A 2a Fase Modernista e os Capitães da Areia de Jorge Amado
1. A 2ª Fase Modernista (1930 - 1945)
Construção – Elaboração – Solidificação
• O aproveitamento das propostas da geração
de 22.
• Não há o radicalismo e o comportamento
anárquico.
• A revolta é substituída pelo questionamento
existencial e social.
• O retrato do homem universal.
2. • A fase neorrealista e neonaturalista.
• O romance regionalista: a tematização do
homem e seu meio.
• A denúncia e o engajamento político.
4. “Durante muitos anos Jorge Amado quis e
soube ser a voz, o sentido e a alegria do
Brasil. Poucas vezes um escritor terá
conseguido tornar-se, tanto como ele, o
espelho e o retrato de um povo inteiro.”
José Saramago
5. A vida dos Capitães da Areia
• Miséria
• A insalubridade da vida.
• A revolta contra o mundo hostil.
• A liberdade das ruas.
6. As Características de Jorge Amado
• A linguagem coloquial.
• A mudança de dicção entre narrador e
personagem.
• O tom lírico.
• O contraste entre a miséria e a indiferença
das classes dominantes.
7. A relação passado - presente
“É aqui que mora o chefe dos Capitães da
Areia: Pedro Bala. Desce cedo foi chamado
assim, desde seus cinco anos. Hoje tem 15
anos. Há dez que vagabundeia nas ruas da
Bahia. Nunca soube de sua mãe, seu pai
morrera de um balaço. Ele ficou sozinho e
empregou anos em conhecer a cidade. Hoje
sabe de todas as suas ruas e de todos os seus
becos. “
8. As Características da Obra
• A imaginação no lugar da estética.
• A idealização os pobres e humildes da Bahia.
• O realismo socialista – a literatura panfletária.
• O exotismo exagerado > o sincretismo
cultural.
9. Pirulito pensou que todos estavam condenados
ao inferno. Pedro Bala não acreditava no
inferno, Professor tampouco, riam dele.
João Grande acreditava era em Xangô, em
Omolu, nos deuses dos negros que vieram da
África. O Querido-de-Deus, que era um
pescador valente e um capoeirista sem igual,
também acreditava neles, misturava-os com os
santos dos brancos que tinham vindo da
Europa. O padre José Pedro dizia que aquilo
era superstição, que era coisa errada, mas que
a culpa não era deles. Pirulito se entristeceu na
beleza do dia. Estariam todos condenados ao
inferno?
10. Vestidos de farrapos, sujos, semiesfomeados,
agressivos, soltando palavrões e fumando
pontas de cigarro, eram, em verdade, os
donos da cidade, os que a conheciam
totalmente, os que totalmente a amavam, os
seus poetas.
Pedro Bala sentiu uma onda dentro de si. Os
pobres não tinham nada. O padre José Pedro
dizia que os pobres um dia iriam para o reino
dos céus, onde Deus seria igual para todos.
Mas a razão jovem de Pedro Bala não achava
justiça naquilo. No reino do céu seriam iguais.
11. E pensando em Deus pensou também nos
Capitães da Areia. Eles furtavam, brigavam nas
ruas, xingavam nomes, derrubavam negrinhas no
areal, por vezes feriam com navalhas ou punhal
homens e polícias. Mas, no entanto, eram bons,
uns eram amigos dos outros. Se faziam tudo
aquilo é que não tinham casa, nem pai, nem
mãe, a vida deles era uma vida sem ter comida
certa e dormindo num casarão quase sem teto.
12. Elementos temáticos
• Um mosaico da cidade – a diferença entre
ricos e pobres.
• A exclusão dos menores abandonados.
• A necessidade de união por questão de
sobrevivência (amizade, lealdade, código
moral, greve).
• A religião e o viés político.
13. • Padre José Pedro > a relação torta com a
religiosidade.
• Don’Aninha > feitiços e encantamentos.
• Cada menino vive a sua busca e deseja,
nessa tentativa, a mudança de vida - Pedro
Bala é a linha condutora do romance e seu
sucesso é, simbolicamente, o sucesso do
grupo.
• A imagem da noite > elemento poético e
social. A vida entre o mistério e a ação.
14. -Tu sabe, padre, que ninguém volta do
lazareto. Ninguém volta. E ele é um da
gente. um do grupo. A gente não pode fazer
isso...
– Mas é a lei, filho.
– Morrer?
O padre mirou Pedro Bala com os olhos
abertos. Aquele meninos viviam a lhe dar
surpresas, sempre mais adiantados em
inteligência do que ele pensava. E, no fundo, o
padre sabia que eles tinham razão.
15. – Roubam para comer porque todos estes
ricos que têm para botar fora, para dar para as
igrejas, não se lembram que existem crianças
com fome... Que culpa...
– Cale-se – a voz do Cônego era cheia de
autoridade. – Quem o visse falar diria que é
um comunista que está falando. E não é difícil.
No meio dessa gentalha o senhor deve ter
aprendido as teorias deles...O senhor é um
comunista, um inimigo da Igreja...
16. • O sobretudo na imaginação do Professor - a
veste simboliza a posição social e a
inadequação ao meio.
• Os apelidos > o retrato metonímico.
• O Trapiche > armazém usado como moradia -
o espaço é desvirtualizado de sua função.
• O espaço físico da cidade > a distorção dos
adjetivos “alto” e “baixo”.
17. “Apelidaram-no de Professor porque num livro
furtado ele aprendera a fazer mágicas com
lenços e níqueis e também porque, contando
aquelas histórias que lia e muitas que inventava,
fazia a grande e misteriosa mágica de os transportar
para mundos diversos, fazia com que os olhos vivos
dos Capitães da Areia brilhassem como só brilham as
estrelas da noite da Bahia.”
18. Durante aqueles oito dias os Capitães da Areia
continuaram mal vestidos, mal alimentados,
dormindo sob a chuva no trapiche ou embaixo
das pontes. Enquanto isso, o Sem-Pernas dormia
em boa cama, comia boa comida, tinha até uma
senhora que o beijava e o chamava de filho. Se
sentiu como um traidor do grupo. Era igual
àquele doqueiro do qual fala João de Adão
cuspindo no chão e passando o pé em cima com
desprezo.
19. E se para alguém o Sem-Pernas abria
exceção no seu ódio, que abrangia o mundo
todo, era para as crianças que formavam os
Capitães da Areia. Estes eram seus
companheiros, eram iguais a ele, eram as
vítimas de todos os demais, pensava o Sem-
Pernas.
20. A divisão da obra:
I - CARTAS À REDAÇÃO – a reportagem e
as cartas do leitores > a obra como documento
da realidade – verossimilhança - o contraste
entre as linguagens.
II - SOB A LUA, NUM VELHO TRAPICHE
ABANDONADO – 11 capítulos – a coletividade
e as peripécias dos “capitães” – as histórias
independentes de alguns membros do grupo –
a epidemia de varíola.
21. III – NOITE DA GRANDE PAZ, DA GRANDE
PAZ DOS TEUS OLHOS – o amor entre Pedro
Bala e Dora – a prisão – orfanato e reformatório
– a noite de amor – a morte de Dora.
IV – CANÇÃO DA VELHA BAHIA, CANÇÃO
DA LIBERDADE - a desintegração do grupo –
o envolvimento de Pedro Bala com os
doqueiros e com a história de seu pai – a
transformação em comunista.
22. Dora, Esposa
Pedro deita ao seu lado. João Grande se
afasta, chega para perto do Professor. Mas não
conversam, ficam entregues à sua tristeza. No
entanto, é uma noite de paz que envolve o
trapiche. E a paz da noite está também nos
olhos doentes de Dora.
-Mais perto...
Ele se chega mais, os corpos estão juntos. Ela
toma a mão dele, leva ao peito, arde de febre
(...)
-Tu sabes que já sou moça?
23. (...)
-Foi no Orfanato... Agora posso ser tua mulher.
Ele a olha espantado:
-Não, que tu tá doente...
-Antes de eu morrer. Vem...
-Tu não vai morrer.
-Se tu vier, não.
(...) Seu rosto acendido pela febre se enche de
alegria. Agora a paz é só da noite, com Dora
está a alegria.
24. Uma pátria e uma família
Anos depois os jornais de classe, pequenos
jornais, dos quais vários não tinham existência
legal e se imprimiam em tipografias clandestinas,
jornais que circulavam nas fábricas, passados de
mão em mão, e que eram lidos à luz de fifós,
publicavam sempre notícias sobre um militante
proletário, o camarada Pedro Bala que estava
perseguido pela polícia de cinco estados como
organizador de greves, como dirigente de
partidos ilegais, como perigoso inimigo da ordem
estabelecida.
25. No ano em que todas as bocas foram impedidas
de falar, no ano em que foi todo ele uma noite de
terror, esses jornais (únicas bocas que ainda
falavam) clamavam pela liberdade de Pedro Bala,
líder de sua classe, que se encontrava preso
numa colônia.
E, no dia em que ele fugiu, em inúmeros lares, na
hora pobre do jantar, rostos se iluminaram ao
saber da notícia. E, apesar de que lá fora era o
terror, qualquer daqueles lares era um lar que se
abriria para Pedro Bala, fugitivo da polícia.
Porque a revolução é uma pátria e uma família.
26. “Nos meus livros não há desânimo, o
povo sempre ganha.”
(Jorge Amado)
27. Personagens
Pedro Bala > rapaz de quinze anos, loiro, com uma cicatriz no rosto.
Generoso e valente, há dez anos perambula pelas ruas de Salvador. É o
líder dos Capitães da Areia.
Sem-Pernas > espécie de espião, falava e ria alto. Apesar de revoltado
pela falta de um lar, era rudemente bondoso. Era coxo, causando pena nas
pessoas que logo o abrigavam em casa. Vive nas casas durante alguns
dias e estuda os hábitos da família e os lugares dos pertences mais
valiosos.
28. João Grande > negro de treze anos, era forte e o mais alto de todos.
Tinha pouca inteligência, mas era temido e bondoso. Cabelo crespo e
baixo , músculos rígidos. Perde o pai atropelado por um caminhão. Após
a morte de seu pai, João Grande foi para junto do grupo do Capitães da
Areia.
José, o Professor > único que lia corretamente, tinha ido à escola
apenas um ano e meio. Era míope e gostava de contar histórias. Sua
imaginação solta criou os melhores planos de roubo. Por meio das
leituras, insere os meninos no universo do maravilhoso.
29. Pirulito > excessivamente místico e introvertido. Rezava constantemente
e deseja ser padre. As orações como fuga da realidade sofrida.
Gato > o malandro do bando, elegante e bem vestido. Dorme com a
prostituta Dalva.
“Tinha o dom da elegância malandra, que está mais no jeito de colocar
chapéu e dar um laço despreocupado na gravata que na roupa
propriamente.”
Volta-Seca > imitador de pássaros e outros sons. Afilhado de Lampião,
tem o padrinho como ídolo.
30. Boa-Vida > muito preguiçoso, era o único que não participava das
atividades de roubo do grupo. Quando roubava entregava o furto à Pedro
Bala para ajudar o grupo.
José Pedro > o padre. Introduzido no grupo pelo Boa-Vida, conhecia o
esconderijo dos capitães. Aos poucos, conquistou a confiança dos
meninos. Deseja ajudar o grupo.
31. João-de-Adão > estivador, negro fortíssimo e antigo grevista. Amigo de
Raimundo, pai de Pedro Bala e respeitado pelos trabalhadores das docas.
Dora > órfã juntamente com o irmão Zé Fuinha. Perde a mãe no surto de
malária e junta-se ao grupo de Pedro Bala. Torna-se uma espécie de mãe e
irmã dos garotos. Desperta o amor de Pedro e do Professor.
32. Ônibus 174 - Os Meninos Invisíveis
“A minha felicidade? Não tem mais jeito de eu
ser feliz não. Não tenho mais ninguém. Não
tenho mãe, não tenho pai, não tenho porra
nenhuma, só tenho meus filho. Não tem mais
jeito de eu ser feliz não!
“Todo mundo que chega na rua, chega como
inocente. Não sabe roubar. Tem muitos que
não fuma maconha, não cheira cola. Aí começa
o quê? Vai num restaurante e pede. (...) Vão
bora meter uma parada. Vão borá roubar. Vira
adulto na hora.
33. “Os comumente chamados ‘Meninos de rua”
são os meninos que cortaram qualquer vinculo
familiar com qualquer pessoa que eles
conhecessem de uma família que eles tiveram,
de uma casa, de uma comunidade. Eles
cortaram, eles esqueceram o passado deles e
o passado deles não existe. Então, o presente
deles, a vida deles é aquela esquina, aquela
rua, aquele grupo de amigos.“
34. “O menino negro pobre, qualquer menino, nas
grandes cidades brasileiras transita pelas ruas,
invisível. Há duas maneiras de se produzir a
invisibilidade. Esse menino é invisível porque
nós não o vemos, nós negligenciamos sua
presença, nós o desdenhamos, ou porque
projetamos sobre ele um estigma, uma
caricatura, um preconceito. Nós só vemos o que
nós projetamos, a caricatura que nós com
nossos preconceitos projetamos.”
35. “A gente pede que a sociedade enxergue a
gente com outro rosto, porque se eles enxergar
a gente com o rosto que eles mesmo botam a
imagem na gente, a gente não vai a lugar
nenhum.”
“Ali, o Sandro nos despertou a todos nós em
todas as salas de visita. Ele impôs a sua
visibilidade. Ele era personagem de uma outra
narrativa. Ele redefiniu de alguma maneira o
relato social. O relato que dava a ele sempre a
posição subalterna, de repente, é convertido
numa narrativa na qual ele é o protagonista.”
36. “Esse menino com essa arma pode produzir em nós, num outro qualquer,
um sentimento, que é o sentimento do medo, um sentimento negativo, mas
um sentimento, através do qual ele recupera a visibilidade, reconquista a
presença, reafirma a sua existência social e sua existência humana. Há um
processo aí de auto-constituição, uma estética da auto-invenção que se dá
pela mediação da violência, da arma, de um modo perverso; uma espécie de
pacto fáustico, em que um menino troca seu futuro, sua vida, sua alma, por
assim dizer, por esse momento efêmero, fugaz de glória, a pequena glória
de ser reconhecido, de ter algum valor, de poder prezar sua auto-estima.
Esse é o momento crucial, o momento matricial da nossa problemática toda.
Se nós não compreendermos a profundidade, a complexidade desse
momento, nós não saberemos como agir.”
37. “Nós não tínhamos resolvido a tragédia da
candelária e já estávamos vivendo uma outra
tragédia, que era, em certo sentido, uma
extensão daquela primeira. Sandro, que é
vitima da candelária, agora se converte no
algoz do novo drama, quase que pra nos
acordar pro fato de que nós precisamos
resolver essa questão que é maior, é maior
que a Candelária, maior que 174, que Vigário
Geral e que todas as nossas tragédias
cotidianas.”
38. “Foi a polícia que matou lá os colegas do Sandro na
candelária e a polícia completou o trabalho. É como
se as duas pontas da história se fechassem. À
polícia cabe o trabalho sujo que a sociedade não
quer ver, mas que em algum lugar obscuro do seu
espírito deseja que se realize, que se anulem os
Sandros, que os Sandros desapareçam das nossas
vistas. Nós não queremos ver essa realidade, nós
não podemos suportar essa realidade. Então a
invisibilidade é, afinal, reconquistada pela produção
policial da invisibilidade através da anulação que a
morte gera.”
39. Ônibus 174 – A sociedade esfacelada
“O pessoal que estava ali estava querendo
ver um espetáculo e o espetáculo dizia o
seguinte, que o final é a morte do bandido.
Isso é coisa comum na nossa sociedade.”
“É verdade que ninguém naquele palácio
tinha condição de gerenciar aquela crise de
longe. Então, pra mim não importa quem
tenha interferido. Ocorre é que quem
interferiu, fez errado.”
40. “Toda fragilidade da segurança pública de um
estado ou de uma nação ela vai aparecer
numa ocorrência com refém. Boa parte dos
nossos policiais estava há mais de dois anos
sem sofrer nenhum tipo de treinamento. O
resultado final disso aí jamais seria positivo. A
não que Deus assim o quisesse.”