1. Referendar é preciso …
Seremos Todos chamados, no próximo dia 30 do corrente mês,
a dizer SIM ou NÃO.
A quê?
De acordo com a deliberação da Assembleia Geral da
Ordem dos Advogados ocorrida no passado dia 26 de março, foi
aprovada a realização de um referendo, onde votaram
favoravelmente 3523 advogados (71%) e contra 1384 (28%),
tendo estado presentes ou representados 5465 advogados.
A questão colocada a referendo é a seguinte: “Deve o
Conselho Geral da Ordem dos Advogados no exercício das suas
competências, previstas no artigo 46.º, n.º 1, alínea c) do EOA,
propor a alteração legislativa do artigo 4.º do EOA, para que
este passe a ter a seguinte redação: ‘A Previdência Social dos
Advogados é obrigatória, cabendo a estes, individualmente,
decidir se a mesma é assegurada através do sistema público,
ou através da Caixa de Previdência dos Advogados e
Solicitadores (CPAS)’”.
Salvo melhor opinião, essa é uma falsa questão!
Se ganhar o NÃO, aparentemente tudo ficará como
dantes, ou seja, o Conselho Geral da Ordem dos Advogados não
terá que propor qualquer alteração legislativa do atual artigo
4.º do EOA, que reza assim: “A previdência social dos
advogados é realizada pela Caixa de Previdência Advogados e
2. Solicitadores nos termos das disposições legais e
regulamentares aplicáveis”.
Se ganhar o SIM, o Conselho Geral ficará vinculado a
propor à Assembleia da República, no prazo máximo de 6
meses, a alteração do artigo 4.º do EOA, nos termos
referendados, não produzindo efeitos, nos três anos
seguintes, quaisquer normas ou atos que contrariem o
resultado do referendo (artigo 26.º do EOA).
Não há classe mais informada do que a nossa
(“presunção e água benta …”).
Ora, estamos esclarecidos quanto ao que se pretende
e quanto ao que aí vem.
Não ignoramos que, neste momento, estão em
discussão dois Projetos de Lei (o Projeto de Lei n.º
614/XIV/2.ª, apresentado pelo Bloco de Esquerda e o Projeto
de Lei n.º 637/XIV/2.ª, proposto pelo Partido Socialista).
O primeiro daqueles Projetos de Lei pretende
proceder à extinção da CPAS e a consequente integração dos
beneficiários no regime geral da Segurança Social.
O segundo pretende, por ora, proceder à criação de
uma Comissão para a eventual integração da CPAS no regime
geral da Segurança Social.
Portanto, se o resultado do referendo for SIM, isso
será entendido como a maioria dos Advogados subscreve as
propostas de lei, pretendendo a integração no regime geral
da Segurança Social.
Sejamos claros. Não é plausível que possa vingar a
possibilidade legislativa de reconhecer ao Advogado,
enquanto indivíduo, de decidir por si, solitariamente, o
regime que de futuro pretenda escolher para lhe ser
aplicado, só a si.
A alternativa possível é só esta: mantém-se a CPAS
(para todos os Advogados) ou acaba-se com a CPAS (e todos
os Advogados serão integrados no regime geral da Segurança
Social para os trabalhadores independentes).
3. No momento em que se concluir que o Regime da
Previdência social da CPAS não pertence a Todos nós (e só a
nós), mas apenas a alguns (maioria ou minoria, pouco
importa) é acabar com a possibilidade de este regime
excecional prevalecer.
Lamento, pois, que a arte e o engenho não nos
tenham permitido encontrar a verdadeira questão a colocar,
a qual seria, sem rodeios, subterfúgios ou eufemismos, se os
Advogados pretendem ou não se integrar no Regime geral da
Segurança Social, acabando com a CPAS.
Se fosse essa a vontade da maioria, pois então que
assim fosse!
A cada um de nós caberia respeitá-la.
Tenho assistido – ávido – ao debate entre uns que
defendem o SIM e uns (que não outros) que defendem o
NÃO.
A discussão de ideias tem-se centrado na apreciação
comparativa entre o que o atual regime da Previdência
Assistencial da CPAS nos dá, oferece ou (rectius) nos
compensa com aquilo que o Regime Geral da Segurança
Social contribui para todos os outros trabalhadores
independentes por forma (des)igual.
Pelo SIM batem-se Colegas respeitáveis, invocando a
defesa de valores - que também muito prezo - da Liberdade
(que dizem de ‘escolha’) da Igualdade (de todos para todos e
não somente de Advogados para Advogados) e da
Independência (de cada Advogado e não de Todos, enquanto
classe).
Creio, no entanto, que o momento reclama União.
Precisamente pela Independência (de Todos,
enquanto Todos, porque só assim se conseguirá respeitar a
de cada um).
Sabemos que um dos princípios base da Deontologia
profissional é o da Independência.
4. No entanto, só seremos verdadeiramente
independentes (enquanto pessoa e advogado) se tivermos a
independência que o nosso Organismo profissional nos
permita ter.
Só seremos realmente independentes - o mesmo é
dizer, livres - se não dependermos do Estado, seja ele
autocrático ou totalitário, seja ele de Direito ou democrático.
Pelo lado do NÃO tenho lido, em defesa do atual
regime previdencial, que, comparativamente com o regime
geral, representa, aqui e ali, vantagens concretas e
específicas (nomeadamente, quanto à idade mínima da
reforma, quanto ao fundo de garantia, quanto a benefícios
assistenciais de maternidade e parentalidade, quanto à
comparticipação nas despesas de internamento hospitalar e
intervenções cirúrgicas …).
E, mais do que isso, acena-se com o perigo da
incerteza do futuro ao integramo-nos no regime geral da
Segurança Social.
Compreendo.
Não aceito, porém, que se mantenha tudo tal como
está. E julgo que Todos e cada um de nós pensa o mesmo.
Não, não é possível que nada mude.
A vontade expressiva de um grande número de
Advogados votantes na Assembleia Geral manifestou-se pela
mudança (ou pela possibilidade de mudança).
É evidente que as regras de contribuição para a CPAS
e os apoios previdenciais e assistenciais (sobretudo neste
período pandémico) não estão a satisfazer o universo dos
Advogados.
Há, pois, que aceitar a mudança e criar condições
para tanto.
Mas, deveremos saber fazê-la dentro do atual regime
de previdência social. Só assim será possível decidir o nosso
5. futuro e poder mudá-lo em benefício de nós próprios
e de Todos, quando e se for essa a nossa vontade. Apenas
poderemos mudar, se mantivermos a CPAS.
Decidir pelo SIM é acabar com a independência e a
liberdade de decidir o nosso futuro.
Ficaremos inexoravelmente dependentes do Estado.
Sem mais hipótese de escolher. Sem a autodeterminação do
regime previdencial que conquistámos.
Votar SIM é dizer NÃO àquela que é a bandeira da
liberdade acenada por aqueles que não querem manter o
regime atual.
Votar NÃO no próximo referendo é continuar a ter
liberdade de escolha e a independência para decidir o nosso
futuro, pessoal e profissional.
Não quero que se mantenha a mesma aparente
indiferença da CPAS perante os Colegas que têm sentido
enormes dificuldades financeiras e não só, sobretudo nesta
época negra que nos tem assolado.
Assim, melhor seria perguntar no referendo que se
avizinha: é preciso mudar as regras de contribuição para a
CPAS e dos apoios por esta concedidos?
Sim. O que, porém, só será possível se Todos juntos
exigirmos essa mudança no atual Regime Previdencial que é
só nosso.
Filipe Pimenta