O documento discute a obra "Sobre a Violência" de Hannah Arendt. Arendt analisa a relação entre poder, força e violência, delineando como cada um opera. Ela argumenta que a violência é um meio para alcançar fins, ao contrário do poder, que depende da união de um grupo. O documento também discute brevemente a obra "A Banalidade do Mal" e o conceito de necropolítica de Achille Mbembe.
Sobre a Violência - Hannah Arendt e a relação entre poder e violência
1. Filosofia
1
A matriz de obras proposta no PAS 3 é bastante diversa
e rica, porque possibilita intersecções entre as mais variadas
áreas de conhecimento, tendo como pano de fundo o discurso
lógico e fomentador das discussões pertinentes ao campo
da reflexão e da prática. A seguir, propomos algumas chaves
de compreensão dos textos, lembrando, porém, que a leitura
das obras e respectivas abordagens, considerando contextos
da experiência cotidiana, comporão, de modo rico e fértil, a
melhor adequação das obras sugeridas na matriz. Nosso texto
é, na verdade, um convite à reflexão e uma provocação.
Sobre a Violência. Hannah Arendt
Hannah Arendt, filósofa e cientista política nascida na
Alemanha do século XX, tem, em sua história de vida, a história
do povo semita. Desde muito cedo, demonstrou grande
capacidade de erudição e bastante afinidade com a Filosofia,
entre os campos da narrativa filosófica. Mobilizada pela
ascensão do Nazismo, buscara exílio em países europeus, mas
foi nos Estados Unidos que, em 1951, se naturalizou americana
e fixou residência.Teve vasta produção intelectual, flertou com
temas como política, direitos humanos, reflexões sobre o mal
e sua ação banal e, ainda, distinguiu os conceitos de vigor,
de força, de violência e de poder, entre outros, em sua obra.
O fato de ela ter se tornado apátrida tocou profundamente
suas composições; além disso, compreendeu que a cidadania
consistia no direito a ter direitos, e essa reflexão permeou
grande parte de sua obra.
Sobre a Violência – 1969 (partes 2 e 3)
A discussão proposta na obra“Sobre aViolência”traz à cena
o grande interesse da autora em relação às questões políticas.
A cidadania, para ela, é o “direito a ter direitos” e, nesse
campo, a produção de Hannah é notada de modo vistoso na
obra referida. Essa obra, que discute a relação entre poder
e violência, está no campo em que Hannah atua de modo
bastante confortável: a Política.
A autora discute a violência como fenômeno notado
na sociedade e como instrumento que pode fazer chegar
ao poder, embora a autora trate de modos muito distintos
ambos os conceitos. O contexto da obra, publicada em 1969,
é a efervescência de movimentos estudantis nos EUA, bem
como todos os desdobramentos da Guerra Fria. Hannah
tece abordagens acerca da leitura de alguns autores a fim de
alcançar as noções de poder e de violência.
Urge ressaltar que a obra discute com propriedade a
relação percebida entre poder, força e violência, delineando
com cuidado os campos de atuações de cada enunciado.
A obra foi provocada pelos acontecimentos e debates no
contexto do século XX, século de grandes guerras e regimes
totalitários: o pano de fundo é a Guerra Fria e as disputas entre
as superpotências pela corrida aos armamentos. Considere
que a autora lembra que, embora tenha havido tantas disputas,
houve um avanço técnico dos instrumentos da violência, e
esta foi usada como recurso político. Ademais, vale considerar
que a violência, nesse caso, está sendo tratada como um
instrumento que faz alcançar certo status.
Segundo Hannah, “o poder nunca é propriedade de
um indivíduo; pertence a um grupo e existe somente
enquanto o grupo se conserva unido”. Nesse contexto, o
poder é uma condição de conquista e de pertencimento a
um certo grupo, e há coesão entre os membros pertencentes.
Assim, a autora entende que, onde há poder, a violência não
perdura. Pode--se notar que existe, nessa relação, um fator
que remete ao pensamento de Michel Foucault no que toca
a ideia de biopoder: “aquele domínio da vida sobre o qual o
poder estabeleceu o controle”. Dessa feita, para a autora, o
poder é a capacidade humana, não só de agir, como de agir
em consonância; “O poder nunca é propriedade de um
indivíduo; pertence a um grupo e só continua enquanto o
grupo mantém a sua união” (p. 49). Ao passo que a violência
“é, por natureza, instrumental; como todos os meios, requer
sempre orientação e justificação através do fim que visa”
(p. 55- 56); a violência tem seu caráter instrumental: é racional
na medida em que é eficaz como instrumento para alcançar
o fim que deve justificá-la (razão instrumental, segundo os
frankfurtianos) – é recurso para manutenção de um status. A
autora atesta: onde há poder, a violência não perdura.
Um aceno sobre A Banalidade do Mal:
“Toda dor pode ser suportada se sobre ela puder
ser contada uma história”– ARENDT, Hannah.
Aorefletirsobreomalesuabanalidade,aoassistireescrever
sobre o julgamento de Otto Adolf Eichmann, oficial nazista,
reflete sobre suas ações e motivações no texto “Eichmann em
Jerusalém”. A narrativa constrói-se na reflexão sobre o mal,
seu alcance e sua banalidade, afirmando que, ao ver o oficial
nazista, não enxerga um monstro, mas um burocrata, apenas
um homem que cumpre suas tarefas. Ou seja: mesmo que
o Nazismo tenha sido um regime terrível, aquele oficial se
Obras de Referência PAS/UnB - Filosofia 3º série
2. 2
imbuíra das premissas do regime, mas jamais refletira sobre
sua ação, desvinculando-se e isentando-se de julgamentos
morais. Em outras palavras, o problema do mal é a isenção da
capacidade de julgamentos morais, não havendo convicção
sobre a sua ação.
Nesse sentido, o mal banal é o mal irrefletido, cotidiano e
que segue apenas um fluxo de ações. Para a autora, porque o
mal é banal, somente o bem é radical, já que ele interrompe
a cadeia do mal e, para fazê-lo, há reflexão e decisão. Em si, o
pensar sobre as ações, de acordo com Hannah, é a capacidade
de filosofar e decidir sobre tais ações! O mal radical não é
assim chamado por ser intenso, mas por estar enraizado em
quem o pratica: é aquele que, além de estar preso na pessoa,
fundamenta-se no ódio, na tentativa do aniquilamento do
outro.Paraoquepraticaomalbanal,aaçãonãosefundamenta
em si mesma.
Necropolítica. Achille Mbembe
Achille Mbembe é um filósofo camaronês bastante atual
e solicitado no campo da reflexão política. O autor traz, ao
centro da atualidade, um debate importante que trata da
Necropolítica; importante considerar que é um autor que
problematiza a questão de adoção de uma política que usa a
morte como um recurso de administração do Estado. Mbembe
dialoga com autores como Foucault, Hegel, Bataille, entre
outros, mas vamos aqui nos apropriar de Foucault a fim de
compreender a ideia de Necropolítica.
No campo da compreensão do poder e suas relações,
Foucault (1926 – 1984) reflete sobre o exercício do poder na
sociedade; compreende a condição institucional do poder
(aplicado pelas instituições nas quais o poder não está
mascarado), bem como na condição microfísica do poder. As
relações de poder acontecem a todo o tempo, em todos os
campos de atuação da sociedade e do indivíduo; não é algo
que se detenha de modo estático. Importante ressaltar que o
poder está sendo visto como a capacidade de gerar disciplina
e controle sobre as vidas individuais; assim, trata-se de uma
condição de controle dos corpos por meio de mecanismos
sutis para controle e docilização dos corpos. A respeito do
biopoder Foucault diz o seguinte:
“[...] essa série de fenômenos que me parece
bastante importante, a saber, o conjunto dos
mecanismos pelos quais aquilo que, na espécie
humana, constitui suas características biológicas
fundamentais vai poder entrar numa política, numa
estratégia política, numa estratégia geral de poder.
Em outras palavras, como a sociedade, as sociedades
ocidentais modernas, a partir do século XVIII, voltaram
a levar em conta o fato biológico fundamental de que
o ser humano constitui uma espécie humana. É em
linhas gerais o que chamo, o que chamei, para lhe dar
um nome, de biopoder.
FOUCAULT. História da Loucura. 2008.
Nesse caso, a perspectiva do fenômeno individual
de adestramento do sujeito vai ser ampliada, e agora
serão levados em conta os fenômenos coletivos. Com
isso nasce a preocupação com a saúde e o bem-
estar da população. E, para que esses fatores sejam
preservados,seráiniciadaumapolíticadepoliciamento
para evitar tudo aquilo que possa ameaçar a vida da
população. Vários procedimentos serão tomados
para que se alcance o objetivo de preservar a vida da
população, como por exemplo, [...] uma medicina que
vai ter, agora, a função maior de higiene pública, com
organismos de coordenação dos tratamentos médicos,
de centralização da informação, de normalização do
saber, [...] de campanha de aprendizado da higiene e
da medicalização da população.
FOUCAULT, 1999. Em defesa da sociedade, 1999.
Consideremos que, em Foucault, o biopoder é exatamente
o domínio da vida sobre o qual o poder estabeleceu o controle
e defende a vida e a manutenção desta.
Mbembe parte, entre tantos conceitos, da ideia do biopoder
de Foucault para a necropolítica. A reflexão do autor camaronês
versa em torno da análise sobre o modo como é decidido o
poder da vida e da morte, aplicado pelo Estado, que é soberano.
OEstadosurgecomoummodelodeinstituiçãoque,idealmente,
é dotado de razão e tem como função a garantia da vida e da
proteção dos indivíduos. Porém, segundo Mbembe, a ideia de
decisão trazida pelos governos acabou por criar mecanismos
legítimos que possibilitam a morte de populações, e, ainda,
as mortes são vistas como uma parte natural de um processo
político, seja por meio do investimento em armas, seja como
extermínio de grupos sociais específicos.
Para o autor, por trás da necropolítica, há uma lógica de
exclusão e de racismo, que permite que certos grupos estejam
“aptos”à morte, ou seja, cria-se um estado de exceção em que
determinados grupos estão alheios à proteção do Estado, que
teoricamente deveria protegê-los. Vale ressaltar que a lógica
necropolítica não trata apenas de mecanismos para a morte
propriamente dita, mas também de considerar que há grupos
que estão desprovidos da proteção do Estado constituído.
“Este ensaio pressupõe que a expressão máxima
da soberania reside, em grande medida, no poder e
na capacidade de ditar quem pode viver e quem deve
morrer. Por isso, matar ou deixar viver constituem os
limites da soberania, seus atributos fundamentais.
Exercitar a soberania é exercer controle sobre a
mortalidade e definir a vida como a implantação e
manifestação de poder.
Alguém poderia resumir nos termos acima o que
Michel Foucault entende por biopoder: aquele domínio
da vida sobre o qual o poder tomou o controle. Mas sob
quais condições práticas se exerce o direito de matar,
deixar viver ou expor à morte? Quem é o sujeito dessa
lei? O que a implementação de tal direito nos diz sobre
a pessoa que é, portanto, condenada à morte e sobre
a relação antagônica que coloca essa pessoa contra
seu (sua) assassino (a)? Essa noção de biopoder é
suficiente para contabilizar as formas contemporâneas
em que o político, por meio da guerra, da resistência
ou da luta contra o terror, faz do assassinato do inimigo
seu objetivo primeiro e absoluto? A guerra, afinal, é
tanto um meio de alcançar a soberania quanto uma
forma de exercer o direito de matar. Se consideramos a
política uma forma de guerra, devemos perguntar: que
3. Filosofia
3
lugar é dado à vida, à morte e ao corpo humano (em
especial o corpo ferido ou morto)? Como eles estão
inscritos na ordem de poder?
MBEMBE, Achille. Necropolítica. 2018. pp. 5-7.
[...] Neste ensaio, argumentei que as formas
contemporâneas que subjugam a vida ao poder da
morte (necropolítica) reconfiguram profundamente
as relações entre resistência, sacrifício e terror.
Demonstrei que a noção de biopoder é insuficiente
para explicar as formas contemporâneas de
subjugação da vida ao poder da morte. Além disso,
propus a noção de necropolítica e necropoder
para explicar as várias maneiras pelas quais, em
nosso mundo contemporâneo, armas de fogo são
implantadas no interesse da destruição máxima de
pessoas e da criação de “mundos de morte”, formas
novas e únicas da existência social, nas quais vastas
populações são submetidas a condições de vida que
lhes conferem o status de “mortos-vivos”. O ensaio
também esboçou algumas das topografias reprimidas
de crueldade (fazenda e colônia, em particular) e
sugeriu que, sob o necropoder, as fronteiras entre
resistência e suicídio, sacrifício e redenção, martírio e
liberdade desaparecem. (Idem, p. 71)
Constituição Federal de 1988 - Artigo 14:
Direitos Políticos
Título II
Dos Direitos e Garantias Fundamentais
Capítulo IV
Dos Direitos Políticos
Título II
Dos Direitos e Garantias Fundamentais
Capítulo IV
Dos Direitos Políticos
Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio
universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para
todos, e, nos termos da lei, mediante:
I - plebiscito;
II - referendo;
III - iniciativa popular.
§ 1º O alistamento eleitoral e o voto são:
I - obrigatórios para os maiores de dezoito anos;
II - facultativos para:
a) os analfabetos;
b) os maiores de setenta anos;
c) os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos.
§ 2º Não podem alistar-se como eleitores os estrangeiros e,
durante o período do serviço militar obrigatório, os conscritos.
§ 3º São condições de elegibilidade, na forma da lei:
I - a nacionalidade brasileira;
II - o pleno exercício dos direitos políticos;
III - o alistamento eleitoral;
IV - o domicílio eleitoral na circunscrição;
V - a filiação partidária;
VI - a idade mínima de:
a) trinta e cinco anos para Presidente e Vice-Presidente da
República e Senador;
b) trinta anos para Governador e Vice-Governador de
Estado e do Distrito Federal;
c) vinte e um anos para Deputado Federal, Deputado
Estadual ou Distrital, Prefeito, Vice-Prefeito e juiz de paz;
d) dezoito anos para Vereador.
§ 4º. São inelegíveis os inalistáveis e os analfabetos.
§ 5º. OPresidentedaRepública,osGovernadoresdeEstado
e do Distrito Federal, os Prefeitos e quem os houver sucedido
ou substituído no curso dos mandatos poderão ser reeleitos
para um único período subsequente.
§ 6º. Para concorrerem a outros cargos, o Presidente da
República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal
e os Prefeitos devem renunciar aos respectivos mandatos até
seis meses antes do pleito.
§ 7º. São inelegíveis, no território de jurisdição do titular,
o cônjuge e os parentes consanguíneos ou afins, até o
segundo grau ou por adoção, do Presidente da República, de
Governador de Estado ou Território, do Distrito Federal, de
Prefeito ou de quem os haja substituído dentro dos seis meses
anteriores ao pleito, salvo se já titular de mandato eletivo e
candidato à reeleição.
§ 8º. O militar alistável é elegível, atendidas as seguintes
condições:
I - se contar menos de dez anos de serviço, deverá afastar-
se da atividade;
II - se contar mais de dez anos de serviço, será agregado
pela autoridade superior e, se eleito, passará automaticamente,
no ato da diplomação, para a inatividade.
§ 9º. Lei complementar estabelecerá outros casos de
inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger
a probidade administrativa, a moralidade para o exercício
do mandato, considerada a vida pregressa do candidato, e a
normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do
poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou
emprego na administração direta ou indireta.
§ 10. O mandato eletivo poderá ser impugnado ante
a Justiça Eleitoral no prazo de quinze dias contados da
diplomação, instruída a ação com provas de abuso do poder
econômico, corrupção ou fraude.
§ 11. A ação de impugnação de mandato tramitará em
segredo de justiça, respondendo o autor, na forma da lei, se
temerária ou de manifesta má-fé.
Art. 15. É vedada a cassação de direitos políticos, cuja
perda ou suspensão só se dará nos casos de:
I - cancelamento da naturalização por sentença transitada
em julgado;
II - incapacidade civil absoluta;
III - condenação criminal transitada em julgado, enquanto
durarem seus efeitos;
IV - recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou
prestação alternativa, nos termos do art. 5º, VIII;
V - improbidade administrativa, nos termos do art. 37, § 4º.
Art. 16. A lei que alterar o processo eleitoral entrará em
vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição
que ocorra até um ano da data de sua vigência.
Art. 17. É livre a criação, fusão, incorporação e extinção de
partidos políticos, resguardados a soberania nacional, o regime
democrático, o pluripartidarismo, os direitos fundamentais da
pessoa humana e observados os seguintes preceitos:
I - caráter nacional;
II - proibição de recebimento de recursos financeiros de
4. 4
entidade ou governo estrangeiros ou de subordinação a estes;
III - prestação de contas à Justiça Eleitoral;
IV - funcionamento parlamentar de acordo com a lei.
§ 1º É assegurada aos partidos políticos autonomia para
definir sua estrutura interna, organização e funcionamento
e para adotar os critérios de escolha e o regime de suas
coligações eleitorais, sem obrigatoriedade de vinculação
entre as candidaturas em âmbito nacional, estadual, distrital
ou municipal, devendo seus estatutos estabelecer normas de
disciplina e fidelidade partidária.
§ 2º Os partidos políticos, após adquirirem personalidade
jurídica, na forma da lei civil, registrarão seus estatutos no
Tribunal Superior Eleitoral.
§ 3º Os partidos políticos têm direito a recursos do fundo
partidário e acesso gratuito ao rádio e à televisão, na forma da
lei.
§ 4º É vedada a utilização pelos partidos políticos de
organização paramilitar.
À margem do corpo – Débora Diniz
O documentário “À Margem do Corpo”, realizado pela
antropólogaDéboraDiniz(publicadoem2006),contaahistória
de Deuseli Vanines, acontecida entre 1996 e 1998 e passa-se
entre as cidades de Alexânia e de Anápolis – GO. A história
de Deuseli é a história de muitas mulheres: empobrecida,
negra, violentada e que seus direitos à saúde, à segurança e
ao bem-estar são intimamente negados. Ademais, o título do
documentário já traz em si uma provocação: o que sabemos
da história de Deuseli nunca fora contado pela por ela mesma;
a história é narrada por outras pessoas envolvidas naquela
trama. Desse modo, a linguagem, nesse caso, nos ajuda a
entender os processos de violências sofridas por Deuseli.
Deuseli Vanines não tem uma genealogia; não se sabe ao
certo quando ela nasce, nem de quem ela é filha. A narrativa
trazida por uma terceira conta que ela fora criada por uma
família e que sofrera uma série de violências. Infere-se que, a
fim de ter meios para sobreviver, desde cedo, ela trabalhara em
casas de família.
Vale postular que o fato gerador do documentário é a
violência sexual sofrida por Vanines, cometida por um homem
conhecido por Nego Vila. O ato fora cometido num dia em que
Deuseli trabalhava e fora surpreendida por NegoVila. Ao narrar
os fatos, Deuseli fora humilhada e desqualificada; era vítima,
mais uma vez, de uma série de outras violências: além da
violência sexual, sofrera negligência policial; teve dificultado o
atendimento pelo SUS; fora-lhe negado o aborto ao feto, fruto
daquela violência sexual; tais fatores desencadearam uma
série de transtornos psiquiátricos que foram confundidos com
possessão demoníaca; ainda o fato de assassinar sua filha de
11 meses afogada numa banheira.
Ao longo do documentário, a narrativa conta, por meio de
relatos de pessoas que conviveram com a vítima, uma série de
situações que ora geram dúvidas, ora lançam suspeitas sobre
a violência sofrida, até o fato que eclode no assassinato da
criança, fruto da violência: filha de Deuseli. A obra trata sobre
uma série de questões: a negligência no atendimento de saúde
(Direito Social), a inércia da Justiça naquele caso, que poderia
ter viabilizado atendimento seguro para o aborto, a violência
contra a mulher, o controle do corpo feminino exercido
naquele contexto (vide Foucault); acena sobre o sistema
carcerário precário; e toca, ainda, nas questões de gênero.
Grupo I
ENEM 2019 – Essa atmosfera de loucura e irrealidade, criada pela
aparente ausência de propósitos, é a verdadeira cortina de ferro
que esconde dos olhos do mundo todas as formas de campos de
concentração. Vistos de fora, os campos e o que neles acontece
só podem ser descritos com imagens extraterrenas, como se a
vida fosse neles separada das finalidades deste mundo. Mais que
o arame farpado, é a irrealidade dos detentos que ele confina
que provoca uma crueldade tão incrível que termina levando à
aceitação do extermínio como solução perfeitamente normal.
ARENDT, H. Origens do totalitarismo. São Paulo: Cia. das Letras, 1989
(adaptado).
1)Apartirdaanálisedaautora,noencontrodastemporalidades
históricas, evidencia-se uma crítica à naturalização do(a)
a) ideário nacional, que legitima as desigualdades sociais.
b) alienação ideológica, que justifica as ações individuais.
c) cosmologia religiosa, que sustenta as tradições
hierárquicas.
d) segregação humana, que fundamenta os projetos
biopolíticos.
e) enquadramento cultural, que favorece os comportamen-
tos punitivos.
(ENEM 2019) Penso que não há um sujeito soberano, fundador,
uma forma universal de sujeito que poderíamos encontrar
em todos os lugares. Penso, pelo contrário, que o sujeito se
constitui através das práticas de sujeição ou, de maneira mais
autônoma, através de práticas de liberação, de liberdade, como
na Antiguidade — a partir, obviamente, de um certo número
de regras, de estilos, que podemos encontrar no meio cultural.
FOUCAULT, M. Ditos e escritos V: ética, sexualidade, política. Rio de Janeiro:
Forense Universitária, 2004.
2) O texto aponta que a subjetivação se efetiva numa dimensão
a) legal, pautada em preceitos jurídicos.
b) racional, baseada em pressupostos lógicos.
c) contingencial, processada em interações sociais.
d) transcendental, efetivada em princípios religiosos.
e) essencial,fundamentadaemparâmetrossubstancialistas.
(Ueg-2013) As histórias, resultado da ação e do discurso,
revelam um agente, mas este agente não é autor nem
produtor. Alguém a iniciou e dela é o sujeito, na dupla acepção
da palavra, mas ninguém é seu autor.
ARENDT, Hannah. A condição humana. Apud SÁTIRO, A.; WUENSCH, A. M.
Pensando melhor – iniciação ao filosofar. São Paulo: Saraiva, 2001. p.24.
3) A filósofa alemã Hannah Arendt foi uma das mais refinadas
pensadoras contemporâneas, refletindo sobre eventos como
a ascensão do Nazismo, o Holocausto, o papel histórico das
massas etc. No trecho citado, ela reflete sobre a importância
da ação e do discurso como fomentadores do que chama de
“negócios humanos”. Nesse sentido, Arendt defende o seguinte
ponto de vista:
a) A condição humana atual não está condicionada por
açõesanteriores,jáquecadauméautordesuaexistência.
5. Filosofia
5
b) A necessidade do ser humano de ser autor e produtor de
ações históricas lhe tira a responsabilidade sobre elas.
c) O agente de uma nova ação sempre age sob a influência
de teias preexistentes de ações anteriores.
d) O produtor de novos discursos sempre precisa levar em
conta discursos anteriores para criar o seu.
(Enem-PPL/2011) Subjaz na propaganda tanto política quanto
comercial a ideia de que as massas podem ser conquistadas,
dominadas e conduzidas, e, por isso, toda e qualquer
propaganda tem um traço de coerção. Nesse sentido, a filósofa
Hanna Arendt diz que“não apenas a propaganda política, mas
toda a moderna publicidade de massa contém um elemento
de coerção”.
AGUIAR, O. A. Veracidade e propaganda em Hannah Arendt. In: Cadernos
de Ética e Filosofia Política 10. São Paulo: EdUSP, 2007 (adaptado).
4) À luz do texto, qual a implicação da publicidade de massa
para a democracia contemporânea?
a) O fortalecimento da sociedade civil.
b) A transparência política das ações do Estado.
c) A dissociação entre os domínios retóricos e a política.
d) O combate às práticas de distorção de informações.
e) O declínio do debate político na esfera pública.
(Ufmg/2009) Leia este trecho:
Eu quero dizer que o mal [...] não tem profundidade, e que, por
esta mesma razão, é tão terrivelmente difícil pensarmos sobre
ele [...] O mal é um fenômeno superficial [...] Nós resistimos
ao mal em não nos deixando ser levados pela superfície
das coisas, em parando e começando a pensar, ou seja, em
alcançando uma outra dimensão que não o horizonte de cada
dia. Em outras palavras, quanto mais superficial alguém for,
mais provável será que ele ceda ao mal.
ARENDT, H. Carta a Grafton, apud ASSY, B. Eichmann, Banalidade do Mal e
Pensamento em Hannah Arendt. In: Jardim, E.; Bignotto, N. (org.). Hannah
Arendt: diálogos, reflexões, memórias. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2001.
p.145.
5) A partir da leitura desse trecho, REDIJA um texto
argumentando a favor de ou contra esta afirmativa:
Para se prevenir o mal, é preciso reflexão.
(Ufpr/2020) Eis como ainda, no início do século XVII, se
descrevia a figura ideal do soldado. O soldado é, antes de tudo,
alguém que se reconhece de longe; que leva os sinais naturais
de seu vigor e coragem, as marcas também de seu orgulho:
seu corpo é o brasão de sua força e de sua valentia. [...] Na
segunda metade do século XVIII, o soldado tornou-se algo
que se fabrica; de uma massa informe, de um corpo inapto,
fez-se a máquina de que se precisa; corrigiram-se aos poucos
as posturas; lentamente uma coação calculada percorre cada
parte do corpo, se assenhoreia dele, dobra o conjunto, torna-o
perpetuamente disponível e se prolonga, em silêncio, no
automatismo dos hábitos.
FOUCAULT, Michel. Os corpos dóceis. In: FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir.
Petrópolis: Vozes, 1999, p.162.
6) Levando em conta essa passagem e a obra em que
está inserida, é correto afirmar que, para Michel Foucault,
instituições como escolas, quartéis, hospitais e prisões são
exemplos de espaços em que, a partir do século XVIII, os
indivíduos
a) são educados de modo a se tornarem autônomos.
b) aprendem a conviver uns com os outros.
c) encontram as condições de segurança e bem-estar.
d) se tornam mais vigorosos e valentes.
e) se fazem objeto do poder disciplinar.
7) (Enem-PPL/2019) Tomemos o exemplo de Sócrates:
é precisamente ele quem interpela as pessoas na rua, os
jovens no ginásio, perguntando: “Tu te ocupas de ti?” O deus
o encarregou disso, é sua missão, e ele não a abandonará,
mesmo no momento em que for ameaçado de morte. Ele é
certamente o homem que cuida do cuidado dos outros: esta é
a posição particular do filósofo.
FOUCAULT, M. Ditos e escritos. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004.
O fragmento evoca o seguinte princípio moral da filosofia
socrática, presente em sua ação dialógica:
a) Examinar a própria vida.
b) Ironizar o seu oponente.
c) Sofismar com a verdade.
d) Debater visando a aporia.
e) Desprezar a virtude alheia.
Grupo II
(Ufpr/2019) Em um texto chamado “Resposta à questão: o
que é esclarecimento?”, Kant afirma que o “esclarecimento
é a saída do homem da menoridade”. Afirma também que
a “menoridade é a incapacidade de servir-se do próprio
entendimento sem direção alheia” e que “o homem é o
culpado por esta incapacidade, quando sua causa resulta na
falta, não do entendimento, mas de resolução e coragem para
fazer uso dele sem a direção de outra pessoa”.
KANT, Resposta à questão: O que é esclarecimento? In: MARÇAL, J.;
CABARRÃO, M.; FANTIN, M. E. (Org.). Antologia de textos filosóficos.
Curitiba: SEED-PR, 2009, p.407.
Por sua vez, Foucault afirma:“Houve, durante a época clássica,
uma descoberta do corpo como objeto e alvo do poder.
Encontraríamos facilmente sinais dessa grande atenção
dedicada então ao corpo – ao corpo que se manipula, se
modela, se treina, que obedece, responde, se torna hábil
ou cujas forças se multiplicam [...]”, referindo-se a um
corpo (homem) que se torna ao mesmo tempo analisável e
manipulável.
FOUCAULT, Michel. Os corpos dóceis. In: FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir.
Trad. Ligia M. Pondé Vassalo. 5.ed. Petrópolis: Vozes, 1987, p.125.
8) Com base nos dois textos e no pensamento desses filósofos,
considere as afirmativas abaixo:
I. O Esclarecimento seria uma espécie de menoridade
intelectual e corresponderia à afirmação da religião como
ponto de partida para o homem tomar suas principais
decisões.
6. 6
II. Enquanto Kant se preocupa em avaliar o quanto os
indivíduos são responsáveis por se deixarem dirigir
por outros, Foucault trata de mostrar os modos como a
sociedade torna o homem manipulável.
III. Tanto Kant quanto Foucault se questionam pelo nível
de autonomia do homem, ambos, porém, a partir
de abordagens diferentes e chegando a conclusões
diferentes.
IV. Fica claro no texto de Foucault que a idade clássica
favorece o autoconhecimento e a autonomia de
pensamento.
Assinale a alternativa correta.
a) Somente a afirmativa 2 é verdadeira.
b) Somente as afirmativas 1 e 4 são verdadeiras.
c) Somente as afirmativas 2 e 3 são verdadeiras.
d) Somente as afirmativas 1, 3 e 4 são verdadeiras.
e) As afirmativas 1, 2, 3 e 4 são verdadeiras.
(Uece/2019) “Generalizando posteriormente a já amplíssima
classe dos dispositivos foucaultianos, chamarei literalmente
de dispositivo qualquer coisa que tenha de algum modo a
capacidade de capturar, orientar, determinar, interceptar,
modelar, controlar e assegurar os gestos, as condutas, as
opiniões e os discursos dos seres viventes.”
AGAMBEN, G. O que é um dispositivo? outra travessia. Florianópolis, n.5,
p.9-16, jan. 2005.
9) Considerando o excerto acima, analise as seguintes
proposições:
I. As prisões e os manicômios se enquadram nesse
conceito na medida em que se voltam para a correção
e a normalização de condutas consideradas desviantes.
II. As escolas, as igrejas e as fábricas podem ser pensadas
como dispositivos na medida em que se voltam
para os corpos e os comportamentos no sentido do
disciplinamento.
III. Os computadores, os telefones celulares, as câmeras de
segurançasedestacamcomodispositivos,poiscontrolam
tecnicamente os gestos e as condutas humanas.
É correto o que se afirma em
a) I, II e III.
b) I e II apenas.
c) II e III apenas.
d) I e III apenas.
(Ufpr/2019) Não se trata de fazer aqui a história das diversas
instituições disciplinares, no que podem ter cada uma de
singular. Mas de localizar apenas numa série de exemplos
algumas das técnicas essenciais que, de uma a outra, se
generalizaram mais facilmente. Técnicas sempre minuciosas,
muitas vezes íntimas, mas que têm sua importância: porque
definem um certo modo de investimento político e detalhado
do corpo, uma nova‘microfísica’do poder.
FOUCAULT, Michel. Os corpos dóceis. In: FOUCAULT, M. Vigiar e Punir.
Trad. Ligia M. P. Vassalo. 5.ed. Petrópolis: Vozes, 1987, p.128.
10) Com base no excerto acima e também no conjunto do
texto estudado, como podemos definir a ideia de“microfísica
do poder”? Cite três exemplos de instituições disciplinares nas
quais é possível identificar esse modo de exercício de poder.
(Uem/2018 – com modificações) “Enfim, é preciso dizer que
não se podem conceber essas relações de poder como uma
espécie de dominação brutal com a forma: ‘Faça isso, ou eu
te mato!’. Não são situações extremas de poder. De fato, as
relações de poder são relações de força, de enfrentamentos,
então, sempre são reversíveis. Não há relações de poder que
sejam completamente triunfantes e cuja dominação seja
incontornável. Tem-se dito muito (os críticos me acusam
disso) que, para mim, ao por o poder em toda parte, eu exclua
toda possibilidade de resistência. Mas é o contrário!”
FOUCAULT, M. Poder e Saber. In: MARÇAL, J. Antologia de textos
filosóficos. Curitiba: Seed, 2009, p.240-241.
11) A partir do texto citado, julgue os itens a seguir:
(1) Como as relações de força são reversíveis, não há um
polo dominador e um dominado.
(2) Para o filósofo, a violência é constituinte das relações de
poder.
(3) Relações de poder não significam necessariamente
que o dominado jamais poderia reverter sua relação de
dominação.
(4) Para Foucault, as relações de poder perpassam as
interações humanas, à exceção das relações afetivas.
(5) Relações de poder são relações de força, às vezes sutis,
que podem se inverter conforme a resistência aplicada
pelo dominado em face do dominador.
(Uem/2017 – com modificações) “[...] As relações de poder
suscitam necessariamente, chamam a todo instante, abrem
a possibilidade de uma resistência, e isso porque há a
possibilidade de resistência real, que o poder daquele que
domina tenta manter-se com tanta força quanto possível,
quanto maior a astúcia, maior a resistência. De modo que
é muito mais a luta perpétua e multiforme que eu tento
mostrar do que a dominação morna e estável de um aparelho
uniformizador”.
FOUCAULT, M. Poder e saber. In: MARÇAL, J. Antologia de textos
filosóficos. Curitiba: Seed, 2009, p.241.
12) A partir do texto citado, julgue os itens a seguir:
(1) Foucault destaca a importância da resistência dos
dominados nas relações de poder.
(2) Diante do poder do Estado, não há resistência possível,
visto que o poder uniformiza os indivíduos.
(3) A resistência à dominação é uma luta permanente que os
dominados travam contra o poder dominador.
(4) A resistência ao poder somente pode ser exercida com o
uso da violência, visto que não há astúcia possível contra
a força do dominador.
(5) Nas relações de poder, não há somente dominação de
um lado e submissão de outro.
13) De modo argumentativo, relacione biopoder (Foucault) e
necropolítica (Mbembe).
14) No documentário “À Margem do Corpo”, a história de
Deuseli é contada sob o prisma de quem conviveu com ela
e, por isso, pode-se inferir o título. Sob seu ponto de vista,
teça um comentário fundamentando as violências às quais
Deuseli fora submetida.
7. 7 Sociologia
O campo das Ciências Sociais estabelece diálogo com
muitas obras da matriz do PAS 3, documento contemplado
comcercade70obrasprofundamentevinculadasàSociologia,
à Antropologia e à Ciência Política. Tradicionalmente 30% da
prova são oriundos das obras listadas, e os itens construídos
tendem a contextualizar historicamente a produção ou
relacionar a vida do autor com a criticidade impressa na
produção.
Esse complemento apresentado pela coleção destaca
três obras representativas no debate sobre diversidade,
desigualdade e violência encampados pela lista de obras
atualizadas para o PAS – Subprograma 2018-2020.
O QUE É RACISMO ESTRUTURAL?
O vídeo em questão tem
duração de cinco minutos e foi
produzido pelo Canal Preto no
Youtube. A produção conta com
Maria Sylvia de Oliveira, advogada
e presidente do Geledés, e Helena
Teodoro, do Instituto de Filosofia e
Ciências Sociais – IFCS.
A tese central é que o racismo
integra a organização econômica,
cultural e política da sociedade
brasileira, deslocando o debate
do racismo como ato individual patologizado (anormal)
para a perspectiva da construção histórica que impregna
um senso de racionalidade e normalidade para a vida social
contemporânea. O racismo seria um dos elementos centrais
que moldam o sentido e a lógica da organização social
brasileira.
“Raça”, como classificação de seres humanos e hierarquia
de povos em termos biológicos e culturais, foi uma construção
da modernidade, especialmente dos projetos colonizadores
dos séculos XVI e XIX. Foi a construção do homem europeu
moderno e universal que fundamentou o embate entre
civilização e barbárie patrocinada pelo continente europeu.
Maria Sylva de Oliveira resgata a sistematizaçaõ do racismo
no território nacional, desde as narrativas que amparam a
dinâmica do trabalho escravo mais duradouro no mundo
ocidental até o legado social deixado atualmente.
• Ato do Império em 1824: proibia a população negra de
frequentar a escola;
• 1850 (Lei de Terras): impedimento de que cativos
tivessem propriedade de terras e implementação de
subsídios para compra por parte dos estrangeiros que
chegavam ao País;
• Lei Áurea: fim da escravidão não acompanhado de
poíticasdeinserçãonasociedadeouaçõesreparativas;
• Racismo institucional: política de embranquecimento
nacional (impulso para a mão de obra estrangeira
entrar no País) e criminalização da população negra e
suas práticas (capoeira e religiosidade).
OprofessorSilvioAlmeida,noseulivro“RacismoEstrutural”,
define racismo como uma forma sistemática de discriminação
que tem a raça como fundamento, e que se manifesta por
meio de práticas conscientes ou inconscientes que culminam
em desvantagens ou privilégios para indivíduos, a depender
do grupo racial ao qual pertençam. O termo guarda diferenças
para as expressões preconceito racial e discriminação racial.
• Preconceito racial: concepções prévias sobre um
indivíduo e um grupo a partir de juízos de valores
estereotipados e caricaturais.
• Discriminação racial: realizar tratamento diferenciado
para membros de grupos racialmente diferentes. A
discriminação pode ser direta e explícita, mas também
pode ser realizada de maneira não intencional e
indireta, como nos casos de omissão frente a práticas
racializantes.
O racismo é apresentado pelo caráter sistêmico, não se
restringindo a um ato discriminatório, mas um processo de
construção de acessos, mobilidade social, reconhecimento
e prestígio em vários campos da vida (político, econômico e
cultural). A consequência prática é a estratificação social como
fenômeno intergeracional.
ATIVIDADES
Texto I
Frantz Fanon publicou, pela primeira vez, em 1952, seu
estudo sobre colonialismo e racismo, “Pele Negra, Máscaras
Brancas”. Ao dizer que,“para o negro, há somente um destino”e
que esse destino é branco, Fanon revelou que as aspirações de
muitos povos colonizados foram formadas pelo pensamento
colonial predominante.
BUCKINGHAM, W. et al. O livro da filosofia. São Paulo: Globo,
2011 (adaptado).
Texto II
Mesmoquenãoqueiramoscobrardessesestabelecimentos
(salões de beleza) uma eficácia política nos moldes
tradicionais da militância, uma vez que são estabelecimentos
comerciais, e não entidades do movimento negro, o fato é
que, ao se autodenominarem“étnicos”e se apregoarem como
divulgadores de uma autoimagem positiva do negro em uma
sociedade racista, os salões se colocam no cerne de uma luta
política e ideológica.
GOMES, N. Corpo e cabelo como símbolos da identidade negra.
Disponível em: www.rizoma.ufsc.br. Acesso em: 13 fev. 2013.
1. (ENEM) Os textos apresentam uma mudança relevante na
constituição identitária frente à discriminação racial. No Brasil,
o desdobramento dessa mudança revela o(a)
a) valorização de traços culturais.
b) utilização de resistência violenta.
c) fortalecimento da organização partidária.
d) enfraquecimento dos vínculos comunitários.
e) aceitação de estruturas de submissão social.
A luta contra o racismo, no Brasil, tomou um rumo
contrário ao imaginário nacional e ao consenso científico,
formado a partir dos anos 1930. Por um lado, o Movimento
Negro Unificado, assim como as demais organizações negras,
priorizaram, em sua luta, a desmistificação do credo da
democracia racial, negando o caráter cordial das relações
raciais e afirmando que, no Brasil, o racismo está entranhado
nas relações sociais. O movimento aprofundou, por outro lado,
sua política de construção de identidade racial, chamando de
“negros” todos aqueles com alguma ascendência africana, e
Obras de Referência PAS/UnB - Sociologia 3º série
8. 8
não apenas os“pretos”.
GUIMARÃES, A. S. A. Classes, raças e democracia. São Paulo:
Editora 34, 2012.
2. (ENEM) A estratégia utilizada por esse movimento tinha
como objetivo
a) eliminar privilégios de classe.
b) alterar injustiças econômicas.
c) combater discriminações étnicas.
d) identificar preconceitos religiosos.
e) reduzir as desigualdades culturais.
O racismo se materializa como discriminação racial, sendo
definido por seu caráter sistêmico. Não se trata, portanto, de
apenas um ato discriminatório ou mesmo de um conjunto de
atos, mas de um processo em que condições de subalternidade
e de privilégio que se distribuem entre grupos raciais se
reproduzemnosâmbitosdapolítica,daeconomiaedasrelações
cotidianas. O racismo articula-se com a segregação racial, ou
seja, a divisão espacial de raças em localidades específicas –
bairros, guetos, ofícios, periferias etc.
ALMEIDA, Silvio. Racismo Estrutural. São Paulo: Sueli Carneiro;
Pólen, 2019.
3. Com base na citação acima e em estudos realizados acerca
das relações raciais no Brasil, julgue os itens.
(1) A sociedade brasileira condena publicamente o racismo,
todavia ele é considerado naturalizado em alguns
espaços, especialmente em relações sociais de caráter
mais cotidiano e familiar.
(2) O País é fruto de um processo de miscigenação, fato que
inviabiliza a existência de racismo e estratificação com
recorte racial.
(3) A herança cultural da escravidão foi diluída nas décadas
posteriores à escravidão.
(4) O mito da democracia racial é uma construção que ajuda
na perpetuação do racismo institucional, especialmente
pelo caráter velado de sua reprodução.
(5) Entre as marcas culturais da escravidão no Brasil, está
a tendência a associar pessoas negras a profissões de
menor status social.
(Interbits 2016) Em geral, cada povo se crê, de boa fé, superior
a outro; e basta que as paixões se intrometam, eis que a
guerra explode: mata-se tanto quanto se pode, de uma parte
e de outra, como se esmagam insetos. Mais se mata, mais se é
glorioso.
RANCIÈRE, Jacques. O mestre ignorante: cinco lições sobre a
emancipação intelectual. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2015,
p.132.
4. Assinale a alternativa que apresenta o conceito sociológico
que melhor representa a crença de um povo em relação a
outro, apresentada no texto da questão.
a) Relativismo Cultural.
b) Etnocentrismo.
c) Racismo.
d) Ideologia.
e) Alienação.
Ainda sobre a discriminação, é importante dizer que é
possível falar também em discriminação positiva, definida
como a possibilidade de atribuição de tratamento diferenciado
a grupos historicamente discriminados com o objetivo de
corrigir desvantagens causadas pela discriminação negativa.
ALMEIDA, Silvio. Racismo estrutural. São Paulo: Sueli Carneiro;
Pólen, 2019.
5. Com base na citação acima e no vídeo “Racismo Estrutural”,
julgue os itens.
(1) O vídeo “Racismo Estrutural” identifica, na política de
cotas, uma reprodução das estruturas de injustiças
sociais.
(2) A discriminação positiva é uma intervenção do Estado
fundamentada na equidade.
(3) As cotas em cargos públicos e o ensino superior seriam
representações da discriminação positiva.
(4) Segundo Silvio Almeida, as instituições sociais
reproduzem, por meio de normas ou naturalização, o
legado da escravidão no Brasil.
(5) O racismo é uma forma sistemática de discriminação
que se manifesta por meio de práticas conscientes ou
inconscientes.
Leia o texto abaixo:
No processo de transição para o trabalho livre existe uma
condição prévia e fundamental que se refere ao acesso à terra.
Enquanto a produção fosse efetuada por escravos, a terra era
praticamente destituída de valor, pois sua propriedade só teria
significado econômico se seu detentor também possuísse
um estoque de cativos. Contudo, a partir do momento que a
escravidão começou a apresentar os primeiros sintomas de
crise, com o término do tráfico africano, tornou-se necessário
impedir que os homens livres tivessem acesso à propriedade
da terra.
KOWARICK, Lúcio. Trabalho e vadiagem: a origem do trabalho
livre no Brasil. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1994. p.75.
6. (UFV) Considerando o contexto tratado no fragmento
acima, a Lei de Terras de 1850
a) criou empecilhos para a constituição de um mercado de
trabalho livre à medida que regulava os novos contratos
de trabalho.
b) garantiu o acesso irrestrito aos imigrantes europeus
que não conseguiam adaptar-se às novas condições de
trabalho.
c) restringiu o acesso à terra, pois transformou-a em uma
mercadoria.
d) modificou a estrutura fundiária no Brasil, possibilitando o
surgimento de pequenas propriedades.
e) possibilitou o acesso à propriedade da terra aos escravos
recém-libertos.
[...] Na verdade, raça, no Brasil jamais foi um termo neutro;
ao contrário, associou-se com frequência a uma imagem
particular do País. Muitas vezes, na vertente mais negativa de
finais do século XIX, a mestiçagem existente no País parecia
atestar a falência da nação [...]
SCHWARCZ, Lilia Moritz. Nem preto nem branco, muito pelo
contrário. São Paulo: Claro Enigma, 2013. cor e raça na intimidade.
7. Julgue os itens a partir do tema abordado no vídeo“Racismo
Estrutural”.
(1) Vigorou, no Brasil do século XIX, uma visão elitista que
privilegiava a cor branca e via, na mistura de raças, a
9. 9 Sociologia
causa de seu atraso.
(2) Os termos raça e etnia se equivalem. Ambos fazem
referência à composição de grupos de pessoas com
características fisiológicas e biológicas comuns.
(3) Os estudos centrados na noção de raça biológica
classificam a Humanidade por meio da seleção natural e
da organização genética.
(4) Por ser o Brasil o país com o maior número de negros
e afrodescendentes fora do continente africano, a
democracia racial foi conquistada ao longo do século XX.
(5) Nas décadas seguintes à abolição da escravatura, a
integração dos negros à sociedade brasileira foi marcada
pela adoção de mecanismos de inclusão que resultaram,
recentemente, na implantação das chamadas políticas
de ação afirmativa.
Os Estados Unidos da América (EUA) são uma grande e
velha república onde ainda se aplica a pena de morte. Na
prática judiciária, esse recurso põe a descoberto todas as
injustiças e mazelas da sociedade: a desigualdade social, uma
vez que são os menos favorecidos e os mais marginalizados
que povoam os pavilhões da morte nas prisões americanas; a
desigualdade financeira, pois, no sistema judiciário americano,
somente os ricos ou mafiosos têm os meios de aceder a
serviços de advogados especializados, capazes de enfrentar
um ministério público poderoso e uma polícia eficiente; a
desigualdade racial, já que, nos casos hediondos — em que
o horror do crime provoca, no público e em alguns jurados,
pulsão de ódio e de vingança —, o racismo, que, no cotidiano,
se disfarça, pode, ali, manifestar-se.
Não é irrelevante o fato de que, nos pavilhões da morte,
o número de negros ou de latinos é proporcionalmente bem
superior à sua representação na população americana.
Robert Badinter. Contre la peine de mort. Écrits 1970-2006. Paris:
Fayard, 2006, p.19-21 (tradução com adaptações).
8. (UnB – adaptada) Tendo como referência o texto acima, o
vídeo“Racismo Estrutural”e considerando os aspectos teóricos
sociológicos, julgue os próximos itens.
(1) A pena de morte é um mecanismo de controle social que
materializa o conceito marxista de Estado como locus da
violência institucionalizada.
(2) A leitura do racismo como fenômeno individual acredita
que o direito penal seria mecanismo suficiente para a
superação do racismo.
(3) Oracismoaqueserefereotextotemsuasraízeshistóricas
nos papéis sociais subalternos que desempenharam, nos
EUA, as populações africanas e latinas, bem como no
orgulho de raça e no sentimento de superioridade de
credo do grupo social que se considerava herdeiro dos
pais fundadores da nação.
(4) Na história da Humanidade, verificam-se casos
semelhantes ao dos EUA, em que se associaram racismo,
pobreza e pena de morte.
QUESTÃO INDÍGENA EM 4 MINUTOS
Produção disponibilizada no Youtube pelo canal Agência
Pública, o vídeo trata da questão indígena no Brasil a partir da
exposição dos indicadores sobre os povos tradicionais, assim
como os desafios políticos e jurídicos ainda enfrentados para
a materialização dos direitos reconhecidos na Constituição de
1988.
Segundo o último Censo Demográfico, realizado pelo IBGE,
são mais de 800 mil indígenas, cerca de 246 etnias distribuídas
em todo o território nacional. A Fundação Nacional do Índio
(FUNAI) reconhece 505 terras indígenas (entre declaradas
e homologadas), representando cerca de 12% do território
brasileiro.
CENSO 2010
304 ETNIAS
274 LÍNGUAS
POP: 896 MIL
36% Urbanos
64% Rural
505 TERRAS INDÍGENAS
12% do território
Um dos grande desafios apresentados pela Constituição
de 1988 foi a inserção da questão indígena, depois de séculos
caracterizados pelo genocídio e pelo assimilacionismo, a Carta
Magna iniciou uma fase de reconhecimento da pluralidade
cultural e autonomia territorial. Em “Da Ordem Social”, consta
o capítulo“Dos Índios”: nos artigos 231 e 232, os constituintes
romperam com a visão dos indígenas como “comunidade
transitória”(passageira, logo chegaria ao fim) e necessidade de
tutela presente no Estatuto do Índio (1973). O resultado foi o
fortalecimento da FUNAI e a construção jurídica dos “direitos
originários”, elemento que reconheceu a propriedade indígena
como anterior à ocupação do território pelos portugueses,
estabelecendo usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos
rios e dos lagos nelas existentes.
Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização
social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos
originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam,
competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar
todos os seus bens.
§ 1º São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as
por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para
suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação
dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as
necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus
usos, costumes e tradições.
Constituição de 1988
O documento estabelecia o prazo de cinco anos para a
demarcação de todas as terras indígenas do País. O processo
de demarcação é fruto da identificação e da sinalização dos
limites do território tradicionalmente ocupado pelos povos
indígenas (FUNAI),;ele inicia com estudos antropológicos para
reconhecimento da ancestralidade, segue para a construção
de espaços para o contraditório (Ministério da Justiça) e finaliza
o processo na homologação pela Presidência da República. As
demandas de demarcação não foram concluídas passados
mais de 30 anos da Constituição de 1988, atualmente mais de
200 terras indígenas aguardam homologação pelo chefe do
Poder Executivo.
10. 10
Foto Guito Moreto / Agência O Globo
A insegurança jurídica e a não mediação da tensão fizeram
multiplicar os conflitos no campo e na floresta. As terras
indígenasrepresentamumcordãodeisolamentoparaoavanço
de mineradores, garimpeiros ilegais e madeireiras. Estima-se
que a taxa de desmatamento fora das terras indígenas é 11
vezes maior do que a registrada nos territórios demarcados.
Conceitos para retomar:
Etnocentrismo
Utilizar a própria cultura como único referencial
de verdade e parâmetros de costumes. Mecanismo de
classificação evolucionista que identifica as culturas
diferentes da sua como arcaicas, subalternas e passíveis de
violência física e simbólica.
Relativismo Cultural
Avaliar cada cultura pelos seus próprios termos e
dinâmica interna. Forma de reconhecer a diversidade
como valor e recusar a hierarquização de práticas culturais.
ATUALIDADES
Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215/2000: a
proposta transfere do Executivo para o Legislativo a palavra
final sobre a demarcação, seria papel do Congresso realizar o
passo posterior ao estudo antropológico liderado pela FUNAI.
O movimento indígena reconhece a proposta como ameaça
às futuras demarcações por fragmentar a responsabilidade do
ato final e depender das correlações de força que operam no
Congresso Nacional.
ATIVIDADES
1. (Enem PPL 2017) No primeiro semestre do ano de 2009,
o Supremo Tribunal Federal (STF), a mais alta corte judicial
brasileira, prolatou decisão referente ao polêmico caso
envolvendo a demarcação da reserva indígena Raposa Serra
do Sol, onde habitam aproximadamente dezenove mil índios
aldeados nas tribos Macuxi, Wapixana, Taurepang, Ingarikó e
Paramona – em julgamento paradigmático que estabeleceu
uma série de conceitos e diretrizes válidas não só para o caso
em questão, mas para todas as reservas indígenas demarcadas
ou em processo de demarcação no Brasil.
SALLES, D. J. P. C. Disponível em: www.ambito-juridico.com.br.
Acesso em: 30 jul. 2013 (adaptado).
A demarcação de terras indígenas, conforme o texto, evidencia
a
a) ampliação da população indígena na região.
b) função do Direito na organização da sociedade.
c) mobilização da sociedade civil pela causa indígena.
d) diminuição do preconceito contra os índios no Brasil.
e) pressão de organismos internacionais em defesa dos
índios brasileiros.
2. (Enem) Para dar conta do movimento histórico do processo de
inserçãodospovosindígenasemcontextosurbanos,cujamemória
reside na fala dos seus sujeitos, foi necessário construir um método
de investigação, baseado na História Oral, que desvelasse essas
vivências ainda não estudadas pela historiografia, bem como as
conflitivas relações de fronteira daí decorrentes. A partir da história
oral, foi possível entender a dinâmica de deslocamento e anserção
dos índios urbanos no contexto da sociedade nacional, bem como
perceber os entrelugares construídos por estes grupos étnicos na
luta pela sobrevivência e no enfrentamento da sua condição de
invisibilidade.
MUSSI, P. L. V. Tronco velho ou ponta da rama? A mulher indígena
terena nos entrelugares da fronteira urbana. Patrimônio e Memória,
n.1, 2008.
O uso desse método para compreender as condições dos
povos indígenas nas áreas urbanas brasileiras justifica-se por
a) focalizar a empregabilidade de indivíduos carentes de
especialização técnica.
b) permitir o recenseamento de cidadãos ausentes das
estatísticas oficiais.
c) neutralizar as ideologias de observadores imbuídos de
viés acadêmico.
d) promover o retorno de grupos apartados de suas nações
de origem.
e) registrar as trajetórias de sujeitos distantes das práticas
de escrita.
Texto I
Documentos do século XVI algumas vezes se referem aos
habitantes indígenas como “os brasis”, ou “gente brasília” e,
ocasionalmente, no século XVII, o termo “brasileiro” era a eles
aplicado, mas as referências ao status econômico e jurídico
desses eram muito mais populares. Assim, os termos“negro da
terra” e “índios” eram utilizados com mais frequência do que
qualquer outro.
SCHWARTZ, S. B. Gente da terra braziliense da nação. Pensando
o Brasil: a construção de um povo. In: MOTA, C. G. (Org.). Viagem
Incompleta: a experiência brasileira (1500-2000). São Paulo: Senac,
2000 (adaptado).
Texto II
Índio é um conceito construído no processo de conquista
da América pelos europeus. Desinteressados pela diversidade
cultural, imbuídos de forte preconceito para com o outro, o
indivíduodeoutrasculturas,espanhóis,portugueses,franceses
e anglo-saxões terminaram por denominar da mesma forma
povos tão díspares quanto os tupinambás e os astecas.
SILVA, K. V.; SILVA, M. H. Dicionário de conceitos históricos. São
Paulo: Contexto, 2005.
3. (ENEM) Ao comparar os textos, as formas de designação dos
grupos nativos pelos europeus, durante o período analisado,
são reveladoras da
a) concepção idealizada do território, entendido como
geograficamente indiferenciado.
b) compreensão etnocêntrica acerca das populações dos
territórios conquistados.
11. 11 Sociologia
c) transposição direta das categorias originadas no
imaginário medieval.
d) visão utópica configurada a partir de fantasias de riqueza.
e) percepção corrente de uma ancestralidade comum às
populações ameríndias.
4. (UEM 2017 – com adaptações) A partir do vídeo “Questão
Indígena em 4 Minutos” e das teorias da antropologia, julgue
os itens.
(1) Enquanto a Sociologia enfrenta a tarefa de pensar a
sociedade, a Antropologia busca registrar e compreender
os fenômenos humanos a partir do conhecimento do
outro. Esse outro pode ser alguém pertencente a uma
cultura distante e distinta da nossa, mas também pode
ser alguém pertencente à nossa própria cultura, colocado
em perspectiva e observado a partir de um ponto de
vista distinto do que nos é habitual e familiar.
(2) O etnocentrismo é fundamentado na perspectiva política
que avalia o mundo através de sua própria cultura,
considerando seu modo de vida como natural e correto
perante os outros.
(3) AquestãoindígenanoBrasilvivenciouumgrandeavanço
com a Constituição de 1988, especialmente quanto ao
direito à diferença e à demarcação de terras indígenas.
(4) O relativismo cultural se opõe ao princípio de que valores,
costumes ou ideias associados a determinada cultura são
universalmente válidos.
(5) Os conflitos por terra indígena são potencializados
quando a FUNAI não realiza seu papel de monitorar,
regularizar e fiscalizar as terras dos povos originários.
Aquestãodademarcaçãodeterrasindígenastem,aolongo
do tempo, suscitado diversos conflitos. Mais recentemente,
observou-se a possibilidade de modificar os critérios de
demarcação, pois, conforme seus críticos, os regulamentos
vigentes possibilitaram a ação de “indígenas civilizados”, ou
seja, aqueles que supostamente teriam perdido sua identidade
indígena, e que agora a reivindicavam com o intuito de obter
terras. No centro deste debate, encontra-se a definição do que
é ser indígena, enfim, a definição dos critérios definidores de
uma etnia.
5. (UFU) Para os estudos antropológicos atuais, define-se uma
etnia por meio da
a) identificação da presença de traços fenotípicos comuns
a uma população, atrelados ao cultivo de uma tradição
cultural.
b) ocupação territorial de um país específico e pela
persistência de traços culturais tradicionais.
c) identificação de uma concepção histórica comum que
funda uma identidade.
d) identificação de traços raciais comuns a uma população,
aliados a elementos culturais específicos.
Congresso indigenista originou o Dia do Índio
NoBrasil,oDiadoÍndioécelebradoem19deabrildesdeum
decreto-lei do presidente Getúlio Vargas, de 1943. A origem da
data é resultado do 1º Congresso Indigenista Interamericano,
realizado no México, em 1940. Compreendendo a importância
do diálogo, diversas lideranças indígenas resolveram aderir ao
congresso, que teve, entre suas resoluções, a adoção da data
comemorativa para toda a América. Também na década de
1940,oBrasilviveuummomentoimportantecomrelaçãoàsua
população indígena. Em 1943, a Marcha para Oeste incentivou
a ocupação e o desenvolvimento da região Centro-Oeste do
País. Entre os desbravadores, estavam três jovens sertanistas,
os irmãos Villas Bôas, que tiveram suas trajetórias levadas ao
cinema no filme“Xingu”.
Adaptado de blogs.estadao.com.br, 19/04/2012.
Um Xingu comportado demais
Fui ver “Xingu”: didático, belo, comportado. Eu queria ver
outro filme, e definitivamente “Xingu” não é sobre os “índios”,
mas sobre a relação dos brancos com um mundo que precisam
neutralizar e que é, de certa forma, insuportável. O filme aplaca
certa culpa com essa bela defesa do Parque do Xingu, que
evitou a dizimação ainda mais atroz de índios brasileiros. Mas
criar uma reserva de humanidade já é matar. Mal menor, diz o
filme. A história dos irmãos Villas Bôas e dos sertanistas é tão
incrível que o filme é um disparador de mundos e imaginários.
A cosmologia indígena, sua outra forma de viver e de pensar
sãoumadasmaisradicaisexperiênciasdeoutrashumanidades.
BENTES, Ivana. Adaptado de controversia.com.br, 17/04/2012.
6. (UERJ 2015) Na crítica ao filme “Xingu”, é apontado um
dilema quanto aos direitos de populações indígenas. Nesse
dilema, são confrontadas as seguintes diretrizes das atuais
políticas governamentais:
a) tutela − emancipação.
b) proteção − aculturação.
c) preservação − integração.
d) territorialização – miscigenação.
7. (UEM 2013) “No Xingu, líderes indígenas como o cacique
Kuyussi, dos kisêdjê, também conhecidos como suiá,
denunciam a fumaça das queimadas produzidas pelas
fazendas que envolvem o parque e tornam o ar irrespirável.
Depois do fogo e da passagem do gado, os brancos semeiam
a soja. Se antes os animais mortos por doenças eram atirados
no rio que abastece os kisêdjê, o Suiá-Missu, agora são os
pesticidas pulverizados por aviões empregados na cultura da
soja que tornam o ar e a água do rio ameaçadores para a saúde
dos índios que convivem com os brancos separados pelo leito
do rio.
CAPOZZOLI, Ulisses. A sombra longa do homem branco.
Scientific American Brasil, n.44, p.15.
Considerando a citação acima e seus conhecimentos sobre o
tema meio ambiente e desenvolvimento, julgue os itens.
(1) Situado ao norte do Estado do Mato Grosso, o Parque
Indígena do Xingu é área de constante embate e
disputa por empresas privadas e mesmo de ações
governamentais interessadas na exploração do potencial
energético da região.
(2) Historicamente, o que se percebe é a maneira predatória
de exploração dos recursos naturais pelas populações
indígenas. Dessa forma, é possível afirmar que as
ações políticas de demarcação de terra e de criação de
reservas contribuíram para a aceleração dos processos de
devastação ambiental.
(3) Ações recentes de políticas públicas, elaboradas
por meio de estudos sociológicos e antropológicos,
12. 12
defendem que os programas de saúde indígena
incorporem as concepções nativas sobre saúde e os
processos terapêuticos tradicionais nas ações médicas
empreendidas na região.
(4) O plantio de soja na região garante ações contra o
desmatamento por ser um tipo de cultura agrícola
voltada para o consumo de famílias locais e para a
sustentabilidade econômica das populações indígenas
que controlam integralmente esse plantio.
(5) Constrangidos por leis ambientais e pelas ações de
responsabilidade social implementadas na região do
Xingu, as empresas agropecuárias limitam o uso de
pesticidas nas áreas de cultivo que compartilham com as
populações indígenas.
No Censo 2010, o IBGE aprimorou a investigação
sobre a população indígena no País, investigando o
pertencimento étnico e introduzindo critérios de identificação
internacionalmente reconhecidos. Foram registrados 896,9 mil
indígenas,36,2%emáreaurbanae63,8%naárearural.Também
foram identificadas 505 terras indígenas, cujo processo de
identificação teve a parceria da Fundação Nacional do Índio
(FUNAI) no aperfeiçoamento da cartografia. Essas terras
representam 12,5% do território brasileiro (106,7 milhões de
hectares), onde residiam 517,4 mil indígenas (57,7% do total).
Apenas seis terras tinham mais de 10 mil indígenas, 107 tinham
entre mais de mil e 10 mil, 291 tinham entre mais de cem e
mil e em 83 residiam até cem indígenas. A terra com maior
população indígena é Yanomami, no Amazonas e em Roraima,
com 25,7 mil indígenas.
Censo 2010 IBGE
8. Considerando a temática da diversidade étnica e dos dados
do último Censo IBGE, julgue os itens.
(1) A abordagem antropológica da cultura dos diferentes
grupos étnicos exige que o pesquisador não crie
hierarquias entre eles.
(2) O olhar etnocêntrico é aquele que vê a cultura do outro a
partir de referências dadas pela sua própria cultura.
(3) A concepção de território para a demarcação de terras
indígenas não pode levar em consideração apenas a
leitura de propriedade difundida pelos não indígenas.
(4) A análise crítica da cultura dos povos indígenas e dos
grupos étnicos que habitam as regiões Norte e Nordeste
do Brasil confere centralidade aos aspectos climáticos
que determinam suas práticas culturais.
(5) O texto cita todas as terras indígenas reconhecidas no
País, esforço da Constituição de 1988, que concluiu todo
o trabalho de demarcação nos cinco anos estabelecidos
pelos constituintes.
9. (UEM 2008) As grandes navegações europeias do século
XV promoveram o contato entre povos e culturas bastante
diversos.Considerandoessefatoeasinterpretaçõesassociadas
à produção de diferenças culturais, julgue os itens.
(1) É amplamente aceita pela Sociologia, até os dias atuais,
a ideia formulada no século XIX de que as diferenças
culturais existentes entre os povos são determinadas
diretamente pela localização geográfica.
(2) No século XIX, obtiveram grande prestígio as teorias que
afirmavam que a inferioridade racial dos negros e dos
índios era responsável pelo seu atraso moral e intelectual
diante dos brancos europeus.
(3) Quando chegaram ao continente americano,
os portugueses encontraram, no território que
posteriormente seria reconhecido como brasileiro, um
conjunto culturalmente homogêneo de comunidades
indígenas, que possuíam as mesmas crenças, linguagem
e valores.
(4) Aperspectivaetnocêntricaprevalecequandoseatribuem
valores de julgamento às crenças e aos costumes do
“outro”, tendo como referência absoluta a própria cultura.
Por isso, ela pode promover posturas de intolerância.
(5) Denomina-se “relativista” a perspectiva que nega
veementemente as diferenças culturais existentes entre
os povos, salientando somente os traços que lhes são
comuns.
Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização
social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos
originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam,
competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar
todos os seus bens.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
Disponível em: www.planalto.gov.br. Acesso em: 27 abr. 2017.
10. (ENEM) A persistência das reivindicações relativas à
aplicação desse preceito normativo tem em vista a vinculação
histórica fundamental entre
a) etnia e miscigenação racial.
b) sociedade e igualdade jurídica.
c) espaço e sobrevivência cultural.
d) progresso e educação ambiental.
e) bem-estar e modernização econômica.
UNIVERSIDADE PARA QUÊ?
O livro é uma transcrição do discurso de Darcy Ribeiro na
posse do novo reitor da Universidade de Brasília. O contexto
histórico é o da redemocratização, a Universidade de Brasília
vivenciava o clima de abertura política que se consolidava
em todo País. O idealizador da Universidade, em 1961, é o
grande convidado da posse do reitor Cristovam Buarque, sua
exposição resgata a história da Universidade, seus propósitos
fundadores e as rupturas geradas pela ditadura de 1964.
Darcy Ribeiro
Cientista social e político brasileiro, Darcy é reconhecido
nacionalmente pela sua produção etnográfica e seu trabalho
no campo da Antropologia Indigenista no País. Na juventude,
funcionário do Serviço de Proteção ao Índio, redigiu, ao lado
dos irmãos Villas Bôas, o projeto do Parque Indígena do Xingu
(1961), a primeira grande terra indígena demarcada pelo
governo brasileiro.
13. 13 Sociologia
Darcy Ribeiro
O antropólogo também seria reconhecido pela idealização
da Universidade de Brasília, instituição que ele foi o primeiro
reitor, ocupando depois os cargos de Ministro da Educação
e Ministro Chefe da Casa Civil de João Goulart. Expulso do
País com a ditadura militar, Darcy voltaria, na década de 80,
como um dos grandes articuladores da redemocratização,
atuando como vice governador do Rio de Janeiro e Senador da
República nos últimos anos de vida.
O Projeto UnB
O texto/discurso de Darcy Ribeiro remete ao simbolismo
do Projeto UnB, instituição criada em 1962, apenas dois anos
depois da inauguração da nova capital do País. O professor
revela o ambiente inovador que permeou sua parceria com
o educador Anísio Teixeira e o arquiteto Oscar Niemeyer. A
promessa era ambiciosa: reinventar o ensino superior brasileiro
e integrar as graduações pela interdisciplinaridade voltada
para a resolução dos grandes dilemas nacionais.
A autonomia universitária, a inovação na forma de
estruturar a universidade (departamentos e institutos),
recrutamento dos mais destacados profissionais do País para
atuar como professor e o compromisso com as necessidade
nacionais eram o pilares do Projeto UnB. Esse questionamento
constante da função social da universidade caracteriza os
elementos centrais da obra.
“Brasil não pode passar sem uma Universidade que tenha o
inteiro domínio do saber humano e o cultive não como ato de
fruição erudita ou de vaidade acadêmica, mas com o objetivo
de, montada nesse saber, pensar o Brasil como problema”. [...]
“Nós sabíamos que nossa tarefa-desafio não era fazer outra
universidade-fruto, resultante de um desenvolvimento já
cumprido, como será a Sorbonne, por exemplo. Precisávamos
de uma universidade-semente, capaz de gerar um
desenvolvimento que o País não tem”.
O ex-reitor destaca um espaço longo para descrever uma
hecatombequemudouporcompletoodestinodauniversidade.
Integrante do alto escalão do governo João Goulart, Darcy
foi um dos primeiros a se exilar, assistiu de longe a uma série
de intervenções que recaíram sobre a universidade, foram
pelo menos quatro intervenções resultando na demissão de
reitores, docentes e na prisão de estudantes. A mais traumática,
relembrada no discurso do professor, foi a intervenção de
1965, quando tanques e viaturas cercaram a universidade e
bloquearam bibliotecas e escritórios. No mesmo ano, 223 dos
305 professores da Universidade demitiram-se da instituição.
O caso foi relatado também no livro do professor Roberto
Salmeron,“A Universidade Interrompida: Brasília 1964-1965”.
A fala de Darcy Ribeiro simboliza uma retomada dos sonhos
de uma geração interrompida e de uma projeto ambiciosos
para o ensino superior do País. O texto encerra provocando as
futuras gerações da UnB a retomar suas perguntas fundadoras:
Universidade para quê? Universidade para quem?
ATIVIDADES
1. No discurso que fez no Auditório Dois Candangos, em 16
de agosto de 1985, Darcy Ribeiro, fundador da universidade
e inspirador desta revista, antecipou o que deve ser o espírito
e a linha editorial de nossa nova publicação: o compromisso
com o conhecimento e a disposição inquietante para divulgá-
lo, levando em conta que “toda ideia é provisória e tem
de ser posta em causa. Tudo é discutível, sobretudo numa
universidade”.
José Geraldo. Revista Darcy.
O projeto da Universidade de Brasília, citado pelo Darcy
Ribeiro, é pautado pelo sentido
a) da autonomia universitária, representado na produção
do conhecimento e na eleição para reitor(a).
b) da gestão educacional centralizada no Estado e nas
vontades do Presidente da República.
c) da construção do conhecimento voltada exclusivamente
para as demandas do mercado.
d) dotecnicismoacadêmicofundamentadopeloeruditismo
e pela vaidade.
2. Nós sabíamos que nossa tarefa-desafio não era fazer outra
universidade-fruto, resultante de um desenvolvimento já
cumprido, como será a Sorbonne, por exemplo. Precisávamos
de uma universidade-semente, capaz de gerar um
desenvolvimento que o País não tem.
RIBEIRO, Darcy. Universidade para quê? Brasília: UnB, 1.ed., 1986.
No discurso proferido em 1985, Darcy Ribeiro evoca um dos
princípios motivadores da construção da Universidade de
Brasília.
a) Espelhar a estrutura, a dinâmica e o papel realizado pelas
universidades mais tradicionais do mundo.
b) Formar grandes intelectuais que tenham interesse em
continuar sua formação nas melhores universidades do
mundo, internacionalizando o País no campo acadêmico.
c) Concatenar as ideias nacionais, reunir o saber científico
e prestar assessoria na construção do desenvolvimento
que o País ainda não tem.
d) Construir pontes com as demandas das maiores
empresas privadas do País, consolidando um ensino
superior estruturado a partir dos interesses do mercado.
3. Há 52 anos, no dia 29 de agosto de 1968, a Universidade
de Brasília (UnB) foi alvo de uma invasão militar que
resultou no espancamento, prisão e tortura de estudantes e
funcionários. Sob o pretexto de cumprir mandados de prisão
contra estudantes, as forças policiais e militares cercaram
a Universidade com viaturas e caminhões de choque.
Centenas de soldados invadiram prédios e salas de aulas, com
metralhadores, fuzis e bombas de gás lacrimogênio. Um dos
grandes alvos da operação foi a Federação dos Estudantes da
Universidade de Brasília (FEUB), considerada pela repressão
como uma organização subversiva e paramilitar. As forças
de segurança espancaram e prenderam o seu presidente,
Honestino Guimarães. Cerca de 300 estudantes foram
mantidos presos na quadra de basquete.
52 anos da invasão da Universidade de Brasília: a luta por
democracia ontem e hoje . Disponível em http://www.noticias.unb.
14. 14
5. Darcy Ribeiro fala, no livro “Universidade para quê?”, das
invasões sofridas pela Universidade de Brasília. Sobre a
violação de direitos praticada pelo regime militar (1964-1985),
é correto afirmar que
a) a Lei Falcão permitiu a divulgação das críticas dos
partidos oposicionistas.
b) a Lei da Anistia garantiu a responsabilização criminal dos
agentes públicos envolvidos.
c) a Comissão da Verdade reinseriu o debate da questão do
autoritarismo na sociedade.
d) o Ato Institucional n° 5 restringiu a reprodução dos
abusos praticados pelo poder público.
e) o Serviço Nacional de Informação mediou os conflitos
ideológicos entre grupos de resistência.
4) A Comissão Nacional da Verdade (CNV) foi instituída em 16
de maio de 2012, com o objetivo de trazer à tona os crimes,
cometidos pelo Estado brasileiro entre os anos 1946 e 1988,
em especial durante a Ditadura Civil-Militar. Entre esses
crimes destacam-se a detenção ilegal ou arbitrária, a tortura,
a execução sumária, arbitrária ou extrajudicial e, por fim, o
desaparecimento forçado e a ocultação de cadáver. Tal como
aponta seu relatório publicado em dezembro de 2014, a CNV
situou o Brasil entre as dezenas de países que
[...] criaram uma comissão da verdade para lidar com o
legado de graves violações de direitos humanos. Com a
significativa presença que detém no cenário internacional, o
reconhecimentodoEstadobrasileirodequeoaperfeiçoamento
da democracia não prescinde do tratamento do passado
fortalece a percepção de que sobram no mundo cada vez
menos espaços para a impunidade.
Relatório da Comissão Nacional da Verdade. Disponível em
http://www.cnv.gov.br/images/pdf/relatorio/volume_1_digital.pdf.
Acesso em: 22 fev. 2015.
4. (UFU) O que justifica a criação de uma comissão com a
natureza da CNV é a necessidade de:
a) Reforçar o conteúdo da lei de anistia (nº 6683/1979), que
traz o perdão aos crimes políticos.
b) Combater a impunidade e revelar os crimes contra a
Humanidade para que deles não se esqueça.
c) Restabelecer a harmonia social a partir do perdão
bilateral entre os que combateram durante a Ditadura,
sem atribuir culpa ou instigar o revanchismo.
d) Virar uma página da história brasileira, aproveitando as
instituições que tiveram vigência no período da Ditadura,
pois contribuíram decisivamente para aperfeiçoar nossa
democracia.
5. (UEM) O Brasil tem uma trajetória singular no enfrentamento
do legado de violações de direitos humanos nos governos
militares entre 1964 e 1985. Apenas agora, 27 anos após o
retorno do poder aos civis, está sendo criada a Comissão
Nacional da Verdade, que, nos próximos dois anos, colherá
depoimentos de vítimas da repressão política e de agentes do
Estado acusados de crimes e, ao cabo do trabalho, publicará
um relatório narrando oficialmente as circunstâncias das
violaçõesepropondoaçõesparaquenãovoltemaacontecer.A
experiência brasileira é singular sob duas perspectivas. De um
lado, trata-se da mais tardia das comissões criadas por cerca de
40 países nas últimas décadas para apurar crimes praticados
durante ditaduras. De outro, o Brasil é um exemplo incomum
de país que tomou diversas iniciativas para reparar crimes,
como as indenizações a famílias de mortos pela ditadura e a
perseguição dos políticos, mas deixou a apuração dos fatos
para mais tarde.
MARQUES, F. O parto da memória. Pesquisa Fapesp, n.196, junho
de 2012, p.67.
A partir do texto citado e dos conhecimentos sobre o assunto,
julgue os itens.
(1) A Comissão da Verdade foi estabelecida sobre o princípio
de que a memória sobre o período da Ditadura Militar
(1964-1984) deve ser revisitada para o esclarecimento
de muitos conflitos sociais, ideológicos e políticos
relacionados ao nosso passado recente.
(2) O Brasil foi o único país no mundo a constituir uma
comissão para avaliar crimes cometidos durante um
período de ditadura.
(3) A Comissão da Verdade é uma iniciativa do Estado
brasileiro, pautada em demandas civis e políticas
de setores da população, partidos e movimentos
organizados.
(4) Sempre que uma ditadura é derrubada, o novo governo
adota medidas para apurar os crimes cometidos durante
aquele período.
Texto I
A palavra utopia, originalmente elaborada por Thomas
More, tem seu significado derivado do grego e corresponde a
“não lugar”, ou“lugar que não existe”.
Texto II
De fato, não importa nem mesmo que nenhuma utopia se
realize. Não é preciso. Só é preciso haver utopia.
RIBEIRO, Darcy. Universidade para quê? Brasília: UnB, 1.ed., 1986.
6. Darcy Ribeiro vincula a UnB com um projeto utópico por ela
representar
a) um sonho interrompido com a Ditadura Militar, sendo
impossível resgatar o projeto da década de 60.
b) um esforço de organização das ações frente o fatalismo e
o pessimismo reproduzidos pela realidade social e pelas
instituições de ensino superior.
c) um desafio impossível de ser realizado, numa autocrítica
feita pelo antropólogo quarenta anos depois da
inauguração da universidade.
d) o produto do desenvolvimento conquistado pelo País na
primeira metade do século XX, a UnB seria a expressão da
modernização nacional alcançada.
15. Filosofia
15
Obras de referência PAS/UnB - Literatura 3º série
TEXTO I - AUGUSTO DOS ANJOS - O MORCEGO
Meia-noite. Ao meu quarto me recolho.
Meu Deus! E este morcego! E, agora, vede:
Na bruta ardência orgânica da sede,
Morde-me a goela ígneo e escaldante molho.
“Vou mandar levantar outra parede ...”
— Digo. Ergo-me a tremer. Fecho o ferrolho
E olho o teto. E vejo-o ainda, igual a um olho,
Circularmente sobre a minha rede!
Pego de um pau. Esforços faço. Chego
A tocá-lo. Minh’alma se concentra.
Que ventre produziu tão feio parto?!
A Consciência Humana é este morcego!
Por mais que a gente faça, à noite, ele entra
Imperceptivelmente em nosso quarto!
ATIVIDADES
Julgue os itens de 1 a 8.
1. Quanto ao seu aspecto formal, o texto representa uma
reação à estética parnasiana, cuja preocupação primeira é com
a elaboração técnica do texto, traduzida pela expressão “arte
pela arte”.
2. A leitura do poema confirma a tendência renovadora do
autor: a desvinculação da palavra do compromisso com o belo,
pelo uso de vocábulos que a tradição julga antipoéticos.
3.Opoemaenfatizaum“eu”particularizado,bastantesubjetivo,
contrariando uma tendência do autor, o qual procura, na maior
parte de sua produção, uma abordagem mais universalizante.
4. A voz poética apodera-se de um recurso da prosa naturalista
pela utilização da imagem de um morcego.
5. O texto revela a sensação do inevitável, da impossibilidade
humana de escapar de sua própria consciência.
6. Enquanto percepção do mundo, o poema apresenta um
caráter doentio da sociedade especificamente moderna por
meio do gosto pelo macabro.
7. O texto representa realisticamente as dificuldades do
cotidiano sem associá-lo às reflexões de cunho existencial.
8. Observa-se, na obra de Augusto dos Anjos, o olhar clínico,
o comportamento analítico, até mesmo certa frieza, certa
impessoalidade científica.
9. Do hibridismo estético peculiar à literatura de Augusto dos
Anjos, a influência que, no poema, mais se destaca no soneto
é a:
a) romântica, na medida em que a condição humana é
profundamente idealizada.
b) realista, na medida em que a crítica social figura como
principal temática do poema.
c) barroca, na medida em que aspectos contrastantes são
deliberadamente harmonizados nos versos.
d) simbolista, na medida em que a condição humana é
percebida a partir de uma visão trágica e decadentista.
TEXTO II - MANUEL BANDEIRA - CONSOADA
Quando a Indesejada das gentes chegar
(Não sei se dura ou caroável),
Talvez eu tenha medo.
Talvez sorria, ou diga:
– Alô, iniludível!
O meu dia foi bom, pode a noite descer.
(A noite com os seus sortilégios.)
Encontrará lavrado o campo, a casa limpa,
A mesa posta,
Com cada coisa em seu lugar.
ATIVIDADES
Julgue os itens de 10 a 16.
10. As expressões“a Indesejada das gentes”,“iniludível”e“noite”
constituem eufemismos para a ideia de morte.
11. A inserção de um travessão (v. 5) representa a liberdade
formal cultivada pelos primeiros modernistas.
12. Há a expressão de uma segurança e uma certeza do futuro
do início ao fim do poema.
13. Manuel Bandeira fugiu completamente do combate e da
renovação estética promovida na primeira fase modernista.
14. Os versos finais sugerem uma tranquilidade do eu lírico
frente à vida que se findará.
15. O tom melancólico e subjetivo é marca do poeta, tido
pela nossa crítica como o “mais subjetivo dos primeiros
modernistas”.
16. A reação confusa do eu lírico (“Talvez eu tenha medo. /
Talvez sorria, ou diga:”) revela que, para ele, a morte é aceita,
mas não desejável.
17. Ao final do poema, o poeta revela:
a) Seu desencanto diante da vida que não pôde viver
normalmente por causa da doença.
b) Seu sentimento de religiosidade e fé diante da vida e da
morte.
c) Seu inconformismo diante do destino que a vida lhe
reservou.
d) Sua tranquilidade diante da morte por haver cumprido
seu papel na vida.
TEXTO III - CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE – A
NOITE DISSOLVE OS HOMENS
A noite desceu. Que noite!
Já não enxergo meus irmãos.
E nem tão pouco os rumores
que outrora me perturbavam.
A noite desceu. Nas casas,
nas ruas onde se combate,
nos campos desfalecidos,
a noite espalhou o medo
e a total incompreensão.
A noite caiu. Tremenda,
sem esperança… Os suspiros
acusam a presença negra
16. 16
que paralisa os guerreiros.
E o amor não abre caminho
na noite. A noite é mortal,
completa, sem reticências,
a noite dissolve os homens,
diz que é inútil sofrer,
a noite dissolve as pátrias,
apagou os almirantes
cintilantes! nas suas fardas.
A noite anoiteceu tudo…
O mundo não tem remédio…
Os suicidas tinham razão.
Aurora,
entretanto eu te diviso, ainda tímida,
inexperiente das luzes que vais acender
e dos bens que repartirás com todos os homens.
Sob o úmido véu de raivas, queixas e humilhações,
adivinho-te que sobes, vapor róseo, expulsando a treva
noturna.
O triste mundo fascista se decompõe ao contato de teus dedos,
teus dedos frios, que ainda se não modelaram
mas que avançam na escuridão como um sinal verde e
peremptório.
Minha fadiga encontrará em ti o seu termo,
minha carne estremece na certeza de tua vinda.
O suor é um óleo suave, as mãos dos sobreviventes se enlaçam,
os corpos hirtos adquirem uma fluidez,
uma inocência, um perdão simples e macio…
Havemos de amanhecer. O mundo
se tinge com as tintas da antemanhã
e o sangue que escorre é doce, de tão necessário
para colorir tuas pálidas faces, aurora.
ATIVIDADES
Julgue os itens de 18 a 25.
18. As metáforas (noite e aurora) comportam-se como um jogo
antitético de afastamento e de aproximação das duas faces
distintas do poema.
19. À medida que o medo, representado pela noite, sufoca
o eu lírico, a esperança, representada pela aurora, ainda que
tateando em meio a um terreno desacolhedor, representa a luz
das novas possibilidades de reconstrução.
20. O texto pertence à segunda fase de produção de autor,
marcada, sobretudo, pela investigação do indivíduo isolado
em seu contexto histórico e social.
21. Há no poema uma evidente crítica aos efeitos decorridos
da Segunda Guerra Mundial.
22. O verso“Havemos de amanhecer”traduz um sentimento de
desilusão e de pessimismo alimentado pelo eu lírico durante
todo o poema.
23. No poema, o resgate memorialista conduz à avaliação de
um cenário social em intensa desordem.
24. Para o eu lírico, a solidariedade é o recurso confiável para a
transformação de uma realidade desconcertada.
25. No texto, a crítica política cede espaço ao idealismo juvenil
que traça um retrato harmônico do mundo contemporâneo.
26. A fase de consolidação do Modernismo brasileiro
representou um amadurecimento de temas e formas, pois já
não havia mais a necessidade de uma renovação artística - ela
já fora alcançada. Assim, ao comparar o poema de Drummond
às produções heroicas, profundas mudanças no fazer poético
podem ser percebidas, pois o poeta
a) retoma a idealização da natureza presente em estéticas
do passado.
b) nega a liberdade formal alcançada pelos modernistas da
primeira geração.
c) realiza uma leitura crítica do contexto histórico e social
da época em que vive.
d) revela uma preocupação de ordem individual e particular
perante sua própria existência.
TEXTO IV - JOÃO CABRAL DE MELO NETO - TECENDO
A MANHÃ
Um galo sozinho não tece uma manhã:
ele precisará sempre de outros galos.
De um que apanhe esse grito que ele
e o lance a outro; de um outro galo
que apanhe o grito que um galo antes
e o lance a outro; e de outros galos
que com muitos outros galos se cruzem
os fios de sol de seus gritos de galo,
para que a manhã, desde uma teia tênue,
se vá tecendo, entre todos os galos.
E se encorpando em tela, entre todos,
se erguendo tenda, onde entrem todos,
se entretendendo para todos, no toldo
(a manhã) que plana livre de armação.
A manhã, toldo de um tecido tão aéreo
que, tecido, se eleva por si: luz balão.
In: MELO NETO, João Cabral de. Obra completa: volume único.
Org. Marly de Oliveira. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994, p.345.
(Biblioteca luso-brasileira. Série brasileira)
ATIVIDADES
Julgue os itens de 27 a 33.
27. A expressão “Um galo sozinho não tece a manhã” (v. 1)
aproxima-se, em estrutura e sentido, do ditado popular “Uma
andorinha só não faz verão”.
28. Na primeira estrofe, os galos convocam a manhã, que se
apresenta no verso dez e domina a segunda estrofe.
29.Aoorganizaroseudiscurso,oeulíricolimita-seaomomento
presente e à dimensão individual.
30. Pode-se aproximar o canto do galo “tecendo a manhã”
com o canto do poeta sendo tecido, verso a verso, fio a fio, no
poema.
31. Pode-se situar o poema como uma alegoria sobre a
identidade individual por meio de uma realização pessoal.
32. A preocupação do poeta com a estrutura do poema
apresentado permite aproximá-lo do conceito de
neoparnasiano.
33. Para João Cabral de Melo Neto, o engenheiro das palavras, o
fazer poético é semelhante a um ofício - não decorre, portanto,
somente da intuição, mas de um trabalho árduo e constante.
34. Sob a alcunha de“engenheiro das palavras”, João Cabral de
17. Filosofia
17
Melo Neto é tido pela crítica como um autor neoparnasiano.
Tendo como base o poema“Tecendo a manhã”, justifica-se essa
classificação, pois nota-se no poema o(a)
a) distanciamento do rigor formal.
b) uso preciosista da língua portuguesa.
c) defesa da arte como um fim em si mesma.
d) preocupação com a estrutura de seu poema.
e) discurso ideológico e político presente em seus versos.
TEXTO V - JORGE WANDERLEY - ESSES CHOPES
DOURADOS [FRAGMENTO]
[…]
quando a geração de meu pai
batia na minha
a minha achava que era normal
que a geração de cima
só podia educar a de baixo
batendo
quando a minha geração batia na de vocês
ainda não sabia que estava errado
mas a geração de vocês já sabia
e cresceu odiando a geração de cima
aí chegou esta hora
em que todas as gerações já sabem de tudo
e é péssimo
ter pertencido à geração do meio
tendo errado quando apanhou da de cima
e errado quando bateu na de baixo
e sabendo que apesar de amaldiçoados
éramos todos inocentes.
ATIVIDADES
Julgue os itens de 35 a 41.
35. No poema, o eu lírico expressa uma série de percepções de
atitudes e de valores situados na passagem do tempo.
36. O rigor formal e o preciosismo linguístico conferem o tom
engajado ao discurso poético.
37.Nota-senopoemaatemáticadaefemeridade,representada
nas convicções vistas, antes, como sólidas.
38. A liberdade formal e os traços de oralidade aproximam o
leitor da fala do eu lírico.
39. O eu lírico apresenta-se aflito frente à incerteza da mudança
por parte das futuras gerações.
40. Reduz-se o poema à abordagem da revolta das novas
gerações contra modelos tradicionais de educação.
41. A discussão sobre os choques de geração é uma temática
cara à literatura contemporânea.
TEXTO VI - HILDA HILST - POEMA AOS HOMENS DO
NOSSO TEMPO [FRAGMENTO]
Enquanto faço o verso, tu decerto vives.
Trabalhas tua riqueza, e eu trabalho o sangue.
Dirás que sangue é o não teres teu ouro
E o poeta te diz: compra o teu tempo
Contempla o teu viver que corre, escuta
O teu ouro de dentro. É outro o amarelo que te falo.
Enquanto faço o verso, tu que não me lês
Sorris, se do meu verso ardente alguém te fala.
O ser poeta te sabe a ornamento, desconversas:
“Meu precioso tempo não pode ser perdido com os poetas”.
Irmão do meu momento: quando eu morrer
Uma coisa infinita também morre. É difícil dizê-lo:
MORRE O AMOR DE UM POETA.
E isso é tanto, que o teu ouro não compra,
E tão raro, que o mínimo pedaço, de tão vasto
Não cabe no meu canto.
ATIVIDADES
Julgue os itens de 42 a 47.
42. O eu lírico critica o materialismo exacerbado, responsável
por impedir que os indivíduos percebam a riqueza que existe
na arte, nos sentimentos e na poesia.
43.Infere-se,nopoema,oapoioàbuscadoouro,metalprecioso
muito importante para o desenvolvimento da Humanidade.
44. A temática do amor não correspondido, presente no
poema, remete às idealizações propostas durante o período
romântico.
45. O eu lírico tece um elogio ao sentimentalismo exagerado, o
qual tenta se sobrepor às necessidades materiais, vistas como
menos importantes.
46. Nos versos “Trabalhas tua riqueza, e eu trabalho o sangue.
/ Dirás que sangue é o não teres teu ouro”, a palavra“sangue”é
utilizada para expressar a ideia de sacrifício.
47. Para distanciar-se do conflito estabelecido, o eu lírico
mantém uma postura impessoal diante das imagens
construídas.
48. Predomina no fragmento a função da linguagem:
a) emotiva.
b) metalinguística.
c) fática.
d) referencial.
TEXTO VII - CUTI - QUEBRANTO [FRAGMENTO]
às vezes sou o policial que me suspeito
me peço documentos
e mesmo de posse deles
me prendo e me dou porrada
às vezes sou o porteiro
não me deixando entrar em mim mesmo
a não ser
pela porta de serviço
[…]
às vezes faço questão de não me ver
e entupido com a visão deles
sinto-me a miséria concebida como um eterno
começo
fecho-me o cerco
sendo o gesto que me nego
a pinga que me bebo e me embebedo
o dedo que me aponto
18. 18
e denuncio
o ponto em que me entrego.
às vezes!…
ATIVIDADES
Julgue os itens de 49 a 54.
49. O poema de Cuti apresenta elementos que traduzem
experiências históricas de preconceito e violência.
50. O discurso do eu lírico revela uma identificação com o
discurso de seu opressor.
51. O texto apresenta a possibilidade da discriminação como
forma de fortalecimento de uma postura social.
52. O poema confere o tom engajado a partir da denúncia de
um passado de opressão e injustiças.
53. Processam-se, nos versos, uma perda de identidade e de
noção de pertencimento político.
54. O distanciamento do rigor formal e sintático auxilia o
discurso social pretendido pelo poeta.
TEXTO VIII - ANA CRISTINA CÉSAR - SONETO
Pergunto aqui se sou louca
Quem quer saberá dizer
Pergunto mais, se sou sã
E ainda mais, se sou eu
Que uso o viés pra amar
E finjo fingir que finjo
Adorar o fingimento
Fingindo que sou fingida
Pergunto aqui meus senhores
quem é a loura donzela
que se chama Ana Cristina
E que se diz ser alguém
É um fenômeno mor
Ou é um lapso sutil?
ATIVIDADES
Julgue os itens de 55 a 60.
55. No poema, o distanciamento das questões sociais e
ideológicas aproxima o discurso da vertente da“arte pela arte”.
56. O tom confessional dos versos confere uma atmosfera de
intimismo à voz do eu lírico.
57. Embora estruturado na forma fixa do soneto, o poema não
apresenta rimas e métrica regular.
58. A investigação de ordem existencialista traduz a
tranquilidade do eu lírico ao olhar para si mesmo.
59. A expressão“lapso sutil”, presente no último verso, pode ser
aproximada ao valor semântico de“epifania”.
60. A visão fragmentada sobre si mesma é mimetizada
formalmente em versos curtos, reticentes e alegóricos.
61. A dicotomia louca/sã, presente na primeira estrofe,
expressa:
a) a metáfora que sintetiza o perfil do eu lírico.
b) o paradoxo da busca por quem se é.
c) a antítese de ser“várias”em“uma só”.
d) o exagero daquela que ainda não conhece sua
personalidade.
TEXTO IX - JOÃO GUIMARÃES ROSA - O RECADO DO
MORRO [FRAGMENTO]
Ao sim, tinha viajado, tinha ido até princípio de sua terra
natural, ele Pedro Orósio, catrumano dos Gerais. Agora, vez,
era que podia ter saudade de lá, saudade firme. Do chapadão
— de onde tudo se enxerga. Do chapadão, com desprumo
de duras ladeiras repentinas, onde a areia se cimenta: a grava
do areal rosado, fazendo pururuca debaixo dos cascos dos
cavalos e da sola crua das alpercatas. Ou aquela areia branca,
por baixo da areia amarela, por baixo da areia rosa, por baixo
da areia vermelha — sarapintada de areia verde: aquilo, sim,
era ter saudade! O vivido velho dos vaqueiros, gritando galope,
encourados rentes, aboiando. Os bois de todo berro, marruás
com marcas de unha de onça. Chovia de escurecer, trovoava,
trovoava, a escuridão lavrava em fogo. E na chapada a chuva
sumia, bebida, como por encanto, não deitava um lenço de
lama, não enxurrava meio rego. Depois, subia um branco
poder de sol, e um vento enorme falava, respondiam todas
as árvores do cerrado — a caraíba, o bate-caixa, a simaruba,
o pau-santo, a bolsa-de-pastor. De lua a lua. Sempre corriam
as emas, os veados, as antas. Sonsa, nadava a sucurijú. Tanto o
gruxo de gaviões, que voavam altos, os papagaios e araras, e
a maria-branca cantava meiguinha, todo aquele arvoredo ela
conhecia, simples, saía pimpã do meio das folhas verdes com
um fiinho de cabelo de boi no bico. Ar assim farto, céu azul
assim, outro nenhum. Uma luz mãe, de milagre. E o coração e
corôodetudo,orealdaquelaterra,eramasveredasvivendoem
verde com o muito espelho de suas águas, para os passarinhos,
mil — e o buritizal, realegre sempre em festa, o belo-belo dos
buritis em tanto, a contra-sol.
ATIVIDADES
Julgue os itens de 62 a 73.
62. A descrição regional promovida pelo autor confere um ar
mítico ao espaço em que as ações são desenvolvidas.
63. O trecho resgata a cultura citadina e letrada do Brasil rural,
entendido como avançado e moderno.
64. A obra apresenta a musicalidade da fala sertaneja e
revitaliza recursos da expressão poética.
65. O fragmento apresentado traduz os costumes das
populações nordestinas, numa linguagem que muito se
aproxima da utilizada pelos escritores do fim do século XIX.
66. O vocabulário “ingênuo” e “espontâneo” das personagens
representa a bondade natural do ser humano, defendida
amplamente pelo autor.
67. A linguagem do narrador rompe as fronteiras entre prosa
e poesia ao aproveitar-se do estilo duro e seco da fala de suas
personagens.
68. Na obra, a tendência regionalista acaba assumindo a
característica de experiência estética universal.
69.EmGuimarãesRosa,ofolclórico,opitorescoeodocumental