retirada”. Muitas mulheres jovens consumiam o produto em conjunto com comprimidos, e segundo o documentário Mundo-Cola, muitas usavam a seguinte frase na época: “meninas decentes não devem tomar duas aspirinas e Coca, porque isso faz você cometer loucuras”. O que em alguns casos instigavam-nas a cometer “algo proibido” fazendo beber o produto junto com este medicamento. Randazzo (1996:11), citando a obra de Carl Jung, apontou que “os mitos, assim como os sonhos, são na verdade projeções que emanam da alma ou da psique inconsciente”. E, ainda, salientou que “os mitos representam sonhos coletivos […] e que, de alguma forma funcionam como instintos ao moldarem o nosso comportamento”. Por meio de Randazzo (1996), que tem na obra de Jung as bases do seu livro, podemos compreender que uma das associações mitológicas mais profundas com a marca Coca-cola é a imagem baseada no arquétipo da Grande Mãe, que “aparece em todas as mitologias culturais e que representa o instinto nutricional presente em todos nós”. A Coca-cola incorpora traços arquetípicos e instintivos da Grande Mãe, como o de uma mãe cuidadosa, amorosa, e dotada de enorme ternura, como pode-se concluir observando a história da marca. Outro arquétipo feminino associado com a Coca-cola é o da “Donzela”, usado nos primórdios da publicidade da marca. O produto era associado “com lindas e saudáveis garotas tipicamente americanas”, de acordo com Randazzo. E segundo ele, uma imagem permaneceu constante mesmo com o passar dos anos: “a Garota Coca-cola é alguém que você pode levar para casa e apresentar à sua mãe”. Nos primeiros tempos era associada ao mito da “Donzela”; agora é associada à imagem da “Grande Mãe”, pela sensação de bem estar quando presente, de segurança, aconchego, de boas lembranças, como de forma geral as mães significam para seus filhos. Podemos perceber que, uma questão importante e que pode estar associado à marca ao sucesso foi relacionar-se a um mito. Pelo caráter simbólico, pelo endeusamento da marca e pelo efeito que ela provoca simbolicamente na vida das pessoas. Através de ritos a marca está presente, seja em festas simples até cerimônias ou eventos que reúnem um grande público a coca cola reúne pessoas e gerações. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
  • 13. 13 Na construção de uma marca, o uso de teorias da psicologia são de fundamental importância, afinal, sabe-se que com o advento do marketing as pessoas não adquirem os produtos pelos seus benefícios em si, mas sim, por ligações emocionais que, na maioria das vezes, estão no inconsciente das pessoas, e que tem na obra de Freud, entre outros, um dos principais suportes para o entendimento destas relações. As marcas mais conhecidas do mundo tem uma associação com a mitologia, onde a obra de Carl Jung, sobre os arquétipos e o inconsciente coletivo, é fundamental para compreender como se dá esta relação. As marcas possuem enredos míticos, que são incorporados à sua imagem. Randazzo lembra-nos que “em certo sentido, praticamente toda a publicidade é uma forma de criar mitos. Cada anúncio e cada comercial é uma mitologia individual, que também contribui para a mitologia geral da marca”. (1996, p. 86.) A publicidade moderna explora toda esta gama de necessidades inconscientes em benefício dos seus produtos, já que os atributos apenas racionais podem não garantir uma marca forte e competitiva. O apelo emocional, a ligação afetiva com os produtos são mais duradouras do que a maioria dos argumentos racionais. A TV, o cinema, as imagens de anúncios em revistas e na internet constroem uma história emocional, mitológica, que penetra na mente do consumidor e transforma os produtos em personificações do desejo inconsciente ou, de certa maneira, aparentemente consciente, onde sabe-se que, muitas vezes, a mensagem enviada pelo possuidor do produto é entendida por outros consumidores como uma espécie de código linguístico, por exemplo, “Eu sou sociável, sou jovem, alegre, tenho um estilo de vida americano, portanto, bebo Coca-cola”. “Eu sou poderoso e viril, portanto, tenho uma Ferrari”. “Eu sou uma mãe cuidados e zelosa pela minha família, portando, uso OMO”. “Eu sou moderno, ligado em novas tecnologias, inteligente e descolado, rico, portanto, uso um computador da Apple”. A preocupação em relação a estes desejos é que eles podem fugir do controle do indivíduo e da sociedade. Estamos em uma era em que os nossos desejos de consumos parecem ser insaciáveis. No livro Filosofando – introdução à filosofia, Aranha e Martins falam sobre a sociedade pós-moderna: o hiperconsumo, que é um fenômeno muito discutido por pensadores dos nosso tempo: O filósofo Gilles Lipovetsky, por exemplo, prefere não demonizar o consumo, mas aceitá-lo como fenômeno do nosso tempo. Ele observa que, desde o final dos anos 1970, devido às técnicas de marketing e de preços mais baixos, os bens se tornaram acessíveis a maior número de pessoas, inclusive as de menor poder aquisitivo, ávidas de compras nos grandes magazines. Desse modo, surgiu uma nova fase de consumo mais intimista e personalizada. Por destacar no consumo o processo de personalização, Lipovetsky recusa-se a aplicar à sociedade pós moderna o conceito marcuseano de unidimensionalidade. Também critica Foucault , identificando que houve uma redução progressiva do processo disciplinar no trabalho. […] Apesar de considerar o consumidor mais crítico, Lipovetsky reconhece o poder massificante da publicidade e os malefícios do hiperconsumismo, entendido como a ilusão de que a mercadoria nos garantiria a felicidade. […] O risco é deixar que o consumo se converta no sentido principal da vida das pessoas. Ficam as perguntas: muitas pessoas não estão consumindo para se transformarem em algo que não são ou que nunca serão? A publicidade excessiva, que invade todos os nossos espaços, não está criando uma geração cada vez maior de pessoas que preferem o prazer do
  • 14. 14 consumo ao invés de procurarem relações sociais verdadeiras e de procurar transformar o seu país, em detrimento de beberam na fonte da felicidade alheia? Onde está o limite das nossas ilusões e onde começam os sonhos de verdade, que podem melhorar as nossas vidas e a nossa humanidade? O nosso desejo de consumir além do que necessitamos não está prejudicando os recursos naturais do nosso planeta? Um dos caminhos que podemos seguir é o de educar as pessoas para o consumo. Cientes do real motivo pelo qual consomem, elas podem tornar-se mais responsáveis. E este é um desafio para os primeiros anos de escola, e que se deve estender até a vida adulta. REFERÊNCIAS ANGELICO, Irene. Mundo Cola: uma trilogia; a construção de um mito; guerra e paz; dominando o planeta. DLI Productions. s.d. ARANHA, Maria Lúcia de Arruda; MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: Introdução à filosofia. 4. ed. São Paulo: Moderna, 2009. BLACKWELL, Roger D.; MINIARD, Paul W.; ENGEL, James F. Comportamento do consumidor. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2005. CASTRO, Ana Lúcia de. Culto ao corpo: identidades e estilos de vida. VIII Congresso Luso- Afro-Brasileiro de Ciências Sociais. Centro de Estudos Sociais, Faculdade de Economia, Universidade de Coimbra. 2004. COCA-COLA BRASIL. A história da Coca-cola no mundo. Disponível em: <http://www.cocacolabrasil.com.br/conteudos.asp?item=2&secao=39&conteudo=103&qtd_c onteudos=1> Acesso em 5 out. 2011. CHAUI, Marilena. Convite à filosofia. 13. ed. São Paulo: Ática, 2009. FARINA, Modesto. Psicodinâmica das cores em publicidade. São Paulo: Edgard Blücher, Ed. da Universidade de São Paulo, 1975. FREUD, Sigmund. Três ensaios sobre a teoria da sexualidade: Obras psicológicas completas. Edição Standart Brasileira. Vol VII. Rio de Janeiro: Imago, 1996. GIGLIO, Ernesto M. O comportamento do consumidor. 2. ed. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2003. GUARESCHI, Pedrinho A. Sociologia Crítica: Alternativa de Mudança. 31. ed. Porto Alegre: Mundo Jovem, 1990. INTERBRAND. Consultoria. Disponível em: http://economia.estadao.com.br/ Acesso em 13 out. 2011. LIMA, Renata. O fascinante mundo das coleções: Coca-Cola. Disponível em: http://www.brasilcult.pro.br/ensaios/cola/coca_cola.htm> Acesso em 5 out. 2011. LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo.
  • 15. 15 São Paulo: Companhia das Letras, 2007. MASLOW, A. H. Introdução à psicologia do ser. 2. ed. Rio de Janeiro: EldoradoTijuca, s.d. PENDERGRAST, Mark. Por Deus, pela pátria e pela Coca-Cola: a história não autorizada do maior dos refrigerantes e da companhia que o produz. Rio de Janeiro: Ediouro, 1993. RANDAZZO, Sal. A criação de mitos na publicidade: como os publicitários usam o poder do mito e do simbolismo para criar marcas de sucesso. Rio de Janeiro: Rocco, 1996. RENNER, Estela. Criança, a alma do negócio. Maria Farinha Produções. s.d. SÁ, Sylvia de. Coca-Cola Brasil impulsiona crescimento da marca no mundo. Disponível em <http://www.mundodomarketing.com.br/9,17564,coca-cola-brasil-impulsiona- crescimento-da-marca-no-mundo.htm> Acesso em: 5 out 2011. SILVA, Chrystiane. O light caducou. Veja on-line. 2007. Disponível em <http://veja.abril.com.br/310107/p_062.html> Acesso em 5 out. 2011. SOLOMON, Michael R. O comportamento do consumidor: comprando possuindo e sendo. 5. ed. Porto Alegre: Bookman, 2002.