Rami percebe que está em um casamento poligâmico com Tony, que tem outras 4 esposas. Ela decide formar uma associação com as outras esposas para ganhar independência financeira. Ao longo do romance, Rami e as outras esposas conquistam sua autonomia em relação a Tony, que acaba sozinho no final. A obra critica a poligamia e a opressão das mulheres na sociedade moçambicana.
2. Autora: Paulina Chiziane (1955) nasceu em
Manjacaze, província de Gaza, no sul de
Moçambique. Negra, de família simples,
herdou da avó, uma contadora de histórias, a
aptidão para criar mundos e narrativas.
Tornou-se reconhecida por ter sido a
primeira mulher a escrever um romance em
seu país. É considerada uma das maiores
expressões literárias do idioma.
Movimento Literário: Pós-modernismo
3. Estilo: a escrita de Chiziane é permeada pela
oralidade e pela apreensão poética, com o
uso de metáforas e comparações, bem como e
muitas referências à, terra, ao vento e ao
mar.
Tempo: Primeiros anos do século XXI.
Percebe-se a passagem do tempo apenas pelo
desenvolvimento das personagens, uma vez
que o tempo cronológico fica somente
pontuado
Espaço: Moçambique, notadamente o sul, em
um país devastado pela guerra anticolonial e
civil.
4. Personagens principais:
Rami: (Rosa Maria): narradora, 40 anos, 5 filhos, mulher do
sul, esposa dedicada e fiel que perceberá que vive com um
marido poligâmico, que tem mais 4 mulheres.
Tony: (António Tomás): machangana, 17 filhos, 50 anos, Dr.
Comandante da polícia, poderoso esposo de Rami, ausente e
polígamo.
Ju: (Julieta): “segunda dama”, 6 filhos, mulher do sul.
Lu: (Luísa): “terceira dama”, 2 filhos, mulher do norte.
Saly: “quarta dama”, maconde, 2 filhos, mulher do norte.
Mauá Sualé: “quinta dama”, 2 filhos, nortenha macua, por
volta dos 19 anos.
Eva: mulata, estéril, rica, amante de Tony.
Gaby: amante de Paris. Aparece em uma viagem de duas
semanas que Tony faz para “consultar um médico” na França.
Levy: irmão de Tony que irá efetuar o levirato.
Saluá: beldade nhanja rejeitada por Tony ao final da narrativa.
5. Enredo: Rami percebe que, a contragosto, está em uma relação
poligâmica. Decide, então, contatar cada uma das outras mulheres
do marido, Tony, e fazer uma “associação” entre elas. Consegue fazer
com que todas sejam loboladas e reconhecidas perante a sociedade.
Ao fazer isso, atravessa as fronteiras físicas e culturais de seus país.
Rami transforma-se em uma mulher que gere a poligamia na qual o
marido a colocou, inclusive com escalas semanais que todas as
esposas deviam cumprir, a despeito de ser uma tarefa dolorosa para
ela.
No cumprimento dessa escala, nota-se como a mulher é rebaixada e
sua função é de simplesmente servir ao marido. Na sequência, Rami
financia os trabalhos das rivais, emprestando dinheiro para a
abertura de pequenos negócios. Aos poucos, Ju, Lu, Saly e Mauá,
começam a ganhar o próprio dinheiro e a conquistarem a
independência financeira, de modo que decidem se tornar primeiras
esposas de outros homens. Tony fica sem as suas mulheres e
percebe que o filho que está no ventre de Rami é fruto do levirato.
Importância da obra: Esse romance abre as portas para a voz
feminina em Moçambique e põe na ordem do dia a discussão sobre a
poligamia. A aceitação da mulher na literatura moçambicana
aumentou e gerou enorme debate sobre o tema. Romance
atualíssimo para todas as nações, que confirma a crescente
aquisição de direitos femininos nos últimos 150 anos.
7. IDENTIDADE E DIFERENÇA
Moçambique consegue a sua independência em 25 de
junho de 1975, sob o governo marxista da Frelino,
chefiado por Machel. Na luta dos colonizados, a
questão identitária se faz visível e questiona-se a
cultura superior.
“o discurso colonial é um aparato de poder da
colonização – que reconhece e repudia a diferença
cultural, criando ‘povos-sujeitos’ e legitimando os
estereótipos do colonizador e do colonizado”.
É sobre esse patrimônio linguístico-cultural-
identitário que a autora escreve.
8. Tony faz o papel do colonizador, opressor e dominador, mas que, aos
poucos, vai perdendo a força para as suas mulheres. Durante a trama, a
autora narra a força da união das mulheres que representam a união da
nação moçambicana contra o seu colonizador,
As mulheres do sul acham que as do norte são umas frescas, umas
falsas. As do norte acham que as do sul são umas frouxas, umas frias.
Em algumas regiões do norte, o homem diz: querido amigo, em honra da
nossa amizade e para estreitar os laços da nossa fraternidade, dorme
com a minha mulher esta noite. No sul, o homem diz: a mulher é meu
gado, minha fortuna (CHIZIANE, 2008, p.38).
9. Norte e Sul de Moçambique se completem nas
características do todo do país, há entre as duas regiões
grandes diferenças:
no Norte, predomina a influência muçulmana em
diversos setores, por exemplo, seguem-se as leis da
Sharid (Sharia é o código de leis do Islamismo) para
se destacarem as responsabilidades econômicas dos
homens em relação às esposas e filhos;
no Sul, a tendência é cristã, pela forte influência da
colonização portuguesa, reforçando-se a mentalidade
de que o homem é superior à mulher, a qual deve ser
obediente ao mando masculino e aceita a condição de
oprimida e subordinada ao homem.
10. Além da denúncia quanto à violência contra o gênero
Feminino também aborda a questão do preconceito de
cor.
A mulher mulata, termo empregado pela autora em sua
obra, é avaliada como uma ameaça às negras, uma vez
que elas são consideradas socialmente superiores às
demais, enquanto à mulher negra é conferido o estatuto
da lascividade.
A narradora avalia a condição da mulher negra
vítimas da discriminação social, do abandono, da
invisibilidade e do desprezo
11. Ao homem, supervalorizado na sociedade moçambicana, quase tudo é permitido. Exemplo
dessa liberdade – ou melhor, libertinagem como ter múltiplos relacionamentos sem a
responsabilidade emocional.
Solução para a autora:
Superação gradativa da condição de mulher submissa fortalecendo-
se,
em primeiro lugar, economicamente;
depois, amorosamente, ressignificando sua existência, tentando
livrar-se da estrutura que a oprime, assim como também libertar as
outras mulheres
amadurecimento que a leva a alcançar sua autonomia.
12. Em diversos mitos, lendas e contos de fadas, o espelho é
um
objeto mágico e repleto de simbolismos.
Em Niketche, ele aparece como o refletidor dos
pensamentos e questionamentos de Rami, além de
proporcionar à narradora uma visão inversa de si
mesma.
Inicialmente, Rami não reconhece como sua a
imagem nele refletida, ele é confrontador e
desnudador da submissão e subalternização da
narradora, alternando o reflexo do consciente e do
inconsciente dela.
13. O espelho com duas faces da narradora
Como Alice, o espelho é como o portal para a descoberta do
desconhecido. A versão de Rami no espelho é para a
narradora uma nova imagem de si mesma, zombeteira, direta
e ameaçadora, mas é seu único amigo sincero, até a chegada
de Luísa na vida de Rami. É o espelho que possibilita à
narradora a ação que a levará a desafiar a sociedade
patriarcal e as tradições moçambicanas.
Como Branca de Neve o espelho é submisso ao poder da
Rainha, demonstrando ter medo dela e o de Rami é
desafiador, confrontador, e lança à narradora uma série de
escárnios. Destaque-se também que o espelho de Branca de
Neve não reflete a imagem da Rainha, mas, sim, a imagem de
um ser aprisionado com características físicas próprias,
enquanto o de Rami reflete a figura da narradora real, mas
que lhe é estranha, pois se lhe apresenta como alguém forte e
distante dos sofrimentos vividos pela narradora em vinte
anos de um casamento infeliz.