O documento discute a transformação da educação escolar brasileira em resposta aos desafios da sociedade moderna. A nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996 conferiu maior autonomia às escolas e definiu os conteúdos com base em competências, habilidades e atitudes. As escolas têm adotado abordagens temáticas e multidisciplinares, com foco na formação para a vida e não apenas para o mercado de trabalho.
Teoria heterotrófica e autotrófica dos primeiros seres vivos..pptx
Escola Ideal
1. Uma revolução silenciosa está em curso nas salas de aula do Brasil. Não se trata de uma
retomada do movimento estudantil, para celebrar a chegada da geração 68 ao poder. Se
a luta do “companheiro” José Dirceu era contra a ditadura militar, a nova batalha é pela
transformação da escola. Uma revolução ainda mais complexa, pois traz implicações
culturais profundas e duradouras. Espelho e reflexo do mundo, a escola sabe que precisa
se adaptar à nova realidade da sociedade da informação, na qual o conteúdo está ao
alcance de um clique de mouse e a dificuldade de concentração dos jovens é crescente.
Um mundo de incertezas, com profissões cada vez mais voláteis, no qual o fantasma do
desemprego é responsável por noites insones e crises de depressão. Hoje, o simples
acúmulo de conhecimentos não é garantia de sucesso profissional. É preciso saber lidar
com a informação, para construir uma visão crítica da realidade e desenvolver
habilidade para a reciclagem permanente.
Educar para o mercado ou educar para a vida? Afinal, qual o papel da escola no século
21?
Em sintonia com os novos tempos, o governo Fernando Henrique Cardoso editou a
nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação, em dezembro de 1996. O documento,
talvez a mais importante realização da gestão do então ministro Paulo Renato Souza
(leia artigo na página 14), confere maior autonomia às escolas. Sob o conceito que a
educação escolar deve se vincular “ao mundo do trabalho e à prática social”, a LDB traz
modificações profundas. A principal delas é a própria definição de conteúdo. “Antes, o
conteúdo era o programa. Com a nova LDB, os conteúdos têm face tripla:
competências, habilidades e atitudes”, afirma Sônia Bittencourt, 53 anos, diretora
pedagógica do Colégio Porto Seguro, uma das escolas mais tradicionais de São Paulo,
que completa 125 anos no próximo dia 20 de setembro. “É competente quem sabe
aprender. A escola deve ensinar o aluno a buscar a informação.
A habilidade está relacionada ao fazer, que significa utilizar os conceitos e as
competências adquiridas. “E a atitude é aprender a ser, a conviver”, diz Sônia. Saber,
fazer e ser: eis a tríade que deve nortear a formação do aluno na escola contemporânea.
Se o discurso está afiado, sua prática é complexa. “A escola está saindo de um conceito
de educação a caminho de outro modelo. Mas nem adianta querer voltar atrás, pois esse
movimento não tem retorno”, afirma Mirza Laranja, 39 anos, diretora pedagógica do
Colégio Augusto Laranja. O novo gera perda de controle e, como todo processo de
mudança, causa insegurança. “Na verdade, a luta é muito mais pela transformação de
valores dos pais que dos alunos”, diz Alejandro Gabriel Miguelez, 28 anos, professor de
português do Colégio Santo Cruz. De fato, a aula expositiva com giz e quadro-negro, na
qual o professor é o todo-poderoso que detém o conhecimento, está com seus dias
contados. E é natural que os pais tenham dificuldade em compreender a nova realidade
do ensino, afinal a escola deles era muito diferente, não só na dinâmica de aula –
marcada pela passividade em relação aos conteúdos –, como na própria relação de poder
e afeto com o “mestre”.
A democratização do acesso à informação promoveu o redimensionamento do poder na
relação aluno-professor. Se antes o conteúdo era despejado de cima para baixo, num
exemplo de hierarquia tipicamente vertical, o novo paradigma exige a troca de
experiências, baseada numa relação mais horizontal. O “professor-sabe-tudo” faz parte
do passado. Tomemos um exemplo prático. Digamos que o assunto da aula de história
2. seja a Guerra de Canudos. Ao digitar essas palavras no Google, ferramenta de busca
mais popular da internet, descobre-se que há quase 7 mil páginas sobre o tema!!! Como
lidar com essa nova realidade? Como preparar os alunos para ter capacidade de
discernimento, para avaliar criticamente esse inesgotável universo de informações,
muitas vezes conflitantes? “O momento de passar a informação é de menor valia na sala
de aula; o fundamental é ir além disso”, afirma Mirza, para quem a autoridade do
professor decorre da qualidade da aula, e do seu relacionamento com os alunos.
O desafio da educação é complexo e depende, sobretudo, da capacidade do professor se
(re)adaptar à nova realidade. Uma piadinha que circula entre pedagogos resume o
antimodelo de educador: quando um professor se vangloria de ter 30 anos de
experiência, normalmente ele quer dizer que tem um ano de experiência e 29 anos de
repetição! Mas não sejamos tão severos com os "mestres". Assim como não é simples
convencer os pais de que o mundo mudou e a escola deve acompanhar essa
transformação, o mesmo se aplica aos professores. Há resistência à mudança. “É muito
difícil ser professor hoje, pois os alunos estão sedentos, muito mais estimulados e
criativos. Não é todo professor antigo que encara os novos desafios”, diz Mirza. “Temos
de trabalhar a consciência do professor”, afirma Sônia. Atentas às demandas de seus
alunos, as escolas particulares investem grande parte de seus lucros na (re)educação de
professores.
Reciclagem permanente não é uma moda passageira, mas uma realidade que se aplica a
todas profissões. Não poderia ser diferente com o professor. Uma frase do ministro
Cristóvão Buarque, cuja gestão à frente da pasta da Educação tem como objetivo
primordial a valorização do professor, é emblemática: “Diploma deveria vir com prazo
de validade, como qualquer outro produto perecível”. No âmbito da escola, é preciso
reeducar os educadores para que o aluno possa, como diz Paulo Freire, aprender a “ler o
mundo”. E, com isso, “estabelecer um diálogo pró-ativo com a sociedade, pois o colégio
não é um fim em si mesmo”, diz Paulo Henrique Camargo Rinaldi, 49 anos, diretor-
geral do Colégio Rio Branco. Tudo muito bonito e edificante. Mas, afinal, qual é a cara
dessa nova escola? O que ela tem de tão diferente do modelo antigo?
A nova LDB permite que as escolas definam parte de seu conteúdo programático. Com
isso, há a possibilidade de criação de aulas diferenciadas. Esportes, música, teatro,
culinária, marcenaria, filosofia... A lista de cursos oferecidos pelas escolas particulares
de São Paulo é ampla e diversificada. Mas a verdadeira revolução são as aulas
temáticas, que envolvem professores de várias disciplinas para estudar um determinado
assunto. Tome-se como exemplo a recente invasão anglo-americana do Iraque. Na aula
de história, o professor analisa a formação dos estados árabes; na de geografia, a
importância do petróleo na geopolítica mundial; na de ciências, as alternativas
energéticas que existem para substituir o combustível fóssil; na de economia, o impacto
dos custos militares da invasão na economia mundial.
E assim por diante. Essa abordagem multidisciplinar permite ao aluno obter uma noção
do todo e, com isso, refletir criticamente sobre a questão. A prática de aulas temáticas
ou multidisciplinares já é uma realidade em colégios como Augusto Laranja. Em outros,
como Santa Cruz, Carlitos e Escola da Vila, amplos temas são investigados em projetos,
que muitas vezes duram um ano inteiro.
3. No Santa Cruz, por exemplo, há quatro projetos nos dois primeiros anos do ensino
médio. Um deles é “Amazônia: da terra firme ao igapó”; os alunos visitam a Amazônia,
estabelecendo um intercâmbio cultural com as populações ribeirinhas; para se preparar,
tem dez aulas antes da viagem, para estudar vários aspectos relacionados ao tema; na
volta, em virtude do conjunto de vivências e conhecimentos adquiridos, mais dez aulas
encerram o projeto, que tem o objetivo de desenvolver a ética e a cidadania nos alunos
do Santa Cruz, colégio cinqüentenário que valoriza a formação humanista. O projeto
“Vida urbana no século 21”, da Escola da Vila, é um ótimo exemplo de atividade
temática multidisciplinar. O projeto, que se desenvolve ao longo do segundo ano do
ensino médio, reúne sete professores de diferentes disciplinas, que, em duas aulas
semanais, propõem a discussão de um tema.
Nos primeiros dois meses, há uma etapa de imersão, na qual os alunos lêem textos,
assistem a vídeos, entrevistam profissionais e saem a campo para identificar problemas.
“O objetivo é sensibilizar o aluno”, afirma Divino Marroquini, 43 anos, professor de
química e coordenador do projeto. Devido ao interesse despertado pela pesquisa,
subtemas são levantados e os alunos, em grupos menores, começam a elaborar as
questões que devem ser discutidas, sob orientação de um professor. No fim de agosto,
entregam uma monografia, que é apresentada não apenas aos colegas, mas também aos
pais e profissionais convidados, num grande evento noturno. No último trimestre, cada
grupo desenvolve um site, coroando um ano de intenso trabalho. “O principal objetivo
do projeto é colocar os alunos em contato com a realidade, fazendo com que escolham
algo para estudar e gerenciem o próprio tempo de estudos. Um segundo objetivo é
aproximar com o mercado de trabalho”, diz Marroquini.
Ao abordar uma temática real, o aluno percebe que há vários conhecimentos necessários
para dar conta de um determinado assunto. E isso gera um ganho motivacional muito
grande. Como em todo processo de descoberta, nem tudo são flores. “O processo é
intenso. No início há crises tremendas, com dificuldade na escolha, uma exigência às
vezes muito grande com o próprio texto. Mas a realização é enorme e os pais
concordam que é o trabalho mais importante desenvolvido pelo filho ao longo de sua
vida escolar”, afirma o coordenador do projeto. Rodrigo Sampaio Primo, 17 anos, é
aluno do terceiro ano do ensino médio. Em 2002, desenvolveu projeto ligado à área de
educação. “A idéia era entrar em contato com um novo universo. Estudei o ensino dado
a alunos especiais na escola pública. No começo, eu não sabia onde estava pisando. Mas
foi superimportante, pois vivenciei uma situação prática, que me permitiu refletir sobre
educação”, diz Primo.
“Não sei se vou fazer faculdade de sociologia ou pedagogia, mas, hoje, tenho mais claro
que quero trabalhar com alguma coisa ligada à educação”, afirma. “Tenho amigos que
estão na faculdade e comentam que seus colegas de outras escolas chegam à
universidade despreparados; geralmente vêm de escolas que são fechadas para o
vestibular; o cara passa e aí?”, diz Primo.
O aluno da Escola da Vila põe o dedo na ferida: de que adianta a escola formar alunos
para passar no vestibular se a vida é muito mais complexa? A questão remete à velha,
estreita e preconceituosa visão de que escolas “tradicionais” são disciplinadoras, fortes e
preparam para o vestibular, enquanto escolas “liberais” são antros de rebeldia, fracas e
não fornecem “base acadêmica” para um bom desempenho no vestibular. Daí, voltamos
à questão inicial: a escola do século 21 deve educar para o mercado ou para a vida?
4. “Educar para a vida significa preparar para enfrentar os desafios do novo milênio, o que
inclui os desafios do mercado de trabalho; não existe mercado sem vida e vice-versa”,
afirma Roberto Nasser, 53 anos, coordenador de orientação profissional do Colégio
Bandeirantes. Rinaldi, do Rio Branco, parece concordar: “Mercado e vida são
complementares”. Já Sônia, do Porto Seguro, é categórica: “A educação básica, até o
ensino médio, tem de formar para a vida”.
Miguelez, do Santa Cruz, tem opinião similar: “Educamos para a vida; será mercado na
medida em que o mercado se preocupar com a vida”. Mirza, do Colégio Augusto
Laranja, fornece uma pista valiosa: “Educar para a vida e para o trabalho às vezes é a
mesma coisa. Muitas vezes o indivíduo que tem sucesso profissional foi líder do
grêmio, participou de uma série de atividades não-acadêmicas”. Faz sentido. Num
mundo de incertezas, no qual mais de 50% das profissões nem sequer existiam 30 anos
atrás, a escola deve se preocupar em formar cidadãos pensantes e atuantes, que tenham
capacidade de fazer escolhas e arcar com as conseqüências de seus atos.
A discussão escola tradicional/ forte x escola liberal/fraca é inócua, pois parte de
preconceitos arraigados, sobretudo nos pais. É óbvio que nem todas as escolas são
iguais, afinal as pessoas também são diferentes. Como a escolha da escola dos filhos é
uma decisão de extrema importância, é prudente deixar os preconceitos de lado e
identificar, com honestidade, um colégio que vá de encontro à sua visão de mundo, que
compartilhe os mesmos valores profundos que conferem sentido à vida. No mundo
atual, a informação está disponível. É preciso aprender a lidar com ela. Vale lembrar
que o próprio exame vestibular tende a se aprimorar, afastando-se da tradicional
“decoreba” para se tornar uma prova mais compreensiva, a exemplo do que já ocorre
com o Enem, o Exame Nacional do Ensino Médio.
A educação escolar é um processo longo. Nas escolas particulares, o aluno passa, em
média, 15 anos até completar o ensino médio. “Há coisas que não são agradáveis no
meio do processo. A escola não pode ser chata, mas sim um desafio”, defende Mirza.
“Aprender brincando é uma experiência muito rica. Alguns conteúdos são árduos, mas a
fixação é mais natural”, afirma Isabel Moniz, coordenadora pedagógica do ensino
fundamental I da Escola Carlitos. O desafio de modernizar a escola gera várias
incertezas. Mas é inegável que estudar está cada vez mais divertido.
Tamanho é documento?
Qual o número ideal de alunos por sala de aula? Para tentar responder a essa pergunta, a
revista Scientific American promoveu uma discussão entre quatro pesquisadores
americanos de prestígio. Após avaliarem uma série de estudos que relacionam o número
de alunos por sala com o desempenho acadêmico, todos admitem que ainda é cedo para
tirar conclusões.
Para Ronald Ehrenberg, professor da Universidade de Cornell, classes menores têm
levado a resultados mais significativos em escolas freqüentadas por “minorias”, como
negros e hispânicos. A hipótese levantada é que, como essas crianças têm, na média,
lares menos estruturados – maior número de pais separados, menor nível de renda, e
5. escolaridade mais baixa –, uma sala de aula menor significa maior chance de integração
social e, conseqüentemente, melhor desempenho acadêmico.
A conclusão mais relevante do estudo, contudo, é que a simples redução do número de
alunos por sala não é condição suficiente para melhorar o nível de ensino. Tudo
depende da forma como o professor se adapta à nova realidade. Se o mestre já está
habituado a trabalhar com pequenos grupos, o efeito tende a ser positivo, uma vez que,
devido ao menor número de alunos por turma, a dedicação a cada criança é
potencialmente maior. Mas, se o professor é fiel ao método tradicional de ensino –
baseado em aulas meramente expositivas –, o efeito tende a ser desprezível. Isso apenas
confirma o aforismo do ministro da Educação, Cristovam Buarque, para quem, em
educação, “o professor é 99% mais um”. Tudo depende dele.
Em seu artigo 25, a Lei de Diretrizes e Bases diz: “será objetivo permanente das
autoridades responsáveis alcançar relação adequada entre o número de alunos e o
professor”. Trocando em miúdos, a LDB deixa a critério da escola estabelecer o número
de alunos por sala. Nos principais colégios particulares de São Paulo, o número de
alunos por classe nada mais é que um indicativo da postura pedagógica de cada
instituição. No ensino médio, escolas tradicionais, como Bandeirantes e Rio Branco,
chegam a ter classes com mais de 40 alunos, enquanto as liberais, como Escola da Vila
e a Carlitos, têm, no máximo, 25 por turma.
Mas, atenção, o número de alunos por sala é apenas um referencial, que não deve ser
avaliado isoladamente. Afinal, turmas menores ou maiores não garantem a qualidade do
ensino, muito menos balizam o desenvolvimento social e afetivo do seu filho. Tudo
depende da interação família-escola, na qual a visão de mundo dos pais e as habilidades
específicas de cada criança são os itens mais relevantes. Em tempo: nos Estados Unidos,
as salas têm, em média, 24 alunos; e, na Califórnia, são apenas 20.
Na prática a, teoria é outra
Conheça as idéias centrais de alguns dos principais pensadores da educação
A complexidade do mundo contemporâneo exige o aperfeiçoamento permanente do
método pedagógico adotado em sala de aula. Os educadores tendem a concordar que os
princípios pedagógicos de pensadores da educação – como Jean Piaget e Lev Vygotsky
– foram elaborados há várias décadas e não se aplicam totalmente aos alunos da
sociedade da informação. Por isso, na prática, a maioria das escolas brasileiras adota um
método pedagógico que se apropria de teorias dos principais filósofos da educação, sem
seguir à risca a cartilha de nenhum deles. O resultado é que, nesse aspecto, o discurso
das escolas é muito parecido, dificultando a tarefa dos pais de avaliar corretamente o
estilo de educação oferecido pelas instituições de ensino. Ainda assim, conhecer os
princípios pedagógicos que norteiam o ato de educar é parte importante no processo de
escolher a escola do seu filho.
Conheça aqui as idéias centrais de quatro dos filósofos da educação que mais
influenciam a pedagogia nacional: Jean Piaget, Lev Vygotsky, Maria Montessori e o
brasileiríssimo Paulo Freire.
6. PIAGET
"O conhecimento é fruto da experiência"
O suíço Jean Piaget (1896-1980) é conhecido como o “pai” do construtivismo na
educação. Ainda que seu trabalho tenha se centrado na elaboração de uma teoria do
conhecimento, com a publicação de A Linguagem e o Pensamento na Criança (1923),
Piaget passou a ter seu nome definitivamente associado à prática pedagógica. Para ele, a
criança se desenvolve na relação com o meio, por meio da construção e permanente
reconstrução de hipóteses para explicar o mundo que a cerca. O papel do professor é
compreender e respeitar o nível de desenvolvimento de cada criança, em esforço
permanente para não ir além de suas capacidades, nem deixá-la agir sozinha, mas
oferecendo instrumentos para que ela possa construir o conhecimento. Para Piaget, o
desenvolvimento cognitivo da criança é fruto da sua interação com o mundo físico e
social. A construção da autonomia moral é um conceito-chave da teoria piagetiana.
SAIBA MAIS
O Nascimento da Inteligência na Criança Jean Piaget, LTC, 389 págs., R$ 61
Piaget ou a Inteligência em Evolução Jacques Montangero e Danielle Maurice-Naville,
Artmed, 246 págs., R$ 41
A Difusão das Idéias de Piaget no Brasil Mário Sérgio Vasconcelos, Ed. Casa do
Psicólogo, 285 págs., R$ 28
VYGOTSKY
"O aprendizado é fruto da interação social"
As idéias do bielo-russo Lev Vygotsky (1896-1934) foram censuradas e só começaram
a ser difundidas no Ocidente a partir dos anos 60. No Brasil, Vygotsky chegou ainda
mais tarde, no início da década de 80, mas exerce crescente influência entre educadores
no país. Sua “rebeldia” foi desprezar tanto o “inatismo” (a pessoa já nasce com
inteligência predeterminada), quanto o “empirismo” (a pessoa é fruto apenas das
experiências às quais é submetida), ao defender uma terceira via, “sociointeracionista”,
na qual o aprendizado é indissociável do desenvolvimento do ser humano. Para ele, o
indivíduo não nasce “pronto”, tampouco é simples cópia do ambiente externo. A
trajetória da evolução intelectual é resultado de uma interação permanente de processos
internos com as influências do mundo social. Quanto maior o aprendizado, maior o
desenvolvimento. Mas isso não quer dizer que o saber “enciclopédico” deve ser
valorizado.
Afinal, para Vygotsky, o real aprendizado se dá quando as informações fazem sentido
para o indivíduo, que está necessariamente inserido num dado contexto social.
SAIBA MAIS
A Formação Social da Mente Lev Vygotsky, Martins Fontes, 191 págs., R$ 24,50
7. Vygotsky em Foco: Pressupostos e Desdobramentos Harry Daniels, Papirus, 296 págs.,
R$ 35
Vygotsky: uma Perspectiva Histórico-Cultural da Educação Teresa Rego, Vozes, 138
págs., R$ 13,20
MONTESSORI
"É preciso seguir a criança"
A vida da italiana Maria Montessori (1870-1952) foi extraordinária. Entre outras
proezas, tornou-se a primeira médica de seu país, em 1896. Seu método pedagógico,
que ganhou fama mundial pela eficiência em alfabetizar crianças, chamou a atenção de
Mussolini. Por não compactuar com o fascismo, Montessori abandonou a Itália. Durante
a Segunda Guerra Mundial, esteve na Índia, a convite de Mahatma Gandhi, em trabalho
de educação para a paz que lhe rendeu duas indicações ao Prêmio Nobel. Com o
armistício, Montessori se estabeleceu na Holanda, onde criou a Associação Montessori
Internacional (AMI). Sua pedagogia consiste em “observar e seguir a criança”, com
base três princípios: atividade, individualidade e liberdade. Para Montessori, a criança
aprende com facilidade quando o processo educacional é agradável. Diz a lenda que,
certa vez, um adulto perguntou a um de seus alunos: “Então esta é a escola onde vocês
fazem o que gostam?”, e a criança respondeu: “Não. Aqui nós gostamos do que
fazemos”.
Montessori sonhava em formar pessoas autônomas, por meio da interação harmônica
entre corpo, inteligência e vontade.
SAIBA MAIS
The Montessori Method (em inglês) Maria Montessori, Dover, 377 págs., US$ 7,95
Educação Montessori: de um Homem Novo para um Mundo Novo Izaltina de Lourdes
Machado, Pioneira, 92 págs., R$ 25
Estudo do Sistema Montessori Vera Lagoa, Loyola, 188 págs., R$ 16,70
FREIRE
"Educar é ensinar a ler o mundo"
O recifense Paulo Freire (1921-1997) é o maior pensador brasileiro da educação. O
reconhecimento internacional teve início com a publicação de Pedagogia do Oprimido
(1968), obra na qual defende o processo educativo como ato político. Segundo Freire,
não há educação neutra; para libertar as classes oprimidas, é preciso promover uma
efetiva troca entre professores e alunos. O educador combatia o que chamava de
“educação bancária”, sistema por meio do qual o professor simplesmente despeja
conhecimentos sobre o aluno, gerando alienação. Segundo Freire, “ninguém ensina nada
a ninguém, mas as pessoas não ”. Democracia no âmbito da escola é um conceito-chave
na pedagogia de Paulo Freire. Alunos devem ter voz ativa no grupo, assim como
professores e, sobretudo, a comunidade na qual a escola está inserida. Para Freire, antes
8. de ensinar a ler e a escrever, a escola tem a missão de fornecer elementos para que a
criança possa “ler o mundo”.
Preocupado com políticas públicas de ensino, Paulo Freire foi secretário de Educação
do município de São Paulo, na gestão petista da prefeita Luiza Erundina; defendeu a
implantação da escola-cidadã e, sobretudo, a valorização do professor, idéias hoje
difundidas em todo o país.
SAIBA MAIS
Pedagogia do Oprimido Paulo Freire, Paz e Terra, 218 págs., R$ 24
Pedagogia da Esperança: um Reencontro com a Pedagogia do Oprimido Paulo Freire,
Paz e Terra, 245 págs., R$ 27,50
Alfabetização: Leitura do Mundo, Leitura da Palavra Paulo Freire e Donaldo Macedo,
Paz e Terra, 167 págs., R$ 20,50
Idéias em debate
Como definir a escola ideal? Para iluminar o debate sobre educação em nosso país,
ouvimos três das maiores autoridades brasileiras no assunto. Confira o que eles dizem
CRISTOVAM BUARQUE
“O professor é o centro do processo de educação”
MERCADO X VIDA
“O mercado faz parte da vida. Não se pode ignorar que o cidadão tem de entrar no
mercado de trabalho. Então, devemos formar para a vida, levando em conta essa
realidade.”
A ESCOLA IDEAL
“Do ponto de vista da cidade, a escola ideal é aquela na qual toda criança estuda numa
escola que tem bons equipamentos – como computadores, bibliotecas e merenda
satisfatória – e ótimos professores. Para isso, o professor deve estar motivado, bem
formado e preparado. Num plano mais individual, ninguém sabe qual a escola ideal no
mundo contemporâneo, pois o mundo está mudando muito.”
TECNOLOGIA
“É o professor que forma, não o computador. Através dos tempos, foi o quadro-negro
que transmitiu o conhecimento. Devemos encarar o computador como um quadro-negro
que se move.”
A IMPORTÂNCIA DO PROFESSOR
9. “O elemento central do processo de educação é o professor. No ensino básico, o
professor brasileiro é um dos que menos ganha em todo o mundo, quando comparamos
sua remuneração com os salários dos profissionais de outras áreas. Estamos investindo
na formação do professor. Criamos o Exame Nacional dos Professores, um sistema de
educação permanente para o professor, bolsas para aqueles que fazem o exame e um
sistema de gratificação.”
CONTEÚDO
“Antes, o conhecimento era estoque. Hoje é fluxo, está em constante mutação.”
EDUCAÇÃO CONTINUADA
“O que se aprende hoje, amanhã pode não ter valor. Por isso, o diploma vale por um
tempo. Se a pessoa não continua estudando, o diploma perde a validade. Eu estudei
engenharia mecânica há 30 anos. Outro dia vi uma cadeira de rodas inovadora. Minha
formação foi mais próxima de Isaac Newton que da tecnologia utilizada para
desenvolver a cadeira de rodas.”
Cristovam Buarque é ministro da Educação, senador pelo Distrito Federal e professor da
Universidade de Brasília (UnB). Foi reitor da UnB (1985-1989) e governador do
Distrito Federal (1995-1998)
PAULO RENATO SOUZA
“É essencial que a escola ensine a aprender”
EDUCAÇÃO CONTINUADA
“Vivemos a era do conhecimento, que evolui numa velocidade sem precedentes. A
tecnologia dá saltos cada vez mais freqüentes. É preciso acompanhar essas mudanças
para estar inserido na sociedade. Trabalhar, consumir e participar da vida social exigem
que a pessoa tenha acesso à educação permanente, ao longo da vida.”
O PAPEL DA ESCOLA
“Antes, a escola de educação básica podia pretender transmitir o conhecimento e até
mesmo a ‘decoreba’ era um instrumento freqüentemente utilizado. Hoje, isso não é mais
possível. Nessa etapa da vida, é essencial que a escola passe a ensinar as crianças e os
jovens simplesmente a aprender. Desenvolver o raciocínio, o pensamento crítico, a
capacidade de pensar, eis os grandes objetivos pedagógicos da escola na era do
conhecimento. Ler e escrever muito são duas velhas práticas que mais do que nunca
devem estar presentes na escola.”
O CONTEÚDO
“A interdisciplinaridade, a contextualização do conhecimento e o desenvolvimento de
habilidades e competências substituíram os velhos conteúdos de disciplinas estanques.”
FAMÍLIA E ESCOLA
10. “A educação integral da criança e do jovem é uma tarefa da família e da escola. Nesse
sentido, é essencial que a escola tenha muito clara sua missão no desenvolvimento dos
princípios éticos e morais e do respeito pelo outro, assim como no desenvolvimento da
responsabilidade social da pessoa. A disciplina é necessária, mas o arbítrio e o
autoritarismo devem ser banidos do ambiente escolar.”
TECNOLOGIA
“É preciso que a escola passe a usar crescentemente o computador e o acesso à internet
como instrumentos de acesso à informação e ao conhecimento. Isso é importante na
escola privada, e mais ainda na escola pública.”
Paulo Renato Souza é consultor. Doutor em economia pela Unicamp, foi ministro da
Educação no governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), reitor da Unicamp e
secretário de Educação do Estado de São Paulo (1983-1987)
GUIOMAR NAMO DE MELLO
“Hoje, conteúdo não é fim, mas sim meio”
MERCADO X VIDA
“É uma pretensão matricular uma criança na pré-escola com a idéia de ter controle sobre
o que existirá em 15 anos. Vivemos num momento de incertezas muito grandes. As
profissões mudam cada vez mais depressa. As escolas lidam com dificuldade com essa
questão, pois a aspiração dos pais é garantir sucesso profissional aos filhos. Os
professores dizem que os pais exigem um ensino que prepare para o vestibular. Mas
olhar apenas para o vestibular é ver a educação de modo pouco generoso.”
O PAPEL DA ESCOLA
“Hoje, conteúdo não é fim, mas sim meio. A escola deve preparar para conviver num
clima flexível; quanto mais básicas as capacidades, melhor. É fundamental desenvolver
o domínio das linguagens da tecnologia, da arte, do corpo; trabalhar em conjunto;
compartilhar conhecimento; gerenciar coletivamente a informação; aprender a
solucionar problemas. Conhecimento é algo social; a informação pode ser adquirida
solitariamente, mas o conhecimento com significado social só existe na relação com o
outro. O objetivo da educação é formar pessoas virtuosas.”
TECNOLOGIA
“A tecnologia deve ser aplicada para levar à inteligência. E isso é uma habilidade
cognitiva que pode ser desenvolvida com ou sem computador. O ‘humanware’ é
programado para usar a informação de modo inteligente, com ou sem hardware.”
EDUCAÇÃO CONTINUADA
“A tendência, no mundo todo, é diminuir o número de anos da formação inicial, e
estudar, reciclar, sempre.”
11. DISCIPLINA
“A disciplina é um eterno problema. Afinal, mesmo o pai mais liberal não diz só sim,
nem o pai mais rígido diz apenas não; na verdade, os filhos existem para fazer você
entrar em contradição.”
Guiomar Namo de Mello é diretora executiva da Fundação Victor Civita e membro do
Conselho Nacional de Educação-Câmara de Educação Básica. Pedagoga com pós-
doutorado pela London University, foi secretária de Educação de São Paulo (1982-
1985)