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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
               ESCOLA DE TEATRO
              CURSO DE LICENCIATURA




           VALDÍRIA SANTOS DE SOUZA




                NÓS NA CIDADE:
UMA INTERAÇÃO ENTRE TEATRO, EDUCAÇÃO E IDENTIDADE




                     Salvador
                      2008
VALDÍRIA SANTOS DE SOUZA




                NÓS NA CIDADE:
UMA INTERAÇÃO ENTRE TEATRO, EDUCAÇÃO E IDENTIDADE




                  Trabalho de Conclusão de Curso submetido ao
                  Curso de Licenciatura em Teatro na Escola de
                  Teatro da Universidade Federal da Bahia como
                  requisito parcial para obtenção do Grau de
                  Licenciado em Teatro.

                  Orientadora:Prof. Ms. Maria Eugênia Viveiros
                  Milet.




                     Salvador
                      2008
Sistema de Bibliotecas - UFBA

Souza, Valdíria Santos de.
   Nós na cidade : uma interação entre teatro, educação e identidade / Valdíria Santos de
Souza. - 2008.
   112 f. : il.

   Inclui anexos.
  Orientadora : Profª Ms. Maria Eugênia Viveiros Milet.
  Trabalho de conclusão de curso (monografia) - Universidade Federal da Bahia, Escola de
Teatro, Salvador, 2009.


    1. Teatro na educação. 2. Identidade social. 3. Identidade racial. 4. Negros - Vida e
costumes sociais - Salvador (BA). 5. Cidadania. 6. Criatividade. I. Milet, Maria Eugênia
Viveiros. II. Universidade Federal da Bahia. Escola de Teatro. III.Título.

                                                                    CDD - 372.66
                                                                    CDU - 792:37
VALDÍRIA SANTOS DE SOUZA




                             NÓS NA CIDADE:
    UMA INTERAÇÃO ENTRE TEATRO, EDUCAÇÃO E IDENTIDADE




Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito parcial para
obtenção do grau de Licenciado em Teatro, Escola de Teatro da Universidade
Federal da Bahia.




                                              Aprovado em 18 de junho de 2008




Maria Eugênia Viveiros Milet – Orientadora____________________________________
Mestra em Teatro pela Escola de Teatro
Universidade Federal da Bahia




Antônia Pereira Bezerra______________________________________________
Pós-Doutora em Dramaturgia pela Université du Québec à Montréal UQAM
Universidade Federal da Bahia




Urânia Auxiliadora Maia- Curso de Artes
Doutora em Educação pela Universidade Federal da Bahia na área de Teatro-Educação
Faculdade Social da Bahia
Ao meu pai Nelson Ribeiro de Souza (Seu
Nelson) e a minha mãe Valdenice Santos
de Souza (D. Nice), os meus primeiros
educadores e mestres na arte de viver, os
maiores responsáveis por tudo que eu
sou hoje.
AGRADECIMENTOS

A Deus e aos Orixás.


Aos meus pais, Nelson e D. Nice, aos meus irmãos Nilson e Nilton, as minhas
irmãs, Valdinéia, Valdirene, Valdineide, Lucineide, Marie e Maria Alice. Um
agradecimento especial a minha irmã Valquíria que colaborou com idéias para
escrita do meu TCC. Minha família que foi a minha primeira escola, que me
ensinou valores éticos e estéticos que me direcionou desde cedo ao caminho
das artes.


A Maria Eugênia, minha mestra, que não desistiu, que confiou, que me orientou,
que me deu a mão e o braço nesta jornada. Meu carinho e afeto por toda a vida.


Aos mestres com carinho, Sônia Rangel (pelos tempos de delicadeza), Luiz
Marfuz, Érico José, Iami Rebouças, Sérgio Farias, Luis Cláudio Cajaíba, Luciano
Bahia, Ana São José, Maria de Lourdes (saudosa Lurdinha), Antônia Pereira,
Urânia Maia, Ângela Reis, Héctor Briones, Fernanda Paquelet, André Rosa,
Paulo Dourado, Luciana Balbino (Escola Cid Passos), Edenice Santana de
Jesus (Centro Educacional Edgar Santos), Vanda Machado, Carlos Petrovich,
Renato da Silveira, Ordep Serra, Olímpio Serra, pela dedicação e generosidade.


Aos meus primeiros mestres na arte de representar: Équio Reis e Franklin
Costa.


Aos meus melhores amigos Tânia Soares e Rafael Morais que me ajudaram a
vir para Salvador, a permanecer e a entrar na faculdade, assim como a
permanecer nela, a lutar pelos meus sonhos e a criar meus caminhos. A eles,
minha amizade eterna.


A Carmen Paternostro, minha amiga e incentivadora.
Aos meus colegas e amigos que me agüentaram durante 4 anos na facul dade,
que dividiram comigo momentos tão doces e intensos, nesse processo de
educação e auto-conhecimento. Gessé, Eliana, Jandiara, Bira, Roseli, Ive,
Camila, Daiane, Wellington, Eliete, Rubenval, Diana, Emiliano e Carla, meu
agradecimento e admiração, por toda a contribuição na criação do processo e
pela amizade. Sem vocês esse trabalho não existiria.


Aos que entraram conosco, mas que por algum motivo, seguiram outro caminho,
mas que com certeza deixaram suas contribuições nas músicas e textos do
espetáculo Nós na Cidade. Mabele, Mariana, Jorge, Alexandre, Eliciana,
Roberto e Roque.


Aos meus colegas, do grupo Licenciatura 2005.1, que me receberam com
carinho e afeto. Meu agradecimento especial a Gonzalez pelas fotos e músicas
do nosso espetáculo, a Francisco pelo carinho e generosidade ao responder o
questionário que contribuiu com o TCC.


A equipe de Comunicação do CRIA, nas pessoas de Tássia Batista e S cheila
Gomes, pelos materiais cedidos e ao grupo CRIAPOESIA, pela companhia.

Ao ator e diretor Ângelo Flávio.


Ao Terreiro da Casa Branca.


A Doutora Tereza Cristina.


A todos os meus amigos e incentivadores, que estavam perto, ou mesmo os que
estavam longe, mas que torceram por mim. Meu muito obrigada!
Um povo sem conhecimento do seu passado
histórico, origem e cultura é como uma árvore
sem raízes.
    (Bob Marley)
Foto: Eliana Andrade de Souza
SOUZA, Valdíria Santos de. Nós na Cidade: uma interação entre teatro,
educação e identidade. 112f. 2008. Trabalho de Conclusão de Curso
(Graduação) – Curso de Licenciatura em Teatro, Escola de Teatro, Universidade
Federal da Bahia, Salvador, 2008.


                                      RESUMO


Estão descritos neste trabalho os processos metodológicos de construção do
espetáculo Nós na Cidade - espetáculo proveniente de um processo colaborativo
desenvolvido pela turma de Licenciatura em Teatro de 2004 – que possibilitaram minha
busca de auto-conhecimento, a formação de um grupo artístico e sua identidade como
grupo. Através da arte educação, os alunos/atores desse processo se encontraram com
a história da cidade de Salvador e com a história dos afro-brasileiros, possibilitando
assim, um pensamento crítico sobre a Educação Étnico-Racial e a Lei 10.639/2003,
através dos diálogos que realizaram com várias instâncias da cidade. O trabalho, que
inclui depoimentos dos integrantes e o texto resultante do processo criativo, apresenta
uma prática artística, política e pedagógica de teatro-educação baseado em jogos e
improvisação. Aponta para possibilidades de educação para cidadania, através do
exercício da criatividade, na dimensão cultural das cidades, valorizando as pessoas
como sujeitos históricos da sociedade a qual pertencem.



Palavras Chave: teatro, identidade, educação étnico-racial, cidadania e criatividade.
APRESENTAÇÃO



     Este trabalho é um relato da minha experiência como artista/educadora envolvida
no processo criativo de construção do espetáculo Nós na Cidade, desenvolvido pela
turma de Licenciatura 2004 a partir componente curricular Improvisação e Jogos
Dramáticos. Esta experiência foi vivenciada por mim e minha turma nos três primeiros
semestres (referentes aos Módulos I, II e III) no curso de Licenciatura da Escola de
Teatro da Universidade Federal da Bahia.

     A partir da metodologia desenvolvida no componente curricular Improvisação e
Jogos Dramáticos, orientado pela professora Maria Eugênia Milet, pesquisamos a
cidade de Salvador e nesse processo de pesquisa chegamos ao primeiro Candomblé
de Keto da Bahia e a sua primeira Mãe de Santo Iyá Nassô, o que nos levou a refletir
sobre a formação da sociedade brasileira através das matrizes estéticas culturais e
sobre a importância do teatro na educação, na formação do educando como cidadão
crítico e participante ativo da sociedade a qual ele pertence.

     Neste trabalho apresentamos uma proposta de arte-educação voltada para o
exercício da criatividade e cidadania, através do conhecimento e valorização da história
e expressão do povo negro, no contexto da construção de um currículo aberto às
manifestações culturais da cidade. Sendo assim tivemos como aspiração, inspirar e
revelar processos educacionais sensíveis e libertários de transformação social,
referendando lutas e conquistas, dentre as quais, a lei 10.639/2003, que obriga o
ensino da cultura afro-brasileira nas escolas públicas e particulares de ensino
fundamental e médio.

     A pesquisa sobre a cidade se deu através de um processo interdisciplinar e trans-
disciplinar proporcionado pelo novo modelo do currículo implantado na Escola de
Teatro, o que possibilitou o diálogo entre diversas áreas do conhecimento dentro e fora
da sala de aula. Foi realizada também uma pesquisa de auto-conhecimento – na
descoberta do Quem Sou Eu – e de conhecimento coletivo através do diálogo dos
alunos/atores uns com os outros e com a cidade. Uma experiência artística-política e
pedagógica, na qual o exercício da criatividade e de construção coletiva pôde fomentar
ricos processos de aprendizagem ligados à história do Brasil, da África, de Salvador e
dos Orixás.

     Este trabalho é um estudo de caráter histórico, descritivo, analítico e poético. A
poesia é trazida nas falas dos componentes do grupo que foram entrevistados e nas
citações de Paulo Freire sobre educação e as Cidades Educativas que permearam este
estudo sobre esse processo de formação individual e coletiva, através da prática
educativa de ensino/aprendizagem com o teatro. Queremos aqui destacar o processo
criativo “experenciado” e a “cidade educativa” que foi emergindo na construção desta
cidadania, e também na construção do espetáculo que espelhava uma Salvador feita
com lutas e expressões dos povos negros, com a sua espiritualidade. Aqui,
pretendemos refazer as dobraduras pelas quais fomos desvelando os cenários e as
personagens ocultadas da cidade, inclusive Nós na Cidade, alunos, aprendizes de um
novo tempo, Sujeitos criativos de nossa história.

     Este trabalho de conclusão de curso traz à tona meu processo pessoal de auto-
conhecimento, meu crescimento, minha consciência de pertencimento étnico cultural e
meu envolvimento e responsabilidade com a cidade e seus personagens. Está repleto
de gratidão e lembranças. Por exemplo, da professora Edenice Santana de Jesus
coordenadora pedagógica do Centro Educacional Edgard Santos, e também ex-aluna
da escola, - que esteve em nossa sala pedindo ajuda para sua luta diária de tentar
envolver a comunidade, os professores e os alunos na revitalização de sua Escola – no
início da sua palestra disse: “Sempre que eu vou começar qualquer atividade, peço
licença aos meus ancestrais”.

     Com esta gratidão, também peço licença a todos os nossos ancestrais e aos
Orixás para começar essa saudosa narrativa.

                                             Agô!
LISTA DE FIGURAS




Figura 01 – A pesquisa do figurino..................................................................................36
Figura 02 – O grupo e a professora no Pelourinho.........................................................43
Figura 03 – A Bahia Negra nos nossos traços e gestos.................................................45
Figura 04 – Francisco André em seu momento: Quem Sou Eu?....................................46
Figura 05 – Apresentação na frente de Câmara de Vereadores.....................................47
Figura 06 – Cantando Reconvexo...................................................................................49
Figura 07 – Ensaio na sala de aula.................................................................................49
Figura 08 – Arrumação da cena......................................................................................50
Figura 09 – Arrumação da cena......................................................................................51
Figura 10 – Torre de Babel..............................................................................................52
Figura 11 – Rubenval Meneses – o locutor.....................................................................54
Figura 12 – Cidade em festa em ritmo de xaxado...........................................................56
Figura 13 – Procissão de Doentes..................................................................................57
Figura 14 – Momento ônibus – processo em sala...........................................................58
Figura 15 – Vendedor e cliente – processo em sala.......................................................60
Figura 16 – Bira Azevedo – representando o padre da procissão..................................63
Figura 17 – Eliana Andrade em seu momento: Quem Sou Eu?.....................................63
Figura 18 – Apresentação em frente a Câmara de Vereadores......................................67
Figura 19 – Apresentação em frente a Câmara..............................................................69
Figura 20 – Mãe Tatá e outros membros do Terreiro assistindo ao espetáculo.............72
Figura 21 – Recebendo os aplausos do público.............................................................73
Figura 22 – O grupo na sala de aula...............................................................................75
Figura 23 – Momento de descontração...........................................................................86
SUMÁRIO



1       INTRODUÇÃO........................................................................................................13
2       EDUCAÇÃO ATRAVÉS DA ARTE: PROCESSOS EM RESULTADOS...............16
2.1     A CHEGADA...........................................................................................................17
2.2     A DESCOBERTA DO QUEM SOU EU...................................................................18
2.3     A FORMAÇÃO DO GRUPO...................................................................................27
2.4     NOSSA PRODUÇÃO..............................................................................................32
3       RESULTADOS EM PROCESSOS.........................................................................40
3.1     NÓS NA CIDADE....................................................................................................41
3.1.1 Sobre a encenação...............................................................................................41
3.1.2    O Texto..................................................................................................................47
3.2     MOBILIZAÇÃO SOCIAL, UMA QUESTÃO DE ATITUDE......................................64
3.3     UM OUTRO OLHAR SOBRE SALVADOR.............................................................76
4       PERSPECTIVAS PARA A CIDADE.......................................................................86
4.1     EDUCAÇÃO ÉTNICO- RACIAL, A LEI 10.639/2003..............................................87
4.2     REPERCUSSÕES NA UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA.............................96
5       CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................................99
        REFERÊNCIAS....................................................................................................101
        ANEXOS...............................................................................................................104
13



1     INTRODUÇÃO




     Axé é para os nagôs a idéia de forças circulantes capazes de engendrar a criação
e a expansão da vida, tornando tudo mais profundo mágico e forte. Nesta força nos
encontramos com nossa ancestralidade - com o povo africano - encontramos a energia
que nos move criativamente e fomos “desocultar” uma realidade existente, sentida e
vivida no passado, pensando criticamente o presente através do teatro, que “ainda tem
a fama de ser a casa do saber, um guardião do patrimônio artístico de várias culturas”
(FARIAS, 2002), inclusive da nossa, que estava sendo ocultada, portanto, pensando o
teatro como instrumento de educação inclusive política, sem deixar de viver o intenso
prazer estético e emocional proporcionado por ele, procuramos dá um novo sentido a
nossa educação.

     Com o Axé, perpassando nossos inconscientes coletivos criamos um espetáculo
chamado Nós na Cidade – engendrando a criação e expansão da vida – e junto com
outros atores sociais, começou com uma luta da qual decidimos fazer parte. Esta luta
se travava para a mudança de nome de um centro cultural localizado na antiga Igreja
da Barroquinha, “berço dos guerreiros nagôs”, que fundaram o primeiro Candomblé de
Keto da Bahia. Neste passo a passo de investigação sobre essa história, fomos
instigados a nos conhecer melhor e mais ainda a cidade, seus lugares, suas histórias e
seus protagonistas. E logo chegamos a uma grande mulher, Iyá Nassô, personagem
importante na construção da cidade, a partir da criação do Terreiro da Casa Branca que
se desdobra em vários outros terreiros de Candomblé nagô, na nossa cidade negra de
São Salvador.

     Com a construção coletiva do espetáculo Nós na Cidade, nos reconhecemos
como cidadãos críticos pertencentes a um grupo social, entendemos nossas múltiplas
identidades e nos reconhecemos como negros e brasileiros. Entendemos o processo de
formação de nossa sociedade baiana, reconhecendo as marcas deixadas pelos nossos
ancestrais - os negros trazidos do Continente Africano - nos contornos da cidade.
14



      Com um processo de auto-conhecimento e integração social – uma mescla entre
singularidades individuais e unidade social - vivenciamos questões sociais e poéticas,
nesta experiência artístico-política e pedagógica, na qual o exercício da criatividade
pode fomentar processos de aprendizagem ligados à história do Brasil, da África e de
Salvador.

      Éramos 25 alunos muito diferentes, de outras cidades do estado da Bahia e de
outros estados do Brasil. Alguns já trabalhavam com teatro, davam aulas, eram atores,
outros, estavam apenas começando a sua jornada na educação e no teatro. A
construção daquele currículo levava em consideração cada um de nós, inclusive os
professores dos outros componentes, pois a filosofia da proposta curricular em módulo,
adotada     justamente     naquele      ano    na    Escola    de    Teatro,    era    baseada      na
interdisciplinaridade, que pressupõe a participação e a integração.

      Das improvisações e jogos foram nascendo o texto, as imagens e as músicas.
Falamos de nós dentro desta cidade de Salvador, de seus doentes e loucos, de seus
monumentos e encantos. Tivemos aulas e fizemos apresentações do nosso processo
na Barroquinha, em praças, em escolas como no Centro Educacional Edgar Santos, na
Casa Branca, no Pelourinho, na Câmara de Vereadores e na Escola de Teatro, sempre
acompanhados do grupo CRIAPoesia um grupo de arte e educação do Centro de
Referencia Integral do Adolescente1, que tem como coordenadora nossa professora
Maria Eugênia Milet.

      Com a obrigação do ensino da cultura afro-brasileira nas escolas de ensino
fundamental e médio (públicas e particulares), pela Lei 10.639/2003, o nosso estudo
pode contribuir com formas de inserir a história da África e afro-brasileira no currículo,
sem preconceito, de uma forma lúdica e séria, possibilitando ao estudante uma visão
completa e crítica da formação da sociedade brasileira e das três matrizes que a
compõem.

1
  O CRIA – Centro de Referencia Integral de Adolescentes foi estruturado como ONG em fevereiro de
1994 com o projeto Educação- Um Exercício de Cidadania, que visava a implantação de educação
sexual e de outras questões ligadas a cidadania, nos currículos escolares da 5ª a 8ª séries das escolas
da rede municipal, bem como a implementação de ações voltadas para a saúde dos adolescentes a partir
dos centros de saúde e da formação de educadores e adolescentes multiplicadores. Os temas
trabalhados, ligados a formação integral do adolescente são prioritários no desenvolvimento das ações e
projetos do CRIA visando a dimensão de cidadania: educação, sexualidade e etnia.
15



     Acreditamos que este trabalho possa contribuir para a discussão sobre a
qualificação da escola a partir de uma compreensão mais significativa de valores étnico-
culturais dos quais todos os brasileiros fazem parte. Corroborando com os esforços de
muitos educadores em desenvolver a consciência crítica e os valores civilizatórios da
população para que os preconceitos não prevaleçam, acirrando assim, o racismo e a
violência contra o povo negro. Nossa intenção, com este trabalho, é destacar as
experiências significativas de educadores e educandos com referências palpáveis de
valorização de suas origens para ampliar sua auto-estima.

     Neste sentido, afirmamos e confirmamos a importância da arte dentro da sala de
aula, como também, os conceitos sobre teatro de improvisação de Viola Spolin; a
metodologia de educação-através-da-arte com Dourado e Milet e o pensamento de
Paulo Freire, através dos livros A importância do ato de ler, Pedagogia do Oprimido
Pedagogia da Autonomia e Política e Educação.

     Pensamos como Paulo Freire, em construir uma Cidade Educativa, que considere
o Axé e toda nossa ancestralidade, assim como diz o próprio autor uma “Cidade
Educativa”:

                     As Cidades Educativas devem ensinar aos seus filhos e aos filhos das outras
                     cidades que as visitam que não precisamos esconder a nossa condição de
                     judeus, de árabes, (...) de brasileiros, de africanos, de latino-americanos de
                     origem hispânica, de indígenas não importa de onde, de negros, de louros, de
                     homossexuais, de crentes, de ateus, de progressistas e conservadores para
                     gozar de respeito e de atenção (2001, p. 25).




     Uma “Cidade Educativa” que nos possibilite respeitar os que existiram antes e os
que virão, pensando uma educação mais justa, que contemple a todos independente de
sua cor, classe, sexo ou religião, tornando o mundo “menos feio”, deixando nas ruas,
nas praças, “as marcas do nosso tempo”, conservando também “os selos de certas
épocas”, capazes de mostrar, quem fomos, quem somos e quem podemos ser,
pensando o passado para construir nosso futuro.
16



2   EDUCAÇÃO ATRAVÉS DA ARTE: PROCESSOS EM RESULTADOS




                          Sou pequena
                           Sou menina
                       Desejosa de crescer
                         Quando grande
                             Menina
                      Vou querer voltar a ser
                   Para andar livre pelos sonhos
                            Inventando
                              novas
                              formas
                             de viver.




                           Valdíria Souza
17



2.1    A CHEGADA




      O curso de Licenciatura em Teatro da UFBA, no ano de 2004, começou com uma
novidade: o currículo da escola adotou o sistema de módulos que consiste em sete
módulos interdisciplinares obrigatórios, seqüenciais, com componentes curriculares
(antigas disciplinas) bem definidos e integrados com ênfase na prática. Cada módulo é
pré-requisito para o seguinte e é composto de 25 horas semanais, em um único turno.
No caso do curso de licenciatura, é desenvolvido de segunda à sexta-feira, das 13 às
18 horas.

      O Componente Curricular, Improvisação e Jogos Dramáticos, carro chefe do 1º
semestre é, segundo a minha compreensão, norteador de toda filosofia do novo
sistema, pois consiste em abordar teoria e prática das diversas técnicas de
improvisação e jogos dramáticos utilizados em teatro, visando tanto a livre criação de
textos e personagens, quanto à formação de um grupo que irá participar ativamente da
construção de seu processo de ensino-aprendizagem, e, por conseguinte, no
aperfeiçoamento da proposta curricular do Curso da Licenciatura.

      Este componente era coordenado pela professora Maria Eugênia Milet, que
também coordenava o módulo, e nesta função tinha a responsabilidade de articular os
componentes, provocando a integração entre os professores para a construção de uma
proposta interdisciplinar e para avaliação dos alunos.

      A estruturação dos módulos do curso tem um caráter temático e progressivo
contendo definições genéricas para garantir a flexibilidade do processo. O módulo I, por
exemplo, tem o tema Eu e a Cidade, responsável pela primeira experiência criativa do
grupo de alunos calouros. No nosso caso, a experiência resultou no espetáculo Nós na
Cidade, que foi apresentado e aprimorado durante os módulos II e III. Através deste
tema as disciplinas práticas e teóricas se integravam para construção deste espetáculo.

      Vinte e seis alunos tiveram a oportunidade de serem os primeiros a participarem
do novo sistema, ingressando na universidade através do vestibular, e eu fui uma das
contempladas a participar da primeira turma de licenciatura em teatro que inaugurava
18



este novo currículo, que integrava os nossos saberes com os nossos contextos, uma
busca de referenciais culturais e auto-conhecimento através dos jogos, das
improvisações, dos trabalhos teóricos e das rodas de conversa.




2.2    A DESCOBERTA DO QUEM SOU EU




      O procedimento Quem Sou Eu-Quem Somos Nós? foi criado pela professora
Maria Eugênia Milet e é desenvolvido no teatro do CRIA. Está relatado em sua
Dissertação de Mestrado: Uma Tribo Mais de Mil - O Teatro do Cria e foi utilizado nas
aulas do curso de licenciatura, como parte integrante do componente curricular
Improvisação e Jogos Dramáticos. Segundo a professora Maria Eugênia, este
procedimento propõe aos sujeitos do processo, a busca do auto-conhecimento, e de
exercício poético-corporal e musical para que se instaure um ambiente de
desnudamento e o jogo se estabeleça, no mergulho de cada um em sua história (e na
imaginação e espontaneidade), bem como na construção de uma composição coletiva
integrando nomes, idéias, imagens, e memórias. “Através de um percurso íntimo e
coletivo que vai delineando uma estética e uma ética – uma pedagogia gerada na
sensibilidade e no exercício da participação” (MILET, 2005 p. 73).

                     O sonho comum encontra-se no sentir, no pensar e no fazer de um teatro com
                     dança, música e poesia – arte que se cria na maneira de educar, para ampliar a
                     consciência do pertencimento ao País e ao mundo, a medida que enaltece a
                     presença das pessoas, a partir dos processos de auto-conhecimento e de
                     construção criativa- interativa, que se processa com o corpo todo: mente,
                     sensação, carne, emoção, memória e intuição (MILET, 2005, p. 74).



      Além deste procedimento a metodologia integrava um processo de educação
estética, baseada em jogos infantis e teatrais, referenciava a prática em paralelo a
experimentação de um repertório diversificado de técnicas de improvisação. Esta
proposta estava ancorada, tanto no sistema de jogos teatrais concebido por Viola
Spolin, através de seu livro Improvisação para o Teatro (1992), quanto na proposta por
19



Dourado e Milet, apresentada no Manual de Criatividades (1998), onde são
apresentadas considerações práticas, filosóficas, metodológicas e 257 atividades para
auxiliar professores de arte-educação.

                     É preciso se descobrir, se conhecer, ter consciência das formas que definem
                     esse alguém. Esse alguém... Quem? Sou eu? Quem Sou eu? Vim das
                     cavernas, vou para naves e estou nessa cidade de urbanóides.
                     Camila Bonifácio – integrante do grupo nas improvisações “Quem sou eu”.



     A pesquisa do Quem sou eu - Quem Somos nós? Foi muito importante para a
turma. Íamos descobrindo o nosso eu poético em contato direto uns com os outros - um
constante diálogo. O eu era construído e desvelado, e uma partitura ia sendo composta
e ao mesmo tempo que nos mostrávamos nos jogos, dialogávamos com o eu do outro,
em constante criação e transformação. Trazemos então Paulo Freire para ressaltar a
importância do diálogo no processo de transformação do Eu, para a transformação
também do mundo. O autor diz:

                     O eu dialógico, sabe que é exatamente o tu que o constitui (...) esse tu que o
                     constitui, se constitui, por sua vez, como eu, ao ter no seu eu um tu. Desta
                     forma, o eu e o tu passam a ser na dialética destas relações constitutivas, dois
                     tu que se fazem dois eu.
                     (...) sujeitos que se encontram para a pronúncia do mundo para a sua
                     transformação (1987, p. 165-166).



     O diálogo que se instaurava no jogo era mais amplo do que o que se dava
simplesmente na conversa, como troca de idéias. Apesar da metodologia também
valorizar as rodas de conversa, ao final de cada aula, era proposta uma “reflexão-ação”,
assim como propõe Paulo Freire, o diálogo “como encontro, onde há homens que em
comunhão buscam saber mais” (1987 p. 80-81), aprendendo a importância de ouvir e
confiar no outro, sem querer impor a sua palavra e entendendo aquele encontro como
importante para a busca de auto-conhecimento e amadurecimento pessoal e coletivo.

                     Ao fundar-se no amor, na humildade, na fé nos homens, o diálogo se faz uma
                     relação horizontal em que a confiança de um pólo no outro é conseqüência
                     óbvia. Seria uma contradição se, amoroso, humilde e cheio de fé, o diálogo não
                     provocasse esse clima de confiança entre sujeitos. (1987, p. 81).
20



     Enquanto aprendíamos a fazer teatro, também estávamos aprendendo a dialogar.
Com muita escuta e com muita indagação, tanto com a professora, quanto para com
nós mesmos – alunos sujeitos daquele processo – desenvolvemos uma espécie de
crítica ao nosso papel de ser e estar no mundo, em nossa cidade, nos retratando,
enquanto jovens cidadãos. Com esse objetivo de trocas de nossos saberes estávamos
aprendendo novas maneiras de ensinar assim como ensina Paulo Freire:

                    (...) o educador já não é o que apenas educa, mas o que enquanto educa é
                    educado, em diálogo com o educando que ao ser educado, também educa.
                    Ambos, assim, se tornam sujeitos do processo em que crescem juntos (...) Já
                    agora ninguém educa ninguém, como tampouco ninguém se educa a si mesmo:
                    os homens se educam em comunhão, mediatizados pelo mundo (1987, p. 68-
                    69).



     O tema do Módulo era Eu e a Cidade, então toda esta criação recuperava
fortemente, também, a dimensão do lugar, o pertencimento a nossa cidade natal. Como
nós alunos (nesta etapa já pertencendo a um grupo!) tínhamos origens diferentes, as
cidades, lugares, eram acolhidos e integrados às cenas. E Salvador nos esperava nas
ruas e nos acolhia também, ali dentro da sala da Universidade. Ali, a cidade se
expressava em nós, cidade expandida nos vários ecos de cada um, era o que
estávamos vivendo, como podemos ver neste depoimento:

                    Oxente quem sou Eu? Vou carregar esta pergunta sempre comigo. Me
                    perguntei isto no primeiro semestre e a cada vez que me perguntava tentava
                    me responder. Hoje continuo me perguntando e sempre descobrindo novas
                    respostas, novos Biras que é resultado de todos os Biras que fui e que ainda
                    sou, porque o sou. A grande contribuição na minha vida neste processo da
                    busca de identidade é o fato de que agora eu entro na sala de aula, ou numa
                    reunião de educadores ou num congresso (...) e eu sei o que eu quero, meus
                    anseios, meus gostos, minhas escolhas. Ou pelo menos tenho pistas,
                    perspectivas pra não ficar parecendo que estou dizendo que sou um ser
                    decidido e sem conflitos internos. (...)
                    Tivemos a chance de nos conhecermos mais. Nunca vou esquecer que Valdíria
                    é de Ilhéus e que Santa Inês é a cidade de Gessé, por exemplo. (Bira Azevedo
                    – Integrante do grupo)



     Pensar a cidade era pensar a estrutura política, geográfica, econômica e
educacional e como estávamos inseridos nela. Assim, nas rodas de conversa, a idéia
21



de cada integrante era trazida, e a cena se ampliava, na dimensão de nossos gestos,
palavras   e   nossa    cultura,   um    exercício    de    criatividade   impulsionado      pelas
improvisações sobre temas ligados à realidade, improvisações de músicas e poesias já
existentes ou criadas pelo grupo.

                       Um teatro mais amoroso e denso com meninos de Salvador – que chamariam é
                       claro, muitos outros para entrarem na roda de brincar de mudar o mundo: de
                       pensar, ser e estar na cidade, fazendo arte, e por que não Educação? (MILET,
                       2002, p. 24)



       Cada aula era única, com começo, meio e fim, com 04 etapas seqüenciadas:
aquecimento; relaxamento-concentração; elaboração e avaliação, sempre levando em
consideração as nossas necessidades e expectativas (DOURADO & MILET, 1998, p.
31).

       Inicialmente desenvolvemos vários jogos tendo como objetivo alcançar uma
fluência expressiva e minimizar as barreiras individuais e grupais. Estávamos na fase
liberação, 1ª fase do método de trabalho desenvolvido no Manual de Criatividades. A
fase liberação “contém atividades que caracterizam principalmente, por solicitar uma
grande participação física: mobilidade, agilidade, reflexos, coordenação, desinibição”
(DOURADO & MILET 1998, p. 17).

                       O Jogo é uma forma natural de trabalho de grupo que propicia o envolvimento e
                       a liberdade pessoal necessária para a experiência. Os jogos desenvolvem as
                       técnicas e habilidades pessoais necessárias para o jogo em si, através do
                       próprio ato de jogar. As habilidades são desenvolvidas no próprio momento em
                       que a pessoa está jogando, divertindo-se ao máximo e recebendo toda
                       estimulação que o jogo tem para oferecer. (SPOLIM,1992, p. 4)



       Sem nenhuma preocupação com resultados estéticos cênicos pré-concebidos ou
artisticamente planejados e ensaiados a primeira finalidade a ser alcançada é
crescimento pessoal dos jogadores através do domínio e uso da linguagem teatral.
Trabalhar com improvisação pressupõe a idéia de que todas as pessoas são criativas,
podíamos exercitar nossa criatividade e contribuir com o processo que estava
nascendo, sem medo, sem vergonha.

                       Qualquer juízo de valor como feio/bonito, bom/mal, certo/errado, mesmo que
                       não seja colocado como correção avaliação, pode projetar modelos de conduta,
22



                     aos quais o aluno vai tentar adaptar-se, fugindo assim à expressão genuína do
                     seu verdadeiro universo, o que constituiria justamente o oposto dos principais
                     objetivos da Educação através da Arte: o auto-conhecimeto e a livre expressão
                     do indivíduo. (DOURADO & MILET, 1998, p.19).



     Os jogos e brincadeiras possibilitaram a criação individual e grupal de movimentos
e sons, contato entre os componentes do grupo buscando uma cumplicidade e
segurança de um para com o outro. O objetivo era claro, entrar em contato com outro,
podendo observar e perceber as diferenças de cada um, respeitando tempo e
presença, descobrindo que é essencial trabalhar em grupo, pois completamos o nosso
trabalho com o do colega para ter o resultado de um todo.

     Buscamos uma consciência corporal capaz de superar limites físicos, com
movimentos repetitivos seguindo uma seqüência elaborada nas improvisações grupal e
individual. Nessas improvisações cada um criou um texto para dizer quem sou eu, de
onde vim e para onde vou e esse texto era dito junto com as partituras corporais. Este
foi o ponto de partida para construirmos um ritual, que só foi possível porque houve um
respeito do momento de cada um, em suas improvisações de sons e movimentos, de
sua experiência criativa. Partimos então para responder criativamente a pergunta que
não queria calar: Quem sou eu?

                     O gesto nasceu da loucura e do movimento repetitivo e quente
                     A loucura, a dança e a luta imperam
                     O corpo precisa de movimento. A consciência é esquecida
                     E corpo se movimenta loucamente
                     Loucura, loucura, Ilhéus, cacau, loucura, Ilhéus...
                     Valdíria Souza




     A loucura descrita no verso acima era o espelho daquele novo momento que
estávamos vivendo. Expondo-nos uns aos outros, sem constrangimento, fazendo sons
e movimentos aparentemente desconexos. Com o texto que estava nascendo
intuitivamente, desenhávamos no espaço uma metáfora do nosso eu, revelando-o para
os outros, no texto-palavra, e no texto mostrado no corpo-físico. Estávamos livres para
jogar, e podíamos sentir essa liberdade proporcionada pelo momento. Segundo Spolin,
“a liberdade pessoal nos ajuda a ter autoconsciência (auto- identidade) e auto-
23



expressão” e essa sede de auto-identidade enquanto básica para todos nós, “é também
necessária para expressão teatral”. (1992, p. 6).

                      O jogo é psicologicamente diferente em grau, mas não em categoria, da
                      atuação dramática. A capacidade de criar uma situação imaginativamente e de
                      fazer um papel, é uma experiência maravilhosa, é como uma espécie de
                      descanso do cotidiano que damos ao nosso eu, ou as férias da rotina de todo
                      dia. Observamos que essa liberdade psicológica cria uma condição, na qual
                      tensão e conflito são dissolvidos e as potencialidades são liberadas no esforço
                      espontâneo de satisfazer as demandas da situação. BOYD (apud
                      SPOLIN,1992, p. 5)



        A experiência em grupo, centrada nos jogos e improvisações, enfatizava o
exercício da criatividade do ator, possibilitando que atuássemos com o nosso corpo
todo.

                      (...) um corpo, um coletivo disposto a se envolver em processo contínuo de
                      criação e educação(...)
                      Um corpo com propósito comum de trazer o verbo para ação de (i) ver(s)
                      cidade, um ato poético de ser, sendo parte integrante da multiculturalidade da
                      cidade e do Brasil, para promover novos olhares e assim fomentar processos de
                      mudanças. (MILET, 2002, p. 52)



        Transformando em energia nossa vontade para o ato do jogo éramos desafiados a
estar sempre atentos a nós mesmos, e aos demais. Concentrados, e deixando o
racional de lado, nos permitíamos e, assim, as energias circulavam, preenchendo todos
os espaços, liberando em nós toda nossa espontaneidade, causando uma grande
explosão dos nossos eus.

                      Através da espontaneidade somos re-formamos em nós mesmos. A
                      espontaneidade cria uma explosão que por um momento nos liberta de quadros
                      de referência estáticos, da memória sufocada por velhos fatos e informações,
                      de teorias não digeridas e técnicas que são na realidade descobertas de outros.
                      A espontaneidade é um momento de liberdade pessoal quando estamos frente
                      a frente com a realidade e a vemos, a exploramos e agimos em conformidade
                      com ela. Nessa realidade as nossas mínimas partes funcionam como um todo
                      orgânico. É o momento de descoberta, de experiência de expressão criativa.
                      (SPOLIM, 1992, p. 4)



        Para gerar nossa expressão criativa/coletiva, começávamos a desenhar com
nossas improvisações, relações sensíveis de contatos, quebrando as barreiras que
ainda existiam entre nós e construindo novas formas de dizer e estar no mundo e de
24



construir nosso conhecimento, se apropriando da palavra do outro, observando como o
outro tomava emprestada a nossa palavra, dando nova forma, com novos movimentos,
com novas formas de arquitetar as palavras e os versos a estrutura poética que estava
nascendo.

                     Reconhecer-me no outro na tentativa de me auto-conhecer.
                     Vim de Santa Inês...Vieram da África e estão no céu dessa cidade, no chão
                     dessa cidade, no povo dessa cidade.
                     Gessé Araújo – Integrante do grupo



     Começamos a segunda fase do processo, e esta correspondia à segunda fase
descrita no Manual de Criatividades - a fase de sensibilização “que tem como objetivo
desenvolver a percepção sensorial do aluno e faze-lo vivenciar diversas formas de
contato com o seu corpo, com o corpo do outro e o ambiente” (DOURADO & MILET
1998, p. 17).

     Na festa intensa do jogo da criação, na busca do nosso eu poético - uma busca
coletiva de vários eus - nos encontramos na infância, nas brincadeiras e jogos que nos
possibilitavam recuperar e transmutar a nossa história de vida: com lembranças e
emoções do passado, valorizávamos o momento presente – o jogo, a cena, e
projetávamos o futuro. Estávamos nos re-descobrindo, nos re-conhecendo mutuamente
e principalmente re-descobrindo o prazer de ser criança, dispostos a jogar e aprender.

     Como diz o ator Rubens Corrêa, “essa é a lei e a sabedoria dos meninos, sou útil
ainda brincando” (1994). E esse sentido da brincadeira como algo valoroso para o
nosso trabalho como ator e professor de teatro nos caminhos que estávamos
percorrendo era como uma volta à infância, um trabalho sensível de memória corporal.
Que apesar das responsabilidades da vida adulta ter chegado até nós, ainda
lembrávamos das brincadeiras no quintal da casa, das rodas de verso e das nossas
mães ou avôs cantando cantigas para dormir.

     Ser criança nesse sentido era relembrar a espontaneidade e a liberdade do
brincar, a inocência e a sinceridade ao criticar a realidade, subvertendo a ordem
estabelecida, mostrando uma outra possibilidade de apreensão do mundo, através da
capacidade de sonhar e de ter esperança. Trazíamos para a cena a nossa criança
25



interna, infância-memória e presença, através dos meninos e meninas que fomos e que
ainda podíamos ser, não só com os jogos e brincadeiras lúdicas, mas com a criança
que preservamos dentro de nós, que podíamos libertar no teatro através dos
personagens que nos faziam reviver nossa criança interna. Como diz a professora Lydia
Hortélio “e tenhamos as Crianças como nossas mestras, elas que são tão próximas à
Vida e artífices naturais do futuro” (1998)2.

        Tanto para o trabalho do ator, como para a prática do arte-educador (que
estávamos buscando conhecer), o contato com o universo infantil, trazido pela
professora Milet, através dos jogos,              brincadeiras, e através dos textos, pudemos
perceber o que diz Rubens Corrêa:

                           (...) A criança é uma fonte incrível de informação artística, e a criança que nós
                           fomos recuperada, através do nosso lado lúdico, tão atrofiado pelo correr dos
                           anos – pode nos servir de guia, mas um guia muito especial – que caminha
                           alegre e despreocupado, que sabe descobrir o mágico dentro do cotidiano,
                           intuitivamente. (CORRÊA, 1994)



        A professora Lydia Hortélio propõe a infância como plano sobre qual a educação e
a arte devem se voltar. Nós futuros arte- educadores, estávamos recuperando a
espontaneidade e a inocência perdida através dos anos e “buscamos ler no verdadeiro
livro: a criança ela mesma, em seu movimento próprio – o brinquedo o brincar, onde ela
se mostra em sua graça e poder, em sua inteireza e espontaneidade”(1998)3.

        É através da arte que podemos ser o que quisermos, deixando fluir na criação os
sentidos que os textos, poemas, músicas, danças e brincadeiras expressam em nosso
corpo, podendo ser criança, “ser humano e ser divino” assim como propõe Fernando
Pessoa no poema O Guardador de Rebanhos, por Alberto Caiero, “despindo o ser” e
“desconstruindo” as verdades pregadas pela sociedade.

                           “(...)
                           E a criança tão humana que é divina
                           É esta minha quotidiana vida de poeta,
                           E é porque ele anda sempre comigo que sou poeta sempre
                           E que o meu mínimo olhar me enche de sensação
                           E o mais pequeno som, seja do que for
                           Parece falar comigo.

2
    Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil. Análises e Sugestões. 20 de março de 1998.
3
    idem.
26



                     A criança nova que habita onde eu vivo
                     Dá-me uma mão a mim
                     E a outra a tudo que existe
                     (...)
                     E deito-o, despindo-o lentamente
                     E como seguindo um ritual muito limpo
                     E todo materno até ele estar nu.

                     Ele dorme dentro da minha alma
                     E às vezes acorda de noite
                     E brinca com os meus sonhos.
                     (...)
                     Sou um guardador de rebanhos
                     O rebanho é os meus pensamentos
                     E os meus pensamentos são todos sensações.
                     Penso com os olhos e com os ouvidos
                     E com as mãos e os pés
                     E com o nariz e a boca.
                     (...)
                     Sinto todo o meu corpo deitado na realidade,
                     Sei a verdade e sou feliz”.



     O procedimento quem sou eu pautado nesta busca de auto-conhecimento e de
construção de conhecimentos da criação coletiva, estabeleceu uma nova forma de ver
e pensar a educação através dos seus próprios fazedores, os alunos atores que
desenvolviam uma maneira sensível de falar com o corpo, com os sentimentos, os
pensamentos e emoções. Íamos assim descobrindo novas formas de educação. Uma
Educação através da arte, que leva em consideração o conhecimento trazido pelo aluno
e não o trata como mero receptor de informação, assim como destaca Francisco um
dos integrantes do grupo, nunca ter imaginado que suas vivências iriam ser valorizadas
como conhecimento.

                     (...) em nenhum momento previa que as minhas vivências particulares e
                     peculiares iriam ser valorizadas como “conhecimento de mundo” e científico.
                     Essa grande e positiva surpresa ajudou bastante a desenvolver a minha visão
                     afetiva e poética da arte/educação. E principalmente valorizou sobre medida a
                     minha auto-estima de pessoa do interior, negro, pobre, egresso de um sistema
                     de ensino público com inúmeras deficiências. Ter valorizado a nossa identidade
                     nos primeiros contatos com a universidade contribuiu significativamente para a
                     formação de um novo perfil de professor de teatro, mais sensível ao contexto
                     social e valorizando a história de vida de nossos futuros alunos. (Francisco
                     André Souza Lima)
27



      A poeta Adélia Prado atribuiu uma importância essencial à arte na educação, pois
a “arte sendo pura expressão” é capaz de trabalhar sentimentos, emoções, criatividade,
essência, alma, fé, sensibilidade e poesia:

                      A escola, no seu conjunto padece de uma defasagem acadêmica, pior do que
                      isso de uma decadência nas áreas das humanidades. (...) Para onde foi a
                      poesia? A literatura? (...) Tudo isso tem a ver com a minha felicidade pessoal
                      que foi colocada em segundo plano nas escolas, por causa da mentalidade
                      utilitária da educação. (...) A arte na escola é que vai dá sentido. A mudança
                      deve partir de quem está na escola. O professor (...). (2002/2003)



      A escola que vivencia a arte no seu dia a dia torna-se capaz também de construir
indivíduos mais felizes, mais humanos e com a auto-estima elevada. E essa mudança
tem que partir de quem está na sala de aula, nós professores.




2.3    A FORMAÇÃO DO GRUPO




                                                   O teatro fala por si e a educação celebra a arte do
                                                 encontro, fazendo-se na interação com as pessoas.
                                                                                 Maria Eugênia Milet




      Todos os dias, de segunda à sexta-feira, das 13 as 18 horas, estávamos juntos na
faculdade freqüentando as aulas do módulo I. Entendíamos que como alunos, tínhamos
o compromisso de estarmos juntos. Alguns estavam se relacionando afetivamente
porque encontraram afinidades, outros estavam se relacionando intelectualmente para
realizarem trabalhos acadêmicos.

      Começamos a ser sensibilizados desde o início pela proposta coletiva, baseada
no    teatro   improvisacional   -   sistema     de   jogos     teatrais    -   um    método      de
ensino/aprendizagem que só poderia acontecer com uma interação de grupo. Essa
relação grupal surgia naturalmente, pois a metodologia exige dos participantes um
28



amplo relacionamento, com total participação e contribuição pessoal, trabalhando juntos
para completar o projeto.

       Assim como o jogo, o teatro é uma atividade artística que exige a participação de
muitas pessoas, e o teatro improvisacional que estávamos trabalhando requeria “um
relacionamento de grupo muito intenso, pois é a partir do acordo e da atuação em
grupo que emerge o material para cenas e peças” (SPOLIM,1992, p. 9).

       Foi através desses acordos, que começamos a imprimir em nosso relacionamento
o respeito, a compreensão as diferenças, a atitude sincera ao criticar na avaliação, a
participação de algum colega que chegou atrasado na sala e não ter participado da
atividade desde o início, ou de outros que faltaram e não realizaram a cena coletiva
ensaiada anteriormente com todos os presentes.

       Através do respeito entendíamos os problemas pessoais que alguns tinham e
faltavam ou chegavam tarde na aula, e nesse processo de respeito mútuo, todos foram
entendendo que apesar dos problemas, para essa ação de ensino/aprendizagem
acontecer, dependia da participação real de todos. Tanto a participação física, quanto a
intelectual. Mente aberta para jogar e responder os problemas que estavam sendo
propostos para realizar a cena.

                        Com a dominação de cada problema caminhamos para uma compreensão mais
                        ampla, pois uma vez solucionado o problema, ele se dissolve como algodão
                        doce. Quando já dominamos o engatinhar, nos pomos em pé, e quando nos
                        levantamos começamos a andar. Esse aparecimento e dissolvição infinitos de
                        fenômenos desenvolve uma visão (percepção) cada vez maior com cada novo
                        conjunto de circunstâncias. (SPOLIM, 1992, p. 10).



       Os problemas pessoais eram colocados nas improvisações e as diferenças entre
cada componente eram trazidas como símbolo de respeito.

       O processo de reconhecimento de grupo trabalhado nas improvisações do Quem
Sou Eu, foi gerando uma afetividade mútua, na troca de olhares, no tocar as mãos nos
círculos, nos jogos de confiança e principalmente no processo de revelar-se para o
outro, nos mostrando que apesar das diferenças podíamos acrescentar nossos saberes
para    um   objetivo    comum     e   crescimento     de    todos.   Para    comprovar     esse
amadurecimento de grupo, importante para nosso trabalho como arte-educadores
29



trazemos os depoimentos dos integrantes do grupo que destacam a importância do
processo não só para a criação do espetáculo, mas também na construção de um novo
olhar sobre a educação, gerando na turma um reconhecimento de grupo. E a identidade
do educador que somos hoje também é pautada nesse reconhecimento.

                     Como artista e arte-educador a busca pela afirmação de uma identidade de
                     grupo e individual foi de extrema importância não apenas para minha formação
                     acadêmica, como também pra construção de um novo olhar sobre a educação
                     superior.(...) Esse processo criativo, portanto, foi importante não só para a
                     criação do espetáculo “Nós da cidade”, mas principalmente porque gerou na
                     turma o reconhecimento de uma identidade de grupo. A partir desse momento
                     nos tornamos solidários na busca pelo conhecimento, derrubando os limites
                     entre o ser professor e ser aluno. (Francisco André Sousa Lima)

                     (...)A minha identidade enquanto professora de teatro, logo arte-educadora, só
                     foi possível devido colaboração de todo o grupo. Paralelo a minha formação
                     acadêmica, participei de outras formações profissionais, pessoais e espirituais
                     que de maneira simples e bela, me ajudou a entender melhor a identidade
                     grupal. Hoje mais do que nunca, preservo e incentivo, a necessidade de
                     entendimento de grupo junto aos meus educandos.(...) Com esta metodologia
                     foi possível perceber claramente o quanto nós, homens e mulheres precisamos
                     nos educar para viver em grupo. (Camila Bonifácio)

                     Quando começo um trabalho com uma turma nova ou quando quero aprofundar
                     questões em grupos já formados, procuro criar e utilizar caminhos de criação e
                     fortalecimento dos vínculos entre as pessoas. Aprendi a fazer, a conduzir este
                     processo com o nosso grupo e a prática de Eugênia.(...)Havia respeito entre o
                     grupo. Sabíamos das limitações uns dos outros, tivemos brigas, mas sabíamos
                     nos tolerar, ficamos juntos ate o final(...). (Bira Azevedo)



     As características pessoais acabaram servindo como elementos formadores da
força desse grupo. Com cada um apresentando características pessoais que sozinhas
poderiam não surtir efeito, mas unidas agregavam valores que ajudavam na coesão do
grupo, tornando-o forte, para entrar em cena.

                     (...) quando atua com o grupo, experienciando coisas junto, o aluno-ator se
                     integra e se descobre dentro da atividade. Tanto as diferenças como as
                     similaridades dentro do grupo são aceitas. Um grupo nunca deveria ser usado
                     para induzir conformidade, mas como num jogo deveria ser elemento propulsor
                     da ação (SPOLIM, 1992, p. 9).



     O trabalho com os jogos teatrais e as brincadeiras, fortaleceu o grupo como célula
operativa de regras. Se unir para realizar a atividade proposta era importante para o
coletivo e com essa união, nos re-conhecíamos, conhecíamos nossas afinidades e
30



diferenças e nos uníamos cada vez mais, traçando através da arte nossos caminhos
pessoais e profissionais, pensando a educação democrática que estávamos
vivenciando.

                     Não há crescimento democrático fora da tolerância que, significando,
                     substantivamente, a convivência entre dessemelhantes, não lhes nega contudo
                     o direto de brigar por seus sonhos. O importante é que a pura diferença não
                     seja razão de ser decisiva, para que se rompa, ou nem se quer se inicie um
                     diálogo através do qual pensares diversos, sonhos opostos, não possam
                     concorrer para o crescimento dos diferentes, para o acrescentamento de
                     saberes. Saberes do corpo inteiro dos dessemelhantes, saberes resultantes da
                     aproximação metódica (...) Saberes de suas experiências feitos, saberes
                     “molhados” de sentimentos, de emoção de medos, de desejos (FREIRE, 2001,
                     p. 17).



     Assim o grupo foi formado, porque pactuavam de um intenso processo criativo-
educativo, processos psico-sócio-culturais de formação de identidade. Esse processo
foi resultado de um convívio intenso, resultado de muitos conflitos, mas principalmente
de extrema confiança, condição básica que nos permitiu criarmos juntos, um processo
de educação estética e ética, capaz de gerar um espetáculo, que falava de nós e da
nossa Cidade, como diz Paulo Freire, estávamos vivendo a autenticidade exigida pela
prática de ensinar-aprender:

                     Quando vivemos a autenticidade exigida pela prática de ensinar-aprender
                     participamos de uma experiência total, diretiva, política e ideológica,
                     gnosiológica, pedagógica, estética e ética, em que a boniteza deve achar-se de
                     mãos dadas com a decência e com a seriedade. (1996, p. 24)



     A beleza apresentava-se na dimensão humana trazida em corpo e alma por nós
integrantes do grupo, através de uma relação sensível e afetuosa que estabelecemos
durante o processo criativo, como também em cena nas apresentações públicas. Daine
integrante do grupo afirma essa beleza intrínseca ao processo:

                     A beleza com que cada cena ia sendo tecida pessoa por pessoa e
                     transformando-se em único e uníssono. Além de poder construir textos, poesias
                     e partituras corporais mais verdadeiras e significativas (Daiane Gama).



     O trabalho nos deixou próximos uns dos outros e atentos para nossa cidade.
Vivemos e compartilhamos nossa crise de identidade, nos ajudando a conhecer o
31



nosso mundo e pensando profundamente o sentido: Quem Sou Eu? Gessé Araújo
destaca a visão mais politizada da educação provocada por esse processo, enquanto
Daiane Gama reflete a sua mudança, pautada na leitura do mundo antes da leitura da
palavra assim como Paulo Freire nos ensinou no livro A Importância do Ato de Ler
(1983) que nos acompanhou desde o início do nosso processo de formação.

                    Temos hoje, de uma maneira geral, uma visão mais ampliada de arte e do
                    próprio teatro que nos propomos fazer. Isso é pra mim uma coisa bastante
                    agregadora neste sentido de grupo. Outra coisa, temos uma visão muito mais
                    politizada de nossa arte, de maneira mais geral, de nossas maneiras de intervir
                    no mundo como educadores (Gessé Araújo).

                    Uma transformação no meu jeito de ver a vida e as minhas possibilidades. Tudo
                    se ampliou. Não só o meu campo de visão, como o meio de alcançar os meus
                    objetivos. Agora faço escolhas baseadas nos anseios descobertos nesse
                    processo. (...) Enquanto arte-educadora, utilizo com mais segurança essas
                    descobertas e tento contagiar os alunos para que eles não só acreditem no que
                    eu estou falando, como possa buscar suas próprias verdades e crenças. Assim
                    como Paulo Freire acreditava que “a leitura do mundo antecedia a leitura da
                    palavra” eu precisei ler esse mundo que estava bem a minha frente e isso só foi
                    possível graças a esse processo de identificação individual e grupal.
                    (Daiane Gama).



     A professora nos guiava por caminhos muito intensos pela arte-educação, sempre
atenta, acompanhando o processo, promovendo mudança de rumos e nosso
crescimento educacional. Ela também fazia parte do grupo e exercia seu papel de
autoridade que lhe cabia, mas a todo tempo nos deixava livres para “alçar vôos”, nos
estimulando a pergunta e a reflexão crítica, sobre o nosso papel como futuro arte-
educador, autenticando o caráter formador do espaço pedagógico como confirma Paulo
Freire quando diz que esse espaço nasce do respeito mútuo entre professores e
alunos. “O clima de respeito que nasce de relações justas, sérias, humildes e
generosas, em que autoridade docente e as liberdades dos alunos se assumem
eticamente, autentica o caráter formador do espaço pedagógico” (1996, p. 92).
32



2.4    A NOSSA PRODUÇÃO




      A partir do momento que nos afirmamos enquanto grupo, criando coisas juntos
para serem levadas à cena, já começava a terceira fase do processo criativo, descrita
no Manual de Criatividades como Fase de Produção “que tem como objetivo propiciar
os meios para que o aluno elabore e organize a sua expressão individual e
coletivamente”. (DOURADO & MILET,1998, p. 18).

      Essas fases descritas no Manual de Criatividades não são fixas. Estas demarcam
o processo, onde participamos de jogos e improvisações e atividades onde nos
expressamos artisticamente. De alguma forma, durante todo tempo estávamos
vivenciando liberação, sensibilização e produção. O Manual propõe estas divisões do
processo criativo, mas explica que cada fase “caracteriza-se pela predominância, de
uma dessas referências” (1998 p.18), determinada muitas vezes pelos exercícios e
jogos e seus objetivos, ou seja, objetivos que devem ser condizentes com a fase que
estamos trabalhando.

      Nas aulas sempre repetíamos o que havíamos criado, mas chegava o momento
que os textos, poesias e músicas, ou textos que nos foram entregues durante as aulas,
fossem “costurados” de forma coerente com as nossas improvisações corporais e
textuais. Então estávamos sempre “indo e voltando”, aperfeiçoando nosso trabalho.
Incluindo nas cenas coisas novas, ou novas formas de dizer as mesmas coisas que
havíamos criado, novas alternativas de resolver o problema proposto.

      A primeira apresentação aconteceu no dia 08 de julho de 2004 na sala de aula da
Escola de Teatro. Recebemos como convidados, alunos das Escolas de Dança, nossos
colegas e professores da Escola de Teatro, que falaram principalmente da idéia de
grupo artístico, possibilitada pelo novo currículo, que integrava o conhecimento prático
ao teórico, e possibilitava uma seqüência de atividades.

                     (...) Somente através do sequenciamento de atividades interdisciplinares,
                     organizadas em função da complexidade técnica e com crescentes demandas
                     de autonomia e produtividade criativa, pode-se desenvolver um processo de
                     ensino/aprendizagem na área de artes. E mais que isso pode-se coordenar a
33



                        participação e avaliar o crescimento do aluno rumo a sua formação profissional.
                        (DOURADO, 1998, p. 79)



      Defendemos assim o Novo Currículo como um elemento motivador para a
formação do nosso grupo e principalmente a possibilidade de continuidade das nossas
atividades criativas capazes de gerar processos criativos4 tão ricos como o Nós na
Cidade – espetáculo gerado no componente Improvisação e Jogos Dramáticos.

      Nesta primeira apresentação mostramos como podíamos ser musicais, dançando
e cantando as canções que criamos nas improvisações, destacando a capacidade que
as letras tinham de falar de teatro e educação. Uma educação de esperança, liberdade
e principalmente autonomia do sujeito.


                        A arte de ser ator
                        É mais que uma paixão
                        É como pai: Educar
                        Dando asas a criação!

                        Conquistar a independência
                        É viver com liberdade
                        É educar!
                        Felicidade!

                        O Teatro da minha vida
                        É o trabalho com liberdade
                        Com energia pra criar meus filhos
                        E ser resolvido no teatro
                        (Criação Coletiva)



      Nesta fase do processo já tínhamos vivenciado esses conceitos de educação para
a liberdade, para a autonomia e da importância do teatro na educação, ligados a nossa
prática como educadores. E os textos refletiam este nosso conhecimento, pois
nasceram dos nossos desejos e experimentação, e eram trazidos segundo nosso
constante crescimento. Já tínhamos algum conhecimento da filosofia de Paulo Freire, e
assim, tudo que dizíamos em cena ligava-se aos estudos que estávamos realizando

4
 Um outro processo criativo desenvolvido pelo grupo foi o espetáculo Ciranda de Estórias, gerado no
componente curricular Teatro de Formas Animadas I, II, e III. Esteve em cartaz na Sala 5 da Escola de
Teatro e no Teatro do Liceu no Pelourinho no ano de 2007, ministrado pela professora Sônia Rangel,
com elenco formado por nós alunos, atores-educadores do curso de licenciatura em teatro 2004.1.
34



sobre a Pedagogia da Autonomia, A Importância do Ato de ler e outros livros do mestre
que nos estavam sendo apresentado.

     Como diz o próprio Paulo Freire, não é possível estar no mundo, sem cantar, sem
musicar, sem politizar e isso é fazer história, é deixar nossa presença no mundo.

                     Estar no mundo sem fazer história, sem por ele ser feito, sem fazer cultura, sem
                     “tratar”, sua própria presença no mundo, sem sonhar, sem cantar, sem musicar,
                     sem pintar, sem cuidar da terra, das águas, sem usar as mãos, sem esculpir,
                     sem filosofar, sem pontos de vista sobre o mundo, sem fazer ciência, ou
                     teologia, sem assombro em face do mistério, sem aprender, sem ensinar, sem
                     idéias de formação, sem politizar, não é possível. (1996, p. 58).



     Cantando e dançando em nossas improvisações aos poucos fazíamos anotações
elaboração do texto dramático. As questões trazidas nas cenas eram retomadas nas
avaliações finais, e nos debates com o público após as apresentações. O diálogo
provocava a re-escrita do texto, envolvendo-nos como criadores num processo crítico
de avaliação e reconstrução que o trabalho de educação exige. Esse procedimento
acentuava a dimensão pedagógica e estética desse teatro, envolvendo no seu fazer, o
re-fazer constante com as pessoas da cidade.

     Ainda no Módulo I, nos encontramos com a história da Igreja da Barroquinha da
cidade de Salvador, que iria se transformar em um centro cultural chamado Coliseu das
Artes. Fomos convidados pela professora Maria Eugênia Milet para participar de uma
aula nas escadarias em frente desta Igreja e descobrimos, através da história contada
pelo professor Renato da Silveira, que atrás daquela igreja havia sido criado a primeira
“roda” de candomblé de Keto da Bahia.

     Conduzimos nossa produção textual para falar sobre o nome que as autoridades
baianas queriam colocar em um centro cultural que tinha na sua história do passado,
um símbolo religioso tão importante para a cidade negra de Salvador. Bira Azevedo,
integrante do grupo, destaca como esse envolvimento com a cidade tornou-se uma luta
política e que pessoalmente mudou sua maneira de ver o candomblé.

                     Nós na Cidade me fez questionar quem eu sou e o que eu vim fazer aqui neste
                     mundo. Juntou-se a isso uma luta política, uma mudança concreta, uma
                     reparação. Foi uma obra artística que contribuiu com a mudança do nome de
                     um espaço, de uma idéia, de um ideal. Ainda mais, mudou completamente a
                     minha visão em relação ao candomblé (que até então era estranho e temeroso
35



                         para mim) e conseqüentemente me aproximou mais da cultura afro e, logo, de
                         Salvador, minha cidade. É impossível eu não tratar mais de questões ligadas a
                         esta temática agora na minha prática. Faz parte da minha busca de
                         transformação e contribuição para este mundo ficar mais bonito. (Bira Azevedo)



      Essa inserção poética se deu primeiramente nas improvisações, depois daquela
aula na Barroquinha, aquela história, passou a fazer parte do nosso processo criativo
através das nossas impressões pessoais e curiosidades que trazíamos sobre o
processo de construção daquele terreiro de candomblé.
      Fomos instigados a investigar os personagens de nossa cidade. Começamos a
olhar mais para as pessoas, para os vendedores, transeuntes, mendigos, turistas.
Observar o andar, a forma de falar e de se comportar como um todo. Passamos a criar
personagens a partir dessas observações e a partir delas fomos dando formas às
cenas, pensando elementos, construindo novas músicas, novos textos.
      Já no módulo II no componente curricular Fundamentos do Teatro na Educação
ministrado pela professora Maria Eugênia Milet, continuamos o nosso processo de
investigação sobre a cidade para a construção do nosso espetáculo.
      Esse foi o momento que nos assumíamos verdadeiramente como dramaturgos,
pois começamos um processo de criação do texto, saímos do campo da improvisação e
assumíamos ensaios com textos trabalhados, como por exemplo, os textos do professor
Renato da Silveira5 que nos chegou através das aulas que ele aceitou ministrar para o
grupo, sobre a história de constituição do primeiro terreiro de candomblé de Keto da
Bahia.

      Para a construção do espetáculo a nossa pesquisa ficou dividida da seguinte
forma:

      Pesquisa Pessoal: Quem Sou Eu;

      Pesquisa da Cidade: Observação das ruas, pessoas da cidade, etc;

      Pesquisa Histórica: Barroquinha – Constituição do primeiro terreiro de Candomblé
de Keto da Bahia;

5
 O professor Silveira aceitou o convite do grupo para ministrar uma aula, mas acabou se encontrando
conosco 3 vezes, incluindo aulas sobre história da África e dos Orixás neste itinerário. Ele é professor da
Faculdade de Comunicação da UFBa.
36



        Processo de Produção: Textos do professor Renato, diálogos com outros
educadores e com as pessoas da cidade, elementos e figurino.




Figura 1 – a pesquisa do figurino. Foto: Eliana Andrade de Souza Integrante do Grupo.



        Além do professor Renato da Silveira, tiveram em nossa sala educadores que
vieram contribuir com a formação do espetáculo, pois como nossa própria professora
Maria Eugênia Milet dizia que o Nós na Cidade era um espetáculo aberto que poderia
se modificar a cada apresentação e a cada contribuição6. Neste contexto, recebemos
na sala a professora Vanda Machado (historiadora envolvida com a religião do
candomblé e a história da África), o professor e diretor teatral Carlos Petrovich, o
antropólogo e Ogã da Casa Branca Olimpio Serra, o antropólogo Ordep Serra, e o Ogã
Leo prefeito do Terreiro da Casa Branca (Ereelson Conceição Chagas), além dos
próprios professores do módulo I. Contribuíram com textos, com músicas e com a
mudança de ordem dos fatos que ocorriam no espetáculo, como foi o caso do professor
Petrovich que sugeriu que invertêssemos a ordem do que estávamos falando, “para já
chegarmos com força”.
        Destacamos então como estávamos envolvidos na fase de produção no processo
criativo, proposto pelo Manual de Criatividades.
                          É a fase em que o ato criador toma corpo. É o exercício de visão do todo, onde
                          o aluno vai se sentir capaz de expressar, através de símbolos, uma idéia e
                          solucionar o problema da escolha e seleção de recursos apropriados a essa


6
    Anotações pessoais das aulas.
37



                       expressão. O foco de atenção recai sobre a capacidade de realização e a
                       consciência crítica. (DOURADO & MILET, 1998, p. 18)



     Nesta fase elaboramos um roteiro e uma estrutura fixa para o espetáculo.
Aprofundamos a pesquisa com as histórias trazidas por Vanda Machado sobre o povo
africano e sua relação de irmandade criada no Navio Negreiro. Sobre essa fase,
caracterizadas por muitas mudanças, Daiane Gama, integrante do grupo, destaca o
enriquecimento do processo e melhora de resultados.

                       Um dos maiores aprendizados que tive foi de que nada está pronto ou acabado.
                       Tudo é passível de mudança e essas mudanças são fundamentais para o
                       enriquecimento do processo e melhora do resultado. Além de respeitar a
                       opinião dos outros e tentar compilar vários pontos de vistas.
                       E o maior de todos é o meu interesse pela cidade e pela cultura africana.
                       (Daiane Gama)



     Esse período provocou grandes debates entre nós, inclusive uma série de crises e
crítica ao processo.

     A primeira crise foi provocada por nosso apego a alguma cena que havíamos
criado e que não queríamos que fosse retirada. A segunda foi porque o espetáculo
sempre estava sendo modificado, provocando em alguns participantes certa inércia,
resistência ou ausência, sem preocupação com a realização do trabalho. Essa
modificação provocada no texto e na estrutura do espetáculo foi interpretada por alguns
como se o processo fosse um “oba oba”, causando muitas vezes discussões calorosas,
em torno do processo, do papel do educador ao interferir, e em torno da
responsabilidade dos alunos/ atores com o espetáculo.

     Até que ponto o grupo estava maduro, e seguro, para continuar este processo
criativo? Para ouvir, se tocar, se olhar de acordo com esse processo de livre
expressão? Para aceitar a orientação do professor?

     Como propõe Roseli dos Santos, uma das integrantes do grupo, citando Viganó na
sua prática pedagógica, confrontando nossas personalidades individuais e as
interpretações que elaborávamos sobre a realidade, podíamos começar a libertar
nossas mentes, pois o jogo requer ao mesmo tempo esforço e liberdade.
38



                     Mediante a educação pelo jogo, que requer ao mesmo tempo esforço e
                     liberdade, foi proposta a caminhada em direção ao amadurecimento pessoal e
                     coletivo dos nossos alunos. Ao mesmo tempo, por meio da experiência estética
                     e produção de uma linguagem artística, eles confrontaram suas personalidades
                     individuais e a interpretações que elaboravam sobre a realidade na qual viviam.
                     E assim eles começaram a libertar suas mentes, a dialogar com os outros e dar
                     forma a novas possibilidades de se construir o mundo VIGANÓ (apud SANTOS,
                     2007, p. 43).



     A professora Maria Eugênia Milet dizia que para compreender a proposta era
preciso estar envolvido no processo criativo. E nos perguntávamos que envolvimento
era esse que ela falava se as nossas cenas estavam sendo retiradas a serviço do
espetáculo? Mas não é a serviço do espetáculo que estamos trabalhando? Não é o
espetáculo que nos ajuda a dizer o que queremos? Não é com o teatro que podemos
dizer quem somos de onde viemos e o que queremos para nossa educação, para
nossa cidade e porque não, para o nosso país?

     A todo o momento, a professora Maria Eugênia Milet lembrava que éramos
artistas sim, que estávamos preocupados com o que criamos, mas antes de tudo
éramos futuros arte-educadores, e como tal deveríamos considerar nossa experiência
artística como um ato formador, refletindo a cada momento sobre o processo, inclusive
sobre os problemas que encontrávamos naquele ato de criar e modificar a serviço do
espetáculo. Sobre isso trazemos uma análise sobre o amadurecimento pessoal e social
relacionado ao aprendizado artístico:

                     Considero que o aprendizado artístico pode estar diretamente relacionado ao
                     amadurecimento pessoal e social. Os resultados obtidos em cada encontro
                     dependem, então, diretamente da qualidade do ambiente criado em cada
                     momento e de uma reflexão constante dos participantes sobre o processo de
                     trabalho e sobre sua atitude pessoal em relação a este. A conjunção desses
                     fatores nos permite avançar no envolvimento com o processo e na superação
                     dos nossos limites. O constante confronto com os nossos problemas e
                     limitações, em cada etapa, faz com que o processo seja sempre composto de
                     avanços e retrocessos. Isso não compromete, no entanto, a conquista de um
                     maior alargamento dos horizontes pessoais e coletivos e de um novo nível de
                     amadurecimento ao final do processo como um todo VIGANO (apud SANTOS,
                     2007, p.45).



     Começamos a entender que nada estava sendo imposto, nem transplantado.
Estávamos sim atuando na criação do nosso próprio currículo, decidindo o que
39



queríamos aprender e reinventando formas de dizer o aprendido, para que pudéssemos
ensinar. A receptividade do público foi muito importante para esse amadurecimento. E
nesse processo de ensino/aprendizagem nos entendemos como atores, criadores da
nossa própria história, eliminando as barreiras que encontrávamos, fortalecendo o
grupo, desenvolvendo nossa personalidade, estabelecendo um acordo de grupo e
caminhando em direção à participação coletiva que ia além do espetáculo, e que agora
chamávamos também de Nós na Cidade.
40



3   RESULTADOS EM PROCESSOS




                   Subimos e descemos ladeiras
                 E entre um buraco e outro das ruas
                      Choramos com a cidade
               Deitamos crianças desejosas de crescer
              Nos levantamos heróis de um novo mundo
                    Acordamos guerreiros nagôs
                           Que a cor dão
                   Tiramos os nós que amarravam
                          nossas histórias
                     Reinventando a realidade
                    Nos desafiando a construção
                      De uma nova educação
                       Com o Nós na Cidade




                            Valdíria Souza
41



3.1    NÓS NA CIDADE




      O texto cênico ou espetacular pode ser entendido como “a relação de todos os
sistemas significantes usados na representação e cujo arranjo e interação formam a
encenação” (PAVIS, 2005 p. 409).

      Nossa encenação foi resultante de uma criação coletiva orientada pela professora
Maria Eugênia Milet e apresentava um discurso ritualístico e espetacular, com intenção
de expor uma força que vinha da proximidade do grupo com a expressão e o
sentimento religioso do candomblé e com a espetacularização do cotidiano, uma
estética que mostra o espetáculo como experiência vivida, assim como diz Rita de
Cássia Silva:

                     A estética contemporânea demonstra com maior clareza o aspecto da arte
                     como experiência vivida, sendo esta, a vida, a experiência transformada em
                     matéria de fruição estética. É este aspecto que atribui aos espetáculos um forte
                     caráter ritualístico, conferindo-lhes mesmo uma certa solenidade e um poder
                     agregador, característicos do Ritual. (2004, p. 339)



      O espetáculo tinha um caráter critico e reflexivo que mostrava em cena toda a
pesquisa sobre a cidade e o nascimento do Terreiro de Candomblé, falava sobre a
intervenção na luta pela mudança de nome do centro cultural da Barroquinha, tinha
também a intenção de envolver outras pessoas nesta causa e apesar dessa
característica didática e narrativa, não perdia a função de entretenimento.




3.1.1 Sobre a Encenação




      Foi “juntando pedaços de nossos eus”, das histórias das pessoas, das histórias da
cidade, dos ensinamentos de vários mestres, inclusive Paulo Freire, que construímos o
nosso espetáculo. Criando cenas a partir de improvisações, partituras corporais,
42



inventávamos a cidade e a educação que desejamos e nos mostrávamos ao público,
nos desnudando em um processo de auto-conhecimento e de busca de um
conhecimento coletivo. Os integrantes do grupo a partir dos depoimentos destacam o
que foi o espetáculo Nós na Cidade, para eles nesse processo de auto-conhecimento:

                     O Nós na cidade foi a materialização dessa metodologia. Claro que é um
                     terreno bem arriscado de educação. Mas a educação que não pretende correr
                     riscos não faz nada mais que entregar ao mundo uma mão de obra alienada
                     para deleite dos que estão no poder. Quando eu digo que é um método
                     arriscado de educação é porque esse tipo de metodologia propõe um
                     desnudamento das pessoas envolvidas. E esse desnudamento é trazido ao
                     palco em forma de espetacularização. O caminho percorrido por “Nós na
                     cidade” pretendia a busca profunda de um auto-conhecimento. “Quem sou eu?”
                     era a pergunta- chave. E isso se torna arriscado porque pra algumas pessoas é
                     muito difícil esse processo de busca de si mesmo. Mas se isso é difícil, se torna
                     muito gratificante quando conseguimos. (Francisco André Sousa Lima)


                     O Nós na Cidade foi a nossa porta de entrada na UFBA e dou o credito ao
                     processo de construção deste espetáculo toda a forma como se seguiu a nossa
                     graduação. (...) Ele nos marcou e nos acompanhará por muito tempo. Nos
                     marcou desta forma, acredito, por conta do trabalho do quem sou eu? Que
                     gerou a formação do nosso grupo. (...) É um espetáculo amplo e rico em
                     informações. Tem Paulo Freire, tem poesias, tem Iyá Nassô, tem cada um de
                     nós, tem o meu tamanho que é maior que o tamanho de minha altura, tem
                     muitas cidades juntas, tem reconvexo, tem, tem e tem. (Bira Azevedo)


                     Momentos individuais e construções coletivas foram agrupadas. Nossas
                     histórias, sonhos, conceitos e preconceitos, nossas diferenças. (...) Nós na
                     Cidade foi a prova de que uma metodologia baseada em jogos e improvisações,
                     se bem direcionada, traz resultados(...). (Jandiara Barreto)




     Um teatro onde o cenário era desenhado por nossas palavras, construído com o
nosso corpo e imaginado por quem nos assistia. Um teatro fora dos padrões do teatro
convencional, feito em palco Italiano, mais próximo do teatro de rua e da performance,
caracterizado por uma arrumação/desarrumação do espaço da cena, provocando uma
multiplicidade e simultaneidade de forma e de olhares. Sobre essa característica do
espetáculo trazemos também as opiniões dos integrantes do grupo, que destacam o
próprio crescimento, e o crescimento do espetáculo e também o aprendizado do
público, que pode recriar o espetáculo a partir da sua visão de mundo:
43



                       Foi prazeroso e refletia bem o que tratávamos: Diversidade. Em cada lugar um
                       público diferente, um olhar diferente, um jeito de fazer diferente. Se adaptar ao
                       local, as pessoas e a causa do momento só enriqueciam o processo. (Daiane
                       Gama)

                       A sensação de teatro itinerante mostrou-me a importância de cada lugar,
                       públicos distintos e energias diversas. São aprendizados para quem faz, para o
                       resultado cênico, consequentemente e para o público. (Jandiara Barreto)

                       Me trouxe ainda outras possibilidades de estética para um espetáculo teatral.
                       Tava acostumado com o teatrão realista de sempre. Nós na Cidade ultrapassa
                       isto. (...) (Bira Azevedo)

                       (...) uma coisa que ficou latente em mim depois do Nós na Cidade foi o
                       provérbio de domínio publico “o artista deve ir onde o povo está”. (...) Muitos de
                       nós estão presos ao palco elisabetano destituindo o valor artístico de qualquer
                       outra linguagem que não esteja preso a essa estrutura. Como não considerar
                       arte (ou atribuir uma menor valia) ao teatro feito nas feiras, nos bairros de
                       periferia, ou os feitos com propósitos educativos? (Francisco André Sousa
                       Lima)




Figura 2 – O grupo e a professora no Pelourinho. Foto: Acervo do Centro Integral da Criança e do
Adolescente - CRIA.



     O espetáculo tinha um caráter didático e para a professora isso era tão importante
para nós alunos/atores como para o público que nos enxergava também como
aprendizes que éramos daquele processo. Na opinião de Camila Bonifácio integrante
do grupo, não só foi aprendizado, foram muitos aprendizados em um processo
descobridor:

                       (...) O espetáculo foi o ápice de um processo descobridor. Aprendizado? Foram
                       muitos, aprendi o que fazer e o que não fazer e isso é bom, mas deste todos
44



                      destacarei uma frase do texto dramático que para mim até hoje é uma
                      provocação para a vida: “... SALVADOR com quem eu caso? Com SALVAR ou
                      com a DOR?”. Acredito que cabe a cada um de nós, homens e mulheres, em
                      nossas vidas escolher uma das duas opções. Apesar da DOR eu prefiro
                      SALVAR! (Camila Bonifácio).



     Um espetáculo de imagens onde a moldura era dada pelos atores, autores dos
textos em que os sentidos eram expressos pelo corpo, pela palavra, por sentimentos e
sensações, assim como destaca em depoimento uma das integrantes:

                      “Nós na cidade” foi certeza de que a cidade é formada não só da parte física
                      geográfica, mas também e principalmente, de uma história que esta
                      impregnada nas nossas falas, no nosso corpo, nos nossos pensamentos e
                      sentimentos. Mas que precisa ser desvelada a muitos (Eliana Andrade).



     Estávamos buscando uma espécie de cidadania crítica, onde nos retratávamos
como cidadãos, artistas e educadores e reafirmávamos a forma de ser da cidade de
Salvador, com sua capacidade de juntar coisas diferentes, segundo a professora Maria
Eugênia Milet “uma forma Barroca” (2002, p. 22) e como disse em seu depoimento
Gessé Araújo, integrante do grupo, o espetáculo era uma busca constante também de
natureza estética:

                      Mais do que um espetáculo feito com a linguagem da rua, uma busca por uma
                      estética de natureza política, como já disse. Nós na Cidade é um "jeito" de
                      dizer, de fazer, até mesmo no tema que abordamos, que demonstra essa busca
                      de natureza estética (Gessé Araújo).



     O processo criativo tinha uma dinâmica própria, com sons, ritmos, palavras,
músicas, perguntas, mostrando uma complexidade que apresentava um teatro em
movimento, em constante mudança.
     As formas cênicas emergidas dos nossos corpos em transformação traziam à tona
a nossa realidade de vida, para conhecendo-a, transforma-la. Com isso nos revelando
sujeitos da nossa história.
45




     Figura 3 – A Bahia negra nos traços e gestos dos atores em cena. Foto: Acervo do CRIA.




     Uma Bahia negra e de resistência aflorava no gestual, nas falas e nas músicas,
expressando um espírito místico e satírico dos alunos/atores, como podemos perceber
na música Cidade In-festa criada como forma de crítica ao carnaval e as festas que hoje
apenas são feitas para os turistas e que deveria ser feita para o povo:

                       Cidade festa que infesta na lavagem,
                       Na lavagem cerebral, na lavagem do Bonfim.
                       Cidade presta na farsa do carnaval
                       Carnaval que é de poucos
                       Nem do povo nem de mim.



     Trazíamos à tona temas mais freqüentes, como racismo, violência, sensualidade,
desigualdade, resistência, religiosidades, carnaval, futebol. Falávamos das crianças
(que habitava em nós), do candomblé, das ruas da cidade, das suas ladeiras, dos seus
loucos e doentes, como podemos perceber claramente no depoimento de Francisco um
dos integrantes do grupo, que ressalta também a criação do espetáculo e seu diálogo
constante com a cidade, com sua história, com a história do candomblé e de Iyá Nassô:

                       Com o “Nós na cidade” demonstramos a importância de um teatro feito para e
                       pela cidade. Um teatro que serve de espelho para uma sociedade que faz
                       questão de maquiar os seus problemas pra não espantar os turistas ou
                       prejudicar os objetivos econômicos (...)
                       Foi importante principalmente pelo diálogo que realizamos com a cidade (...) Foi
                       importante pelo contato empírico que tivemos com uma realidade que nos será
                       companheira por toda a vida pós-acadêmica. O espetáculo foi a intersecção
46


                       entre ensino, pesquisa e extensão a tríade essencial que se pretende a nossa
                       universidade.
                       Mais ainda: o espetáculo se tornou importante por defender a causa de “Iyá
                       Nassô”, uma princesa africana escravizada no Brasil que contribuiu
                       decisivamente para a criação do Candomblé, expressão maior da resistência
                       negra no cenário inóspito que foi a escravidão colonial. (Francisco André de
                       Sousa Lima)



     Esses signos traduziam nossas buscas poéticas, que eram potencializadas
através das aprendizagens em grupo a partir de nossas experiências com a cidade,
criando formas e sentidos, trazendo a pessoa do ator que se transformava enquanto
dava forma, através da sua presença, aproximando-se cada vez mais da realidade
humana, de personagens e situações que representava, ou seja, da própria realidade,
contando uma história nossa.




Figura 4 – Francisco André em seu momento: Quem sou Eu? Foto: Acervo CRIA




     Nesse sentido nos inserimos criticamente na realidade para transformá-la,
pensamos e agimos criticamente como cidadãos e futuros professores.
47



3.1.1 O Texto




Um ator e um músico entram em cena.
MÚSICO: toca no violão a entrada da música Reconvexo7




Figura 5 – Apresentação na frente da Câmara de Vereadores. Foto: Acervo CRIA



ATOR: A Cidade se faz educativa pela necessidade de educar, de aprender, de
ensinar, de conhecer, de criar de sonhar, de imaginar de que todos nós, mulheres e
homens, impregnamos seus campos, suas montanhas, seus vales, seus rios,
impregnamos suas ruas, suas praças, suas fontes, suas casas, seus edifícios, deixando
em tudo o selo de certo tempo, (...) A Cidade somos nós e nós somos a Cidade. Mas
não podemos esquecer de que o que somos guarda algo que foi e que nos chega pela
continuidade histórica de que não podemos escapar, mas sobre que podemos
trabalhar8.


Aos poucos outros atores vão entrando em cena, se colocando em determinadas
posições e falando frases sobre educação.




7
    Caetano Veloso.
8
    Paulo Freire.
48



ATOR 1 – A leitura do mundo antecede a leitura da palavra.
ATOR 2 – A arte é a fenda na rocha da vida por onde a educação deve passar
ATOR 3 – A vida é como uma peça de teatro e não permite ensaios por isso
cante, dance, ria! Viva intensamente! Antes quê as cortinas se fechem e a peça termine
sem aplausos!
ATOR 4 – Acreditar nas massas populares, já não mais fale a elas, ou sobre elas,
mas as ouça, para poder falar com elas.
ATOR 5 – Educação é antes de tudo, respeitar a identidade do educando.
ATOR 6 – Essência é aquilo que faz com que uma coisa seja ela mesma.
ATOR 7 – E já que estamos falando de essência. Vamos falar da nossa própria essência
e da essência da nossa cidade. Lá na Barroquinha há um espaço cultural que está sendo
revitalizado, mas está sendo destruído em nossa essência. Lá os governantes entendem
que deve se chamar Coliseu das Artes. A gente não concorda com isso porque nada tem
a ver com a nossa identidade. Agente acredita que lá deve se chamar Centro Cultural...
TODOS – Iyá Nassô!
ATOR 8 – Porque eu sou do tamanho do que vejo!
TODOS – E não do tamanho da minha altura!


O músico canta a música Reconvexo acompanhado ao violão e os outros atores
acompanham com palmas e pandeiro


Eu sou a chuva que lança a areia do Saara
Sobre os automóveis de Roma
Eu sou a sereia que dança
A destemida Iara
Água e folha da Amazônia
Eu sou a sombra da voz da matriarca da Roma Negra
Você não me pega
Você nem chega a me ver
Meu som te cega, careta, quem é você?
Que não sentiu o suingue de Henri Salvador
Que não seguiu o Olodum balançando o Pelô
E que não riu com a risada de Andy Warhol
Que não, que não e nem disse que não
Eu sou um preto norte-americano forte
Com um brinco de ouro na orelha
Nós na Cidade: Uma interação entre, Teatro, Educação e Identidade
Nós na Cidade: Uma interação entre, Teatro, Educação e Identidade
Nós na Cidade: Uma interação entre, Teatro, Educação e Identidade
Nós na Cidade: Uma interação entre, Teatro, Educação e Identidade
Nós na Cidade: Uma interação entre, Teatro, Educação e Identidade
Nós na Cidade: Uma interação entre, Teatro, Educação e Identidade
Nós na Cidade: Uma interação entre, Teatro, Educação e Identidade
Nós na Cidade: Uma interação entre, Teatro, Educação e Identidade
Nós na Cidade: Uma interação entre, Teatro, Educação e Identidade
Nós na Cidade: Uma interação entre, Teatro, Educação e Identidade
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Nós na Cidade: Uma interação entre, Teatro, Educação e Identidade
Nós na Cidade: Uma interação entre, Teatro, Educação e Identidade
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Nós na Cidade: Uma interação entre, Teatro, Educação e Identidade
Nós na Cidade: Uma interação entre, Teatro, Educação e Identidade
Nós na Cidade: Uma interação entre, Teatro, Educação e Identidade
Nós na Cidade: Uma interação entre, Teatro, Educação e Identidade
Nós na Cidade: Uma interação entre, Teatro, Educação e Identidade
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  • 1. UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA ESCOLA DE TEATRO CURSO DE LICENCIATURA VALDÍRIA SANTOS DE SOUZA NÓS NA CIDADE: UMA INTERAÇÃO ENTRE TEATRO, EDUCAÇÃO E IDENTIDADE Salvador 2008
  • 2. VALDÍRIA SANTOS DE SOUZA NÓS NA CIDADE: UMA INTERAÇÃO ENTRE TEATRO, EDUCAÇÃO E IDENTIDADE Trabalho de Conclusão de Curso submetido ao Curso de Licenciatura em Teatro na Escola de Teatro da Universidade Federal da Bahia como requisito parcial para obtenção do Grau de Licenciado em Teatro. Orientadora:Prof. Ms. Maria Eugênia Viveiros Milet. Salvador 2008
  • 3. Sistema de Bibliotecas - UFBA Souza, Valdíria Santos de. Nós na cidade : uma interação entre teatro, educação e identidade / Valdíria Santos de Souza. - 2008. 112 f. : il. Inclui anexos. Orientadora : Profª Ms. Maria Eugênia Viveiros Milet. Trabalho de conclusão de curso (monografia) - Universidade Federal da Bahia, Escola de Teatro, Salvador, 2009. 1. Teatro na educação. 2. Identidade social. 3. Identidade racial. 4. Negros - Vida e costumes sociais - Salvador (BA). 5. Cidadania. 6. Criatividade. I. Milet, Maria Eugênia Viveiros. II. Universidade Federal da Bahia. Escola de Teatro. III.Título. CDD - 372.66 CDU - 792:37
  • 4. VALDÍRIA SANTOS DE SOUZA NÓS NA CIDADE: UMA INTERAÇÃO ENTRE TEATRO, EDUCAÇÃO E IDENTIDADE Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito parcial para obtenção do grau de Licenciado em Teatro, Escola de Teatro da Universidade Federal da Bahia. Aprovado em 18 de junho de 2008 Maria Eugênia Viveiros Milet – Orientadora____________________________________ Mestra em Teatro pela Escola de Teatro Universidade Federal da Bahia Antônia Pereira Bezerra______________________________________________ Pós-Doutora em Dramaturgia pela Université du Québec à Montréal UQAM Universidade Federal da Bahia Urânia Auxiliadora Maia- Curso de Artes Doutora em Educação pela Universidade Federal da Bahia na área de Teatro-Educação Faculdade Social da Bahia
  • 5. Ao meu pai Nelson Ribeiro de Souza (Seu Nelson) e a minha mãe Valdenice Santos de Souza (D. Nice), os meus primeiros educadores e mestres na arte de viver, os maiores responsáveis por tudo que eu sou hoje.
  • 6. AGRADECIMENTOS A Deus e aos Orixás. Aos meus pais, Nelson e D. Nice, aos meus irmãos Nilson e Nilton, as minhas irmãs, Valdinéia, Valdirene, Valdineide, Lucineide, Marie e Maria Alice. Um agradecimento especial a minha irmã Valquíria que colaborou com idéias para escrita do meu TCC. Minha família que foi a minha primeira escola, que me ensinou valores éticos e estéticos que me direcionou desde cedo ao caminho das artes. A Maria Eugênia, minha mestra, que não desistiu, que confiou, que me orientou, que me deu a mão e o braço nesta jornada. Meu carinho e afeto por toda a vida. Aos mestres com carinho, Sônia Rangel (pelos tempos de delicadeza), Luiz Marfuz, Érico José, Iami Rebouças, Sérgio Farias, Luis Cláudio Cajaíba, Luciano Bahia, Ana São José, Maria de Lourdes (saudosa Lurdinha), Antônia Pereira, Urânia Maia, Ângela Reis, Héctor Briones, Fernanda Paquelet, André Rosa, Paulo Dourado, Luciana Balbino (Escola Cid Passos), Edenice Santana de Jesus (Centro Educacional Edgar Santos), Vanda Machado, Carlos Petrovich, Renato da Silveira, Ordep Serra, Olímpio Serra, pela dedicação e generosidade. Aos meus primeiros mestres na arte de representar: Équio Reis e Franklin Costa. Aos meus melhores amigos Tânia Soares e Rafael Morais que me ajudaram a vir para Salvador, a permanecer e a entrar na faculdade, assim como a permanecer nela, a lutar pelos meus sonhos e a criar meus caminhos. A eles, minha amizade eterna. A Carmen Paternostro, minha amiga e incentivadora.
  • 7. Aos meus colegas e amigos que me agüentaram durante 4 anos na facul dade, que dividiram comigo momentos tão doces e intensos, nesse processo de educação e auto-conhecimento. Gessé, Eliana, Jandiara, Bira, Roseli, Ive, Camila, Daiane, Wellington, Eliete, Rubenval, Diana, Emiliano e Carla, meu agradecimento e admiração, por toda a contribuição na criação do processo e pela amizade. Sem vocês esse trabalho não existiria. Aos que entraram conosco, mas que por algum motivo, seguiram outro caminho, mas que com certeza deixaram suas contribuições nas músicas e textos do espetáculo Nós na Cidade. Mabele, Mariana, Jorge, Alexandre, Eliciana, Roberto e Roque. Aos meus colegas, do grupo Licenciatura 2005.1, que me receberam com carinho e afeto. Meu agradecimento especial a Gonzalez pelas fotos e músicas do nosso espetáculo, a Francisco pelo carinho e generosidade ao responder o questionário que contribuiu com o TCC. A equipe de Comunicação do CRIA, nas pessoas de Tássia Batista e S cheila Gomes, pelos materiais cedidos e ao grupo CRIAPOESIA, pela companhia. Ao ator e diretor Ângelo Flávio. Ao Terreiro da Casa Branca. A Doutora Tereza Cristina. A todos os meus amigos e incentivadores, que estavam perto, ou mesmo os que estavam longe, mas que torceram por mim. Meu muito obrigada!
  • 8. Um povo sem conhecimento do seu passado histórico, origem e cultura é como uma árvore sem raízes. (Bob Marley)
  • 10. SOUZA, Valdíria Santos de. Nós na Cidade: uma interação entre teatro, educação e identidade. 112f. 2008. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação) – Curso de Licenciatura em Teatro, Escola de Teatro, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2008. RESUMO Estão descritos neste trabalho os processos metodológicos de construção do espetáculo Nós na Cidade - espetáculo proveniente de um processo colaborativo desenvolvido pela turma de Licenciatura em Teatro de 2004 – que possibilitaram minha busca de auto-conhecimento, a formação de um grupo artístico e sua identidade como grupo. Através da arte educação, os alunos/atores desse processo se encontraram com a história da cidade de Salvador e com a história dos afro-brasileiros, possibilitando assim, um pensamento crítico sobre a Educação Étnico-Racial e a Lei 10.639/2003, através dos diálogos que realizaram com várias instâncias da cidade. O trabalho, que inclui depoimentos dos integrantes e o texto resultante do processo criativo, apresenta uma prática artística, política e pedagógica de teatro-educação baseado em jogos e improvisação. Aponta para possibilidades de educação para cidadania, através do exercício da criatividade, na dimensão cultural das cidades, valorizando as pessoas como sujeitos históricos da sociedade a qual pertencem. Palavras Chave: teatro, identidade, educação étnico-racial, cidadania e criatividade.
  • 11. APRESENTAÇÃO Este trabalho é um relato da minha experiência como artista/educadora envolvida no processo criativo de construção do espetáculo Nós na Cidade, desenvolvido pela turma de Licenciatura 2004 a partir componente curricular Improvisação e Jogos Dramáticos. Esta experiência foi vivenciada por mim e minha turma nos três primeiros semestres (referentes aos Módulos I, II e III) no curso de Licenciatura da Escola de Teatro da Universidade Federal da Bahia. A partir da metodologia desenvolvida no componente curricular Improvisação e Jogos Dramáticos, orientado pela professora Maria Eugênia Milet, pesquisamos a cidade de Salvador e nesse processo de pesquisa chegamos ao primeiro Candomblé de Keto da Bahia e a sua primeira Mãe de Santo Iyá Nassô, o que nos levou a refletir sobre a formação da sociedade brasileira através das matrizes estéticas culturais e sobre a importância do teatro na educação, na formação do educando como cidadão crítico e participante ativo da sociedade a qual ele pertence. Neste trabalho apresentamos uma proposta de arte-educação voltada para o exercício da criatividade e cidadania, através do conhecimento e valorização da história e expressão do povo negro, no contexto da construção de um currículo aberto às manifestações culturais da cidade. Sendo assim tivemos como aspiração, inspirar e revelar processos educacionais sensíveis e libertários de transformação social, referendando lutas e conquistas, dentre as quais, a lei 10.639/2003, que obriga o ensino da cultura afro-brasileira nas escolas públicas e particulares de ensino fundamental e médio. A pesquisa sobre a cidade se deu através de um processo interdisciplinar e trans- disciplinar proporcionado pelo novo modelo do currículo implantado na Escola de Teatro, o que possibilitou o diálogo entre diversas áreas do conhecimento dentro e fora da sala de aula. Foi realizada também uma pesquisa de auto-conhecimento – na descoberta do Quem Sou Eu – e de conhecimento coletivo através do diálogo dos alunos/atores uns com os outros e com a cidade. Uma experiência artística-política e
  • 12. pedagógica, na qual o exercício da criatividade e de construção coletiva pôde fomentar ricos processos de aprendizagem ligados à história do Brasil, da África, de Salvador e dos Orixás. Este trabalho é um estudo de caráter histórico, descritivo, analítico e poético. A poesia é trazida nas falas dos componentes do grupo que foram entrevistados e nas citações de Paulo Freire sobre educação e as Cidades Educativas que permearam este estudo sobre esse processo de formação individual e coletiva, através da prática educativa de ensino/aprendizagem com o teatro. Queremos aqui destacar o processo criativo “experenciado” e a “cidade educativa” que foi emergindo na construção desta cidadania, e também na construção do espetáculo que espelhava uma Salvador feita com lutas e expressões dos povos negros, com a sua espiritualidade. Aqui, pretendemos refazer as dobraduras pelas quais fomos desvelando os cenários e as personagens ocultadas da cidade, inclusive Nós na Cidade, alunos, aprendizes de um novo tempo, Sujeitos criativos de nossa história. Este trabalho de conclusão de curso traz à tona meu processo pessoal de auto- conhecimento, meu crescimento, minha consciência de pertencimento étnico cultural e meu envolvimento e responsabilidade com a cidade e seus personagens. Está repleto de gratidão e lembranças. Por exemplo, da professora Edenice Santana de Jesus coordenadora pedagógica do Centro Educacional Edgard Santos, e também ex-aluna da escola, - que esteve em nossa sala pedindo ajuda para sua luta diária de tentar envolver a comunidade, os professores e os alunos na revitalização de sua Escola – no início da sua palestra disse: “Sempre que eu vou começar qualquer atividade, peço licença aos meus ancestrais”. Com esta gratidão, também peço licença a todos os nossos ancestrais e aos Orixás para começar essa saudosa narrativa. Agô!
  • 13. LISTA DE FIGURAS Figura 01 – A pesquisa do figurino..................................................................................36 Figura 02 – O grupo e a professora no Pelourinho.........................................................43 Figura 03 – A Bahia Negra nos nossos traços e gestos.................................................45 Figura 04 – Francisco André em seu momento: Quem Sou Eu?....................................46 Figura 05 – Apresentação na frente de Câmara de Vereadores.....................................47 Figura 06 – Cantando Reconvexo...................................................................................49 Figura 07 – Ensaio na sala de aula.................................................................................49 Figura 08 – Arrumação da cena......................................................................................50 Figura 09 – Arrumação da cena......................................................................................51 Figura 10 – Torre de Babel..............................................................................................52 Figura 11 – Rubenval Meneses – o locutor.....................................................................54 Figura 12 – Cidade em festa em ritmo de xaxado...........................................................56 Figura 13 – Procissão de Doentes..................................................................................57 Figura 14 – Momento ônibus – processo em sala...........................................................58 Figura 15 – Vendedor e cliente – processo em sala.......................................................60 Figura 16 – Bira Azevedo – representando o padre da procissão..................................63 Figura 17 – Eliana Andrade em seu momento: Quem Sou Eu?.....................................63 Figura 18 – Apresentação em frente a Câmara de Vereadores......................................67 Figura 19 – Apresentação em frente a Câmara..............................................................69 Figura 20 – Mãe Tatá e outros membros do Terreiro assistindo ao espetáculo.............72 Figura 21 – Recebendo os aplausos do público.............................................................73 Figura 22 – O grupo na sala de aula...............................................................................75 Figura 23 – Momento de descontração...........................................................................86
  • 14. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO........................................................................................................13 2 EDUCAÇÃO ATRAVÉS DA ARTE: PROCESSOS EM RESULTADOS...............16 2.1 A CHEGADA...........................................................................................................17 2.2 A DESCOBERTA DO QUEM SOU EU...................................................................18 2.3 A FORMAÇÃO DO GRUPO...................................................................................27 2.4 NOSSA PRODUÇÃO..............................................................................................32 3 RESULTADOS EM PROCESSOS.........................................................................40 3.1 NÓS NA CIDADE....................................................................................................41 3.1.1 Sobre a encenação...............................................................................................41 3.1.2 O Texto..................................................................................................................47 3.2 MOBILIZAÇÃO SOCIAL, UMA QUESTÃO DE ATITUDE......................................64 3.3 UM OUTRO OLHAR SOBRE SALVADOR.............................................................76 4 PERSPECTIVAS PARA A CIDADE.......................................................................86 4.1 EDUCAÇÃO ÉTNICO- RACIAL, A LEI 10.639/2003..............................................87 4.2 REPERCUSSÕES NA UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA.............................96 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................................99 REFERÊNCIAS....................................................................................................101 ANEXOS...............................................................................................................104
  • 15. 13 1 INTRODUÇÃO Axé é para os nagôs a idéia de forças circulantes capazes de engendrar a criação e a expansão da vida, tornando tudo mais profundo mágico e forte. Nesta força nos encontramos com nossa ancestralidade - com o povo africano - encontramos a energia que nos move criativamente e fomos “desocultar” uma realidade existente, sentida e vivida no passado, pensando criticamente o presente através do teatro, que “ainda tem a fama de ser a casa do saber, um guardião do patrimônio artístico de várias culturas” (FARIAS, 2002), inclusive da nossa, que estava sendo ocultada, portanto, pensando o teatro como instrumento de educação inclusive política, sem deixar de viver o intenso prazer estético e emocional proporcionado por ele, procuramos dá um novo sentido a nossa educação. Com o Axé, perpassando nossos inconscientes coletivos criamos um espetáculo chamado Nós na Cidade – engendrando a criação e expansão da vida – e junto com outros atores sociais, começou com uma luta da qual decidimos fazer parte. Esta luta se travava para a mudança de nome de um centro cultural localizado na antiga Igreja da Barroquinha, “berço dos guerreiros nagôs”, que fundaram o primeiro Candomblé de Keto da Bahia. Neste passo a passo de investigação sobre essa história, fomos instigados a nos conhecer melhor e mais ainda a cidade, seus lugares, suas histórias e seus protagonistas. E logo chegamos a uma grande mulher, Iyá Nassô, personagem importante na construção da cidade, a partir da criação do Terreiro da Casa Branca que se desdobra em vários outros terreiros de Candomblé nagô, na nossa cidade negra de São Salvador. Com a construção coletiva do espetáculo Nós na Cidade, nos reconhecemos como cidadãos críticos pertencentes a um grupo social, entendemos nossas múltiplas identidades e nos reconhecemos como negros e brasileiros. Entendemos o processo de formação de nossa sociedade baiana, reconhecendo as marcas deixadas pelos nossos ancestrais - os negros trazidos do Continente Africano - nos contornos da cidade.
  • 16. 14 Com um processo de auto-conhecimento e integração social – uma mescla entre singularidades individuais e unidade social - vivenciamos questões sociais e poéticas, nesta experiência artístico-política e pedagógica, na qual o exercício da criatividade pode fomentar processos de aprendizagem ligados à história do Brasil, da África e de Salvador. Éramos 25 alunos muito diferentes, de outras cidades do estado da Bahia e de outros estados do Brasil. Alguns já trabalhavam com teatro, davam aulas, eram atores, outros, estavam apenas começando a sua jornada na educação e no teatro. A construção daquele currículo levava em consideração cada um de nós, inclusive os professores dos outros componentes, pois a filosofia da proposta curricular em módulo, adotada justamente naquele ano na Escola de Teatro, era baseada na interdisciplinaridade, que pressupõe a participação e a integração. Das improvisações e jogos foram nascendo o texto, as imagens e as músicas. Falamos de nós dentro desta cidade de Salvador, de seus doentes e loucos, de seus monumentos e encantos. Tivemos aulas e fizemos apresentações do nosso processo na Barroquinha, em praças, em escolas como no Centro Educacional Edgar Santos, na Casa Branca, no Pelourinho, na Câmara de Vereadores e na Escola de Teatro, sempre acompanhados do grupo CRIAPoesia um grupo de arte e educação do Centro de Referencia Integral do Adolescente1, que tem como coordenadora nossa professora Maria Eugênia Milet. Com a obrigação do ensino da cultura afro-brasileira nas escolas de ensino fundamental e médio (públicas e particulares), pela Lei 10.639/2003, o nosso estudo pode contribuir com formas de inserir a história da África e afro-brasileira no currículo, sem preconceito, de uma forma lúdica e séria, possibilitando ao estudante uma visão completa e crítica da formação da sociedade brasileira e das três matrizes que a compõem. 1 O CRIA – Centro de Referencia Integral de Adolescentes foi estruturado como ONG em fevereiro de 1994 com o projeto Educação- Um Exercício de Cidadania, que visava a implantação de educação sexual e de outras questões ligadas a cidadania, nos currículos escolares da 5ª a 8ª séries das escolas da rede municipal, bem como a implementação de ações voltadas para a saúde dos adolescentes a partir dos centros de saúde e da formação de educadores e adolescentes multiplicadores. Os temas trabalhados, ligados a formação integral do adolescente são prioritários no desenvolvimento das ações e projetos do CRIA visando a dimensão de cidadania: educação, sexualidade e etnia.
  • 17. 15 Acreditamos que este trabalho possa contribuir para a discussão sobre a qualificação da escola a partir de uma compreensão mais significativa de valores étnico- culturais dos quais todos os brasileiros fazem parte. Corroborando com os esforços de muitos educadores em desenvolver a consciência crítica e os valores civilizatórios da população para que os preconceitos não prevaleçam, acirrando assim, o racismo e a violência contra o povo negro. Nossa intenção, com este trabalho, é destacar as experiências significativas de educadores e educandos com referências palpáveis de valorização de suas origens para ampliar sua auto-estima. Neste sentido, afirmamos e confirmamos a importância da arte dentro da sala de aula, como também, os conceitos sobre teatro de improvisação de Viola Spolin; a metodologia de educação-através-da-arte com Dourado e Milet e o pensamento de Paulo Freire, através dos livros A importância do ato de ler, Pedagogia do Oprimido Pedagogia da Autonomia e Política e Educação. Pensamos como Paulo Freire, em construir uma Cidade Educativa, que considere o Axé e toda nossa ancestralidade, assim como diz o próprio autor uma “Cidade Educativa”: As Cidades Educativas devem ensinar aos seus filhos e aos filhos das outras cidades que as visitam que não precisamos esconder a nossa condição de judeus, de árabes, (...) de brasileiros, de africanos, de latino-americanos de origem hispânica, de indígenas não importa de onde, de negros, de louros, de homossexuais, de crentes, de ateus, de progressistas e conservadores para gozar de respeito e de atenção (2001, p. 25). Uma “Cidade Educativa” que nos possibilite respeitar os que existiram antes e os que virão, pensando uma educação mais justa, que contemple a todos independente de sua cor, classe, sexo ou religião, tornando o mundo “menos feio”, deixando nas ruas, nas praças, “as marcas do nosso tempo”, conservando também “os selos de certas épocas”, capazes de mostrar, quem fomos, quem somos e quem podemos ser, pensando o passado para construir nosso futuro.
  • 18. 16 2 EDUCAÇÃO ATRAVÉS DA ARTE: PROCESSOS EM RESULTADOS Sou pequena Sou menina Desejosa de crescer Quando grande Menina Vou querer voltar a ser Para andar livre pelos sonhos Inventando novas formas de viver. Valdíria Souza
  • 19. 17 2.1 A CHEGADA O curso de Licenciatura em Teatro da UFBA, no ano de 2004, começou com uma novidade: o currículo da escola adotou o sistema de módulos que consiste em sete módulos interdisciplinares obrigatórios, seqüenciais, com componentes curriculares (antigas disciplinas) bem definidos e integrados com ênfase na prática. Cada módulo é pré-requisito para o seguinte e é composto de 25 horas semanais, em um único turno. No caso do curso de licenciatura, é desenvolvido de segunda à sexta-feira, das 13 às 18 horas. O Componente Curricular, Improvisação e Jogos Dramáticos, carro chefe do 1º semestre é, segundo a minha compreensão, norteador de toda filosofia do novo sistema, pois consiste em abordar teoria e prática das diversas técnicas de improvisação e jogos dramáticos utilizados em teatro, visando tanto a livre criação de textos e personagens, quanto à formação de um grupo que irá participar ativamente da construção de seu processo de ensino-aprendizagem, e, por conseguinte, no aperfeiçoamento da proposta curricular do Curso da Licenciatura. Este componente era coordenado pela professora Maria Eugênia Milet, que também coordenava o módulo, e nesta função tinha a responsabilidade de articular os componentes, provocando a integração entre os professores para a construção de uma proposta interdisciplinar e para avaliação dos alunos. A estruturação dos módulos do curso tem um caráter temático e progressivo contendo definições genéricas para garantir a flexibilidade do processo. O módulo I, por exemplo, tem o tema Eu e a Cidade, responsável pela primeira experiência criativa do grupo de alunos calouros. No nosso caso, a experiência resultou no espetáculo Nós na Cidade, que foi apresentado e aprimorado durante os módulos II e III. Através deste tema as disciplinas práticas e teóricas se integravam para construção deste espetáculo. Vinte e seis alunos tiveram a oportunidade de serem os primeiros a participarem do novo sistema, ingressando na universidade através do vestibular, e eu fui uma das contempladas a participar da primeira turma de licenciatura em teatro que inaugurava
  • 20. 18 este novo currículo, que integrava os nossos saberes com os nossos contextos, uma busca de referenciais culturais e auto-conhecimento através dos jogos, das improvisações, dos trabalhos teóricos e das rodas de conversa. 2.2 A DESCOBERTA DO QUEM SOU EU O procedimento Quem Sou Eu-Quem Somos Nós? foi criado pela professora Maria Eugênia Milet e é desenvolvido no teatro do CRIA. Está relatado em sua Dissertação de Mestrado: Uma Tribo Mais de Mil - O Teatro do Cria e foi utilizado nas aulas do curso de licenciatura, como parte integrante do componente curricular Improvisação e Jogos Dramáticos. Segundo a professora Maria Eugênia, este procedimento propõe aos sujeitos do processo, a busca do auto-conhecimento, e de exercício poético-corporal e musical para que se instaure um ambiente de desnudamento e o jogo se estabeleça, no mergulho de cada um em sua história (e na imaginação e espontaneidade), bem como na construção de uma composição coletiva integrando nomes, idéias, imagens, e memórias. “Através de um percurso íntimo e coletivo que vai delineando uma estética e uma ética – uma pedagogia gerada na sensibilidade e no exercício da participação” (MILET, 2005 p. 73). O sonho comum encontra-se no sentir, no pensar e no fazer de um teatro com dança, música e poesia – arte que se cria na maneira de educar, para ampliar a consciência do pertencimento ao País e ao mundo, a medida que enaltece a presença das pessoas, a partir dos processos de auto-conhecimento e de construção criativa- interativa, que se processa com o corpo todo: mente, sensação, carne, emoção, memória e intuição (MILET, 2005, p. 74). Além deste procedimento a metodologia integrava um processo de educação estética, baseada em jogos infantis e teatrais, referenciava a prática em paralelo a experimentação de um repertório diversificado de técnicas de improvisação. Esta proposta estava ancorada, tanto no sistema de jogos teatrais concebido por Viola Spolin, através de seu livro Improvisação para o Teatro (1992), quanto na proposta por
  • 21. 19 Dourado e Milet, apresentada no Manual de Criatividades (1998), onde são apresentadas considerações práticas, filosóficas, metodológicas e 257 atividades para auxiliar professores de arte-educação. É preciso se descobrir, se conhecer, ter consciência das formas que definem esse alguém. Esse alguém... Quem? Sou eu? Quem Sou eu? Vim das cavernas, vou para naves e estou nessa cidade de urbanóides. Camila Bonifácio – integrante do grupo nas improvisações “Quem sou eu”. A pesquisa do Quem sou eu - Quem Somos nós? Foi muito importante para a turma. Íamos descobrindo o nosso eu poético em contato direto uns com os outros - um constante diálogo. O eu era construído e desvelado, e uma partitura ia sendo composta e ao mesmo tempo que nos mostrávamos nos jogos, dialogávamos com o eu do outro, em constante criação e transformação. Trazemos então Paulo Freire para ressaltar a importância do diálogo no processo de transformação do Eu, para a transformação também do mundo. O autor diz: O eu dialógico, sabe que é exatamente o tu que o constitui (...) esse tu que o constitui, se constitui, por sua vez, como eu, ao ter no seu eu um tu. Desta forma, o eu e o tu passam a ser na dialética destas relações constitutivas, dois tu que se fazem dois eu. (...) sujeitos que se encontram para a pronúncia do mundo para a sua transformação (1987, p. 165-166). O diálogo que se instaurava no jogo era mais amplo do que o que se dava simplesmente na conversa, como troca de idéias. Apesar da metodologia também valorizar as rodas de conversa, ao final de cada aula, era proposta uma “reflexão-ação”, assim como propõe Paulo Freire, o diálogo “como encontro, onde há homens que em comunhão buscam saber mais” (1987 p. 80-81), aprendendo a importância de ouvir e confiar no outro, sem querer impor a sua palavra e entendendo aquele encontro como importante para a busca de auto-conhecimento e amadurecimento pessoal e coletivo. Ao fundar-se no amor, na humildade, na fé nos homens, o diálogo se faz uma relação horizontal em que a confiança de um pólo no outro é conseqüência óbvia. Seria uma contradição se, amoroso, humilde e cheio de fé, o diálogo não provocasse esse clima de confiança entre sujeitos. (1987, p. 81).
  • 22. 20 Enquanto aprendíamos a fazer teatro, também estávamos aprendendo a dialogar. Com muita escuta e com muita indagação, tanto com a professora, quanto para com nós mesmos – alunos sujeitos daquele processo – desenvolvemos uma espécie de crítica ao nosso papel de ser e estar no mundo, em nossa cidade, nos retratando, enquanto jovens cidadãos. Com esse objetivo de trocas de nossos saberes estávamos aprendendo novas maneiras de ensinar assim como ensina Paulo Freire: (...) o educador já não é o que apenas educa, mas o que enquanto educa é educado, em diálogo com o educando que ao ser educado, também educa. Ambos, assim, se tornam sujeitos do processo em que crescem juntos (...) Já agora ninguém educa ninguém, como tampouco ninguém se educa a si mesmo: os homens se educam em comunhão, mediatizados pelo mundo (1987, p. 68- 69). O tema do Módulo era Eu e a Cidade, então toda esta criação recuperava fortemente, também, a dimensão do lugar, o pertencimento a nossa cidade natal. Como nós alunos (nesta etapa já pertencendo a um grupo!) tínhamos origens diferentes, as cidades, lugares, eram acolhidos e integrados às cenas. E Salvador nos esperava nas ruas e nos acolhia também, ali dentro da sala da Universidade. Ali, a cidade se expressava em nós, cidade expandida nos vários ecos de cada um, era o que estávamos vivendo, como podemos ver neste depoimento: Oxente quem sou Eu? Vou carregar esta pergunta sempre comigo. Me perguntei isto no primeiro semestre e a cada vez que me perguntava tentava me responder. Hoje continuo me perguntando e sempre descobrindo novas respostas, novos Biras que é resultado de todos os Biras que fui e que ainda sou, porque o sou. A grande contribuição na minha vida neste processo da busca de identidade é o fato de que agora eu entro na sala de aula, ou numa reunião de educadores ou num congresso (...) e eu sei o que eu quero, meus anseios, meus gostos, minhas escolhas. Ou pelo menos tenho pistas, perspectivas pra não ficar parecendo que estou dizendo que sou um ser decidido e sem conflitos internos. (...) Tivemos a chance de nos conhecermos mais. Nunca vou esquecer que Valdíria é de Ilhéus e que Santa Inês é a cidade de Gessé, por exemplo. (Bira Azevedo – Integrante do grupo) Pensar a cidade era pensar a estrutura política, geográfica, econômica e educacional e como estávamos inseridos nela. Assim, nas rodas de conversa, a idéia
  • 23. 21 de cada integrante era trazida, e a cena se ampliava, na dimensão de nossos gestos, palavras e nossa cultura, um exercício de criatividade impulsionado pelas improvisações sobre temas ligados à realidade, improvisações de músicas e poesias já existentes ou criadas pelo grupo. Um teatro mais amoroso e denso com meninos de Salvador – que chamariam é claro, muitos outros para entrarem na roda de brincar de mudar o mundo: de pensar, ser e estar na cidade, fazendo arte, e por que não Educação? (MILET, 2002, p. 24) Cada aula era única, com começo, meio e fim, com 04 etapas seqüenciadas: aquecimento; relaxamento-concentração; elaboração e avaliação, sempre levando em consideração as nossas necessidades e expectativas (DOURADO & MILET, 1998, p. 31). Inicialmente desenvolvemos vários jogos tendo como objetivo alcançar uma fluência expressiva e minimizar as barreiras individuais e grupais. Estávamos na fase liberação, 1ª fase do método de trabalho desenvolvido no Manual de Criatividades. A fase liberação “contém atividades que caracterizam principalmente, por solicitar uma grande participação física: mobilidade, agilidade, reflexos, coordenação, desinibição” (DOURADO & MILET 1998, p. 17). O Jogo é uma forma natural de trabalho de grupo que propicia o envolvimento e a liberdade pessoal necessária para a experiência. Os jogos desenvolvem as técnicas e habilidades pessoais necessárias para o jogo em si, através do próprio ato de jogar. As habilidades são desenvolvidas no próprio momento em que a pessoa está jogando, divertindo-se ao máximo e recebendo toda estimulação que o jogo tem para oferecer. (SPOLIM,1992, p. 4) Sem nenhuma preocupação com resultados estéticos cênicos pré-concebidos ou artisticamente planejados e ensaiados a primeira finalidade a ser alcançada é crescimento pessoal dos jogadores através do domínio e uso da linguagem teatral. Trabalhar com improvisação pressupõe a idéia de que todas as pessoas são criativas, podíamos exercitar nossa criatividade e contribuir com o processo que estava nascendo, sem medo, sem vergonha. Qualquer juízo de valor como feio/bonito, bom/mal, certo/errado, mesmo que não seja colocado como correção avaliação, pode projetar modelos de conduta,
  • 24. 22 aos quais o aluno vai tentar adaptar-se, fugindo assim à expressão genuína do seu verdadeiro universo, o que constituiria justamente o oposto dos principais objetivos da Educação através da Arte: o auto-conhecimeto e a livre expressão do indivíduo. (DOURADO & MILET, 1998, p.19). Os jogos e brincadeiras possibilitaram a criação individual e grupal de movimentos e sons, contato entre os componentes do grupo buscando uma cumplicidade e segurança de um para com o outro. O objetivo era claro, entrar em contato com outro, podendo observar e perceber as diferenças de cada um, respeitando tempo e presença, descobrindo que é essencial trabalhar em grupo, pois completamos o nosso trabalho com o do colega para ter o resultado de um todo. Buscamos uma consciência corporal capaz de superar limites físicos, com movimentos repetitivos seguindo uma seqüência elaborada nas improvisações grupal e individual. Nessas improvisações cada um criou um texto para dizer quem sou eu, de onde vim e para onde vou e esse texto era dito junto com as partituras corporais. Este foi o ponto de partida para construirmos um ritual, que só foi possível porque houve um respeito do momento de cada um, em suas improvisações de sons e movimentos, de sua experiência criativa. Partimos então para responder criativamente a pergunta que não queria calar: Quem sou eu? O gesto nasceu da loucura e do movimento repetitivo e quente A loucura, a dança e a luta imperam O corpo precisa de movimento. A consciência é esquecida E corpo se movimenta loucamente Loucura, loucura, Ilhéus, cacau, loucura, Ilhéus... Valdíria Souza A loucura descrita no verso acima era o espelho daquele novo momento que estávamos vivendo. Expondo-nos uns aos outros, sem constrangimento, fazendo sons e movimentos aparentemente desconexos. Com o texto que estava nascendo intuitivamente, desenhávamos no espaço uma metáfora do nosso eu, revelando-o para os outros, no texto-palavra, e no texto mostrado no corpo-físico. Estávamos livres para jogar, e podíamos sentir essa liberdade proporcionada pelo momento. Segundo Spolin, “a liberdade pessoal nos ajuda a ter autoconsciência (auto- identidade) e auto-
  • 25. 23 expressão” e essa sede de auto-identidade enquanto básica para todos nós, “é também necessária para expressão teatral”. (1992, p. 6). O jogo é psicologicamente diferente em grau, mas não em categoria, da atuação dramática. A capacidade de criar uma situação imaginativamente e de fazer um papel, é uma experiência maravilhosa, é como uma espécie de descanso do cotidiano que damos ao nosso eu, ou as férias da rotina de todo dia. Observamos que essa liberdade psicológica cria uma condição, na qual tensão e conflito são dissolvidos e as potencialidades são liberadas no esforço espontâneo de satisfazer as demandas da situação. BOYD (apud SPOLIN,1992, p. 5) A experiência em grupo, centrada nos jogos e improvisações, enfatizava o exercício da criatividade do ator, possibilitando que atuássemos com o nosso corpo todo. (...) um corpo, um coletivo disposto a se envolver em processo contínuo de criação e educação(...) Um corpo com propósito comum de trazer o verbo para ação de (i) ver(s) cidade, um ato poético de ser, sendo parte integrante da multiculturalidade da cidade e do Brasil, para promover novos olhares e assim fomentar processos de mudanças. (MILET, 2002, p. 52) Transformando em energia nossa vontade para o ato do jogo éramos desafiados a estar sempre atentos a nós mesmos, e aos demais. Concentrados, e deixando o racional de lado, nos permitíamos e, assim, as energias circulavam, preenchendo todos os espaços, liberando em nós toda nossa espontaneidade, causando uma grande explosão dos nossos eus. Através da espontaneidade somos re-formamos em nós mesmos. A espontaneidade cria uma explosão que por um momento nos liberta de quadros de referência estáticos, da memória sufocada por velhos fatos e informações, de teorias não digeridas e técnicas que são na realidade descobertas de outros. A espontaneidade é um momento de liberdade pessoal quando estamos frente a frente com a realidade e a vemos, a exploramos e agimos em conformidade com ela. Nessa realidade as nossas mínimas partes funcionam como um todo orgânico. É o momento de descoberta, de experiência de expressão criativa. (SPOLIM, 1992, p. 4) Para gerar nossa expressão criativa/coletiva, começávamos a desenhar com nossas improvisações, relações sensíveis de contatos, quebrando as barreiras que ainda existiam entre nós e construindo novas formas de dizer e estar no mundo e de
  • 26. 24 construir nosso conhecimento, se apropriando da palavra do outro, observando como o outro tomava emprestada a nossa palavra, dando nova forma, com novos movimentos, com novas formas de arquitetar as palavras e os versos a estrutura poética que estava nascendo. Reconhecer-me no outro na tentativa de me auto-conhecer. Vim de Santa Inês...Vieram da África e estão no céu dessa cidade, no chão dessa cidade, no povo dessa cidade. Gessé Araújo – Integrante do grupo Começamos a segunda fase do processo, e esta correspondia à segunda fase descrita no Manual de Criatividades - a fase de sensibilização “que tem como objetivo desenvolver a percepção sensorial do aluno e faze-lo vivenciar diversas formas de contato com o seu corpo, com o corpo do outro e o ambiente” (DOURADO & MILET 1998, p. 17). Na festa intensa do jogo da criação, na busca do nosso eu poético - uma busca coletiva de vários eus - nos encontramos na infância, nas brincadeiras e jogos que nos possibilitavam recuperar e transmutar a nossa história de vida: com lembranças e emoções do passado, valorizávamos o momento presente – o jogo, a cena, e projetávamos o futuro. Estávamos nos re-descobrindo, nos re-conhecendo mutuamente e principalmente re-descobrindo o prazer de ser criança, dispostos a jogar e aprender. Como diz o ator Rubens Corrêa, “essa é a lei e a sabedoria dos meninos, sou útil ainda brincando” (1994). E esse sentido da brincadeira como algo valoroso para o nosso trabalho como ator e professor de teatro nos caminhos que estávamos percorrendo era como uma volta à infância, um trabalho sensível de memória corporal. Que apesar das responsabilidades da vida adulta ter chegado até nós, ainda lembrávamos das brincadeiras no quintal da casa, das rodas de verso e das nossas mães ou avôs cantando cantigas para dormir. Ser criança nesse sentido era relembrar a espontaneidade e a liberdade do brincar, a inocência e a sinceridade ao criticar a realidade, subvertendo a ordem estabelecida, mostrando uma outra possibilidade de apreensão do mundo, através da capacidade de sonhar e de ter esperança. Trazíamos para a cena a nossa criança
  • 27. 25 interna, infância-memória e presença, através dos meninos e meninas que fomos e que ainda podíamos ser, não só com os jogos e brincadeiras lúdicas, mas com a criança que preservamos dentro de nós, que podíamos libertar no teatro através dos personagens que nos faziam reviver nossa criança interna. Como diz a professora Lydia Hortélio “e tenhamos as Crianças como nossas mestras, elas que são tão próximas à Vida e artífices naturais do futuro” (1998)2. Tanto para o trabalho do ator, como para a prática do arte-educador (que estávamos buscando conhecer), o contato com o universo infantil, trazido pela professora Milet, através dos jogos, brincadeiras, e através dos textos, pudemos perceber o que diz Rubens Corrêa: (...) A criança é uma fonte incrível de informação artística, e a criança que nós fomos recuperada, através do nosso lado lúdico, tão atrofiado pelo correr dos anos – pode nos servir de guia, mas um guia muito especial – que caminha alegre e despreocupado, que sabe descobrir o mágico dentro do cotidiano, intuitivamente. (CORRÊA, 1994) A professora Lydia Hortélio propõe a infância como plano sobre qual a educação e a arte devem se voltar. Nós futuros arte- educadores, estávamos recuperando a espontaneidade e a inocência perdida através dos anos e “buscamos ler no verdadeiro livro: a criança ela mesma, em seu movimento próprio – o brinquedo o brincar, onde ela se mostra em sua graça e poder, em sua inteireza e espontaneidade”(1998)3. É através da arte que podemos ser o que quisermos, deixando fluir na criação os sentidos que os textos, poemas, músicas, danças e brincadeiras expressam em nosso corpo, podendo ser criança, “ser humano e ser divino” assim como propõe Fernando Pessoa no poema O Guardador de Rebanhos, por Alberto Caiero, “despindo o ser” e “desconstruindo” as verdades pregadas pela sociedade. “(...) E a criança tão humana que é divina É esta minha quotidiana vida de poeta, E é porque ele anda sempre comigo que sou poeta sempre E que o meu mínimo olhar me enche de sensação E o mais pequeno som, seja do que for Parece falar comigo. 2 Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil. Análises e Sugestões. 20 de março de 1998. 3 idem.
  • 28. 26 A criança nova que habita onde eu vivo Dá-me uma mão a mim E a outra a tudo que existe (...) E deito-o, despindo-o lentamente E como seguindo um ritual muito limpo E todo materno até ele estar nu. Ele dorme dentro da minha alma E às vezes acorda de noite E brinca com os meus sonhos. (...) Sou um guardador de rebanhos O rebanho é os meus pensamentos E os meus pensamentos são todos sensações. Penso com os olhos e com os ouvidos E com as mãos e os pés E com o nariz e a boca. (...) Sinto todo o meu corpo deitado na realidade, Sei a verdade e sou feliz”. O procedimento quem sou eu pautado nesta busca de auto-conhecimento e de construção de conhecimentos da criação coletiva, estabeleceu uma nova forma de ver e pensar a educação através dos seus próprios fazedores, os alunos atores que desenvolviam uma maneira sensível de falar com o corpo, com os sentimentos, os pensamentos e emoções. Íamos assim descobrindo novas formas de educação. Uma Educação através da arte, que leva em consideração o conhecimento trazido pelo aluno e não o trata como mero receptor de informação, assim como destaca Francisco um dos integrantes do grupo, nunca ter imaginado que suas vivências iriam ser valorizadas como conhecimento. (...) em nenhum momento previa que as minhas vivências particulares e peculiares iriam ser valorizadas como “conhecimento de mundo” e científico. Essa grande e positiva surpresa ajudou bastante a desenvolver a minha visão afetiva e poética da arte/educação. E principalmente valorizou sobre medida a minha auto-estima de pessoa do interior, negro, pobre, egresso de um sistema de ensino público com inúmeras deficiências. Ter valorizado a nossa identidade nos primeiros contatos com a universidade contribuiu significativamente para a formação de um novo perfil de professor de teatro, mais sensível ao contexto social e valorizando a história de vida de nossos futuros alunos. (Francisco André Souza Lima)
  • 29. 27 A poeta Adélia Prado atribuiu uma importância essencial à arte na educação, pois a “arte sendo pura expressão” é capaz de trabalhar sentimentos, emoções, criatividade, essência, alma, fé, sensibilidade e poesia: A escola, no seu conjunto padece de uma defasagem acadêmica, pior do que isso de uma decadência nas áreas das humanidades. (...) Para onde foi a poesia? A literatura? (...) Tudo isso tem a ver com a minha felicidade pessoal que foi colocada em segundo plano nas escolas, por causa da mentalidade utilitária da educação. (...) A arte na escola é que vai dá sentido. A mudança deve partir de quem está na escola. O professor (...). (2002/2003) A escola que vivencia a arte no seu dia a dia torna-se capaz também de construir indivíduos mais felizes, mais humanos e com a auto-estima elevada. E essa mudança tem que partir de quem está na sala de aula, nós professores. 2.3 A FORMAÇÃO DO GRUPO O teatro fala por si e a educação celebra a arte do encontro, fazendo-se na interação com as pessoas. Maria Eugênia Milet Todos os dias, de segunda à sexta-feira, das 13 as 18 horas, estávamos juntos na faculdade freqüentando as aulas do módulo I. Entendíamos que como alunos, tínhamos o compromisso de estarmos juntos. Alguns estavam se relacionando afetivamente porque encontraram afinidades, outros estavam se relacionando intelectualmente para realizarem trabalhos acadêmicos. Começamos a ser sensibilizados desde o início pela proposta coletiva, baseada no teatro improvisacional - sistema de jogos teatrais - um método de ensino/aprendizagem que só poderia acontecer com uma interação de grupo. Essa relação grupal surgia naturalmente, pois a metodologia exige dos participantes um
  • 30. 28 amplo relacionamento, com total participação e contribuição pessoal, trabalhando juntos para completar o projeto. Assim como o jogo, o teatro é uma atividade artística que exige a participação de muitas pessoas, e o teatro improvisacional que estávamos trabalhando requeria “um relacionamento de grupo muito intenso, pois é a partir do acordo e da atuação em grupo que emerge o material para cenas e peças” (SPOLIM,1992, p. 9). Foi através desses acordos, que começamos a imprimir em nosso relacionamento o respeito, a compreensão as diferenças, a atitude sincera ao criticar na avaliação, a participação de algum colega que chegou atrasado na sala e não ter participado da atividade desde o início, ou de outros que faltaram e não realizaram a cena coletiva ensaiada anteriormente com todos os presentes. Através do respeito entendíamos os problemas pessoais que alguns tinham e faltavam ou chegavam tarde na aula, e nesse processo de respeito mútuo, todos foram entendendo que apesar dos problemas, para essa ação de ensino/aprendizagem acontecer, dependia da participação real de todos. Tanto a participação física, quanto a intelectual. Mente aberta para jogar e responder os problemas que estavam sendo propostos para realizar a cena. Com a dominação de cada problema caminhamos para uma compreensão mais ampla, pois uma vez solucionado o problema, ele se dissolve como algodão doce. Quando já dominamos o engatinhar, nos pomos em pé, e quando nos levantamos começamos a andar. Esse aparecimento e dissolvição infinitos de fenômenos desenvolve uma visão (percepção) cada vez maior com cada novo conjunto de circunstâncias. (SPOLIM, 1992, p. 10). Os problemas pessoais eram colocados nas improvisações e as diferenças entre cada componente eram trazidas como símbolo de respeito. O processo de reconhecimento de grupo trabalhado nas improvisações do Quem Sou Eu, foi gerando uma afetividade mútua, na troca de olhares, no tocar as mãos nos círculos, nos jogos de confiança e principalmente no processo de revelar-se para o outro, nos mostrando que apesar das diferenças podíamos acrescentar nossos saberes para um objetivo comum e crescimento de todos. Para comprovar esse amadurecimento de grupo, importante para nosso trabalho como arte-educadores
  • 31. 29 trazemos os depoimentos dos integrantes do grupo que destacam a importância do processo não só para a criação do espetáculo, mas também na construção de um novo olhar sobre a educação, gerando na turma um reconhecimento de grupo. E a identidade do educador que somos hoje também é pautada nesse reconhecimento. Como artista e arte-educador a busca pela afirmação de uma identidade de grupo e individual foi de extrema importância não apenas para minha formação acadêmica, como também pra construção de um novo olhar sobre a educação superior.(...) Esse processo criativo, portanto, foi importante não só para a criação do espetáculo “Nós da cidade”, mas principalmente porque gerou na turma o reconhecimento de uma identidade de grupo. A partir desse momento nos tornamos solidários na busca pelo conhecimento, derrubando os limites entre o ser professor e ser aluno. (Francisco André Sousa Lima) (...)A minha identidade enquanto professora de teatro, logo arte-educadora, só foi possível devido colaboração de todo o grupo. Paralelo a minha formação acadêmica, participei de outras formações profissionais, pessoais e espirituais que de maneira simples e bela, me ajudou a entender melhor a identidade grupal. Hoje mais do que nunca, preservo e incentivo, a necessidade de entendimento de grupo junto aos meus educandos.(...) Com esta metodologia foi possível perceber claramente o quanto nós, homens e mulheres precisamos nos educar para viver em grupo. (Camila Bonifácio) Quando começo um trabalho com uma turma nova ou quando quero aprofundar questões em grupos já formados, procuro criar e utilizar caminhos de criação e fortalecimento dos vínculos entre as pessoas. Aprendi a fazer, a conduzir este processo com o nosso grupo e a prática de Eugênia.(...)Havia respeito entre o grupo. Sabíamos das limitações uns dos outros, tivemos brigas, mas sabíamos nos tolerar, ficamos juntos ate o final(...). (Bira Azevedo) As características pessoais acabaram servindo como elementos formadores da força desse grupo. Com cada um apresentando características pessoais que sozinhas poderiam não surtir efeito, mas unidas agregavam valores que ajudavam na coesão do grupo, tornando-o forte, para entrar em cena. (...) quando atua com o grupo, experienciando coisas junto, o aluno-ator se integra e se descobre dentro da atividade. Tanto as diferenças como as similaridades dentro do grupo são aceitas. Um grupo nunca deveria ser usado para induzir conformidade, mas como num jogo deveria ser elemento propulsor da ação (SPOLIM, 1992, p. 9). O trabalho com os jogos teatrais e as brincadeiras, fortaleceu o grupo como célula operativa de regras. Se unir para realizar a atividade proposta era importante para o coletivo e com essa união, nos re-conhecíamos, conhecíamos nossas afinidades e
  • 32. 30 diferenças e nos uníamos cada vez mais, traçando através da arte nossos caminhos pessoais e profissionais, pensando a educação democrática que estávamos vivenciando. Não há crescimento democrático fora da tolerância que, significando, substantivamente, a convivência entre dessemelhantes, não lhes nega contudo o direto de brigar por seus sonhos. O importante é que a pura diferença não seja razão de ser decisiva, para que se rompa, ou nem se quer se inicie um diálogo através do qual pensares diversos, sonhos opostos, não possam concorrer para o crescimento dos diferentes, para o acrescentamento de saberes. Saberes do corpo inteiro dos dessemelhantes, saberes resultantes da aproximação metódica (...) Saberes de suas experiências feitos, saberes “molhados” de sentimentos, de emoção de medos, de desejos (FREIRE, 2001, p. 17). Assim o grupo foi formado, porque pactuavam de um intenso processo criativo- educativo, processos psico-sócio-culturais de formação de identidade. Esse processo foi resultado de um convívio intenso, resultado de muitos conflitos, mas principalmente de extrema confiança, condição básica que nos permitiu criarmos juntos, um processo de educação estética e ética, capaz de gerar um espetáculo, que falava de nós e da nossa Cidade, como diz Paulo Freire, estávamos vivendo a autenticidade exigida pela prática de ensinar-aprender: Quando vivemos a autenticidade exigida pela prática de ensinar-aprender participamos de uma experiência total, diretiva, política e ideológica, gnosiológica, pedagógica, estética e ética, em que a boniteza deve achar-se de mãos dadas com a decência e com a seriedade. (1996, p. 24) A beleza apresentava-se na dimensão humana trazida em corpo e alma por nós integrantes do grupo, através de uma relação sensível e afetuosa que estabelecemos durante o processo criativo, como também em cena nas apresentações públicas. Daine integrante do grupo afirma essa beleza intrínseca ao processo: A beleza com que cada cena ia sendo tecida pessoa por pessoa e transformando-se em único e uníssono. Além de poder construir textos, poesias e partituras corporais mais verdadeiras e significativas (Daiane Gama). O trabalho nos deixou próximos uns dos outros e atentos para nossa cidade. Vivemos e compartilhamos nossa crise de identidade, nos ajudando a conhecer o
  • 33. 31 nosso mundo e pensando profundamente o sentido: Quem Sou Eu? Gessé Araújo destaca a visão mais politizada da educação provocada por esse processo, enquanto Daiane Gama reflete a sua mudança, pautada na leitura do mundo antes da leitura da palavra assim como Paulo Freire nos ensinou no livro A Importância do Ato de Ler (1983) que nos acompanhou desde o início do nosso processo de formação. Temos hoje, de uma maneira geral, uma visão mais ampliada de arte e do próprio teatro que nos propomos fazer. Isso é pra mim uma coisa bastante agregadora neste sentido de grupo. Outra coisa, temos uma visão muito mais politizada de nossa arte, de maneira mais geral, de nossas maneiras de intervir no mundo como educadores (Gessé Araújo). Uma transformação no meu jeito de ver a vida e as minhas possibilidades. Tudo se ampliou. Não só o meu campo de visão, como o meio de alcançar os meus objetivos. Agora faço escolhas baseadas nos anseios descobertos nesse processo. (...) Enquanto arte-educadora, utilizo com mais segurança essas descobertas e tento contagiar os alunos para que eles não só acreditem no que eu estou falando, como possa buscar suas próprias verdades e crenças. Assim como Paulo Freire acreditava que “a leitura do mundo antecedia a leitura da palavra” eu precisei ler esse mundo que estava bem a minha frente e isso só foi possível graças a esse processo de identificação individual e grupal. (Daiane Gama). A professora nos guiava por caminhos muito intensos pela arte-educação, sempre atenta, acompanhando o processo, promovendo mudança de rumos e nosso crescimento educacional. Ela também fazia parte do grupo e exercia seu papel de autoridade que lhe cabia, mas a todo tempo nos deixava livres para “alçar vôos”, nos estimulando a pergunta e a reflexão crítica, sobre o nosso papel como futuro arte- educador, autenticando o caráter formador do espaço pedagógico como confirma Paulo Freire quando diz que esse espaço nasce do respeito mútuo entre professores e alunos. “O clima de respeito que nasce de relações justas, sérias, humildes e generosas, em que autoridade docente e as liberdades dos alunos se assumem eticamente, autentica o caráter formador do espaço pedagógico” (1996, p. 92).
  • 34. 32 2.4 A NOSSA PRODUÇÃO A partir do momento que nos afirmamos enquanto grupo, criando coisas juntos para serem levadas à cena, já começava a terceira fase do processo criativo, descrita no Manual de Criatividades como Fase de Produção “que tem como objetivo propiciar os meios para que o aluno elabore e organize a sua expressão individual e coletivamente”. (DOURADO & MILET,1998, p. 18). Essas fases descritas no Manual de Criatividades não são fixas. Estas demarcam o processo, onde participamos de jogos e improvisações e atividades onde nos expressamos artisticamente. De alguma forma, durante todo tempo estávamos vivenciando liberação, sensibilização e produção. O Manual propõe estas divisões do processo criativo, mas explica que cada fase “caracteriza-se pela predominância, de uma dessas referências” (1998 p.18), determinada muitas vezes pelos exercícios e jogos e seus objetivos, ou seja, objetivos que devem ser condizentes com a fase que estamos trabalhando. Nas aulas sempre repetíamos o que havíamos criado, mas chegava o momento que os textos, poesias e músicas, ou textos que nos foram entregues durante as aulas, fossem “costurados” de forma coerente com as nossas improvisações corporais e textuais. Então estávamos sempre “indo e voltando”, aperfeiçoando nosso trabalho. Incluindo nas cenas coisas novas, ou novas formas de dizer as mesmas coisas que havíamos criado, novas alternativas de resolver o problema proposto. A primeira apresentação aconteceu no dia 08 de julho de 2004 na sala de aula da Escola de Teatro. Recebemos como convidados, alunos das Escolas de Dança, nossos colegas e professores da Escola de Teatro, que falaram principalmente da idéia de grupo artístico, possibilitada pelo novo currículo, que integrava o conhecimento prático ao teórico, e possibilitava uma seqüência de atividades. (...) Somente através do sequenciamento de atividades interdisciplinares, organizadas em função da complexidade técnica e com crescentes demandas de autonomia e produtividade criativa, pode-se desenvolver um processo de ensino/aprendizagem na área de artes. E mais que isso pode-se coordenar a
  • 35. 33 participação e avaliar o crescimento do aluno rumo a sua formação profissional. (DOURADO, 1998, p. 79) Defendemos assim o Novo Currículo como um elemento motivador para a formação do nosso grupo e principalmente a possibilidade de continuidade das nossas atividades criativas capazes de gerar processos criativos4 tão ricos como o Nós na Cidade – espetáculo gerado no componente Improvisação e Jogos Dramáticos. Nesta primeira apresentação mostramos como podíamos ser musicais, dançando e cantando as canções que criamos nas improvisações, destacando a capacidade que as letras tinham de falar de teatro e educação. Uma educação de esperança, liberdade e principalmente autonomia do sujeito. A arte de ser ator É mais que uma paixão É como pai: Educar Dando asas a criação! Conquistar a independência É viver com liberdade É educar! Felicidade! O Teatro da minha vida É o trabalho com liberdade Com energia pra criar meus filhos E ser resolvido no teatro (Criação Coletiva) Nesta fase do processo já tínhamos vivenciado esses conceitos de educação para a liberdade, para a autonomia e da importância do teatro na educação, ligados a nossa prática como educadores. E os textos refletiam este nosso conhecimento, pois nasceram dos nossos desejos e experimentação, e eram trazidos segundo nosso constante crescimento. Já tínhamos algum conhecimento da filosofia de Paulo Freire, e assim, tudo que dizíamos em cena ligava-se aos estudos que estávamos realizando 4 Um outro processo criativo desenvolvido pelo grupo foi o espetáculo Ciranda de Estórias, gerado no componente curricular Teatro de Formas Animadas I, II, e III. Esteve em cartaz na Sala 5 da Escola de Teatro e no Teatro do Liceu no Pelourinho no ano de 2007, ministrado pela professora Sônia Rangel, com elenco formado por nós alunos, atores-educadores do curso de licenciatura em teatro 2004.1.
  • 36. 34 sobre a Pedagogia da Autonomia, A Importância do Ato de ler e outros livros do mestre que nos estavam sendo apresentado. Como diz o próprio Paulo Freire, não é possível estar no mundo, sem cantar, sem musicar, sem politizar e isso é fazer história, é deixar nossa presença no mundo. Estar no mundo sem fazer história, sem por ele ser feito, sem fazer cultura, sem “tratar”, sua própria presença no mundo, sem sonhar, sem cantar, sem musicar, sem pintar, sem cuidar da terra, das águas, sem usar as mãos, sem esculpir, sem filosofar, sem pontos de vista sobre o mundo, sem fazer ciência, ou teologia, sem assombro em face do mistério, sem aprender, sem ensinar, sem idéias de formação, sem politizar, não é possível. (1996, p. 58). Cantando e dançando em nossas improvisações aos poucos fazíamos anotações elaboração do texto dramático. As questões trazidas nas cenas eram retomadas nas avaliações finais, e nos debates com o público após as apresentações. O diálogo provocava a re-escrita do texto, envolvendo-nos como criadores num processo crítico de avaliação e reconstrução que o trabalho de educação exige. Esse procedimento acentuava a dimensão pedagógica e estética desse teatro, envolvendo no seu fazer, o re-fazer constante com as pessoas da cidade. Ainda no Módulo I, nos encontramos com a história da Igreja da Barroquinha da cidade de Salvador, que iria se transformar em um centro cultural chamado Coliseu das Artes. Fomos convidados pela professora Maria Eugênia Milet para participar de uma aula nas escadarias em frente desta Igreja e descobrimos, através da história contada pelo professor Renato da Silveira, que atrás daquela igreja havia sido criado a primeira “roda” de candomblé de Keto da Bahia. Conduzimos nossa produção textual para falar sobre o nome que as autoridades baianas queriam colocar em um centro cultural que tinha na sua história do passado, um símbolo religioso tão importante para a cidade negra de Salvador. Bira Azevedo, integrante do grupo, destaca como esse envolvimento com a cidade tornou-se uma luta política e que pessoalmente mudou sua maneira de ver o candomblé. Nós na Cidade me fez questionar quem eu sou e o que eu vim fazer aqui neste mundo. Juntou-se a isso uma luta política, uma mudança concreta, uma reparação. Foi uma obra artística que contribuiu com a mudança do nome de um espaço, de uma idéia, de um ideal. Ainda mais, mudou completamente a minha visão em relação ao candomblé (que até então era estranho e temeroso
  • 37. 35 para mim) e conseqüentemente me aproximou mais da cultura afro e, logo, de Salvador, minha cidade. É impossível eu não tratar mais de questões ligadas a esta temática agora na minha prática. Faz parte da minha busca de transformação e contribuição para este mundo ficar mais bonito. (Bira Azevedo) Essa inserção poética se deu primeiramente nas improvisações, depois daquela aula na Barroquinha, aquela história, passou a fazer parte do nosso processo criativo através das nossas impressões pessoais e curiosidades que trazíamos sobre o processo de construção daquele terreiro de candomblé. Fomos instigados a investigar os personagens de nossa cidade. Começamos a olhar mais para as pessoas, para os vendedores, transeuntes, mendigos, turistas. Observar o andar, a forma de falar e de se comportar como um todo. Passamos a criar personagens a partir dessas observações e a partir delas fomos dando formas às cenas, pensando elementos, construindo novas músicas, novos textos. Já no módulo II no componente curricular Fundamentos do Teatro na Educação ministrado pela professora Maria Eugênia Milet, continuamos o nosso processo de investigação sobre a cidade para a construção do nosso espetáculo. Esse foi o momento que nos assumíamos verdadeiramente como dramaturgos, pois começamos um processo de criação do texto, saímos do campo da improvisação e assumíamos ensaios com textos trabalhados, como por exemplo, os textos do professor Renato da Silveira5 que nos chegou através das aulas que ele aceitou ministrar para o grupo, sobre a história de constituição do primeiro terreiro de candomblé de Keto da Bahia. Para a construção do espetáculo a nossa pesquisa ficou dividida da seguinte forma: Pesquisa Pessoal: Quem Sou Eu; Pesquisa da Cidade: Observação das ruas, pessoas da cidade, etc; Pesquisa Histórica: Barroquinha – Constituição do primeiro terreiro de Candomblé de Keto da Bahia; 5 O professor Silveira aceitou o convite do grupo para ministrar uma aula, mas acabou se encontrando conosco 3 vezes, incluindo aulas sobre história da África e dos Orixás neste itinerário. Ele é professor da Faculdade de Comunicação da UFBa.
  • 38. 36 Processo de Produção: Textos do professor Renato, diálogos com outros educadores e com as pessoas da cidade, elementos e figurino. Figura 1 – a pesquisa do figurino. Foto: Eliana Andrade de Souza Integrante do Grupo. Além do professor Renato da Silveira, tiveram em nossa sala educadores que vieram contribuir com a formação do espetáculo, pois como nossa própria professora Maria Eugênia Milet dizia que o Nós na Cidade era um espetáculo aberto que poderia se modificar a cada apresentação e a cada contribuição6. Neste contexto, recebemos na sala a professora Vanda Machado (historiadora envolvida com a religião do candomblé e a história da África), o professor e diretor teatral Carlos Petrovich, o antropólogo e Ogã da Casa Branca Olimpio Serra, o antropólogo Ordep Serra, e o Ogã Leo prefeito do Terreiro da Casa Branca (Ereelson Conceição Chagas), além dos próprios professores do módulo I. Contribuíram com textos, com músicas e com a mudança de ordem dos fatos que ocorriam no espetáculo, como foi o caso do professor Petrovich que sugeriu que invertêssemos a ordem do que estávamos falando, “para já chegarmos com força”. Destacamos então como estávamos envolvidos na fase de produção no processo criativo, proposto pelo Manual de Criatividades. É a fase em que o ato criador toma corpo. É o exercício de visão do todo, onde o aluno vai se sentir capaz de expressar, através de símbolos, uma idéia e solucionar o problema da escolha e seleção de recursos apropriados a essa 6 Anotações pessoais das aulas.
  • 39. 37 expressão. O foco de atenção recai sobre a capacidade de realização e a consciência crítica. (DOURADO & MILET, 1998, p. 18) Nesta fase elaboramos um roteiro e uma estrutura fixa para o espetáculo. Aprofundamos a pesquisa com as histórias trazidas por Vanda Machado sobre o povo africano e sua relação de irmandade criada no Navio Negreiro. Sobre essa fase, caracterizadas por muitas mudanças, Daiane Gama, integrante do grupo, destaca o enriquecimento do processo e melhora de resultados. Um dos maiores aprendizados que tive foi de que nada está pronto ou acabado. Tudo é passível de mudança e essas mudanças são fundamentais para o enriquecimento do processo e melhora do resultado. Além de respeitar a opinião dos outros e tentar compilar vários pontos de vistas. E o maior de todos é o meu interesse pela cidade e pela cultura africana. (Daiane Gama) Esse período provocou grandes debates entre nós, inclusive uma série de crises e crítica ao processo. A primeira crise foi provocada por nosso apego a alguma cena que havíamos criado e que não queríamos que fosse retirada. A segunda foi porque o espetáculo sempre estava sendo modificado, provocando em alguns participantes certa inércia, resistência ou ausência, sem preocupação com a realização do trabalho. Essa modificação provocada no texto e na estrutura do espetáculo foi interpretada por alguns como se o processo fosse um “oba oba”, causando muitas vezes discussões calorosas, em torno do processo, do papel do educador ao interferir, e em torno da responsabilidade dos alunos/ atores com o espetáculo. Até que ponto o grupo estava maduro, e seguro, para continuar este processo criativo? Para ouvir, se tocar, se olhar de acordo com esse processo de livre expressão? Para aceitar a orientação do professor? Como propõe Roseli dos Santos, uma das integrantes do grupo, citando Viganó na sua prática pedagógica, confrontando nossas personalidades individuais e as interpretações que elaborávamos sobre a realidade, podíamos começar a libertar nossas mentes, pois o jogo requer ao mesmo tempo esforço e liberdade.
  • 40. 38 Mediante a educação pelo jogo, que requer ao mesmo tempo esforço e liberdade, foi proposta a caminhada em direção ao amadurecimento pessoal e coletivo dos nossos alunos. Ao mesmo tempo, por meio da experiência estética e produção de uma linguagem artística, eles confrontaram suas personalidades individuais e a interpretações que elaboravam sobre a realidade na qual viviam. E assim eles começaram a libertar suas mentes, a dialogar com os outros e dar forma a novas possibilidades de se construir o mundo VIGANÓ (apud SANTOS, 2007, p. 43). A professora Maria Eugênia Milet dizia que para compreender a proposta era preciso estar envolvido no processo criativo. E nos perguntávamos que envolvimento era esse que ela falava se as nossas cenas estavam sendo retiradas a serviço do espetáculo? Mas não é a serviço do espetáculo que estamos trabalhando? Não é o espetáculo que nos ajuda a dizer o que queremos? Não é com o teatro que podemos dizer quem somos de onde viemos e o que queremos para nossa educação, para nossa cidade e porque não, para o nosso país? A todo o momento, a professora Maria Eugênia Milet lembrava que éramos artistas sim, que estávamos preocupados com o que criamos, mas antes de tudo éramos futuros arte-educadores, e como tal deveríamos considerar nossa experiência artística como um ato formador, refletindo a cada momento sobre o processo, inclusive sobre os problemas que encontrávamos naquele ato de criar e modificar a serviço do espetáculo. Sobre isso trazemos uma análise sobre o amadurecimento pessoal e social relacionado ao aprendizado artístico: Considero que o aprendizado artístico pode estar diretamente relacionado ao amadurecimento pessoal e social. Os resultados obtidos em cada encontro dependem, então, diretamente da qualidade do ambiente criado em cada momento e de uma reflexão constante dos participantes sobre o processo de trabalho e sobre sua atitude pessoal em relação a este. A conjunção desses fatores nos permite avançar no envolvimento com o processo e na superação dos nossos limites. O constante confronto com os nossos problemas e limitações, em cada etapa, faz com que o processo seja sempre composto de avanços e retrocessos. Isso não compromete, no entanto, a conquista de um maior alargamento dos horizontes pessoais e coletivos e de um novo nível de amadurecimento ao final do processo como um todo VIGANO (apud SANTOS, 2007, p.45). Começamos a entender que nada estava sendo imposto, nem transplantado. Estávamos sim atuando na criação do nosso próprio currículo, decidindo o que
  • 41. 39 queríamos aprender e reinventando formas de dizer o aprendido, para que pudéssemos ensinar. A receptividade do público foi muito importante para esse amadurecimento. E nesse processo de ensino/aprendizagem nos entendemos como atores, criadores da nossa própria história, eliminando as barreiras que encontrávamos, fortalecendo o grupo, desenvolvendo nossa personalidade, estabelecendo um acordo de grupo e caminhando em direção à participação coletiva que ia além do espetáculo, e que agora chamávamos também de Nós na Cidade.
  • 42. 40 3 RESULTADOS EM PROCESSOS Subimos e descemos ladeiras E entre um buraco e outro das ruas Choramos com a cidade Deitamos crianças desejosas de crescer Nos levantamos heróis de um novo mundo Acordamos guerreiros nagôs Que a cor dão Tiramos os nós que amarravam nossas histórias Reinventando a realidade Nos desafiando a construção De uma nova educação Com o Nós na Cidade Valdíria Souza
  • 43. 41 3.1 NÓS NA CIDADE O texto cênico ou espetacular pode ser entendido como “a relação de todos os sistemas significantes usados na representação e cujo arranjo e interação formam a encenação” (PAVIS, 2005 p. 409). Nossa encenação foi resultante de uma criação coletiva orientada pela professora Maria Eugênia Milet e apresentava um discurso ritualístico e espetacular, com intenção de expor uma força que vinha da proximidade do grupo com a expressão e o sentimento religioso do candomblé e com a espetacularização do cotidiano, uma estética que mostra o espetáculo como experiência vivida, assim como diz Rita de Cássia Silva: A estética contemporânea demonstra com maior clareza o aspecto da arte como experiência vivida, sendo esta, a vida, a experiência transformada em matéria de fruição estética. É este aspecto que atribui aos espetáculos um forte caráter ritualístico, conferindo-lhes mesmo uma certa solenidade e um poder agregador, característicos do Ritual. (2004, p. 339) O espetáculo tinha um caráter critico e reflexivo que mostrava em cena toda a pesquisa sobre a cidade e o nascimento do Terreiro de Candomblé, falava sobre a intervenção na luta pela mudança de nome do centro cultural da Barroquinha, tinha também a intenção de envolver outras pessoas nesta causa e apesar dessa característica didática e narrativa, não perdia a função de entretenimento. 3.1.1 Sobre a Encenação Foi “juntando pedaços de nossos eus”, das histórias das pessoas, das histórias da cidade, dos ensinamentos de vários mestres, inclusive Paulo Freire, que construímos o nosso espetáculo. Criando cenas a partir de improvisações, partituras corporais,
  • 44. 42 inventávamos a cidade e a educação que desejamos e nos mostrávamos ao público, nos desnudando em um processo de auto-conhecimento e de busca de um conhecimento coletivo. Os integrantes do grupo a partir dos depoimentos destacam o que foi o espetáculo Nós na Cidade, para eles nesse processo de auto-conhecimento: O Nós na cidade foi a materialização dessa metodologia. Claro que é um terreno bem arriscado de educação. Mas a educação que não pretende correr riscos não faz nada mais que entregar ao mundo uma mão de obra alienada para deleite dos que estão no poder. Quando eu digo que é um método arriscado de educação é porque esse tipo de metodologia propõe um desnudamento das pessoas envolvidas. E esse desnudamento é trazido ao palco em forma de espetacularização. O caminho percorrido por “Nós na cidade” pretendia a busca profunda de um auto-conhecimento. “Quem sou eu?” era a pergunta- chave. E isso se torna arriscado porque pra algumas pessoas é muito difícil esse processo de busca de si mesmo. Mas se isso é difícil, se torna muito gratificante quando conseguimos. (Francisco André Sousa Lima) O Nós na Cidade foi a nossa porta de entrada na UFBA e dou o credito ao processo de construção deste espetáculo toda a forma como se seguiu a nossa graduação. (...) Ele nos marcou e nos acompanhará por muito tempo. Nos marcou desta forma, acredito, por conta do trabalho do quem sou eu? Que gerou a formação do nosso grupo. (...) É um espetáculo amplo e rico em informações. Tem Paulo Freire, tem poesias, tem Iyá Nassô, tem cada um de nós, tem o meu tamanho que é maior que o tamanho de minha altura, tem muitas cidades juntas, tem reconvexo, tem, tem e tem. (Bira Azevedo) Momentos individuais e construções coletivas foram agrupadas. Nossas histórias, sonhos, conceitos e preconceitos, nossas diferenças. (...) Nós na Cidade foi a prova de que uma metodologia baseada em jogos e improvisações, se bem direcionada, traz resultados(...). (Jandiara Barreto) Um teatro onde o cenário era desenhado por nossas palavras, construído com o nosso corpo e imaginado por quem nos assistia. Um teatro fora dos padrões do teatro convencional, feito em palco Italiano, mais próximo do teatro de rua e da performance, caracterizado por uma arrumação/desarrumação do espaço da cena, provocando uma multiplicidade e simultaneidade de forma e de olhares. Sobre essa característica do espetáculo trazemos também as opiniões dos integrantes do grupo, que destacam o próprio crescimento, e o crescimento do espetáculo e também o aprendizado do público, que pode recriar o espetáculo a partir da sua visão de mundo:
  • 45. 43 Foi prazeroso e refletia bem o que tratávamos: Diversidade. Em cada lugar um público diferente, um olhar diferente, um jeito de fazer diferente. Se adaptar ao local, as pessoas e a causa do momento só enriqueciam o processo. (Daiane Gama) A sensação de teatro itinerante mostrou-me a importância de cada lugar, públicos distintos e energias diversas. São aprendizados para quem faz, para o resultado cênico, consequentemente e para o público. (Jandiara Barreto) Me trouxe ainda outras possibilidades de estética para um espetáculo teatral. Tava acostumado com o teatrão realista de sempre. Nós na Cidade ultrapassa isto. (...) (Bira Azevedo) (...) uma coisa que ficou latente em mim depois do Nós na Cidade foi o provérbio de domínio publico “o artista deve ir onde o povo está”. (...) Muitos de nós estão presos ao palco elisabetano destituindo o valor artístico de qualquer outra linguagem que não esteja preso a essa estrutura. Como não considerar arte (ou atribuir uma menor valia) ao teatro feito nas feiras, nos bairros de periferia, ou os feitos com propósitos educativos? (Francisco André Sousa Lima) Figura 2 – O grupo e a professora no Pelourinho. Foto: Acervo do Centro Integral da Criança e do Adolescente - CRIA. O espetáculo tinha um caráter didático e para a professora isso era tão importante para nós alunos/atores como para o público que nos enxergava também como aprendizes que éramos daquele processo. Na opinião de Camila Bonifácio integrante do grupo, não só foi aprendizado, foram muitos aprendizados em um processo descobridor: (...) O espetáculo foi o ápice de um processo descobridor. Aprendizado? Foram muitos, aprendi o que fazer e o que não fazer e isso é bom, mas deste todos
  • 46. 44 destacarei uma frase do texto dramático que para mim até hoje é uma provocação para a vida: “... SALVADOR com quem eu caso? Com SALVAR ou com a DOR?”. Acredito que cabe a cada um de nós, homens e mulheres, em nossas vidas escolher uma das duas opções. Apesar da DOR eu prefiro SALVAR! (Camila Bonifácio). Um espetáculo de imagens onde a moldura era dada pelos atores, autores dos textos em que os sentidos eram expressos pelo corpo, pela palavra, por sentimentos e sensações, assim como destaca em depoimento uma das integrantes: “Nós na cidade” foi certeza de que a cidade é formada não só da parte física geográfica, mas também e principalmente, de uma história que esta impregnada nas nossas falas, no nosso corpo, nos nossos pensamentos e sentimentos. Mas que precisa ser desvelada a muitos (Eliana Andrade). Estávamos buscando uma espécie de cidadania crítica, onde nos retratávamos como cidadãos, artistas e educadores e reafirmávamos a forma de ser da cidade de Salvador, com sua capacidade de juntar coisas diferentes, segundo a professora Maria Eugênia Milet “uma forma Barroca” (2002, p. 22) e como disse em seu depoimento Gessé Araújo, integrante do grupo, o espetáculo era uma busca constante também de natureza estética: Mais do que um espetáculo feito com a linguagem da rua, uma busca por uma estética de natureza política, como já disse. Nós na Cidade é um "jeito" de dizer, de fazer, até mesmo no tema que abordamos, que demonstra essa busca de natureza estética (Gessé Araújo). O processo criativo tinha uma dinâmica própria, com sons, ritmos, palavras, músicas, perguntas, mostrando uma complexidade que apresentava um teatro em movimento, em constante mudança. As formas cênicas emergidas dos nossos corpos em transformação traziam à tona a nossa realidade de vida, para conhecendo-a, transforma-la. Com isso nos revelando sujeitos da nossa história.
  • 47. 45 Figura 3 – A Bahia negra nos traços e gestos dos atores em cena. Foto: Acervo do CRIA. Uma Bahia negra e de resistência aflorava no gestual, nas falas e nas músicas, expressando um espírito místico e satírico dos alunos/atores, como podemos perceber na música Cidade In-festa criada como forma de crítica ao carnaval e as festas que hoje apenas são feitas para os turistas e que deveria ser feita para o povo: Cidade festa que infesta na lavagem, Na lavagem cerebral, na lavagem do Bonfim. Cidade presta na farsa do carnaval Carnaval que é de poucos Nem do povo nem de mim. Trazíamos à tona temas mais freqüentes, como racismo, violência, sensualidade, desigualdade, resistência, religiosidades, carnaval, futebol. Falávamos das crianças (que habitava em nós), do candomblé, das ruas da cidade, das suas ladeiras, dos seus loucos e doentes, como podemos perceber claramente no depoimento de Francisco um dos integrantes do grupo, que ressalta também a criação do espetáculo e seu diálogo constante com a cidade, com sua história, com a história do candomblé e de Iyá Nassô: Com o “Nós na cidade” demonstramos a importância de um teatro feito para e pela cidade. Um teatro que serve de espelho para uma sociedade que faz questão de maquiar os seus problemas pra não espantar os turistas ou prejudicar os objetivos econômicos (...) Foi importante principalmente pelo diálogo que realizamos com a cidade (...) Foi importante pelo contato empírico que tivemos com uma realidade que nos será companheira por toda a vida pós-acadêmica. O espetáculo foi a intersecção
  • 48. 46 entre ensino, pesquisa e extensão a tríade essencial que se pretende a nossa universidade. Mais ainda: o espetáculo se tornou importante por defender a causa de “Iyá Nassô”, uma princesa africana escravizada no Brasil que contribuiu decisivamente para a criação do Candomblé, expressão maior da resistência negra no cenário inóspito que foi a escravidão colonial. (Francisco André de Sousa Lima) Esses signos traduziam nossas buscas poéticas, que eram potencializadas através das aprendizagens em grupo a partir de nossas experiências com a cidade, criando formas e sentidos, trazendo a pessoa do ator que se transformava enquanto dava forma, através da sua presença, aproximando-se cada vez mais da realidade humana, de personagens e situações que representava, ou seja, da própria realidade, contando uma história nossa. Figura 4 – Francisco André em seu momento: Quem sou Eu? Foto: Acervo CRIA Nesse sentido nos inserimos criticamente na realidade para transformá-la, pensamos e agimos criticamente como cidadãos e futuros professores.
  • 49. 47 3.1.1 O Texto Um ator e um músico entram em cena. MÚSICO: toca no violão a entrada da música Reconvexo7 Figura 5 – Apresentação na frente da Câmara de Vereadores. Foto: Acervo CRIA ATOR: A Cidade se faz educativa pela necessidade de educar, de aprender, de ensinar, de conhecer, de criar de sonhar, de imaginar de que todos nós, mulheres e homens, impregnamos seus campos, suas montanhas, seus vales, seus rios, impregnamos suas ruas, suas praças, suas fontes, suas casas, seus edifícios, deixando em tudo o selo de certo tempo, (...) A Cidade somos nós e nós somos a Cidade. Mas não podemos esquecer de que o que somos guarda algo que foi e que nos chega pela continuidade histórica de que não podemos escapar, mas sobre que podemos trabalhar8. Aos poucos outros atores vão entrando em cena, se colocando em determinadas posições e falando frases sobre educação. 7 Caetano Veloso. 8 Paulo Freire.
  • 50. 48 ATOR 1 – A leitura do mundo antecede a leitura da palavra. ATOR 2 – A arte é a fenda na rocha da vida por onde a educação deve passar ATOR 3 – A vida é como uma peça de teatro e não permite ensaios por isso cante, dance, ria! Viva intensamente! Antes quê as cortinas se fechem e a peça termine sem aplausos! ATOR 4 – Acreditar nas massas populares, já não mais fale a elas, ou sobre elas, mas as ouça, para poder falar com elas. ATOR 5 – Educação é antes de tudo, respeitar a identidade do educando. ATOR 6 – Essência é aquilo que faz com que uma coisa seja ela mesma. ATOR 7 – E já que estamos falando de essência. Vamos falar da nossa própria essência e da essência da nossa cidade. Lá na Barroquinha há um espaço cultural que está sendo revitalizado, mas está sendo destruído em nossa essência. Lá os governantes entendem que deve se chamar Coliseu das Artes. A gente não concorda com isso porque nada tem a ver com a nossa identidade. Agente acredita que lá deve se chamar Centro Cultural... TODOS – Iyá Nassô! ATOR 8 – Porque eu sou do tamanho do que vejo! TODOS – E não do tamanho da minha altura! O músico canta a música Reconvexo acompanhado ao violão e os outros atores acompanham com palmas e pandeiro Eu sou a chuva que lança a areia do Saara Sobre os automóveis de Roma Eu sou a sereia que dança A destemida Iara Água e folha da Amazônia Eu sou a sombra da voz da matriarca da Roma Negra Você não me pega Você nem chega a me ver Meu som te cega, careta, quem é você? Que não sentiu o suingue de Henri Salvador Que não seguiu o Olodum balançando o Pelô E que não riu com a risada de Andy Warhol Que não, que não e nem disse que não Eu sou um preto norte-americano forte Com um brinco de ouro na orelha