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O tema do meio ambiente e seu tratamento
multilateral são para o Brasil questões
fundamentais, não apenas pelo interesse
internacional e pelas crescentes implicações que
vemos das atividades humanas sobre o meio
ambiente, mas sobretudo pelo fato de estar
vinculado ao tema do desenvolvimento – que
permanece como a grande necessidade e
aspiração nacional. A questão ambiental é hoje
ineludível em vários campos da atividade
humana e constitui sem dúvida uma das áreas
que compõem a “agenda da opinião pública”
contemporânea.
No campo internacional, o Brasil tem um
papel importante a desempenhar no que diz
respeito ao bom encaminhamento das questões
ambientais. Isso se deve tanto à transcendência
do tema para uma necessidade interna básica –
o desenvolvimento nacional – quanto à nossa
condição própria – talvez única – de país de
grandes dimensões e potencialidades, mas
também de imensos contrastes econômicos e
sociais.
Contamos, em alguns setores, com
características de país industrializado e em
outros apresentamos graves índices de pobreza.
Tais condições, se representam um grande
desafio interno, representam também
possibilidades externas, em termos tanto de
acesso a recursos e tecnologia quanto de
influência positiva e moderadora em favor de
consensos que atendam às prioridades dos
países em desenvolvimento e que encaminhem
de forma construtiva as grandes questões
ambientais tratadas no plano internacional.
Tem o Brasil, assim, um diálogo frutífero tanto
com os países em desenvolvimento quanto com
os países desenvolvidos.
Por todas essas razões, o Brasil é sempre
visto como um dos principais atores nas
tratativas internacionais sobre esses temas e
nossas posições são, invariavelmente, acolhidas
com respeito e atenção. Essa percepção decorre
de nossas credenciais próprias, ligadas ao peso
político e econômico do país, mas também das
riquezas e da diversidade de nosso patrimônio
ambiental.
No tratamento de temas afetos ao meio
ambiente e ao desenvolvimento sustentável é
imprescindível abordar a Conferência das
Nações Unidas sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento – a Conferência do Rio, de
1992. A Conferência do Rio mudou o eixo da
discussão sobre o desenvolvimento ao
contextualizá-la numa visão global que coloca
as relações Norte-Sul sob o signo da
cooperação. No Rio de Janeiro, há quase dez
anos, escreveu-se uma das páginas mais
significativas do multilateralismo e da
determinação dos povos de buscar um futuro
comum fundado na paz e na construção da
prosperidade. Para o Brasil, recordar a
Conferência do Rio, significa também reafirmar
o comprometimento do País com o
desenvolvimento sustentável a partir de uma
visão que transcende nossos interesses
específicos para incluir nossas expectativas
quanto à ação da comunidade internacional.
A idéia do desenvolvimento sustentável é um
7
Rio+10:
o Brasil na cúpula
sobre desenvolvimento
sustentável
conceito heurístico – tem múltiplas dimensões.
Associa a preocupação ambiental à não menos
legítima preocupação com a economia e a
erradicação da pobreza. A variável ambiental
deve sempre estar presente de maneira positiva
no estímulo e na sustentabili-
dade do desenvolvimento – e
não como instrumento abusi-
vo de cerceamento econômico
ou entrave comercial.
O desenvolvimento susten-
tável, enquanto conceito, é
universal, mas, enquanto expe-
riência, expõe sua dimensão
local. No campo da implemen-
tação, ainda somos vítimas do
paradoxo do excesso de poder
e do excesso de impotência. Excesso de poder que
se reflete na concentração limitada de recursos
financeiros, tecnológicos e de conhecimento,
cujo acesso pelos países em desenvolvimento
ainda conhece severos impedimentos. Excesso
de impotência ante a incapacidade da
comunidade internacional de galvanizar os
recursos existentes para diminuir de maneira
eficaz as distâncias dentro e entre as
sociedades, o que agrava a insustentabilidade.
Tornar o desenvolvimento sustentável uma
alavanca de modernização requer conferir-lhe
condições sistêmicas de competitividade. A
internalização do mundo na vida das sociedades
promovida pela regulamentação multilateral do
desenvolvimento sustentável não se pode dar de
maneira seletiva. A persistência, nos mercados
desenvolvidos, de subsídios à agricultura, bem
como de barreiras não tarifárias, reforçam a
busca da competitividade por meio de práticas
predatórias, que os governos devem-se esforçar
por reverter.
Completada uma década da conclusão dos
históricos acordos do Rio, a busca do
desenvolvimento sustentável mostra-nos a
inter-relação entre conceitos e realidade.
Os princípios consagrados na Declaração do Rio
sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento e na
Declaração de Florestas, bem como os
compromissos da Agenda 21, ainda enfrentam o
teste da vontade política de se adotarem novas
atitudes, novas metodologias
e de se empregarem novos
meios que promovam a
melhoria da qualidade de
vida das populações sem que
isso implique custos que hoje
temos a consciência de serem
inaceitáveis do ponto de vista
ambiental. Por outro lado, a
realidade política tem eviden-
ciado que muitas das expec-
tativas que tínhamos, em
1992, para colocar a cooperação internacional
em novas bases, não têm sido plenamente
satisfeitas e que os compromissos assumidos nos
instrumentos emanados da Conferência não têm
sido honrados em sua totalidade.
Não foi definida uma agenda para a Cúpula
Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável
(Joanesburgo, de 26 de agosto a 4 de setembro
de 2002), por ocasião de sua convocação. Essa
agenda está sendo objeto de negociações no
âmbito do Comitê Preparatório da Conferência.
No contexto preparatório para a Rio+10, o
Brasil sediou, no Rio de Janeiro, em outubro de
2001, uma Reunião Regional dos Países da
América Latina e do Caribe, em nível
ministerial. Naquela ocasião, os países da
região acordaram uma plataforma para as
negociações em âmbito global, em que se sugere
como tema central de Joanesburgo a busca de
uma nova globalização e de um desenvolvimento
sustentável inclusivo e eqüitativo.
É importante ter presente que, na
Conferência do Rio, a comunidade internacional
assumiu um compromisso político de dupla
natureza, a saber: a internalização, por meio da
legislação e de outras práticas administrativas,
8
Tornar o desenvolvimento
sustentável uma alavanca
de modernização requer
conferir-lhe condições
sistêmicas de
competitividade.
dos parâmetros de desenvolvimento sustentável
acordados na Agenda 21 e nas declarações e
convenções então adotadas; e a provisão de
cooperação financeira, tecnológica e técnica aos
países em desenvolvimento.
A Rio + 10, portanto, deve ter seu escopo
demarcado pela avaliação da implementação
dos compromissos assumidos em 1992, na
Conferência do Rio. No entender do Brasil, cabe
ter presente as circunstâncias históricas que
permitiram o consenso no Rio, em 1992, em
torno da Agenda 21. Esse consenso deve ser
preservado; qualquer idéia de se duplicar a
Agenda 21 em Joanesburgo pode comprometer
o êxito da Conferência. Tampouco deve a
Conferência de Joanesburgo envolver o
lançamento de qualquer novo processo nego-
ciador, especialmente em razão da necessidade
de ainda se cumprirem os compromissos
assumidos no Rio, há dez anos
A exemplo da Conferência do Rio, a reunião
de Joanesburgo, não obstante a natureza
técnica que permeia muitos dos temas a serem
debatidos, será uma reunião de natureza
eminentemente político-diplomática. Servirá
para estabelecer as diretrizes que deverão
orientar os esforços nacionais e a ação
internacional nos anos vindouros no campo
ambiental. Por esse motivo, ao estabelecer a
Comissão Interministerial sobre a Rio+10, o
Presidente da República instruiu o Ministério
das Relações Exteriores a presidi-la, com o
propósito de que a formulação das posições a
serem defendidas pelo Brasil seja subsidiada
pelo conhecimento e pela experiência
acumulada, desde 1992, pelos Ministérios
setoriais e entidades vinculadas, bem como por
representantes da sociedade civil organizada, o
que assegura à Comissão as necessárias
transparência e representatividade.
Do ponto de vista brasileiro, a Agenda 21
deve ser vista como um todo e servir de base
para a construção de uma agenda de trabalho
para a Rio+10 em temas que vêm,
progressivamente, se impondo à atenção da
comunidade internacional, tais como, poluição
urbana; padrões de produção e de consumo;
fontes alternativas de energia; eficiência
energética; ecoturismo; e disponibilidade de
recursos humanos, financeiros, tecnológicos e
institucionais adequados. Tais temas já fazem
parte da Agenda 21, mas poderiam ser
aprofundados e ganhar maior relevância.
Os temas a serem tratados na Cúpula de
Joanesburgo apresentam, para o Brasil, elevado
interesse estratégico. Nas negociações
internacionais, o Itamaraty, em estreita
coordenação com os Ministérios setoriais, tem
buscado defender posições coerentes e
construtivas nos diversos foros e processos
negociadores decorrentes dos compromissos e
estruturas acordados na Conferência do Rio.
Sobretudo, a Cúpula de Joanesburgo deve
resultar na renovação do compromisso político e
do apoio para o desenvolvimento sustentável de
forma consistente, inter alia, com o princípio
das responsabilidades comuns, porém
diferenciadas, tendo como fundamento a
responsabilidade histórica e ineludível, por
parte dos países desenvolvidos, em razão dos
insustentáveis padrões de desenvolvimento que
marcam o avanço de suas sociedades.
Espera-se, portanto, que essa renovação de
compromissos se traduza, de um lado, em uma
maior disposição em prover cooperação
financeira e tecnológica voltadas a favorecer a
adoção de modelos de desenvolvimento
sustentável nos países em desenvolvimento e, de
outro, em uma maior disposição em incorporar
o desenvolvimento sustentável como
preocupação primordial no desenho e execução
de políticas públicas.
A Rio+10 deve, assim, propiciar o
desenvolvimento de parcerias para o
9
desenvolvimento sustentável, seja pelo reforço
da cooperação internacional, seja pela
intensificação do engajamento do setor privado
em ações claramente marcadas pela
sustentabilidade respaldadas pela abertura dos
mercados e que, além de gerarem empregos e
renda, adotem tecnologias ambientalmente
saudáveis. Esses dois eixos de ação devem ter
como resultado último o incremento da
competitividade das sociedades e das empresas
num mundo globalizado.
A participação do setor privado é
fundamental nas discussões sobre a Rio+10.
Nesse contexto, não se pode ignorar que os
países em desenvolvimento realizaram, nos
últimos dez anos, profundas reformas
estruturais para atrair investimentos externos,
tecnologia, e propiciar melhor rentabilidade
para a assistência financeira internacional; ao
lado dessas reformas, houve uma abertura de
mercado, permitindo maior competição de
produtos estrangeiros em seus mercados
internos. Todavia, esses esforços não encontram
simetria nos países desenvolvidos, cujos
mercados ainda se encontram fechados a
produtos oriundos dos países em desenvol-
vimento. Isso torna questionável o discurso
sobre o desenvolvimento sustentável centrado
apenas em prescrições para um dos termos da
parceria global, especialmente com realce à
pobreza como causa da degradação ambiental.
A Conferência de Joanesburgo deve buscar
avaliar como os países industrializados estão
caminhando para a sustentabilidade, tendo
presente o princípio das responsabilidades
comuns mas diferenciadas. Cumpre, por
conseguinte, abordar a dimensão econômica do
desenvolvimento sustentável, especialmente no
que tange aos padrões de produção e consumo
prevalecentes nas economias avançadas, a
partir de uma visão abrangente das inter-
relações entre investimento, combate à pobreza
e abertura de mercados.
A Cúpula terá também o grande desafio de
gerar consenso e ações eficazes no plano social.
Tendo em vista tentativas de singularizar o
debate sobre a pobreza na Cúpula de
Joanesburgo, cabe destacar que a pobreza não é
causa maior da degradação ambiental, mas
resultado direto das falhas e desequilíbrios
prevalecentes nas estruturas econômicas e
sociais sobre as quais se pautou o desenvol-
vimento liderado pelas sociedades industria-
lizadas. A degradação do meio ambiente surge
muito mais em resultado dos padrões de
consumo e de produção promovidos pela socie-
dade industrial. A sustentabilidade desses
padrões é que deve ser avaliada prioritaria-
mente em relação aos impactos ambientais.
A pobreza é, no entanto, inadmissível, pois
incompatível com a dignidade humana. É
conseqüência de um crescimento anômalo que
induz à exploração predatória dos bens e
serviços ambientais, seja para manter o
desperdício da fartura, seja para tentar
contornar as privações dos que pouco ou nada
possuem. O desafio global para o milênio que se
inicia – e sobre o qual se debruçará a Cúpula de
Joanesburgo – é o de conciliar a erradicação da
pobreza com a superação de padrões insusten-
táveis de consumo e produção. As duas metas
são hoje – como eram há dez anos – insepará-
veis para se alcançar a sustentabilidade global.
Especial atenção deve ser conferida à
premência de não se aprofundar o desequilíbrio
entre ricos e pobres, em nível nacional, regional
e internacional. O desenvolvimento sustentável
não é uma receita única, mas seus ingredientes
necessitam ser aplicados em doses suficientes e
adequadas a cada tecido social para que as
transformações que todos almejamos possam
ser realidade.
A Cúpula de Joanesburgo ocorrerá num
momento marcado pelo reforço da solidariedade
10
internacional para combater as ameaças à
segurança. As respostas aos desafios no campo
da segurança requerem que a solidariedade se
concretize de modo simétrico na solução dos
desafios pendentes consubstanciados no
cumprimento dos compromissos assumidos na
Agenda 21, bem como nas convenções e
declarações consagradas unanimemente no Rio
de Janeiro.
A globalização e o desen-
volvimento sustentável têm
em comum o sentido da mu-
dança. Mas têm igualmente
em comum a característica
de serem conceitos sobre os
quais não há uma interpre-
tação única que possa
embasar a ação política. Glo-
balização, desenvolvimento e
sustentabilidade têm signifi-
cados diferentes para distin-
tos grupos sociais ou correntes políticas.
Todavia, mesmo nessa incerteza epistemo-
lógica, o consenso de que são inadequados os
padrões até agora seguidos para o uso da
natureza e do meio ambiente impõe que a
comunidade científica e o arsenal tecnológico
propiciem conhecimento para que sejam
encontradas opções racionais para os impasses
que as sociedades enfrentam. O aprofundamento
da interdependência entre as sociedades acen-
tuou o caráter transformador e a importância
política do conhecimento. O desenvolvimento
sustentável tem seu fundamento na combinação
entre a engenhosidade política e o apoio da
ciência para a compreensão de fenômenos que
até há pouco sequer freqüentavam nossa
imaginação.
O desenvolvimento sustentável é uma questão
global, em que os objetivos são convergentes e
as responsabilidades são comuns, embora
diferenciadas. À luz desse preceito, a Cúpula de
Joanesburgo servirá para avaliarmos o quanto
se avançou e o quanto ainda se precisa fazer
para tornar realidade o desenvolvimento
sustentável. Esse conceito-síntese consubstan-
ciou a mensagem kantiana da Conferência de
1992 que reconhece a importância, do ponto de
vista da humanidade, da consolidação de uma
visão de futuro orientada para um novo patamar
de convivência internacional. Essa visão, entre-
tanto, requer para sua
implementação uma coope-
ração em termos grocianos,
isto é, centrada na interde-
pendência construtiva das
soberanias.
Nas palavras do Presi-
dente Fernando Henrique
Cardoso, a dinâmica da
questão ambiental “tem que
ser cultural”1
. Enfrentar os
desafios que o desenvolvi-
mento sustentável nos oferece
somente será possível se infundirmos uma nova
consciência acerca da natureza estratégica do
meio ambiente. A necessidade de novas vias
para a cooperação tanto no campo da proteção
da natureza quanto da promoção do desenvol-
vimento está em sintonia com os anseios de uma
geração sensível à necessidade de se proteger o
meio ambiente e ao imperativo de se acelerar a
afirmação da eqüidade social. É auspicioso ver
a valorização das instâncias intergover-
namentais e a ampliação da presença da
sociedade civil na definição do esforço para
superar práticas predatórias e promover alter-
nativas mais sustentáveis de promoção da
prosperidade e do bem-estar.
Nos dez anos desde a realização da
Conferência do Rio solidificou-se a convicção
sobre o equilíbrio imprescindível que deve haver
entre a utilização de recursos ambientais e
naturais e o progresso econômico e social.
A discussão sobre os caminhos do desenvolvi-
mento teve grande ascendência sobre o
11
O desenvolvimento
sustentável é uma questão
global, em que os objetivos
são convergentes e as
responsabilidades são
comuns, embora
diferenciadas.
cotidiano dos cidadãos e sobre a moldagem da
sociedade. Com base nesse significado da noção
de desenvolvimento para nosso tecido social
cabe afirmar, como o fiz em 1992, que “o
pressuposto do desenvolvimento sustentável é o
próprio desenvolvimento”.
Conferências como a
Cúpula de Joanesburgo servem
para que busquemos racio-
nalizar a ação em meio à
incerteza da compreensão.
Cumpre, assim, avançar no
entendimento entre os dife-
rentes atores para traduzir no concreto as
decisões tomadas no Rio e que ainda carecem de
implementação plena. Cumpre, ainda, ter
presente que, na formulação das respostas ao
desafio do desenvolvimento sustentável, enfren-
tamos tempos diferentes entre as reações da
natureza às atividades humanas e a determinação
política de enfrentar os desafios ambientais. A
crescente certeza científica sobre o efeito das
ações humanas na degradação do meio ambiente
urge a implementação das medidas saneadoras
acordadas no plano global e
invalida opções unilaterais
pela inércia.
Em nossa época, marcada
pelo fenômeno da globali-
zação e seu impacto em
nossas sociedades, devemos
ter como princípio norteador
a construção de uma globalização sustentável,
inclusiva e eqüitativa. Nossa ação para a Confe-
rência de Joanesburgo deve ser orientada por
uma visão de futuro que aproxime a realidade
social e normativa consagradora de valores
compartilhados dos ideais que nos inspiram.
12
Professor Celso Lafer
Ministro de Estado das Relações Exteriores; Vice-Presidente da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento – a Rio 92
1 CARDOSO, Fernando Henrique. O Presidente Segundo o Sociólogo: entrevista a Roberto Pompeu de Toledo. São
Paulo: Companhia das Letras, 1998, p. 163.
“O pressuposto do
desenvolvimento sustentável
é o próprio desenvolvimento”
Dificilmente países em desenvolvimento
poderão encontrar, nos dias de hoje, experiências
tão ricas e diversificadas como as que resumem a
história do Planejamento brasileiro nos últimos
cinqüenta anos. É por essa razão que a exposição
sistemática da experiência brasileira, em torno
da busca do desenvolvimento sustentável, há de
ser reconhecida como um dos mais importantes
“laboratórios” na construção racional das
sociedades modernas e democráticas.
A “terra de contrastes” conforme nos definiu
Roger Bastide nos anos 40, exerce seu peso
específico na concepção de alternativas viáveis de
desenvolvimento. De um lado, padrões de
consumo próximos aos europeus convivem com
níveis de exclusão social só verificado nos países
mais pobres do mundo; de outro, uma diversidade
cultural que reflete as diferentes contribuições à
nossa matriz étnica e os processos adaptativos a
condições de produção bastante diferenciadas; por
fim, uma diversidade natural, expressa nos vários
ecossistemas que se encontram no espaço
nacional – tudo compondo uma vasta extensão
territorial recortada por um mosaico de situações
refratário a um tratamento uniforme. Nesse
sentido, não se desenvolve em nosso país um
planejamento mas, sim, rigorosamente,
“planejamentos”.
A despeito das dificuldades, uma análise detida
do sistema federal de planejamento evidencia sua
aderência aos seguintes princípios internacionais
para a consolidação de uma estratégia nacional
de desenvolvimento sustentável1
:
15
Passos em direção a uma
estratégia nacional de
desenvolvimento
sustentável - A experiência
brasileira recente
1. Forte compromisso político X
2. Fundamentado em estratégia compartilhada e visão pragmática X
3. Processo controlado e conduzido nacionalmente X
4. Formulado com base no conhecimento, na técnica e capacidade X
5. Formulado a partir de processos e estratégias preexistentes X
6. Liderado por uma instituição forte X
7. Um alto nível de participação social na sua elaboração X
8. Processo estratégico ancorado em análises técnicas X
9. Integração e balanceamento das estratégias entre setores e regiões X
10. Articulação entre o curto, o médio e o longo prazo na sua formulação X
11. Coerência entre o orçamento e as prioridades estratégicas X
12. Objetivos realistas, porém flexíveis X
13. Articulação entre prioridades e ações locais e nacionais X
14. Construção de mecanismos para monitoramento, avaliação e revisão X
15. Continuidade do processo X
15 princípios de uma Estratégia Nacional de Desenvolvimento
Sustentável X Plano Avança Brasil
Atende
Atende
Razoavelmente
Não atende
Vários fatores podem ser perfilados como
determinantes dessa trajetória.
O ponto de partida encontra-se na
promulgação da Constituição Federal de 1988,
que em seu artigo 165 institui leis de iniciativa
do Poder Executivo que estabelecerão o Plano
Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes
Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária
Anual (LOA). O PPA é o instrumento de
organização do planejamento governamental
federal concebido para vigorar 4 (quatro) anos,
do segundo ano do mandato presidencial até o
primeiro ano do mandato subseqüente. A LDO é
concebida para fazer a articulação e o
ajustamento conjuntural do PPA orientando a
elaboração dos orçamentos anuais.
O primeiro PPA - 1991/1995 - foi elaborado
durante o Governo Collor de Mello. Já ele
expressava avanço institucional no processo
ditado pela nova legislação na medida em que
foi enviado ao Congresso Nacional na forma de
um relatório anual de execução física e
financeira. Como não havia sistema de
acompanhamento, não foram incorporadas
mudanças no decorrer do período e tampouco
foi feita uma atualização de intenções do Plano.
O segundo PPA, já sob o governo Fernando
Henrique Cardoso, cobriu o quadriênio
1996/1999. Ele inaugura novas práticas de
planejamento ao introduzir o corte espacial e a
visão regional no conceito de Eixos de
Desenvolvimento. Paralelamente a este avanço
surge o processo de mudança no papel do
Estado, que de provedor de bens e serviços
passa a ter um perfil de regulação e indução do
desenvolvimento, graças ao Programa de
Reforma do Estado. Em agosto de 1996 é
criado o Programa “Brasil em Ação”, composto
de 42 projetos, selecionados no âmbito do PPA,
considerados prioritários nas áreas de infra-
estrutura econômica (26) e desenvolvimento
social (16), todos executados segundo um novo
modelo de gerenciamento, um gerente para
cada projeto, que enfatiza a obtenção de
resultados.
O PPA atual (2000-2003) inova mais ainda.
No aspecto da mudança institucional, há uma
integração maior entre o planejamento e o
orçamento por meio da organização das ações
em Programas. Os Programas devem ser
desenhados para solucionar um problema ou
atender uma demanda da sociedade, com
produtos finais necessários à consecução dos
objetivos propostos. Os Programas passam a ser
integrados por ações (projetos, atividades ou
operações especiais), as quais possuem um
único produto e metas estabelecidas.
O Estudo dos Eixos Nacionais de Integração e
Desenvolvimento foi, pela incorporação de seus
conceitos e resultados, uma das principais
referências utilizadas na elaboração do PPA
2000-2003. Além disso o Estudo, que se enreda
em um horizonte de oito anos (ou dois PPAs),
assumiu outros paradigmas, que decorrem das
condições inéditas dos desafios presentes. São
eles:
• Os ditames do desenvolvimento sustentável;
• A nova ordem econômica internacional
(globalização dos mercados);
• A capacidade empreendedora do setor privado; e
• O processo democrático-participativo na Sociedade
brasileira.
A sua realização situa-se no contexto da
formulação, por parte do governo federal, de
uma nova estratégia de desenvolvimento a nível
espacial, embasada em uma Visão Estratégica
de longo prazo (vinte anos), e buscando uma
geografia sócio-econômica mais equânime, cuja
implementação requer a valorização articulada
de todo o potencial disponível das diversas áreas
que compõem o território nacional. Essa nova
postura envolve a caracterização de Eixos
Nacionais, com a finalidade de integrar as
diversas economias regionais e melhor articulá-
las aos mercados internacionais.
16
Para tanto, dois critérios foram levados em
conta na sua definição e delimitação: a
existência de rede multimodal de transporte de
carga e a presença de possibilidades de
estruturação produtiva interna, em termos de
um conjunto de atividades econômicas. Esses
critérios definem a inserção do eixo em um
espaço mais amplo (nacional ou internacional)
com efeitos multiplicadores dentro da sua área
de influência - entendida esta como as relações
sociais presentes nas imediações das vias de
transporte e cuja lógica se reflete na rede de
cidades e sua hierarquia peculiar.
Esta definição liberta-se da visão centrada
nas estruturas de transporte, que prevaleceu na
definição dos eixos para o PPA 1996-1999
(vide mapa anexo), dando ênfase ao
funcionamento das economias regionais. Assim,
esse conceito inovador do planejamento
brasileiro amplia as possibilidades de
compreensão dos processos sócio-econômicos
localizados e abre o leque de opções de
intervenções públicas e privadas que redundem
na diminuição das disparidades regionais e
sociais.
A conceituação de eixos está umbilicalmente
ligada à revisão das práticas de planejamento,
ocorrida na última década. Segundo o padrão
que prevaleceu até o início dos anos 90, a
função do planejamento era essencialmente
normativa. Ele indicava para os agentes
públicos e privados quais as grandes linhas de
investimento estatal para um dado período. Os
Planos de Metas são exemplos claros disso.
Esse tipo de planejamento normativo foi típico
de uma sociedade menos complexa,
autoritariamente dirigida e enquadrada num
projeto de modernização que almejava levar o
país a concluir sua revolução industrial
quando o Estado efetivamente liderava o
processo de desenvolvimento.
Partindo das novas condições, desenvolveu-
se uma metodologia de planejamento balizada
pela compreensão de que ele deve ser além de
normativo para o setor público, indicativo para
o setor privado, isto é, considerado relevante
pelos agentes econômicos e sociais na medida
em que possa orientá-los quanto às prioridades
da sociedade e servir de instrumento de
otimização das oportunidades sem ter como
premissa a capacidade de imposição que o
Estado exercitou no passado. Isso implica num
processo de implementação bem mais
complexo, onde a relação com os agentes
sociais se orienta pelas exigências das
parcerias que o Estado precisa celebrar para
lograr as conquistas públicas. Este
envolvimento da iniciativa privada para que
também mobilize seus recursos na conquista
dos objetivos estratégicos abre uma fase
negocial inédita no processo, onde o Estado
precisa estar preocupado também com a
atratividade dos negócios que sinaliza como de
interesse nacional. A base desse cálculo parte,
ainda, da adoção do conceito de Programa e
Gerente, segundo o qual as ações, os recursos e
as responsabilidades do Governo são
organizados de acordo com os objetivos a
serem atingidos.
Este percurso no qual o Estado vê redefinido
o seu papel deu-se pari passu com a maturidade
do conceito de sustentabilidade. De fato, tanto a
Constituinte quanto a Rio 92 serviram para
estabelecer uma pauta nacional onde as
questões ligadas à sustentabilidade do
desenvolvimento – desde barreiras comerciais e
mudanças nos padrões de produção e consumo
até a preservação dos recursos naturais e o
combate à miséria nos grandes centros urbanos
e no meio rural – constitui o norte do
planejamento na esfera governamental. Ao
assumi-la como diretriz, o planejamento passou
a privilegiar a efetivação de ações integradas
voltadas para a melhoria das condições de vida
através da execução de atividades concatenadas
17
dentro da seguinte lógica:
Essa cadeia de articulações exige a
explicitação e a coordenação de investimentos
nas três dimensões do desenvolvimento
sustentável - social, econômica e ambiental -,
além da dimensão da informação e do
conhecimento2
, que no seu conjunto formam, até
2007, o seguinte Portfólio:
Na sua composição setorial destaca-se o
papel do Desenvolvimento Social que representa
quase metade do investimento total previsto.
Outra inovação diz respeito ao grau de
legitimação alcançado no processo de definição
do Portfólio. A versão do Portfólio - que é o
principal produto do Estudo dos Eixos -
disponível em abril de 1999, foi submetida ao
debate público em seminários realizados por
todo o País entre abril e agosto daquele ano.
Numa primeira fase, em Brasília, os seminários
envolveram o Governo Federal, contando com a
participação de todos os Ministérios. Na
segunda etapa, implicaram em um conjunto de
apresentações em todas as capitais brasileiras,
com participação de representantes dos
Governos Estaduais e Municipais e lideranças
expressivas das comunidades locais. O processo
permitiu não só a apresentação dos resultados
18
Setores US$ milhões %
Infra-estrutura Econômica 99.974,1 43,8
Transportes 31.334,5 13,7
Energia 32.827,5 14,4
Telecomunicações 30.800,9 13,5
Infra-estrutura Hídrica (NE) 5.011,2 2,2
Desenvolvimento Social 112.213,3 49,0
Educacão 26.496,0 11,6
Habitação 16.516,3 7,2
Saúde 49.219,7 21,5
Saneamento 19.981,3 8,7
Informação e Conhecimento 2.539,0 1,1
Associados a Atividades Econômicas 1.797,0 0,8
Associados a Projetos de Infra-estrutura 742,0 0,3
Meio Ambiente 13.806,0 6,1
Gestão de Recursos Hídricos 6.180,0 2,7
Florestas 2.643,9 1,2
Demais 4.982,1 2,2
Total do Portifólio 228.532,4 100,0
Fonte: Consórcio Brasiliana
Portfólio 2007: Composição Setorial dos Investimentos
Por Setor, em US$ milhões e %
do Estudo como também serviu para validá-lo,
com foco no Portfólio de Investimentos,
mediante a incorporação das recomendações
decorrentes dos debates. Os seminários com o
Governo Federal constaram de duas reuniões e
mais catorze outras com os Ministérios/
Secretarias que solicitaram contatos individuais
para aprofundar discussões especializadas. Os
seminários estaduais foram realizados nas 27
capitais, tendo contado com participação ativa
de mais de 2.600 pessoas. Cada um deles
envolveu a apresentação conjunta dos principais
resultados do Estudo, seguida de debates e da
apresentação, por parte do governo estadual, da
visão estratégica de desenvolvimento do ponto de
vista do Estado e/ou da região em que se insere.
Ora, para o prosseguimento dessa linha de
amadurecimento da ação pública na esfera do
planejamento novas dimensões devem ser
incorporadas nas formulações estratégicas. A
primeira delas, já em curso, é a reavaliação do
impacto dos investimentos nos Eixos da
Amazônia. Dela decorrerá, para o futuro, a
adoção da avaliação ambiental estratégica em
todo o território nacional, para todos os eixos de
integração e desenvolvimento em que foi dividido.
A outra, é a necessária consideração de que o
Brasil não está isolado no mundo. Em outras
palavras, a estratégia a se formular para o futuro
deverá levar em conta: i) a inserção latino-
americana de nosso país pela integração da infra-
estrutura com os países vizinhos; ii) a agregação
de um tratamento a ser conferido ao meio
ambiente no qual este seja tomado no marco das
comparações de custos vis-à-vis as oportunidades
ambientais, sendo que estas parecem ser mais
promissoras no campo dos serviços ambientais,
de crescente interesse global.
A dimensão internacionalizada das relações
também está presente em iniciativas para se
criar condições institucionais de organização
produtiva do espaço sul americano. O Plano de
Ação para a Integração da Infraestrutura Sul-
americana, elaborado pelo BID, aponta
diretrizes para a ampliação e modernização da
infra-estrutura em um horizonte de 10 anos e é
um esboço da direção de um esforço a se buscar
coordenadamente. A visão geo-econômica que
dá o contorno dessa iniciativa pode ser
visualizada (ver mapa anexo).
A outra situação singular à qual o
Planejamento tem buscado atender nos remete
à Amazônia. Como se sabe, já não são poucos os
documentos correntes que sugerem a opção
estratégica por se criar na Amazônia uma
“civilização brasileira florestal” com o objetivo de
preservar a quase totalidade deste bioma,
restringindo as intervenções econômicas a
espaços bem delimitados capazes de promover a
elevação do padrão de vida da população da
região sem comprometer o seu ambiente . No
extremo oposto, é grande o alarmismo
fomentado pela divulgação de projeções sobre a
“destruição” da Amazônia se mantidos os
níveis de desflorestamento, associados à
extração de madeira e produção agropecuária,
ou simplesmente por incêndios florestais
decorrentes de práticas agrícolas inadequadas,
ou, ainda, em conseqüência de grandes projetos
de infra-estrutura. Áreas de contrastes reais e
imaginados, os Eixos da Amazônia devem ser
encarados como ecologicamente orientados no
seu desenvolvimento e sustentáveis pela
reposição das formas de produção que tomam
os recursos naturais o diferencial que maior
valor agrega ao desenvolvimento regional.
O Estudo dos Eixos Nacionais de Integração e
Desenvolvimento já havia registrado a
importância da preocupação com eventuais
impactos ambientais de empreendimentos,
inaugurando também o tratamento do Meio
Ambiente não apenas como uma restrição mas
como fonte de novas oportunidades.
Especificamente, ele incluía, como visto
anteriormente, um Portfólio de investimentos
ambientais.
19
Através deste relato, sumarizando alguns dos
principais pontos de inflexão que caracterizam
o “salto” para a feição moderna do sistema
federal de planejamento, buscamos indicar não
só a aderência aos princípios internacionais da
construção da sustentabilidade ambiental,
econômica, social e política como também
apontar linhas de aperfeiçoamento do processo
em foco. Evidentemente os contrastes que
recortam a nação brasileira deixam marcas
profundas na estrutura pública de
planejamento. Há diferenças expressivas no
plano institucional – governos estaduais e
municipais tem diferentes ritmos de maturação
e, portanto, diferentes condições de partilhar
responsabilidades com o governo federal; as
ONGs, protagonistas no processo de legitimação
dos planos e programas, apresentam níveis de
organização que são diferenciados por setor ou
região. Tudo isso condiciona as possibilidades de
avanço da estrutura de planejamento do Estado
brasileiro; no entanto, o mais importante é que
se estabeleça o diálogo deste com outros
modelos de construção de uma estratégia
nacional de desenvolvimento sustentável.
20
José Paulo Silveira
Secretário de Planejamento e Investimentos Estratégicos do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão
1 Base do debate do International Forum on National Sustainable Development Strategies, promovido pelo Department of
Economic and Social Affairs (DESA), Under General Secretary, UN, Accra, Ghana, Novembro de 2001.
2 A dimensão da informação e conhecimento, tratada à parte segundo a visão do sistema de planejamento do Governo
Federal no Brasil, inclui acesso à informação, P&D e capacitação profissional.
21
Eixos no PPA 1996-1999
Eixos no PPA 2000-2003
Hid, Madeira-Amazonas
Costeiro do Sul
Franja de Fronteira
São Paulo
Centro-Oeste
Costeiro Nordeste
Transnordestino
Araguaia - Tocantins
Oeste
Saída para o Caribe
Rio São Francisco
Hid. Paraguai-Paraná
Rodovias
Rios
Ferrovias
MADEIRA-AMAZONAS
REDE SUDESTE
OESTE
SUDOESTE
SUL
SÃO FRANCISCO
TRANSNORDESTINO
ARAGUAIA-
TOCANTINS
ARCO NORTE
Estamos vivendo um momento histórico para
a gestão ambiental no Brasil. Em março, o
Conselho Nacional de Recursos Hídricos aprovou
a cobrança pelo uso da água na bacia
hidrográfica do Rio Paraíba do Sul. É a primeira
vez que este tipo de cobrança será feita em um
rio federal. Com isto, estamos instituindo o
princípio do poluidor/pagador. Vale dizer, em vez
de socializarmos os custos da recuperação de
eventuais danos ambientais, os que usam e
poluem os recursos naturais terão que assumir
os encargos financeiros de sua recuperação. O
valor será pago por todos os usuários da bacia
hidrográfica do Paraíba do Sul que têm outorga
dos Governos Federal e Estadual para usarem a
água dos rios. A cobrança se estenderá, em
breve, a todo o país, com prioridade para as
bacias do Rio São Francisco e do Rio Doce, duas
das mais importantes e degradadas do país.
O conceito moderno de gestão ambiental não
implica somente a fiscalização da degradação do
Meio Ambiente mas, sobretudo, a criação de
condições necessárias para assegurar a pere-
nidade dos recursos naturais por meio de novas
políticas para seu uso. No limiar do terceiro
milênio, dois grandes mitos da civilização oci-
dental estão sendo desfeitos. O primeiro deles é o
da inesgotabilidade dos recursos da natureza.
Essa percepção equivocada foi muito difundida,
principalmente em países com dimensão conti-
nental e com abundância de recursos naturais,
como o Brasil. Ela criou a falsa idéia de que os
recursos naturais seriam infinitos e, portanto,
passíveis de utilização indiscriminada sem maio-
res preocupações com sua conservação. Entre-
tanto, a sociedade vai descobrindo, com cada vez
mais intensidade que, ao contrário disso, estamos
lidando com recursos finitos e entre eles a água,
um recurso valiosíssimo e insubstituível para a
sobrevivência dos seres humanos.
Outro mito que está começando a ruir é o da
hegemonia do homem sobre a natureza. Essa
visão antropocêntrica, diretamente ligada à
cultura dos povos ocidentais, ajudou a criar mo-
delos de desenvolvimento e de uso dos recursos
naturais sem compromisso com a conservação
do meio ambiente. Felizmente, a sociedade está
se dando conta de que não existe essa hege-
monia, que o homem vive uma relação de total
interdependência com a natureza e com o meio
físico que o cerca. No século XX, passamos por
um momento único na história da civilização,
com desenvolvimento e explosão tecnológicos
jamais vistos. Mas, paulatinamente, a sociedade
já percebeu que o desenvolvimento material sem
qualidade de vida produz uma falsa prosperi-
dade. Hoje as pessoas podem navegar na
Internet e têm a seu dispor os meios de comuni-
cações mais avançados, como telefones celula-
res e computadores que cabem na palma da
mão. Em contrapartida, seus filhos já não
podem tomar banho no córrego do bairro, sim-
plesmente porque ele está totalmente poluído.
Essa mudança de percepção tem influenciado
positivamente a modernização das políticas públi-
cas relacionadas à gestão ambiental, particular-
mente no tocante a recursos vitais como a água. O
homem não é capaz de sobreviver sem o meio
ambiente harmônico, sem os recursos naturais.
Isso leva a crer que o homem faz parte daquilo
que se pode chamar de “imensa teia da vida”.
23
Gestão das águas em
uma economia
globalizada
Ele é parte, e apenas uma parte de todo o
processo, dependente de outros seres vivos e do
meio físico para permanecer no planeta. A
partir dessa percepção foram criadas as
condições políticas objetivas para que sejam
estabelecidos novos paradigmas para a proteção
do meio ambiente.
A Lei 9.433, a Lei das Águas, criou o
Conselho Nacional de Recursos Hídricos e fixou,
pela primeira vez, uma política pública no
Brasil que atribui a um comitê da bacia o poder
concreto de decidir as políticas de conservação
e uso sustentável dos recursos
hídricos. O comitê de bacia é
um mecanismo democrático e
participativo no qual as três
esferas de Governo (Federal,
Estadual e Municipal) com-
partilham com os usuários da
água e com as entidades da
sociedade civil o poder de
decidir sobre as prioridades e
as políticas a serem estabe-
lecidas para a conservação e
uso dos recursos hídricos
naquela bacia. Nós passa-
mos, também, a tratar a água
como um insumo econômico,
buscando mudar a mentali-
dade retrógada de tratar os
recursos naturais como
recursos de custo zero por serem são ofertados
pela natureza.
A cobrança pelo recurso ambiental “água”
significa valorizar economicamente um recurso
da natureza. Significa, ainda, deixar de tratar o
dano ambiental como uma externalidade econô-
mica, pois estamos sinalizando claramente que
o custo ambiental tem que estar embutido no
custo dos produtos e serviços oferecidos à
sociedade. O modelo atual é extremamente
perverso porque permite a apropriação do lucro
pelo uso dos recursos naturais apenas pelos
agentes econômicos, mas socializa para toda a
sociedade os prejuízos e danos ambientais cau-
sados pela utilização desses mesmos recursos.
Para que os mecanismos previstos na lei
nacional de gerenciamento de Recursos Hídricos
possam ser efetivos, a cobrança pelo uso das
águas depende dos comitês. A cobrança não se
dará por uma decisão unilateral do governo e da
autoridade pública, ela terá que ser negociada
no âmbito do comitê. Estabelecer as regras da
cobrança e os valores compe-
te aos comitês, e por isso é
importante que eles estejam
organizados e entrem em
funcionamento.
É preciso deixar bem claro
que a cobrança pelo uso da
água não se tornará mais um
instrumento de arrecadação
para os cofres federais. Por lei,
no mínimo 92,5% dos recursos
apurados deverão ser reinves-
tidos na recuperação da pró-
pria bacia hidrográfica, em
programas de reflorestamento
de matas ciliares, proteção de
nascentes, recuperação de
áreas degradadas e tratamento
de esgoto e lixo, a partir de
prioridades definidas pelo comitê de bacia.
Esse é o primeiro passo de uma grande
mudança que o Brasil vai realizar para o futuro.
Como detentores de um dos maiores ativos
ambientais do planeta, nós temos que trabalhar
com políticas extremamente modernas para
gerir esse patrimônio natural e transformar
suas vantagens comparativas em vantagens
competitivas em uma economia cada vez mais
globalizada.
24
José Carlos Carvalho
Ministro de Estado do Meio Ambiente
O modelo atual é
extremamente perverso
porque permite a
apropriação do lucro pelo
uso dos recursos naturais
apenas pelos agentes
econômicos, mas socializa
para toda a sociedade os
prejuízos e danos
ambientais causados pela
utilização desses mesmos
recursos.
Passados dez anos da Rio-92, o debate acerca
de indicadores ambientais parece ainda tão
vigoroso quanto inconcluso. Não foram pequenos
os esforços de cada país participante e da
comunidade internacional como um todo, no
sentido de definir e produzir informações
adequadas a orientar ações relativas ao meio
ambiente e ao desenvolvimento sustentável, e os
avanços foram consideráveis. Ocorre que a
perspectiva de ação imposta pelos problemas
ambientais sugere uma abordagem ampla e
extremamente diversificada e um horizonte tem-
poral de referência absolutamente inauditos.
Assim, o tamanho e a complexidade da tarefa
faz com que as conquistas pareçam sempre
menores que os desafios (re)colocados.
Afinal, o que se requer são informações que, ao
mesmo tempo, retratem praticamente toda a ativi-
dade humana e seu impacto sobre condições de
ambiência nos seus múltiplos aspectos. Mais que
isso, as informações devem ainda permitir inferên-
cias sobre as necessidades das gerações futuras.
As dificuldades tornam-se ainda maiores
porque, no caso das estatísticas sociais, as prin-
cipais fontes são os registros administrativos e
as pesquisas domiciliares, onde o informante
responde às perguntas do entrevistador, enquan-
to no caso das estatísticas econômicas as
principais fontes são, novamente, os registros
administrativos e as respostas das empresas,
unidades produtivas ou órgãos públicos.
Mas nem os registros administrativos, nem
empresas, nem cidadãos estão preparados para
responder sobre impactos causados ao meio
ambiente e, ao perguntarmos aos ecossistemas
sobre estes impactos, eles nos oferecem
respostas em sua própria “linguagem” que
ainda estamos distantes de saber ouvir e
compreender adequadamente.
Todo indicador, toda informação estatística
constitui, antes de tudo, uma síntese de grande
abstração. E são abstrações na forma de cifras
cuja inteligibilidade e, logo, utilidade, depende
de familiaridade com o fenômeno mensurado e
com o modo e escala em que é medido. Um
indicador que agrega, por exemplo, a produção
social medida em unidades monetárias, é algo
absolutamente abstrato, mas muito objetivo,
passados centenas de anos das sociedades
monetizadas. Mas é objetivo também por se
referir a mercadorias normalmente comerciali-
zadas. Coisa muito diversa é medir e construir
indicadores sintéticos que incorporem paisa-
gem, qualidade de ar, reservas naturais, danos
ambientais, saúde e outros que tais. Trata-se de
justapor, condensar e integrar aspectos que são
objeto de múltiplas disciplinas, que muitas vezes
utilizam diferentes sistemas de medida e que,
principalmente, ainda são de valoração social
extremamente difícil por conta tanto da
ignorância humana sobre a dinâmica ecológica
como do fato de estarmos ainda nos primórdios
do processo histórico (econômico, social e
político) que definirá a extensão e a profundi-
dade do compromisso com as gerações humanas
do futuro.
Enquanto o universo da produção de
estatísticas econômicas e sociais dispõe de um
aparato conceitual, metodológico e de melhores
práticas desenvolvido ao longo de décadas e
objeto de um trabalho mundial de harmonização
29
Indicadores ambientais
para uma globalização
sustentável
com vistas à maior comparabilidade, as defini-
ções conceituais, viabilidade, aplicabilidade e
funcionalidade dos inúmeros indicadores ambi-
entais e do desenvolvimento sustentável propos-
tos são reiteradamente criticados, revistos e
postos à prova. Nesse sentido são todos novos,
como nova é a temática do meio ambiente e, por
isso, pagam tributo à imprecisão e fluidez do
próprio conceito de desenvolvimento sustentável.
Tornou-se ponto de controvérsia a própria
idéia de valoração de recursos naturais e
serviços ambientais e, logo, a ênfase em
mensurações físicas ou a elaboração de medidas
monetárias. A discussão se desdobra ainda entre
privilegiar indicadores associados ao que se
denominou sustentabilidade fraca ou aqueles
associados a sustentabilidade forte. Na hipótese
fraca da sustentabilidade admite-se uma grande
capacidade de substituição entre “capital
natural” e manufaturado de maneira que os
recursos naturais podem ser valorados confor-
me se manifesta a preferencia do consumidor.
Em outras palavras, supõe-se que qualquer uso
dos recursos naturais possa ser reposto por
fontes alternativas de igual valor. Na hipótese
forte da sustentabilidade, considera-se a
substituição limitada e, com base em pesquisas
ecológicas, avaliam-se os custos relativos a
“padrões de uso” ou de “sustentabilidade” de
diferentes “funções ambientais” e os custos
para troca ou reformulação das atividades
econômicas, de sorte que se evite a depleção ou
degradação do meio.
Muitos autores tomam posição entre os dois
extremos das hipóteses fraca e forte de
sustentabilidade. Aceitam que na prática as
economias no presente dependem de consumir
algum nível de recursos não renováveis. Por
outro lado, permitir que todas as fontes não
renováveis sejam consumidas rapidamente seria
irresponsável. A alternativa conceitual tem sido
trabalhar com a idéia de um certo “nível
crítico” de recursos ambientais, ou seja, um
nível além do qual a depleção não deve ser
permitida. É evidente que não há consenso
sobre quais níveis críticos considerar.
Também a disputa entre mensurações físicas
e sócio-econômicas admite uma posição
intermediária. Embora seja evidente a dificul-
dade em integrar ambos os aspectos, trata-se de
uma construção (mais do que técnica, histórica)
indispensável. Assim, cabe avançar tanto o
desenvolvimento de indicadores e índices
ambientais quanto o desenvolvimento de contas
físicas e ambientais e sistemas integrados,
consolidando, através de aplicações práticas as
alternativas mais úteis e viáveis. Nos trabalhos
para a elaboração do novo manual da ONU
sobre contas ambientais (SEEA) é proposta
uma contabilidade ambiental híbrida, confron-
tando informações física sobre o uso dos
recursos com informações em termos físicos e
monetárias sobre o processo econômico de
produção.
Cabe lembrar que quaisquer que sejam as
abordagens conceituais e os métodos seguidos, é
necessária a coleta e sistematização de um
vasto conjunto de informações. E sua produção
não pode prescindir da colaboração de diversas
instituições. Algumas em razão da sua
competência específica e outras historicamente
engajadas no estudo das questões ambientais.
O Brasil tem participado ativamente deste
esforço, quer internamente, através de orga-
nismos públicos, universidades, instituições
privadas e organizações não governamentais,
quer externamente, colaborando com diversas
iniciativas e organismos internacionais.
O Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística – IBGE, na qualidade de instituição
oficial de estatística, tem procurado responder
às funções que lhe são atribuídas neste campo,
inclusive no sentido da construção de um
sistema nacional voltado a organização e
consolidação de informações ambientais.
30
De fato, enquanto em todo o mundo,
Instituições Nacionais de Estatística buscam
aproximação com a cartografia em função das
possibilidades abertas pelo desenvolvimento da
tecnologia de geo-referenciamento de dados e
da geografia, ciências biológicas, física e
química, em função das demandas colocadas
pela produção de informações ambientais, o
Brasil conta, desde 1936 quando foi criado o
IBGE, com essas atribuições reunidas numa
única instituição que tradicionalmente dedica-se
ao conhecimento da realidade físico-ambiental
do território. Além das atividades básicas de
geodesia e cartografia oficial, desenvolvidas
pelo IBGE desde então, destaca-se, a incor-
poração, em 1986, do acervo e Projeto
RADAMBRASIL, ampliando a atenção aos
temas de geologia, geomorfologia, solos, vege-
tação, uso potencial da terra.
Particularmente para a Amazônia Legal, que
representa mais de 50% do Território Nacional,
mediante Contrato firmado entre o IBGE e a
Comissão de Implantação do Sistema de
Controle do Espaço Aéreo – CISCEA / Sistema
de Vigilância da Amazônia – SIVAM, já se en-
contram armazenadas, em banco de dados geo-
referenciados, informações inerentes a 204 car-
tas (escala 1:250 000), compreendendo os temas
geologia, geomorfologia, solos e vegetação.
Ainda no que concerne aos estudos dos
recursos naturais, o IBGE desenvolve pesquisas
voltadas à área de Fauna e Flora. Nestes, des-
taca-se o trabalho de levantamento básico rea-
lizado pelos herbários IBGE (Brasília e
Salvador) na mais absoluta harmonia com insti-
tuições congêneres do Brasil e do exterior e com
grande integração com as atividades de mapea-
mento de vegetação e coleta de material botânico.
As coleções científicas do IBGE constituem
um valioso patrimônio à disposição da Insti-
tuição e da comunidade científica, pois são,
como importante testemunho histórico-
científico da biodiversidade original, informa-
ção indispensável para construção de muitos
indicadores de impacto ambiental.
O IBGE tem participado também dos
trabalhos da Comunicação Nacional Brasileira
de Gases de Efeito Estufa, coordenado pelo
Ministério da Ciência e Tecnologia – MCT e
assumiu a responsabilidade de ser o depositário
das informações do inventário brasileiro das
emissões de gases do efeito estufa.
Coordena também a coleta, revisão e
atualização da base de dados sobre estatísticas
ambientais que o grupo de trabalho formado
pelo IBGE, Instituto de Pesquisas Espaciais
(INPE), Instituto de Pesquisa Ambiental da
Amazônia (IPAM), Banco de Dados da
Amazônia da Secretaria da Amazônia do Minis-
tério do Meio Ambiente e Instituto Brasileiro de
Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis (IBAMA) produz para dar suporte
ao Relatório Perspectivas do Meio Ambiente no
Brasil, o Geo Brasil, que está sendo elaborado
pelo MMA e o IBAMA, em parceria com o Pro-
grama das Nações Unidas para o Meio
Ambiente (PNUMA) com vistas à divulgação
durante a Conferência Mundial de Meio
Ambiente e Desenvolvimento – Rio +10, em
Johannesburgo.
Mais recentemente o IBGE, valendo-se
também de seu patrimônio de informações e
pesquisas econômicas e sociais, vem desenvol-
vendo juntamente com o Ministério do Meio
Ambiente o Projeto Indicadores de Desenvolvi-
mento Sustentável. Ele tenta contribuir para
avaliações abrangentes da realidade brasileira,
incluindo a perspectiva ambiental, sob a ótica
da compatibilização das diversas dimensões do
desenvolvimento, com a intenção de sistema-
tizar e acompanhar a situação nacional no que
diz respeito ao desenvolvimento sustentável.
A preocupação com indicadores de
sustentabilidade foi colocada pela Agenda 21
31
nos capítulos que tratam da relação entre meio
ambiente, desenvolvimento sustentável e
informações para a tomada de decisões. A
idéia central da Conferência Rio-92 foi a de
dotar os países signatários dos instrumentos
adequados para medir e avaliar as políticas
públicas voltadas para o desenvolvimento
sustentável.
O projeto toma como referência a
metodologia proposta pela Comissão para o
Desenvolvimento Sustentável elaborada em
1996, intitulada. “Indicators of Sustentainable
Development Framework and Methodologics”
conhecido como “Livro Azul” e as recomenda-
ções adicionais que o sucederam, como é o caso
dos resultados do “International Expert
Meeting on Information for Decision - Making
and Participation”, em setembro de 2000, no
Canadá. Assim, trata de temas como Saúde,
Educação, Habitação, População, Atmosfera,
Terra, Oceanos/Mares e Costas, Água, Biodiver-
sidade, Padrões de consumo e produção, etc.
Com o objetivo de fornecer uma avaliação
mais adequada quanto ao processo de desenvol-
vimento, cada indicador será apresentado numa
perspectiva evolutiva através de série histórica
de dados para Brasil, tomando como base o ano
de 1992. Além disso, quando possível, será ado-
tado o nível de agregação espacial das unidades
da Federação o que permite o exame da diver-
sidade de situações existentes no país.
O esforço que o IBGE vem realizando com
este projeto pretende disponibilizar um conjunto
de indicadores que posteriormente poderá e
deverá ser adaptado, ampliado e aprimorado e
que, certamente, contribui para ampliar o
debate das questões ambientais na sociedade
brasileira.
Acreditamos que é importante, contudo, não
minimizar as dificuldades existentes na defini-
ção e no aprofundamento do conceito de desen-
volvimento sustentável.
A visão de desenvolvimento sustentável da
interpretação neoclássica tende a cair, na nossa
opinião, na armadilha do que poderíamos
chamar de utopia da razão técnica e supor que
a sustentabilidade da aventura civilizatória
humana pode ser alcançada exclusivamente
através do aumento da eficiência econômica e
da adoção de tecnologias mais limpas. Nesse
caso, estaríamos frente à uma versão extremista
da hipótese fraca da sustentabilidade, que
admite a exaustão de qualquer riqueza natural
desde que seu valor possa ser reposto por outro
ativo de igual valor, propondo um modelo que
ignora completamente as incertezas envolvidas
nessa troca e representa muito mal a realidade
do processo de produção.
Em outra posição estariam não apenas os
adeptos da hipótese forte da sustentabilidade
como também aqueles que ao se situarem entre
os dois extremos (na forma apresentada no
início deste artigo) chamam a atenção para a
necessidade de definir o recorte territorial dos
ecossistemas cuja sustentabilidade deseja-se
preservar e a abrangência temporal do
compromisso com as futuras gerações.
Se o que pode estar sob ameaça, numa escala
de tempo à qual não estamos habituados e é
impossível ao mercado “enxergar”, é o
ecossistema planetário na sua forma atual e,
portanto, a própria sobrevivência da espécie
humana, como atribuir valor àquilo que afeta,
positiva ou negativamente, a sustentabilidade
do desenvolvimento?
Em posição oposta à razão tecnicista,
portanto, estariam aqueles que, ainda que
considerando desejável e indispensável o aumen-
to da eficiência econômica e tecnológica, pen-
sam ser necessária a constituição de vontades e
mecanismos democráticos globais que se sobre-
ponham à orientação de mercado (eficiente na
alocação dos recursos produtivos mas cega e
surda à quaisquer outros valores que não os da
32
acumulação de capital) fazendo prevalecer os
princípios da sustentabilidade ambiental e ética
da humanidade. Para isso é preciso estar aberto
à discussão dos padrões de
produção, circulação e
consumo de mercadorias e
admitir que os recursos natu-
rais do planeta constituem
ativos cujos valores não serão
determinados de forma
intrínseca pelo mercado na
sua forma atual, mas sim
construídos historicamente
por uma humanidade progres-
sivamente mais consciente.
Os trabalhos preparatórios
para o novo manual da ONU
sobre contas ambientais
(SEEA 2000) definem três
“funções” do meio ambiente sobre a economia:
1) funções de recursos (recursos naturais
colocados à disposição para conversão em
bens ou serviços);
2) funções de serviços (provêem as condições
necessárias para a manutenção da vida) e
3) funções de absorção (diz respeito à absorção
dos resíduos da produção e do consumo).
Para nossos propósitos, podemos considerar
secundária a questão da disponibilidade de
recursos naturais para o processo de produção e
consumo porque ela é muito mais sensível à
evolução tecnológica e porque para um recurso
fundamental (a energia) existe enorme e
constante oferta externa ao planeta, o que não
ocorre para as outras duas funções.
A diminuição da quantidade e qualidade das
funções de serviço e o inegável uso das funções
de absorção muito além das suas capacidades
de assimilação dos resíduos da produção e do
consumo, contudo, podem (e o estão fazendo)
ameaçar severamente a qualidade de vida das
populações mais desfavorecidas em termos
econômicos e sociais e a própria biodiversidade
atual do planeta, inclusive a sobrevivência da
espécie humana.
Para dimensionar o im-
pacto das atividades humanas
sobre essas funções, entre-
tanto, é necessário definir o
recorte territorial, determi-
nando se os impactos são
locais, regionais ou globais.
Questões locais tem a ver com
qualidade do ar, fornecimento
de água limpa, a remoção e
disposição do lixo sólido e dos
efluentes líquidos, limpeza
das ruas, etc.
Questões regionais são
causadas principalmente
pelos automóveis, produção
de energia e indústria pesada. Afetam as
grandes cidades e áreas circunvizinhas, bacias
hidrográficas e até extensões além das fron-
teiras nacionais, como a “chuva ácida”
decorrente das emissões de dióxidos de enxofre
e de nitrogênio.
A terceira categoria de questões são as
globais e suas conseqüências mais conhecidas
são o aquecimento global, a crise de
biodiversidade, a destruição da camada de
ozônio e a degradação dos oceanos. É provável
que a escassez de recursos hídricos e o aumento
da desertificação exijam, também, uma
aproximação global, além da regional.
Desenvolvimento sustentável é um conceito e
um processo histórico em construção que
pressupõe uma dimensão espacial (o território)
e uma dimensão temporal (a extensão do com-
promisso com as gerações futuras). Ambas exi-
gem definições concretas e consistentes entre si.
Assim, a preservação de um determinado
ecossistema poderia ser definida, em função da
abrangência de seu território, como um
problema local ou regional. A avaliação da
33
Desenvolvimento
sustentável é um conceito e
um processo histórico em
construção que pressupõe
uma dimensão espacial e
uma dimensão temporal.
Ambas exigem definições
concretas e consistentes
entre si.
sustentabilidade do desenvolvimento de uma
nação, ou grupos de nações, uma questão
regional. Os processos globais são, como vimos,
aqueles que afetam a sustentabilidade do desen-
volvimento e da vida humana no planeta.
Quanto à dimensão temporal, a escala de
tempo que envolve a sustentabilidade de um
ambiente local ou regional é medida em
décadas, o que já configura um horizonte muito
mais dilatado do que aquele à que estamos
(instituições e mercado) habituados.
A agressão ao ecossistema global,
entretanto, exige da humanidade capacidade de
pensar e agir em um tempo histórico ainda mais
amplo, mensurável em séculos. Isso diz respeito
não apenas ao futuro (apenas como exemplo,
gases de efeito estufa permanecem séculos na
atmosfera e essa também é a unidade para
medir a dilatação das águas dos oceanos,
decorrente do aquecimento global e causa
principal da elevação do nível dos mares) mas
também ao passado, na medida em que por
detrás da noção de “responsabilidades comuns
porém diferenciadas”, consagrada na Rio-92,
está a consciência de que entre as nações do
mundo existem responsabilidades históricas
distintas pelos processos em andamento.
Paradoxalmente, essa dilatada escala de
tempo torna fundamental e coloca na agenda a
exigência de urgência para a produção das
informações físicas que permitam acompanhar
os processos de poluição que ocorrem em escala
global. Isto por duas razões. Em primeiro lugar
porque como é grande o desconhecimento sobre
a dinâmica ecológica do planeta, o princípio da
precaução exige o uso equilibrado dos recursos
e serviços do meio ambiente de forma a prevenir
danos irreparáveis à sua sustentabilidade. Em
segundo lugar, porque é o conhecimento
científico dos processos em andamento e das
suas conseqüências que fornecerá o suporte
para que a sociedade humana, através de uma
dinâmica democrática global, construa os
mercados e os sistemas de regulação que
tornarão possível atribuir valores aos ativos
importantes para a sustentabilidade da vida tal
qual a conhecemos. O melhor exemplo contem-
porâneo são as negociações no âmbito da ONU
para o enfrentamento do aquecimento global,
que através do Protocolo de Kioto e acordos
subseqüentes viabilizaram o surgimento de um
mercado global para toneladas de carbono que
deixem de ser acumulados na atmosfera.
Do ponto de vista da elaboração de
indicadores de Desenvolvimento Sustentável
isso significa, também, que é preciso tomar
extremo cuidado para não confundir os
indicadores que iluminem a agressão humana
ao ecossistema planetário com o conjunto de
informações que cada sociedade produz e utiliza
em seu território com vistas à avaliar a
sustentabilidade de seu desenvolvimento e à
melhoria de suas políticas públicas.
Em outras palavras, não é a agregação dos
Indicadores de Desenvolvimento Sustentável
que cada país produz, com seu caráter embri-
onário anteriormente exposto e suas dificul-
dades para obterem uma territorialização que
reflita a realidade dos ecossistemas, que poderia
constituir-se numa informação adequada da
sustentabilidade do desenvolvimento global.
Tampouco esses indicadores se prestam à
hierarquizações que não teriam qualquer
consistência espacial ou temporal com a
sustentabilidade do planeta.
Ainda que os indicadores globais possam ser
harmonizados e definidos como um subconjunto
dos indicadores de desenvolvimento sustentável
que cada país deveria produzir, sabemos que o
estágio em que as nações do mundo se encon-
tram na produção de estatísticas econômicas,
sociais, e, principalmente, ambientais, é bas-
tante heterogêneo e que a definição das prio-
ridades nos programas de trabalho estatístico
34
de cada país decorre de sua própria vida social
e é assunto autônomo dos Institutos Nacionais
de Estatística.
Desse ponto de vista, parece-nos que, sem
prejuízo dos esforços conduzidos pela Comissão
Estatística das Nações Unidas na produção de
estatísticas ambientais e de contas ambientais
associadas às contas nacionais e pela Comissão
de Desenvolvimento Sustentável das Nações
Unidas através dos indicadores do desenvol-
vimento sustentável do Livro Azul, que
propiciam às sociedades elementos para avaliar
aspectos da sustentabilidade de seu desenvol-
vimento, deveria ser considerado objetivo
prioritário a elaboração de Indicadores do
Desenvolvimento Sustentável Global que
retratem fisicamente os processos de agressão
global ao ecossistema planetário, tornando
possível prevenir eventos irreparáveis e
fornecendo o suporte necessário para a
construção dos mercados que serão responsá-
veis pela valoração dos ativos naturais.
Para isso seria necessária a concentração de
esforços nesses processos (Mudança Global do
Clima, Crise de Biodiversidade, Redução da
Camada de Ozônio, degradação dos oceanos,
desertificação e crise de recursos hídricos). A
criação de um sistema de monitoramento da
sustentabilidade do desenvolvimento mundial
exigiria dos países desenvolvidos amplos
investimentos no conhecimento científico e
acompanhamento da biosfera, da atmosfera,
dos oceanos e dos continentes; na realização de
seus próprios levantamentos nacionais e no
apoio à ONU e instituições multilaterais na
mobilização de recursos para harmonizar
metodologias e viabilizar a execução dos
levantamentos dos países menos desenvolvidos.
A experiência da definição de metodologia pelo
Painel Intergovernamental sobre Mudança do
Clima (IPCC) e o sistema construído para
apoiar a realização das comunicações nacionais
para a Convenção Quadro das Nações Unidas
sobre Mudança do Clima poderia ser
aproveitada como modelo.
35
Sérgio Besserman Vianna
Presidente do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística)
Guido Gelli
Diretor de Geociências do IBGE
A idealização do território é provavelmente
um dos temas mais caros ao romantismo, ao
longo de todo o século XIX. O Brasil, jovem
Nação que então emergia para a história, não
poderia ser exceção. Assim como os Estados
Unidos da América projetaram sobre o far west
as esperanças de construção de uma sociedade
nova e sem igual – rica, empreendedora,
desafiadora – o Império brasileiro começou a
construir sua imagem de pujança natural,
mistério e desafio civilizatório a partir das
primeiras expedições científicas que aportaram
em nosso país tão logo este se fez independente.
Mais do que um Imperador culto, mecenas
das artes e das ciências, movia o interesse sobre
a Amazônia a possibilidade de se descobrir
formas de vida insuspeitadas, testemunhas vivas
da generosidade infinita da criação. De fato,
aquele país que a Europa antevira através do
traçado da paisagem do “Brasil holandês”1
e de
Debret aprofunda-se a partir de meados do
século XIX com a expedição de Spix e Martius,
a expedição Langsdorff e tantas outras que nos
deixaram o testemunho do olhar deslumbrado
do ocidente culto sobre a América intocada e
desafiadora.
A primeira elaboração romântica nacional
sobre a Amazônia foi incitada pelo próprio
Imperador, ao propor ao Instituto Histórico e
Geográfico o desenvolvimento de estudos que
respondessem às seguintes questões: “Se
existiram Amazonas no Brasil? Se existiram, quais os
testemunhos de sua existência; quais seus costumes,
usanças e crenças? Se se assemelhavam ou indicavam
originarem-se das Amazonas de Scithia e Líbia, e
quais os motivos do seu rápido desaparecimento? Se
não existiram, que motivo tiveram Orellana e
Cristovão da Cunha, seu fiador, para nos asseverarem
a sua existência?” E coube justamente a Antônio
Gonçalves Dias, um de nossos mais importantes
poetas românticos, desincumbir-se da tarefa2
.
De lá para cá, essa mitologia sempre
encontrou eco entre brasileiros e estrangeiros –
e continuará encontrando, de vez que o
desconhecido tão bem se presta à imaginação –
mas, ao mesmo tempo, tem servido de forte
estímulo à indagação científica e à apropriação
racional desse que, sem dúvida, é um dos mais
expressivos patrimônios da humanidade.
Hoje, quando vislumbramos a Amazônia, é a
contribuição que ela possa dar à humanidade
enquanto espaço singular, habitat de um sem
número de espécies naturais, que move nossas
indagações e mobiliza nossas energias. Já não
são poucos os documentos que circulam nas
esferas públicas e que sugerem uma vasta gama
de opções estratégicas para se viabilizar na
Amazônia uma “civilização brasileira florestal” com
o objetivo de preservar a quase totalidade deste
bioma e desenvolver as atividades econômicas
capazes de promover a elevação do padrão de
vida da população da região. No extremo
oposto, é grande o alarmismo fomentado pela
divulgação de projeções sobre a “destruição”
da Amazônia se mantidos os níveis de
desflorestamento, associados à extração de
madeira e produção agropecuária, ou simples-
mente os incêndios florestais decorrentes de
práticas agrícolas inadequadas, ou, ainda, o que
37
Amazônia: desafios de
uma civilização tropical
no século XXI
grandes projetos de infra-estrutura permitem
antever.
A aparente utopia da “civilização florestal” –
afinal nenhum país industrializado logrou este
tento até os dias correntes – tem o sentido maior
de desafio a que se construa formas originais de
gestão dos recursos naturais da floresta,
tornando-as perenes ao mesmo tempo que
propiciadoras do bem estar da população.
Portanto – pelo que encerra de esperanças e
possibilidades – a defesa do bioma amazônico
constitui um interesse nacio-
nal especifico, permanente,
com potencial de produzir
valores para a sociedade mui-
to maiores do que os valores
porventura decorrentes da
supressão da floresta para o
uso da madeira e da terra.
Área de contrastes reais e
imaginados, a Amazônia
deve ser encarada como
ecologicamente orientada
pela recriação das formas de
produção que tomam os
recursos naturais como o
diferencial que maior valor
agrega ao desenvolvimento regional. Assim, ela
deixaria de ser uma região “de fronteira” para,
através da valorização dos seus recursos
naturais, viabilizar um modelo de desenvol-
vimento endógeno, único no mundo, com o uso
de tecnologias adequadas ao seu manejo, parti-
cularmente da água, do solo e da vegetação.
Esse modelo singular seria o parâmetro
orientador para todas as oportunidades de
investimentos que lá venham a ser identificadas.
Vê-se, portanto, que também no início do
século XXI encontra-se o país dotado de uma
nova utopia para a Amazônia: a utopia da
civilização florestal apoiada nas mais
avançadas tecnologias disponíveis. Ao contrário
porém da utopia romântica, a nova “utopia”
vale pelos compromissos transformadores que é
capaz de engendrar a partir dos esforços dos
brasileiros e da comunidade internacional. A
exploração da região já não pode ser uma
empreitada isolada, seja de interesses
comerciais voltados para ganhos imediatos, ou
mesmo de cientistas, dobrados sobre sua imensa
riqueza sem compromissos com as populações
locais ou com o significado de suas descobertas
para o país como um todo. A Amazônia do
futuro será de todos os brasileiros e a cons-
ciência que hoje se forma em
torno dela corresponde à
apropriação racional, madu-
ra, dessa porção do território
que antes mais se prestava às
fantasias românticas.
Para nós, brasileiros, o
desafio de se elevar a
qualidade de vida dos vinte
milhões de amazônidas sem
comprometer a identidade da
região e a diversidade social,
cultural, ambiental e biológi-
ca que a caracterizam é a
diretriz maior de quantos
planos e projetos de desenvol-
vimento venham a estar orientados para o seu
território. O que a região pode melhor oferecer
à humanidade são serviços ambientais e
conhecimento dos processos de convivência e
evolução das espécies; alguns já pesquisados,
outros imaginados, a maioria desconhecidos.
Preservar e fomentar esta possibilidade de
avanço científico é uma responsabilidade, em
primeiro lugar, do Estado brasileiro e, subsidia-
riamente, de toda a comunidade internacional
voltada para a construção de novos patamares
de interação sustentável com a natureza em
escala planetária. Não há outro caminho a
seguir: é preciso um compromisso universal,
amplo, com o caráter inovador de desenvolvi-
mento que a Amazônia permite vislumbrar,
38
A Amazônia do futuro será
de todos os brasileiros e a
consciência que hoje se
forma em torno dela
corresponde à apropriação
racional, madura, dessa
porção do território que
antes mais se prestava às
fantasias românticas.
desde que a curiosidade científica se debruçou
sobre o seu território, a partir do século XIX.
Afinal é na Amazônia que se joga, como é cada
vez mais reconhecido, boa parcela da sorte da
humanidade como um todo.
Felizmente, já superou o país aquela fase do
planejamento regionalizado, no qual se dividia
pelo espaço parcelas do orçamento público
alocando-os em estratégias de crescimento que
– esperava-se – atingiria as metas inicialmente
projetadas. Hoje, no plano que persegue a
articulação territorial das diversas iniciativas
públicas e privadas, governamentais ou não
governamentais, catalogadas sob a ótica do
desenvolvimento social, econômico, ambiental e
de informação e conhecimento, respeitando-se
as especificidades locais e tendo como pano de
fundo uma estratégia nacional de desenvolvi-
mento sustentável, o panorama que se
descortina é bem mais integrado, mais cheio de
determinações recíprocas, de sorte que se
dispõe do vasto acervo de conhecimento que se
acumulou no processo de elaboração tanto da
Agenda 21 Brasileira quanto dos Eixos
Nacionais de Integração e Desenvolvimento.
Em outras palavras, o tecido social e econômico
que vai se desenhando em torno de diretrizes
como as estabelecidas na Agenda 21, ou dos
Eixos, fazem da Amazônia não uma região a se
“resgatar” mas, antes, um espaço de plane-
jamento a se integrar mais e mais às dinâmicas
nacional e internacional, alimentando-as e delas
se nutrindo também.
Cada vez menos, numa sociedade
globalizada, os “espaços” não poderão ser
fechados sobre si mesmos. Cada vez mais a
sinergia entre eles determinará a dinâmica que
move os países e as regiões espacialmente mais
próximas ou economicamente mais integradas.
Por essa razão, os investimentos já não são
“regionalizados” no sentido clássico. Tomemos,
por exemplo, a “marca Amazônia”. O seu
desenvolvimento exige que seja amplamente
aceita no mercado mundial, pois através dela se
legitima um acréscimo de valor aos produtos
que corresponda ao “custo ambiental” para
produzi-los, isto é, um diferencial que possa ser
garantia do desenvolvimento regional
sustentável.
Evidentemente esta experiência que se
vislumbra exige que nos debrucemos de várias
maneiras novas sobre a Amazônia. Uma delas,
na área de “informação e conhecimento” -
dimensão reconhecidamente contemporânea do
desenvolvimento, onde a construção do padrão
que a Amazônia requer se alicerça – passa-se
necessariamente pelo acesso universal da
população local à informação e aos conteúdos
do conhecimento que dizem respeito às suas
vidas, trabalho e fruição cultural enquanto
formas de inclusão e organização social para o
pleno exercício da cidadania. Recursos públicos
já disponibilizados para essa finalidade – como
os recursos do Fundo de Universalização dos
Serviços de Telecomunicações – precisam ser
desenvolvidos e incrementados de forma a
provocar no menor tempo possível o maior
impacto esperado. Essa dimensão estratégica
da informação e do conhecimento abriga, ainda,
programas de capacitação profissional e técnica
para atividades organizadas na forma de
arranjos produtivos locais (sustentáveis e
competitivos) ou para atender políticas públicas
específicas, de desenvolvimento social ou meio
ambiente.
Complementarmente, há que se investir em
pesquisa e desenvolvimento de caráter inovador,
porém voltada para arranjos produtivos já
existentes, como a Zona Franca de Manaus, ou
para novas atividades que possam potencializar
as vantagens competitivas do ambiente local e
seu repertório de informações ecológicas e
biológicas. Esse é um enorme desafio para a
sociedade científica brasileira e, particular-
mente, para as poucas centenas de doutores que
vivem na região, fato que constitui uma
39
fragilidade notável para o desenvolvimento
regional. A atratividade moderna da
“Amazônia”, como vimos, remonta ao século
XIX. No entanto, a fixação dos talentos a ele
vocacionados, a interação do conhecimento
produzido com a população autóctone, o
desenvolvimento científico local – tudo isso
constitui itens da pauta do modelo de
desenvolvimento sustentável regional que o
Estado brasileiro deve perseguir com afinco nos
tempos presentes.
A busca da harmonia com a ecologia
amazônica impõe a necessidade de inovação
também para os projetos de infra-estrutura
econômica, ou seja, transporte, energia e
comunicações, que devem ser concebidos como
sistemas adaptados ao ambiente e ao contexto
de uma Amazônia subcontinental, interna-
cionalmente integrada. Essa ótica ilumina a
integração internacional não só como indutora
de fluxos comerciais, mas também de fluxos de
informação e conhecimento (redes de comu-
nicações) e de melhores alternativas de
investimento na exploração de recursos naturais
e na infraestrutura. O aproveitamento hidre-
létrico mais racional de Guri, na Venezuela, e a
exportação de energia através de linhas de
transmissão para o Estado de Roraima, no
Brasil, formam um conjunto exemplar dessa
busca de ecoeficiência subcontinental nos
investimentos de infra-estrutura. Outro digno de
registro é proposta de interligação rodoviária
entre os estados de Roraima e Amapá, no
extremo norte do subcontinente, através de um
arco, que se inicia em Boa Vista e termina em
Macapá, e passa, no sentido horário, por
Georgetown, Panamaribo e Cayenne, antes de
reingressar ao território brasileiro. Está via já
está quase toda pavimentada e é conhecida
como “Arco Norte”.
Como sistemas mais adaptáveis ao ambiente
amazônico destacam-se as hidrovias, o
aproveitamento energético do gás natural de
Urucu e fontes alternativas de energia, mais
expressivas e eficientes quando combinadas
entre si.
Dos projetos de hidrovias merece menção a
Hidrovia do Rio Madeira, iniciativa público-
privada, que ao inverter a lógica do fluxo
predominante de transporte que atende a região
centro-oeste, voltada aos portos da região
sudeste, para o Norte, na direção do porto
fluvial de Itacoatiara, às margens do Rio
Amazonas, proporcionou uma redução no custo
de transporte de grãos da ordem de 30 dólares
por tonelada.
Na abordagem da questão ambiental, a
inovação que se busca passa pela abordagem
conceitualmente mais ampla que não se
restringe a ações mitigadoras, normalmente
decorrentes de projetos de infra-estrutura, mas
que trata o meio ambiente como gerador de
oportunidades de emprego e renda.
Nas áreas florestadas, por exemplo, isso
implica em exploração do turismo sob as mais
diversas formas (turismo ecológico, pesca
esportiva, turismo de aventura, observação de
pássaros, etc- modalidades contempladas no
PROECOTUR) ou em atividades de manejo de
baixo impacto, de produtos madeireiros ou não-
madeireiros. Nesse contexto, há necessidade de
se incentivar comercialmente atividades
sustentáveis, tanto através de iniciativas da
sociedade (associações de compradores de
produtos certificados, por exemplo), como pelo
uso do poder público, incluindo-se dispositivos de
iniciativas ou acordos internacionais (fair trade).
Nas áreas degradadas da região, que
equivalem à superfície da França, isso significa
acreditar no desenvolvimento social, ambiental
e econômico proporcionado por investimentos
em sistemas agroflorestais, basicamente de
caráter familiar e comunitário, e por uma busca
de maior produtividade no uso do solo, através
de técnicas de manejo de pastos e capoeiras
40
Carlos Alberto Dória
Gerente de Estudos dos Eixos Nacionais de Integração e Desenvolvimento do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão
Pedro Neto - Consulteur
Ronaldo Luiz - Consulteur
1 A respeito da importância dessa experiência colonizadora para o conhecimento científico do Brasil ver Dante Martins
Teixeira, O mito da Natureza Intocada: as aves do Brasil holandês (1624-1654) como exemplo para a história recente da fauna do
novo mundo, Tese apresentada ao Programa de Pós-graduação em Ciências Biológicas, UFRJ, Rio de Janeiro, 1999.
2 Ver Antonio Gonçalves Dias, “Amazonas. Memória escrita em desenvolvimento do programa dado por S. M. I. ao sócio...”, Revista
do Instituto Histórico e Geographico Brazileiro, tomo XVIII, 1855 (terceira série), Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1896.
(vegetação secundária). Aqui bem caberiam
incentivos internacionais na forma de créditos
de redução de emissão (CER), de que trata o
mecanismo de desenvolvimento limpo (MDL) do
Protocolo de Quioto.
O padrão inovador também deve estar
presente na construção de um arcabouço
político-institucional consistente, a começar
pela estrutura de suporte para a Lei de Crimes
Ambientais. Ressalte-se também os avanços
introduzidos pelo Sistema Nacional de
Unidades de Conservação (SNUC), dentre os
quais se destacam os conceitos de corredores
ecológicos e de reservas da biosfera, além do
compromisso governamental de se elevar o
percentual de unidades de conservação para
10% do território nacional. Mas há avanços
significativos ainda na realização da meta
constitucional de se demarcar os cerca de 90
milhões de hectares de terras indígenas, quando
se verifica que estamos muito próximos de
concluir esse processo de que trata o Artigo 67
das suas disposições transitórias.
Na questão do acesso aos recursos genéticos
há diversas proposições em tramitação no
Congresso, sendo importante ressaltar os
debates em torno da repartição dos benefícios
da biodiversidade, em especial, como remunerar
o conhecimento das populações tradicionais. De
qualquer forma, embora não haja uma instância
normativa e deliberativa instalada para cuidar
dessa questão, já se vislumbram os caminhos a
percorrer.
De maneira geral, pode-se dizer que desde a
Rio 92 deu-se um salto de qualidade na
consciência nacional e internacional sobre a
Amazônia. Nos últimos dez anos, os brasileiros
e quantos vislumbram a Amazônia como
portadora de perspectivas generosas para o
futuro da humanidade, souberam se debruçar
sobre uma utopia originalmente novecentista e
transformá-la num grande objetivo nacional e
internacional nos marcos do desenvolvimento
sustentável. Este conceito, tão essencial para a
civilização que se esboça para o século XXI, ou
se firma e se alastra a partir de perspectivas
concretas engendradas no espaço amazônico ou
não passará de frase vazia, desprovida de
significado social. Assim, a metáfora de uma
“civilização brasileira florestal” resume o rumo que,
entre nós, devem ter todas as ações e esforços
visando a exploração e integração do espaço
amazônico em benefício do conjunto da
nacionalidade e da humanidade. Esta a
mensagem que, com o exemplo prático, os
brasileiros quererão levar a Joanesburgo, na
chamada “Rio + 10”.
41
A incorreta destinação dos resíduos sólidos
urbanos, sobretudo nas regiões metropolitanas
mais densamente povoadas do país, chegou a
uma situação-limite. No Estado de São Paulo,
por exemplo, levantamento feito em 1999 pela
Cetesb mostrava que metade dos municípios
ainda utilizava exclusivamente os lixões,
ameaçando a saúde pública, enquanto apenas
28% armazenavam os detritos corretamente em
aterros sanitários - e mesmo assim sem ainda
obter altos índices de reciclagem.
A situação piora ano a ano com o
esgotamento da capacidade de lixões e aterros
sanitários, ausência de locais para a construção
de novos aterros, equipamentos de incineração
desativados ou funcionando inadequadamente, e
falta de estímulos à coleta seletiva e
recuperação de materiais como plásticos, latas,
alumínio e vidro.
A razão do drama crescente enfrentado pelo
país com o problema da destinação do lixo
repousa sobre a ausência de uma política nacio-
nal que co-responsabilize poder público, inicia-
tiva privada e cidadãos, e seja implementada
mediante instrumentos como educação ambi-
ental, dispositivos legais, múltiplas técnicas de
manejo de resíduos urbanos, e uma gestão
eficiente em todas as fases do processo.
De fato, sem uma ampla articulação entre
poder público e sociedade, continuaremos
expostos a todo tipo de improvisações quanto à
destinação do lixo. Entretanto, tal união de
esforços requer que as diversas ações dos
agentes públicos e privados sejam concatenadas
dentro de um marco legal.
É isto o que discute presentemente uma
Comissão Especial da Câmara dos Deputados,
formada para consolidar, em uma única
legislação, mais de 70 projetos de lei apre-
sentados a respeito. Tal legislação deve dispor
sobre a utilização dos escassos recursos
existentes com o máximo de eficiência econômi-
ca; contemplar o que existe de mais avançado
em logística de coleta seletiva e tecnologias de
compostagem, reciclagem, aterragem, recupe-
ração energética e incineração limpa; e dotar o
Estado de instrumentos legais para fiscalizar
empreendimentos que gerem grande volume de
resíduos.
A política nacional de manejo de resíduos
sólidos urbanos será tanto mais bem sucedida
enquanto tiver como alvos: reduzir a quantidade
e a nocividade dos resíduos sólidos; eliminar os
prejuízos à saúde pública e ao meio ambiente
por eles causados; formar uma consciência
comunitária sobre a importância da opção pelo
consumo de produtos e serviços que não afron-
tem o meio-ambiente e/ou que seja recicláveis
mediante um manejo adequado; e gerar benefí-
cios sociais e econômicos tanto aos municípios
que se dispuserem a licenciar instalações para a
destinação correta dos resíduos, quanto a
centenas de milhares de catadores, bem como
para empresas de reciclagem.
O grande desafio do relatório que estou
incumbido de preparar e apresentar para ser
submetido à votação será chegar a um consenso
sobre as bases e os instrumentos de tal política.
Até o momento, por exemplo, chegou-se ao
consenso de que um dos princípios a embasar
45
Por uma política
nacional de resíduos
sólidos
uma política nacional de resíduos sólidos é o da
responsabilidade compartilhada entre os diver-
sos agentes. Vejamos como isso funcionaria, por
exemplo, na fabricação e consumo de alimentos
industrializados. Todo elo de cada cadeia
produtiva cuida de dar destinação correta a seus
próprios resíduos industriais. O resíduo do
produto final deve ser corretamente descartado
pelo consumidor, por exemplo, separando o lixo
doméstico em duas frações, uma orgânica
(restos do alimento), que seguiria para compos-
tagem, e a outra (embalagem usada), cujos
materiais podem ser reciclados. As prefeituras
continuam com a responsabilidade sobre o
transporte, introduzindo coleta seletiva nos mu-
nicípios onde ainda ela inexiste, e a indicação de
locais para compostagem ou destinação de
resíduos não recicláveis. Cooperativas de cata-
dores fazem a separação dos materiais e,
mediante acordos com as prefeituras, poderão
comercializá-los. Empresas de reciclagem
devem estar envolvidas, devolvendo os materiais
ao mercado sob a forma de novos produtos.
A idéia é que a legislação induza a cada elo
das cadeias produtivas a assumirem suas res-
ponsabilidades. À indústria, por exemplo, além
de cuidar de dar correta destinação a seus
rejeitos industriais, caberá reduzir gradativa-
mente o volume de suas embalagens, para
reduzir o volume final dos resíduos descartáveis.
Indústrias de bens que exigem cuidados
especiais, como baterias e pneus, manterão seus
próprios esquemas de coleta e destinação final.
Na construção civil, o proprietário do empreen-
dimento, a construtora e os transportadores dos
materiais descartados nas obras serão solidaria-
mente responsáveis por sua correta destinação
final. E assim por diante.
A legislação também deverá instituir dois
fundos: um de limpeza urbana, distrital ou
municipal, para dar suporte financeiro às ações
voltadas à melhoria e à manutenção dos
serviços de limpeza urbana. E outro de resíduos
sólidos, de âmbito federal, para aplicação
prioritária em cooperação técnica e financeira
com os Estados, Distrito Federal e Municípios,
em ações, projetos, programas e planos rela-
cionados ao gerenciamento de resíduos sólidos,
bem como na recuperação de áreas degradadas
pela disposição inadequada de resíduos sólidos,
cuja autoria tenha sido impossível de recuperar.
Neste momento, um intenso trabalho de
articulação parlamentar está sendo desen-
volvido, para obter consenso sobre os principais
dispositivos da nova política. Desenvolvem-se
audiências públicas com representantes dos
diversos agentes diretamente atingidos, como
prefeituras, cadeias produtivas de materiais
recicláveis e órgãos de controle ambiental, com
apoio do conhecimento acadêmico.
O passo seguinte será a apresentação do
relatório final. Desta forma, a comissão poderá
debater e aperfeiçoar uma proposta que já
contará com um razoável respaldo dos
diferentes segmentos do poder público e da
sociedade.
46
Emerson Kapaz
Deputado Federal pelo PPS-SP e relator da Comissão Especial para uma Política Nacional de Resíduos Sólidos
Educação ambiental é, sem dúvida, um dos
meios mais indicados para se resgatar valores
que incluem o respeito pela diversidade cultural
e biológica, fundamentais para a conservação e
para um convívio harmônico entre diferentes
culturas e entre essas e a natureza. A aceitação
sem questionamento do modelo de desenvol-
vimento baseado no consumo desenfreado tem
levado o ser humano a adotar atitudes que
acabam resultando em diferenças sociais cres-
centes e em perdas culturais e biológicas irrepa-
ráveis. No Brasil a gravidade dessas perdas é
compatível à sua riqueza. Como um dos países
líderes em biodiversidade no mundo, a responsa-
bilidade do Brasil em proteger tal riqueza é
enorme e a educação ambiental pode ser
fundamental nesse processo.
A educação ambiental no Brasil
Há muito que o Brasil vem percebendo a
importância da educação ambiental. Durante o
fórum paralelo da Rio-92, foi elaborado o
documento “Tratado de Educação Ambiental
para Sociedades Sustentáveis e Responsa-
bilidade Global”. Um de seus princípios é que
“a educação ambiental deve ter como base o
pensamento crítico e inovador, em qualquer
tempo ou lugar, em seus modos formal, não
formal e informal, promovendo a transformação
e a construção da sociedade” (WWF/
ECOPRESS, 2000:22). Reconhece, ainda, que
a “educação ambiental deve ajudar a desen-
volver uma consciência ética sobre todas as
formas de vida com as quais compartilhamos
este planeta, respeitar seus ciclos vitais e impor
limites à exploração dessas formas de vida pelos
seres humanos” (WWF/ECOPRESS, 2000:24).
Ainda em 1992, os Ministérios do Meio
Ambiente, da Educação, da Cultura e da
Ciência e Tecnologia instituíram o Programa
Nacional de Educação Ambiental – PRONEA.
Na perspectiva de cumprir suas determinações e
na qualidade de executor da política nacional de
meio ambiente, o IBAMA elaborou diretrizes
para a implementação do PRONEA. Incluiu a
educação ambiental no processo de gestão
ambiental, o que a torna presente em quase
todas as suas áreas de atuação (IBAMA, 1996).
Já o Ministério da Educação elaborou em
1997 uma nova proposta curricular conhecida
como Parâmetros Curriculares Nacionais -
PCNs, onde a dimensão ambiental passa a ser
um tema transversal nos currículos básicos do
ensino fundamental (de 1ª a 8ª séries). Ao
permear todas as disciplinas, a educação ambi-
ental integra questões socioambientais de forma
ampla e abrangente (MEC, 2000).
A culminância do reconhecimento de sua
importância se deu em abril de 1999, quando a
educação ambiental passou a contar com a Lei
nº 9795/99, que a oficializa como área essen-
cial e permanente em todo processo educacional
do país. A lei está embasada no artigo 225,
inciso VI da Constituição Federal de 1988, que
menciona a responsabilidade, individual e
coletiva, da sociedade na implementação e
prática da educação ambiental. A Política
Nacional de Educação Ambiental instituída
51
A importância da
educação ambiental
na proteção da
biodiversidade do Brasil
pela lei reconhece o dever de defender e
preservar o meio ambiente para as presentes e
futuras gerações e estimula a participação de
toda a sociedade para assumir responsabili-
dades em sua implantação (MEC, 2000).
Mesmo reconhecendo formalmente sua
importância, o Brasil ainda tem um longo cami-
nho a percorrer para imple-
mentar a educação ambiental
com efetividade. No ensino
formal o MEC vem se esfor-
çando para capacitar profes-
sores que possam desenvolver
programas pertinentes. No
entanto, o tamanho continen-
tal do país e os escassos
recursos alocados à área são
fatores que dificultam sua
implementação adequada.
Os desafios são muitos.
Como outros países que con-
tam com rica biodiversidade,
raras são as ocasiões em que
conservação ou a própria
educação ambiental são prio-
rizadas. Sendo assim, os
danos ambientais têm se intensificado, provo-
cando a perda da diversidade biológica e
cultural, a contaminação do ar e da água e
outros impactos igualmente irreparáveis.
A educação ambiental e seu papel na
conservação da biodiversidade
Apesar da preocupação com a sobrevivência
de espécies e ecossistemas ter levando à criação
de unidades de conservação que visam não só a
proteção, mas a continuidade de processos
evolutivos indispensáveis ao desenvolvimento da
riqueza biológica existente no planeta, uma
grande maioria dessas áreas é rodeada de
desmatamento ou de acentuada descaracte-
rização de sua condição original. Muitas
unidades de conservação tornaram-se “ilhas de
vida” e sua proteção é muitas vezes indispen-
sável à sobrevivência de espécies e ecossistemas
únicos no mundo. Contudo, são raros os exem-
plos onde existem profissionais e infraestrutura
à altura de sua importância biológica.
Neste cenário, o envolvimento de comuni-
dades locais passa a ser um
dos mais promissores meios
de proteção às unidades de
conservação. O fortalecimen-
to de tais comunidades pode
levar à participação efetiva, o
que difere da condição co-
mum em regiões remotas,
onde muitas destas unidades
de conservação estão locali-
zadas, em que segmentos
sociais menos favorecidos são
banidos do processo decisó-
rio. O fato de pessoas não
terem o hábito de participar,
comumente não perceberem
seu direito de reivindicar, ou
menos ainda seu potencial
transformador, torna a edu-
cação um meio singular de abrir caminhos que
podem beneficiar tanto a realidade social
quanto à ecológica. É na valorização do que é
possível ser feito localmente para a melhoria da
qualidade e da proteção da vida, dentro de um
princípio sugerido por Schumacher (1989) onde
a chave pode estar no singelo e não no
grandioso, que a educação ambiental representa
um meio eficaz de transformação. Com base no
respeito à vida humana e aos demais seres,
como proposto por Buber (1987), as relações
passam a representar um caminho de cresci-
mento, de cooperação e de concretizações
efetivas que podem beneficiar a coletividade.
A educação ambiental dirigida às populações
que vivem cerca de unidades de conservação
pode contribuir a tornar essas áreas em focos de
52
A Política Nacional de
Educação Ambiental
instituída pela lei reconhece
o dever de defender e
preservar o meio ambiente
para as presentes e futuras
gerações e estimula a
participação de toda a
sociedade para assumir
responsabilidades em sua
implantação.
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Rio + 10: o Brasil rumo ao desenvolvimento sustentável

  • 1.
  • 2. O tema do meio ambiente e seu tratamento multilateral são para o Brasil questões fundamentais, não apenas pelo interesse internacional e pelas crescentes implicações que vemos das atividades humanas sobre o meio ambiente, mas sobretudo pelo fato de estar vinculado ao tema do desenvolvimento – que permanece como a grande necessidade e aspiração nacional. A questão ambiental é hoje ineludível em vários campos da atividade humana e constitui sem dúvida uma das áreas que compõem a “agenda da opinião pública” contemporânea. No campo internacional, o Brasil tem um papel importante a desempenhar no que diz respeito ao bom encaminhamento das questões ambientais. Isso se deve tanto à transcendência do tema para uma necessidade interna básica – o desenvolvimento nacional – quanto à nossa condição própria – talvez única – de país de grandes dimensões e potencialidades, mas também de imensos contrastes econômicos e sociais. Contamos, em alguns setores, com características de país industrializado e em outros apresentamos graves índices de pobreza. Tais condições, se representam um grande desafio interno, representam também possibilidades externas, em termos tanto de acesso a recursos e tecnologia quanto de influência positiva e moderadora em favor de consensos que atendam às prioridades dos países em desenvolvimento e que encaminhem de forma construtiva as grandes questões ambientais tratadas no plano internacional. Tem o Brasil, assim, um diálogo frutífero tanto com os países em desenvolvimento quanto com os países desenvolvidos. Por todas essas razões, o Brasil é sempre visto como um dos principais atores nas tratativas internacionais sobre esses temas e nossas posições são, invariavelmente, acolhidas com respeito e atenção. Essa percepção decorre de nossas credenciais próprias, ligadas ao peso político e econômico do país, mas também das riquezas e da diversidade de nosso patrimônio ambiental. No tratamento de temas afetos ao meio ambiente e ao desenvolvimento sustentável é imprescindível abordar a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento – a Conferência do Rio, de 1992. A Conferência do Rio mudou o eixo da discussão sobre o desenvolvimento ao contextualizá-la numa visão global que coloca as relações Norte-Sul sob o signo da cooperação. No Rio de Janeiro, há quase dez anos, escreveu-se uma das páginas mais significativas do multilateralismo e da determinação dos povos de buscar um futuro comum fundado na paz e na construção da prosperidade. Para o Brasil, recordar a Conferência do Rio, significa também reafirmar o comprometimento do País com o desenvolvimento sustentável a partir de uma visão que transcende nossos interesses específicos para incluir nossas expectativas quanto à ação da comunidade internacional. A idéia do desenvolvimento sustentável é um 7 Rio+10: o Brasil na cúpula sobre desenvolvimento sustentável
  • 3. conceito heurístico – tem múltiplas dimensões. Associa a preocupação ambiental à não menos legítima preocupação com a economia e a erradicação da pobreza. A variável ambiental deve sempre estar presente de maneira positiva no estímulo e na sustentabili- dade do desenvolvimento – e não como instrumento abusi- vo de cerceamento econômico ou entrave comercial. O desenvolvimento susten- tável, enquanto conceito, é universal, mas, enquanto expe- riência, expõe sua dimensão local. No campo da implemen- tação, ainda somos vítimas do paradoxo do excesso de poder e do excesso de impotência. Excesso de poder que se reflete na concentração limitada de recursos financeiros, tecnológicos e de conhecimento, cujo acesso pelos países em desenvolvimento ainda conhece severos impedimentos. Excesso de impotência ante a incapacidade da comunidade internacional de galvanizar os recursos existentes para diminuir de maneira eficaz as distâncias dentro e entre as sociedades, o que agrava a insustentabilidade. Tornar o desenvolvimento sustentável uma alavanca de modernização requer conferir-lhe condições sistêmicas de competitividade. A internalização do mundo na vida das sociedades promovida pela regulamentação multilateral do desenvolvimento sustentável não se pode dar de maneira seletiva. A persistência, nos mercados desenvolvidos, de subsídios à agricultura, bem como de barreiras não tarifárias, reforçam a busca da competitividade por meio de práticas predatórias, que os governos devem-se esforçar por reverter. Completada uma década da conclusão dos históricos acordos do Rio, a busca do desenvolvimento sustentável mostra-nos a inter-relação entre conceitos e realidade. Os princípios consagrados na Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento e na Declaração de Florestas, bem como os compromissos da Agenda 21, ainda enfrentam o teste da vontade política de se adotarem novas atitudes, novas metodologias e de se empregarem novos meios que promovam a melhoria da qualidade de vida das populações sem que isso implique custos que hoje temos a consciência de serem inaceitáveis do ponto de vista ambiental. Por outro lado, a realidade política tem eviden- ciado que muitas das expec- tativas que tínhamos, em 1992, para colocar a cooperação internacional em novas bases, não têm sido plenamente satisfeitas e que os compromissos assumidos nos instrumentos emanados da Conferência não têm sido honrados em sua totalidade. Não foi definida uma agenda para a Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável (Joanesburgo, de 26 de agosto a 4 de setembro de 2002), por ocasião de sua convocação. Essa agenda está sendo objeto de negociações no âmbito do Comitê Preparatório da Conferência. No contexto preparatório para a Rio+10, o Brasil sediou, no Rio de Janeiro, em outubro de 2001, uma Reunião Regional dos Países da América Latina e do Caribe, em nível ministerial. Naquela ocasião, os países da região acordaram uma plataforma para as negociações em âmbito global, em que se sugere como tema central de Joanesburgo a busca de uma nova globalização e de um desenvolvimento sustentável inclusivo e eqüitativo. É importante ter presente que, na Conferência do Rio, a comunidade internacional assumiu um compromisso político de dupla natureza, a saber: a internalização, por meio da legislação e de outras práticas administrativas, 8 Tornar o desenvolvimento sustentável uma alavanca de modernização requer conferir-lhe condições sistêmicas de competitividade.
  • 4. dos parâmetros de desenvolvimento sustentável acordados na Agenda 21 e nas declarações e convenções então adotadas; e a provisão de cooperação financeira, tecnológica e técnica aos países em desenvolvimento. A Rio + 10, portanto, deve ter seu escopo demarcado pela avaliação da implementação dos compromissos assumidos em 1992, na Conferência do Rio. No entender do Brasil, cabe ter presente as circunstâncias históricas que permitiram o consenso no Rio, em 1992, em torno da Agenda 21. Esse consenso deve ser preservado; qualquer idéia de se duplicar a Agenda 21 em Joanesburgo pode comprometer o êxito da Conferência. Tampouco deve a Conferência de Joanesburgo envolver o lançamento de qualquer novo processo nego- ciador, especialmente em razão da necessidade de ainda se cumprirem os compromissos assumidos no Rio, há dez anos A exemplo da Conferência do Rio, a reunião de Joanesburgo, não obstante a natureza técnica que permeia muitos dos temas a serem debatidos, será uma reunião de natureza eminentemente político-diplomática. Servirá para estabelecer as diretrizes que deverão orientar os esforços nacionais e a ação internacional nos anos vindouros no campo ambiental. Por esse motivo, ao estabelecer a Comissão Interministerial sobre a Rio+10, o Presidente da República instruiu o Ministério das Relações Exteriores a presidi-la, com o propósito de que a formulação das posições a serem defendidas pelo Brasil seja subsidiada pelo conhecimento e pela experiência acumulada, desde 1992, pelos Ministérios setoriais e entidades vinculadas, bem como por representantes da sociedade civil organizada, o que assegura à Comissão as necessárias transparência e representatividade. Do ponto de vista brasileiro, a Agenda 21 deve ser vista como um todo e servir de base para a construção de uma agenda de trabalho para a Rio+10 em temas que vêm, progressivamente, se impondo à atenção da comunidade internacional, tais como, poluição urbana; padrões de produção e de consumo; fontes alternativas de energia; eficiência energética; ecoturismo; e disponibilidade de recursos humanos, financeiros, tecnológicos e institucionais adequados. Tais temas já fazem parte da Agenda 21, mas poderiam ser aprofundados e ganhar maior relevância. Os temas a serem tratados na Cúpula de Joanesburgo apresentam, para o Brasil, elevado interesse estratégico. Nas negociações internacionais, o Itamaraty, em estreita coordenação com os Ministérios setoriais, tem buscado defender posições coerentes e construtivas nos diversos foros e processos negociadores decorrentes dos compromissos e estruturas acordados na Conferência do Rio. Sobretudo, a Cúpula de Joanesburgo deve resultar na renovação do compromisso político e do apoio para o desenvolvimento sustentável de forma consistente, inter alia, com o princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas, tendo como fundamento a responsabilidade histórica e ineludível, por parte dos países desenvolvidos, em razão dos insustentáveis padrões de desenvolvimento que marcam o avanço de suas sociedades. Espera-se, portanto, que essa renovação de compromissos se traduza, de um lado, em uma maior disposição em prover cooperação financeira e tecnológica voltadas a favorecer a adoção de modelos de desenvolvimento sustentável nos países em desenvolvimento e, de outro, em uma maior disposição em incorporar o desenvolvimento sustentável como preocupação primordial no desenho e execução de políticas públicas. A Rio+10 deve, assim, propiciar o desenvolvimento de parcerias para o 9
  • 5. desenvolvimento sustentável, seja pelo reforço da cooperação internacional, seja pela intensificação do engajamento do setor privado em ações claramente marcadas pela sustentabilidade respaldadas pela abertura dos mercados e que, além de gerarem empregos e renda, adotem tecnologias ambientalmente saudáveis. Esses dois eixos de ação devem ter como resultado último o incremento da competitividade das sociedades e das empresas num mundo globalizado. A participação do setor privado é fundamental nas discussões sobre a Rio+10. Nesse contexto, não se pode ignorar que os países em desenvolvimento realizaram, nos últimos dez anos, profundas reformas estruturais para atrair investimentos externos, tecnologia, e propiciar melhor rentabilidade para a assistência financeira internacional; ao lado dessas reformas, houve uma abertura de mercado, permitindo maior competição de produtos estrangeiros em seus mercados internos. Todavia, esses esforços não encontram simetria nos países desenvolvidos, cujos mercados ainda se encontram fechados a produtos oriundos dos países em desenvol- vimento. Isso torna questionável o discurso sobre o desenvolvimento sustentável centrado apenas em prescrições para um dos termos da parceria global, especialmente com realce à pobreza como causa da degradação ambiental. A Conferência de Joanesburgo deve buscar avaliar como os países industrializados estão caminhando para a sustentabilidade, tendo presente o princípio das responsabilidades comuns mas diferenciadas. Cumpre, por conseguinte, abordar a dimensão econômica do desenvolvimento sustentável, especialmente no que tange aos padrões de produção e consumo prevalecentes nas economias avançadas, a partir de uma visão abrangente das inter- relações entre investimento, combate à pobreza e abertura de mercados. A Cúpula terá também o grande desafio de gerar consenso e ações eficazes no plano social. Tendo em vista tentativas de singularizar o debate sobre a pobreza na Cúpula de Joanesburgo, cabe destacar que a pobreza não é causa maior da degradação ambiental, mas resultado direto das falhas e desequilíbrios prevalecentes nas estruturas econômicas e sociais sobre as quais se pautou o desenvol- vimento liderado pelas sociedades industria- lizadas. A degradação do meio ambiente surge muito mais em resultado dos padrões de consumo e de produção promovidos pela socie- dade industrial. A sustentabilidade desses padrões é que deve ser avaliada prioritaria- mente em relação aos impactos ambientais. A pobreza é, no entanto, inadmissível, pois incompatível com a dignidade humana. É conseqüência de um crescimento anômalo que induz à exploração predatória dos bens e serviços ambientais, seja para manter o desperdício da fartura, seja para tentar contornar as privações dos que pouco ou nada possuem. O desafio global para o milênio que se inicia – e sobre o qual se debruçará a Cúpula de Joanesburgo – é o de conciliar a erradicação da pobreza com a superação de padrões insusten- táveis de consumo e produção. As duas metas são hoje – como eram há dez anos – insepará- veis para se alcançar a sustentabilidade global. Especial atenção deve ser conferida à premência de não se aprofundar o desequilíbrio entre ricos e pobres, em nível nacional, regional e internacional. O desenvolvimento sustentável não é uma receita única, mas seus ingredientes necessitam ser aplicados em doses suficientes e adequadas a cada tecido social para que as transformações que todos almejamos possam ser realidade. A Cúpula de Joanesburgo ocorrerá num momento marcado pelo reforço da solidariedade 10
  • 6. internacional para combater as ameaças à segurança. As respostas aos desafios no campo da segurança requerem que a solidariedade se concretize de modo simétrico na solução dos desafios pendentes consubstanciados no cumprimento dos compromissos assumidos na Agenda 21, bem como nas convenções e declarações consagradas unanimemente no Rio de Janeiro. A globalização e o desen- volvimento sustentável têm em comum o sentido da mu- dança. Mas têm igualmente em comum a característica de serem conceitos sobre os quais não há uma interpre- tação única que possa embasar a ação política. Glo- balização, desenvolvimento e sustentabilidade têm signifi- cados diferentes para distin- tos grupos sociais ou correntes políticas. Todavia, mesmo nessa incerteza epistemo- lógica, o consenso de que são inadequados os padrões até agora seguidos para o uso da natureza e do meio ambiente impõe que a comunidade científica e o arsenal tecnológico propiciem conhecimento para que sejam encontradas opções racionais para os impasses que as sociedades enfrentam. O aprofundamento da interdependência entre as sociedades acen- tuou o caráter transformador e a importância política do conhecimento. O desenvolvimento sustentável tem seu fundamento na combinação entre a engenhosidade política e o apoio da ciência para a compreensão de fenômenos que até há pouco sequer freqüentavam nossa imaginação. O desenvolvimento sustentável é uma questão global, em que os objetivos são convergentes e as responsabilidades são comuns, embora diferenciadas. À luz desse preceito, a Cúpula de Joanesburgo servirá para avaliarmos o quanto se avançou e o quanto ainda se precisa fazer para tornar realidade o desenvolvimento sustentável. Esse conceito-síntese consubstan- ciou a mensagem kantiana da Conferência de 1992 que reconhece a importância, do ponto de vista da humanidade, da consolidação de uma visão de futuro orientada para um novo patamar de convivência internacional. Essa visão, entre- tanto, requer para sua implementação uma coope- ração em termos grocianos, isto é, centrada na interde- pendência construtiva das soberanias. Nas palavras do Presi- dente Fernando Henrique Cardoso, a dinâmica da questão ambiental “tem que ser cultural”1 . Enfrentar os desafios que o desenvolvi- mento sustentável nos oferece somente será possível se infundirmos uma nova consciência acerca da natureza estratégica do meio ambiente. A necessidade de novas vias para a cooperação tanto no campo da proteção da natureza quanto da promoção do desenvol- vimento está em sintonia com os anseios de uma geração sensível à necessidade de se proteger o meio ambiente e ao imperativo de se acelerar a afirmação da eqüidade social. É auspicioso ver a valorização das instâncias intergover- namentais e a ampliação da presença da sociedade civil na definição do esforço para superar práticas predatórias e promover alter- nativas mais sustentáveis de promoção da prosperidade e do bem-estar. Nos dez anos desde a realização da Conferência do Rio solidificou-se a convicção sobre o equilíbrio imprescindível que deve haver entre a utilização de recursos ambientais e naturais e o progresso econômico e social. A discussão sobre os caminhos do desenvolvi- mento teve grande ascendência sobre o 11 O desenvolvimento sustentável é uma questão global, em que os objetivos são convergentes e as responsabilidades são comuns, embora diferenciadas.
  • 7. cotidiano dos cidadãos e sobre a moldagem da sociedade. Com base nesse significado da noção de desenvolvimento para nosso tecido social cabe afirmar, como o fiz em 1992, que “o pressuposto do desenvolvimento sustentável é o próprio desenvolvimento”. Conferências como a Cúpula de Joanesburgo servem para que busquemos racio- nalizar a ação em meio à incerteza da compreensão. Cumpre, assim, avançar no entendimento entre os dife- rentes atores para traduzir no concreto as decisões tomadas no Rio e que ainda carecem de implementação plena. Cumpre, ainda, ter presente que, na formulação das respostas ao desafio do desenvolvimento sustentável, enfren- tamos tempos diferentes entre as reações da natureza às atividades humanas e a determinação política de enfrentar os desafios ambientais. A crescente certeza científica sobre o efeito das ações humanas na degradação do meio ambiente urge a implementação das medidas saneadoras acordadas no plano global e invalida opções unilaterais pela inércia. Em nossa época, marcada pelo fenômeno da globali- zação e seu impacto em nossas sociedades, devemos ter como princípio norteador a construção de uma globalização sustentável, inclusiva e eqüitativa. Nossa ação para a Confe- rência de Joanesburgo deve ser orientada por uma visão de futuro que aproxime a realidade social e normativa consagradora de valores compartilhados dos ideais que nos inspiram. 12 Professor Celso Lafer Ministro de Estado das Relações Exteriores; Vice-Presidente da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento – a Rio 92 1 CARDOSO, Fernando Henrique. O Presidente Segundo o Sociólogo: entrevista a Roberto Pompeu de Toledo. São Paulo: Companhia das Letras, 1998, p. 163. “O pressuposto do desenvolvimento sustentável é o próprio desenvolvimento”
  • 8.
  • 9. Dificilmente países em desenvolvimento poderão encontrar, nos dias de hoje, experiências tão ricas e diversificadas como as que resumem a história do Planejamento brasileiro nos últimos cinqüenta anos. É por essa razão que a exposição sistemática da experiência brasileira, em torno da busca do desenvolvimento sustentável, há de ser reconhecida como um dos mais importantes “laboratórios” na construção racional das sociedades modernas e democráticas. A “terra de contrastes” conforme nos definiu Roger Bastide nos anos 40, exerce seu peso específico na concepção de alternativas viáveis de desenvolvimento. De um lado, padrões de consumo próximos aos europeus convivem com níveis de exclusão social só verificado nos países mais pobres do mundo; de outro, uma diversidade cultural que reflete as diferentes contribuições à nossa matriz étnica e os processos adaptativos a condições de produção bastante diferenciadas; por fim, uma diversidade natural, expressa nos vários ecossistemas que se encontram no espaço nacional – tudo compondo uma vasta extensão territorial recortada por um mosaico de situações refratário a um tratamento uniforme. Nesse sentido, não se desenvolve em nosso país um planejamento mas, sim, rigorosamente, “planejamentos”. A despeito das dificuldades, uma análise detida do sistema federal de planejamento evidencia sua aderência aos seguintes princípios internacionais para a consolidação de uma estratégia nacional de desenvolvimento sustentável1 : 15 Passos em direção a uma estratégia nacional de desenvolvimento sustentável - A experiência brasileira recente 1. Forte compromisso político X 2. Fundamentado em estratégia compartilhada e visão pragmática X 3. Processo controlado e conduzido nacionalmente X 4. Formulado com base no conhecimento, na técnica e capacidade X 5. Formulado a partir de processos e estratégias preexistentes X 6. Liderado por uma instituição forte X 7. Um alto nível de participação social na sua elaboração X 8. Processo estratégico ancorado em análises técnicas X 9. Integração e balanceamento das estratégias entre setores e regiões X 10. Articulação entre o curto, o médio e o longo prazo na sua formulação X 11. Coerência entre o orçamento e as prioridades estratégicas X 12. Objetivos realistas, porém flexíveis X 13. Articulação entre prioridades e ações locais e nacionais X 14. Construção de mecanismos para monitoramento, avaliação e revisão X 15. Continuidade do processo X 15 princípios de uma Estratégia Nacional de Desenvolvimento Sustentável X Plano Avança Brasil Atende Atende Razoavelmente Não atende
  • 10. Vários fatores podem ser perfilados como determinantes dessa trajetória. O ponto de partida encontra-se na promulgação da Constituição Federal de 1988, que em seu artigo 165 institui leis de iniciativa do Poder Executivo que estabelecerão o Plano Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA). O PPA é o instrumento de organização do planejamento governamental federal concebido para vigorar 4 (quatro) anos, do segundo ano do mandato presidencial até o primeiro ano do mandato subseqüente. A LDO é concebida para fazer a articulação e o ajustamento conjuntural do PPA orientando a elaboração dos orçamentos anuais. O primeiro PPA - 1991/1995 - foi elaborado durante o Governo Collor de Mello. Já ele expressava avanço institucional no processo ditado pela nova legislação na medida em que foi enviado ao Congresso Nacional na forma de um relatório anual de execução física e financeira. Como não havia sistema de acompanhamento, não foram incorporadas mudanças no decorrer do período e tampouco foi feita uma atualização de intenções do Plano. O segundo PPA, já sob o governo Fernando Henrique Cardoso, cobriu o quadriênio 1996/1999. Ele inaugura novas práticas de planejamento ao introduzir o corte espacial e a visão regional no conceito de Eixos de Desenvolvimento. Paralelamente a este avanço surge o processo de mudança no papel do Estado, que de provedor de bens e serviços passa a ter um perfil de regulação e indução do desenvolvimento, graças ao Programa de Reforma do Estado. Em agosto de 1996 é criado o Programa “Brasil em Ação”, composto de 42 projetos, selecionados no âmbito do PPA, considerados prioritários nas áreas de infra- estrutura econômica (26) e desenvolvimento social (16), todos executados segundo um novo modelo de gerenciamento, um gerente para cada projeto, que enfatiza a obtenção de resultados. O PPA atual (2000-2003) inova mais ainda. No aspecto da mudança institucional, há uma integração maior entre o planejamento e o orçamento por meio da organização das ações em Programas. Os Programas devem ser desenhados para solucionar um problema ou atender uma demanda da sociedade, com produtos finais necessários à consecução dos objetivos propostos. Os Programas passam a ser integrados por ações (projetos, atividades ou operações especiais), as quais possuem um único produto e metas estabelecidas. O Estudo dos Eixos Nacionais de Integração e Desenvolvimento foi, pela incorporação de seus conceitos e resultados, uma das principais referências utilizadas na elaboração do PPA 2000-2003. Além disso o Estudo, que se enreda em um horizonte de oito anos (ou dois PPAs), assumiu outros paradigmas, que decorrem das condições inéditas dos desafios presentes. São eles: • Os ditames do desenvolvimento sustentável; • A nova ordem econômica internacional (globalização dos mercados); • A capacidade empreendedora do setor privado; e • O processo democrático-participativo na Sociedade brasileira. A sua realização situa-se no contexto da formulação, por parte do governo federal, de uma nova estratégia de desenvolvimento a nível espacial, embasada em uma Visão Estratégica de longo prazo (vinte anos), e buscando uma geografia sócio-econômica mais equânime, cuja implementação requer a valorização articulada de todo o potencial disponível das diversas áreas que compõem o território nacional. Essa nova postura envolve a caracterização de Eixos Nacionais, com a finalidade de integrar as diversas economias regionais e melhor articulá- las aos mercados internacionais. 16
  • 11. Para tanto, dois critérios foram levados em conta na sua definição e delimitação: a existência de rede multimodal de transporte de carga e a presença de possibilidades de estruturação produtiva interna, em termos de um conjunto de atividades econômicas. Esses critérios definem a inserção do eixo em um espaço mais amplo (nacional ou internacional) com efeitos multiplicadores dentro da sua área de influência - entendida esta como as relações sociais presentes nas imediações das vias de transporte e cuja lógica se reflete na rede de cidades e sua hierarquia peculiar. Esta definição liberta-se da visão centrada nas estruturas de transporte, que prevaleceu na definição dos eixos para o PPA 1996-1999 (vide mapa anexo), dando ênfase ao funcionamento das economias regionais. Assim, esse conceito inovador do planejamento brasileiro amplia as possibilidades de compreensão dos processos sócio-econômicos localizados e abre o leque de opções de intervenções públicas e privadas que redundem na diminuição das disparidades regionais e sociais. A conceituação de eixos está umbilicalmente ligada à revisão das práticas de planejamento, ocorrida na última década. Segundo o padrão que prevaleceu até o início dos anos 90, a função do planejamento era essencialmente normativa. Ele indicava para os agentes públicos e privados quais as grandes linhas de investimento estatal para um dado período. Os Planos de Metas são exemplos claros disso. Esse tipo de planejamento normativo foi típico de uma sociedade menos complexa, autoritariamente dirigida e enquadrada num projeto de modernização que almejava levar o país a concluir sua revolução industrial quando o Estado efetivamente liderava o processo de desenvolvimento. Partindo das novas condições, desenvolveu- se uma metodologia de planejamento balizada pela compreensão de que ele deve ser além de normativo para o setor público, indicativo para o setor privado, isto é, considerado relevante pelos agentes econômicos e sociais na medida em que possa orientá-los quanto às prioridades da sociedade e servir de instrumento de otimização das oportunidades sem ter como premissa a capacidade de imposição que o Estado exercitou no passado. Isso implica num processo de implementação bem mais complexo, onde a relação com os agentes sociais se orienta pelas exigências das parcerias que o Estado precisa celebrar para lograr as conquistas públicas. Este envolvimento da iniciativa privada para que também mobilize seus recursos na conquista dos objetivos estratégicos abre uma fase negocial inédita no processo, onde o Estado precisa estar preocupado também com a atratividade dos negócios que sinaliza como de interesse nacional. A base desse cálculo parte, ainda, da adoção do conceito de Programa e Gerente, segundo o qual as ações, os recursos e as responsabilidades do Governo são organizados de acordo com os objetivos a serem atingidos. Este percurso no qual o Estado vê redefinido o seu papel deu-se pari passu com a maturidade do conceito de sustentabilidade. De fato, tanto a Constituinte quanto a Rio 92 serviram para estabelecer uma pauta nacional onde as questões ligadas à sustentabilidade do desenvolvimento – desde barreiras comerciais e mudanças nos padrões de produção e consumo até a preservação dos recursos naturais e o combate à miséria nos grandes centros urbanos e no meio rural – constitui o norte do planejamento na esfera governamental. Ao assumi-la como diretriz, o planejamento passou a privilegiar a efetivação de ações integradas voltadas para a melhoria das condições de vida através da execução de atividades concatenadas 17
  • 12. dentro da seguinte lógica: Essa cadeia de articulações exige a explicitação e a coordenação de investimentos nas três dimensões do desenvolvimento sustentável - social, econômica e ambiental -, além da dimensão da informação e do conhecimento2 , que no seu conjunto formam, até 2007, o seguinte Portfólio: Na sua composição setorial destaca-se o papel do Desenvolvimento Social que representa quase metade do investimento total previsto. Outra inovação diz respeito ao grau de legitimação alcançado no processo de definição do Portfólio. A versão do Portfólio - que é o principal produto do Estudo dos Eixos - disponível em abril de 1999, foi submetida ao debate público em seminários realizados por todo o País entre abril e agosto daquele ano. Numa primeira fase, em Brasília, os seminários envolveram o Governo Federal, contando com a participação de todos os Ministérios. Na segunda etapa, implicaram em um conjunto de apresentações em todas as capitais brasileiras, com participação de representantes dos Governos Estaduais e Municipais e lideranças expressivas das comunidades locais. O processo permitiu não só a apresentação dos resultados 18 Setores US$ milhões % Infra-estrutura Econômica 99.974,1 43,8 Transportes 31.334,5 13,7 Energia 32.827,5 14,4 Telecomunicações 30.800,9 13,5 Infra-estrutura Hídrica (NE) 5.011,2 2,2 Desenvolvimento Social 112.213,3 49,0 Educacão 26.496,0 11,6 Habitação 16.516,3 7,2 Saúde 49.219,7 21,5 Saneamento 19.981,3 8,7 Informação e Conhecimento 2.539,0 1,1 Associados a Atividades Econômicas 1.797,0 0,8 Associados a Projetos de Infra-estrutura 742,0 0,3 Meio Ambiente 13.806,0 6,1 Gestão de Recursos Hídricos 6.180,0 2,7 Florestas 2.643,9 1,2 Demais 4.982,1 2,2 Total do Portifólio 228.532,4 100,0 Fonte: Consórcio Brasiliana Portfólio 2007: Composição Setorial dos Investimentos Por Setor, em US$ milhões e %
  • 13. do Estudo como também serviu para validá-lo, com foco no Portfólio de Investimentos, mediante a incorporação das recomendações decorrentes dos debates. Os seminários com o Governo Federal constaram de duas reuniões e mais catorze outras com os Ministérios/ Secretarias que solicitaram contatos individuais para aprofundar discussões especializadas. Os seminários estaduais foram realizados nas 27 capitais, tendo contado com participação ativa de mais de 2.600 pessoas. Cada um deles envolveu a apresentação conjunta dos principais resultados do Estudo, seguida de debates e da apresentação, por parte do governo estadual, da visão estratégica de desenvolvimento do ponto de vista do Estado e/ou da região em que se insere. Ora, para o prosseguimento dessa linha de amadurecimento da ação pública na esfera do planejamento novas dimensões devem ser incorporadas nas formulações estratégicas. A primeira delas, já em curso, é a reavaliação do impacto dos investimentos nos Eixos da Amazônia. Dela decorrerá, para o futuro, a adoção da avaliação ambiental estratégica em todo o território nacional, para todos os eixos de integração e desenvolvimento em que foi dividido. A outra, é a necessária consideração de que o Brasil não está isolado no mundo. Em outras palavras, a estratégia a se formular para o futuro deverá levar em conta: i) a inserção latino- americana de nosso país pela integração da infra- estrutura com os países vizinhos; ii) a agregação de um tratamento a ser conferido ao meio ambiente no qual este seja tomado no marco das comparações de custos vis-à-vis as oportunidades ambientais, sendo que estas parecem ser mais promissoras no campo dos serviços ambientais, de crescente interesse global. A dimensão internacionalizada das relações também está presente em iniciativas para se criar condições institucionais de organização produtiva do espaço sul americano. O Plano de Ação para a Integração da Infraestrutura Sul- americana, elaborado pelo BID, aponta diretrizes para a ampliação e modernização da infra-estrutura em um horizonte de 10 anos e é um esboço da direção de um esforço a se buscar coordenadamente. A visão geo-econômica que dá o contorno dessa iniciativa pode ser visualizada (ver mapa anexo). A outra situação singular à qual o Planejamento tem buscado atender nos remete à Amazônia. Como se sabe, já não são poucos os documentos correntes que sugerem a opção estratégica por se criar na Amazônia uma “civilização brasileira florestal” com o objetivo de preservar a quase totalidade deste bioma, restringindo as intervenções econômicas a espaços bem delimitados capazes de promover a elevação do padrão de vida da população da região sem comprometer o seu ambiente . No extremo oposto, é grande o alarmismo fomentado pela divulgação de projeções sobre a “destruição” da Amazônia se mantidos os níveis de desflorestamento, associados à extração de madeira e produção agropecuária, ou simplesmente por incêndios florestais decorrentes de práticas agrícolas inadequadas, ou, ainda, em conseqüência de grandes projetos de infra-estrutura. Áreas de contrastes reais e imaginados, os Eixos da Amazônia devem ser encarados como ecologicamente orientados no seu desenvolvimento e sustentáveis pela reposição das formas de produção que tomam os recursos naturais o diferencial que maior valor agrega ao desenvolvimento regional. O Estudo dos Eixos Nacionais de Integração e Desenvolvimento já havia registrado a importância da preocupação com eventuais impactos ambientais de empreendimentos, inaugurando também o tratamento do Meio Ambiente não apenas como uma restrição mas como fonte de novas oportunidades. Especificamente, ele incluía, como visto anteriormente, um Portfólio de investimentos ambientais. 19
  • 14. Através deste relato, sumarizando alguns dos principais pontos de inflexão que caracterizam o “salto” para a feição moderna do sistema federal de planejamento, buscamos indicar não só a aderência aos princípios internacionais da construção da sustentabilidade ambiental, econômica, social e política como também apontar linhas de aperfeiçoamento do processo em foco. Evidentemente os contrastes que recortam a nação brasileira deixam marcas profundas na estrutura pública de planejamento. Há diferenças expressivas no plano institucional – governos estaduais e municipais tem diferentes ritmos de maturação e, portanto, diferentes condições de partilhar responsabilidades com o governo federal; as ONGs, protagonistas no processo de legitimação dos planos e programas, apresentam níveis de organização que são diferenciados por setor ou região. Tudo isso condiciona as possibilidades de avanço da estrutura de planejamento do Estado brasileiro; no entanto, o mais importante é que se estabeleça o diálogo deste com outros modelos de construção de uma estratégia nacional de desenvolvimento sustentável. 20 José Paulo Silveira Secretário de Planejamento e Investimentos Estratégicos do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão 1 Base do debate do International Forum on National Sustainable Development Strategies, promovido pelo Department of Economic and Social Affairs (DESA), Under General Secretary, UN, Accra, Ghana, Novembro de 2001. 2 A dimensão da informação e conhecimento, tratada à parte segundo a visão do sistema de planejamento do Governo Federal no Brasil, inclui acesso à informação, P&D e capacitação profissional.
  • 15. 21 Eixos no PPA 1996-1999 Eixos no PPA 2000-2003 Hid, Madeira-Amazonas Costeiro do Sul Franja de Fronteira São Paulo Centro-Oeste Costeiro Nordeste Transnordestino Araguaia - Tocantins Oeste Saída para o Caribe Rio São Francisco Hid. Paraguai-Paraná Rodovias Rios Ferrovias MADEIRA-AMAZONAS REDE SUDESTE OESTE SUDOESTE SUL SÃO FRANCISCO TRANSNORDESTINO ARAGUAIA- TOCANTINS ARCO NORTE
  • 16.
  • 17. Estamos vivendo um momento histórico para a gestão ambiental no Brasil. Em março, o Conselho Nacional de Recursos Hídricos aprovou a cobrança pelo uso da água na bacia hidrográfica do Rio Paraíba do Sul. É a primeira vez que este tipo de cobrança será feita em um rio federal. Com isto, estamos instituindo o princípio do poluidor/pagador. Vale dizer, em vez de socializarmos os custos da recuperação de eventuais danos ambientais, os que usam e poluem os recursos naturais terão que assumir os encargos financeiros de sua recuperação. O valor será pago por todos os usuários da bacia hidrográfica do Paraíba do Sul que têm outorga dos Governos Federal e Estadual para usarem a água dos rios. A cobrança se estenderá, em breve, a todo o país, com prioridade para as bacias do Rio São Francisco e do Rio Doce, duas das mais importantes e degradadas do país. O conceito moderno de gestão ambiental não implica somente a fiscalização da degradação do Meio Ambiente mas, sobretudo, a criação de condições necessárias para assegurar a pere- nidade dos recursos naturais por meio de novas políticas para seu uso. No limiar do terceiro milênio, dois grandes mitos da civilização oci- dental estão sendo desfeitos. O primeiro deles é o da inesgotabilidade dos recursos da natureza. Essa percepção equivocada foi muito difundida, principalmente em países com dimensão conti- nental e com abundância de recursos naturais, como o Brasil. Ela criou a falsa idéia de que os recursos naturais seriam infinitos e, portanto, passíveis de utilização indiscriminada sem maio- res preocupações com sua conservação. Entre- tanto, a sociedade vai descobrindo, com cada vez mais intensidade que, ao contrário disso, estamos lidando com recursos finitos e entre eles a água, um recurso valiosíssimo e insubstituível para a sobrevivência dos seres humanos. Outro mito que está começando a ruir é o da hegemonia do homem sobre a natureza. Essa visão antropocêntrica, diretamente ligada à cultura dos povos ocidentais, ajudou a criar mo- delos de desenvolvimento e de uso dos recursos naturais sem compromisso com a conservação do meio ambiente. Felizmente, a sociedade está se dando conta de que não existe essa hege- monia, que o homem vive uma relação de total interdependência com a natureza e com o meio físico que o cerca. No século XX, passamos por um momento único na história da civilização, com desenvolvimento e explosão tecnológicos jamais vistos. Mas, paulatinamente, a sociedade já percebeu que o desenvolvimento material sem qualidade de vida produz uma falsa prosperi- dade. Hoje as pessoas podem navegar na Internet e têm a seu dispor os meios de comuni- cações mais avançados, como telefones celula- res e computadores que cabem na palma da mão. Em contrapartida, seus filhos já não podem tomar banho no córrego do bairro, sim- plesmente porque ele está totalmente poluído. Essa mudança de percepção tem influenciado positivamente a modernização das políticas públi- cas relacionadas à gestão ambiental, particular- mente no tocante a recursos vitais como a água. O homem não é capaz de sobreviver sem o meio ambiente harmônico, sem os recursos naturais. Isso leva a crer que o homem faz parte daquilo que se pode chamar de “imensa teia da vida”. 23 Gestão das águas em uma economia globalizada
  • 18. Ele é parte, e apenas uma parte de todo o processo, dependente de outros seres vivos e do meio físico para permanecer no planeta. A partir dessa percepção foram criadas as condições políticas objetivas para que sejam estabelecidos novos paradigmas para a proteção do meio ambiente. A Lei 9.433, a Lei das Águas, criou o Conselho Nacional de Recursos Hídricos e fixou, pela primeira vez, uma política pública no Brasil que atribui a um comitê da bacia o poder concreto de decidir as políticas de conservação e uso sustentável dos recursos hídricos. O comitê de bacia é um mecanismo democrático e participativo no qual as três esferas de Governo (Federal, Estadual e Municipal) com- partilham com os usuários da água e com as entidades da sociedade civil o poder de decidir sobre as prioridades e as políticas a serem estabe- lecidas para a conservação e uso dos recursos hídricos naquela bacia. Nós passa- mos, também, a tratar a água como um insumo econômico, buscando mudar a mentali- dade retrógada de tratar os recursos naturais como recursos de custo zero por serem são ofertados pela natureza. A cobrança pelo recurso ambiental “água” significa valorizar economicamente um recurso da natureza. Significa, ainda, deixar de tratar o dano ambiental como uma externalidade econô- mica, pois estamos sinalizando claramente que o custo ambiental tem que estar embutido no custo dos produtos e serviços oferecidos à sociedade. O modelo atual é extremamente perverso porque permite a apropriação do lucro pelo uso dos recursos naturais apenas pelos agentes econômicos, mas socializa para toda a sociedade os prejuízos e danos ambientais cau- sados pela utilização desses mesmos recursos. Para que os mecanismos previstos na lei nacional de gerenciamento de Recursos Hídricos possam ser efetivos, a cobrança pelo uso das águas depende dos comitês. A cobrança não se dará por uma decisão unilateral do governo e da autoridade pública, ela terá que ser negociada no âmbito do comitê. Estabelecer as regras da cobrança e os valores compe- te aos comitês, e por isso é importante que eles estejam organizados e entrem em funcionamento. É preciso deixar bem claro que a cobrança pelo uso da água não se tornará mais um instrumento de arrecadação para os cofres federais. Por lei, no mínimo 92,5% dos recursos apurados deverão ser reinves- tidos na recuperação da pró- pria bacia hidrográfica, em programas de reflorestamento de matas ciliares, proteção de nascentes, recuperação de áreas degradadas e tratamento de esgoto e lixo, a partir de prioridades definidas pelo comitê de bacia. Esse é o primeiro passo de uma grande mudança que o Brasil vai realizar para o futuro. Como detentores de um dos maiores ativos ambientais do planeta, nós temos que trabalhar com políticas extremamente modernas para gerir esse patrimônio natural e transformar suas vantagens comparativas em vantagens competitivas em uma economia cada vez mais globalizada. 24 José Carlos Carvalho Ministro de Estado do Meio Ambiente O modelo atual é extremamente perverso porque permite a apropriação do lucro pelo uso dos recursos naturais apenas pelos agentes econômicos, mas socializa para toda a sociedade os prejuízos e danos ambientais causados pela utilização desses mesmos recursos.
  • 19.
  • 20. Passados dez anos da Rio-92, o debate acerca de indicadores ambientais parece ainda tão vigoroso quanto inconcluso. Não foram pequenos os esforços de cada país participante e da comunidade internacional como um todo, no sentido de definir e produzir informações adequadas a orientar ações relativas ao meio ambiente e ao desenvolvimento sustentável, e os avanços foram consideráveis. Ocorre que a perspectiva de ação imposta pelos problemas ambientais sugere uma abordagem ampla e extremamente diversificada e um horizonte tem- poral de referência absolutamente inauditos. Assim, o tamanho e a complexidade da tarefa faz com que as conquistas pareçam sempre menores que os desafios (re)colocados. Afinal, o que se requer são informações que, ao mesmo tempo, retratem praticamente toda a ativi- dade humana e seu impacto sobre condições de ambiência nos seus múltiplos aspectos. Mais que isso, as informações devem ainda permitir inferên- cias sobre as necessidades das gerações futuras. As dificuldades tornam-se ainda maiores porque, no caso das estatísticas sociais, as prin- cipais fontes são os registros administrativos e as pesquisas domiciliares, onde o informante responde às perguntas do entrevistador, enquan- to no caso das estatísticas econômicas as principais fontes são, novamente, os registros administrativos e as respostas das empresas, unidades produtivas ou órgãos públicos. Mas nem os registros administrativos, nem empresas, nem cidadãos estão preparados para responder sobre impactos causados ao meio ambiente e, ao perguntarmos aos ecossistemas sobre estes impactos, eles nos oferecem respostas em sua própria “linguagem” que ainda estamos distantes de saber ouvir e compreender adequadamente. Todo indicador, toda informação estatística constitui, antes de tudo, uma síntese de grande abstração. E são abstrações na forma de cifras cuja inteligibilidade e, logo, utilidade, depende de familiaridade com o fenômeno mensurado e com o modo e escala em que é medido. Um indicador que agrega, por exemplo, a produção social medida em unidades monetárias, é algo absolutamente abstrato, mas muito objetivo, passados centenas de anos das sociedades monetizadas. Mas é objetivo também por se referir a mercadorias normalmente comerciali- zadas. Coisa muito diversa é medir e construir indicadores sintéticos que incorporem paisa- gem, qualidade de ar, reservas naturais, danos ambientais, saúde e outros que tais. Trata-se de justapor, condensar e integrar aspectos que são objeto de múltiplas disciplinas, que muitas vezes utilizam diferentes sistemas de medida e que, principalmente, ainda são de valoração social extremamente difícil por conta tanto da ignorância humana sobre a dinâmica ecológica como do fato de estarmos ainda nos primórdios do processo histórico (econômico, social e político) que definirá a extensão e a profundi- dade do compromisso com as gerações humanas do futuro. Enquanto o universo da produção de estatísticas econômicas e sociais dispõe de um aparato conceitual, metodológico e de melhores práticas desenvolvido ao longo de décadas e objeto de um trabalho mundial de harmonização 29 Indicadores ambientais para uma globalização sustentável
  • 21. com vistas à maior comparabilidade, as defini- ções conceituais, viabilidade, aplicabilidade e funcionalidade dos inúmeros indicadores ambi- entais e do desenvolvimento sustentável propos- tos são reiteradamente criticados, revistos e postos à prova. Nesse sentido são todos novos, como nova é a temática do meio ambiente e, por isso, pagam tributo à imprecisão e fluidez do próprio conceito de desenvolvimento sustentável. Tornou-se ponto de controvérsia a própria idéia de valoração de recursos naturais e serviços ambientais e, logo, a ênfase em mensurações físicas ou a elaboração de medidas monetárias. A discussão se desdobra ainda entre privilegiar indicadores associados ao que se denominou sustentabilidade fraca ou aqueles associados a sustentabilidade forte. Na hipótese fraca da sustentabilidade admite-se uma grande capacidade de substituição entre “capital natural” e manufaturado de maneira que os recursos naturais podem ser valorados confor- me se manifesta a preferencia do consumidor. Em outras palavras, supõe-se que qualquer uso dos recursos naturais possa ser reposto por fontes alternativas de igual valor. Na hipótese forte da sustentabilidade, considera-se a substituição limitada e, com base em pesquisas ecológicas, avaliam-se os custos relativos a “padrões de uso” ou de “sustentabilidade” de diferentes “funções ambientais” e os custos para troca ou reformulação das atividades econômicas, de sorte que se evite a depleção ou degradação do meio. Muitos autores tomam posição entre os dois extremos das hipóteses fraca e forte de sustentabilidade. Aceitam que na prática as economias no presente dependem de consumir algum nível de recursos não renováveis. Por outro lado, permitir que todas as fontes não renováveis sejam consumidas rapidamente seria irresponsável. A alternativa conceitual tem sido trabalhar com a idéia de um certo “nível crítico” de recursos ambientais, ou seja, um nível além do qual a depleção não deve ser permitida. É evidente que não há consenso sobre quais níveis críticos considerar. Também a disputa entre mensurações físicas e sócio-econômicas admite uma posição intermediária. Embora seja evidente a dificul- dade em integrar ambos os aspectos, trata-se de uma construção (mais do que técnica, histórica) indispensável. Assim, cabe avançar tanto o desenvolvimento de indicadores e índices ambientais quanto o desenvolvimento de contas físicas e ambientais e sistemas integrados, consolidando, através de aplicações práticas as alternativas mais úteis e viáveis. Nos trabalhos para a elaboração do novo manual da ONU sobre contas ambientais (SEEA) é proposta uma contabilidade ambiental híbrida, confron- tando informações física sobre o uso dos recursos com informações em termos físicos e monetárias sobre o processo econômico de produção. Cabe lembrar que quaisquer que sejam as abordagens conceituais e os métodos seguidos, é necessária a coleta e sistematização de um vasto conjunto de informações. E sua produção não pode prescindir da colaboração de diversas instituições. Algumas em razão da sua competência específica e outras historicamente engajadas no estudo das questões ambientais. O Brasil tem participado ativamente deste esforço, quer internamente, através de orga- nismos públicos, universidades, instituições privadas e organizações não governamentais, quer externamente, colaborando com diversas iniciativas e organismos internacionais. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, na qualidade de instituição oficial de estatística, tem procurado responder às funções que lhe são atribuídas neste campo, inclusive no sentido da construção de um sistema nacional voltado a organização e consolidação de informações ambientais. 30
  • 22. De fato, enquanto em todo o mundo, Instituições Nacionais de Estatística buscam aproximação com a cartografia em função das possibilidades abertas pelo desenvolvimento da tecnologia de geo-referenciamento de dados e da geografia, ciências biológicas, física e química, em função das demandas colocadas pela produção de informações ambientais, o Brasil conta, desde 1936 quando foi criado o IBGE, com essas atribuições reunidas numa única instituição que tradicionalmente dedica-se ao conhecimento da realidade físico-ambiental do território. Além das atividades básicas de geodesia e cartografia oficial, desenvolvidas pelo IBGE desde então, destaca-se, a incor- poração, em 1986, do acervo e Projeto RADAMBRASIL, ampliando a atenção aos temas de geologia, geomorfologia, solos, vege- tação, uso potencial da terra. Particularmente para a Amazônia Legal, que representa mais de 50% do Território Nacional, mediante Contrato firmado entre o IBGE e a Comissão de Implantação do Sistema de Controle do Espaço Aéreo – CISCEA / Sistema de Vigilância da Amazônia – SIVAM, já se en- contram armazenadas, em banco de dados geo- referenciados, informações inerentes a 204 car- tas (escala 1:250 000), compreendendo os temas geologia, geomorfologia, solos e vegetação. Ainda no que concerne aos estudos dos recursos naturais, o IBGE desenvolve pesquisas voltadas à área de Fauna e Flora. Nestes, des- taca-se o trabalho de levantamento básico rea- lizado pelos herbários IBGE (Brasília e Salvador) na mais absoluta harmonia com insti- tuições congêneres do Brasil e do exterior e com grande integração com as atividades de mapea- mento de vegetação e coleta de material botânico. As coleções científicas do IBGE constituem um valioso patrimônio à disposição da Insti- tuição e da comunidade científica, pois são, como importante testemunho histórico- científico da biodiversidade original, informa- ção indispensável para construção de muitos indicadores de impacto ambiental. O IBGE tem participado também dos trabalhos da Comunicação Nacional Brasileira de Gases de Efeito Estufa, coordenado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia – MCT e assumiu a responsabilidade de ser o depositário das informações do inventário brasileiro das emissões de gases do efeito estufa. Coordena também a coleta, revisão e atualização da base de dados sobre estatísticas ambientais que o grupo de trabalho formado pelo IBGE, Instituto de Pesquisas Espaciais (INPE), Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), Banco de Dados da Amazônia da Secretaria da Amazônia do Minis- tério do Meio Ambiente e Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) produz para dar suporte ao Relatório Perspectivas do Meio Ambiente no Brasil, o Geo Brasil, que está sendo elaborado pelo MMA e o IBAMA, em parceria com o Pro- grama das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) com vistas à divulgação durante a Conferência Mundial de Meio Ambiente e Desenvolvimento – Rio +10, em Johannesburgo. Mais recentemente o IBGE, valendo-se também de seu patrimônio de informações e pesquisas econômicas e sociais, vem desenvol- vendo juntamente com o Ministério do Meio Ambiente o Projeto Indicadores de Desenvolvi- mento Sustentável. Ele tenta contribuir para avaliações abrangentes da realidade brasileira, incluindo a perspectiva ambiental, sob a ótica da compatibilização das diversas dimensões do desenvolvimento, com a intenção de sistema- tizar e acompanhar a situação nacional no que diz respeito ao desenvolvimento sustentável. A preocupação com indicadores de sustentabilidade foi colocada pela Agenda 21 31
  • 23. nos capítulos que tratam da relação entre meio ambiente, desenvolvimento sustentável e informações para a tomada de decisões. A idéia central da Conferência Rio-92 foi a de dotar os países signatários dos instrumentos adequados para medir e avaliar as políticas públicas voltadas para o desenvolvimento sustentável. O projeto toma como referência a metodologia proposta pela Comissão para o Desenvolvimento Sustentável elaborada em 1996, intitulada. “Indicators of Sustentainable Development Framework and Methodologics” conhecido como “Livro Azul” e as recomenda- ções adicionais que o sucederam, como é o caso dos resultados do “International Expert Meeting on Information for Decision - Making and Participation”, em setembro de 2000, no Canadá. Assim, trata de temas como Saúde, Educação, Habitação, População, Atmosfera, Terra, Oceanos/Mares e Costas, Água, Biodiver- sidade, Padrões de consumo e produção, etc. Com o objetivo de fornecer uma avaliação mais adequada quanto ao processo de desenvol- vimento, cada indicador será apresentado numa perspectiva evolutiva através de série histórica de dados para Brasil, tomando como base o ano de 1992. Além disso, quando possível, será ado- tado o nível de agregação espacial das unidades da Federação o que permite o exame da diver- sidade de situações existentes no país. O esforço que o IBGE vem realizando com este projeto pretende disponibilizar um conjunto de indicadores que posteriormente poderá e deverá ser adaptado, ampliado e aprimorado e que, certamente, contribui para ampliar o debate das questões ambientais na sociedade brasileira. Acreditamos que é importante, contudo, não minimizar as dificuldades existentes na defini- ção e no aprofundamento do conceito de desen- volvimento sustentável. A visão de desenvolvimento sustentável da interpretação neoclássica tende a cair, na nossa opinião, na armadilha do que poderíamos chamar de utopia da razão técnica e supor que a sustentabilidade da aventura civilizatória humana pode ser alcançada exclusivamente através do aumento da eficiência econômica e da adoção de tecnologias mais limpas. Nesse caso, estaríamos frente à uma versão extremista da hipótese fraca da sustentabilidade, que admite a exaustão de qualquer riqueza natural desde que seu valor possa ser reposto por outro ativo de igual valor, propondo um modelo que ignora completamente as incertezas envolvidas nessa troca e representa muito mal a realidade do processo de produção. Em outra posição estariam não apenas os adeptos da hipótese forte da sustentabilidade como também aqueles que ao se situarem entre os dois extremos (na forma apresentada no início deste artigo) chamam a atenção para a necessidade de definir o recorte territorial dos ecossistemas cuja sustentabilidade deseja-se preservar e a abrangência temporal do compromisso com as futuras gerações. Se o que pode estar sob ameaça, numa escala de tempo à qual não estamos habituados e é impossível ao mercado “enxergar”, é o ecossistema planetário na sua forma atual e, portanto, a própria sobrevivência da espécie humana, como atribuir valor àquilo que afeta, positiva ou negativamente, a sustentabilidade do desenvolvimento? Em posição oposta à razão tecnicista, portanto, estariam aqueles que, ainda que considerando desejável e indispensável o aumen- to da eficiência econômica e tecnológica, pen- sam ser necessária a constituição de vontades e mecanismos democráticos globais que se sobre- ponham à orientação de mercado (eficiente na alocação dos recursos produtivos mas cega e surda à quaisquer outros valores que não os da 32
  • 24. acumulação de capital) fazendo prevalecer os princípios da sustentabilidade ambiental e ética da humanidade. Para isso é preciso estar aberto à discussão dos padrões de produção, circulação e consumo de mercadorias e admitir que os recursos natu- rais do planeta constituem ativos cujos valores não serão determinados de forma intrínseca pelo mercado na sua forma atual, mas sim construídos historicamente por uma humanidade progres- sivamente mais consciente. Os trabalhos preparatórios para o novo manual da ONU sobre contas ambientais (SEEA 2000) definem três “funções” do meio ambiente sobre a economia: 1) funções de recursos (recursos naturais colocados à disposição para conversão em bens ou serviços); 2) funções de serviços (provêem as condições necessárias para a manutenção da vida) e 3) funções de absorção (diz respeito à absorção dos resíduos da produção e do consumo). Para nossos propósitos, podemos considerar secundária a questão da disponibilidade de recursos naturais para o processo de produção e consumo porque ela é muito mais sensível à evolução tecnológica e porque para um recurso fundamental (a energia) existe enorme e constante oferta externa ao planeta, o que não ocorre para as outras duas funções. A diminuição da quantidade e qualidade das funções de serviço e o inegável uso das funções de absorção muito além das suas capacidades de assimilação dos resíduos da produção e do consumo, contudo, podem (e o estão fazendo) ameaçar severamente a qualidade de vida das populações mais desfavorecidas em termos econômicos e sociais e a própria biodiversidade atual do planeta, inclusive a sobrevivência da espécie humana. Para dimensionar o im- pacto das atividades humanas sobre essas funções, entre- tanto, é necessário definir o recorte territorial, determi- nando se os impactos são locais, regionais ou globais. Questões locais tem a ver com qualidade do ar, fornecimento de água limpa, a remoção e disposição do lixo sólido e dos efluentes líquidos, limpeza das ruas, etc. Questões regionais são causadas principalmente pelos automóveis, produção de energia e indústria pesada. Afetam as grandes cidades e áreas circunvizinhas, bacias hidrográficas e até extensões além das fron- teiras nacionais, como a “chuva ácida” decorrente das emissões de dióxidos de enxofre e de nitrogênio. A terceira categoria de questões são as globais e suas conseqüências mais conhecidas são o aquecimento global, a crise de biodiversidade, a destruição da camada de ozônio e a degradação dos oceanos. É provável que a escassez de recursos hídricos e o aumento da desertificação exijam, também, uma aproximação global, além da regional. Desenvolvimento sustentável é um conceito e um processo histórico em construção que pressupõe uma dimensão espacial (o território) e uma dimensão temporal (a extensão do com- promisso com as gerações futuras). Ambas exi- gem definições concretas e consistentes entre si. Assim, a preservação de um determinado ecossistema poderia ser definida, em função da abrangência de seu território, como um problema local ou regional. A avaliação da 33 Desenvolvimento sustentável é um conceito e um processo histórico em construção que pressupõe uma dimensão espacial e uma dimensão temporal. Ambas exigem definições concretas e consistentes entre si.
  • 25. sustentabilidade do desenvolvimento de uma nação, ou grupos de nações, uma questão regional. Os processos globais são, como vimos, aqueles que afetam a sustentabilidade do desen- volvimento e da vida humana no planeta. Quanto à dimensão temporal, a escala de tempo que envolve a sustentabilidade de um ambiente local ou regional é medida em décadas, o que já configura um horizonte muito mais dilatado do que aquele à que estamos (instituições e mercado) habituados. A agressão ao ecossistema global, entretanto, exige da humanidade capacidade de pensar e agir em um tempo histórico ainda mais amplo, mensurável em séculos. Isso diz respeito não apenas ao futuro (apenas como exemplo, gases de efeito estufa permanecem séculos na atmosfera e essa também é a unidade para medir a dilatação das águas dos oceanos, decorrente do aquecimento global e causa principal da elevação do nível dos mares) mas também ao passado, na medida em que por detrás da noção de “responsabilidades comuns porém diferenciadas”, consagrada na Rio-92, está a consciência de que entre as nações do mundo existem responsabilidades históricas distintas pelos processos em andamento. Paradoxalmente, essa dilatada escala de tempo torna fundamental e coloca na agenda a exigência de urgência para a produção das informações físicas que permitam acompanhar os processos de poluição que ocorrem em escala global. Isto por duas razões. Em primeiro lugar porque como é grande o desconhecimento sobre a dinâmica ecológica do planeta, o princípio da precaução exige o uso equilibrado dos recursos e serviços do meio ambiente de forma a prevenir danos irreparáveis à sua sustentabilidade. Em segundo lugar, porque é o conhecimento científico dos processos em andamento e das suas conseqüências que fornecerá o suporte para que a sociedade humana, através de uma dinâmica democrática global, construa os mercados e os sistemas de regulação que tornarão possível atribuir valores aos ativos importantes para a sustentabilidade da vida tal qual a conhecemos. O melhor exemplo contem- porâneo são as negociações no âmbito da ONU para o enfrentamento do aquecimento global, que através do Protocolo de Kioto e acordos subseqüentes viabilizaram o surgimento de um mercado global para toneladas de carbono que deixem de ser acumulados na atmosfera. Do ponto de vista da elaboração de indicadores de Desenvolvimento Sustentável isso significa, também, que é preciso tomar extremo cuidado para não confundir os indicadores que iluminem a agressão humana ao ecossistema planetário com o conjunto de informações que cada sociedade produz e utiliza em seu território com vistas à avaliar a sustentabilidade de seu desenvolvimento e à melhoria de suas políticas públicas. Em outras palavras, não é a agregação dos Indicadores de Desenvolvimento Sustentável que cada país produz, com seu caráter embri- onário anteriormente exposto e suas dificul- dades para obterem uma territorialização que reflita a realidade dos ecossistemas, que poderia constituir-se numa informação adequada da sustentabilidade do desenvolvimento global. Tampouco esses indicadores se prestam à hierarquizações que não teriam qualquer consistência espacial ou temporal com a sustentabilidade do planeta. Ainda que os indicadores globais possam ser harmonizados e definidos como um subconjunto dos indicadores de desenvolvimento sustentável que cada país deveria produzir, sabemos que o estágio em que as nações do mundo se encon- tram na produção de estatísticas econômicas, sociais, e, principalmente, ambientais, é bas- tante heterogêneo e que a definição das prio- ridades nos programas de trabalho estatístico 34
  • 26. de cada país decorre de sua própria vida social e é assunto autônomo dos Institutos Nacionais de Estatística. Desse ponto de vista, parece-nos que, sem prejuízo dos esforços conduzidos pela Comissão Estatística das Nações Unidas na produção de estatísticas ambientais e de contas ambientais associadas às contas nacionais e pela Comissão de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas através dos indicadores do desenvol- vimento sustentável do Livro Azul, que propiciam às sociedades elementos para avaliar aspectos da sustentabilidade de seu desenvol- vimento, deveria ser considerado objetivo prioritário a elaboração de Indicadores do Desenvolvimento Sustentável Global que retratem fisicamente os processos de agressão global ao ecossistema planetário, tornando possível prevenir eventos irreparáveis e fornecendo o suporte necessário para a construção dos mercados que serão responsá- veis pela valoração dos ativos naturais. Para isso seria necessária a concentração de esforços nesses processos (Mudança Global do Clima, Crise de Biodiversidade, Redução da Camada de Ozônio, degradação dos oceanos, desertificação e crise de recursos hídricos). A criação de um sistema de monitoramento da sustentabilidade do desenvolvimento mundial exigiria dos países desenvolvidos amplos investimentos no conhecimento científico e acompanhamento da biosfera, da atmosfera, dos oceanos e dos continentes; na realização de seus próprios levantamentos nacionais e no apoio à ONU e instituições multilaterais na mobilização de recursos para harmonizar metodologias e viabilizar a execução dos levantamentos dos países menos desenvolvidos. A experiência da definição de metodologia pelo Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC) e o sistema construído para apoiar a realização das comunicações nacionais para a Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima poderia ser aproveitada como modelo. 35 Sérgio Besserman Vianna Presidente do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) Guido Gelli Diretor de Geociências do IBGE
  • 27.
  • 28. A idealização do território é provavelmente um dos temas mais caros ao romantismo, ao longo de todo o século XIX. O Brasil, jovem Nação que então emergia para a história, não poderia ser exceção. Assim como os Estados Unidos da América projetaram sobre o far west as esperanças de construção de uma sociedade nova e sem igual – rica, empreendedora, desafiadora – o Império brasileiro começou a construir sua imagem de pujança natural, mistério e desafio civilizatório a partir das primeiras expedições científicas que aportaram em nosso país tão logo este se fez independente. Mais do que um Imperador culto, mecenas das artes e das ciências, movia o interesse sobre a Amazônia a possibilidade de se descobrir formas de vida insuspeitadas, testemunhas vivas da generosidade infinita da criação. De fato, aquele país que a Europa antevira através do traçado da paisagem do “Brasil holandês”1 e de Debret aprofunda-se a partir de meados do século XIX com a expedição de Spix e Martius, a expedição Langsdorff e tantas outras que nos deixaram o testemunho do olhar deslumbrado do ocidente culto sobre a América intocada e desafiadora. A primeira elaboração romântica nacional sobre a Amazônia foi incitada pelo próprio Imperador, ao propor ao Instituto Histórico e Geográfico o desenvolvimento de estudos que respondessem às seguintes questões: “Se existiram Amazonas no Brasil? Se existiram, quais os testemunhos de sua existência; quais seus costumes, usanças e crenças? Se se assemelhavam ou indicavam originarem-se das Amazonas de Scithia e Líbia, e quais os motivos do seu rápido desaparecimento? Se não existiram, que motivo tiveram Orellana e Cristovão da Cunha, seu fiador, para nos asseverarem a sua existência?” E coube justamente a Antônio Gonçalves Dias, um de nossos mais importantes poetas românticos, desincumbir-se da tarefa2 . De lá para cá, essa mitologia sempre encontrou eco entre brasileiros e estrangeiros – e continuará encontrando, de vez que o desconhecido tão bem se presta à imaginação – mas, ao mesmo tempo, tem servido de forte estímulo à indagação científica e à apropriação racional desse que, sem dúvida, é um dos mais expressivos patrimônios da humanidade. Hoje, quando vislumbramos a Amazônia, é a contribuição que ela possa dar à humanidade enquanto espaço singular, habitat de um sem número de espécies naturais, que move nossas indagações e mobiliza nossas energias. Já não são poucos os documentos que circulam nas esferas públicas e que sugerem uma vasta gama de opções estratégicas para se viabilizar na Amazônia uma “civilização brasileira florestal” com o objetivo de preservar a quase totalidade deste bioma e desenvolver as atividades econômicas capazes de promover a elevação do padrão de vida da população da região. No extremo oposto, é grande o alarmismo fomentado pela divulgação de projeções sobre a “destruição” da Amazônia se mantidos os níveis de desflorestamento, associados à extração de madeira e produção agropecuária, ou simples- mente os incêndios florestais decorrentes de práticas agrícolas inadequadas, ou, ainda, o que 37 Amazônia: desafios de uma civilização tropical no século XXI
  • 29. grandes projetos de infra-estrutura permitem antever. A aparente utopia da “civilização florestal” – afinal nenhum país industrializado logrou este tento até os dias correntes – tem o sentido maior de desafio a que se construa formas originais de gestão dos recursos naturais da floresta, tornando-as perenes ao mesmo tempo que propiciadoras do bem estar da população. Portanto – pelo que encerra de esperanças e possibilidades – a defesa do bioma amazônico constitui um interesse nacio- nal especifico, permanente, com potencial de produzir valores para a sociedade mui- to maiores do que os valores porventura decorrentes da supressão da floresta para o uso da madeira e da terra. Área de contrastes reais e imaginados, a Amazônia deve ser encarada como ecologicamente orientada pela recriação das formas de produção que tomam os recursos naturais como o diferencial que maior valor agrega ao desenvolvimento regional. Assim, ela deixaria de ser uma região “de fronteira” para, através da valorização dos seus recursos naturais, viabilizar um modelo de desenvol- vimento endógeno, único no mundo, com o uso de tecnologias adequadas ao seu manejo, parti- cularmente da água, do solo e da vegetação. Esse modelo singular seria o parâmetro orientador para todas as oportunidades de investimentos que lá venham a ser identificadas. Vê-se, portanto, que também no início do século XXI encontra-se o país dotado de uma nova utopia para a Amazônia: a utopia da civilização florestal apoiada nas mais avançadas tecnologias disponíveis. Ao contrário porém da utopia romântica, a nova “utopia” vale pelos compromissos transformadores que é capaz de engendrar a partir dos esforços dos brasileiros e da comunidade internacional. A exploração da região já não pode ser uma empreitada isolada, seja de interesses comerciais voltados para ganhos imediatos, ou mesmo de cientistas, dobrados sobre sua imensa riqueza sem compromissos com as populações locais ou com o significado de suas descobertas para o país como um todo. A Amazônia do futuro será de todos os brasileiros e a cons- ciência que hoje se forma em torno dela corresponde à apropriação racional, madu- ra, dessa porção do território que antes mais se prestava às fantasias românticas. Para nós, brasileiros, o desafio de se elevar a qualidade de vida dos vinte milhões de amazônidas sem comprometer a identidade da região e a diversidade social, cultural, ambiental e biológi- ca que a caracterizam é a diretriz maior de quantos planos e projetos de desenvol- vimento venham a estar orientados para o seu território. O que a região pode melhor oferecer à humanidade são serviços ambientais e conhecimento dos processos de convivência e evolução das espécies; alguns já pesquisados, outros imaginados, a maioria desconhecidos. Preservar e fomentar esta possibilidade de avanço científico é uma responsabilidade, em primeiro lugar, do Estado brasileiro e, subsidia- riamente, de toda a comunidade internacional voltada para a construção de novos patamares de interação sustentável com a natureza em escala planetária. Não há outro caminho a seguir: é preciso um compromisso universal, amplo, com o caráter inovador de desenvolvi- mento que a Amazônia permite vislumbrar, 38 A Amazônia do futuro será de todos os brasileiros e a consciência que hoje se forma em torno dela corresponde à apropriação racional, madura, dessa porção do território que antes mais se prestava às fantasias românticas.
  • 30. desde que a curiosidade científica se debruçou sobre o seu território, a partir do século XIX. Afinal é na Amazônia que se joga, como é cada vez mais reconhecido, boa parcela da sorte da humanidade como um todo. Felizmente, já superou o país aquela fase do planejamento regionalizado, no qual se dividia pelo espaço parcelas do orçamento público alocando-os em estratégias de crescimento que – esperava-se – atingiria as metas inicialmente projetadas. Hoje, no plano que persegue a articulação territorial das diversas iniciativas públicas e privadas, governamentais ou não governamentais, catalogadas sob a ótica do desenvolvimento social, econômico, ambiental e de informação e conhecimento, respeitando-se as especificidades locais e tendo como pano de fundo uma estratégia nacional de desenvolvi- mento sustentável, o panorama que se descortina é bem mais integrado, mais cheio de determinações recíprocas, de sorte que se dispõe do vasto acervo de conhecimento que se acumulou no processo de elaboração tanto da Agenda 21 Brasileira quanto dos Eixos Nacionais de Integração e Desenvolvimento. Em outras palavras, o tecido social e econômico que vai se desenhando em torno de diretrizes como as estabelecidas na Agenda 21, ou dos Eixos, fazem da Amazônia não uma região a se “resgatar” mas, antes, um espaço de plane- jamento a se integrar mais e mais às dinâmicas nacional e internacional, alimentando-as e delas se nutrindo também. Cada vez menos, numa sociedade globalizada, os “espaços” não poderão ser fechados sobre si mesmos. Cada vez mais a sinergia entre eles determinará a dinâmica que move os países e as regiões espacialmente mais próximas ou economicamente mais integradas. Por essa razão, os investimentos já não são “regionalizados” no sentido clássico. Tomemos, por exemplo, a “marca Amazônia”. O seu desenvolvimento exige que seja amplamente aceita no mercado mundial, pois através dela se legitima um acréscimo de valor aos produtos que corresponda ao “custo ambiental” para produzi-los, isto é, um diferencial que possa ser garantia do desenvolvimento regional sustentável. Evidentemente esta experiência que se vislumbra exige que nos debrucemos de várias maneiras novas sobre a Amazônia. Uma delas, na área de “informação e conhecimento” - dimensão reconhecidamente contemporânea do desenvolvimento, onde a construção do padrão que a Amazônia requer se alicerça – passa-se necessariamente pelo acesso universal da população local à informação e aos conteúdos do conhecimento que dizem respeito às suas vidas, trabalho e fruição cultural enquanto formas de inclusão e organização social para o pleno exercício da cidadania. Recursos públicos já disponibilizados para essa finalidade – como os recursos do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações – precisam ser desenvolvidos e incrementados de forma a provocar no menor tempo possível o maior impacto esperado. Essa dimensão estratégica da informação e do conhecimento abriga, ainda, programas de capacitação profissional e técnica para atividades organizadas na forma de arranjos produtivos locais (sustentáveis e competitivos) ou para atender políticas públicas específicas, de desenvolvimento social ou meio ambiente. Complementarmente, há que se investir em pesquisa e desenvolvimento de caráter inovador, porém voltada para arranjos produtivos já existentes, como a Zona Franca de Manaus, ou para novas atividades que possam potencializar as vantagens competitivas do ambiente local e seu repertório de informações ecológicas e biológicas. Esse é um enorme desafio para a sociedade científica brasileira e, particular- mente, para as poucas centenas de doutores que vivem na região, fato que constitui uma 39
  • 31. fragilidade notável para o desenvolvimento regional. A atratividade moderna da “Amazônia”, como vimos, remonta ao século XIX. No entanto, a fixação dos talentos a ele vocacionados, a interação do conhecimento produzido com a população autóctone, o desenvolvimento científico local – tudo isso constitui itens da pauta do modelo de desenvolvimento sustentável regional que o Estado brasileiro deve perseguir com afinco nos tempos presentes. A busca da harmonia com a ecologia amazônica impõe a necessidade de inovação também para os projetos de infra-estrutura econômica, ou seja, transporte, energia e comunicações, que devem ser concebidos como sistemas adaptados ao ambiente e ao contexto de uma Amazônia subcontinental, interna- cionalmente integrada. Essa ótica ilumina a integração internacional não só como indutora de fluxos comerciais, mas também de fluxos de informação e conhecimento (redes de comu- nicações) e de melhores alternativas de investimento na exploração de recursos naturais e na infraestrutura. O aproveitamento hidre- létrico mais racional de Guri, na Venezuela, e a exportação de energia através de linhas de transmissão para o Estado de Roraima, no Brasil, formam um conjunto exemplar dessa busca de ecoeficiência subcontinental nos investimentos de infra-estrutura. Outro digno de registro é proposta de interligação rodoviária entre os estados de Roraima e Amapá, no extremo norte do subcontinente, através de um arco, que se inicia em Boa Vista e termina em Macapá, e passa, no sentido horário, por Georgetown, Panamaribo e Cayenne, antes de reingressar ao território brasileiro. Está via já está quase toda pavimentada e é conhecida como “Arco Norte”. Como sistemas mais adaptáveis ao ambiente amazônico destacam-se as hidrovias, o aproveitamento energético do gás natural de Urucu e fontes alternativas de energia, mais expressivas e eficientes quando combinadas entre si. Dos projetos de hidrovias merece menção a Hidrovia do Rio Madeira, iniciativa público- privada, que ao inverter a lógica do fluxo predominante de transporte que atende a região centro-oeste, voltada aos portos da região sudeste, para o Norte, na direção do porto fluvial de Itacoatiara, às margens do Rio Amazonas, proporcionou uma redução no custo de transporte de grãos da ordem de 30 dólares por tonelada. Na abordagem da questão ambiental, a inovação que se busca passa pela abordagem conceitualmente mais ampla que não se restringe a ações mitigadoras, normalmente decorrentes de projetos de infra-estrutura, mas que trata o meio ambiente como gerador de oportunidades de emprego e renda. Nas áreas florestadas, por exemplo, isso implica em exploração do turismo sob as mais diversas formas (turismo ecológico, pesca esportiva, turismo de aventura, observação de pássaros, etc- modalidades contempladas no PROECOTUR) ou em atividades de manejo de baixo impacto, de produtos madeireiros ou não- madeireiros. Nesse contexto, há necessidade de se incentivar comercialmente atividades sustentáveis, tanto através de iniciativas da sociedade (associações de compradores de produtos certificados, por exemplo), como pelo uso do poder público, incluindo-se dispositivos de iniciativas ou acordos internacionais (fair trade). Nas áreas degradadas da região, que equivalem à superfície da França, isso significa acreditar no desenvolvimento social, ambiental e econômico proporcionado por investimentos em sistemas agroflorestais, basicamente de caráter familiar e comunitário, e por uma busca de maior produtividade no uso do solo, através de técnicas de manejo de pastos e capoeiras 40
  • 32. Carlos Alberto Dória Gerente de Estudos dos Eixos Nacionais de Integração e Desenvolvimento do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão Pedro Neto - Consulteur Ronaldo Luiz - Consulteur 1 A respeito da importância dessa experiência colonizadora para o conhecimento científico do Brasil ver Dante Martins Teixeira, O mito da Natureza Intocada: as aves do Brasil holandês (1624-1654) como exemplo para a história recente da fauna do novo mundo, Tese apresentada ao Programa de Pós-graduação em Ciências Biológicas, UFRJ, Rio de Janeiro, 1999. 2 Ver Antonio Gonçalves Dias, “Amazonas. Memória escrita em desenvolvimento do programa dado por S. M. I. ao sócio...”, Revista do Instituto Histórico e Geographico Brazileiro, tomo XVIII, 1855 (terceira série), Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1896. (vegetação secundária). Aqui bem caberiam incentivos internacionais na forma de créditos de redução de emissão (CER), de que trata o mecanismo de desenvolvimento limpo (MDL) do Protocolo de Quioto. O padrão inovador também deve estar presente na construção de um arcabouço político-institucional consistente, a começar pela estrutura de suporte para a Lei de Crimes Ambientais. Ressalte-se também os avanços introduzidos pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), dentre os quais se destacam os conceitos de corredores ecológicos e de reservas da biosfera, além do compromisso governamental de se elevar o percentual de unidades de conservação para 10% do território nacional. Mas há avanços significativos ainda na realização da meta constitucional de se demarcar os cerca de 90 milhões de hectares de terras indígenas, quando se verifica que estamos muito próximos de concluir esse processo de que trata o Artigo 67 das suas disposições transitórias. Na questão do acesso aos recursos genéticos há diversas proposições em tramitação no Congresso, sendo importante ressaltar os debates em torno da repartição dos benefícios da biodiversidade, em especial, como remunerar o conhecimento das populações tradicionais. De qualquer forma, embora não haja uma instância normativa e deliberativa instalada para cuidar dessa questão, já se vislumbram os caminhos a percorrer. De maneira geral, pode-se dizer que desde a Rio 92 deu-se um salto de qualidade na consciência nacional e internacional sobre a Amazônia. Nos últimos dez anos, os brasileiros e quantos vislumbram a Amazônia como portadora de perspectivas generosas para o futuro da humanidade, souberam se debruçar sobre uma utopia originalmente novecentista e transformá-la num grande objetivo nacional e internacional nos marcos do desenvolvimento sustentável. Este conceito, tão essencial para a civilização que se esboça para o século XXI, ou se firma e se alastra a partir de perspectivas concretas engendradas no espaço amazônico ou não passará de frase vazia, desprovida de significado social. Assim, a metáfora de uma “civilização brasileira florestal” resume o rumo que, entre nós, devem ter todas as ações e esforços visando a exploração e integração do espaço amazônico em benefício do conjunto da nacionalidade e da humanidade. Esta a mensagem que, com o exemplo prático, os brasileiros quererão levar a Joanesburgo, na chamada “Rio + 10”. 41
  • 33.
  • 34. A incorreta destinação dos resíduos sólidos urbanos, sobretudo nas regiões metropolitanas mais densamente povoadas do país, chegou a uma situação-limite. No Estado de São Paulo, por exemplo, levantamento feito em 1999 pela Cetesb mostrava que metade dos municípios ainda utilizava exclusivamente os lixões, ameaçando a saúde pública, enquanto apenas 28% armazenavam os detritos corretamente em aterros sanitários - e mesmo assim sem ainda obter altos índices de reciclagem. A situação piora ano a ano com o esgotamento da capacidade de lixões e aterros sanitários, ausência de locais para a construção de novos aterros, equipamentos de incineração desativados ou funcionando inadequadamente, e falta de estímulos à coleta seletiva e recuperação de materiais como plásticos, latas, alumínio e vidro. A razão do drama crescente enfrentado pelo país com o problema da destinação do lixo repousa sobre a ausência de uma política nacio- nal que co-responsabilize poder público, inicia- tiva privada e cidadãos, e seja implementada mediante instrumentos como educação ambi- ental, dispositivos legais, múltiplas técnicas de manejo de resíduos urbanos, e uma gestão eficiente em todas as fases do processo. De fato, sem uma ampla articulação entre poder público e sociedade, continuaremos expostos a todo tipo de improvisações quanto à destinação do lixo. Entretanto, tal união de esforços requer que as diversas ações dos agentes públicos e privados sejam concatenadas dentro de um marco legal. É isto o que discute presentemente uma Comissão Especial da Câmara dos Deputados, formada para consolidar, em uma única legislação, mais de 70 projetos de lei apre- sentados a respeito. Tal legislação deve dispor sobre a utilização dos escassos recursos existentes com o máximo de eficiência econômi- ca; contemplar o que existe de mais avançado em logística de coleta seletiva e tecnologias de compostagem, reciclagem, aterragem, recupe- ração energética e incineração limpa; e dotar o Estado de instrumentos legais para fiscalizar empreendimentos que gerem grande volume de resíduos. A política nacional de manejo de resíduos sólidos urbanos será tanto mais bem sucedida enquanto tiver como alvos: reduzir a quantidade e a nocividade dos resíduos sólidos; eliminar os prejuízos à saúde pública e ao meio ambiente por eles causados; formar uma consciência comunitária sobre a importância da opção pelo consumo de produtos e serviços que não afron- tem o meio-ambiente e/ou que seja recicláveis mediante um manejo adequado; e gerar benefí- cios sociais e econômicos tanto aos municípios que se dispuserem a licenciar instalações para a destinação correta dos resíduos, quanto a centenas de milhares de catadores, bem como para empresas de reciclagem. O grande desafio do relatório que estou incumbido de preparar e apresentar para ser submetido à votação será chegar a um consenso sobre as bases e os instrumentos de tal política. Até o momento, por exemplo, chegou-se ao consenso de que um dos princípios a embasar 45 Por uma política nacional de resíduos sólidos
  • 35. uma política nacional de resíduos sólidos é o da responsabilidade compartilhada entre os diver- sos agentes. Vejamos como isso funcionaria, por exemplo, na fabricação e consumo de alimentos industrializados. Todo elo de cada cadeia produtiva cuida de dar destinação correta a seus próprios resíduos industriais. O resíduo do produto final deve ser corretamente descartado pelo consumidor, por exemplo, separando o lixo doméstico em duas frações, uma orgânica (restos do alimento), que seguiria para compos- tagem, e a outra (embalagem usada), cujos materiais podem ser reciclados. As prefeituras continuam com a responsabilidade sobre o transporte, introduzindo coleta seletiva nos mu- nicípios onde ainda ela inexiste, e a indicação de locais para compostagem ou destinação de resíduos não recicláveis. Cooperativas de cata- dores fazem a separação dos materiais e, mediante acordos com as prefeituras, poderão comercializá-los. Empresas de reciclagem devem estar envolvidas, devolvendo os materiais ao mercado sob a forma de novos produtos. A idéia é que a legislação induza a cada elo das cadeias produtivas a assumirem suas res- ponsabilidades. À indústria, por exemplo, além de cuidar de dar correta destinação a seus rejeitos industriais, caberá reduzir gradativa- mente o volume de suas embalagens, para reduzir o volume final dos resíduos descartáveis. Indústrias de bens que exigem cuidados especiais, como baterias e pneus, manterão seus próprios esquemas de coleta e destinação final. Na construção civil, o proprietário do empreen- dimento, a construtora e os transportadores dos materiais descartados nas obras serão solidaria- mente responsáveis por sua correta destinação final. E assim por diante. A legislação também deverá instituir dois fundos: um de limpeza urbana, distrital ou municipal, para dar suporte financeiro às ações voltadas à melhoria e à manutenção dos serviços de limpeza urbana. E outro de resíduos sólidos, de âmbito federal, para aplicação prioritária em cooperação técnica e financeira com os Estados, Distrito Federal e Municípios, em ações, projetos, programas e planos rela- cionados ao gerenciamento de resíduos sólidos, bem como na recuperação de áreas degradadas pela disposição inadequada de resíduos sólidos, cuja autoria tenha sido impossível de recuperar. Neste momento, um intenso trabalho de articulação parlamentar está sendo desen- volvido, para obter consenso sobre os principais dispositivos da nova política. Desenvolvem-se audiências públicas com representantes dos diversos agentes diretamente atingidos, como prefeituras, cadeias produtivas de materiais recicláveis e órgãos de controle ambiental, com apoio do conhecimento acadêmico. O passo seguinte será a apresentação do relatório final. Desta forma, a comissão poderá debater e aperfeiçoar uma proposta que já contará com um razoável respaldo dos diferentes segmentos do poder público e da sociedade. 46 Emerson Kapaz Deputado Federal pelo PPS-SP e relator da Comissão Especial para uma Política Nacional de Resíduos Sólidos
  • 36.
  • 37. Educação ambiental é, sem dúvida, um dos meios mais indicados para se resgatar valores que incluem o respeito pela diversidade cultural e biológica, fundamentais para a conservação e para um convívio harmônico entre diferentes culturas e entre essas e a natureza. A aceitação sem questionamento do modelo de desenvol- vimento baseado no consumo desenfreado tem levado o ser humano a adotar atitudes que acabam resultando em diferenças sociais cres- centes e em perdas culturais e biológicas irrepa- ráveis. No Brasil a gravidade dessas perdas é compatível à sua riqueza. Como um dos países líderes em biodiversidade no mundo, a responsa- bilidade do Brasil em proteger tal riqueza é enorme e a educação ambiental pode ser fundamental nesse processo. A educação ambiental no Brasil Há muito que o Brasil vem percebendo a importância da educação ambiental. Durante o fórum paralelo da Rio-92, foi elaborado o documento “Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsa- bilidade Global”. Um de seus princípios é que “a educação ambiental deve ter como base o pensamento crítico e inovador, em qualquer tempo ou lugar, em seus modos formal, não formal e informal, promovendo a transformação e a construção da sociedade” (WWF/ ECOPRESS, 2000:22). Reconhece, ainda, que a “educação ambiental deve ajudar a desen- volver uma consciência ética sobre todas as formas de vida com as quais compartilhamos este planeta, respeitar seus ciclos vitais e impor limites à exploração dessas formas de vida pelos seres humanos” (WWF/ECOPRESS, 2000:24). Ainda em 1992, os Ministérios do Meio Ambiente, da Educação, da Cultura e da Ciência e Tecnologia instituíram o Programa Nacional de Educação Ambiental – PRONEA. Na perspectiva de cumprir suas determinações e na qualidade de executor da política nacional de meio ambiente, o IBAMA elaborou diretrizes para a implementação do PRONEA. Incluiu a educação ambiental no processo de gestão ambiental, o que a torna presente em quase todas as suas áreas de atuação (IBAMA, 1996). Já o Ministério da Educação elaborou em 1997 uma nova proposta curricular conhecida como Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs, onde a dimensão ambiental passa a ser um tema transversal nos currículos básicos do ensino fundamental (de 1ª a 8ª séries). Ao permear todas as disciplinas, a educação ambi- ental integra questões socioambientais de forma ampla e abrangente (MEC, 2000). A culminância do reconhecimento de sua importância se deu em abril de 1999, quando a educação ambiental passou a contar com a Lei nº 9795/99, que a oficializa como área essen- cial e permanente em todo processo educacional do país. A lei está embasada no artigo 225, inciso VI da Constituição Federal de 1988, que menciona a responsabilidade, individual e coletiva, da sociedade na implementação e prática da educação ambiental. A Política Nacional de Educação Ambiental instituída 51 A importância da educação ambiental na proteção da biodiversidade do Brasil
  • 38. pela lei reconhece o dever de defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações e estimula a participação de toda a sociedade para assumir responsabili- dades em sua implantação (MEC, 2000). Mesmo reconhecendo formalmente sua importância, o Brasil ainda tem um longo cami- nho a percorrer para imple- mentar a educação ambiental com efetividade. No ensino formal o MEC vem se esfor- çando para capacitar profes- sores que possam desenvolver programas pertinentes. No entanto, o tamanho continen- tal do país e os escassos recursos alocados à área são fatores que dificultam sua implementação adequada. Os desafios são muitos. Como outros países que con- tam com rica biodiversidade, raras são as ocasiões em que conservação ou a própria educação ambiental são prio- rizadas. Sendo assim, os danos ambientais têm se intensificado, provo- cando a perda da diversidade biológica e cultural, a contaminação do ar e da água e outros impactos igualmente irreparáveis. A educação ambiental e seu papel na conservação da biodiversidade Apesar da preocupação com a sobrevivência de espécies e ecossistemas ter levando à criação de unidades de conservação que visam não só a proteção, mas a continuidade de processos evolutivos indispensáveis ao desenvolvimento da riqueza biológica existente no planeta, uma grande maioria dessas áreas é rodeada de desmatamento ou de acentuada descaracte- rização de sua condição original. Muitas unidades de conservação tornaram-se “ilhas de vida” e sua proteção é muitas vezes indispen- sável à sobrevivência de espécies e ecossistemas únicos no mundo. Contudo, são raros os exem- plos onde existem profissionais e infraestrutura à altura de sua importância biológica. Neste cenário, o envolvimento de comuni- dades locais passa a ser um dos mais promissores meios de proteção às unidades de conservação. O fortalecimen- to de tais comunidades pode levar à participação efetiva, o que difere da condição co- mum em regiões remotas, onde muitas destas unidades de conservação estão locali- zadas, em que segmentos sociais menos favorecidos são banidos do processo decisó- rio. O fato de pessoas não terem o hábito de participar, comumente não perceberem seu direito de reivindicar, ou menos ainda seu potencial transformador, torna a edu- cação um meio singular de abrir caminhos que podem beneficiar tanto a realidade social quanto à ecológica. É na valorização do que é possível ser feito localmente para a melhoria da qualidade e da proteção da vida, dentro de um princípio sugerido por Schumacher (1989) onde a chave pode estar no singelo e não no grandioso, que a educação ambiental representa um meio eficaz de transformação. Com base no respeito à vida humana e aos demais seres, como proposto por Buber (1987), as relações passam a representar um caminho de cresci- mento, de cooperação e de concretizações efetivas que podem beneficiar a coletividade. A educação ambiental dirigida às populações que vivem cerca de unidades de conservação pode contribuir a tornar essas áreas em focos de 52 A Política Nacional de Educação Ambiental instituída pela lei reconhece o dever de defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações e estimula a participação de toda a sociedade para assumir responsabilidades em sua implantação.