[1] O documento analisa a admissibilidade do Projeto de Lei 158/2011, que estende o benefício do auxílio-transporte aos policiais e bombeiros militares do Distrito Federal. [2] Contudo, a Constituição Federal reserva à União a competência para legislar sobre vencimentos e organização das polícias civil e militar do DF. [3] Além disso, a iniciativa de leis sobre servidores públicos do DF é privativa do Governador, conforme a Lei Orgânica local.
1. CÂMARA LEGISLATIVA DO DISTRITO FEDERAL
ASSESSORIA LEGISLATIVA – ASSEL
UNIDADE DE CONSTITUIÇÃO E JUSTIÇA
Assunto: admissibilidade do PL 158/2011
Interessado: Deputado Patrício
CONSULTA
Em atendimento à solicitação do Senhor Presidente da Câmara Legislativa do
Distrito Federal, Deputado Patrício, responde-se à questão formulada acerca da
admissibilidade do Projeto de Lei 158/2001.
O projeto de Lei 158/2011, de autoria do Deputado Olair Francisco, altera a
Lei 2.966, de 7 de maio de 2002, e revoga a Lei 280, de 19 de junho de 1992. A Lei
2.966/2002 instituiu o auxílio- transporte para os servidores civis da administração
direta, autárquica e fundacional do Distrito Federal. O art.1º do PL 158/2011 determina
que se dê nova redação ao art. 1º da Lei 2.966/2002 para que se estenda aos policiais
militares e aos bombeiros militares o benefício do auxílio-transporte. No art. 2º do PL
em análise, verifica-se a cláusula de vigência e, no art. 3º, a de revogação, com
determinação expressa de revogação da Lei 280/92, que assegurou a livre locomoção
aos policiais militares e bombeiros militares em todos os veículos de transporte público
coletivo do Distrito Federal.
Deve-se destacar, inicialmente, conseqüência aparentemente não desejada pelo
legislador no projeto de Lei 158/20121. É que ao dar nova redação ao art.1º da lei
2.966/2002 e não, como talvez desejasse o autor do projeto, dar nova redação ao caput
do art. 1º da Lei 2.966/2002, revoga-se o parágrafo único que consta do art. 1º que se
quer alterar:
LEI, Nº 2.966, DE 7 DE MAIO DE 2002
(Autoria do Projeto: Poder Executivo)
1
2. Institui o auxílio-transporte para os servidores civis da Administração Direta,
Autárquica e Fundacional do Distrito Federal e dá outras providências.
O GOVERNADOR DO DISTRITO FEDERAL,
Faço saber que a Câmara Legislativa do Distrito Federal decreta e eu
sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º Fica criado o auxílio-transporte, a ser pago em pecúnia ou em vale-
transporte, vantagem de natureza indenizatória, destinada exclusivamente ao
custeio parcial das despesas realizadas com transporte coletivo, inclusive
interestadual, pelos servidores civis da administração direta, autárquica e
fundacional do Distrito Federal, nos deslocamentos de suas residências para
os locais de trabalho e vice-versa, excetuadas aquelas realizadas nos
deslocamentos em intervalos para repouso ou alimentação, durante a jornada
de trabalho, e aquelas efetuadas com transportes seletivos ou especiais.
Parágrafo único. É vedada a incorporação do auxílio instituído por esta Lei à
remuneração, aos vencimentos ou aos subsídios pagos aos servidores civis;
não podendo ser computado nem cumulado para fins de acréscimos
posteriores, nem servir de base para cálculo de qualquer vantagem
pecuniária, bem como a sua caracterização para fins de incidência de imposto
de renda ou de contribuição para plano de seguridade social. (Parágrafo com
a redação da Lei nº 2.992, de 11/6/2002.) 1
Atendendo-se, portanto, ao que determina o art.1º do PL 158/2011, restaria
revogado o parágrafo único do art. 1º da Lei 2.966/2002.
Com relação à admissibilidade do Projeto de Lei 158/2011, deve-se observar
que a Constituição Federal determina que compete à União organizar e manter a polícia
civil, a polícia militar e o corpo de bombeiros militar do Distrito Federal.
Art.21. Compete à União:
(...)
XIV- organizar e manter a polícia civil, a polícia militar e o corpo de
bombeiros militar do Distrito Federal, bem como prestar assistência
financeira ao Distrito Federal para a execução de serviços públicos, por meio
de fundo próprio; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de
1998).
Em vista disso, após reiteradas decisões , pacificou-se , no Supremo Tribunal
Federal, o entendimento segundo o qual compete privativamente à União legislar sobre
vencimentos dos membros das polícias civil e militar do Distrito Federal. Em virtude
dessas reiteradas decisões, o Supremo Tribunal Federal fez publicar o enunciado 647:
1
Texto original: Parágrafo único. É vedada a incorporação do auxílio instituído por
esta Lei à remuneração, aos vencimentos ou aos subsídios pagos aos servidores civis,
não podendo ser computado nem cumulado para fins de acréscimos posteriores, nem
servir de base para cálculo de qualquer vantagem pecuniária.
2
3. Súmula 647
Compete privativamente à União legislar sobre vencimentos dos membros
das polícias civil e militar do Distrito Federal.
A jurisprudência que se consolidou no Supremo Tribunal Federal atribuiu,
inicialmente, à União a competência legislativa para normas que lhe acarretassem
despesas, como planos de carreira, aumento de salários, criação de benefícios, dentre
outras. Nos últimos anos, contudo, o Supremo Tribunal Federal vem entendendo que
toda e qualquer norma que diga respeito à organização das polícias civil e militar,
mesmo que não haja criação de despesas, competirá, também, privativamente à União.
Ademais, mesmo que não houvesse, no projeto de Lei 158/2011, o vício que se
configura, segundo o Supremo Tribunal Federal, em usurpação de competência
privativa da União, esse PL também representaria malferimento ao artigo 53 e ao
parágrafo 1º do art. 71, ambos da Lei Orgânica do Distrito Federal, uma vez que a
iniciativa de leis que tratem da concessão de benefícios, como o auxílio-transporte, para
servidores públicos do Distrito Federal é reservada ao Governador do Distrito Federal:
Art. 53. São Poderes do Distrito Federal, independentes e harmônicos entre
si, o Executivo e o Legislativo.
§ 1º É vedada a delegação de atribuições entre os Poderes.
§ 2º O cidadão, investido na função de um dos Poderes, não poderá exercer a
de outro, salvo as exceções previstas nesta Lei Orgânica.
Art. 71. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer
membro ou comissão da Câmara Legislativa, ao Governador do Distrito
Federal e, nos termos do art. 84, IV, ao Tribunal de Contas do Distrito
Federal, assim como aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Lei
Orgânica.
§ 1º Compete privativamente ao Governador do Distrito Federal a iniciativa
das leis que disponham sobre:
I – criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta,
autárquica e fundacional, ou aumento de sua remuneração;
II – servidores públicos do Distrito Federal, seu regime jurídico, provimento
de cargos, estabilidade e aposentadoria;2
III – organização da Procuradoria-Geral do Distrito Federal;
IV – criação, estruturação, reestruturação, desmembramento, extinção,
incorporação, fusão e atribuições das Secretarias de Estado do Distrito
2
Ver ADI nº 2007 00 2 011613-1 – TJDFT, Diário de Justiça de 4/8/2010, julgada procedente
para declarar a inconstitucionalidade por omissão do Governador do Distrito Federal quanto à
elaboração do Estatuto dos Servidores Públicos Civis do Distrito Federal.
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4. Federal, Órgãos e entidades da administração pública; (Inciso com a redação
da Emenda à Lei Orgânica nº 44, de 2005.)3
V – plano plurianual, orçamento anual e diretrizes orçamentárias.
§ 2º Não será objeto de deliberação proposta que vise a conceder gratuidade
ou subsídio em serviço público prestado de forma indireta, sem a
correspondente indicação da fonte de custeio.
Em face do exposto e com fundamento no inciso XIV do art. 21 da
Constituição Federal e na Súmula 647 do Supremo Tribunal Federal, verifica-se no
projeto de Lei 158/2011 inconstitucionalidade formal, consubstanciada no vício de
iniciativa do referido PL.
Esperando ter atendido à questão proposta, colocamono-nos, ainda, à
disposição para eventuais esclarecimentos e outros estudos ou pareceres.
Brasilia, 23 de fevereiro de 2011.
3
A Emenda à Lei Orgânica nº 44, de 2005, substituiu a expressão “Secretarias de Governo do
Distrito Federal” por “Secretarias de Estado do Distrito Federal”.
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