O documento descreve a história de Lucas, uma criança atendida em um CAPS, e as dificuldades encontradas na rede de atendimento à sua família. Isso levou à criação de uma nova rede, chamada Rede de Proteção da Criança e Adolescente de Vila Prudente, formada por diferentes serviços para discutir casos complexos de forma colaborativa.
Seminário Saúde Mental na Atenção Básica: "Vínculos e Diálogos Necessários" - 04 e 05 de novembro de 2014
1. REDE: UMA ESTRATÉGIA PARA O
COTIDIANO OU O “INESPERADO” NUM CAPSi
Que população chega atualmente nos CAPS infantis da
cidade de São Paulo?
AÇÃO
1
•Respondendo...
Crianças e adolescentes que não se relacionam, que não brincam, que
não aprendem, que não comem, que se cortam, se drogam, ou que as
vezes fazem coisas de crianças ou de adolescentes.
Crianças e adolescentes que sofrem e trazem consigo suas famílias, a
escola que frequentam, o lugar em que vivem e por onde deveriam
circular com autonomia e proteção!
2. REDE: UMA ESTRATÉGIA PARA O
COTIDIANO OU O “INESPERADO” NUM CAPSi
Diante da resposta, surgem outras perguntas:
• Qual o objeto de nosso trabalho?
A doença/diagnóstico? ou O sofrimento?
• Qual o sujeito de nossa intervenção?
AÇÃO
1
A criança e o adolescente? ou Suas famílias? ou Os lugares onde circulam
ou deveriam circular: seu território?
• Quais estratégias usar nestas situações?
Atendimento individual/grupal? ou Atendimento familiar? ou Uso de
medicação? ou Reuniões com outro atores? ou Tudo isto junto e o que mais?
3. AÇÃO
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REDE: UMA ESTRATÉGIA PARA O
COTIDIANO OU O “INESPERADO” NUM CAPSi
Uma das estratégias usadas há algum tempo no CAPS Infantil V.
Prudente é a rede. Ela nos conecta:
• Com as escolas
• Com o Conselho Tutelar
• Com as Unidades Básicas de Saúde
Porém a equipe do CAPSi V Prudente, apesar de ter profissionais
experientes e comprometidos com a clínica da saúde mental na infância ,
enfrenta inúmeros desafios em seu cotidiano, inclusive circunstâncias
cada vez mais complexas...
4. AÇÃO
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REDE: UMA ESTRATÉGIA PARA O
COTIDIANO OU O “INESPERADO” NUM CAPSi
E vamos percebendo a necessidade de outras formas de rede: mais
frouxas, mais firmes, com trama mais aberta, trama mais fechada, ora
com um formato, ora com outro...
Então, nada como o cotidiano!
O dia-a-dia, que com seus imprevistos e desafios nos convoca a fazer
algo diferente. Pensar redes diferentes?
5. AÇÃO
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COTIDIANO OU O “INESPERADO” NUM CAPSi
Esta é a história de como a partir de algo “inesperado”, uma nova rede
tem sido tecida na região de Vila Prudente.
... A rede de Proteção à Criança e Adolescente de Vila Prudente.
É nova porque propõe pensar novas respostas para dilemas inéditos ou
não, em nossa prática cotidiana.
Vamos ao “inesperado”!
Era uma vez um garotinho chamado Lucas. Foi encaminhado de uma UBS
da região em 2009, com 5 anos na época...
6. Continuando ...
seu diagnóstico: autismo, deficiência mental e auditiva. Estava matriculado em
escola regular, mas não frequentava.
Sua família: a mãe e dois irmãos pré adolescentes
Projeto Terapêutico : Consultas com o psiquiatra e uso de medicação;
atendimento da criança em grupo duas vezes por semana; atendimento da mãe
em grupo de responsáveis, atendimento individual de Lucas e sua mãe,
sobretudo buscando auxiliar a genitora na procura, obtenção e organização de
recursos para seu filho e sua família. Conversas com a escola para tentar incluir
Lucas naquele espaço
O CAPS tinha “cercado o caso” por todos os lados....
AÇÃO
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REDE: UMA ESTRATÉGIA PARA O
COTIDIANO OU O “INESPERADO” NUM CAPSi
7. REDE: UMA ESTRATÉGIA PARA O
COTIDIANO OU O “INESPERADO” NUM CAPSi
Mas, sempre existem desafios....
AÇÃO
1
O manejo da genitora com Lucas e com os demais filhos era marcado
por ausências, negligencias e a falta de uma rede familiar, e de
vizinhança que a ajudasse no cuidado com os seus. Os pais das crianças
não aparecem, situação tão comum nas situações que atendemos.
O local onde a família vivia era de extrema vulnerabilidade, cercada por
condições de grande miséria e violência.
8. A escola regular não conseguia incluir Lucas em sua rotina.
A mãe se preocupava com Luís, o filho do meio, que demonstrava
comportamento “agressivo”. Apesar da UBS de referência se dispor a
atendê-lo, a mãe não tinha vínculo com aquele serviço, e o
acompanhamento nunca se efetivou.
Uma primeira observação:
A família, nosso usuário, também escolhe a rede que ela quer
formar!!!
AÇÃO
1
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COTIDIANO OU O “INESPERADO” NUM CAPSi
9. AÇÃO
1
REDE: UMA ESTRATÉGIA PARA O
COTIDIANO OU O “INESPERADO” NUM CAPSi
No decorrer do atendimento, mudanças no Projeto Terapêutico.
Lucas passa a frequentar escola especial, e sua genitora continua
atendida em grupo de orientação no CAPS Infantil.
Mas a mãe começa a faltar, coincidentemente com o abandono de Lucas
na escola.
Começa então a preocupação em envolver outros atores, pois era
evidente que apenas o CAPS não poderia “cercar” aquela situação!
10. A UBS nos conta que a mãe estava grávida e tal informação era
desconhecida de todos. A mãe não realizou o acompanhamento pré-natal!
Outras informações do Conselho Tutelar diziam que Lucas havia piorado
e que sua irmã mais velha, estava usando drogas e ficando dias fora de
casa!
Sentimento de impotência: Quem responsabilizar frente tantos desafios:
•O CAPS?
•A UBS?
•A Escola?
Se faz necessário acionar a rede.
AÇÃO
1
REDE: UMA ESTRATÉGIA PARA O
COTIDIANO OU O “INESPERADO” NUM CAPSi
11. AÇÃO
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REDE: UMA ESTRATÉGIA PARA O
COTIDIANO OU O “INESPERADO” NUM CAPSi
Uma ilusão: Naquele momento, o acionamento da rede era uma espécie
de panacéia, onde todos esperávamos soluções mágicas advindas de
outro, o qual supomos ter o saber e a solução necessários para aquela
circunstância.
O bebê nasce! Diante da situação de penúria e risco em que a família se
encontrava, surge depois de muita discussão , receios e angústias, a
proposta de acolher/abrigar o bebê ainda sem nome.
12. Naquele momento, o CAPS ainda se apresentava numa postura de
“perito” da situação. Então os “demais” serviços da rede (escola, UBS,
Cons. Tutelar), respondiam de duas maneiras:
- com distância da situação de Lucas, pouco se envolvendo
- não se sentindo autorizados a propor ou desencadear ações.
AÇÃO
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REDE: UMA ESTRATÉGIA PARA O
COTIDIANO OU O “INESPERADO” NUM CAPSi
13. AÇÃO
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REDE: UMA ESTRATÉGIA PARA O
COTIDIANO OU O “INESPERADO” NUM CAPSi
O trabalho em rede requer relações de horizontalidade entre seus
membros e isto é obvio na teoria, mas um grande desafio na prática!
-Nesta tarefa com diferentes parcerias, estão envolvidas rivalidades,
disputas pelo poder, aceitação dos próprios limites.
- É importante neste processo, rever e transformar paradigmas,
deslocando os atores envolvidos da posição de saber absoluto para uma
postura de compartilhar e se corresponsabilizar frente à determinada
situação.
14. REDE: UMA ESTRATÉGIA PARA O 1
Após diversas visitas e conversas com a genitora, abre-se processo
junto ao Ministério Público. A Justiça pediu providencias, mas não
deu tempo e em junho de 2013, o bebê agora nomeado Luan, foi
afogado pelo irmão “especial” Lucas, conforme relato da mãe.
AÇÃO
COTIDIANO OU O “INESPERADO” NUM CAPSi
15. REDE: UMA ESTRATÉGIA PARA O
COTIDIANO OU O “INESPERADO” NUM CAPSi
O não tão “INESPERADO” aconteceu!
Esta situação desorganizou a todos os envolvidos:
AÇÃO
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- A rede não foi competente?
- Seria mais um algarismo a engrossar as estatísticas das chamadas
“mortes violentas de crianças e adolescentes”?
- Como sair do registro da culpa, pois neste caso a criança e sua família
estavam inseridas em nossos serviços? Eles tinham nome, casa, rosto!
- Como nós, profissionais envolvidos, poderíamos transformar o
sentimento de impotência e desamparo impregnado na maioria de nós,
em potencia na tarefa diária de cuidar do outro.
16. AÇÃO
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REDE: UMA ESTRATÉGIA PARA O
COTIDIANO OU O “INESPERADO” NUM CAPSi
Precisávamos recompor a rede, mas qual a rede a ser acionada?
Entra em cena:
- a APD-Programa de acompanhamento ao portador de deficiência
intelectual,
- o CREAS,
- a universidade (PUC São Paulo – através da faculdade de Psicologia),
- a Justiça, que sob o impacto da morte de um bebê pede urgência nas
ações.
17. AÇÃO
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REDE: UMA ESTRATÉGIA PARA O
COTIDIANO OU O “INESPERADO” NUM CAPSi
Na busca de compor um projeto único, os diferentes atores começam a
demonstrar um movimento de maior autonomia, disponibilizando
tempo, espaço e, sobretudo capacidade de acolher a família
O CAPS não é mais o único serviço presente nesta situação!
Nesta reorganização, o CAPS Infantil pode “...se deslocar do eixo
terapêutico, da herança clínico-médica, para ressignificar a saúde
mental no eixo da saúde social (1999, Fernandes, M.I.A. Saúde mental: a
clausura de um conceito. Revista USP)”, postura fundamental para trabalhar
em rede com situações tão complexas.
18. - Nova reflexão e aprendizado: A rede competente é a que está
disponível e que consegue se vincular e se co-responsabilizar com o
sujeito de nossa ação, pois como sujeito ele também responde pela
própria vida e as circunstâncias que escolhe viver.
- Outro desafio: Implicar o sujeito, alvo de nossa ação de rede, pois não
raramente, ele é desconsiderado em sua subjetividade e autonomia.
A família de Lucas precisava estar implicada em seu “projeto”!
AÇÃO
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COTIDIANO OU O “INESPERADO” NUM CAPSi
19. AÇÃO
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REDE: UMA ESTRATÉGIA PARA O
COTIDIANO OU O “INESPERADO” NUM CAPSi
Assim, em setembro de 2013, com o apoio da PUC, fizemos dois
seminários, que apontava como um dos possíveis desdobramentos, a
criação de um fórum na região, de caráter intersetorial:
...a REDE DE PROTEÇÃO DA CRIANÇA EE AADDOOLLEESSCCEENNTTEE DDEE VVIILLAA
PPRRUUDDEENNTTEE
Este fórum não é inédito, e como ele muitos acontecem, inclusive em
diferentes regiões de São Paulo.
20. AÇÃO
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COTIDIANO OU O “INESPERADO” NUM CAPSi
- O fórum se reúne mensalmente e tem como tarefa discutir questões
envolvendo crianças e adolescentes.
- A preocupação é estabelecer parcerias pautadas no compromisso ético
e político com o sistema de garantias previsto no ECA, efetivando-o
cotidianamente no fazer de cada serviço.
- Há um grupo de trabalho intersetorial que se dispõe a preparar as
reuniões , pautado nas demandas advindas das discussões do grupo.
- Além das reuniões, há um email para comunicação, informes,
publicização das atas e consulta sobre pautas e demandas.
21. AÇÃO
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REDE: UMA ESTRATÉGIA PARA O
COTIDIANO OU O “INESPERADO” NUM CAPSi
- Numa parceria com o Ministério Público da Vara da Infância do
Ipiranga, em especial na pessoa da promotora Dra. Maria Izabel A
Sampaio Castro, a rede ganhou novos atores, e que se num primeiro
momento vem cumprindo uma “determinação”, depois ficam e
parecem estar aproveitando o espaço com sugestões de pautas e
participação nas discussões.
- Mais um desafio: Que as discussões da “Rede de Proteção” possam
alimentar o cotidiano dos serviços e vice-versa , não permitindo que tal
espaço se torne uma rede burocrática, e sim um disparador de tantas
outras redes que se fizerem necessárias.
22. AÇÃO
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REDE: UMA ESTRATÉGIA PARA O
COTIDIANO OU O “INESPERADO” NUM CAPSi
Neste processo de construção, temos apreendido que as costuras desta
rede precisam ser tecidas de tal forma a demarcar contornos e limites,
seja através do afrouxamento de alguns nós , seja na criação de outras
conexões com a força de diferentes “fios”.
Por fim, acreditamos que a originalidade, a força, e mesmo o
esgarçamento destes tecidos que vão sendo costurados, podem nos
auxiliam no enfrentamento das complexas circunstâncias com as quais
nos deparamos em nosso dia-a-dia, sendo elas corriqueiras ou
inesperadas!
23. AÇÃO
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REDE: UMA ESTRATÉGIA PARA O
COTIDIANO OU O “INESPERADO” NUM CAPSi
Experiência do CAPS Infantil Vila Prudente
Supervisão Técnica de Saúde Vila Prudente/Sapopemba
Coordenadoria Regional de Saúde Sudeste
Autora: Marisa Corrêa Siebert
Email: supervisaovpsap@gmail.com