Quando o governo anunciou uma medida para desonerar a folha de pagamento das empresas da construção civil, os empresários comemoraram. No entanto, em abril, o governo alterou as regras, exigindo que obras iniciadas antes de abril continuassem pagando a contribuição previdenciária com base na folha de pagamento. Essa mudança repentina violou princípios legais como segurança jurídica e direito adquirido, prejudicando os empresários que haviam se planejado com base nas regras anteriores.
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Governo altera regras da desoneração da folha da construção civil
1. GOVERNO DEU UM '1º DE ABRIL' NA CONSTRUÇÃO CIVIL
Quando saiu a Medida Provisória n.º 601, em 28 de dezembro de 2012, os
empresários do ramo da construção civil vibraram. E tinham motivos para
comemorar: estavam diante da autorização do governo para desonerar,
efetivamente, a folha de pagamento de seus funcionários – um dos maiores pesos
do Custo-Brasil. Era, em bom português, um ‘‘pacote de bondades’’ para o setor.
Embora com atraso, o governo estava oferecendo um belo presente de Natal ao
empresário da construção civil, no afã de fazer a economia ‘‘bombar’’ novamente.
Afinal, a desoneração prevista na MP 601, como a outros segmentos, beneficiaria as
empresas que se dedicam à construção de edifícios; que prestam serviços de
instalações elétricas, hidráulicas e outros em construções; que fazem obras de
acabamento; e que oferecem demais serviços especializados para o setor.
Trocando em miúdos, esta MP previa que as empresas do ramo da construção civil
passariam a recolher a cota previdenciária patronal (CPP) sobre 2% do faturamento
bruto a partir de 1º. de abril de 2013 – ao invés da alíquota de 20% sobre a folha de
salários. O presente iria ser entregue no ano seguinte.
Chega abril de 2013, em pleno frenesi de obras, e nos deparamos com uma
surpresa, que deixa todo mundo boquiaberto: a entrega do ‘‘presente’’ foi feita
mediante restrições, impostas pela superveniência da Medida Provisória n.º 612, de
4 de abril. Mais precisamente, tal MP delimitou que as obras com matrículas no
Cadastro Específico do INSS (CEI) anteriores à vigência da nova regra, ou seja,
obtidas antes de 1º de abril de 2013, deveriam manter o recolhimento previdenciário
com base na folha de pagamento, até o seu término.
No caso das matrículas procedidas a partir de 1º de abril de 2013, caberia o
recolhimento na forma substituída; isto é, sobre o faturamento. Em outras palavras,
em pleno andamento da partida, o governo alterou as regras do jogo. O brinde de
Natal virou um legítimo ‘1º de abril’!
‘‘E agora, José?’’, perguntaria o saudoso Carlos Drummond de Andrade. O que faço
com meu planejamento? Por que o governo insiste em violar os princípios da
segurança jurídica, da boa fé e da proteção à confiança – tripé garantidor dos
investimentos numa economia de mercado?
O princípio da boa fé, apenas para lembrar, impõe ao Poder Público a obrigação de
agir com certa previsibilidade e de respeitar às situações constituídas pelas normas
por ele editadas e reconhecidas, a fim de levar estabilidade e coerência à sociedade.
2. Ora, sem oposição no Congresso Nacional e surfando nas pesquisas de opinião
pública, parece que este governo não tem de se esforçar para oferecer explicações
ou mostrar coerência aos seus contribuintes. Na prática, o fato é que quem está
sendo lesado deve correr atrás do prejuízo, diga-se, na maioria das vezes, através
da Justiça, se quiser fazer valer os seus direitos.
Neste caso específico, é importante alertar que a MP 612 foi publicada quando a sua
congênere norma – MP 601 – já estava vigorando. Isto é, alterou a nova forma de
apuração da cota patronal previdenciária quando a MP anterior já estava em vigor
para o setor da construção civil. Com isso, para além da ofensa aos citados
princípios da segurança jurídica e da boa-fé, foram jogados no lixo os princípios da
irretroatividade e da anterioridade nonagesimal – eis que só pode haver alteração na
cobrança dos tributos após 90 dias da publicação da lei que os criou ou modificou.
Como se tal não bastasse, deve-se atentar que a cota patronal apurada sobre o
faturamento foi inicialmente instituída com prazo determinado para sua vigência: o
comando jurídico (caput) do artigo 7º, da Lei n.º 12.546/2011, garantia que esta
desoneração se aplicaria até 31 de dezembro de 2014. Por fim, como salta aos
olhos, não é preciso fazer muito esforço para se concluir que essa nova MP fere
também o instituto do direito adquirido.
E se o governo insiste em não reconhecer o que está estampado no bom direito e
em assentada jurisprudência protetiva dos seus contribuintes, a saída será pedir
socorro ao Poder Judiciário, pois permitir que uma violação deste porte acabe em
‘pizza’ – como de praxe acontece em nosso país -- seria aceitar piada de mau gosto.
Maria Carolina Simas