1) O documento discute a história da endocardite infecciosa e os riscos associados a diferentes condições cardíacas.
2) Os protocolos atuais de profilaxia antibiótica para endocardite estão sob revisão devido à falta de evidências sobre sua eficácia e riscos de resistência bacteriana.
3) As novas diretrizes restringem o uso de profilaxia antibiótica apenas para alguns procedimentos dentários em pacientes de alto risco.
Protocolos atuais de profilaxia antibiótica para endocardite infecciosa em procedimentos odontológicos
1. Dr. Alberto de Almeida Las Casas Júnior
Cardiologista do Instituto de Neurologia de Goiânia
lascasasjr@me.com
Relação Odontologia e Endocardite
Infecciosa
Atuais Protocolos de Profilaxia Antibiótica
2. Endocardite
“A primeira descrição de endocardite foi registrada
provavelmente por Lazare Riviere em 1646. O
paciente procurou-o devido à “palpitação no
coração”. Riviere encontrou “o pulso fino,
irregular, com toda variedade de
irregularidades”. O paciente desenvolveu intensa
dispnéia e edema em membros inferiores,
gradualmente tornou-se mais enfermo,
manifestou hemoptises e faleceu.
3. Os seguinte achados foram verificados à
necropsia. “Excrescências arredondadas no
ventrículo esquerdo, assemelhando-se a tecido
pulmonar, a maior das quais parecida com um
aglomerado de avelãs e preenchendo a região
inicial da aorta.”
BRAUNWALD, Tratado de Medicina
Cardiovascular.
4. Conceitos
• Infecção microbiana do endocárdio ou endotélio
vascular
• Lesão característica – vegetação
• A incidência e mortalidade não diminuiram nos
últimos 30 anos
• Espectro amplo de apresentações
• Diretrizes por consenso de especialistas, pela baixa
incidência, ausência de estudos randomizados e
poucas meta-análises.
5. Risco de Endocardite
• População geral não cardiopata – 5/100.000 pts/ano
• Prótese valvar por EI – 2.160/100.000 pts/ano
• PVM sem sopro – 4,6/100.000 pts/ano
• PVM com sopro IM – 52/100.000 pts/ano
• E. Aórtica congênita – 271/100.000 pts/ano
• CIV – 145/100.000 pts/ano
• Cardiopatia reumática – 380-440/100.000 pts/ano
• Endocardite prévia – 740/100.000 pts/ano
6. Epidemiologia
• Mudanças no perfil epidemiológico:
Antes:
Jovens com valvopatias reumáticas
Hoje:
Idosos submetidos a procedimentos
próteses
Prolapso da válvula mitral
valvopatias degenerativas
usuários de drogas intravenosas
7. Classificação
• Localização da infecção e material:
Em valva nativa esquerda
Em valva protética esquerda precoce (<1 ano)
Em valva protética esquerda tardia (>1 ano)
Em valva direita
Relacionada a dispositivos (MP/CDI)
8. Classificação
• Modo de aquisição:
Adquirida na comunidade (sintomas <48 h após a
admissão hospitalar)
Associada aos cuidados de saúde:
Nosocomial (sintomas >48 h após admissão)
Ñ nosocomial (sintomas <48 h após admissão, homecare,
QT, HD <30d, internados há <90d, ou insitucionalizados)
Usuários de drogas intravenosas
9. Patogênese
• O endotélio normal é estéril
• Rotura causa endocardite trombótica não bacteriana, a
qual depois sofre colonização
• Inflamação endotelial libera integrina β1, à qual adere a
fibronectina da bactéria
• Bacteremia
• Escovação – até 100 UFC/ml sangue por <10 minutos
• Aderência bacteriana depende de fatores do hospedeiro
e do patógeno
10. Risco Alto de EI ou Desfecho Adverso
• 1. Próteses valvares
• 2. Endocardite infecciosa prévia
• 3. Cardiopatias congênitas:
a) Cianóticas não corrigidas, incluindo “shunts” e condutos paliativos
b) Com correção completa, com prótese ou dispositivo por cirurgia ou
cateterismo, durante 6 meses após, até a endotelização
c) Corrigida com defeitos residuais no local ou adjacentes a retalhos ou
dispositivos prostéticos (que inibem a endotelização)
• 4. Receptores de transplante cardíaco com valvopatias
(AHA)
11. Quadro Clínico
• A maioria das manifestações e dos achados de exame
físico é inespecífica
• Originam-se de 3 aspectos:
1. Infecção sistêmica (citocinas)
2. Lesão estrutural cardíaca ou vascular
3. Manifestações imunológicas
• Podem se originar predominantemente das
complicações
19. Quando suspeitar de EI ?
• Sopro regurgitante novo
• Eventos embólicos de origem desconhecida
• Sepse de origem desconhecida
• Febre associada a prótese, EI prévia, cardiopatia
congênita, imunodepressão, uso de droga IV,
procedimento invasivo recente, fenômenos vasculares,
sinais neurológicos focais, TEP, abscessos periféricos
de causa desconhecida, HC + para germe compatível.
20. Critérios de Duke Modificados - Maiores
• Hemoculturas positivas (1 dos abaixo)
(Colher 3 amostras venosas de 10 ml)
Microorganismo típico em 2 separadas
Duas positivas com intervalo > 12 horas,
Três em 3 com intervalo > 1 hora, ou a maioria de pelo
menos 4 em > 1 hora
• Ecocardiograma (1 dos abaixo)
Massa oscilante na valva, fluxo ou prótese,
Discinesia parcial nova de prótese, ou
Regurgitação valvar nova
21. Critérios de Duke Modificados - Menores
• Predisposição: cardiopatia / drogadição
• Febre: >/= 38°C
• Vasculares: Embolia em artéria calibrosa
Infarto pulmonar séptico
Aneurisma micótico
AVC hemorrágico
Hemorragia conjuntival
Lesões de Janeway
22. Critérios de Duke Modificados - Menores
• Imunológicos:
Glomerulonefrite
Nódulos de Osler
Manchas de Roth
Fator reumatóide positivo
• Microbiológicos:
Hemocultura com uma amostra positiva
Sorologia de infecção ativa por germe compatível com EI
23. Diagnóstico Definido
• Critérios patológicos:
Microorganismo em cultura ou histologia
de material cirúrgico ou de necrópsia
• Critérios clínicos:
Dois critérios maiores, um maior e três
menores ou cinco menores
24. Diagnóstico
• Possível:
1 critério maior e 1 menor ou 3 menores
• Afastado:
Diagnóstico alternativo firme para o quadro
Resolução com antibiótico em até 4 dias
Nenhuma evidência patológica em peça cirúrgica ou
necrópsia, após antibiótico por até 4 dias
Critérios insuficientes para EI possível
26. Bacteremia Provável
• Procedimentos dentários c/ risco de sangrar
• Broncoscopia rígida
• Cistoscopia com infecção urinária
• Biópsia de trato urinário e próstata
• Amigdalectomia e adenoidectomia
• Dilatação esofágica e escleroterapia
• Instrumentação de vias biliares obstruídas
• Prostatectomia transuretral
• Litotripsia
• Procedimentos ginecológicos com infecção
27. Bacteremia em Procedimentos
Dentários
• Extração - 10-100%
• Cir. Periodontal - 36-88%
• Proc. Endodônticos - até 20%
• Limpeza dental - até 40%
• Matriz p/ elásticos - 9-32%
• Escovação - 20-68%
• Uso de palitos - 20-40%
• Jato de água - 7-50%
• Mastigação de alimentos - 7-51%
28. Porém...
• Parece não haver diferença clinicamente significante na
freqüência, natureza, magnitude e duração da
bacteremia associada aos procedimentos dentários
comparados às atividades rotineiras diárias.
• Em pacientes com má higiene oral, a incidência de
bacteremia antes de extração dentária pode ser
semelhante à de bacteremia após a extração.
• Não há evidência de que sangramento visível em
procedimentos seja um bom preditor de bacteremia.
29. • Na maioria dos pacientes com EI não conseguimos
estabelecer uma relação causal com procedimento invasivo.
• Roberts GJ. Dentists are innocent! ‘Everyday’ bacteremia is
the real culprit: a review and assessment of the evidence that
dental surgical procedures are a principal cause of bacterial
endocarditis in children. Pediatr Cardiol 1999;20: 317 – 325.
• Uso indiscriminado de antibióticos pode levar a resistência
bacteriana.
• Antibiótico pode levar a anafilaxia.
30. Estimativa de Risco
Risco de EI para 1 procedimento dentário:
• População geral – 1:14.000.000
• Prolapso de valva mitral – 1:1.100.000
• Cardiopatia congênita – 1:475.000
• Endocardite prévia: 1:95.000
• Cardiopatia reumática: 1:142.000
• Prótese: 1:114.000
• Mesmo que a eficácia dos antibióticos profiláticos fosse
100%, o número de EI prevenidas seria muito baixo.
• 1 EI prevenida, 94.999 pacientes usaram antibiótico sem
benefício algum!
European Heart Journal (2009) 30, 2369-2413
31. Dúvidas
• Qual procedimento dentário requer profilaxia para
endocardite ?
• Os procedimentos têm mais risco de bacteremia que as
rotinas diárias ( mastigação, bochechos, escovação ) ?
• Duas escovações diárias em 1 ano têm 154.000 vezes
mais risco de bacteremia que uma extração.
• Rotinas diárias durante 1 ano têm 5,6 milhões de vezes
mais risco de bacteremia que uma extração.
• Não existe um estudo prospectivo, randomizado,
controlado por placebo para profilaxia de EI.
32. Indicações de Profilaxia para EI
Classe IIa - Evidência C
• 1. Próteses valvares ou reparos com material protético
• 2. Endocardite infecciosa prévia
• 3. Cardiopatias congênitas:
a) Cianóticas não corrigidas, incluindo “shunts” e condutos
paliativos
b) Com correção completa, com prótese ou dispositivo por
cirurgia ou cateterismo, durante 6 meses após, até a endotelização
c) Corrigidas com defeitos residuais no local ou adjacentes a
retalhos ou dispositivos prostéticos (que inibem a endotelização)
European Heart Journal (2009) 30, 2369-2413
33. Profilaxia para EI Não Indicada
• Estenose aórtica
• Estenose mitral
• Prolapso da valva mitral, sintomático ou não.
• Valvopatias nativas em adolescentes e adultos
jovens
• Estenose pulmonar com valvotomia por balão
European Heart Journal (2009) 30, 2369-2413
35. Indicações de Profilaxia para EI
• Procedimentos dentários com:
1. Manipulação de gengivas
2. Manipulação periapical dos dentes
3. Perfuração das mucosas
• Não é indicada em anestesia em tecido não
infectado, colocação, ajuste ou retirada de próteses e
dispositivos ortodônticos, perda da 1ª dentição ou
trauma aos lábios e mucosa oral.
European Heart Journal (2009) 30, 2369-2413
37. Profilaxia - Procedimentos Dentários
• Profilaxia em dose alta antes do procedimento, sem
necessidade de dose após.
• Evitar ou minimizar a bacteremia além de alterar
propriedades bacterianas diminuindo a aderência ao
endotélio.
• Amoxicilina 2 g VO 30 a 60 minutos antes do
procedimento dentário (crianças 50 mg/Kg)
• Alérgicos e/ou incapazes de deglutir: Clindamicina 600
mg (crianças 20 mg/Kg) VO, IM ou IV
European Heart Journal (2009) 30, 2369-2413
38. ACC/AHA 2008 Guideline Update on Valvular Heart Disease:
Focused Update on Infective Endocarditis
Circulation 2008:118:000-000 - August 19, 2008.
“Os clínicos devem estar disponíveis para discutir as
razões para estas novas mudanças com seus
pacientes, incluindo a falta de evidência científica
para demonstrar um benefício provado na profilaxia
da endocardite infecciosa.”
“ Com o tempo e a educação continuada, o Comitê
prevê aceitação crescente das novas diretrizes entre
médicos e pacientes.”
40. Guidelines on the Prevention, Diagnosis and
Treatment of Infective Endocarditis
European Society of Cardiology – Sept. 2009
“Após revisão informada e
discussão com o paciente, muitos
médicos podem decidir continuar
com a profilaxia, e esta visão
deve ser respeitada.”
42. Prevention of Infective Endocarditis
Guidelines from the American Heart Association
Circulation 2007:116:1736-54 - May 8, 2007.
“...A manutenção de boa higiene oral e o
acesso a cuidados dentários de rotina
provavelmente são mais
importantes na redução do risco de
endocardite por toda a vida que a
administração de profilaxia antibiótica
para um procedimento dentário.”
Janeway: pequenas máculas ou nódulos eritemotoso ou hemorrágico, localizado nas palmas ou solas. Osler: nódulos subcutâneos, dolorosos, em dedos e regiões tenares e hipotenares