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CENTRO UNIVERSITÁRIO LUTERANO DE JI-PARANÁ
CEULJI/ULBRA
ENTRE TRAMAS E DRAMAS: O FAZER, O PENSAR E O SENTIR DAS
PROFISSIONAIS DO NÚCLEO PSICOSSOCIAL DO FÓRUM “Z”.
Ji-Paraná/RO
2010
LOCIMAR MASSALAI
ENTRE TRAMAS E DRAMAS: O FAZER, O PENSAR E O SENTIR DAS
PROFISSIONAIS DO NÚCLEO PSICOSSOCIAL DO FÓRUM “Z”.
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado
ao Curso de Serviço Social do Centro
Universitário Luterano de Ji-Paraná-
CEULJI/ULBRA, para obtenção de título de
Bacharel em Serviço Social, sob orientação da
Profª. Msc. Dalva Felipe de Oliveira.
Ji-Paraná/RO
2010
LOCIMAR MASSALAI
ENTRE TRAMAS E DRAMAS: O FAZER, O PENSAR E O SENTIR DAS
PROFISSIONAIS DO NÚCLEO PSICOSSOCIAL DO FÓRUM DESEMBARGADOR “X”
EM “Y”.
________________________________
Professora Msc.
______________________________
Assistente Social
___________________________________
Professora Doutora
___________________________________
Professora Msc.
____________________
Média
Ji-Paraná/RO
2009
Para minha mãe, Érica Massalai modelo de cuidado interdisciplinar, anjo
protetor presente em todas as situações da minha vida.
Para a professora Dalva Felipe de Oliveira, por sua postura ética,
desafiadora e amiga, modelo de educadora que faz de sua tarefa docente não
apenas a de ensinar os conteúdos, mas também ensinar a pensar certo.
Para as crianças do 1º ao 5º ano da Escola Estadual “Z” cuja presença
resiliente tem me deixado menos ranzinza e muito mais amoroso.
Para minhas ex-alunas do Curso de Pedagogia do CEULJI/ULBRA que,
sendo mães, mulheres e companheiras foram exemplos de superação, adaptação e
flexibilidade diante das adversidades por quais passam para estudar.
AGRADECIMENTOS
Somente nos damos conta do quanto dependemos dos demais, quando
paramos para pensar em todas as pessoas que deveríamos agradecer por tudo
quanto conseguimos realizar. Foram tantos rostos amigos que ao longo desta
graduação nos estenderam a mão e foram compreensíveis, companheiros,
solidários, atenciosos e respeitosos em cada momento vivido. Vamos aos “thank
you”!
À minha mãe, Érica Massalai, por sua voz inconfundível no portão ou ao
telefone nas tardes quentes do verão amazônida quase sempre lá pelas 17h30min,
me chamando: “Locimar, Locimar, quer jantar lá em casa hoje?” Enquanto eu, numa
luta danada tentava entender os desdobramentos epistemológicos de Foucault,
Iamamoto ou Japiassu para referendar os discursos! O arroz com feijão preto e ovo
da minha mãe realmente ajudaram tornar estes momentos menos áridos. E tem
coisa melhor do que comida de mãe? Porque junto com a comida vem sempre o
afago, o incentivo...
À professora Dalva Felipe de Oliveira por integralmente me orientar e me
servir às pratadas, livros e mais livros num lauto banquete de autores que não
somente deram sustentação ao meu e outros discursos como também me
possibilitaram hoje ser um profissional menos superficial. Justamente eu, que tenho
sede de entender e aprofundar as coisas. Este é o papel de quem orienta.
O importante é ter claro que, muito embora a ação
profissional se efetive por aproximações, desvios, soluções
precárias para resolver dificuldades imediatas, isto não
significa que o saber construído pelo serviço social seja
necessariamente utilitarista ou imediatista; significa sim que,
seja qual for seu objeto, mediata ou imediatamente, o
profissional deverá procurar superar estas limitações,
encaminhando suas reflexões e seus resultados em um
sentido histórico, social, político e técnico de produção de
conhecimentos, tendo em vista um saber e uma prática mais
conseqüentes.
(BAPTISTA, 2001, p.116)
RESUMO
O trabalho das assistentes sociais e psicólogas no Núcleo Psicossocial é permeado
de discursos que são manifestados através de atitudes de indignação e
conformidade. Inseridas num espaço de poder, representado pela força do Estado
da lei com um significado nem sempre visível, porém presente, como espaço de
poder que são conferidas pelos saberes profissionais e pela natureza da instituição
judiciária as assistentes sociais e psicólogas vai configurando sua prática via estes
discursos. Dentro deste contexto objetivou-se conhecer e posteriormente analisar a
prática das assistentes sociais a partir do viés interdisciplinar, norteados pela
seguinte questão provocadora: “Como o excesso de atividades dificulta o ser e o
fazer profissional sobre o viés da interdisciplinaridade”? Para atingir o objetivo
proposto recorreu-se aos seguintes procedimentos: como método de procedimento
optou-se pelo estudo de caso (YIN, 2005). Os dados foram coletados através da
observação participante (HAGUETTE, 1987) e a entrevista semi-dirigida (NEGRINE,
1991) que foram aplicadas com três assistentes sociais e duas psicólogas do Núcleo
Psicossocial do Fórum “Z”. Os dados foram categorizados segundo a proposta de
Laurence Bardin(2009). Para fundamentar as nossas analises sobre discurso,
verdade e poder recorreu-se às teses desenvolvidas por Michael Foucault (1977;
1985; 1987; 1997; 2002 e 2009), Pierre Bordieu (2004). A categoria
interdisciplinaridade foi embasada nas reflexões realizadas por Japiassu (1976;
1992), Gusdorf (1976; 1984 ), Piaget (1976) Fazenda ( 1993; 1996;2001; 2008 )
Severino (2007) e Rodrigues On (2001). As questões relativas ao Serviço Social
foram analisadas a luz de Iamomoto (1985; 2007; 2010), Fávero (2005; 2008) e
Magalhães (2006). A partir das falas e das observações realizadas verificou-se que
de fato o excesso de atividades prejudica efetivamente o fazer interdisciplinar, porém
não é o único culpado. Aliado a isto, percebeu-se que as profissionais foram
acostumando-se a certa rotina e que o trabalho por elas tem uma dimensão
multidisciplinar do que interdisciplinar. Há desejos de torná-lo interdisciplinar, mas
faltam atitudes e decisões para tal e diante disto começam a enfrentar os desafios
que exige uma prática interdisciplinar, nessa perspectiva escolheram uma
coordenadora e começaram a sentar para realizar os estudos e organizar seus
projetos do referido núcleo.
Palavras-chave: Serviço Social. Prática interdisciplinar. Questão social. Judiciário.
RESUMEN
El trabajo de los trabajadores sociales y psicólogos en el Centro Psicosocial está
impregnado de los discursos que se manifiestan a través de actitudes de indignación
y de conformidad. Situado en un espacio de poder, representado por la fuerza de la
ley estatal y con un significado no siempre visible, pero presente como un espacio
de poder que se confiere por el conocimiento profesional y la naturaleza de la
institución judiciaria las trabajadoras sociales y psicólogos van haciendo su trabajo
bajo el poder de estos discursos. Dentro de este contexto, se tuvo como objetivo
conocer y analizar la práctica de las trabajadoras sociales desde una mirada
interdisciplinaria, orientado por la provocativa pregunta: "¿Por qué el grande numero
de actividades impide de se hacer el trabajo a partir de la mirada interdisciplinaria?”
Para lograr nuestro objetivo hemos utilizado los siguientes procedimientos: como
modo de proceder fue elegido el estudio de caso (Yin, 2005). Los datos fueron
recolectados a través de la observación participante (Haguette, 1987) y entrevista
semi-dirigida (Negrine, 1991) que se aplicaron con tres trabajadares sociales y dos
psicólogas en el Centro Psicosocial de Foro “Z”. Los datos se clasificaran de
acuerdo con la propuesta de Laurence Bardin (2009). Para basar nuestro análisis en
el discurso, la verdad y el poder recurrimos a las teorías desarrolladas por Michel
Foucault (1977, 1985, 1987, 1997, 2002 y 2009), Pierre Bourdieu (2004). La
categoría interdisciplinaridad se basó en consideraciones hechas por Japiassu
(1976, 1992), Gusdorf (1976, 1984), Piaget (1976) FAZENDA (1993, 1996, 2001,
2008), Severino (2007) y Rodrigues On (2001). Cuestiones relacionadas con los
Servicios Sociales fueron analizadas la luz de Iamomoto (1985, 2007, 2010), Favero
(2005, 2008) y Magalhaes (2006). Los discursos y las observaciones muestran que,
de hecho, las actividades adicionales afectan el hacer interdisciplinario, pero no es el
único culpable. Junto a esto, se señaló que los profesionales se están
acostumbrando a la rutina de tener que dar cuenta para hacer visitas, informes, etc y
que el trabajo se realiza de forma mucho más multidisciplinar que en la dimensión
interdisciplinar. Hay deseos para que sea interdisciplinario, pero carece de las
medidas y decisiones para hacerlo. Teniendo en cuenta este principio para hacer
frente a los desafíos que requiere una práctica interdisciplinaria: necesitan elegir un
coordinador y sentarse a organizar sus proyectos.
Palabras clave: Trabajo Social. Práctica Interdisciplinaria. Temas Sociales. Poder
Judicial.
SUMÁRIO
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS .....................................................................................9
LISTA DE ILUSTRAÇÕES .......................................................................................................10
LISTA DE TABELA...................................................................................................................11
MEMORIAL...............................................................................................................................12
1. A APROXIMAÇÃO COM A REALIDADE.............................................................................18
1.1 Os percursos metodológicos..........................................................................................25
1.2 Coletando os dados.......................................................................................................26
1.3 Como se analisou os dados ...........................................................................................28
2.CONSIDERAÇÕES PRIMEIRAS SOBRE O CENÁRIO ......................................................30
2.1 A segunda cena do filme................................................................................................33
3. QUANDO OS ATORES SURGEM EM CENA E FALAM ....................................................36
3.1 O elenco..........................................................................................................................36
3.2 A formação das assistentes sociais...............................................................................49
3.3 Quando o excesso de atividades fragiliza e angustia o cotidiano ..............................58
3.4 Se o grupo é intersciplinar a prática também é? ...........................................................60
4.CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................693
REFERÊNCIAS ......................................................................................................................748
APÊNDICE .............................................................................................................................793
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
EAD
CEULJI
Educação à Distância
Centro Universitário Luterano de Jí-Paraná
CEFESS Conselho Federal de Serviço Social
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Foto 1: Casa onde passei boa parte da minha família e adolescência – 1970 a 1980
Projeto Riachuelo, Linha 102 e Lote 64 ...............................................................15
Foto 2: Certificado de Conclusão do Curso de Normalista de Érica Massalai .........16
Foto 3: Conclusão do Curso de Normalista (Regente de Ensino Primário), em 1963
em São Carlos – Santa Catarina ..............................................................................17
Foto 4: Detalhe Porta de entrada que dá acesso à sala de trabalho das Assistentes
Sociais e Psicólogas do Núcleo Psicossocial .........................................................36
Foto 5: O espaço coletivo - Sala de trabalho das Assistentes Sociais e Psicólogas
do Núcleo Psicossocial modificada .......................................................................39
Foto 1: O espaço individual de cada profissional ...................................................39
Foto 2: O espaço individual de cada profissional, ou seja, aquilo que é só dele ......40
Foto 3: Espaço para atendimento individualizado.........................................40
Foto 4: Espaço redesenhado – momento de reunião para discutir palestras sobre a
Nova Lei de Adoção. Presentes no momento: duas assistentes sociais, uma
psicóloga e uma estagiária do Serviço Social do CEULJI/ULBRA ............................41
Ilustração de texto 01- Do memorial: “Mãe e filho” – arquivo particular ....................13
Ilustração de texto 02- Do desespero: “O grito” de Edvard Munch .........................34
Ilustração de texto 03- Do saber fragmentado: “Mulher com gavetas” de Salvador
Dalí .....................................................................................................................66
LISTA DE TABELA
Tabela 01 – Fala das assistentes sociais e Psicólogas a partir das entrevistas e
observações contidas no Diário de Campo ............................................................43
12
MEMORIAL
Sou sempre uma vírgula e nunca um ponto final, parafraseando uma mestra
que eu tive em minha graduação em Pedagogia. Sou feito de sonhos/utopia, movido
por projetos, afinal é isto que dá sentido a minha
existência enquanto sujeito histórico. Chamo-me
Locimar, por escolha de meus pais, interessante que
nunca me interessei em saber os reais motivos por
tal escolha e isto não tem hoje muita significância,
pois aprendi a gostar do meu nome e, por
conseguinte gostar de mim. Como qualquer homem,
tive momentos de vazios existenciais bem no sentido
sartriano, mas uma tríade me salvou do desespero e
me fez a pessoa que sou: o fato de ter uma família e
ser amado por ela, ser amado por Deus
incondicionalmente e os livros que sempre me deram
respostas diante das inquietações e injustiças a mim
impetradas. A cada leitura uma nova visão de mundo
ia se desenhando no meu imaginário e provocava inquietudes face aos desafios que
a vida suscitava. Nessa perspectiva asseguro que as análises que tais leituras
apresentavam me auxiliaram na busca de compreender tais desafios. Ressalta-se
que cada mergulho no mundo das leituras nem sempre era digerível de imediato.
Eram necessárias idas e vindas para decifrar o que estava “oculto” nos códigos
lingüísticos, dinâmica esta que difere radicalmente das respostas prontas dos livros
de auto-ajuda.
Catarinense por questões biológicas e Jiparanaense por circunstâncias
sócio-culturais, pois sou filho de migrantes que acreditaram no mito do eldorado que
13
foi forjado pelo governo militar cujo lema era: “Integrar para não entregar”. Nesse
sentido, a década de 70 foi determinante para a construção de uma “nova história”
da minha família. Neste “eldorado” carente de políticas públicas, mas recheado de
relações sociais que foram tecendo cotidianamente entre os colonos, essas relações
se traduziram nas instituições existentes na época, quais sejam: igreja, escola e
famílias. Sendo assim, a ajuda mútua era imprescindível para não desaminar e não
retornar ao local de origem haja vista que o retorno significava um fracasso diante
dos parentes que ficaram no sul do País. Isto tudo me faz lembrar Basségio (2004,
p. 01) ao falar da Migração em Rondônia e em específico de Ji-Paraná, quando
afirma que:
A maioria dos migrantes começaram a chegar por volta de 1975. Criaram-se
projetos de colonização e muita terra foi repartida. Mas, o que aconteceu
com grande parte destas famílias? Mal haviam decorrido 10 anos desde a
sua chagada, grande número de famílias começaram abandonar, vender ou
alugar seus lotes e saíram em busca de melhores condições de vida.
Dirigiram-se então para à periferia das cidades ou então para novas frentes
de ocupação.
A situação descrita acima também aconteceu com minha família, pois em
1983 migramos para a cidade em busca de estudos e vida melhor porque a lavoura
de café e cacau dava muita praga e o lucro era pouco e não tínhamos nenhum
subsídio do governo para cuidar da lavoura. Logo depois vendemos o lote que
tínhamos e que por quase 15 anos foi o cenário de minha infância e parte da
adolescência. Saudades das pescarias no Rio Riachuelo (hoje um pequeno filete de
água), Rio Malaquias e o próprio córrego perto de nossa casa, o que o homem não
fez para ocupar essas áreas, limpou tudo e o que restou foram apenas saudades.
Nesta, meus pais fincaram as nossas raízes e ergueram uma casa na qual
passei bons momentos de minha infância; não era nenhum de Versalhes, mas tinha
o fundamental: amor. Esses momentos rememorados me levaram às lágrimas ao
lado da Dalva, minha orientadora, (responsável pelo resgate destas memórias), e ela
nem percebeu. Penso que não. Se percebeu, foi discreta e elegante pois mesmo
que estivéssemos num tempo coletivo, naquele ínterim, naquela incursão pessoal
entendia que resgatar a memória da gente é perceber-se vivo e fazendo parte de um
contexto e história maiores e menores. Fui puxando um nó e vieram outros tantos.
14
Ao sentar com minha mãe na tarde chuvosa deste sábado1 revivi momentos
fantásticos de nossa história e que por falta de uma anamnese corriam o risco de
serem esquecidos.
Foto 1 – casa onde passei boa parte da minha família e adolescência – 1970 a 1980 – Projeto
Riachuelo, Linha 102 e Lote 64.
Créditos: Arquivo pessoal (MASSALAI, 2010)
Aos nove anos fiz a minha primeira viagem ao mundo encantado das letras na
Escola Oiapoque na linha 102 Gleba 42 lote 14, Projeto Riachuelo, na então Vila de
Rondônia. Saudades das brincadeiras e peraltices daquela turma multisseriada. Eu
contava com o apoio da minha professora/normalista2 (ver foto 2,). Segundo ela,
este curso foi “emergencial”, porque tinha muita falta de professores e quando veio
para Rondônia não valia como segundo grau e por isto seu salário no momento de
ser contratada, foi diminuído de 1.115,00 cruzeiros para 912,00 cruzeiros.
Minha mãe formou-se como Normalista em 1963 na cidade de São Carlos,
Estado de Santa Catarina. Justificou suas notas um tanto quanto baixas porque
tinha que trabalhar como doméstica na casa de uma família e somente depois que
fazia todos os afazeres cotidianos é que podia estudar. Relatou que ao fazer o
concurso para professora primária aqui na Vila de Rondônia, ficou entre as primeiras
1 Dia 23/10/2010.
2 Eram moças que estudavam nas chamadas “Escolas Normais”,por isto recebiam o nome de Normalistas.As
Escolas Normais preparavam as moças para serem professores do primário (1ºao 5º ano) e eram consideradas
um orgulho para suas famílias.
15
colocadas. E que este concurso foi feito na Escola Tupi, na Linha 94. “A prova que
era composta por uma prova e uns desenhos.
Foto 2 – Certificado de Conclusão do Curso de Normalista de Érica Massalai
Créditos: Arquivo pessoal (MASSALAI, 2010)
Sendo minha mãe, a primeira professora, os vínculos se entrelaçavam e logo
as cobranças eram maiores sobre mim. Nesses ritos de iniciação fui monitor dela e
catequista da minha Comunidade Nossa Senhora Aparecida3, (que estava
encravada na propriedade da minha família) e isto já se delineava uma credencial
3
Hoje se chama Virgem Santíssima Aparecida e fica localizada na Linha 102 no Projeto Riachuelo.
16
que mais tarde foi fundamental para a minha escolha profissional. Neste tempo,
recordo-me bem de minha mãe trazendo um saco de livros nas costas, altas horas
da noite porque tinha que andar muitos quilômetros a pé no meio da mata. Para
mim, o cheiro de livro novo era uma festa para o paladar. Lembro-me até hoje do
cheiro dos livros e de um em especial: “As reinações de narizinho” de Monteiro
Lobato. Era grande e com uma foto imensa da Narizinho na capa.
Foto 3 – Conclusão do Curso de Normalista (Regente de Ensino Primário), em 1963 – São Carlos –
Santa Catarina.
Créditos: Arquivo pessoal (MASSALAI, 2010)
Como a sociedade era muito machista, meu pai não permitiu que realizasse o
meu sonho: cursar o Magistério e assim fui literalmente obrigado a fazer o Colegial.
A docência estava tão encravada em mim que auxiliava as minhas professoras na
sala de aula, e este amor pelo ensinar me fez em 1985 ingressar na Congregação
dos Irmãos Maristas4 em Vilhena sendo transferido mais tarde para Florianópolis e
em 1989 começo a primeira graduação em Pedagogia Educação Infantil e Anos
Iniciais.
4 Ordem religiosa de irmãos leigos,fundada em por São Marcelino Champagnatem 1817 para o trabalho com
crianças e jovens no campo da educação.
17
O mito do eterno retorno bem no sentido de Mircea Eliade (1999), isto é, uma
saudade das minhas origens, me fez retornar ao Estado de Rondônia e mil sonhos
povoaram a minha mente e uma perguntava martelava meu juízo: o que fazer pela
educação das crianças e dos jovens da cidade que tinha me acolhido? Buscando
aprimorar os conhecimentos e eu não tendo noção do que era “Stricto Senso”, em
1998 fui cursar Pedagogia com especialização e Orientação Educacional no então
Instituto Luterano de Ji-Paraná, (hoje CEULJI/ULBRA), sem saber bem do que se
tratava. Tempo extraordinário de descobertas e de riquezas memoráveis das
professoras da época: Elide Cechin, Asta Verena Tews, Mary José e suas aulas de
Currículo (Que mulher louca, provocativa, mais de uma competência extraordinária).
E o professor Alejandro Yague Mayor com as suas desconstruções filosóficas que
dava nós em nossos juízos. Nesse período o Estágio Curricular foi marcante, pois
cada passo nessa nova trajetória era acompanhado pelas professoras orientadoras
de estágio que iam onde o aluno estagiava, não havia distâncias, os limites
geográficos eram transponíveis concretizando em sua plenitude o sentido de ser
professora como desenha Werner em seu livro a Paidéia.
Como a busca pelo conhecimento estava presente na vida fui fazer a Pós-
graduação em Metodologia do Ensino Superior e em seguida Psicopedagogia
Clínica, todavia, tais cursos não tiveram muita significância para mim. No ano de
2005, continuando essa busca comecei o Curso de Serviço Social, pois compreendo
que o mesmo mantém uma relação orgânica com a Educação. Vale frisar que curso
ajudou aprimorar o olhar epistemológico sobre a sociedade e suas complexas
relações juntamente com uma leitura crítica da realidade.
O ponto alto foi a prática do estágio e os necessários aprofundamentos
teóricos para as leituras das questões que fizeram parte do micro e macrosmo do
Núcleo Psicossocial do Fórum...
18
1. A APROXIMAÇÃO COM A REALIDADE
“Tanto quanto o agir, também o saber não pode se
dar na fragmentação: precisa acontecer sob a perspectiva da
totalidade. E isto é válido tanto para as situações de ensino,
como de pesquisa. O desafio da multiplicidade, expressão da
riqueza da manifestação do mundo em nossa experiência,
não nos exime da exigência da unidade, garantia da
significação especificamente humana do mundo que os
homens inauguraram”.
(SEVERINO, 2001, p.54)
A escolha do tema para este TCC foi uma decisão pensada a partir da
nossa experiência profissional e pessoal com grupos humanos distintos. Quando
pensamos em grupos humanos, nos lembramos de todos aqueles aos quais
fazemos parte e que referendam nossa vida. Em especial não podemos deixar de
falar do grupo de pessoas da Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio “Z”.
Dentro da escola existem tantos subgrupos: o grupo de professoras do 1º ao 5º ano,
o grupo de alunos de casa turma, o grupo dos gestores e por ai vamos podendo
numerar tantos outros que vão configurando entre uma situação e outra nossas
redes de relacionamentos naquele local de trabalho. A partir da experiência que
tivemos com Comunidades Eclesiais de Base e com a Pastoral da Juventude fomos
aprendendo a lidar com tantas diferenças e saber ouvir e respeitar cada pessoa. O
que nem sempre foi fácil. Aprendendo a ser dinâmico e respeitar o protagonismo de
cada pessoa.
Quando fizemos nossa primeira graduação em Pedagogia, no início da década
de 90 estava em alta a discussão sobre interdisciplinaridade com Ivani Fazenda.
Lembramo-nos de uma das primeiras jornadas acadêmicas que participamos em
Jaraguá do Sul, Santa Catarina e que Fazenda esteve presente e em um dos seus
discursos disse a seguinte frase que anotamos avidamente em um caderno de
apontamentos:
Perceber-se interdisciplinar é o primeiro movimento em direção a um fazer
interdisciplinar. O que caracteriza uma prática interdisciplinar é a atitude
interdisciplinar de ousadia, da busca e da pesquisa. É a transformação da
19
segurança num exercício do pensar, num construir (FAZENDA, 1996, p.14-
17).
Também era um tempo em que se falava muito de uma visão holista sobre as
coisas.
A parte só pode ser compreendida a partir do todo, que privilegia a
consideração da totalidade na explicação de uma realidade, sustentando
que o todo não é apenas a soma das partes, mas possui uma unidade
orgânica (JAPIASSU & MARCONDES, 1990, p.122).
Os dois conceitos e suas implicações sobre as ciências e as profissões
continuam extremamente atuais, até porque sua concretização na prática pouco se
efetivou e ficou muito no discurso.
Partindo deste contexto, quando chegou o momento do estágio escolhemos
fazê-lo no Fórum “T”, mais especificamente no Núcleo Psicossocial, porque nele
trabalham assistentes sociais e psicólogas, caracterizando este local e fazer, como
interdisciplinar. E também porque queríamos fazer o estágio num local onde
houvesse de fato a presença de uma equipe interdisciplinar atuando sobre
determinadas situações com o objetivo5 maior de analisar os desafios enfrentados
pelas assistentes sociais e psicólogas no Núcleo Psicossocial do Fórum para
trabalhar na perspectiva da interdisciplinaridade.
E nos perguntamos como o excesso de trabalho das assistentes sociais e
psicólogas do Núcleo Psicossocial dificultam o trabalho sobre o viés interdisciplinar?
Para desvendar esses mistérios se fez necessário uma incursão literária sobre os
discursos que permeiam o cotidiano dessas profissionais, nesse sentido as análises
foucaltinanas foram substancialmente significativas para compreender como se
institui a hierarquização dos saberes no Fórum.
5 Quanto aos objetivos específicos: Identificar estrutura organizacional do Fórum; Observar condições
de trabalho e dinâmica laboral das assistentes sociais e psicólogas; Verificar a formaç ão das
assistentes sociais e psicólogas; Verificar junto aos arquivos do Fórum, o número de atendimentos
realizados no período de agosto de 2009 a julho de 2010; Identificar as vertentes teórico-
metodológicas que norteou a formação das profissionais do Núcleo Psicossocial do Fórum; Detectar
dinâmica de interação entre assistentes sociais e psicólogas na distribuição e encaminhamento dos
processos.
20
O trabalho das assistentes sociais e psicólogas no Núcleo Psicossocial é
permeado de discursos que são manifestados através de atitudes de indignação e
conformidade. Inseridas num espaço de poder, representado pela força do Estado e
da lei com um significado nem sempre visível, porém presente, como espaço de
poder que são conferidas pelos saberes profissionais (competências técnicas
operativas) e pela natureza da instituição judiciária as assistentes sociais e
psicólogas vai configurando sua prática via estes discursos.
Os discursos presentes em toda a sociedade e com maior força, nas
instituições judiciárias, são controlados, perpassados por formas de poder e de
repressão, haja vista que. "[...] em toda sociedade a produção do discurso é ao
mesmo tempo controlada, selecionada, organizada e redistribuída por certo número
de procedimentos que tem por função conjurar seus poderes, dominarem seu
conhecimento aleatório, esquivar sua pesada e temível materialidade” (FOUCAULT,
2009, p.9).
Tal hegemonia acontece porque o sistema que garante a circulação das
relações de poder na sociedade vai plasmando verdades prontas. Vamos aproveitar
o linguajar tecnológico para caracterizar tal situação configurando o pensamento dos
indivíduos, pois uma vez que o poder não está concentrado somente nas
instituições, como a igreja, a escola, a família e o estado, mas na ideologia
hegemônica dos discursos que tais instituições possuem em toda sua dinâmica de
atuação.
Por tal motivo, é comum que indivíduos com diferentes vivências sociais e
oriundos de diversas classes, quando ingressam no espaço das instituições como o
Judiciário, por exemplo, passem a incorporar a postura e o discurso hegemônico
nele presente. Pois, o poder simbólico como defende Bourdieu (2004) é, com efeito,
esse poder invisível o qual só pode ser exercido com a cumplicidade daqueles que
não querem saber que lhe estão sujeitos ou mesmo que o exercem.
Entendemos que qualquer campo social é necessariamente estruturado por
um conjunto de regras não enunciadas para o que pode ser dito ou percebido
validamente dentro dele, e essas regras, portanto, operam como um modo do que
21
Bourdieu denomina ‘violência simbólica’. Como a violência simbólica é legítima,
geralmente não é reconhecida como violência, daí seu poder de hegemonia.
Olhando para o contexto do Judiciário, vemos que os magistrados nem
sempre percebem que sua atividade profissional lhes permite diferentes
interpretações da lei e a descoberta de novas formas de mediação de conflito,
acabando por reproduzir as posições majoritárias, adotando-as como “verdades
absolutas”. Eles estão inseridos dentro da dinâmica dos tribunais de justiça e assim
sendo, as decisões judiciais são proferidas em consonância com o discurso
hegemônico do Judiciário, onde podemos destacar a fala de Bourdieu (2004, p. 213-
214) que acentua esta característica de poder hegemônico:
Como no texto religioso, filosófico ou literato, no texto jurídico estão em jogo
lutas, pois a leitura é uma maneira de apropriação da força simbólica que
nele se encontra em estado potencial. Mas, por mais que os juristas possam
opor-se a respeito de textos cujo sentido nunca se impõe de maneira
absolutamente imperativa, eles permanecem inseridos num corpo
fortemente integrado de instâncias hierarquizadas que estão à altura de
resolver os conflitos entre os intérpretes e as interpretações.
Podemos dizer que vivemos um momento em que há certa proeminência do
Supremo e do discurso jurídico, o discurso da racionalidade do Direito.
Foucault (2009, p.9) também parte da idéia de que a idéia de que a educação
instaura um campo de lutas pela hegemonia do discurso, pois “[...] o sistema de
educação é uma maneira política de manter ou de modificar a apropriação dos
discursos, com os saberes e os poderes que trazem consigo”. E propõe que é
necessário reconhecermos em nossa sociedade os procedimentos de exclusão que
levam os sujeitos à submissão e ao silêncio temeroso. O primeiro e mais evidente é
o da interdição. O seu campo de ação está centrado, sobretudo, nas esferas da
sexualidade e da política, que imediatamente, se articula ao campo do desejo e do
poder. Percebe-se aqui um forte jogo de dissimulação, ou seja, nunca se diz o que
realmente se pensa. É onde se situa o exercício da mais temível prática do poder e
da dominação, hegemonia de um discurso que exclui.
Ao desvendar a relação entre as práticas discursivas e os poderes que as
permeiam, Foucault realiza uma arqueologia do saber, ou seja, busca explicitar
através da análise histórica que o discurso como saber não é uma ciência. Ao
percorrer os diversos procedimentos que cerceiam e controlam os discursos na
sociedade, comprovando que o discurso não é simplesmente aquilo que traduz as
22
lutas ou os sistemas de dominação, mas aquilo pelo qual se luta o poder de que
queremos nos apoderar e sem dúvida preservar. Todavia, ao delimitar tal fronteira,
pondera que “[...] como se o discurso, longe de ser esse elemento transparente o
neutro no qual a sexualidade se desarma e a política se pacifica, fosse um dos
lugares onde elas exercem, de modo privilegiado, alguns de seus mais temíveis
poderes” (FOUCAULT, 2009: 10).
É na instituição judiciária que o assistente social intervém com todo o seu
saber profissional e torna-se um perito e desta forma subsidia ações judiciais em
relação às mais variadas situações que envolvem violência contra a criança e o
adolescente e a preservação de seus direitos fundamentais. Fazendo seus
pareceres, relatórios e encaminhamentos estão às voltas com aquilo que acreditam
ser “a verdade” segundo as normas sociais estabelecidas.
Segundo Bourdieu (2004, p. 212) essa “verdade” produzida pelo Campo
Judiciário é entendida como o real, o justo haja vista que esse campo é lugar da
concorrência entre os operadores do Direito que o consideram como o ‘monopólio
de dizer o Direito'. Local onde cada um dos operadores do Direito procura através da
sua janela social interpretar os textos que já deixam subentendidos a concepção de
“justa” e “legitima” a cerca do mundo social. Daí deduz que,
O campo judiciário é o lugar da concorrência pelo monopólio do direito de
dizer o direito, quer dizer, a boa distribuição ou a boa ordem na qual se
defrontam agentes investidos de competência ao mesmo tempo social e
técnica que consiste essencialmente na capacidade reconhecida de
interpretar um corpus de texto que consagram a visão legítima, justa do
mundo social. É com esta condição que se podem dar as razões quer da
autonomia relativa do direito, quer do efeito propriamente simbólico do
desconhecimento, que resulta da ilusão da sua autonomia absoluta em
relações às pressões externas.
Quando ouvimos as assistentes sociais e as psicólogas percebemos que seus
discursos revelaram através das dinâmicas do seu trabalho, o poder que as
permeiam nas relações poder-saber, profissional e institucional. Aquilo que podem
ou não falar, por exemplo, aquilo que é “segredo de justiça”. Seu trabalho está
diretamente envolvido com as questões legais da aplicação da lei, da justiça. De
tudo o que depende da palavra delas, de seus discursos concretizados através dos
pareceres e tal, envolvidos em ações de julgamento vinculados ao exercício do
poder. O que, segundo Fávero (2005, p. 22) “[...] o Serviço Social contribui para
23
operar o poder legal – que aplica a norma – e opera o poder profissional – pelo seu
saber teórico-prático -, nas relações cotidianas, em ações micro e penetradas por
micro-poderes”.
É importante caracterizar este poder como uma capacidade geral de agir que
o homem tem ou determinar o comportamento do outro, isto é, um poder sobre o
outro, que se torna um poder de relação entre as pessoas (BOBBIO, 1993). No caso
das assistentes sociais e psicólogas do Núcleo Psicossocial, este poder está em
seus discursos, via fala e via palavra quando proferem, orientam, afirmam, pontuam
e direcionam as mais variadas situações de são cobradas pelos seus pareceres,
laudos e estudos sociais com elementos disciplinadores porque o Judiciário se
constitui como uma instituição que tem características eminentemente disciplinares e
disciplinadores.
Este poder disciplinador considera como disciplinar é acompanhado de perto
pelo discurso de quem fala a norma, de quem vigia, realiza a partilha entre o normal
e o anormal. Ou seja, o discurso do professor, do juiz, do médico, do psiquiatra e
finalmente, sobretudo o discurso do psicanalista. Em qualquer ponto do exercício do
poder é, ao mesmo tempo, um lugar de formação de saber. E, inversamente, todo
saber estabelecido permite e assegura o exercício de um poder.
O exercício do poder principalmente no campo judiciário se torna
epistemológico porque produz outros saberes a partir daquilo que extrai dos
indivíduos e daquilo que elabora sobre eles, como assevera Fávero (2005, p. 24)
“[...] as instituições disciplinares, através de seus especialistas, nas diversas
profissões, sustentam o saber-poder que se expressa pela norma. A coerção pela
norma, pela disciplina, estabelece um padrão de normalidade aos indivíduos, se
expressando, entre outros, nos discursos, leis, morais”.
Todavia, apesar dos operadores do Direito e advogarem o monopólio do
saber, vale ressaltar que os demais profissionais através de suas competências e
habilidades devem contestar estes saberes produzidos e institucionalizados, essas
contestações “[...] por mais que o discurso seja aparentemente bem pouca coisa, as
interdições que o atingem revelam logo, rapidamente, sua ligação com o desejo e o
poder”. O discurso não é simplesmente aquilo que traduz as lutas ou os sistemas de
24
dominação, mas aquilo porque, pelo que se luta o poder do qual nos queremos
apoderar (FOUCAULT, 2009, p. 10).
Então se pode dizer que o discurso é poroso à práxis, e a práxis é modificada
pelo discurso. Tudo se passa no nível do discurso. Os objetos, conceitos e escolhas
temáticas das diversas das diversas disciplinas são dados no espaço epistêmico
formado pelas interações de sistematicidades discursivas.
Olhando como assistentes sociais e psicólogas ocupam e demarcam
devidamente seus lugares, estes atores sociais presentes na trama dos discursos do
judiciário revelam a seu modo, como atuam, através de seus discursos, como se
misturam e se complementam no contato com outros sujeitos sociais. Todavia,
esses sujeitos sociais que configuram a realidade social desigual e injusta se
manifesta via discurso, nos saberes e dizeres dos profissionais que atuam no Núcleo
Psicossocial os colocam como segundo Bernardi (2008, p. 22),
[...] testemunhas oculares de um tempo que se vai diferenciando, ora pela
inclusão de novos atores, ora pela mudança de enfoque das práticas, ora
pela escassez de recursos e pessoas. Tempo esse, dimensionado tanto em
minutos de controle de prática, quanto a partir da imediaticidade de
resposta, urgência de ações contrapostas ao número crescente de
processos e de decrescente de pessoas, que se acotovelam na burocracia
institucional.
Tal análise se adéqua a realidade do núcleo Psicossocial do Fórum de Ji-
Paraná, um cenário todo peculiar onde os sujeitos, vistos sob o ponto de vista
foucaultiano, vivem num mundo onde já foram ou estão sendo submergidos pelo
discurso.
As práticas discursivas não são pura e simplesmente modos de fabricação
de discursos. Ganham corpo em conjuntos técnicos, em instituições, em
esquemas de comportamento, em tipos de transmissão e de difusão, em
formas pedagógicas, que ao mesmo tempo as impõem e as mantêm
(FOUCAULT, 1997, p. 12).
A corroboração das idéias expostas acima foi evidenciada a cada dia durante
o processo de estágio de observação e intervenção no fórum, mais especificamente
no Núcleo Psicossocial, quando as pessoas demonstravam grande dificuldade em
entender todo o discurso jurídico dos processos relativos às mais variadas situações
de suas vidas, como, por exemplo, ações de guarda, adoção, violências, entre
outras. Quase sempre, analfabetas diante do discurso jurídico e de seu corpus de
25
verdades precisaram de alguém que as introduzisse neste mundo todo próprio e
particular, para não dizer, exclusivo e excludente.
Tanto no mundo científico como na vida cotidiana, os conceitos têm a
importante função de nos ajudar a compreender, analisar e conhecer os fenômenos
que vemos ou experimentamos em nossa relação com o mundo. Eles funcionam
como ferramentas, usadas para compor nossa percepção da realidade. Quanto
melhor elaborados forem os conceitos, melhores serão nossas possibilidades de
operar sobre a realidade, isto é, de construir reflexões bem fundamentadas sobre o
mundo em nossa volta e sobre nós mesmos no mundo bem como de nossos
projetos, maiores ou menores.
O fio condutor que perpassou toda a análise das falas das assistentes sociais
e psicólogas foi a análise de conteúdo baseada na proposta teórica de Laurence
Bardin.
1.1. Os percursos metodológicos
Em linhas gerais no exercício desta pesquisa optamos pelo enfoque
qualitativo diante da necessidade de dar voz aos sujeitos e na intenção maior de
deixar que se expressassem com maior liberdade.
[...] suas opiniões e os significados que atribuem aos acontecimentos
relativos ao cotidiano profissional, e trazerem suas experiências, sem as
limitações impostas por um questionário estruturado apenas em questões
fechadas. Ressalta-se que a realização da prática profissional, na
perspectiva interdisciplinar, que compõe o objeto deste estudo, permite
constatar a importância das informações qualitativas, pois reforça que o
saber, em si, não é posse individual de cada profissão, é pleno, é
necessário, quando se pretende produzir práticas sociais que tenham a
dimensão do coletivo (FÁVERO, 2008, p. 62).
No trabalho coletivo os sujeitos vão se constituindo como pessoas e como
profissionais nas relações entre o pequeno grupo e a dinâmica da organização á
qual fazem parte. A direção social encaminhada diante dos desafios profissionais
nas respostas aos sujeitos da ação deste trabalho é condicionada pela visão de
mundo, pelos valores, hábitos e crenças, mas também pelos fundamentos teóricos e
princípios éticos que dão arcabouço ao agir profissional. Não se pode prescindir
destes elementos quando se pensa em pesquisa num enfoque qualitativo.
26
Como método de procedimento, adotamos o estudo de caso haja vista que o
mesmo contribui para a compreensão das relações sociais e politicas da situação
pesquisada. Dentro deste viés é muito comum esse tipo de estratégia para
pesquisadores das áreas da sociologia, psicologia e do serviço social pois fica
evidente que a grande importancia do estudo de caso é o desejo de entender melhor
os fenômenos sociais e sua complexidade.
Ressaltamos que o estudo de caso diferente de outras pesquisas, desafia
muito mais o pesquisador, pois estrategicamente falando, exige uma interação
contínua junto ao objeto pesquisado, com intuito de obter resultados satisfatórios em
relação ao caso.
[...] Em todas as situações, a clara necessidade pelos estudos de caso
surge do desejo de se compreender fenômenos sociais complexos. Em
resumo, o estudo de caso permite uma investigação para se preservar as
características holísticas e significativas dos acontecimentos da vida real –
tais como ciclos de vida individuais, processos organizacionais e
administrativos, mudanças ocorridas em regiões urbanas, relações
internacionais e maturação de setores econômicos (YIN, 2005, p.20).
Consideramos também que o estudo de caso permite captar e aprofundar
dados coletados de maneira precisa à investigação, além de levar em conta a
objetividade do caso considerando todas as informações coletadas. Além disso, este
permite uma compreensão do contexto de cada sujeito entrevistado, levando em
conta todos os fatores inerentes a tal.
Diante do que foi acima exposto, acredita-se que o estudo de caso deverá ser
aplicado onde a intenção primeira seja a de descrever e caracterizar situações
vivenciadas pelas profissionais que compõem o Núcleo Psicossocial do Fórum.
1.2. Coletando os dados
Para que se concretizasse esta pesquisa foram utilizadas as seguintes
técnicas: a observação participante e entrevistas semi-dirigidas. A observação como
procedimento de coleta de dados ou informações constitui-se num instrumento
valioso. Não é possível utilizar qualquer tipo de observação. Optamos então nesta
27
pesquisa pela observação participante para que fosse coerente com o todo do
trabalho e o tipo de abordagem que estávamos adotando.
O observador está em relação face a face com os observados, e
participando com eles em seu ambiente natural de vida coleta dados. Logo,
o observador é parte do contexto, sendo observado, no qual ele ao mesmo
tempo modifica e é modificado por este contexto. O papel do observador
pode ser tanto formal como informal, encoberto ou revelado, o observador
pode dispensar muito ou pouco tempo na situação da pesquisa.
(SCHWARTZ, apud HAGUETTE, 1987, p.62).
Tivemos certo cuidado ao adotar a observação participante: a consciência de
que nossas observações poderiam ser influenciadas pela própria realidade
observada, pela nossa formação pessoal e profissional nossas cosmovisões.
A observação participante como a entrevista, [...] são, pois, técnicas de
coleta de dados que trazem em si limitações sobre as quais o pesquisador
deve estar atento a fim de evitá-las quando for possível e de aceita-las
quando inevitáveis embora conscientes das distorções que podem provocar
(HAGUETTE, 1987, p. 78).
Os dados observados foram descritos num diário de campo, instrumento que
permitiu o detalhamento das observações, como se fossem “fotografias
instantâneas” da realidade que estava sendo observada. Tornou-se um relato
minucioso daquilo observamos, ouvimos e percebemos.
O diário são folhas de trás dos cadernos de anotações de pesquisas,
viagens e reuniões. São folhas de uma fala oculta. Escritos carregados de
afeição. Tudo isso pra dizer que os escritos do Diário descrevem maneiras
de sentir pessoas, lugares, situações e objetos. Aqui, livre do rigor da teoria,
não preciso explicar o que compreendo, mas compreender o que sinto.
(BRANDÃO, 1982, p.12-13).
Tínhamos a clareza de que, longe de ser neutro, eram anotações feitas a
partir dos nossos pontos de vista. Como um recorte e que a realidade continuava
sendo sempre maior do que os dados anotados.
Utilizamos a entrevista semi-estruturada, que segundo Negrine (1991, p. 74-
75), ocorre quando
[...] o instrumento de coleta está pensado para obter informações de
questões concretas, previamente definidas pelo pesquisador, e, ao mesmo
tempo, permite que realize explorações não-previstas, oferecendo-lhe
28
liberdade ao entrevistado para dissertar sobre o tema ou abordar aspectos
que sejam relevantes sobre o que se pensa. [...] Quando fazemos uso de
entrevista ‘semi-estruturada’, por um lado, visamos garantir um determinado
rol de informações importantes ao estudo e, por outro, para dar maior
flexibilidade à entrevista, proporcionando mais liberdade para o entrevistado
aportar aspectos que, segundo sua ótica, seja relevante em se tratando de
determinada temática.
Através destes instrumentos foi possível captar muitas falas, e mensagens
das assistentes sociais e psicólogas no seu trabalho cotidiano no Núcleo
Psicossocial do Fórum, pois como fala Bardin (2009:16) “[...] por detrás do discurso
aparente geralmente simbólico e polissêmico esconde-se um sentido que convém
desvendar”.
1.3. Como se analisou os dados
Como analisar, entender a profusão de falas, comentários e pequenos
discursos, grandes, suspiros de cansaço ou aborrecimento, quando da chegada, por
exemplo, de mais um processo no núcleo psicossocial? Como entender as críticas e
lamentos das assistentes sociais e psicólogas? Qual método mais apropriado de
análise em uma situação como esta?
Esses questionamentos nos fizeram coçar a cabeça muitas vezes: como
analisar o material verbal colhido, pois “[...] fazer falar, debater, registrar fielmente o
que é dito transcrevê-lo em centenas de páginas... e depois? Como proceder para
analisar, e depois teorizar, a partir de um material abundante (BARDIN, 2009, p.8)”.
Durante o percurso do Estágio Supervisionado em Serviço Social I e II
sempre nos chamou atenção à questão da fala, dos pequenos ou grandes discursos
das assistentes sociais e psicólogas e saber o que estava por detrás delas e como
se configuravam na realidade maior do sistema judiciário, mais especificamente no
Fórum.
Gostamos muito de registrar falas as falas das pessoas porque acreditamos
que elas são altamente reveladoras das situações e contexto em que estão vivendo
e onde se inserem. Nessa perspectiva, vislumbrou-se a intenção de focar o
29
conteúdo da palavra em seu aspecto individual e no ato da linguagem como ressalta
Franco (2005, p. 20):
A análise de conteúdo assenta-se nos pressupostos de uma concepção
crítica e dinâmica da linguagem. Linguagem aqui entendida, como uma
construção real de toda a sociedade e como expressão da existência
humana que, em diferentes momentos históricos, elabora e desenvolve
representações sociais no dinamismo interacional que se estabelece entre
linguagem, pensamento e ação.
Uma tarefa paciente de desocultação que pressupôs desconstrução da
realidade para que fossem feitas as inferências. A partir desta perspectiva, a análise
de conteúdo nos permitiu fazer novas deduções sobre o material do objeto da
análise, fazendo como que escavações nas falas dos sujeitos e percebendo nelas,
elementos da realidade onde estavam inseridos.
Neste sentido, a análise de conteúdo permitiu-nos realizar inferências,
deduções, sobre a fonte, a situação em que esta foi produzida o material que se
constituiu em nosso objeto da análise, haja vista a finalidade precípua da análise é
realizar inferências tendo como base uma lógica explicitada que tem uma
consonância com o objeto a ser analisado. Afinal esta é:
[...], la raison d’etre da análise de conteúdo. É ela que confere a esse
procedimento relevância teórica, uma vez que implica pelo menos uma
comparação, já que a informação puramente descritiva sobre o conteúdo é
de pequeno valor. Produzir inferências em análise de conteúdo tem um
significado bastante explícito e pressupõe a comparação dos dados obtidos
mediante discursos e símbolos, com os pressupostos teóricos de diferentes
concepções de mundo, de indivíduo e de sociedade. Situação concreta que
se expressa a partir das condições da práxis de seus produtores e
receptores acrescida do momento histórico e social da produção ou
recepção (FRANCO, 2005, p. 25-29) (grifos do autor).
O ponto de partida na análise de conteúdo é sempre a mensagem, verbal ou
escrita, feita através de gestos ou manifestada silenciosamente, figurativa ou não,
documental e carregada de significados e sentidos. Sentidos estes que devem ser
considerados desde o modo de representação social que cada sujeito tem de si
mesmo e a dinâmica como seus discursos são utilizados quando fala ou escreve e
como lida com eles.
30
2. CONSIDERAÇÕES PRIMEIRAS SOBRE O CENÁRIO
[...] Quero lembrar o risco da banalização da vida humana,
(grifo da autora), que pode ser provocado pela rotina, pelo trato
cotidiano de situações de segregação, de injustiça. O risco da perda
da capacidade de paixão (grifo da autora), da indignação - motor
necessário para uma ação comprometida – que pode levar o
profissional a viver sua prática mecanicamente, procurando
resultados, mas sem paixão.
(BAPTISTA, 2001, p.118)
“Está psicografando?” Uma assistente social do fórum pergunta-nos ao ver-
nos anotando avidamente e discretamente as coisas que vão acontecendo aos
borbotões no Núcleo Psicossocial. Talvez ela tivesse mesmo com razão em sua
percepção: estávamos mesmo psicografando, pois não queríamos perder nada
daqueles momentos, nem sua intensidade, nem suas incoerências nem suas
luminosidades. Não queríamos perder nada das particularidades daquele espaço.
Nossas mãos obedeciam ao comando de nossas percepções que em função de sua
magnitude, não se pode registrar tudo, embora a minha mente quisesse.
Éramos nós quem fotografávamos e registrávamos aqueles momentos que
até a inserção no campo de estágio, não tínhamos a noção da profundidade dos
fenômenos que adentravam cotidianamente naquele universo. Estávamos todo-
cabeça, mente e espírito – envolvidos naquela situação, absorto e nesse momento
nos faz lembrar Lispector (1973, p.40), quando tentava se autodefinir dizendo: "Eu
sou à esquerda de quem entra. E estremece em mim o mundo. [...] Sou
caleidoscópica: fascinam-me as minhas mutações faiscantes que aqui
caleidoscopicamente registro. Sou um coração batendo no mundo." Coração
batendo no mundo significava para nós desvendar o contexto e perceber seus
interstícios. Nesse sentido, foi necessário aprender a gostar de registrar o nosso link
com a etnografia foi prazeroso haja vista que gostar de observar nos auxilio neste
caminho que de imediato apareceu sinuoso. Portanto, como dizia Gertz (1989, p. 7)
ao referir-se a prática etnográfica e que me serviu de base na hora de anotar, olhar,
observar:
31
[...] a etnografia é uma descrição densa. O que o etnógrafo enfrenta, de fato
[...] é uma multiplicidade de estruturas conceituais complexas, muitas delas
sobrepostas ou amarradas umas às outras, que são simultaneamente
estranhas, irregulares e inexplícitas, e que ele tem que, de alguma forma,
primeiro apreender e depois apresentar.[...] Fazer a etnografia é como
tentar ler (no sentido de ‘ construir uma leitura de’) um manuscrito estranho,
desbotado, cheio de eclipses, incoerências, emendas suspeitas e
comentários tendenciosos, escrito não com os sinais convencionais do som,
mas com exemplos transitórios de comportamentos modelados.
Em função da densidade que envolvia os atores sociais que partilhavam de
determinados momentos do cenário, exigia-nos a sensibilidade para “fotografar” o
momento que aguardávamos durante todo o período da graduação: o estágio e mais
precisamente no Fórum. Porque neste espaço institucional? Já que tínhamos uma
experiência na área educacional, principalmente no trato de determinadas
expressões da Questão Social quais sejam: violência contra a criança e o
adolescente, abandono, evasão escolar, delinqüência juvenil. Todavia, o Fórum nos
permitiu perceber as relações nem sempre harmoniosas entre essas expressões e
os transmites legais na condução dos processos. Mas neste espaço os atores
sociais iam a busca de um amparo legal para as situações que vivenciavam. Nada
mais salutar nesse momento que resgatar o pensamento kierkegaardiano acerca do
drama humano: "Se o homem fosse um animal ou um anjo, não sentiria angústia.
Mas, sendo uma síntese, angustia-se. E tanto mais sente a angústia, quanto mais
humano for". Era esta a nossa sensação e nosso objetivo maior: fazer a experiência
de acompanhar e vivenciar o trabalho das profissionais que fazem parte do Núcleo
Psicossocial e suas relações com os usuários dos serviços.
Essa relação aprioristicamente parece simples, destarte ao enveredar por
esses caminhos aflora de imediato, discursos antagônicos, ou seja, de um lado as
assistentes sociais e psicólogas com todo discurso formal oriundo dos anos de
aprendizado na academia e de outro, o discurso do usuário que carregado de seus
saberes que, de uma forma ou de outra os utilizaram para viver. Mais que em virtude
das complexidades sociais, econômicas e políticas que vivenciam buscavam um
amparo legal para solucionar os problemas.
Mas como colocar no papel todas as relações vivenciadas durante o período
de estágio? Nesse momento é como assistir um filme no qual a primeira cena refere-
32
se a nossa inserção na instituição, o sentar no banco da entrada principal do Fórum,
(era o dia 30 de julho de 2010) nos deixava apreensivos, o que estávamos fazendo
naquele cenário? Será que conseguiríamos visualizar as dimensões que envolvia
principalmente o trabalho da assistente social? Todos esses questionamentos que
povoaram a nossas gerava uma expectativa, haja vista que o momento do estágio é
o coroamento do processo de formação do assistente social.
Mesmo com toda a bagagem teórica e a nossa experiência como orientador
educacional aquele friozinho na barriga apareceu, pois a imagem do Fórum como
um espaço sacrossanto, de autoridades inatingíveis ou investidas de um poder de
decisão quase como que de vida e morte, prisão ou liberdade sobre os corpos e os
discursos dos usuários que em função da subalternidade que o discurso
hegemônico da Instituição adentra no imaginário social e que de uma forma
subliminar se petrifica e se torna comum entre os usuários como se pode perceber
no seguinte diálogo entre a assistente social e uma usuária: “eu chamo a senhora de
doutora por causa do respeito e dos segredos de justiça”. A senhora é doutora né?”
Ao que a assistente social respondeu: “Pode me chamar de Margarida, mesmo,
Margarida”. A usuária retrucou e reafirmou o dicurso hegemônico: “Margarida, é... tá
bom, mas a gente chama de doutora por respeito”. Esta situação nos remeteu tantas
vezes ao trabalho cotidiano como orientador quando se percebe muitas vezes que
também na escola a domesticação e disciplinarização dos corpos rola solto. Não sei
se é arriscado dizer, mas Demo (2007, p. 23) tem razão quando afirma que
Enquanto o mercado se inova louca e irresponsavelmente, a escola, que
deveria estar à frente das mudanças, anda à passos de cágado, se é que
anda. Pareceria até que não faz parte do futuro das sociedades, tanto assim
que a tese de Foucault6 de que a escola tem como referência maior o
disciplinamento dos corpos, não a aprendizagem, continua muito presente.
Nada como a expressão foucaultiana para corroborar a domesticação dos
corpos e dos discursos.
6
FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: história da violência nas prisões.Petrópolis:Vozes, 1977.
33
A racionalidade perpassava em todos os gestos e espaços, ou seja, no Fórum
as pessoas falam baixo quase sussurrando nos corredores e pisam metricamente
para não perturbar a santa ordem.
Gritos verbalizados não existem, os que aparecem são logo contidos, no
entanto os gritos abafados, reprimidos ecoam como
uma gravura de Munch7, cuja figura humana não
apresenta suas linhas reais, mas contorce-se sob o
efeito de suas emoções. As linhas sinuosas do céu e
da água, e a linha diagonal da ponte, conduzem o
olhar do observador para a boca da figura que se
abre num grito perturbador. Munch foi um artista
determinado a criar ‘pessoas vivas, que respiram e
sentem, sofrem e amam’. Servindo de metáfora para
nosso cenário, diríamos que o silêncio imposto pelas
estruturas do Judiciário não é suficiente para calar
de forma categórica o usuário. Como em um espaço da fábrica estão
“domesticados”, loucos para se libertar dos grilhões que os aprisionam, mas em
função da busca da solução do problema vivenciado suportam o peso do espaço e
do poder que este impõe e significa. Pois, todo o aparato legal e policial dá esta
falsa sensação de harmonia e tranqüilidade.
2.1. A segunda cena do filme
Chegamos ao fórum às 07h30min sendo atendido pelo segurança que estava
sentado em uma mesinha perto da porta. Pude perceber que era de uma firma
terceirizada, o que significa que não era funcionário do Estado. Gentilmente pediu
que aguardássemos, pois a assistente social que haveria de nos acompanhar ainda
não havia chegado. Fiquei por ali aguardando e ouvindo um acirrado diálogo entre o
7
O Grito é uma pintura do norueguês Edvard Munch, datada de 1893. A obra representa uma figura andrógina
num momento de profunda angústia e desespero existencial. O pano de fundo é a doca de Oslofjord (em Oslo)
ao pôr-do-Sol.
34
segurança e o recepcionista acerca da história de “Z” contada por pessoas que a
desconhecem e da importância de se ouvir os pioneiros. Neste ínterim chega a
assistente social supervisora de campo e convidou-me para ir até a sala do setor
que é o Núcleo Psicossocial. Apresentou o local e falou-nos da alegria de aceitar-
nos como estagiário e ficamos ali trocando figurinhas sobre nosso primeiro contato
quando por ocasião de uma visita que ela fez na escola onde trabalhávamos dois
anos atrás. Combinamos como seria a dinâmica do estágio tais como: dias da
semana, atividades, visitas e etc.
E “voilà”8, estavam estabelecidos o clima e o contrato pedagógico e relacional
para que nos fornecesse elementos imprescindíveis à prática do estágio no espaço
do Núcleo Psicossocial.
Como viajantes exploradores poderiam enveredar por caminhos sinuosos,
assim também o fizemos, mas fomos sabendo de que como em qualquer viagem, é
condição primeira correr todos os riscos para descobrir nuances desses espaços
desconhecidos. Como nos fala Bachelard (1990, p. 76) de forma tão evocativa:
Nenhuma utilidade pode legitimar o risco imenso de partir sobre as ondas.
Para enfrentar a navegação, é preciso que haja interesses poderosos. Ora,
os verdadeiros interesses poderosos são os interesses quiméricos. São os
interesses que sonhamos, e não os que calculamos. São os interesses
fabulosos. O herói do mar é um herói da morte. O primeiro marujo é o
primeiro homem vivo que foi tão corajoso como um morto.
Tivemos o cuidado de relatar, neste preâmbulo, algumas impressões viscerais
sobre a experiência de estágio no fórum que no caminhar foi paulatinamente se
transformando no Trabalho de Conclusão do Curso. Um coroamento que foi sendo
gestado desde as primeiras disciplinas que atrelado as experiências como orientador
escolar de uma escola pública de bairro periférico de um município periférico que
durante anos ficou carente de políticas públicas.
Ao eleger como temática o trabalho das Assistentes Sociais e Psicólogas no
Fórum, sob a perspectiva da interdisciplinaridade pressupôs, nos obrigou a rever os
conceitos sobre Interdisciplinaridade, como esses saberes se articular
8 Expressão que vem do francês e significa “eis aí”.
35
cotidianamente ou não no espaço institucional? Como trabalhar a subjetividade
presente nas falas das profissionais do núcleo? Como a formação continuada pode
fazer a diferença no trato com o usuário? Responder esses questionamentos tornou-
se um dever de sinceridade filosófica tanto para as profissionais como para os
usuários. Na ânsia de atingir o objetivo proposto fomos literalmente obrigados a
mudar as nossas concepções de analisar o trabalho do assistente social e tudo
aquilo que configura esta profissão entendida como uma resultante necessária para
o capital.
Esta experiência será contada como um esquete teatral que tem um cenário e
com atores em ação, gestos subentendidos que devem ser decifrados. Que o palco
seja iluminado e abram-se as cortinas. Como relato de experiência sinaliza
certamente o filme de um tempo o qual poderá se tornar um instrumento de leitura
deste próprio tempo.
Quantas pessoas passam por esta porta todos os dias? Quantos dramas,
tramas, dores, vidas encontradas ou desencontradas perpassando o fazer das
assistentes sociais e psicólogas que trabalham neste local e jamais deixando-as
imunes destas marcas. Marcas percebidas durante a prática do estágio: desejo de
dar mais atenção às pessoas, de ouvir mais, de buscar soluções mais rápidas para
um caso como se percebe nesta fala de uma das assistentes sociais:
“A dinâmica da sociedade ela é muito rápida e parece que o judiciário ele
não acompanha, né? Você pega e faz um estudo e daqui uma semana está
desatualizado, né? E assim, é essa a nossa angústia. Parece que as coisas
levam um tempo mesmo para se processar e com isso se perde muita coisa
né? E quando chega a tomada da decisão a realidade já mudou e as
pessoas já não estão nem mais interessadas naquilo ali, perdeu o interesse
por aquilo ali. Essa para nós é a maior frustração.”
As profissionais demonstram ter consciência do descompasso entre as
transformações rápidas por quais passam a vida dos usuários e a lentidão das
mudanças no Judiciário. Tanto quanto, esta contradição as provoca e elas percebem
e sentem isto. São sensíveis sim aos dramas dos sujeitos de sua ação. Talvez
precisem problematizar mais as causas destes e planejar intervenções que possam
responder com maior eficiência tais desafios.
36
3. QUANDO OS ATORES SURGEM EM CENA E FALAM
Conhecer é, antes e acima de tudo, questionar,
desconstruir.(DEMO, 2007, p.32).
3.1. O elenco
No cenário do Núcleo Psicossocial do Fórum trabalham três assistentes sociais
e duas psicólogas compondo assim o que chamamos de uma equipe interdisciplinar.
Compreendemos uma equipe interdisciplinar como aquela que possui um grupo de
profissionais com formação diversificada e que atuam de maneira interdependente,
inter-relacionando-se num mesmo ambiente de trabalho, através de comunicações
formais e informais. Severino (2007, p.19) falando da importância de uma postura
interdisciplinar na intervenção social afirma que:
Se o trabalho prático visando tornar as condições concretas da existência
dos homens mais adequadas, de todos os pontos de vista, está
fundamentado numa concepção articulada, construída mediante a
contribuição de conhecimentos empíricos e teóricos, não se reduzindo a
puro ativismo espontaneísta, então é obvio que esse trabalho tem de levar
em conta a complementaridade de todos os elementos envolvidos. Toda
ação social, atravessada pela análise científica e pela reflexão filosófica, é
uma práxis e, portanto, integra as exigências de eficácia do agir tanto
quanto aquelas de elucidação do pensar.
37
Sob o ponto de vista funcional, o Núcleo Psicossocial, etimologicamente
significa uma equipe interdisciplinar, haja vista que trabalham neste espaço,
psicólogas e assistentes sociais, cada uma com sua formação.
Todavia, em função do reduzido número de profissionais para atender toda a
demanda, além disso, a agilidade na condução dos processos contribui para que as
mesmas não analisem os mesmos de forma conjunta. Sem contar com o espaço
físico que por sinal é reduzido e que para amenizar esta situação, fizeram uma
mudança radical na sala, deixando-a mais livre para o trânsito das mesmas e dos
usuários e também para reunirem.
No espaço coletivo não há disputa sobre ele. Cada profissional dispõe de uma
mesa e um computador. No entanto, a impressora é de uso coletivo (Ver fotos 6 e
7). Todavia, o espaço de atendimento individualizado (Foto 06), é disputado gerando
“pequenos reclames discretos” entre as profissionais refletindo diretamente no
atendimento aos usuários. Se racionalidade do discurso perpassa em suas falas,
essa mesma racionalidade se aplica ao uso do mesmo.
Depois que foi feita a reengenharia do espaço, foi possível até de se fazer
pequenos encontros de estudo ou reunião, como se percebe na foto 06 abaixo.
Durante o período de estágio todas as profissionais do Núcleo colaboraram
ativamente do processo. Ora prestando informações, ora conversando livremente
sobre o dia a dia do Núcleo, ora desabafando. Todas se mostraram receptivas em
alguns momentos em face da presença de um estranho/estagiário ficaram
reticentes, pois a chegada de um estranho provoca um embotamento, nada como o
dia-a-dia para que estas arestas sejam superadas. Todavia, no momento da
entrevista formal, apenas duas assistentes sociais aceitaram participar. Uma das
psicólogas estava de férias com a família em outro Estado e não foi localizada.
Quanto às outras duas profissionais, uma assistente social e uma psicóloga, por
demonstrarem resistência, não foram entrevistadas.
A idade das assistentes sociais entrevistadas varia de 28 a 40 anos. Uma é
casada e tem dois filhos. A outra assistente social tem uma filha e mora com os pais
em “Azul”. A mais jovem fez sua graduação na Universidade Federal de... e a outra
na Universidade Católica de... Quanto às falas que seguem abaixo, aquelas que
estão em negrito foram anotadas nas observações contidas no diário de campo. As
38
demais são frutos da entrevista feita com as duas assistentes sociais que
concordaram participar da pesquisa.
Apresentadas as protagonistas deste enredo, suas falas ainda permanecem
ecoando em nossa memória como documento vivo de um tempo e de um espaço.
Tempo recheado de riquezas e contradições, espaço conflituoso, denso e que traz
em suas estruturas uma relação de poder. Portanto, as suas palavras são
testemunhos desse tempo. Nesse sentido, temos que concordar com Bachelard
(1990, p. 35) ao afirmar que:
Toda a expressão falada não é outra senão eco de uma sonoridade natural
do ser, do seu ser. E sempre o ser, um ser, os seres são uma garantia da
Palavra. O ser da Palavra é só uma forma do Ser. A Palavra é sempre um
instrumento.
Portanto, toda palavra é uma expressão de linguagem que traz embutida uma
visão de mundo, de homem e de sociedade, de formação, por isso a Linguagem se
constitui no principal instrumento de trabalho do Assistente Social.
As falas das assistentes sociais e psicólogas que virão a seguir serão
divididas por “quandos”, que marcaram determinadas situações mais abrangentes,
digamos assim, de seu trabalho cotidiano. Vamos interferindo vez por outra com a
fala de outros atores, para ratificá-las, corroborá-las e dizer que estão inseridas num
contexto maior.
39
Tabela 01: Fala das assistentes sociais e Psicólogas a partir das entrevistas e observações contidas
no Diário de Campo.
UNIDADADES DE REGISTRO UNIDADES DE CONTEXTO CATEGORIAS
“Ah, a visão social crítica né, da Federal
do Espírito Santo, clara, declaradamente
fundamentada pelo marxismo, assim
como o projeto hegemônico do Serviço
Social da grande maioria da categoria.”
“Basicamente uma visão social crítica,
com outro direcionamento. Hoje, no meu
trabalho eu tenho também como
referência concepções assim mais,
digamos, que eu acho que hoje é
chamado de pós-moderno que compõe
a fenomenologia. É claro que a visão de
classe continua, o entendimento de
propriedade de que necessariamente ,
na propriedade capitalista a gente tem
exploração e que esta exploração que
gera toda as questões com as quais a
gente trabalha, mas a forma, o
entendimento continua sendo este, mas
a forma para construir as estratégias de
abordagens destas questões que tá
menos fundamentada em questões de
participação popular e lutas de classes é
mais em questões é , de questões
mesmo apresentadas e das condições
que geraram estas questões e as
possibilidades de enfrentamento que
são trazidas pelas próprias propostas.”
“Ah, Marilda Iamamoto, ficou bem
marcante assim.”
Marxismo, visão de
classe e luta de classes Formação
“Olha tem os livros, alguns livros que eu
leio, que eu paro para ler e que de fato
provocam algum movimento diferente.
Eles são mais marcantes e que
provocam movimentos. Tem um que eu
li há pouco, mas este foi mais para
esfriar as coisas, foi o “Cabeça de
Porco” do Mv Bill. Mas eu li mais para
aproximação de questões de
envolvimento da juventude com a
criminalidade. Mais o que foi mais
marcante que eu li no ano passado foi o
“Ponto de mutação” do Fritjof Capra e
Leituras Formação
40
agora eu estou lendo Boaventura Souza
Santos, o livro “Desenvolvimento sem
crescimento” que em experiências
alternativas de crescimento econômico e
de desenvolvimento de comunidade.
Este livro já tinha há muito tempo agora
eu peguei para ler. Ele tá fundamentado
na teoria social critica com experiências
micro, de regiões que deram certo.”
“As leituras que a gente faz dizem
respeito às legislações né, o ECA, tem
muitas: questões do novo Código Civil,
que mais? Questões pertinentes às
problemáticas que a gente trabalha né?
Abuso sexual, mediação familiar,
institucionalização de crianças, enfim,
todos os temas que envolvem aquelas
problemáticas.”
“Eu acho que é agregar vários
conhecimentos para o enfrentamento de
uma única questão, que nunca uma área
de conhecimento, um único olhar
profissional vai dar todas as respostas
possíveis, checar todas as respostas
possíveis do enfrentamento de uma
questão, que causou determinadas
questões. O que eu acho que a
interdisciplinaridade ela tem que passar
muito por conjunção mesmo de
construção conjunta de alternativas.
Basicamente é isso. Atuar em conjunto e
agregar também sim, e respeitar a
especificidade, mas no sentido assim de
que tem coisas que eu não vou ser
capaz de visualizar e que o Pedagogo
vai ver e que eu posso agregar isso ao
meu fazer profissional, ao meu trabalho
profissional. Eu posso agregar esse
conhecimento e essa atitude também no
meu trabalho, assim, não no sentido de
fazer o que o Pedagogo faz, para isto eu
preciso de muito mais tempo de
formação. Nunca vou conseguir fazer e
ter o mesmo olhar que o psicólogo tem
mas eu posso agregar ao meu trabalho
Trabalho Interdisciplinaridade
41
esses conhecimentos e eu acho que
pode ser até sem a presença desses
profissionais. Interdisciplinaridade tem
que ser uma troca constante em que eu
vou agregar ao meu trabalho outros
elementos.”
“Para mim é um trabalho assim em
conjunto com profissionais de outras
áreas, prá melhor abordar a
problemática sobre vários aspectos,
digamos. No núcleo a gente procura
(risos) digamos, trabalhar essas
questões se atendo mais a questões
psicológicas e sociais.”
“Olha, a gente costuma assim trocar
mesmo as ideias, trocar as percepções,
as observações dos casos quando a
gente atende em conjunto, mas assim
quando a leitura de relatório só mesmo
quando a gente tem que fazer mesmo
aquele relatório psicossocial. Mas o
mais comum é a gente conversar sobre
os casos.”
“Não, não temos o espaço adequado. É
uma necessidade assim que até a gente
reconhece que precisa mesmo, mas
pelas demandas, pelo volume mesmo
de trabalho a gente não tem se
permitido, mas a gente tem assim a
intenção realmente de criar um espaço,
criar um, preparar um tempo por conta
que a gente sabe que é muito
importante. Eu acredito digamos, dentre
cinco pessoas, eu acredito que três de
nós tem uma intenção maior de fazer
isto.”
“A gente teria que trocar mais as
figurinhas, quem vai sair pergunta
sobre os processos das outras.”
“Não, instituído não! A gente faz isto
aleatoriamente no cotidiano e em
conversas no ambiente de trabalho para
a gente discutir os casos que a gente
tem. Mas de sentar para construir
propostas de alternativas para o
trabalho, isto não tem.”
Cotidiano Trabalho
42
“Ixi é urgente. Que novela eles
fizeram? Qual é a trilha sonora?”
“E com o meu trabalho que eu vejo que
eu posso trazer mais questões da vida
mesmo cotidiana, da expressão de vida
das pessoas que tudo isso que esses
papéis estão dizendo é uma expressão
da vida das pessoas, dos problemas
mais complexos ainda, das questões
mais problemáticas que as pessoas
estão vivendo.”
Cotidianidade Trabalho
“Quanto a gente faz o atendimento em
conjunto, um profissional elabora o
relatório. Ou a assistente social ou a
psicóloga. As vezes a gente atende
sozinho e faz o relatório sozinho
também.”
Relatórios Instrumentais de
trabalho
“Por exemplo, quando se pede o
relatório social e a gente acha que dá
para propor uma alternativa sem a
presença do psicólogo junto, a gente faz
e manda o relatório. Às vezes nos
pedem para fazer um relatório
psicossocial e a gente tem que fazer
junto com o psicólogo. E às vezes não
nos pedem relatório psicossocial e a
gente sente necessidade deste outro
olhar, o do psicólogo.”
“Olha, a gente costuma assim trocar
mesmo as idéias , trocar as percepções,
as observações dos casos quando a
gente atende em conjunto, mas assim
quando a leitura de relatório só mesmo
quando a gente tem que fazer mesmo
aquele relatório psicossocial. Mas o
mais comum é a gente conversar sobre
os casos.”
Estudo de caso,
Observação e relatório
psicossocial
Interdisciplinaridade
Então eu acho que é possível com meu
trabalho aqui se conseguir trazer essa
humanização assim no trato dessas
questões, na abordagem dessas
questões, o que é muito ínfimo ainda. O
que precisa é que a gente assumisse
um movimento conjunto do núcleo para
Visita domiciliar,
Humanização,
processos, informação
legal e
Trabalho
43
a gente conseguir, porque como a gente
faz, apesar de a gente fazer todas as
abordagens de aproximação como, por
exemplo, uma visita domiciliar, um
acompanhamento, que a gente faz mas
isto tudo se transforma em papel depois.
Fica registrado e todo esse contato,
essa abordagem quando vira papel se
transforma na informação legal dentro
de um processo. A gente precisa fazer
um movimento, fazer com que essas
informações que estão impressas no
que a gente escreve, elas tenham mais
expressão dentro da vida das pessoas,
daquilo que as pessoas estão vivendo e
que vejam o que a gente escreve que
vejam a vida das pessoas mesmo.
acompanhamento
“Então, é o que está registrado em lei.
Eu acho que a gente, as profissionais do
núcleo tem um espaço, não privilegiado,
mas um espaço rico para ganhar esta
posição de credibilidade mesmo. Mas o
que vale , o que tem corpo como
conhecimento válido, é o conhecimento
legal. Dentro do fórum, dentro do
tribunal de justiça, acho que em
qualquer instituição de justiça, o que tá
determinado em lei é o que vale. Eu
acho que falta muito assim, o
entendimento do que está posto na lei,
meio que uma mediação entre o que é
legislação e expressão de vida mesmo.
As opções tem que vir baseadas no que
está posto legalmente mas o que está
posto legalmente é uma indicação, um
princípio que o que pode ou não fugir
daqueles princípios do instituído.”
“Não, não me sinto controlada. Temos
uma autonomia; relativa mas tem. Acho
que na questão de escala mesmo
hierárquica no próprio organograma tal,
mas a gente tem autonomia sobre
nossos fazeres e ações dentro do
núcleo, tem sim.”
Espaço institucional e
informação legal e
autonomia
Instituição
44
“Olha eu acho o que a gente coloca tem
muita relevância, tem um certo poder na
decisão. E a maioria dos juízes respeita.
O Ministério Público é que costuma
questionar. O que a gente propõe aqui
no fórum é aceito.”
Poder e discurso Invisibilidade de
controle
“Quando eu cheguei eu achei assim o
espaço do Núcleo e o entendimento do
trabalho do núcleo muito inferior do que
de fato pode ser. Do que de fato a gente
pode fazer de resultado positivo mesmo
em responder a processos, mesmo em
simplesmente dar alternativas a
processos visto que é o básico do que a
gente faz. Eu acho que ainda o
entendimento do que a gente faz é muito
pequeno que a gente poderia ter muito
mais espaço e em bem melhores
condições para dar alternativas mais
efetivas, resultados mais positivos.”
“Estou no fórum desde 1999. Vai fazer
11 anos. Nós estamos ali na verdade
para atuar naqueles processos né, onde
o juiz entende que é necessário um
esclarecimento sobre a questão da
problemática e daí, nos atendemos os
juízes das varas cíveis, eventualmente
algum caso das varas criminais, daí a
gente, é, o processo é encaminhado lá
para o setor e daí a gente vai fazer um
estudo social ou psicossocial a respeito
do caso.”
Processos e
intervenção Trabalho
45
9 Estas falas aparecem negritadas porque foram anotadas durante as observações do período de Estágio e que
estão em nosso diário de campo.
“Não, não temos o espaço adequado. É
uma necessidade assim que até a gente
reconhece que precisa mesmo, mas
pelas demandas, pelo volume mesmo
de trabalho a gente não tem se
permitido, mas a gente tem assim a
intenção realmente de criar um espaço,
criar um, preparar um tempo por conta
que a gente sabe que é muito
importante. Eu acredito digamos, dentre
cinco pessoas, eu acredito que três de
nós tem uma intenção maior de fazer
isto.”
“Ainda bem que eu não estou com
meus relatórios atrasados. Aquele
monte ali chegou ontem. Aquele
monte ali é meu é da Fulana. Esse
não é nosso não. Aqui tudo é urgente,
urgentíssimo. Este processo aqui vai
para a fila. Processos aqui chegam a
toda hora”.9
“Esses processos que batem e
voltam é que acabam com a gente.
Não consigo me organizar. Não sei o
que fazer”.
“Vamos acabar o relatório para
despachar?”
“É das políticas de rede que não
funcionam. Estou cansada
emocionalmente. É frustrante, pois
cobram da gente coisa que não
podemos dar. Estou me questionando
muito”.
“Não estudamos nada hoje. Até que
eu gostaria de estudar, mas tenho
que despachar este processo. Nosso
trabalho aqui é deixar mastigadinho,
tudo triturado para eles. Triturar o
pesado. O duro é se a gente pudesse
(risos) mastigar e cuspir depois, tava
bom né? (risos).”
“Meu montinho já está grande
Sobre trabalho e
atitude projetiva
Formação
continuada e
trabalho
46
novamente, oh Senhor da Glória.”
“Ás vezes isto desestimula tanto. Me
sinto amarrada com estes processos
todos”.
“Eu me vejo assim é, o meu papel ali
assim é, fundamental mesmo para
buscar a garantia dos direitos das
pessoas que estão ali envolvidas
naqueles processos. Eu vejo ali que eu
estou na defesa mesmo desses direitos
e que a gente tem que entender isso e
fazer essa questão.”
Código de ética e
Garantia de Direitos Instituição
“Claro, assim eu penso que em uma
escola digamos, o papel não digo mais
importante, mas significativo, mais
atuante mesmo é o do juiz né, por conta
das tomadas de decisões, mas assim
nós também nos sentimos assim
reconhecidas em nosso trabalho porque
de fato eles estão sempre nos
requisitando e considerando nossas
opiniões e nossas sugestões. Então a
gente, hoje eu não sei como seria o
judiciário sem a presença do assistente
social e do psicólogo. Reconhecida,
assim, parece assim que se eles não
pedirem um estudo, eles não se sentem
seguros para tomar nenhuma decisão,
porque é a gente que ta ali no dia a dia,
né? Que pára para observar mesmo as
situações. Então assim a maioria tem
realmente embasada as decisões com
base no que a gente percebe e sugere.
Me vejo realmente reconhecida.”
Valorização, realização
e reconhecimento
profissional
Trabalho
“Você sabe que o dia a dia, a dinâmica
da sociedade ela é muito rápida e
parece que assim, que o judiciário ele
não acompanha, né? Você pega e faz
um estudo e daqui uma semana está
47
desatualizado, né? E assim, é essa a
nossa angústia. Parece que as coisas
levam um tempo mesmo para se
processar e com isso se perde muita
coisa né? E quando chega a tomada da
decisão a realidade já mudou e as
pessoas já não estão nem mais
interessadas naquilo ali, perdeu o
interesse por aquilo ali. Essa para nós é
a maior frustração.”
“Você sabe como a justiça é lenta
né?”
Angústia e decepção Burocracia
“Acho que a questão do abuso sexual,
da adoção também, ainda mais eu a
gente está procurando se adequar à
nova lei de adoção. E cada problemática
tem questões que assim, envolvem
dificuldades, sei lá. Tem hora que eu me
angustio parece assim que eu quero ver
as coisas acontecerem a nível de
concreto né? Eu sei que nós não somos
executivas, nós não somos executoras.
Então isso gera uma certa angústia
assim. Para que assim, que cada um
trabalha de um jeito e a rede não está
interligada e ai as coisas não funcionam
porque em algum lugar as coisas se
estagnam, empacam mesmo, então
essas coisas que dificultam, porque a
gente sabe que é um processo, mas
assim a engrenagem.”
Angústia e decepção Redes sociais
“Eu fico olhando estes relatórios e
fico pensando: quantos destes
meninos já estão no Agenor de
Carvalho?” “É muito frustrante para o
técnico porque se sugere tanta coisa
que não é levado em conta”.
“casos velhos, sem solução”.
Angústia e decepção Intervenção, fazer
profissional, visão
de futuro e ausência
de poder nas
decisões
“Esses processos que batem e
voltam é que acabam com a gente.
Não consigo me organizar. Não sei o Excesso de trabalho Trabalho
48
que fazer”.
“A gente pode reservar uma tarde
para estudos. Todos juntos, nós e as
psicólogas. Assim a gente se anima
mais, você participa?”
Formação e trabalho
Trabalho
“Estou cansada, precisamos sentar
juntas”.
Troca de saberes Trabalho
“Estamos vendo um trabalho que
começamos no ano passado, temos
que ver o que fazem as outras
instituições em prol dos menores.
Nós acabamos não conhecendo o
que as outras fazem. Precisamos
saber, mesmo que a gente sabe que
não fazem muita coisa. A X. pode
ajudar bastante, ela dialoga e troca.”
Redes sociais, diálogo
e trocas
Trabalho
“Aos olhos humanos não têm
solução, só por Deus mesmo”.“Para a
gente ser feliz é preciso honrar pai e
mãe, é um pricípio bíblico. A senhora
frequenta alguma igreja? Você está
indo para alguma igreja? Ora pro seu
pai, se você conhece Jesus, ora pro
seu pai. Você já sabe o que é certo e
o que é errado. Chama sua mãe
também”.
Perda da dimensão
política
Formação,
naturalização das
expressões da
questão social
“isso aqui é um atentado violento ao
pudor, será que já está sendo
atendido por alguma de nós?” Atendimento Trabalho
“As pessoas ficam com raiva da
gente”. Representação social Trabalho
“A gente poderia fazer umas
palestras, mas quando?”
Processo de trabalho Intervenção
“Demora tanto, que é por isto que as
pessoas procuram a ilegalidade. Isto
é tão desestimulador”.
Legalidade Burocracia
49
3.2. A formação das assistentes sociais
Consideramos que toda formação de profissionais em nível superior possui
duas dimensões, a saber, aquela que se refere à formação inicial e que se dá nas
mais variadas graduações. A outra, comumente chamada de formação permanente
ou continuada podendo acontecer através de cursos, capacitações oferecidas pelas
instituições onde o profissional está inserido ou formação em serviço que é a mais
interessante e tem maior chance de estar em consonância com as diversas
realidades do mundo do trabalho e suas contradições.
Existem duas tendências hoje quando se fala em formação em serviço que
são complementares: a primeira consiste em focalizar a atenção no potencial
formador e transformador dos saberes adquiridos na experiência do cotidiano da
“A gente faz uma colcha de retalhos e
não senta para conversar. Porque ela
tem que encaixar o atendimento dele
ali”.
Atendimento individual Interdisciplinaridade
“Eu gosto tanto de fazer visita, entrar
em contato direto com os usuários.
Dá uma sensação de liberdade. Só
não gosto de ficar lá olhando aqueles
processos”.
Visita, usuários e
processos
Socialização
“tenho medo de ser taxativa. Ai o juiz
vai falar: segundo a psicóloga tal. Ai
sua palavra tem peso. É aquilo que
você diz, parece uma masturbação...
é a vida a pessoa. É muito
preocupante um laudo nestes casos...
é a vida da pessoa. Parece uma
masturbação, a gente fica ali em cima
e nao sabe para onde vai. E o que a
gente faz com o abusador?
Discurso, poder e
direitos
Instituição
50
prática profissional. Essa idéia fica ainda mais assumida em Pimenta (1999:26)
quando afirma: “O profissional não pode constituir seu saber-fazer, senão a partir de
seu próprio fazer. Não é senão sobre essa base que o saber, enquanto elaboração
teórica se constitui”.
Outra forma de analisar a formação continuada se refere à tematização da
prática defendida por Scarpa (1998) quando afirma a necessidade de tematizar a
prática que é o exercício de fazer com que o profissional do Serviço Social, por
exemplo, seja capaz de desentranhar as teorias que guiam seu fazer profissional
real.
Fazer recortes da realidade para transformá-los em objeto de reflexão e
teorizar. Haja vista que o assistente social tem o dever de plasmar em suas ações,
sua marca e digital nos espaços institucionais para validar os direitos dos usuários,
como uma categoria imperativa que está ancorada nos princípios fundamentais do
Código de Ética dos Assistentes Sociais aprovado em 15 de março de 1993 com
alterações provocadas pelas resoluções do CFESS nº 290/94 e 293/94. O Código,
documento norteador das ações dos assistentes sociais, afirma que estes devem
primar pelo “compromisso com a qualidade dos serviços prestados à população e
com o aprimoramento intelectual, na perspectiva da competência profissional”.
Competência profissional esta que deve articular dialeticamente as dimensões
ético-politica, teórico-metodológica e técnico-operativo, ou seja, a questão do
poder↔saber↔fazer deve perpassar em seu fazer como elemento de reflexão
constante. É a razão maior do ser dos assistentes sociais que vem de encontro à
finalidade do seu fazer. Segundo Silva (2007, p.114), o profissional do Serviço Social
deve retomar sua prática haja vista que nesse:
[...] duplo processo de respostas a procuras que se lhe colocam
institucionalmente, o profissional deve refletir sobre o tipo de serviço que é
prestado por ele, isto é, a quem serve, como se determina o processo de
entrada, quais os requisitos dos serviços que presta, com o intuito de no
processo de ‘inclusão/exclusão’, valorizar o primeiro em relação ao
segundo.
Em tempos de tantos “encantos” e outros “desencantos”, o profissional do
Serviço Social não pode se dar ao luxo de perder a dimensão investigativa do seu
fazer, isto é a própria dimensão ontológica e teleológica que norteiam a sua prática.
As profissionais do Fórum em suas falas manifestam que cumprem tarefas, fazem
51
coisas e em função da lentidão da justiça perdem o controle, não uma reflexão, um
sentar, um parar para uma troca de saberes. Como conseqüência as leituras de
realidades vão desde a linearidade até o fatalismo perdendo diríamos assim a
dimensão profética não acepção mais profunda deste termo que lhe é tão cara e que
foi conquistada através de uma luta árdua, histórica e processual.
Qual sereia sedutora que seria capaz de emergir dos mares como em um
encanto da desmitificar o seu fazer? Como nos mares, os perigos sempre rondam o
fazer dos assistentes sociais, em tempos de capital fetiche da mercantilização dos
direitos e das ausências de políticas públicas eficazes como se concretizar uma
cidadania mais plena como preconizou Gramsci. Mas o que seria esta cidadania
plena? Discutindo conceito de cidadania, Zambon (2006) afirma que:
O conceito de cidadania encontra-se atualmente num jogo de disputa de
interesses. Com isso, trabalhamos numa concepção de cidadania como
soberania popular, ou seja, o conjunto de cidadãos tem uma participação
ativa na formação do governo e no controle da vida social. Baseando-se em
Gramsci, a realização da cidadania plena se dá principalmente na conquista
de novos espaços na esfera pública. A correlação de forças entre a
burguesia e a classe subalterna se dá principalmente na nova configuração
do Estado; que, através de estratégias a classe trabalhadora possa
conseguir a hegemonia neste espaço e realizar seu projeto de emancipação
e construção de uma nova sociedade.
Neste intróito, o profissional do Serviço Social é antes de tudo um educador
social, eliminando toda a dimensão caritativa e tecnicista que outrora perpassava o
seu fazer. Eliminando não no sentido de esquecimento, porque ela faz parte
intrínseca da história da profissão. Eliminar no sentido de estar de vigília para que
esta dimensão não venha ser retomada, haja vista que o novo sempre traz marcas
do velho como assevera Marx. De qualquer forma, desde o surgimento da Questão
Social a origem reside na contradição entre o capital e o trabalho, no entanto na era
do capital fetiche tais contradições se aguçaram em função da reestruturação
produtiva e o reordenamento do Estado na condução das políticas.
[…] las transformaciones que el Estado ha tenido, respeto a las políticas
sociales, se observan por el cambio de una perspectiva
universal/contractual de la cuestión social hacia una modalidad de
precarización, focalización y descentralización de la actividad estatal; este
trastrocamiento se ha dado paralelamente al crecimiento de la actividad
social privada en su versión filantrópica y mercantil. Consideramos que este
nuevo tratamiento de la cuestión social profundiza aún más el cuadro de
desigualdades sociales, agravadas por la baja cobertura de los programas
52
sociales, la estratificación de beneficios, la falta de protección económica
por los desempleados y la ausencia de un enfoque distributivo de las
políticas sociales. Todos estos aspectos muestran que el estándar de la
política social estatal se caracteriza por el predominio de programas
asistenciales de carácter complementario y de emergencia, destinado
apenas para los pobres. De este modo, los vectores de integración, vía
relaciones salariales y protección social, se han debilitado, desplazándose
hacia los “márgenes”. En este contexto, es imperiosa la necesidad de
recrear la lucha por la instauración de la ciudadanía social; ésta va, por
cierto, más allá de la instrumentación de las políticas sociales y al margen
de las decisiones fundamentales del desarrollo económico. El desafío está
justamente en la necesidad de pensar la política social, incorporada en la
construcción de un proyecto de sociedad; asimismo en la resignificación de
sus fines, considerándolas como la vía de desarrollo de los derechos
sociales y la ciudadanía social. La ausencia objetiva de esta perspectiva y
una visión instrumentalista (PAGAZA, 2009, p. 219).
O receio da fordização na formação do profissional do Serviço Social, ou seja,
do aprender-fazer retira muitas vezes a dimensão política e reflexiva do trabalho. Em
tempos da mercantilização da formação profissional através dos cursos à distância
podemos perceber esta dinâmica de formação para a Mcdonaldização – fast food.
Este fenômeno Gentili (2002) chama de penetração dos princípios que regulam a
lógica do financiamento dos fast foods em espaços cada vez mais amplos da vida
social no capitalismo contemporâneo, cujo conjunto de estratégias estão dirigidas a
transferir a educação, da esfera dos direitos sociais à esfera do mercado e que está
ancorado no que denomina de trilha da excelência: qualidade, serviço, limpeza e
preço.
Esta formação inicial aligeirada que é feita em geral, nos cursos à distância -
EAD-, que se distanciam da própria concepção de universidade, ou seja, o tripé
ensino↔pesquisa↔extensão se volatiza no ar (BERMAN, 1986). Os efeitos
perversos desta formação incidem no seu fazer, destituindo o caráter de classe
(classe para si), retornando a velha concepção individualista (classe em si) que de
forma indireta favorece ao modelo neoliberal. Tais fatos têm suscitado reflexões
sobre os impactos dessa formação na relação com a validação dos direitos sociais
pela categoria, segundo a oferta destes cursos:
Ainda que reflita a expansão do mercado de trabalho especializado, poderá
desdobrar-se na criação de um exército assistencial de reserva. Isto é, um
recurso de qualificação do voluntariado no reforço do chamamento à
solidariedade em um ambiente político que estimula a criminalização da
questão social e das lutas dos trabalhadores e o caráter assistencial das
políticas sociais, como já salientado. A massificação e a perda de qualidade
da formação universitária estimulam o reforço de mecanismos ideológicos
que facilitam a submissão dos profissionais às ‘normas do mercado’,
redundando em um processo de despolitização da categoria, favorecido
53
pelo isolamento vivenciado no ensino à distância e na falta de experiências
estudantis coletivas na vida universitária. (Grifos da autora) (IAMAMOTO,
2010, p.36-37). (grifos da autora)
Almejamos que sejam os assistentes sociais, educadores sociais que
sinalizem saídas para que a cidadania seja garantida a partir de projetos alternativos
no qual os usuários sejam os verdadeiros protagonistas da história. Isto nos fez
lembrar um encontro que partilhamos recentemente num grupo de Terceira Idade.
Estávamos trabalhando com dinâmicas de grupo e qual não foi nossa surpresa, que
lá pelas tantas os idosos, eles mesmos perguntaram se também podiam apresentar
suas dinâmicas e suas brincadeiras. O perigo sempre está ai, ou seja, naquele que
facilmente se incorre: fazer coisas para os outros, para as crianças, adolescentes,
jovens, os pobres, mas sem a participação ativa destes, ou melhor, sem fazer com
eles. Reproduzindo de forma ingênua o modelo fordista-taylorista, ou seja, aqueles
que pensam, têm idéias e aqueles que laconicamente as executam, como se os
mesmos não pudessem pensar?
No Núcleo Psicossocial, duas assistentes sociais tiveram sua formação inicial
em instituições públicas de ensino superior e apenas uma fez sua graduação em
instituição particular. O ano de formação varia entre a década de 70, 90 e 2000. Das
duas psicólogas, uma fez graduação na década de 1970 em uma universidade
particular e a outra em 2000 em uma universidade pública. A idade varia entre 28 a
53 anos.
Cada profissional que compõem o Núcleo psicossocial teve sua formação
pautada por determinadas linhas teóricas e que de certa forma continuam marcando
ainda sua dinâmica de intervenção profissional. E isto acontece em todas as
profissões. Por exemplo, se tomarmos o caso da Orientação Educacional, nos anos
70 os orientadores tinham uma atuação profundamente disciplinadora, adaptadora.
Seu fazer foi influenciado pelo contexto da época. Hoje atuam mais no sentido de
ajudar o aluno a ser participativo e capaz de enxergar o mundo e suas
complexidades, destarte tais mudanças tem relação com as transformações
macrossociais.
Todas las profesiones se constituyen y se desarrollan como parte de las
relaciones sociales y que van construyendo su campo a partir del proceso
de especialización de los saberes que responde a las necesidades que
marca la sociedad capitalista. De este modo, van recreando su campo y su
significado social, no como consecuencia directa y mecánica de dichas
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ENTRE TRAMAS E DRAMAS: O FAZER, O PENSAR E O SENTIR DAS PROFISSIONAIS DO NÚCLEO PSICOSSOCIAL DO FÓRUM “Z”

  • 1. CENTRO UNIVERSITÁRIO LUTERANO DE JI-PARANÁ CEULJI/ULBRA ENTRE TRAMAS E DRAMAS: O FAZER, O PENSAR E O SENTIR DAS PROFISSIONAIS DO NÚCLEO PSICOSSOCIAL DO FÓRUM “Z”. Ji-Paraná/RO 2010 LOCIMAR MASSALAI
  • 2. ENTRE TRAMAS E DRAMAS: O FAZER, O PENSAR E O SENTIR DAS PROFISSIONAIS DO NÚCLEO PSICOSSOCIAL DO FÓRUM “Z”. Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Serviço Social do Centro Universitário Luterano de Ji-Paraná- CEULJI/ULBRA, para obtenção de título de Bacharel em Serviço Social, sob orientação da Profª. Msc. Dalva Felipe de Oliveira. Ji-Paraná/RO 2010 LOCIMAR MASSALAI
  • 3. ENTRE TRAMAS E DRAMAS: O FAZER, O PENSAR E O SENTIR DAS PROFISSIONAIS DO NÚCLEO PSICOSSOCIAL DO FÓRUM DESEMBARGADOR “X” EM “Y”. ________________________________ Professora Msc. ______________________________ Assistente Social ___________________________________ Professora Doutora ___________________________________ Professora Msc. ____________________ Média Ji-Paraná/RO 2009
  • 4. Para minha mãe, Érica Massalai modelo de cuidado interdisciplinar, anjo protetor presente em todas as situações da minha vida. Para a professora Dalva Felipe de Oliveira, por sua postura ética, desafiadora e amiga, modelo de educadora que faz de sua tarefa docente não apenas a de ensinar os conteúdos, mas também ensinar a pensar certo. Para as crianças do 1º ao 5º ano da Escola Estadual “Z” cuja presença resiliente tem me deixado menos ranzinza e muito mais amoroso. Para minhas ex-alunas do Curso de Pedagogia do CEULJI/ULBRA que, sendo mães, mulheres e companheiras foram exemplos de superação, adaptação e flexibilidade diante das adversidades por quais passam para estudar.
  • 5. AGRADECIMENTOS Somente nos damos conta do quanto dependemos dos demais, quando paramos para pensar em todas as pessoas que deveríamos agradecer por tudo quanto conseguimos realizar. Foram tantos rostos amigos que ao longo desta graduação nos estenderam a mão e foram compreensíveis, companheiros, solidários, atenciosos e respeitosos em cada momento vivido. Vamos aos “thank you”! À minha mãe, Érica Massalai, por sua voz inconfundível no portão ou ao telefone nas tardes quentes do verão amazônida quase sempre lá pelas 17h30min, me chamando: “Locimar, Locimar, quer jantar lá em casa hoje?” Enquanto eu, numa luta danada tentava entender os desdobramentos epistemológicos de Foucault, Iamamoto ou Japiassu para referendar os discursos! O arroz com feijão preto e ovo da minha mãe realmente ajudaram tornar estes momentos menos áridos. E tem coisa melhor do que comida de mãe? Porque junto com a comida vem sempre o afago, o incentivo... À professora Dalva Felipe de Oliveira por integralmente me orientar e me servir às pratadas, livros e mais livros num lauto banquete de autores que não somente deram sustentação ao meu e outros discursos como também me possibilitaram hoje ser um profissional menos superficial. Justamente eu, que tenho sede de entender e aprofundar as coisas. Este é o papel de quem orienta.
  • 6. O importante é ter claro que, muito embora a ação profissional se efetive por aproximações, desvios, soluções precárias para resolver dificuldades imediatas, isto não significa que o saber construído pelo serviço social seja necessariamente utilitarista ou imediatista; significa sim que, seja qual for seu objeto, mediata ou imediatamente, o profissional deverá procurar superar estas limitações, encaminhando suas reflexões e seus resultados em um sentido histórico, social, político e técnico de produção de conhecimentos, tendo em vista um saber e uma prática mais conseqüentes. (BAPTISTA, 2001, p.116)
  • 7. RESUMO O trabalho das assistentes sociais e psicólogas no Núcleo Psicossocial é permeado de discursos que são manifestados através de atitudes de indignação e conformidade. Inseridas num espaço de poder, representado pela força do Estado da lei com um significado nem sempre visível, porém presente, como espaço de poder que são conferidas pelos saberes profissionais e pela natureza da instituição judiciária as assistentes sociais e psicólogas vai configurando sua prática via estes discursos. Dentro deste contexto objetivou-se conhecer e posteriormente analisar a prática das assistentes sociais a partir do viés interdisciplinar, norteados pela seguinte questão provocadora: “Como o excesso de atividades dificulta o ser e o fazer profissional sobre o viés da interdisciplinaridade”? Para atingir o objetivo proposto recorreu-se aos seguintes procedimentos: como método de procedimento optou-se pelo estudo de caso (YIN, 2005). Os dados foram coletados através da observação participante (HAGUETTE, 1987) e a entrevista semi-dirigida (NEGRINE, 1991) que foram aplicadas com três assistentes sociais e duas psicólogas do Núcleo Psicossocial do Fórum “Z”. Os dados foram categorizados segundo a proposta de Laurence Bardin(2009). Para fundamentar as nossas analises sobre discurso, verdade e poder recorreu-se às teses desenvolvidas por Michael Foucault (1977; 1985; 1987; 1997; 2002 e 2009), Pierre Bordieu (2004). A categoria interdisciplinaridade foi embasada nas reflexões realizadas por Japiassu (1976; 1992), Gusdorf (1976; 1984 ), Piaget (1976) Fazenda ( 1993; 1996;2001; 2008 ) Severino (2007) e Rodrigues On (2001). As questões relativas ao Serviço Social foram analisadas a luz de Iamomoto (1985; 2007; 2010), Fávero (2005; 2008) e Magalhães (2006). A partir das falas e das observações realizadas verificou-se que de fato o excesso de atividades prejudica efetivamente o fazer interdisciplinar, porém não é o único culpado. Aliado a isto, percebeu-se que as profissionais foram acostumando-se a certa rotina e que o trabalho por elas tem uma dimensão multidisciplinar do que interdisciplinar. Há desejos de torná-lo interdisciplinar, mas faltam atitudes e decisões para tal e diante disto começam a enfrentar os desafios que exige uma prática interdisciplinar, nessa perspectiva escolheram uma coordenadora e começaram a sentar para realizar os estudos e organizar seus projetos do referido núcleo. Palavras-chave: Serviço Social. Prática interdisciplinar. Questão social. Judiciário.
  • 8. RESUMEN El trabajo de los trabajadores sociales y psicólogos en el Centro Psicosocial está impregnado de los discursos que se manifiestan a través de actitudes de indignación y de conformidad. Situado en un espacio de poder, representado por la fuerza de la ley estatal y con un significado no siempre visible, pero presente como un espacio de poder que se confiere por el conocimiento profesional y la naturaleza de la institución judiciaria las trabajadoras sociales y psicólogos van haciendo su trabajo bajo el poder de estos discursos. Dentro de este contexto, se tuvo como objetivo conocer y analizar la práctica de las trabajadoras sociales desde una mirada interdisciplinaria, orientado por la provocativa pregunta: "¿Por qué el grande numero de actividades impide de se hacer el trabajo a partir de la mirada interdisciplinaria?” Para lograr nuestro objetivo hemos utilizado los siguientes procedimientos: como modo de proceder fue elegido el estudio de caso (Yin, 2005). Los datos fueron recolectados a través de la observación participante (Haguette, 1987) y entrevista semi-dirigida (Negrine, 1991) que se aplicaron con tres trabajadares sociales y dos psicólogas en el Centro Psicosocial de Foro “Z”. Los datos se clasificaran de acuerdo con la propuesta de Laurence Bardin (2009). Para basar nuestro análisis en el discurso, la verdad y el poder recurrimos a las teorías desarrolladas por Michel Foucault (1977, 1985, 1987, 1997, 2002 y 2009), Pierre Bourdieu (2004). La categoría interdisciplinaridad se basó en consideraciones hechas por Japiassu (1976, 1992), Gusdorf (1976, 1984), Piaget (1976) FAZENDA (1993, 1996, 2001, 2008), Severino (2007) y Rodrigues On (2001). Cuestiones relacionadas con los Servicios Sociales fueron analizadas la luz de Iamomoto (1985, 2007, 2010), Favero (2005, 2008) y Magalhaes (2006). Los discursos y las observaciones muestran que, de hecho, las actividades adicionales afectan el hacer interdisciplinario, pero no es el único culpable. Junto a esto, se señaló que los profesionales se están acostumbrando a la rutina de tener que dar cuenta para hacer visitas, informes, etc y que el trabajo se realiza de forma mucho más multidisciplinar que en la dimensión interdisciplinar. Hay deseos para que sea interdisciplinario, pero carece de las medidas y decisiones para hacerlo. Teniendo en cuenta este principio para hacer frente a los desafíos que requiere una práctica interdisciplinaria: necesitan elegir un coordinador y sentarse a organizar sus proyectos. Palabras clave: Trabajo Social. Práctica Interdisciplinaria. Temas Sociales. Poder Judicial.
  • 9. SUMÁRIO LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS .....................................................................................9 LISTA DE ILUSTRAÇÕES .......................................................................................................10 LISTA DE TABELA...................................................................................................................11 MEMORIAL...............................................................................................................................12 1. A APROXIMAÇÃO COM A REALIDADE.............................................................................18 1.1 Os percursos metodológicos..........................................................................................25 1.2 Coletando os dados.......................................................................................................26 1.3 Como se analisou os dados ...........................................................................................28 2.CONSIDERAÇÕES PRIMEIRAS SOBRE O CENÁRIO ......................................................30 2.1 A segunda cena do filme................................................................................................33 3. QUANDO OS ATORES SURGEM EM CENA E FALAM ....................................................36 3.1 O elenco..........................................................................................................................36 3.2 A formação das assistentes sociais...............................................................................49 3.3 Quando o excesso de atividades fragiliza e angustia o cotidiano ..............................58 3.4 Se o grupo é intersciplinar a prática também é? ...........................................................60 4.CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................693 REFERÊNCIAS ......................................................................................................................748 APÊNDICE .............................................................................................................................793
  • 10. LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS EAD CEULJI Educação à Distância Centro Universitário Luterano de Jí-Paraná CEFESS Conselho Federal de Serviço Social
  • 11. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Foto 1: Casa onde passei boa parte da minha família e adolescência – 1970 a 1980 Projeto Riachuelo, Linha 102 e Lote 64 ...............................................................15 Foto 2: Certificado de Conclusão do Curso de Normalista de Érica Massalai .........16 Foto 3: Conclusão do Curso de Normalista (Regente de Ensino Primário), em 1963 em São Carlos – Santa Catarina ..............................................................................17 Foto 4: Detalhe Porta de entrada que dá acesso à sala de trabalho das Assistentes Sociais e Psicólogas do Núcleo Psicossocial .........................................................36 Foto 5: O espaço coletivo - Sala de trabalho das Assistentes Sociais e Psicólogas do Núcleo Psicossocial modificada .......................................................................39 Foto 1: O espaço individual de cada profissional ...................................................39 Foto 2: O espaço individual de cada profissional, ou seja, aquilo que é só dele ......40 Foto 3: Espaço para atendimento individualizado.........................................40 Foto 4: Espaço redesenhado – momento de reunião para discutir palestras sobre a Nova Lei de Adoção. Presentes no momento: duas assistentes sociais, uma psicóloga e uma estagiária do Serviço Social do CEULJI/ULBRA ............................41 Ilustração de texto 01- Do memorial: “Mãe e filho” – arquivo particular ....................13 Ilustração de texto 02- Do desespero: “O grito” de Edvard Munch .........................34 Ilustração de texto 03- Do saber fragmentado: “Mulher com gavetas” de Salvador Dalí .....................................................................................................................66
  • 12. LISTA DE TABELA Tabela 01 – Fala das assistentes sociais e Psicólogas a partir das entrevistas e observações contidas no Diário de Campo ............................................................43
  • 13. 12 MEMORIAL Sou sempre uma vírgula e nunca um ponto final, parafraseando uma mestra que eu tive em minha graduação em Pedagogia. Sou feito de sonhos/utopia, movido por projetos, afinal é isto que dá sentido a minha existência enquanto sujeito histórico. Chamo-me Locimar, por escolha de meus pais, interessante que nunca me interessei em saber os reais motivos por tal escolha e isto não tem hoje muita significância, pois aprendi a gostar do meu nome e, por conseguinte gostar de mim. Como qualquer homem, tive momentos de vazios existenciais bem no sentido sartriano, mas uma tríade me salvou do desespero e me fez a pessoa que sou: o fato de ter uma família e ser amado por ela, ser amado por Deus incondicionalmente e os livros que sempre me deram respostas diante das inquietações e injustiças a mim impetradas. A cada leitura uma nova visão de mundo ia se desenhando no meu imaginário e provocava inquietudes face aos desafios que a vida suscitava. Nessa perspectiva asseguro que as análises que tais leituras apresentavam me auxiliaram na busca de compreender tais desafios. Ressalta-se que cada mergulho no mundo das leituras nem sempre era digerível de imediato. Eram necessárias idas e vindas para decifrar o que estava “oculto” nos códigos lingüísticos, dinâmica esta que difere radicalmente das respostas prontas dos livros de auto-ajuda. Catarinense por questões biológicas e Jiparanaense por circunstâncias sócio-culturais, pois sou filho de migrantes que acreditaram no mito do eldorado que
  • 14. 13 foi forjado pelo governo militar cujo lema era: “Integrar para não entregar”. Nesse sentido, a década de 70 foi determinante para a construção de uma “nova história” da minha família. Neste “eldorado” carente de políticas públicas, mas recheado de relações sociais que foram tecendo cotidianamente entre os colonos, essas relações se traduziram nas instituições existentes na época, quais sejam: igreja, escola e famílias. Sendo assim, a ajuda mútua era imprescindível para não desaminar e não retornar ao local de origem haja vista que o retorno significava um fracasso diante dos parentes que ficaram no sul do País. Isto tudo me faz lembrar Basségio (2004, p. 01) ao falar da Migração em Rondônia e em específico de Ji-Paraná, quando afirma que: A maioria dos migrantes começaram a chegar por volta de 1975. Criaram-se projetos de colonização e muita terra foi repartida. Mas, o que aconteceu com grande parte destas famílias? Mal haviam decorrido 10 anos desde a sua chagada, grande número de famílias começaram abandonar, vender ou alugar seus lotes e saíram em busca de melhores condições de vida. Dirigiram-se então para à periferia das cidades ou então para novas frentes de ocupação. A situação descrita acima também aconteceu com minha família, pois em 1983 migramos para a cidade em busca de estudos e vida melhor porque a lavoura de café e cacau dava muita praga e o lucro era pouco e não tínhamos nenhum subsídio do governo para cuidar da lavoura. Logo depois vendemos o lote que tínhamos e que por quase 15 anos foi o cenário de minha infância e parte da adolescência. Saudades das pescarias no Rio Riachuelo (hoje um pequeno filete de água), Rio Malaquias e o próprio córrego perto de nossa casa, o que o homem não fez para ocupar essas áreas, limpou tudo e o que restou foram apenas saudades. Nesta, meus pais fincaram as nossas raízes e ergueram uma casa na qual passei bons momentos de minha infância; não era nenhum de Versalhes, mas tinha o fundamental: amor. Esses momentos rememorados me levaram às lágrimas ao lado da Dalva, minha orientadora, (responsável pelo resgate destas memórias), e ela nem percebeu. Penso que não. Se percebeu, foi discreta e elegante pois mesmo que estivéssemos num tempo coletivo, naquele ínterim, naquela incursão pessoal entendia que resgatar a memória da gente é perceber-se vivo e fazendo parte de um contexto e história maiores e menores. Fui puxando um nó e vieram outros tantos.
  • 15. 14 Ao sentar com minha mãe na tarde chuvosa deste sábado1 revivi momentos fantásticos de nossa história e que por falta de uma anamnese corriam o risco de serem esquecidos. Foto 1 – casa onde passei boa parte da minha família e adolescência – 1970 a 1980 – Projeto Riachuelo, Linha 102 e Lote 64. Créditos: Arquivo pessoal (MASSALAI, 2010) Aos nove anos fiz a minha primeira viagem ao mundo encantado das letras na Escola Oiapoque na linha 102 Gleba 42 lote 14, Projeto Riachuelo, na então Vila de Rondônia. Saudades das brincadeiras e peraltices daquela turma multisseriada. Eu contava com o apoio da minha professora/normalista2 (ver foto 2,). Segundo ela, este curso foi “emergencial”, porque tinha muita falta de professores e quando veio para Rondônia não valia como segundo grau e por isto seu salário no momento de ser contratada, foi diminuído de 1.115,00 cruzeiros para 912,00 cruzeiros. Minha mãe formou-se como Normalista em 1963 na cidade de São Carlos, Estado de Santa Catarina. Justificou suas notas um tanto quanto baixas porque tinha que trabalhar como doméstica na casa de uma família e somente depois que fazia todos os afazeres cotidianos é que podia estudar. Relatou que ao fazer o concurso para professora primária aqui na Vila de Rondônia, ficou entre as primeiras 1 Dia 23/10/2010. 2 Eram moças que estudavam nas chamadas “Escolas Normais”,por isto recebiam o nome de Normalistas.As Escolas Normais preparavam as moças para serem professores do primário (1ºao 5º ano) e eram consideradas um orgulho para suas famílias.
  • 16. 15 colocadas. E que este concurso foi feito na Escola Tupi, na Linha 94. “A prova que era composta por uma prova e uns desenhos. Foto 2 – Certificado de Conclusão do Curso de Normalista de Érica Massalai Créditos: Arquivo pessoal (MASSALAI, 2010) Sendo minha mãe, a primeira professora, os vínculos se entrelaçavam e logo as cobranças eram maiores sobre mim. Nesses ritos de iniciação fui monitor dela e catequista da minha Comunidade Nossa Senhora Aparecida3, (que estava encravada na propriedade da minha família) e isto já se delineava uma credencial 3 Hoje se chama Virgem Santíssima Aparecida e fica localizada na Linha 102 no Projeto Riachuelo.
  • 17. 16 que mais tarde foi fundamental para a minha escolha profissional. Neste tempo, recordo-me bem de minha mãe trazendo um saco de livros nas costas, altas horas da noite porque tinha que andar muitos quilômetros a pé no meio da mata. Para mim, o cheiro de livro novo era uma festa para o paladar. Lembro-me até hoje do cheiro dos livros e de um em especial: “As reinações de narizinho” de Monteiro Lobato. Era grande e com uma foto imensa da Narizinho na capa. Foto 3 – Conclusão do Curso de Normalista (Regente de Ensino Primário), em 1963 – São Carlos – Santa Catarina. Créditos: Arquivo pessoal (MASSALAI, 2010) Como a sociedade era muito machista, meu pai não permitiu que realizasse o meu sonho: cursar o Magistério e assim fui literalmente obrigado a fazer o Colegial. A docência estava tão encravada em mim que auxiliava as minhas professoras na sala de aula, e este amor pelo ensinar me fez em 1985 ingressar na Congregação dos Irmãos Maristas4 em Vilhena sendo transferido mais tarde para Florianópolis e em 1989 começo a primeira graduação em Pedagogia Educação Infantil e Anos Iniciais. 4 Ordem religiosa de irmãos leigos,fundada em por São Marcelino Champagnatem 1817 para o trabalho com crianças e jovens no campo da educação.
  • 18. 17 O mito do eterno retorno bem no sentido de Mircea Eliade (1999), isto é, uma saudade das minhas origens, me fez retornar ao Estado de Rondônia e mil sonhos povoaram a minha mente e uma perguntava martelava meu juízo: o que fazer pela educação das crianças e dos jovens da cidade que tinha me acolhido? Buscando aprimorar os conhecimentos e eu não tendo noção do que era “Stricto Senso”, em 1998 fui cursar Pedagogia com especialização e Orientação Educacional no então Instituto Luterano de Ji-Paraná, (hoje CEULJI/ULBRA), sem saber bem do que se tratava. Tempo extraordinário de descobertas e de riquezas memoráveis das professoras da época: Elide Cechin, Asta Verena Tews, Mary José e suas aulas de Currículo (Que mulher louca, provocativa, mais de uma competência extraordinária). E o professor Alejandro Yague Mayor com as suas desconstruções filosóficas que dava nós em nossos juízos. Nesse período o Estágio Curricular foi marcante, pois cada passo nessa nova trajetória era acompanhado pelas professoras orientadoras de estágio que iam onde o aluno estagiava, não havia distâncias, os limites geográficos eram transponíveis concretizando em sua plenitude o sentido de ser professora como desenha Werner em seu livro a Paidéia. Como a busca pelo conhecimento estava presente na vida fui fazer a Pós- graduação em Metodologia do Ensino Superior e em seguida Psicopedagogia Clínica, todavia, tais cursos não tiveram muita significância para mim. No ano de 2005, continuando essa busca comecei o Curso de Serviço Social, pois compreendo que o mesmo mantém uma relação orgânica com a Educação. Vale frisar que curso ajudou aprimorar o olhar epistemológico sobre a sociedade e suas complexas relações juntamente com uma leitura crítica da realidade. O ponto alto foi a prática do estágio e os necessários aprofundamentos teóricos para as leituras das questões que fizeram parte do micro e macrosmo do Núcleo Psicossocial do Fórum...
  • 19. 18 1. A APROXIMAÇÃO COM A REALIDADE “Tanto quanto o agir, também o saber não pode se dar na fragmentação: precisa acontecer sob a perspectiva da totalidade. E isto é válido tanto para as situações de ensino, como de pesquisa. O desafio da multiplicidade, expressão da riqueza da manifestação do mundo em nossa experiência, não nos exime da exigência da unidade, garantia da significação especificamente humana do mundo que os homens inauguraram”. (SEVERINO, 2001, p.54) A escolha do tema para este TCC foi uma decisão pensada a partir da nossa experiência profissional e pessoal com grupos humanos distintos. Quando pensamos em grupos humanos, nos lembramos de todos aqueles aos quais fazemos parte e que referendam nossa vida. Em especial não podemos deixar de falar do grupo de pessoas da Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio “Z”. Dentro da escola existem tantos subgrupos: o grupo de professoras do 1º ao 5º ano, o grupo de alunos de casa turma, o grupo dos gestores e por ai vamos podendo numerar tantos outros que vão configurando entre uma situação e outra nossas redes de relacionamentos naquele local de trabalho. A partir da experiência que tivemos com Comunidades Eclesiais de Base e com a Pastoral da Juventude fomos aprendendo a lidar com tantas diferenças e saber ouvir e respeitar cada pessoa. O que nem sempre foi fácil. Aprendendo a ser dinâmico e respeitar o protagonismo de cada pessoa. Quando fizemos nossa primeira graduação em Pedagogia, no início da década de 90 estava em alta a discussão sobre interdisciplinaridade com Ivani Fazenda. Lembramo-nos de uma das primeiras jornadas acadêmicas que participamos em Jaraguá do Sul, Santa Catarina e que Fazenda esteve presente e em um dos seus discursos disse a seguinte frase que anotamos avidamente em um caderno de apontamentos: Perceber-se interdisciplinar é o primeiro movimento em direção a um fazer interdisciplinar. O que caracteriza uma prática interdisciplinar é a atitude interdisciplinar de ousadia, da busca e da pesquisa. É a transformação da
  • 20. 19 segurança num exercício do pensar, num construir (FAZENDA, 1996, p.14- 17). Também era um tempo em que se falava muito de uma visão holista sobre as coisas. A parte só pode ser compreendida a partir do todo, que privilegia a consideração da totalidade na explicação de uma realidade, sustentando que o todo não é apenas a soma das partes, mas possui uma unidade orgânica (JAPIASSU & MARCONDES, 1990, p.122). Os dois conceitos e suas implicações sobre as ciências e as profissões continuam extremamente atuais, até porque sua concretização na prática pouco se efetivou e ficou muito no discurso. Partindo deste contexto, quando chegou o momento do estágio escolhemos fazê-lo no Fórum “T”, mais especificamente no Núcleo Psicossocial, porque nele trabalham assistentes sociais e psicólogas, caracterizando este local e fazer, como interdisciplinar. E também porque queríamos fazer o estágio num local onde houvesse de fato a presença de uma equipe interdisciplinar atuando sobre determinadas situações com o objetivo5 maior de analisar os desafios enfrentados pelas assistentes sociais e psicólogas no Núcleo Psicossocial do Fórum para trabalhar na perspectiva da interdisciplinaridade. E nos perguntamos como o excesso de trabalho das assistentes sociais e psicólogas do Núcleo Psicossocial dificultam o trabalho sobre o viés interdisciplinar? Para desvendar esses mistérios se fez necessário uma incursão literária sobre os discursos que permeiam o cotidiano dessas profissionais, nesse sentido as análises foucaltinanas foram substancialmente significativas para compreender como se institui a hierarquização dos saberes no Fórum. 5 Quanto aos objetivos específicos: Identificar estrutura organizacional do Fórum; Observar condições de trabalho e dinâmica laboral das assistentes sociais e psicólogas; Verificar a formaç ão das assistentes sociais e psicólogas; Verificar junto aos arquivos do Fórum, o número de atendimentos realizados no período de agosto de 2009 a julho de 2010; Identificar as vertentes teórico- metodológicas que norteou a formação das profissionais do Núcleo Psicossocial do Fórum; Detectar dinâmica de interação entre assistentes sociais e psicólogas na distribuição e encaminhamento dos processos.
  • 21. 20 O trabalho das assistentes sociais e psicólogas no Núcleo Psicossocial é permeado de discursos que são manifestados através de atitudes de indignação e conformidade. Inseridas num espaço de poder, representado pela força do Estado e da lei com um significado nem sempre visível, porém presente, como espaço de poder que são conferidas pelos saberes profissionais (competências técnicas operativas) e pela natureza da instituição judiciária as assistentes sociais e psicólogas vai configurando sua prática via estes discursos. Os discursos presentes em toda a sociedade e com maior força, nas instituições judiciárias, são controlados, perpassados por formas de poder e de repressão, haja vista que. "[...] em toda sociedade a produção do discurso é ao mesmo tempo controlada, selecionada, organizada e redistribuída por certo número de procedimentos que tem por função conjurar seus poderes, dominarem seu conhecimento aleatório, esquivar sua pesada e temível materialidade” (FOUCAULT, 2009, p.9). Tal hegemonia acontece porque o sistema que garante a circulação das relações de poder na sociedade vai plasmando verdades prontas. Vamos aproveitar o linguajar tecnológico para caracterizar tal situação configurando o pensamento dos indivíduos, pois uma vez que o poder não está concentrado somente nas instituições, como a igreja, a escola, a família e o estado, mas na ideologia hegemônica dos discursos que tais instituições possuem em toda sua dinâmica de atuação. Por tal motivo, é comum que indivíduos com diferentes vivências sociais e oriundos de diversas classes, quando ingressam no espaço das instituições como o Judiciário, por exemplo, passem a incorporar a postura e o discurso hegemônico nele presente. Pois, o poder simbólico como defende Bourdieu (2004) é, com efeito, esse poder invisível o qual só pode ser exercido com a cumplicidade daqueles que não querem saber que lhe estão sujeitos ou mesmo que o exercem. Entendemos que qualquer campo social é necessariamente estruturado por um conjunto de regras não enunciadas para o que pode ser dito ou percebido validamente dentro dele, e essas regras, portanto, operam como um modo do que
  • 22. 21 Bourdieu denomina ‘violência simbólica’. Como a violência simbólica é legítima, geralmente não é reconhecida como violência, daí seu poder de hegemonia. Olhando para o contexto do Judiciário, vemos que os magistrados nem sempre percebem que sua atividade profissional lhes permite diferentes interpretações da lei e a descoberta de novas formas de mediação de conflito, acabando por reproduzir as posições majoritárias, adotando-as como “verdades absolutas”. Eles estão inseridos dentro da dinâmica dos tribunais de justiça e assim sendo, as decisões judiciais são proferidas em consonância com o discurso hegemônico do Judiciário, onde podemos destacar a fala de Bourdieu (2004, p. 213- 214) que acentua esta característica de poder hegemônico: Como no texto religioso, filosófico ou literato, no texto jurídico estão em jogo lutas, pois a leitura é uma maneira de apropriação da força simbólica que nele se encontra em estado potencial. Mas, por mais que os juristas possam opor-se a respeito de textos cujo sentido nunca se impõe de maneira absolutamente imperativa, eles permanecem inseridos num corpo fortemente integrado de instâncias hierarquizadas que estão à altura de resolver os conflitos entre os intérpretes e as interpretações. Podemos dizer que vivemos um momento em que há certa proeminência do Supremo e do discurso jurídico, o discurso da racionalidade do Direito. Foucault (2009, p.9) também parte da idéia de que a idéia de que a educação instaura um campo de lutas pela hegemonia do discurso, pois “[...] o sistema de educação é uma maneira política de manter ou de modificar a apropriação dos discursos, com os saberes e os poderes que trazem consigo”. E propõe que é necessário reconhecermos em nossa sociedade os procedimentos de exclusão que levam os sujeitos à submissão e ao silêncio temeroso. O primeiro e mais evidente é o da interdição. O seu campo de ação está centrado, sobretudo, nas esferas da sexualidade e da política, que imediatamente, se articula ao campo do desejo e do poder. Percebe-se aqui um forte jogo de dissimulação, ou seja, nunca se diz o que realmente se pensa. É onde se situa o exercício da mais temível prática do poder e da dominação, hegemonia de um discurso que exclui. Ao desvendar a relação entre as práticas discursivas e os poderes que as permeiam, Foucault realiza uma arqueologia do saber, ou seja, busca explicitar através da análise histórica que o discurso como saber não é uma ciência. Ao percorrer os diversos procedimentos que cerceiam e controlam os discursos na sociedade, comprovando que o discurso não é simplesmente aquilo que traduz as
  • 23. 22 lutas ou os sistemas de dominação, mas aquilo pelo qual se luta o poder de que queremos nos apoderar e sem dúvida preservar. Todavia, ao delimitar tal fronteira, pondera que “[...] como se o discurso, longe de ser esse elemento transparente o neutro no qual a sexualidade se desarma e a política se pacifica, fosse um dos lugares onde elas exercem, de modo privilegiado, alguns de seus mais temíveis poderes” (FOUCAULT, 2009: 10). É na instituição judiciária que o assistente social intervém com todo o seu saber profissional e torna-se um perito e desta forma subsidia ações judiciais em relação às mais variadas situações que envolvem violência contra a criança e o adolescente e a preservação de seus direitos fundamentais. Fazendo seus pareceres, relatórios e encaminhamentos estão às voltas com aquilo que acreditam ser “a verdade” segundo as normas sociais estabelecidas. Segundo Bourdieu (2004, p. 212) essa “verdade” produzida pelo Campo Judiciário é entendida como o real, o justo haja vista que esse campo é lugar da concorrência entre os operadores do Direito que o consideram como o ‘monopólio de dizer o Direito'. Local onde cada um dos operadores do Direito procura através da sua janela social interpretar os textos que já deixam subentendidos a concepção de “justa” e “legitima” a cerca do mundo social. Daí deduz que, O campo judiciário é o lugar da concorrência pelo monopólio do direito de dizer o direito, quer dizer, a boa distribuição ou a boa ordem na qual se defrontam agentes investidos de competência ao mesmo tempo social e técnica que consiste essencialmente na capacidade reconhecida de interpretar um corpus de texto que consagram a visão legítima, justa do mundo social. É com esta condição que se podem dar as razões quer da autonomia relativa do direito, quer do efeito propriamente simbólico do desconhecimento, que resulta da ilusão da sua autonomia absoluta em relações às pressões externas. Quando ouvimos as assistentes sociais e as psicólogas percebemos que seus discursos revelaram através das dinâmicas do seu trabalho, o poder que as permeiam nas relações poder-saber, profissional e institucional. Aquilo que podem ou não falar, por exemplo, aquilo que é “segredo de justiça”. Seu trabalho está diretamente envolvido com as questões legais da aplicação da lei, da justiça. De tudo o que depende da palavra delas, de seus discursos concretizados através dos pareceres e tal, envolvidos em ações de julgamento vinculados ao exercício do poder. O que, segundo Fávero (2005, p. 22) “[...] o Serviço Social contribui para
  • 24. 23 operar o poder legal – que aplica a norma – e opera o poder profissional – pelo seu saber teórico-prático -, nas relações cotidianas, em ações micro e penetradas por micro-poderes”. É importante caracterizar este poder como uma capacidade geral de agir que o homem tem ou determinar o comportamento do outro, isto é, um poder sobre o outro, que se torna um poder de relação entre as pessoas (BOBBIO, 1993). No caso das assistentes sociais e psicólogas do Núcleo Psicossocial, este poder está em seus discursos, via fala e via palavra quando proferem, orientam, afirmam, pontuam e direcionam as mais variadas situações de são cobradas pelos seus pareceres, laudos e estudos sociais com elementos disciplinadores porque o Judiciário se constitui como uma instituição que tem características eminentemente disciplinares e disciplinadores. Este poder disciplinador considera como disciplinar é acompanhado de perto pelo discurso de quem fala a norma, de quem vigia, realiza a partilha entre o normal e o anormal. Ou seja, o discurso do professor, do juiz, do médico, do psiquiatra e finalmente, sobretudo o discurso do psicanalista. Em qualquer ponto do exercício do poder é, ao mesmo tempo, um lugar de formação de saber. E, inversamente, todo saber estabelecido permite e assegura o exercício de um poder. O exercício do poder principalmente no campo judiciário se torna epistemológico porque produz outros saberes a partir daquilo que extrai dos indivíduos e daquilo que elabora sobre eles, como assevera Fávero (2005, p. 24) “[...] as instituições disciplinares, através de seus especialistas, nas diversas profissões, sustentam o saber-poder que se expressa pela norma. A coerção pela norma, pela disciplina, estabelece um padrão de normalidade aos indivíduos, se expressando, entre outros, nos discursos, leis, morais”. Todavia, apesar dos operadores do Direito e advogarem o monopólio do saber, vale ressaltar que os demais profissionais através de suas competências e habilidades devem contestar estes saberes produzidos e institucionalizados, essas contestações “[...] por mais que o discurso seja aparentemente bem pouca coisa, as interdições que o atingem revelam logo, rapidamente, sua ligação com o desejo e o poder”. O discurso não é simplesmente aquilo que traduz as lutas ou os sistemas de
  • 25. 24 dominação, mas aquilo porque, pelo que se luta o poder do qual nos queremos apoderar (FOUCAULT, 2009, p. 10). Então se pode dizer que o discurso é poroso à práxis, e a práxis é modificada pelo discurso. Tudo se passa no nível do discurso. Os objetos, conceitos e escolhas temáticas das diversas das diversas disciplinas são dados no espaço epistêmico formado pelas interações de sistematicidades discursivas. Olhando como assistentes sociais e psicólogas ocupam e demarcam devidamente seus lugares, estes atores sociais presentes na trama dos discursos do judiciário revelam a seu modo, como atuam, através de seus discursos, como se misturam e se complementam no contato com outros sujeitos sociais. Todavia, esses sujeitos sociais que configuram a realidade social desigual e injusta se manifesta via discurso, nos saberes e dizeres dos profissionais que atuam no Núcleo Psicossocial os colocam como segundo Bernardi (2008, p. 22), [...] testemunhas oculares de um tempo que se vai diferenciando, ora pela inclusão de novos atores, ora pela mudança de enfoque das práticas, ora pela escassez de recursos e pessoas. Tempo esse, dimensionado tanto em minutos de controle de prática, quanto a partir da imediaticidade de resposta, urgência de ações contrapostas ao número crescente de processos e de decrescente de pessoas, que se acotovelam na burocracia institucional. Tal análise se adéqua a realidade do núcleo Psicossocial do Fórum de Ji- Paraná, um cenário todo peculiar onde os sujeitos, vistos sob o ponto de vista foucaultiano, vivem num mundo onde já foram ou estão sendo submergidos pelo discurso. As práticas discursivas não são pura e simplesmente modos de fabricação de discursos. Ganham corpo em conjuntos técnicos, em instituições, em esquemas de comportamento, em tipos de transmissão e de difusão, em formas pedagógicas, que ao mesmo tempo as impõem e as mantêm (FOUCAULT, 1997, p. 12). A corroboração das idéias expostas acima foi evidenciada a cada dia durante o processo de estágio de observação e intervenção no fórum, mais especificamente no Núcleo Psicossocial, quando as pessoas demonstravam grande dificuldade em entender todo o discurso jurídico dos processos relativos às mais variadas situações de suas vidas, como, por exemplo, ações de guarda, adoção, violências, entre outras. Quase sempre, analfabetas diante do discurso jurídico e de seu corpus de
  • 26. 25 verdades precisaram de alguém que as introduzisse neste mundo todo próprio e particular, para não dizer, exclusivo e excludente. Tanto no mundo científico como na vida cotidiana, os conceitos têm a importante função de nos ajudar a compreender, analisar e conhecer os fenômenos que vemos ou experimentamos em nossa relação com o mundo. Eles funcionam como ferramentas, usadas para compor nossa percepção da realidade. Quanto melhor elaborados forem os conceitos, melhores serão nossas possibilidades de operar sobre a realidade, isto é, de construir reflexões bem fundamentadas sobre o mundo em nossa volta e sobre nós mesmos no mundo bem como de nossos projetos, maiores ou menores. O fio condutor que perpassou toda a análise das falas das assistentes sociais e psicólogas foi a análise de conteúdo baseada na proposta teórica de Laurence Bardin. 1.1. Os percursos metodológicos Em linhas gerais no exercício desta pesquisa optamos pelo enfoque qualitativo diante da necessidade de dar voz aos sujeitos e na intenção maior de deixar que se expressassem com maior liberdade. [...] suas opiniões e os significados que atribuem aos acontecimentos relativos ao cotidiano profissional, e trazerem suas experiências, sem as limitações impostas por um questionário estruturado apenas em questões fechadas. Ressalta-se que a realização da prática profissional, na perspectiva interdisciplinar, que compõe o objeto deste estudo, permite constatar a importância das informações qualitativas, pois reforça que o saber, em si, não é posse individual de cada profissão, é pleno, é necessário, quando se pretende produzir práticas sociais que tenham a dimensão do coletivo (FÁVERO, 2008, p. 62). No trabalho coletivo os sujeitos vão se constituindo como pessoas e como profissionais nas relações entre o pequeno grupo e a dinâmica da organização á qual fazem parte. A direção social encaminhada diante dos desafios profissionais nas respostas aos sujeitos da ação deste trabalho é condicionada pela visão de mundo, pelos valores, hábitos e crenças, mas também pelos fundamentos teóricos e princípios éticos que dão arcabouço ao agir profissional. Não se pode prescindir destes elementos quando se pensa em pesquisa num enfoque qualitativo.
  • 27. 26 Como método de procedimento, adotamos o estudo de caso haja vista que o mesmo contribui para a compreensão das relações sociais e politicas da situação pesquisada. Dentro deste viés é muito comum esse tipo de estratégia para pesquisadores das áreas da sociologia, psicologia e do serviço social pois fica evidente que a grande importancia do estudo de caso é o desejo de entender melhor os fenômenos sociais e sua complexidade. Ressaltamos que o estudo de caso diferente de outras pesquisas, desafia muito mais o pesquisador, pois estrategicamente falando, exige uma interação contínua junto ao objeto pesquisado, com intuito de obter resultados satisfatórios em relação ao caso. [...] Em todas as situações, a clara necessidade pelos estudos de caso surge do desejo de se compreender fenômenos sociais complexos. Em resumo, o estudo de caso permite uma investigação para se preservar as características holísticas e significativas dos acontecimentos da vida real – tais como ciclos de vida individuais, processos organizacionais e administrativos, mudanças ocorridas em regiões urbanas, relações internacionais e maturação de setores econômicos (YIN, 2005, p.20). Consideramos também que o estudo de caso permite captar e aprofundar dados coletados de maneira precisa à investigação, além de levar em conta a objetividade do caso considerando todas as informações coletadas. Além disso, este permite uma compreensão do contexto de cada sujeito entrevistado, levando em conta todos os fatores inerentes a tal. Diante do que foi acima exposto, acredita-se que o estudo de caso deverá ser aplicado onde a intenção primeira seja a de descrever e caracterizar situações vivenciadas pelas profissionais que compõem o Núcleo Psicossocial do Fórum. 1.2. Coletando os dados Para que se concretizasse esta pesquisa foram utilizadas as seguintes técnicas: a observação participante e entrevistas semi-dirigidas. A observação como procedimento de coleta de dados ou informações constitui-se num instrumento valioso. Não é possível utilizar qualquer tipo de observação. Optamos então nesta
  • 28. 27 pesquisa pela observação participante para que fosse coerente com o todo do trabalho e o tipo de abordagem que estávamos adotando. O observador está em relação face a face com os observados, e participando com eles em seu ambiente natural de vida coleta dados. Logo, o observador é parte do contexto, sendo observado, no qual ele ao mesmo tempo modifica e é modificado por este contexto. O papel do observador pode ser tanto formal como informal, encoberto ou revelado, o observador pode dispensar muito ou pouco tempo na situação da pesquisa. (SCHWARTZ, apud HAGUETTE, 1987, p.62). Tivemos certo cuidado ao adotar a observação participante: a consciência de que nossas observações poderiam ser influenciadas pela própria realidade observada, pela nossa formação pessoal e profissional nossas cosmovisões. A observação participante como a entrevista, [...] são, pois, técnicas de coleta de dados que trazem em si limitações sobre as quais o pesquisador deve estar atento a fim de evitá-las quando for possível e de aceita-las quando inevitáveis embora conscientes das distorções que podem provocar (HAGUETTE, 1987, p. 78). Os dados observados foram descritos num diário de campo, instrumento que permitiu o detalhamento das observações, como se fossem “fotografias instantâneas” da realidade que estava sendo observada. Tornou-se um relato minucioso daquilo observamos, ouvimos e percebemos. O diário são folhas de trás dos cadernos de anotações de pesquisas, viagens e reuniões. São folhas de uma fala oculta. Escritos carregados de afeição. Tudo isso pra dizer que os escritos do Diário descrevem maneiras de sentir pessoas, lugares, situações e objetos. Aqui, livre do rigor da teoria, não preciso explicar o que compreendo, mas compreender o que sinto. (BRANDÃO, 1982, p.12-13). Tínhamos a clareza de que, longe de ser neutro, eram anotações feitas a partir dos nossos pontos de vista. Como um recorte e que a realidade continuava sendo sempre maior do que os dados anotados. Utilizamos a entrevista semi-estruturada, que segundo Negrine (1991, p. 74- 75), ocorre quando [...] o instrumento de coleta está pensado para obter informações de questões concretas, previamente definidas pelo pesquisador, e, ao mesmo tempo, permite que realize explorações não-previstas, oferecendo-lhe
  • 29. 28 liberdade ao entrevistado para dissertar sobre o tema ou abordar aspectos que sejam relevantes sobre o que se pensa. [...] Quando fazemos uso de entrevista ‘semi-estruturada’, por um lado, visamos garantir um determinado rol de informações importantes ao estudo e, por outro, para dar maior flexibilidade à entrevista, proporcionando mais liberdade para o entrevistado aportar aspectos que, segundo sua ótica, seja relevante em se tratando de determinada temática. Através destes instrumentos foi possível captar muitas falas, e mensagens das assistentes sociais e psicólogas no seu trabalho cotidiano no Núcleo Psicossocial do Fórum, pois como fala Bardin (2009:16) “[...] por detrás do discurso aparente geralmente simbólico e polissêmico esconde-se um sentido que convém desvendar”. 1.3. Como se analisou os dados Como analisar, entender a profusão de falas, comentários e pequenos discursos, grandes, suspiros de cansaço ou aborrecimento, quando da chegada, por exemplo, de mais um processo no núcleo psicossocial? Como entender as críticas e lamentos das assistentes sociais e psicólogas? Qual método mais apropriado de análise em uma situação como esta? Esses questionamentos nos fizeram coçar a cabeça muitas vezes: como analisar o material verbal colhido, pois “[...] fazer falar, debater, registrar fielmente o que é dito transcrevê-lo em centenas de páginas... e depois? Como proceder para analisar, e depois teorizar, a partir de um material abundante (BARDIN, 2009, p.8)”. Durante o percurso do Estágio Supervisionado em Serviço Social I e II sempre nos chamou atenção à questão da fala, dos pequenos ou grandes discursos das assistentes sociais e psicólogas e saber o que estava por detrás delas e como se configuravam na realidade maior do sistema judiciário, mais especificamente no Fórum. Gostamos muito de registrar falas as falas das pessoas porque acreditamos que elas são altamente reveladoras das situações e contexto em que estão vivendo e onde se inserem. Nessa perspectiva, vislumbrou-se a intenção de focar o
  • 30. 29 conteúdo da palavra em seu aspecto individual e no ato da linguagem como ressalta Franco (2005, p. 20): A análise de conteúdo assenta-se nos pressupostos de uma concepção crítica e dinâmica da linguagem. Linguagem aqui entendida, como uma construção real de toda a sociedade e como expressão da existência humana que, em diferentes momentos históricos, elabora e desenvolve representações sociais no dinamismo interacional que se estabelece entre linguagem, pensamento e ação. Uma tarefa paciente de desocultação que pressupôs desconstrução da realidade para que fossem feitas as inferências. A partir desta perspectiva, a análise de conteúdo nos permitiu fazer novas deduções sobre o material do objeto da análise, fazendo como que escavações nas falas dos sujeitos e percebendo nelas, elementos da realidade onde estavam inseridos. Neste sentido, a análise de conteúdo permitiu-nos realizar inferências, deduções, sobre a fonte, a situação em que esta foi produzida o material que se constituiu em nosso objeto da análise, haja vista a finalidade precípua da análise é realizar inferências tendo como base uma lógica explicitada que tem uma consonância com o objeto a ser analisado. Afinal esta é: [...], la raison d’etre da análise de conteúdo. É ela que confere a esse procedimento relevância teórica, uma vez que implica pelo menos uma comparação, já que a informação puramente descritiva sobre o conteúdo é de pequeno valor. Produzir inferências em análise de conteúdo tem um significado bastante explícito e pressupõe a comparação dos dados obtidos mediante discursos e símbolos, com os pressupostos teóricos de diferentes concepções de mundo, de indivíduo e de sociedade. Situação concreta que se expressa a partir das condições da práxis de seus produtores e receptores acrescida do momento histórico e social da produção ou recepção (FRANCO, 2005, p. 25-29) (grifos do autor). O ponto de partida na análise de conteúdo é sempre a mensagem, verbal ou escrita, feita através de gestos ou manifestada silenciosamente, figurativa ou não, documental e carregada de significados e sentidos. Sentidos estes que devem ser considerados desde o modo de representação social que cada sujeito tem de si mesmo e a dinâmica como seus discursos são utilizados quando fala ou escreve e como lida com eles.
  • 31. 30 2. CONSIDERAÇÕES PRIMEIRAS SOBRE O CENÁRIO [...] Quero lembrar o risco da banalização da vida humana, (grifo da autora), que pode ser provocado pela rotina, pelo trato cotidiano de situações de segregação, de injustiça. O risco da perda da capacidade de paixão (grifo da autora), da indignação - motor necessário para uma ação comprometida – que pode levar o profissional a viver sua prática mecanicamente, procurando resultados, mas sem paixão. (BAPTISTA, 2001, p.118) “Está psicografando?” Uma assistente social do fórum pergunta-nos ao ver- nos anotando avidamente e discretamente as coisas que vão acontecendo aos borbotões no Núcleo Psicossocial. Talvez ela tivesse mesmo com razão em sua percepção: estávamos mesmo psicografando, pois não queríamos perder nada daqueles momentos, nem sua intensidade, nem suas incoerências nem suas luminosidades. Não queríamos perder nada das particularidades daquele espaço. Nossas mãos obedeciam ao comando de nossas percepções que em função de sua magnitude, não se pode registrar tudo, embora a minha mente quisesse. Éramos nós quem fotografávamos e registrávamos aqueles momentos que até a inserção no campo de estágio, não tínhamos a noção da profundidade dos fenômenos que adentravam cotidianamente naquele universo. Estávamos todo- cabeça, mente e espírito – envolvidos naquela situação, absorto e nesse momento nos faz lembrar Lispector (1973, p.40), quando tentava se autodefinir dizendo: "Eu sou à esquerda de quem entra. E estremece em mim o mundo. [...] Sou caleidoscópica: fascinam-me as minhas mutações faiscantes que aqui caleidoscopicamente registro. Sou um coração batendo no mundo." Coração batendo no mundo significava para nós desvendar o contexto e perceber seus interstícios. Nesse sentido, foi necessário aprender a gostar de registrar o nosso link com a etnografia foi prazeroso haja vista que gostar de observar nos auxilio neste caminho que de imediato apareceu sinuoso. Portanto, como dizia Gertz (1989, p. 7) ao referir-se a prática etnográfica e que me serviu de base na hora de anotar, olhar, observar:
  • 32. 31 [...] a etnografia é uma descrição densa. O que o etnógrafo enfrenta, de fato [...] é uma multiplicidade de estruturas conceituais complexas, muitas delas sobrepostas ou amarradas umas às outras, que são simultaneamente estranhas, irregulares e inexplícitas, e que ele tem que, de alguma forma, primeiro apreender e depois apresentar.[...] Fazer a etnografia é como tentar ler (no sentido de ‘ construir uma leitura de’) um manuscrito estranho, desbotado, cheio de eclipses, incoerências, emendas suspeitas e comentários tendenciosos, escrito não com os sinais convencionais do som, mas com exemplos transitórios de comportamentos modelados. Em função da densidade que envolvia os atores sociais que partilhavam de determinados momentos do cenário, exigia-nos a sensibilidade para “fotografar” o momento que aguardávamos durante todo o período da graduação: o estágio e mais precisamente no Fórum. Porque neste espaço institucional? Já que tínhamos uma experiência na área educacional, principalmente no trato de determinadas expressões da Questão Social quais sejam: violência contra a criança e o adolescente, abandono, evasão escolar, delinqüência juvenil. Todavia, o Fórum nos permitiu perceber as relações nem sempre harmoniosas entre essas expressões e os transmites legais na condução dos processos. Mas neste espaço os atores sociais iam a busca de um amparo legal para as situações que vivenciavam. Nada mais salutar nesse momento que resgatar o pensamento kierkegaardiano acerca do drama humano: "Se o homem fosse um animal ou um anjo, não sentiria angústia. Mas, sendo uma síntese, angustia-se. E tanto mais sente a angústia, quanto mais humano for". Era esta a nossa sensação e nosso objetivo maior: fazer a experiência de acompanhar e vivenciar o trabalho das profissionais que fazem parte do Núcleo Psicossocial e suas relações com os usuários dos serviços. Essa relação aprioristicamente parece simples, destarte ao enveredar por esses caminhos aflora de imediato, discursos antagônicos, ou seja, de um lado as assistentes sociais e psicólogas com todo discurso formal oriundo dos anos de aprendizado na academia e de outro, o discurso do usuário que carregado de seus saberes que, de uma forma ou de outra os utilizaram para viver. Mais que em virtude das complexidades sociais, econômicas e políticas que vivenciam buscavam um amparo legal para solucionar os problemas. Mas como colocar no papel todas as relações vivenciadas durante o período de estágio? Nesse momento é como assistir um filme no qual a primeira cena refere-
  • 33. 32 se a nossa inserção na instituição, o sentar no banco da entrada principal do Fórum, (era o dia 30 de julho de 2010) nos deixava apreensivos, o que estávamos fazendo naquele cenário? Será que conseguiríamos visualizar as dimensões que envolvia principalmente o trabalho da assistente social? Todos esses questionamentos que povoaram a nossas gerava uma expectativa, haja vista que o momento do estágio é o coroamento do processo de formação do assistente social. Mesmo com toda a bagagem teórica e a nossa experiência como orientador educacional aquele friozinho na barriga apareceu, pois a imagem do Fórum como um espaço sacrossanto, de autoridades inatingíveis ou investidas de um poder de decisão quase como que de vida e morte, prisão ou liberdade sobre os corpos e os discursos dos usuários que em função da subalternidade que o discurso hegemônico da Instituição adentra no imaginário social e que de uma forma subliminar se petrifica e se torna comum entre os usuários como se pode perceber no seguinte diálogo entre a assistente social e uma usuária: “eu chamo a senhora de doutora por causa do respeito e dos segredos de justiça”. A senhora é doutora né?” Ao que a assistente social respondeu: “Pode me chamar de Margarida, mesmo, Margarida”. A usuária retrucou e reafirmou o dicurso hegemônico: “Margarida, é... tá bom, mas a gente chama de doutora por respeito”. Esta situação nos remeteu tantas vezes ao trabalho cotidiano como orientador quando se percebe muitas vezes que também na escola a domesticação e disciplinarização dos corpos rola solto. Não sei se é arriscado dizer, mas Demo (2007, p. 23) tem razão quando afirma que Enquanto o mercado se inova louca e irresponsavelmente, a escola, que deveria estar à frente das mudanças, anda à passos de cágado, se é que anda. Pareceria até que não faz parte do futuro das sociedades, tanto assim que a tese de Foucault6 de que a escola tem como referência maior o disciplinamento dos corpos, não a aprendizagem, continua muito presente. Nada como a expressão foucaultiana para corroborar a domesticação dos corpos e dos discursos. 6 FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: história da violência nas prisões.Petrópolis:Vozes, 1977.
  • 34. 33 A racionalidade perpassava em todos os gestos e espaços, ou seja, no Fórum as pessoas falam baixo quase sussurrando nos corredores e pisam metricamente para não perturbar a santa ordem. Gritos verbalizados não existem, os que aparecem são logo contidos, no entanto os gritos abafados, reprimidos ecoam como uma gravura de Munch7, cuja figura humana não apresenta suas linhas reais, mas contorce-se sob o efeito de suas emoções. As linhas sinuosas do céu e da água, e a linha diagonal da ponte, conduzem o olhar do observador para a boca da figura que se abre num grito perturbador. Munch foi um artista determinado a criar ‘pessoas vivas, que respiram e sentem, sofrem e amam’. Servindo de metáfora para nosso cenário, diríamos que o silêncio imposto pelas estruturas do Judiciário não é suficiente para calar de forma categórica o usuário. Como em um espaço da fábrica estão “domesticados”, loucos para se libertar dos grilhões que os aprisionam, mas em função da busca da solução do problema vivenciado suportam o peso do espaço e do poder que este impõe e significa. Pois, todo o aparato legal e policial dá esta falsa sensação de harmonia e tranqüilidade. 2.1. A segunda cena do filme Chegamos ao fórum às 07h30min sendo atendido pelo segurança que estava sentado em uma mesinha perto da porta. Pude perceber que era de uma firma terceirizada, o que significa que não era funcionário do Estado. Gentilmente pediu que aguardássemos, pois a assistente social que haveria de nos acompanhar ainda não havia chegado. Fiquei por ali aguardando e ouvindo um acirrado diálogo entre o 7 O Grito é uma pintura do norueguês Edvard Munch, datada de 1893. A obra representa uma figura andrógina num momento de profunda angústia e desespero existencial. O pano de fundo é a doca de Oslofjord (em Oslo) ao pôr-do-Sol.
  • 35. 34 segurança e o recepcionista acerca da história de “Z” contada por pessoas que a desconhecem e da importância de se ouvir os pioneiros. Neste ínterim chega a assistente social supervisora de campo e convidou-me para ir até a sala do setor que é o Núcleo Psicossocial. Apresentou o local e falou-nos da alegria de aceitar- nos como estagiário e ficamos ali trocando figurinhas sobre nosso primeiro contato quando por ocasião de uma visita que ela fez na escola onde trabalhávamos dois anos atrás. Combinamos como seria a dinâmica do estágio tais como: dias da semana, atividades, visitas e etc. E “voilà”8, estavam estabelecidos o clima e o contrato pedagógico e relacional para que nos fornecesse elementos imprescindíveis à prática do estágio no espaço do Núcleo Psicossocial. Como viajantes exploradores poderiam enveredar por caminhos sinuosos, assim também o fizemos, mas fomos sabendo de que como em qualquer viagem, é condição primeira correr todos os riscos para descobrir nuances desses espaços desconhecidos. Como nos fala Bachelard (1990, p. 76) de forma tão evocativa: Nenhuma utilidade pode legitimar o risco imenso de partir sobre as ondas. Para enfrentar a navegação, é preciso que haja interesses poderosos. Ora, os verdadeiros interesses poderosos são os interesses quiméricos. São os interesses que sonhamos, e não os que calculamos. São os interesses fabulosos. O herói do mar é um herói da morte. O primeiro marujo é o primeiro homem vivo que foi tão corajoso como um morto. Tivemos o cuidado de relatar, neste preâmbulo, algumas impressões viscerais sobre a experiência de estágio no fórum que no caminhar foi paulatinamente se transformando no Trabalho de Conclusão do Curso. Um coroamento que foi sendo gestado desde as primeiras disciplinas que atrelado as experiências como orientador escolar de uma escola pública de bairro periférico de um município periférico que durante anos ficou carente de políticas públicas. Ao eleger como temática o trabalho das Assistentes Sociais e Psicólogas no Fórum, sob a perspectiva da interdisciplinaridade pressupôs, nos obrigou a rever os conceitos sobre Interdisciplinaridade, como esses saberes se articular 8 Expressão que vem do francês e significa “eis aí”.
  • 36. 35 cotidianamente ou não no espaço institucional? Como trabalhar a subjetividade presente nas falas das profissionais do núcleo? Como a formação continuada pode fazer a diferença no trato com o usuário? Responder esses questionamentos tornou- se um dever de sinceridade filosófica tanto para as profissionais como para os usuários. Na ânsia de atingir o objetivo proposto fomos literalmente obrigados a mudar as nossas concepções de analisar o trabalho do assistente social e tudo aquilo que configura esta profissão entendida como uma resultante necessária para o capital. Esta experiência será contada como um esquete teatral que tem um cenário e com atores em ação, gestos subentendidos que devem ser decifrados. Que o palco seja iluminado e abram-se as cortinas. Como relato de experiência sinaliza certamente o filme de um tempo o qual poderá se tornar um instrumento de leitura deste próprio tempo. Quantas pessoas passam por esta porta todos os dias? Quantos dramas, tramas, dores, vidas encontradas ou desencontradas perpassando o fazer das assistentes sociais e psicólogas que trabalham neste local e jamais deixando-as imunes destas marcas. Marcas percebidas durante a prática do estágio: desejo de dar mais atenção às pessoas, de ouvir mais, de buscar soluções mais rápidas para um caso como se percebe nesta fala de uma das assistentes sociais: “A dinâmica da sociedade ela é muito rápida e parece que o judiciário ele não acompanha, né? Você pega e faz um estudo e daqui uma semana está desatualizado, né? E assim, é essa a nossa angústia. Parece que as coisas levam um tempo mesmo para se processar e com isso se perde muita coisa né? E quando chega a tomada da decisão a realidade já mudou e as pessoas já não estão nem mais interessadas naquilo ali, perdeu o interesse por aquilo ali. Essa para nós é a maior frustração.” As profissionais demonstram ter consciência do descompasso entre as transformações rápidas por quais passam a vida dos usuários e a lentidão das mudanças no Judiciário. Tanto quanto, esta contradição as provoca e elas percebem e sentem isto. São sensíveis sim aos dramas dos sujeitos de sua ação. Talvez precisem problematizar mais as causas destes e planejar intervenções que possam responder com maior eficiência tais desafios.
  • 37. 36 3. QUANDO OS ATORES SURGEM EM CENA E FALAM Conhecer é, antes e acima de tudo, questionar, desconstruir.(DEMO, 2007, p.32). 3.1. O elenco No cenário do Núcleo Psicossocial do Fórum trabalham três assistentes sociais e duas psicólogas compondo assim o que chamamos de uma equipe interdisciplinar. Compreendemos uma equipe interdisciplinar como aquela que possui um grupo de profissionais com formação diversificada e que atuam de maneira interdependente, inter-relacionando-se num mesmo ambiente de trabalho, através de comunicações formais e informais. Severino (2007, p.19) falando da importância de uma postura interdisciplinar na intervenção social afirma que: Se o trabalho prático visando tornar as condições concretas da existência dos homens mais adequadas, de todos os pontos de vista, está fundamentado numa concepção articulada, construída mediante a contribuição de conhecimentos empíricos e teóricos, não se reduzindo a puro ativismo espontaneísta, então é obvio que esse trabalho tem de levar em conta a complementaridade de todos os elementos envolvidos. Toda ação social, atravessada pela análise científica e pela reflexão filosófica, é uma práxis e, portanto, integra as exigências de eficácia do agir tanto quanto aquelas de elucidação do pensar.
  • 38. 37 Sob o ponto de vista funcional, o Núcleo Psicossocial, etimologicamente significa uma equipe interdisciplinar, haja vista que trabalham neste espaço, psicólogas e assistentes sociais, cada uma com sua formação. Todavia, em função do reduzido número de profissionais para atender toda a demanda, além disso, a agilidade na condução dos processos contribui para que as mesmas não analisem os mesmos de forma conjunta. Sem contar com o espaço físico que por sinal é reduzido e que para amenizar esta situação, fizeram uma mudança radical na sala, deixando-a mais livre para o trânsito das mesmas e dos usuários e também para reunirem. No espaço coletivo não há disputa sobre ele. Cada profissional dispõe de uma mesa e um computador. No entanto, a impressora é de uso coletivo (Ver fotos 6 e 7). Todavia, o espaço de atendimento individualizado (Foto 06), é disputado gerando “pequenos reclames discretos” entre as profissionais refletindo diretamente no atendimento aos usuários. Se racionalidade do discurso perpassa em suas falas, essa mesma racionalidade se aplica ao uso do mesmo. Depois que foi feita a reengenharia do espaço, foi possível até de se fazer pequenos encontros de estudo ou reunião, como se percebe na foto 06 abaixo. Durante o período de estágio todas as profissionais do Núcleo colaboraram ativamente do processo. Ora prestando informações, ora conversando livremente sobre o dia a dia do Núcleo, ora desabafando. Todas se mostraram receptivas em alguns momentos em face da presença de um estranho/estagiário ficaram reticentes, pois a chegada de um estranho provoca um embotamento, nada como o dia-a-dia para que estas arestas sejam superadas. Todavia, no momento da entrevista formal, apenas duas assistentes sociais aceitaram participar. Uma das psicólogas estava de férias com a família em outro Estado e não foi localizada. Quanto às outras duas profissionais, uma assistente social e uma psicóloga, por demonstrarem resistência, não foram entrevistadas. A idade das assistentes sociais entrevistadas varia de 28 a 40 anos. Uma é casada e tem dois filhos. A outra assistente social tem uma filha e mora com os pais em “Azul”. A mais jovem fez sua graduação na Universidade Federal de... e a outra na Universidade Católica de... Quanto às falas que seguem abaixo, aquelas que estão em negrito foram anotadas nas observações contidas no diário de campo. As
  • 39. 38 demais são frutos da entrevista feita com as duas assistentes sociais que concordaram participar da pesquisa. Apresentadas as protagonistas deste enredo, suas falas ainda permanecem ecoando em nossa memória como documento vivo de um tempo e de um espaço. Tempo recheado de riquezas e contradições, espaço conflituoso, denso e que traz em suas estruturas uma relação de poder. Portanto, as suas palavras são testemunhos desse tempo. Nesse sentido, temos que concordar com Bachelard (1990, p. 35) ao afirmar que: Toda a expressão falada não é outra senão eco de uma sonoridade natural do ser, do seu ser. E sempre o ser, um ser, os seres são uma garantia da Palavra. O ser da Palavra é só uma forma do Ser. A Palavra é sempre um instrumento. Portanto, toda palavra é uma expressão de linguagem que traz embutida uma visão de mundo, de homem e de sociedade, de formação, por isso a Linguagem se constitui no principal instrumento de trabalho do Assistente Social. As falas das assistentes sociais e psicólogas que virão a seguir serão divididas por “quandos”, que marcaram determinadas situações mais abrangentes, digamos assim, de seu trabalho cotidiano. Vamos interferindo vez por outra com a fala de outros atores, para ratificá-las, corroborá-las e dizer que estão inseridas num contexto maior.
  • 40. 39 Tabela 01: Fala das assistentes sociais e Psicólogas a partir das entrevistas e observações contidas no Diário de Campo. UNIDADADES DE REGISTRO UNIDADES DE CONTEXTO CATEGORIAS “Ah, a visão social crítica né, da Federal do Espírito Santo, clara, declaradamente fundamentada pelo marxismo, assim como o projeto hegemônico do Serviço Social da grande maioria da categoria.” “Basicamente uma visão social crítica, com outro direcionamento. Hoje, no meu trabalho eu tenho também como referência concepções assim mais, digamos, que eu acho que hoje é chamado de pós-moderno que compõe a fenomenologia. É claro que a visão de classe continua, o entendimento de propriedade de que necessariamente , na propriedade capitalista a gente tem exploração e que esta exploração que gera toda as questões com as quais a gente trabalha, mas a forma, o entendimento continua sendo este, mas a forma para construir as estratégias de abordagens destas questões que tá menos fundamentada em questões de participação popular e lutas de classes é mais em questões é , de questões mesmo apresentadas e das condições que geraram estas questões e as possibilidades de enfrentamento que são trazidas pelas próprias propostas.” “Ah, Marilda Iamamoto, ficou bem marcante assim.” Marxismo, visão de classe e luta de classes Formação “Olha tem os livros, alguns livros que eu leio, que eu paro para ler e que de fato provocam algum movimento diferente. Eles são mais marcantes e que provocam movimentos. Tem um que eu li há pouco, mas este foi mais para esfriar as coisas, foi o “Cabeça de Porco” do Mv Bill. Mas eu li mais para aproximação de questões de envolvimento da juventude com a criminalidade. Mais o que foi mais marcante que eu li no ano passado foi o “Ponto de mutação” do Fritjof Capra e Leituras Formação
  • 41. 40 agora eu estou lendo Boaventura Souza Santos, o livro “Desenvolvimento sem crescimento” que em experiências alternativas de crescimento econômico e de desenvolvimento de comunidade. Este livro já tinha há muito tempo agora eu peguei para ler. Ele tá fundamentado na teoria social critica com experiências micro, de regiões que deram certo.” “As leituras que a gente faz dizem respeito às legislações né, o ECA, tem muitas: questões do novo Código Civil, que mais? Questões pertinentes às problemáticas que a gente trabalha né? Abuso sexual, mediação familiar, institucionalização de crianças, enfim, todos os temas que envolvem aquelas problemáticas.” “Eu acho que é agregar vários conhecimentos para o enfrentamento de uma única questão, que nunca uma área de conhecimento, um único olhar profissional vai dar todas as respostas possíveis, checar todas as respostas possíveis do enfrentamento de uma questão, que causou determinadas questões. O que eu acho que a interdisciplinaridade ela tem que passar muito por conjunção mesmo de construção conjunta de alternativas. Basicamente é isso. Atuar em conjunto e agregar também sim, e respeitar a especificidade, mas no sentido assim de que tem coisas que eu não vou ser capaz de visualizar e que o Pedagogo vai ver e que eu posso agregar isso ao meu fazer profissional, ao meu trabalho profissional. Eu posso agregar esse conhecimento e essa atitude também no meu trabalho, assim, não no sentido de fazer o que o Pedagogo faz, para isto eu preciso de muito mais tempo de formação. Nunca vou conseguir fazer e ter o mesmo olhar que o psicólogo tem mas eu posso agregar ao meu trabalho Trabalho Interdisciplinaridade
  • 42. 41 esses conhecimentos e eu acho que pode ser até sem a presença desses profissionais. Interdisciplinaridade tem que ser uma troca constante em que eu vou agregar ao meu trabalho outros elementos.” “Para mim é um trabalho assim em conjunto com profissionais de outras áreas, prá melhor abordar a problemática sobre vários aspectos, digamos. No núcleo a gente procura (risos) digamos, trabalhar essas questões se atendo mais a questões psicológicas e sociais.” “Olha, a gente costuma assim trocar mesmo as ideias, trocar as percepções, as observações dos casos quando a gente atende em conjunto, mas assim quando a leitura de relatório só mesmo quando a gente tem que fazer mesmo aquele relatório psicossocial. Mas o mais comum é a gente conversar sobre os casos.” “Não, não temos o espaço adequado. É uma necessidade assim que até a gente reconhece que precisa mesmo, mas pelas demandas, pelo volume mesmo de trabalho a gente não tem se permitido, mas a gente tem assim a intenção realmente de criar um espaço, criar um, preparar um tempo por conta que a gente sabe que é muito importante. Eu acredito digamos, dentre cinco pessoas, eu acredito que três de nós tem uma intenção maior de fazer isto.” “A gente teria que trocar mais as figurinhas, quem vai sair pergunta sobre os processos das outras.” “Não, instituído não! A gente faz isto aleatoriamente no cotidiano e em conversas no ambiente de trabalho para a gente discutir os casos que a gente tem. Mas de sentar para construir propostas de alternativas para o trabalho, isto não tem.” Cotidiano Trabalho
  • 43. 42 “Ixi é urgente. Que novela eles fizeram? Qual é a trilha sonora?” “E com o meu trabalho que eu vejo que eu posso trazer mais questões da vida mesmo cotidiana, da expressão de vida das pessoas que tudo isso que esses papéis estão dizendo é uma expressão da vida das pessoas, dos problemas mais complexos ainda, das questões mais problemáticas que as pessoas estão vivendo.” Cotidianidade Trabalho “Quanto a gente faz o atendimento em conjunto, um profissional elabora o relatório. Ou a assistente social ou a psicóloga. As vezes a gente atende sozinho e faz o relatório sozinho também.” Relatórios Instrumentais de trabalho “Por exemplo, quando se pede o relatório social e a gente acha que dá para propor uma alternativa sem a presença do psicólogo junto, a gente faz e manda o relatório. Às vezes nos pedem para fazer um relatório psicossocial e a gente tem que fazer junto com o psicólogo. E às vezes não nos pedem relatório psicossocial e a gente sente necessidade deste outro olhar, o do psicólogo.” “Olha, a gente costuma assim trocar mesmo as idéias , trocar as percepções, as observações dos casos quando a gente atende em conjunto, mas assim quando a leitura de relatório só mesmo quando a gente tem que fazer mesmo aquele relatório psicossocial. Mas o mais comum é a gente conversar sobre os casos.” Estudo de caso, Observação e relatório psicossocial Interdisciplinaridade Então eu acho que é possível com meu trabalho aqui se conseguir trazer essa humanização assim no trato dessas questões, na abordagem dessas questões, o que é muito ínfimo ainda. O que precisa é que a gente assumisse um movimento conjunto do núcleo para Visita domiciliar, Humanização, processos, informação legal e Trabalho
  • 44. 43 a gente conseguir, porque como a gente faz, apesar de a gente fazer todas as abordagens de aproximação como, por exemplo, uma visita domiciliar, um acompanhamento, que a gente faz mas isto tudo se transforma em papel depois. Fica registrado e todo esse contato, essa abordagem quando vira papel se transforma na informação legal dentro de um processo. A gente precisa fazer um movimento, fazer com que essas informações que estão impressas no que a gente escreve, elas tenham mais expressão dentro da vida das pessoas, daquilo que as pessoas estão vivendo e que vejam o que a gente escreve que vejam a vida das pessoas mesmo. acompanhamento “Então, é o que está registrado em lei. Eu acho que a gente, as profissionais do núcleo tem um espaço, não privilegiado, mas um espaço rico para ganhar esta posição de credibilidade mesmo. Mas o que vale , o que tem corpo como conhecimento válido, é o conhecimento legal. Dentro do fórum, dentro do tribunal de justiça, acho que em qualquer instituição de justiça, o que tá determinado em lei é o que vale. Eu acho que falta muito assim, o entendimento do que está posto na lei, meio que uma mediação entre o que é legislação e expressão de vida mesmo. As opções tem que vir baseadas no que está posto legalmente mas o que está posto legalmente é uma indicação, um princípio que o que pode ou não fugir daqueles princípios do instituído.” “Não, não me sinto controlada. Temos uma autonomia; relativa mas tem. Acho que na questão de escala mesmo hierárquica no próprio organograma tal, mas a gente tem autonomia sobre nossos fazeres e ações dentro do núcleo, tem sim.” Espaço institucional e informação legal e autonomia Instituição
  • 45. 44 “Olha eu acho o que a gente coloca tem muita relevância, tem um certo poder na decisão. E a maioria dos juízes respeita. O Ministério Público é que costuma questionar. O que a gente propõe aqui no fórum é aceito.” Poder e discurso Invisibilidade de controle “Quando eu cheguei eu achei assim o espaço do Núcleo e o entendimento do trabalho do núcleo muito inferior do que de fato pode ser. Do que de fato a gente pode fazer de resultado positivo mesmo em responder a processos, mesmo em simplesmente dar alternativas a processos visto que é o básico do que a gente faz. Eu acho que ainda o entendimento do que a gente faz é muito pequeno que a gente poderia ter muito mais espaço e em bem melhores condições para dar alternativas mais efetivas, resultados mais positivos.” “Estou no fórum desde 1999. Vai fazer 11 anos. Nós estamos ali na verdade para atuar naqueles processos né, onde o juiz entende que é necessário um esclarecimento sobre a questão da problemática e daí, nos atendemos os juízes das varas cíveis, eventualmente algum caso das varas criminais, daí a gente, é, o processo é encaminhado lá para o setor e daí a gente vai fazer um estudo social ou psicossocial a respeito do caso.” Processos e intervenção Trabalho
  • 46. 45 9 Estas falas aparecem negritadas porque foram anotadas durante as observações do período de Estágio e que estão em nosso diário de campo. “Não, não temos o espaço adequado. É uma necessidade assim que até a gente reconhece que precisa mesmo, mas pelas demandas, pelo volume mesmo de trabalho a gente não tem se permitido, mas a gente tem assim a intenção realmente de criar um espaço, criar um, preparar um tempo por conta que a gente sabe que é muito importante. Eu acredito digamos, dentre cinco pessoas, eu acredito que três de nós tem uma intenção maior de fazer isto.” “Ainda bem que eu não estou com meus relatórios atrasados. Aquele monte ali chegou ontem. Aquele monte ali é meu é da Fulana. Esse não é nosso não. Aqui tudo é urgente, urgentíssimo. Este processo aqui vai para a fila. Processos aqui chegam a toda hora”.9 “Esses processos que batem e voltam é que acabam com a gente. Não consigo me organizar. Não sei o que fazer”. “Vamos acabar o relatório para despachar?” “É das políticas de rede que não funcionam. Estou cansada emocionalmente. É frustrante, pois cobram da gente coisa que não podemos dar. Estou me questionando muito”. “Não estudamos nada hoje. Até que eu gostaria de estudar, mas tenho que despachar este processo. Nosso trabalho aqui é deixar mastigadinho, tudo triturado para eles. Triturar o pesado. O duro é se a gente pudesse (risos) mastigar e cuspir depois, tava bom né? (risos).” “Meu montinho já está grande Sobre trabalho e atitude projetiva Formação continuada e trabalho
  • 47. 46 novamente, oh Senhor da Glória.” “Ás vezes isto desestimula tanto. Me sinto amarrada com estes processos todos”. “Eu me vejo assim é, o meu papel ali assim é, fundamental mesmo para buscar a garantia dos direitos das pessoas que estão ali envolvidas naqueles processos. Eu vejo ali que eu estou na defesa mesmo desses direitos e que a gente tem que entender isso e fazer essa questão.” Código de ética e Garantia de Direitos Instituição “Claro, assim eu penso que em uma escola digamos, o papel não digo mais importante, mas significativo, mais atuante mesmo é o do juiz né, por conta das tomadas de decisões, mas assim nós também nos sentimos assim reconhecidas em nosso trabalho porque de fato eles estão sempre nos requisitando e considerando nossas opiniões e nossas sugestões. Então a gente, hoje eu não sei como seria o judiciário sem a presença do assistente social e do psicólogo. Reconhecida, assim, parece assim que se eles não pedirem um estudo, eles não se sentem seguros para tomar nenhuma decisão, porque é a gente que ta ali no dia a dia, né? Que pára para observar mesmo as situações. Então assim a maioria tem realmente embasada as decisões com base no que a gente percebe e sugere. Me vejo realmente reconhecida.” Valorização, realização e reconhecimento profissional Trabalho “Você sabe que o dia a dia, a dinâmica da sociedade ela é muito rápida e parece que assim, que o judiciário ele não acompanha, né? Você pega e faz um estudo e daqui uma semana está
  • 48. 47 desatualizado, né? E assim, é essa a nossa angústia. Parece que as coisas levam um tempo mesmo para se processar e com isso se perde muita coisa né? E quando chega a tomada da decisão a realidade já mudou e as pessoas já não estão nem mais interessadas naquilo ali, perdeu o interesse por aquilo ali. Essa para nós é a maior frustração.” “Você sabe como a justiça é lenta né?” Angústia e decepção Burocracia “Acho que a questão do abuso sexual, da adoção também, ainda mais eu a gente está procurando se adequar à nova lei de adoção. E cada problemática tem questões que assim, envolvem dificuldades, sei lá. Tem hora que eu me angustio parece assim que eu quero ver as coisas acontecerem a nível de concreto né? Eu sei que nós não somos executivas, nós não somos executoras. Então isso gera uma certa angústia assim. Para que assim, que cada um trabalha de um jeito e a rede não está interligada e ai as coisas não funcionam porque em algum lugar as coisas se estagnam, empacam mesmo, então essas coisas que dificultam, porque a gente sabe que é um processo, mas assim a engrenagem.” Angústia e decepção Redes sociais “Eu fico olhando estes relatórios e fico pensando: quantos destes meninos já estão no Agenor de Carvalho?” “É muito frustrante para o técnico porque se sugere tanta coisa que não é levado em conta”. “casos velhos, sem solução”. Angústia e decepção Intervenção, fazer profissional, visão de futuro e ausência de poder nas decisões “Esses processos que batem e voltam é que acabam com a gente. Não consigo me organizar. Não sei o Excesso de trabalho Trabalho
  • 49. 48 que fazer”. “A gente pode reservar uma tarde para estudos. Todos juntos, nós e as psicólogas. Assim a gente se anima mais, você participa?” Formação e trabalho Trabalho “Estou cansada, precisamos sentar juntas”. Troca de saberes Trabalho “Estamos vendo um trabalho que começamos no ano passado, temos que ver o que fazem as outras instituições em prol dos menores. Nós acabamos não conhecendo o que as outras fazem. Precisamos saber, mesmo que a gente sabe que não fazem muita coisa. A X. pode ajudar bastante, ela dialoga e troca.” Redes sociais, diálogo e trocas Trabalho “Aos olhos humanos não têm solução, só por Deus mesmo”.“Para a gente ser feliz é preciso honrar pai e mãe, é um pricípio bíblico. A senhora frequenta alguma igreja? Você está indo para alguma igreja? Ora pro seu pai, se você conhece Jesus, ora pro seu pai. Você já sabe o que é certo e o que é errado. Chama sua mãe também”. Perda da dimensão política Formação, naturalização das expressões da questão social “isso aqui é um atentado violento ao pudor, será que já está sendo atendido por alguma de nós?” Atendimento Trabalho “As pessoas ficam com raiva da gente”. Representação social Trabalho “A gente poderia fazer umas palestras, mas quando?” Processo de trabalho Intervenção “Demora tanto, que é por isto que as pessoas procuram a ilegalidade. Isto é tão desestimulador”. Legalidade Burocracia
  • 50. 49 3.2. A formação das assistentes sociais Consideramos que toda formação de profissionais em nível superior possui duas dimensões, a saber, aquela que se refere à formação inicial e que se dá nas mais variadas graduações. A outra, comumente chamada de formação permanente ou continuada podendo acontecer através de cursos, capacitações oferecidas pelas instituições onde o profissional está inserido ou formação em serviço que é a mais interessante e tem maior chance de estar em consonância com as diversas realidades do mundo do trabalho e suas contradições. Existem duas tendências hoje quando se fala em formação em serviço que são complementares: a primeira consiste em focalizar a atenção no potencial formador e transformador dos saberes adquiridos na experiência do cotidiano da “A gente faz uma colcha de retalhos e não senta para conversar. Porque ela tem que encaixar o atendimento dele ali”. Atendimento individual Interdisciplinaridade “Eu gosto tanto de fazer visita, entrar em contato direto com os usuários. Dá uma sensação de liberdade. Só não gosto de ficar lá olhando aqueles processos”. Visita, usuários e processos Socialização “tenho medo de ser taxativa. Ai o juiz vai falar: segundo a psicóloga tal. Ai sua palavra tem peso. É aquilo que você diz, parece uma masturbação... é a vida a pessoa. É muito preocupante um laudo nestes casos... é a vida da pessoa. Parece uma masturbação, a gente fica ali em cima e nao sabe para onde vai. E o que a gente faz com o abusador? Discurso, poder e direitos Instituição
  • 51. 50 prática profissional. Essa idéia fica ainda mais assumida em Pimenta (1999:26) quando afirma: “O profissional não pode constituir seu saber-fazer, senão a partir de seu próprio fazer. Não é senão sobre essa base que o saber, enquanto elaboração teórica se constitui”. Outra forma de analisar a formação continuada se refere à tematização da prática defendida por Scarpa (1998) quando afirma a necessidade de tematizar a prática que é o exercício de fazer com que o profissional do Serviço Social, por exemplo, seja capaz de desentranhar as teorias que guiam seu fazer profissional real. Fazer recortes da realidade para transformá-los em objeto de reflexão e teorizar. Haja vista que o assistente social tem o dever de plasmar em suas ações, sua marca e digital nos espaços institucionais para validar os direitos dos usuários, como uma categoria imperativa que está ancorada nos princípios fundamentais do Código de Ética dos Assistentes Sociais aprovado em 15 de março de 1993 com alterações provocadas pelas resoluções do CFESS nº 290/94 e 293/94. O Código, documento norteador das ações dos assistentes sociais, afirma que estes devem primar pelo “compromisso com a qualidade dos serviços prestados à população e com o aprimoramento intelectual, na perspectiva da competência profissional”. Competência profissional esta que deve articular dialeticamente as dimensões ético-politica, teórico-metodológica e técnico-operativo, ou seja, a questão do poder↔saber↔fazer deve perpassar em seu fazer como elemento de reflexão constante. É a razão maior do ser dos assistentes sociais que vem de encontro à finalidade do seu fazer. Segundo Silva (2007, p.114), o profissional do Serviço Social deve retomar sua prática haja vista que nesse: [...] duplo processo de respostas a procuras que se lhe colocam institucionalmente, o profissional deve refletir sobre o tipo de serviço que é prestado por ele, isto é, a quem serve, como se determina o processo de entrada, quais os requisitos dos serviços que presta, com o intuito de no processo de ‘inclusão/exclusão’, valorizar o primeiro em relação ao segundo. Em tempos de tantos “encantos” e outros “desencantos”, o profissional do Serviço Social não pode se dar ao luxo de perder a dimensão investigativa do seu fazer, isto é a própria dimensão ontológica e teleológica que norteiam a sua prática. As profissionais do Fórum em suas falas manifestam que cumprem tarefas, fazem
  • 52. 51 coisas e em função da lentidão da justiça perdem o controle, não uma reflexão, um sentar, um parar para uma troca de saberes. Como conseqüência as leituras de realidades vão desde a linearidade até o fatalismo perdendo diríamos assim a dimensão profética não acepção mais profunda deste termo que lhe é tão cara e que foi conquistada através de uma luta árdua, histórica e processual. Qual sereia sedutora que seria capaz de emergir dos mares como em um encanto da desmitificar o seu fazer? Como nos mares, os perigos sempre rondam o fazer dos assistentes sociais, em tempos de capital fetiche da mercantilização dos direitos e das ausências de políticas públicas eficazes como se concretizar uma cidadania mais plena como preconizou Gramsci. Mas o que seria esta cidadania plena? Discutindo conceito de cidadania, Zambon (2006) afirma que: O conceito de cidadania encontra-se atualmente num jogo de disputa de interesses. Com isso, trabalhamos numa concepção de cidadania como soberania popular, ou seja, o conjunto de cidadãos tem uma participação ativa na formação do governo e no controle da vida social. Baseando-se em Gramsci, a realização da cidadania plena se dá principalmente na conquista de novos espaços na esfera pública. A correlação de forças entre a burguesia e a classe subalterna se dá principalmente na nova configuração do Estado; que, através de estratégias a classe trabalhadora possa conseguir a hegemonia neste espaço e realizar seu projeto de emancipação e construção de uma nova sociedade. Neste intróito, o profissional do Serviço Social é antes de tudo um educador social, eliminando toda a dimensão caritativa e tecnicista que outrora perpassava o seu fazer. Eliminando não no sentido de esquecimento, porque ela faz parte intrínseca da história da profissão. Eliminar no sentido de estar de vigília para que esta dimensão não venha ser retomada, haja vista que o novo sempre traz marcas do velho como assevera Marx. De qualquer forma, desde o surgimento da Questão Social a origem reside na contradição entre o capital e o trabalho, no entanto na era do capital fetiche tais contradições se aguçaram em função da reestruturação produtiva e o reordenamento do Estado na condução das políticas. […] las transformaciones que el Estado ha tenido, respeto a las políticas sociales, se observan por el cambio de una perspectiva universal/contractual de la cuestión social hacia una modalidad de precarización, focalización y descentralización de la actividad estatal; este trastrocamiento se ha dado paralelamente al crecimiento de la actividad social privada en su versión filantrópica y mercantil. Consideramos que este nuevo tratamiento de la cuestión social profundiza aún más el cuadro de desigualdades sociales, agravadas por la baja cobertura de los programas
  • 53. 52 sociales, la estratificación de beneficios, la falta de protección económica por los desempleados y la ausencia de un enfoque distributivo de las políticas sociales. Todos estos aspectos muestran que el estándar de la política social estatal se caracteriza por el predominio de programas asistenciales de carácter complementario y de emergencia, destinado apenas para los pobres. De este modo, los vectores de integración, vía relaciones salariales y protección social, se han debilitado, desplazándose hacia los “márgenes”. En este contexto, es imperiosa la necesidad de recrear la lucha por la instauración de la ciudadanía social; ésta va, por cierto, más allá de la instrumentación de las políticas sociales y al margen de las decisiones fundamentales del desarrollo económico. El desafío está justamente en la necesidad de pensar la política social, incorporada en la construcción de un proyecto de sociedad; asimismo en la resignificación de sus fines, considerándolas como la vía de desarrollo de los derechos sociales y la ciudadanía social. La ausencia objetiva de esta perspectiva y una visión instrumentalista (PAGAZA, 2009, p. 219). O receio da fordização na formação do profissional do Serviço Social, ou seja, do aprender-fazer retira muitas vezes a dimensão política e reflexiva do trabalho. Em tempos da mercantilização da formação profissional através dos cursos à distância podemos perceber esta dinâmica de formação para a Mcdonaldização – fast food. Este fenômeno Gentili (2002) chama de penetração dos princípios que regulam a lógica do financiamento dos fast foods em espaços cada vez mais amplos da vida social no capitalismo contemporâneo, cujo conjunto de estratégias estão dirigidas a transferir a educação, da esfera dos direitos sociais à esfera do mercado e que está ancorado no que denomina de trilha da excelência: qualidade, serviço, limpeza e preço. Esta formação inicial aligeirada que é feita em geral, nos cursos à distância - EAD-, que se distanciam da própria concepção de universidade, ou seja, o tripé ensino↔pesquisa↔extensão se volatiza no ar (BERMAN, 1986). Os efeitos perversos desta formação incidem no seu fazer, destituindo o caráter de classe (classe para si), retornando a velha concepção individualista (classe em si) que de forma indireta favorece ao modelo neoliberal. Tais fatos têm suscitado reflexões sobre os impactos dessa formação na relação com a validação dos direitos sociais pela categoria, segundo a oferta destes cursos: Ainda que reflita a expansão do mercado de trabalho especializado, poderá desdobrar-se na criação de um exército assistencial de reserva. Isto é, um recurso de qualificação do voluntariado no reforço do chamamento à solidariedade em um ambiente político que estimula a criminalização da questão social e das lutas dos trabalhadores e o caráter assistencial das políticas sociais, como já salientado. A massificação e a perda de qualidade da formação universitária estimulam o reforço de mecanismos ideológicos que facilitam a submissão dos profissionais às ‘normas do mercado’, redundando em um processo de despolitização da categoria, favorecido
  • 54. 53 pelo isolamento vivenciado no ensino à distância e na falta de experiências estudantis coletivas na vida universitária. (Grifos da autora) (IAMAMOTO, 2010, p.36-37). (grifos da autora) Almejamos que sejam os assistentes sociais, educadores sociais que sinalizem saídas para que a cidadania seja garantida a partir de projetos alternativos no qual os usuários sejam os verdadeiros protagonistas da história. Isto nos fez lembrar um encontro que partilhamos recentemente num grupo de Terceira Idade. Estávamos trabalhando com dinâmicas de grupo e qual não foi nossa surpresa, que lá pelas tantas os idosos, eles mesmos perguntaram se também podiam apresentar suas dinâmicas e suas brincadeiras. O perigo sempre está ai, ou seja, naquele que facilmente se incorre: fazer coisas para os outros, para as crianças, adolescentes, jovens, os pobres, mas sem a participação ativa destes, ou melhor, sem fazer com eles. Reproduzindo de forma ingênua o modelo fordista-taylorista, ou seja, aqueles que pensam, têm idéias e aqueles que laconicamente as executam, como se os mesmos não pudessem pensar? No Núcleo Psicossocial, duas assistentes sociais tiveram sua formação inicial em instituições públicas de ensino superior e apenas uma fez sua graduação em instituição particular. O ano de formação varia entre a década de 70, 90 e 2000. Das duas psicólogas, uma fez graduação na década de 1970 em uma universidade particular e a outra em 2000 em uma universidade pública. A idade varia entre 28 a 53 anos. Cada profissional que compõem o Núcleo psicossocial teve sua formação pautada por determinadas linhas teóricas e que de certa forma continuam marcando ainda sua dinâmica de intervenção profissional. E isto acontece em todas as profissões. Por exemplo, se tomarmos o caso da Orientação Educacional, nos anos 70 os orientadores tinham uma atuação profundamente disciplinadora, adaptadora. Seu fazer foi influenciado pelo contexto da época. Hoje atuam mais no sentido de ajudar o aluno a ser participativo e capaz de enxergar o mundo e suas complexidades, destarte tais mudanças tem relação com as transformações macrossociais. Todas las profesiones se constituyen y se desarrollan como parte de las relaciones sociales y que van construyendo su campo a partir del proceso de especialización de los saberes que responde a las necesidades que marca la sociedad capitalista. De este modo, van recreando su campo y su significado social, no como consecuencia directa y mecánica de dichas