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Alunos: Victor Mendes Lucas Lemes
Capítulos: Sono Calmo Mulheres Mendigas
Os delegados de polícia são homens endurecidos pela profissão, por se depararem, constantemente, com os cenários de miséria e horror das ruas. Certo dia, num gesto de amabilidade, o delegado convidou-me para visitar a realidade sórdida do Rio, não sei se queria, apenas, me impressionar ou se queria usar isso como ensinamento. Quando cheguei à delegacia, estavam preparados para uma caça aos pivetes, o delegado, um bacharel em direito e um adido. Saímos em grupo, por saber que é perigoso andar sozinho em ambientes como esses. Na medida em que íamos caminhando, grupos de vagabundos e desordeiros desapareciam por entre becos, casebres e prédios desmoronados, escondidos em meio à escuridão da noite.
No silêncio, ouvia-se o apito monótono do guarda-noturno de vigília e o replicar de outro, ao longe. Certa hora, o delegado parou em frente a uma hospedaria de gatunos, dessas baratas e de má aparência, esmurrou a porta e gritou com voz de autoridade, até a saída de um homem. Entramos para checar o local, passamos por cômodos mal cheirosos e bagunçados, e encontramos homens dormindo no chão e em camas sujas, alguns, completamente nus. Cada um de nós expressava uma reação e sentimento àquela cena, alguns chocados, outros, achando normal e até engraçado o que viam pela frente. A medida que subíamos os andares, a podridão e mal cheiro aumentavam em nossas narinas, quase interrompendo nossa respiração.
Ficava difícil caminhar em meio aos corpos amontoados no chão, dormindo uns sobre os outros, alguns homens e mulheres nus, mas todos maltrapilhos, desleixados e fedorentos. Nos fundos, a situação era a mesma, ou até pior. Quando saímos, o adido esbravejou que bastava pra ele, não queria ver mais nada. O bacharel, também, concluiu que bastava ver um local como esse, para saber que os outros eram iguais. Já o delegado, esbravejava que era um favor que ele fazia ao prender os miseráveis para dormir na estação. O certo é que deveríamos ter asilos, higiene e limpeza para abrigar todas essas pessoas. Havemos de ter.
O título é uma ironia feita à realidade vivida pelos pobres e abandonados enquanto dormiam.
Mendigar é a exploração mais legalizada da cidade. Alguns o fazem por necessidade, outros por malandragem, são homens e mulheres que, muitas vezes, se utilizam da boa fé das pessoas. Pietro Mazzoli é um desses maus exemplos, é mendigo por desafio e comodidade. Soldado, fugiu do serviço militar, passou malandramente por diversas profissões, e acabou nas ruas, aplicando todos os truques para explorar as pessoas de bem. Seguindo o exemplo dele, existem  mendigas burguesas, mendigas mães de família, cegas que enxergam admiravelmente bem, e muitas outras miseravelmente exploradoras, a lista dessas senhoras é interminável.
Elas pregam o amor a Deus e usam no peito, medalhinhas de santos para enganar as pessoas de boa fé. Percebem logo que esmolar é, apenas, uma profissão menos fatigante que trabalhar. Não há uma só cuja coleta diária seja menor de dez mil reais. Do fundo desse emaranhado de vício, de malandragem, gatunice, as mulheres realmente miseráveis são em muito maior número que se pensa, criaturas que rolaram por todas as infâmias e já não sentem, já não pensam, despidas da graça e do pudor. Para estas basta um pão enlameado e um níquel, basta um copo de álcool para as ver tagarelar, recordando a existência passada. São verdadeiras pobres de espírito, muitas vezes exploradas por cafetões, homens, ainda, mais malandros e imorais do que elas próprias.
Essa crônica faz uma análise da mendicância nas ruas do Rio. Pouco a pouco vai desnudando a realidade das mulheres mendigas, a forma como atuam para convencer as pessoas, as falsas moléstias, as fantasias, o tom emocionante do pedido de esmola. Uma a uma as mulheres entrevistadas revelam suas histórias tristes.
FIM

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  • 1. Alunos: Victor Mendes Lucas Lemes
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  • 3. Os delegados de polícia são homens endurecidos pela profissão, por se depararem, constantemente, com os cenários de miséria e horror das ruas. Certo dia, num gesto de amabilidade, o delegado convidou-me para visitar a realidade sórdida do Rio, não sei se queria, apenas, me impressionar ou se queria usar isso como ensinamento. Quando cheguei à delegacia, estavam preparados para uma caça aos pivetes, o delegado, um bacharel em direito e um adido. Saímos em grupo, por saber que é perigoso andar sozinho em ambientes como esses. Na medida em que íamos caminhando, grupos de vagabundos e desordeiros desapareciam por entre becos, casebres e prédios desmoronados, escondidos em meio à escuridão da noite.
  • 4. No silêncio, ouvia-se o apito monótono do guarda-noturno de vigília e o replicar de outro, ao longe. Certa hora, o delegado parou em frente a uma hospedaria de gatunos, dessas baratas e de má aparência, esmurrou a porta e gritou com voz de autoridade, até a saída de um homem. Entramos para checar o local, passamos por cômodos mal cheirosos e bagunçados, e encontramos homens dormindo no chão e em camas sujas, alguns, completamente nus. Cada um de nós expressava uma reação e sentimento àquela cena, alguns chocados, outros, achando normal e até engraçado o que viam pela frente. A medida que subíamos os andares, a podridão e mal cheiro aumentavam em nossas narinas, quase interrompendo nossa respiração.
  • 5. Ficava difícil caminhar em meio aos corpos amontoados no chão, dormindo uns sobre os outros, alguns homens e mulheres nus, mas todos maltrapilhos, desleixados e fedorentos. Nos fundos, a situação era a mesma, ou até pior. Quando saímos, o adido esbravejou que bastava pra ele, não queria ver mais nada. O bacharel, também, concluiu que bastava ver um local como esse, para saber que os outros eram iguais. Já o delegado, esbravejava que era um favor que ele fazia ao prender os miseráveis para dormir na estação. O certo é que deveríamos ter asilos, higiene e limpeza para abrigar todas essas pessoas. Havemos de ter.
  • 6. O título é uma ironia feita à realidade vivida pelos pobres e abandonados enquanto dormiam.
  • 7. Mendigar é a exploração mais legalizada da cidade. Alguns o fazem por necessidade, outros por malandragem, são homens e mulheres que, muitas vezes, se utilizam da boa fé das pessoas. Pietro Mazzoli é um desses maus exemplos, é mendigo por desafio e comodidade. Soldado, fugiu do serviço militar, passou malandramente por diversas profissões, e acabou nas ruas, aplicando todos os truques para explorar as pessoas de bem. Seguindo o exemplo dele, existem mendigas burguesas, mendigas mães de família, cegas que enxergam admiravelmente bem, e muitas outras miseravelmente exploradoras, a lista dessas senhoras é interminável.
  • 8. Elas pregam o amor a Deus e usam no peito, medalhinhas de santos para enganar as pessoas de boa fé. Percebem logo que esmolar é, apenas, uma profissão menos fatigante que trabalhar. Não há uma só cuja coleta diária seja menor de dez mil reais. Do fundo desse emaranhado de vício, de malandragem, gatunice, as mulheres realmente miseráveis são em muito maior número que se pensa, criaturas que rolaram por todas as infâmias e já não sentem, já não pensam, despidas da graça e do pudor. Para estas basta um pão enlameado e um níquel, basta um copo de álcool para as ver tagarelar, recordando a existência passada. São verdadeiras pobres de espírito, muitas vezes exploradas por cafetões, homens, ainda, mais malandros e imorais do que elas próprias.
  • 9. Essa crônica faz uma análise da mendicância nas ruas do Rio. Pouco a pouco vai desnudando a realidade das mulheres mendigas, a forma como atuam para convencer as pessoas, as falsas moléstias, as fantasias, o tom emocionante do pedido de esmola. Uma a uma as mulheres entrevistadas revelam suas histórias tristes.
  • 10. FIM

Notas do Editor

  1. Prof: Malu
  2. Alunos: Victor Mendes, Lucas Lemes Prof: Malu