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DIREITO CIVIL

                                                                    Prof.: Alexander Perazo



       VISÃO GERAL DO NOVO CÓDIGO CIVIL DE 2002
       Lei n° 10.406, de 10.01.02 – O Código Civil é a constituição do homem comum, pois
estabelece regras de conduta entre todos os seres humanos, mesmo antes de nascer
(resguarda os direitos do nascituro) até depois de sua morte.
O CC/2002 foi apresentado em 1972, convertido em Projeto de Lei em 1975 e engavetado,
com certa prudência, à espera da nova Constituição.

        Orientações da elaboração do novo Código
        a) preservar, sempre que possível, o CC/1916
        b) criar um novo Código e não simplesmente revisar o de 1916
        c) inclusão de valores essenciais como a eticidade, a socialidade e a operabilidade
        d) aproveitamento dos trabalhos de revisão do Código Civil no que tange ao Direito
das Obrigações em 1940 e em 1965.
        e) firmar não uma unificação do Direito Privado, mas sim do Direito das Obrigações,
inclusive com a inclusão de mais um Livro na Parte Especial intitulado Direito de Empresa

        Os três princípios fundamentais
        Eticidade – foi inserido no Código a participação de valores éticos. Assim, o art.. 113
e o 422, que tratam da boa-fé
        Socialidade – foi retirado o caráter individualista do Código, com a inclusão da
função social do contrato (art. 421) e adoção da interpretação mais benéfica ao aderente
(art. 423)
        Operabilidade – procurou-se solucionar antigas discussões doutrinárias como a
distinção entre prescrição e decadência, associação (sem fins econômicos) e sociedade
(com objetivo de lucro)

       Direito público e privado – Direito público é o destinado a disciplinar os interesses
gerais da coletividade. A relação é entre o Estado e o particular ou entre dois Estados,
sendo sempre de subordinação. Direito privado, por sua vez, é aquele que regula as relações
entre os homens. A relação é entre indivíduos, sendo sempre de coordenação.



       LEI DE INTRODUÇÃO AO CÓDIGO CIVIL

         A Lei de Introdução ao Código Civil é um conjunto de normas sobre normas, pois
disciplina as próprias normas jurídicas, determinando o seu modo de aplicação e
entendimento, no tempo e no espaço
         Fontes do direito – A lei é o objeto da LICC e a principal fonte do direito. Pelo art.
4º da LICC, podemos antever que são fontes do direito: a lei, a analogia, o costume e os
princípios gerais do direito. A jurisprudência é colocada como fonte meramente intelectual
ou informativa (não formal) do direito.
LEI – a palavra lei é empregada em duas acepções: em um sentido amplo, como
sinônimo de norma jurídica, compreende toda regra geral de conduta, emanada por
autoridade competente; em sentido estrito, refere-se, tão somente, a norma jurídica
elaborada pelo Poder Legislativo por meio de processo adequado.
       Possui como características a generalidade, a imperatividade e a permanência.

        Vigência da lei – a vigência é uma qualidade temporal da norma, designa a
existência específica da norma em determinada época. Segundo a LICC em seu art. 1º, salvo
disposição em contrário, a lei começa a vigorar em todo o país quarenta e cinco dias depois
de oficialmente publicada.
        O intervalo entre a data de sua publicação e a sua entrada em vigor denomina-se
vacatio legis.
        OBS – Se durante a vacatio legis ocorrer nova publicação de seu texto, para
correção de erros materiais ou falha de ortografia, o prazo da obrigatoriedade começará a
correr a partir da nova publicação (art. 1º, § 3º). Se a lei já entrou em vigor, tais correções
são consideradas lei nova, tornando-se obrigatória após o decurso da vacatio.
        OBS 2 – decretos e regulamentos tornam-se obrigatórios a partir de sua
publicação.

        Revogação da lei – cessa a vigência de uma lei com a sua revogação, sendo certo que
uma lei, em regra, tem caráter permanente. Assim, mantém-se a lei em vigor até ser
revogada por outra lei.
        A revogação parcial denomina-se derrogação, enquanto que a revogação total é
chamada de ab-rogação.
        Uma lei revogada não adquire vigência com a revogação da lei que a revogou
(repristinação).

        Interpretação da lei – interpretar é descobrir o sentido e o alcance da norma
jurídica. Todas as lei estão sujeitas a interpretação, não se aplicando o brocardo jurídico in
claris cessat intepretatio (na clareza dispensa-se a interpretação).
        Quanto à origem, os métodos de interpretação podem ser autêntico, jurisprudencial
e doutrinário; quanto aos meios, a interpretação pode ser gramatical, lógica, sistemática,
histórica e sociológica (teleológica)
        Gramatical – consiste no exame do texto normativo sob o ponto de vista linguístico;
        Lógica – procura-se apurar o sentido e a finalidade da norma
        Sistemática – parte do pressuposto que uma lei não existe isoladamente, devendo
ser interpretada em conjunto com outras;
        Histórica – investiga-se os antecedentes da norma a fim de descobrir o seu exato
significado.
        Teleológica – tem por objetivo adaptar o sentido ou a finalidade da norma às novas
exigências sociais, com claro abandono do individualismo.

        Conflito de leis no tempo – em regra, as leis são irretroativas. Assim, salvo
disposição em contrário, aplica-se a lei nova aos fatos pendentes e aos fatos futuros.
Quanto aos fatos pendentes, é possível que o legislador crie “disposições transitórias”.
Aduz o art. 6º da LICC que a lei não prejudicará o ato jurídico perfeito, o direito adquirido
e a coisa julgada.

        Eficácia da lei no espaço – a norma jurídica tem aplicação dentro do território
nacional (princípio da territorialidade). Ocorre, porém, que em determinadas situações,
surge a necessidade de aplicação de outras leis dentro do território nacional (princípio da
extraterritorialidade). Assim, pelo sistema da extraterritorialidade a norma jurídica
aplica-se em território de outro Estado, segundo princípios e convenções internacionais.
        Com efeito, dispõe o art. 7º da LICC que a lei do país em que for domiciliada a
pessoa determina as regras sobre o começo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade
e os direitos de família
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL

        PESSOA NATURAL
        O conceito de personalidade está umbilicalmente ligado ao conceito de pessoa. Todo
aquele que nasce com vida torna-se uma pessoa, ou seja, adquire personalidade. Esta é,
portanto, atributo do ser humano, sendo a aptidão genérica para adquirir direitos e
contrair obrigações.
        Assim, afirmar que o homem possui personalidade é o mesmo que dizer que ele tem
capacidade para ser titular de direitos. Todas as pessoas ao nascer adquirem a capacidade
de direitos ou de gozo. Por outro lado, nem todas as pessoas possuem a capacidade de
exercício ou de fato, que é a aptidão para exercer, por si só, os atos da vida civil. Por
faltarem a certas pessoas alguns requisitos materiais, como maioridade, saúde,
desenvolvimento mental, etc, a lei, no intuito de protegê-las, malgrado não lhes negue a
capacidade de adquirir direitos, sonega-lhes o de se autodeterminarem, exigindo a
participação de outras pessoas, que as representa ou assiste.
        Capacidade também não se confunde com legitimação, sendo esta a aptidão para a
prática de determinados atos jurídicos específicos. Assim, por exemplo, o ascendente
genericamente capaz, não estará legitimado para a venda de seus bens a outros
descendentes, sem o consentimento dos demais (art. 496, CC/2002).

        Sujeitos da Relação Jurídica
        O novo Código Civil, no Livro I da Parte Geral, dispõe sobre as pessoas como
sujeitos de direitos. As relações jurídicas são todas as relações da vida social regulada
pelo Direito (fatos jurídicos), sempre somente o homem o sujeito destas relações jurídicas.
Os animais, portanto, não são considerados sujeitos de direitos, embora mereçam proteção.
        A ordem jurídica reconhece duas espécies de pessoas: a pessoa física (natural, o
próprio ser humano) e a pessoa jurídica (agrupamento de pessoas físicas, com o intuito de
alcançar fins comuns), também denominada de pessoa moral ou pessoa coletiva.
        Note-se que no direito brasileiro não existe incapacidade de direito, pois, como
dito, todas as pessoas se tornam, ao nascer, capazes de adquirir direitos (art. 1º do
CC/2002). Existe, outrossim, incapacidade de fato ou de exercícios, decorrente do
reconhecimento da inexistência, em uma pessoa, dos requisitos indispensáveis ao exercício
dos seus direitos.
        A incapacidade de fato pode ser suprida pelos institutos da representação ou da
assistência, conforme o caso (absoluta ou relativamente capazes).
        Desta forma, a incapacidade absoluta acarreta a proibição total do exercício por sí
só do direito. O negócio somente pode ser praticado pelo representante do incapaz. O art.
3º do CC/2002 nos fornece as três hipóteses de incapacidade:

                   “Art. 3º. São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos
           da vida civil:
                   I – os menores de dezesseis anos
                   II – os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o
           necessário discernimento para a prática deses atos
                   III – os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua
           vontade”
OBS – Frise-se que se a pessoa, ainda que por causa transitória, não puder
exprimir a sua vontade, mas acaba exprimindo-a, o ato é nulo (art. 3º, III). Por sua
vez, se a pessoa, ainda que por causa transitória, não exprimiu a vontade, o ato é
inexistente, por faltar a própria declaração da vontade

        Por sua vez, a incapacidade pode ser somente relativa, ocasião em que o incapaz
poderá praticar atos da vida civil, desde que devidamente assistido por seu representante.
O art. 4º, por sua vez, traduz a incapacidade relativa:

                    “Art. 4º. São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os
             exercer:
                    I – os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos
                    II – os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por
             deficiência mental, tenham o discernimento reduzido
                    III – os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo
                    IV – os pródigos
                    Parágrafo único. A capacidade dos índios será regulada por legislação
             especial”

        A incapacidade (de exercício, lembre-se), por seu turno, cessa com a maioridade, ou
seja, no primeiro momento do dia em que o indivíduo completa dezoito anos, ou nos casos de
emancipação previstos no p.u. do art. 5º do CC/2002;

                    “Art. 5º. (...)
                    Parágrafo único. Cessará, para os menores, a incapacidade:
                    I – pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante
             instrumento público, independentemente de homologação judicial, ou por
             sentença do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver dezesseis anos completos;
                    II – pelo casamento
                    III – pelo exercício de emprego público efetivo
                    IV – pela colação de grau em curso de ensino superior;
                    V – pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de
             relação de emprego, desde que, em função deles, o menor com dezesseis anos
             completos tenha economia própria”

         Pelo exposto, podemos concluir que a emancipação pode ser voluntária, judicial ou
legal.

        A emancipação voluntária é concedida pelos pais, se o menor tiver dezesseis anos
completos (ou por um deles na falta do outro), mas não pode servir de excludente de
responsabilidade dos pais em relação aos seus filhos (objetiva, diga-se) e tampouco para
exonerar-se do dever de alimentar.
        A emancipação judicial é aquela do menor sob tutela que já completou dezesseis
anos, dependendo de sentença e ouvido o tutor.
        Por derradeiro, a emancipação legal está presente nos demais incisos do parágrafo
único do art. 5º.

       DIREITOS DA PERSONALIDADE
       O Código Civil dedicou um capítulo específico aos direitos de personalidade, pois,
segundo Miguel Reale “tratando-se de matéria de per si complexa ede significação ética
essencial, foi preferido o enunciado de poucas normas dotadas de rigor e clareza, cujos
objetivos permitirão os naturais desenvolvimentos da doutrina e da jurisprudência”.
        Assim, os direitos de personalidade são direitos subjetivos que possuem como
objeto os bens e valores essenciais da pessoa humana, em seu aspecto físico, moral e
intelectual. São direitos inalienáveis, que se encontram fora do comércio e que merecem,
sobremaneira, a proteção legal.
        Segundo o art. 11 do Código Civil “os direitos da personalidade são instransmissíveis
e irrenunciáveis, não podendo o ser exercício sofrer limitação voluntária. Podemos destacar
as seguintes características:
        a) Instransmissibilidade e irrenunciabilidade – não podem seus titulares dispor dos
direitos de personalidade, transferindo-se a terceiros, renunciando o seu uso ou
simplesmente os abandonando, pois nascem e se extinguem com a própria pessoa. Por óbvio
que ninguém pode desfrutar em nome de outrem bens como a vida, a honra, a liberdade,
etc.
        Alguns atributos da personalidade admitem a cessão de seu uso, como por exemplo,
a imagem que pode ser explorada comercialmente, mediante retribuição. Permite-se
também a cessão gratuita de órgãos do corpo humano para fins terapêuticos. Assim a
indisponibilidade dos direitos da personalidade e tida como relativa.
        b) Abolutismo – o caráter absoluto do direito da personalidade deve-se ao fato de o
mesmo ser oponível erga omnes
        c) Não-limitação – o rol dos direitos da personalidade existente no Código Civil é
meramente exemplificativo (numerus apertus), pois é impossível imaginar-se um rol
exaustivo dos direitos da personalidade. Desta forma, são direitos da personalidade o
direito a alimentos, ao meio ambiente saudável, à velhice digna, ao culto religioso, à
liberdade de pensamento, etc.
        d) Imprescritibilidade – os direitos da personalidade não se extinguem pelo decurso
do tempo. Malgrado o dano moral consista na lesão a um interesse que visa a satisfação de
um bem jurídico extrapatrimonial contido nos direitos da personalidade, a pretensão à
reparação civil está sujeita aos prazos prescricionais, por ter caráter patrimonial.
        e) Impenhorabilidade – se os direitos da personalidade são indisponíveis,
logicamente tornam-se impenhoráveis. Frise-se que os reflexos patrimoniais dos direitos da
personalidade podem ser penhorados
        f) Vitaliciedade – os direitos da personalidade são inatos, sou seja, são adquiridos
no momento da concepção e acompanham a pessoa por toda a sua vida até sua morte. Aliás,
mesmo após a morte de uma pessoa alguns direitos são resguardados, como o respeito ao
morto, sua honra ou memória, etc.

        O Código Civil disciplina os direitos da personalidade com os atos de disposição do
próprio corpo (arts. 13 e 1), o direito à não-submissão a tratamento médico de risco (art.
15), o direito ao nome e ao pseudônimo (arts. 16 a 19), a proteção à palavra e à imagem (art.
20) e a proteção à intimidade (art. 21). No art. 52, preceitua que “aplica-se às pessoas
jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos da personalidade.”



        PESSOA JURÍDICA
        A pessoa jurídica, por sua vez, consiste num conjunto de pessoas ou bens, dotado de
personalidade jurídica própria e constituído na forma da lei, para a consecução de fins
comuns. A sua principal característica é a de que atuam na vida jurídica com personalidade
diversa da dos indivíduos que a compõem.
A formação da pessoa jurídica exige uma pluralidade de pessoas ou de bens e uma
finalidade específica (elementos de ordem material), bem como um ato constitutivo e
respectivo registro no órgão competente (elemento formal), ou Registro Civil das Pessoas
Jurídicas (sociedade simples) ou na Junta Comercial (sociedade empresária).
        Natureza jurídica – atualmente, duas teorias explicam a existência da pessoa
jurídica: teorias da ficção (ficção legal ou ficção doutrinária) e teoria das realidade
(orgânica, jurídica e técnica).
        São espécies de pessoa jurídica:
        Pessoa jurídica de direito público
                Externo (art. 42)
                        Países estrangeiros
                        Organismos internacionais
                Interno (art. 41)
                        União
                        Estados
                        Municípios
                        Distrito Federal
                        Territórios
                        Autarquias, inclusive as associações públicas
                        demais entidades de caráter público criadas por lei
        Pessoa jurídica de direito privado
                associações
                sociedades
                fundações
                organizações religiosas
                partidos políticos

        Neste ponto, faz-se mister os seguintes conceitos:
        Associações – são pessoas jurídicas de direito privado constituídas de pessoas que
reúnem os seus esforços para a realização de fins não econômicos. Nesse sentido, reza o
art. 53 que “Constituem-se as associações pela união de pessoas que se organizem para fins
não econômicos”. Assim o traço característicos das associações está no fato de elas não
visarem ao lucro.
        Sociedades – Celebram contratos de sociedade as pessoas que reciprocamente se
obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a
partilha, entre si, dos resultados. As sociedades podem ser simples ou empresárias; as
primeiras são constituídas, em geral, por profissionais que atuam em uma mesma área ou
por prestadores de serviços técnicos (clínicas médicas, escritórios de advocacia, etc),
possuindo fins econômicos; as segundas, por sua vez, possuem em seu objeto o exercício de
atividade própria de empresário.
        Fundações – constituem um acervo de bens que recebe personalidade jurídica para
a realização de fins determinados, de interesse público, de modo permanente e estável.
Nos dizeres de Clóvis Beviláqua “consistem em complexos de bens (universitates bonorum)
dedicados à consecução de certos fins e, para esse efeito, dotados de personalidade”. Sua
existência decorre da vontade de uma pessoa, o instituidor, e seus fins, de natureza moral,
religiosa, cultural ou assistencial, são imutáveis.

      DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA
      O ordenamento jurídico confere às pessoas jurídicas personalidade distinta da de
seus membros. Eis a razão de ser da pessoa jurídica. Porém, o que fazer quando a
existência da pessoa moral serve como instrumento para a prática de fraudes e abusos de
direitos contra credores, acarretando-lhes prejuízos?
        A reação a esses abusos ocorreu em diversos países, dando origem, através dos
estudos do Prof. Rubens Requião em nosso país, à teoria da desconsideração da
personalidade jurídica (disregard doctrine).
        Assim, permite-se ao juiz que, em casos de fraude e de má-fé, desconsidere o
princípio de que as pessoas jurídicas possuem existência distinta de seus sócios, para
atingir e vincular os bens particulares dos sócios à satisfação das dívidas da sociedade,
erguendo-se o véu da personalidade jurídica.
        Atenção, trata-se apenas e rigorosamente, de suspensão episódica da personalidade
da pessoa jurídica não desfazendo seu ato constitutivo, nem invalidando a sua existência,
apenas possibilitando que certas e determinadas relações obrigacionais possam ser
estendidas aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.
        Desta forma, em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio
de finalidade ou pela confusão patrimonial será possível, em tese, desconsiderara a
personalidade jurídica

       DOMICÍLIO
       O domicílio da pessoa natural foi definido pelo Código como sendo o lugar onde ela,
de modo definitivo, estabelece a sua residência o centro principal de sua atividade. Do
conceito supra, subsume-se duas ideias: a de morada e o centro de atividade; a primeira,
pertinente à família, ao lar, ao ponto onde o homem se recolhe para a sua vida íntima; a
segunda, relativa à vida externa, às relações sociais.
       O domicílio pode ser ainda voluntário ou necessário ou legal. Este último são
exemplos o incapaz, o servidor público, o militar, o marítimo e o preso.
       Já a pessoa jurídica de direito privado não possui residência, mas sede ou
estabelecimento. Trata-se de um domicílio especial que pode ser livremente escolhido no
seu estatuto ou atos constitutivos.



        BENS
        Os bens são coisas que, por serem úteis e raras, são suscetíveis de apropriação e
contêm valor econômico. Somente interessam ao direito coisas suscetíveis de apropriação
exclusiva pelo homem. As que existem em abundância no universo, como o ar atmosférico e
a água dos oceanos, por exemplo, deixam de ser bens em sentido jurídico.
        O patrimônio, por outro lado, é o complexo das relações jurídicas de uma pessoa que
tem valor econômico. O patrimônio e a herança constituem coisas universais (ou
universalidades) e como tais subsistem, embora não constem de objetos materiais.
Entende-se que o patrimônio é composto por todo o ativo e por todo o passivo de um
indivíduo, de modo que se pode encontrar pessoa que tenha um patrimônio negativo, como é
o caso do insolvente.



       CLASSIFICAÇÃO DOS BENS
       Os bens podem ser:

        Corpóreos e incorpóreos – corpóreos são os bens físicos, com existência material;
incorpóreos são os bens com existência abstrata, porém com valor econômico (direito
autoral, crédito, etc).
Móveis e imóveis – imóveis são aqueles que não podem ser transportados de um
lugar para o outro sem deterioração ou perda. Podem ser ainda imóveis por natureza,
imóveis por acessão ou por disposição legal (art 80 – direitos reais sobre imóveis e as ações
que os asseguram e o direito à sucessão aberta); Bens móveis, por sua vez, são aqueles que
podem ser transportados de um lugar para o outro. São móveis por disposição legal as
energias, os direitos reais sobre objetos móveis e as ações correspondentes e os direitos
pessoais de caráter patrimonial e suas respectivas ações.

       Fungíveis e consumíveis – são consumíveis aqueles móveis que se destroem assim
que vão sendo usados; são fungíveis aqueles móveis que podem ser substituídos por outros
da mesma espécie, qualidade e quantidade.

       Divisíveis e indivisíveis – divisíveis são aqueles que podem ser divididos sem
perderem o seu valor; os indivisíveis, por sua vez, podem ser por natureza, por
determinação legal ou por vontade das partes.

       Singulares e coletivos – singulares são os bens individualizados; coletivos são bens
agregados num todo (uma biblioteca).

        Principais e acessórios – principais são aqueles que não dependem de mais nenhum
outro bem para a sua existência; acessórios são aqueles que se consideram decorrentes de
outros.
        Os acessórios podem ser: produtos (utilidades que se retiram das coisas,
diminuindo-lhe a quantidade, porque não se reproduzem periodicamente, como as pedras, os
metais, etc); frutos (são as utilidades que uma coisa periodicamente produz, nascendo e
renascendo da coisa, sem acarretar a sua extinção); pertenças (que não se constituindo
parte integrante da coisa, se destina, de modo duradouro ao uso, ao serviço ou ao
aformoseamento do bem).
        Atenção: As pertenças são acessórios que não seguem o principal.

        Bens públicos – são os bens do domínio nacional, pertencentes à União, aos Estados
ou aos Municípios. Se dividem em:
        a) bens de uso comum (inalienáveis): aquele pertencentes ao Poder Público que
podem ser utilizados por todos do povo (ruas, praias, parques)
        b) uso especial (inalienáveis): aqueles pertencentes ao Poder Público para a
administração e prestação de serviços (prédios de prefeituras, escolas, fóruns, etc);
        c) dominiais ou dominicais (alienáveis): são os que compõem o patrimônio da União,
Estados e Municípios como objeto de direito pessoal ou real dessas pessoas de direito
público interno.
        OBS – os bens públicos (todos) não estão sujeitos a usucapião. (são
imprescritíveis)



        DOS FATOS JURÍDICOS
        O novo Código Civil abandonou a expressão ato jurídico pela designação escorreita e
específica de negócios jurídicos, porque em verdade somente este é rico em conteúdo e
justifica uma pormenorizada regulamentação. Manteve a noção de fatos jurídicos,
abrangendo, como veremos, os fato jurídicos em geral, ou seja, os fatos jurídicos em
sentido amplo e suas espécies.
Fatos jurídicos são, na definição de Savigny os acontecimentos em virtude dos quais as
relações de direitos nascem e se extinguem, ou seja, todos os acontecimentos suscetíveis
de produzir alguma aquisição, modificação ou extinção de direitos. (Teixeira de Freitas).
        Perceba que a expressão fatos jurídicos engloba todos aqueles eventos provindos
da atividade humana de decorrentes de fatos naturais, desde que tenham influência na
órbita do direito. Assim, nem todo acontecimento constitui um fato jurídico, sendo alguns
simplesmente denominados de fatos por não possuírem relevância para o direito.
        Aduz Caio Mário da Silva Pereira que “a chuva que cai é um fato, que ocorre e
continua a ocorrer, dentro da normal indiferença da vida jurídica. O que não quer dizer que,
algumas vezes, este mesmo fato não repercuta no campo do direito, para estabelecer ou
alterar relações jurídicas. Outros se passam no domínio das ações humanas, também
indiferentes ao direito: o indivíduo veste-se, alimenta-se, sai de casa, e a v ida jurídica se
mostra alheia a estas ações, a não ser quando a locomoção, a alimentação, o vestuário
provoquem a atenção do ordenamento legal”.
        Conclui-se, portanto, que todo fato, para ser considerado jurídico, deve passar por
um juízo de valoração. Fato jurídico em sentido amplo é todo acontecimento da vida que o
ordenamento jurídico considera relevante no campo do direito. Pode ser o simples evento
natural como o fato do animal ou a conduta humana, havendo para tanto a correspondência
entre o fato e a norma a ser seguida.

        Classificação – os fatos jurídicos em sentido amplo podem ser classificados em: a)
fatos naturais (ou fatos jurídicos stricto sensu); b) fatos humanos ou atos jurídicos.
        Os fatos naturais, por sua vez, podem ser: a) ordinários, como o nascimento, a
morte, a maioridade, etc; b) extraordinários que seria o caso fortuito e a força maior.
        Os fatos humanos, atos jurídicos, i.é, as ações humanas que criam, modificam,
transferem ou extinguem direitos, por sua vez, podem ser: a) lícitos; b) ilícitos.
        Lícitos são os atos humanos a que a lei defere os efeitos almejados pelo agente.
Praticados em conformidade com o ordenamento jurídico, produzem efeitos jurídicos
voluntários, queridos pelo agente. No âmbito Cível existe o amplo terreno da licitude, ou
seja, tudo o que a lei não proíbe torna-se lícito.
        Ilícitos são os atos jurídicos praticados em desconformidade com o prescrito no
ordenamento jurídico. Em vez de direitos, criam deveres e obrigações. Importante é que
hoje em dia, admite-se que os atos ilícitos integrem a categoria dos atos jurídicos por
definição do art. 186 e pelos efeitos que produzem, gerando a obrigação de reparar o dano,
a teor do art. 927.
        Os atos lícitos ainda se dividem em: a) ato jurídico em sentido estrito ou atos
meramente lícitos; b) negócios jurídicos e c) ato-fato jurídico. Nos dois primeiros exige-se
a manifestação da vontade.
        No negócio jurídico a ação humana visa diretamente a alcançar um fim prático
permitido na lei, razão por que exige-se uma vontade qualificada, sem vícios. São os
contratos e as declarações unilaterais de vontade.
        Nos atos meramente lícitos o efeito da manifestação da vontade já está
predeterminado na lei, como ocorre com a notificação que constitui em mora o devedor, o
reconhecimento de um filho, a tradição, não havendo por isso qualquer dose de escolha da
categoria jurídica. Perceba que a ação humana se baseia não numa vontade qualificada, mas
em simples intenção como quando alguém fisga um peixe, dele se tornando proprietário
graças ao instituto da ocupação.
        No ato-fato jurídico ressalta-se a consequência do ato, o fato resultante, sem se
levar em consideração a vontade de praticá-lo. O efeito do ato, muitas vezes, não é
buscado nem imaginado pelo agente, mas decorre de uma conduta e é sancionado pela lei,
como é o caso de uma pessoa que acha casualmente um tesouro, tornando-se, mesmo sem
querer proprietário de sua metade, por força do art. 1.264, mesmo que essa pessoa seja um
absolutamente incapaz, por exemplo.
       A expressão atos-fatos jurídicos foi divulgada por Pontes de Miranda referindo-se
a essas situações em que a lei encara os fatos sem levar em consideração a vontade, a
intenção ou a consciência do agente. Por essa razão é válido o contrato de compra e venda
de um bombom por uma criança absolutamente incapaz, por exemplo, ou um louco que
achando um tesouro se tornará proprietário de sua metade, independentemente de sua
vontade ou de sua incapacidade.



         NEGÓCIO JURÍDICO – a expressão negócio jurídico não é empregada no Código
Civil no sentido comum de operação ou transação comercial, mas sim como uma das espécies
em que se subdividem os atos jurídicos lícitos.
         Todos os doutrinadores são unânimes ao afirmar que a expressão negócio jurídico
surgiu com o BGB (Código Civil Alemão), contudo no CC/1916, Beviláqüa ainda optou pela
orientação francesa com a concepção pelo ato jurídico. Somente no CC/2002 houve a
adoção explícita da teoria do negócio jurídico.
         Segundo Francisco Amaral “negócio jurídico deve-se entender a declaração da
vontade privada destinada a produzir efeitos que o agente pretende e o direito reconhece.
Tais efeitos são a constituição, modificação ou extinção de relações jurídicas, de modo
vinculante, obrigatório para as partes intervenientes”. Assim, o negócio jurídico é meio de
realização da autonomia privada, sendo o contrato o seu principal símbolo.
         É bem verdade que a autonomia privada já não mais possui o mesmo caráter
individualista que norteou o CC/1916. O novo Código possui escorreita orientação social,
cujos princípios foram traçados pela CF/88, principalmente no que tange à função social da
propriedade e ao respeito e dignidade da pessoa humana (adotando o CC/2002 o princípio
da função social dos contratos).
         Fácil é dita percepção quando estudamos o art. 421 ou o 422, ambos do CC/2002,
que diversas vezes comentamos em sala de aula.

        Finalidade negocial – como dito, no negócio jurídico a manifestação da vontade
possui finalidade negocial que abrange a aquisição, conservação, modificação ou extinção de
direitos. Assim, vejamos:

        Aquisição de direitos – ocorre a aquisição de direitos com a sua incorporação ao
patrimônio do titular. Pode ser originária ou derivada.
        Originária ocorre quando não existe qualquer interferência do anterior titular.
Ocorre na ocupação de coisa sem dono, na usucapião, na avulsão, etc.
        Derivada ocorre a devida transferência de um direito a uma outra pessoa. Perceba
que nesse caso o direito é adquirido com todas as qualidades ou defeitos do título anterior,
pois ninguém pode transferir mais direitos do que possui (nemo plus juris ad alterum
transfere potest quam ipse habet).
        A aquisição de direitos pode ser ainda a título gratuito (quando só o adquirente
aufere vantagens, como a sucessão) ou oneroso (quando se exige do adquirente uma
contraprestação, como na compra e venda).
        Quanto à sua extensão pode a aquisição de direitos se dar a título singular, que
ocorre no tocante a determinados bens, ou a título universal, quando o adquirente sucede o
seu antecessor na totalidade de seus direitos. A aquisição de direitos a título singular, por
sua vez, pode ser por ato inter vivos ou causa mortis a depender do momento de ocorrência
de seus efeitos.
         Os direitos ainda se diferem entre atuais e futuros. Atuais são os completamente
adquiridos, futuros os cuja aquisição não se acabou de operar.
         Assim, atual é o direito subjetivo já formado e incorporado ao patrimônio de seu
titular, podendo se por ele livremente exercido. Direito futuro é o que ainda não se
constituiu. Dentre os futuros ainda separamos os já deferidos dos não deferidos
         Direito deferido é aquele cuja aquisição depende somente do arbítrio do sujeito, ou
seja, ainda não se incorporaram ao patrimônio do adquirente porque ele ainda não quis, mas
poderão incorporar-se a qualquer momento, pois depende exclusivamente de seu arbítrio. É
o que sucede com o direito de propriedade, v.g., quando a sua aquisição depende tão
somente do registro do título aquisitivo.
         Direito não deferido são direitos futuros que se subordinam a fatos ou condições
falíveis, ou seja, são aqueles que não se incorporara e talvez nem se incorporem ao
patrimônio do adquirente por razões que são alheias a sua vontade. A eficácia de uma
doação já realizada pode depender de um fato futuro falível, como um casamento do
donatário, por exemplo.
         Algumas vezes, é bem verdade que o direito se forma de forma gradativa. Assim,
haveria uma fase preliminar em que há apenas uma esperança ou possibilidade de que esse
direito venha a ser adquirido, a situação é de expectativa de direito. Trata-se de mera
esperança de vir a adquirir um direito. Frise-se como exemplo a mera possibilidade que têm
os filhos de suceder a seus pais quando estes morrerem.
         Quando encontra-se ultrapassada a fase preliminar e o direito se acha inicial e
parcialmente formado, surge o direito eventual, ou seja, já existe um interesse ainda que
embrionário ou incompleto. É pois um direito já concebido, mas ainda não nascido, pois
falta-lhe um elemento básico, sendo mais do que uma expectativa de fato. Como exemplo
podemos citar a aceitação de uma proposta de compra e venda ou o exercício do direito de
preferência.
         OBS: Sílvio Rodrigues coloca o exemplo acima como direito eventual e não
expectativa de direito, pois, segundo ele, os herdeiros, se tudo ocorrer como esperado,
receberão a herança.
         Na terceira situação de avanço para a concretização do direito encontramos o
direito condicional, pois este já se encontra plenamente constituído, porém sua eficácia
(guarde bem o termo) depende do implemento da condição estipulada, de um evento futuro
e incerto. O art. 130 do CC/2002 emprega a expressão direito eventual no sentido genérico
do termo, abrangendo o direito condicional, quando aduz que “ao titular de direito eventual,
nos casos de condição suspensiva ou resolutiva, é permitido praticar os atos destinados a
conservá-lo”.

        Conservação de direitos – para resguardar ou conservar seus direitos o titular, às
vezes, necessita tomar certas medidas preventivas ou repressivas.
        As medidas de caráter preventivo visam garantir o direito contra futura violação.
Podem ser de natureza extrajudicial (garantias pessoais ou reais) e judiciais (arresto,
sequestro, caução, busca e apreensão, etc)
        As medidas de caráter repressivo visam restaurar o direito violado. A pretensão é
deduzida em juízo por meio da ação, pois a lei não excluirá da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça a direito.
        A defesa privada ou autotutela só é admitida excepcionalmente, pois pode conduzir
a excessos. É prevista na legítima defesa, no exercício regular de um direito, no estado de
necessidade, na proteção possessória, etc.
Modificação de direitos – os direitos subjetivos nem sempre conservam as
características iniciais e permanecem inalterados durante sua existência. Podem sofrer
mutações quanto ao seu objeto, quanto às pessoas, pois a manifestação da vontade com
finalidade negocial pode objetivar a aquisição, conservação e também a modificação de
direitos.
        A modificação dos direitos pode ser objetiva ou subjetiva.
        É objetiva quando diz respeito ao seu objeto; será subjetiva quando concerne à
pessoa do seu titular, podendo dar-se inter vivos ou causa mortis. Certos direitos, por
serem personalíssimos, constituídos intuitu personae, são insuscetíveis e modificação
subjetiva, como sucede com os direitos de família puros.

        Extinção de direitos – o direito pode extinguir-se quando houver: o perecimento do
objeto, alienação, renúncia, abandono, falecimento do titular de direito personalíssimo,
prescrição, decadência, confusão, implemento de condição resolutiva, escoamento de prazo,
perempção e desapropriação.
        Nem todas as causas apontadas podem ser consideradas negócio jurídico, pois
muitas delas decorrem da lei e de fatos alheios à vontade das partes, como o perecimento
do objeto provocado por um raio e a desapropriação.



       PRESSUPOSTOS DE EXISTÊNCIA DO NEGÓCIO JURÍDICO – os pressupostos
de existência do negócio jurídico são os seus elementos estruturais. Optamos pelos
seguintes: declaração de vontade, a finalidade negocial e a idoneidade do objeto. Assim,
faltando qualquer desses requisitos, o negócio jurídico inexiste.

        Declaração de vontade – a vontade é pressuposto básico de todo negócio jurídico e
é imprescindível que se exteriorize. A vontade interna, como a reserva mental, é
indiferente para o direito, pois não houve a sua exteriorização.
        A vontade é um elemento de caráter subjetivo, que se revela através da declaração.
Esta, portanto, e não aquela, constitui requisito de existência do negócio jurídico.
        Assim, pelo princípio da obrigatoriedade dos contratos, a vontade uma vez
manifestada, obriga o contratante (pacta sunt servanda), significando que o contrato faz
lei entre as partes não podendo, em tese, ser modificado pelo Judiciário. Em oposição a
este princípio, temos a lei contratos ou da onerosidade excessiva, baseada na teoria da
imprevisão que autoriza o recurso ao Judiciário para se pleitear a sua revisão.
        A manifestação da vontade pode ser expressa, tácita ou presumida.
        Expressa é a que se realiza por meio da palavra, falada ou escrita, e de gestos,
sinais ou mímicas, sempre de modo explícito, possibilitando o imediato conhecimento do
agente.
        Tácita é a declaração da vontade que se revela pelo comportamento do agente, pois
comumente se deduz de uma pessoa a sua intenção. É a pessoa que não diz se aceita a
doação de um carro, mas passa a usá-lo como se fosse seu. Frise-se que nos contratos a
manifestação da vontade somente pode ser tácita quando a lei não exigir que seja expressa.
        Presumida é quando a declaração não é realizada pelo agente, mas a lei deduz,
passado certo lapso de tempo, que ela foi emitida. Como exemplo temos as presunções de
pagamento previstas nos arts. 322, 323 e 324, ou entendendo-se que, findo o prazo sem
manifestação, terá o mesmo declarado sua vontade de forma presumida.
A manifestação tácita da presumida diferem-se porque esta será sempre
estabelecida em lei, enquanto que aquela será deduzida do comportamento do agente. As
presunções legais são juris tantum, ou seja, admitem prova em contrário.
         O silêncio como manifestação da vontade – em regra o provérbio “quem cala
consente” não se aplica ao direito, pois o silêncio nada significa, por constituir total
ausência de manifestação de vontade e, como tal, não produzir efeitos. Todavia, em
situações excepcionais, o silêncio poderá possuir algum significado.
         Assim, o art. 111 aduz que “o silêncio importa anuência, quando as circunstâncias e
os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de vontade expressa.”
         Portanto, o silêncio pode ser interpretado como manifestação tácita de vontade
quando a lei conferir a ele tal efeito, cabendo ao juiz examinar caso a caso, para verificar
se o silêncio traduz ou não a manifestação da vontade.

         Reserva mental – ocorre reserva mental quando um dos declarantes oculta a sua
verdadeira intenção, ou seja, quando não quer um efeito jurídico que declara querer. Tem
por objetivo enganar o outro contratante, mas se este não sabe da reserva, o ato subsiste
e produz os efeitos que o declarante não desejava.
         Assim, a reserva, isto é, o que se passa na cabeça do declarante, é um indiferente
para o mundo jurídico e irrelevante no que se refere à validade e eficácia do negócio
jurídico
         Pelo art. 110 percebe-se que a manifestação de vontade subsiste ainda que o seu
autor haja feito a reserva mental de não querer o que manifestou, salvo se dela o
destinatário tinha conhecimento”.

        Finalidade negocial – a finalidade negocial é o propósito de adquirir, conservar,
modificar ou extinguir direitos. Sem essa intenção, a manifestação de vontade não
caracteriza um negócio jurídico, podendo ser, dependendo do caso, um ato jurídico em
sentido estrito.
        A existência de um negócio jurídico, portanto, consiste no exercício da autonomia
privada. Há um poder de escolha da categoria jurídica. Permite-se que a vontade negocial
proponha, dentre as espécies, variaçoes quanto a intensidade de cada uma.

        Idoneidade do objeto – Imagine se a intenção das partes é celebrar um contrato de
mútuo. Diante de tal desiderato, é impossível que o objeto seja infungível, pois é da
essência do contrato de mútuo que o mesmo recaia sobre um bem fungível.
        Para a constituição de uma hipoteca, é necessário que o bem seja imóvel, ou se
trate de um navio ou de um avião. Os demais bens serão inidôneos para a celebração de tal
negócio.
        Desta forma, o objeto jurídico deve ser idôneo, isto é, deve apresentar os
requisitos ou qualidades que a lei exige para que o negócio produza os efeitos desejados.



        REQUISITOS DE VALIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO – para que o negócio
jurídico produza efeitos, possibilitando a aquisição, modificação, conservação e extinção de
direitos, deve preencher certos requisitos, apresentados como os de sua validade.
        Assim, são requisitos, de caráter geral, de validade do negócio jurídico:
        a) agente capaz;
        b) objeto lícito;
        c) forma prescrita ou não defesa em lei.
Os requisitos podem ser específicos a determinados negócio como, por exemplo, a
res, pretius et consensus na compra e venda.

         Capacidade do agente – a capacidade do agente (condição subjetiva) é a aptidão
para intervir em negócios jurídicos como declarante ou declaratário. Trata-se da
capacidade de fato ou de exercício, necessária para que uma pessoa possa exercer, por si
só, os atos da vida civil.
         Pelo novo CC/2002 a capacidade plena é adquirida pelo indivíduo ao completar 18
anos de idade ou com a emancipação (art. 5º). A incapacidade, por sua vez, é a restrição
legal ao exercício da vida civil e pode ser de duas espécies: absoluta e relativa.
         A incapacidade absoluta acarreta a proibição total do exercício, por si só, do
direito, sob pena de nulidade (art. 166, I)
         A incapacidade relativa acarreta a anulabilidade do ato, salvo em hipóteses
especiais (arts. 228, 666, 1.860, etc).
         Perceba que a declaração de vontade é elemento necessário à existência do negócio
jurídico, enquanto a capacidade é requisito necessário à sua validade e eficácia, bem como
ao poder de disposição do agente.
         Objeto lícito, possível, determinado ou determinável – a validade do negócio
jurídico requer ainda objeto lícito, possível e determinado ou determinável (condição
objetiva).
         Objeto lícito é aquele que não atenta contra a lei, a moral ou os bons costumes.
Quando o negócio jurídico é imoral, os tribunais por vezes aplicam o princípio do direito de
que ninguém pode valer-se de sua própria torpeza, nemo auditur propiam turpitudinem
allegans, ou então o brocardo in pari causa turpitudinis cessat repetitio, em que se ambas
as partes no contrato, agem com torpeza, não pode qualquer delas pedir a devolução do que
pagou.
         O objeto deve, também, ser possível, pois quando impossível o negócio jurídico é
nulo. A impossibilidade do objeto pode ser física ou jurídica.
         Impossibilidade física é a que emana de lei física ou naturais. A obrigação de
colocar toda a água do oceano em um copo d’água, por exemplo. A impossibilidade deve ser
absoluta, pois em se tratando de relativa, ou seja, aquela que atinge somente o devedor mas
não outras pessoas, não constitui obstáculo ao negócio jurídico.
         A impossibilidade jurídica ocorre quando o ordenamento jurídico proíbe,
expressamente, negócios a respeito de determinado bem, como os pacta corvina (herança
de pessoa viva) ou a alienação de bens fora do comércio.
         Por fim, deve o objeto do negócio jurídico ser determinado (ou ao menos
determinável).
         Admite-se, contudo, a venda de coisa incerta, indicada ao menos pelo gênero e
qualidade (art. 243) ou a venda alternativa, cuja indeterminação cessa com a escolha ou
concentração (art. 252).

        Forma – o terceiro requisito de validade do negócio jurídico é a forma que é o meio
de revelação da vontade.
        Existem dois sistemas no que tange à prova como requisito de validade do negócio
jurídico: o consensualismo, da liberdade das formas e o formalismo, ou de forma
obrigatória.
        No direito brasileiro a forma é, em regra, livre. As partes podem celebrar o
contrato por escrito, público ou particular, ou verbalmente, a não ser nos casos em que a
lei, para dar maior segurança e seriedade ao negócio, exija a forma escrita, pública ou
particular.
REQUISITOS DE EFICÁCIA DO NEGÓCIO JURÍDICO – além dos elementos
estruturais e essenciais, que constituem requisitos de existência e validade do negócio
jurídico, pode este conter outros elementos meramente acidentais, introduzidos
facultativamente pela vontade das partes, não necessários à sua existência. Uma vez
convencionados (desde que não ofendam a ordem pública) possuem o mesmo valor dos
elementos estruturais e essenciais, pois passam a integrá-lo de forma indissociável.
        São a condição, o termo e o encargo.



        CONDIÇÃO – Condição é o acontecimento futuro e incerto de que depende a
eficácia do negócio jurídico. Da sua ocorrência depende o nascimento ou a extinção de um
direito. Seu conceito encontra-se, hoje, no art 122 do CC. Perceba que a lei refere-se a
condição é aquela que derive exclusivamente da vontade das partes, afastando as condições
impostas por lei (condiciones juris).

        Elementos da condição – os elementos da condição são: a voluntariedade; a
futuridade e a incerteza.
Quanto à voluntariedade as partes devem querer e determinar o evento, pois se a eficácia
do negócio jurídico for determinada por lei, não haverá condição, mas conditio juris.
        Quanto à futuridade perceba que em se tratando de fato passado ou presente,
ainda que ignorado, não se considera condição. Veja o exemplo: prometo determinada
quantia se meu bilhete tiver sido premiado no sorteio de ontem (não existe condição, pois
ou o bilhete já foi premiado e a obrigação é pura e simples, ou o bilhete não o foi e a
declaração é ineficaz). São as erroneamente denominadas condições impróprias.
        Quanto à incerteza o evento pode, objetivamente, realizar-se ou não. Exemplo:
pagarei a dívida se tiver lucro na colheita. Assim, se o fato for futuro, mas certo, como a
morte por exemplo, não teremos condição, mas sim termo.

        Negócios jurídicos que não admitem condição – as condições são admitidas em
atos de natureza patrimonial, regra geral, com algumas exceções, como na aceitação e
renúncia de herança, mas não podem integrar os de caráter patrimonial pessoal, como os
direitos de família puros e os direito personalíssimos. Assim, não admitem condição, por
exemplo, o casamento, o reconhecimento de filhos, a adoção, a emancipação, etc.
Os atos que não admitem condição são chamados de atos puros. São eles:
        a)          os negócios jurídicos que, por sua função, inadmitem incerteza;
        b)          os atos jurídicos em sentido estrito
        c)          os atos jurídicos de família
        d)          os atos referentes ao exercício de direitos personalíssimos

       Classificação das condições

         Quanto à licitude – lícitas e ilícitas (art. 122 – todas as condições não contrárias à
lei, à ordem pública ou aos bons costumes são lícitas). Ilícitas são, por exemplo, a cláusula
de alguém mudar de religião, ou de matar alguém, ou entregar-se à prostituição.
         O CC nos artigos 122 e 123 proíbe expressamente as condições que privarem de
todo efeito o negócio jurídico (perplexas), as que o sujeitarem ao puro arbítrio de uma das
partes (meramente potestativas), as física ou juridicamente impossíveis e as
incompreensíveis ou contraditórias.
Quanto à possibilidade – possíveis e impossíveis (art. 124 – têm-se por inexistentes
as condições impossíveis, quando resolutivas, e as de não fazer coisa impossível). No
exemplo clássico: dar-te-ei R$ 100,00 se tocares o céu com o dedo.
        Repito: se a condição for resolutiva, ter-se-á como inexistente, somente a condição
e não o negócio jurídico. Assim, se digo “o comodato se dará até o dia em que tocares o céu
com o dedo”, o contrato de empréstimo será válido e a condição tida como inexistente, por
impossível.
        Temos também as condições juridicamente impossíveis, ou seja, aquela que esbarra
em condição expressa do ordenamento jurídico como, v.g., a condição estabelecida em
adotar pessoa da mesma idade (impossível por força do art. 1.619 do CC/2002).
        As condições de não fazer coisa impossível são inexistentes porque não prejudicam
o negócio, por falta de seriedade. Ora, se é impossível a condição, é porque não posso fazê-
la.
        Diversa é a solução do Código quando as condições impossíveis são suspensivas, pois:
        Art. 123. Invalidam os negócios jurídicos que lhes são subordinados:
        I – as condições física ou juridicamente impossíveis, quando suspensivas;
        II - As condições ilícitas, ou e fazer coisa ilícita;
        III – as condições incompreensíveis ou contraditórias.
        Assim, quando a condição é suspensiva a eficácia do contrao está a ela subordinada.
Se o evento é impossível, o negócio jamis alcançará a necessária eficácia.

        Quanto à fonte de onde promanam – casuais, potestativas e mistas.
        Casuais são aquelas que dependem do acaso, do fortuito, de fato totalmente alheio
à vontade das partes. No exemplo, entregarei a você a quantia de R$ 1.000,00, se chover
amanhã, a cláusula é casual
        Potestativas são aquelas que decorrem da vontade ou do poder de uma das partes,
que pode provocar ou impedir a sua ocorrência. AS condições potestativas dividem-se em
puramente potestativas e potestativas simples.
        As puramente potestativas são consideradas ilícitas pelo Código que inclui entre as
condições defesas aquelas que se sujeitem ao puro arbítrio de uma das partes (art. 122). É
a denominada cláusula si voluero (se me aprouver).
        As simplesmente potestativas são válidas porque não depende somente do arbítrio
da vontade de uma das partes, mas também de algum acontecimento ou circunstância
externa que escapa ao seu controle. Por exemplo: ganharás um carro se fores a Roma. Ora,
o fato de ir a Roma não depende somente da vontade das partes, mas também da obtenção
de tempo e de dinheiro (principalmente).
São exemplos de condições simplesmente potestativas os artigos 420, 505, 509 e o 513,
por exemplo.
        Mistas são condições que dependem simultaneamente da vontade das partes e da
vontade de um terceiro. Exemplos: dar-te-ei um dinheiro se casares com determinadas
pessoa ou se constituíres sociedade com fulano de tal.

        Quanto ao modo de atuação – a condição, sob esta lente, pode ser suspensiva ou
resolutiva.
        Suspensiva é aquela que impede que o ato produza efeitos até a realização do
evento futuro e incerto
        Resolutiva é aquela que resolve o direito transferido pelo negócio, ocorrido o evento
futuro e incerto.
Por fim, as condições ainda podem ser consideradas sob três estados: pendentes
(quando ainda não ocorreu), verificada a ocorrência dá-se o implemento e não realizada
ocorre a frustração.



        TERMO – termo o dia ou o momento em que começa ou se extingue a eficácia do
negócio jurídico, podendo ter como unidade de medida a hora, o dia, o mês ou o ano. Termo
convencional é, portanto, a cláusula contratual que subordina a eficácia do negócio jurídico
a evento futuro e certo.
Assim, aduz o art. 131 que o termo inicial suspende o exercício, mas não a aquisição do
direito. Ora, o termo não suspende a aquisição do direito por ser evento futuro, mas dotado
de certeza. Difere da condição, que subordina, como vimos, a eficácia do negócio a evento
futuro e incerto (que pode nem acontecer). Assim, o titular do direito a termo pode, com
maior razão, exercer sobre ele atos conservatórios.
        Pode ocorrer a conjugação da condição e do termo no mesmo negócio jurídico.
Assim, v.g., “dou-te um consultório se te formares em medicina até os 25 anos”.
        Determinados negócios não admitem termo, como a aceitação ou renúncia de
herança, a adoção, a emancipação, etc.

         Espécies – Termo convencional é inserido no contrato pela vontade das partes;
Termo de direito é o que decorre da lei; Termo de graça é a dilação de prazo concedida ao
devedor.
         Pode o termo, apesar de certo, não existir data certa, como no exemplo:
determinado bem passará a pertencer a tal pessoa a partir da morte do proprietário
(perceba que a morte é certa, porém a data incerta). Assim, pode o termo ainda ser
dividido em certo e incerto.
         Existe também o termo inicial ou suspensivo (dies a quo) e final ou resolutivo (dies
ad quem). Pode um contrato de locação ser celebrado para ter vigência a partir de
determinada data (termo inicial) ou ser estipulado com prazo certo de término (termo
final). Relembre-se que o termo inicial suspende o exercício, mas não a aquisição do direito.



         ENCARGO OU MODO – o encargo pode ser definido como uma determinação que,
imposta pelo autor da liberalidade, a esta adere, restringindo-a. Trata-se de cláusula
acessória às liberalidades (doação, testamento, etc), pela qual se impõe uma obrigação ao
beneficiário. Não pode ser aposta em negócio a título oneroso, pois equivaleria a uma
contraprestação.
         São exemplos de encargo as doações de terrenos feitas a um determinado município
com a obrigação (com o encargo) de ali ser construída uma creche, ou uma escola, ou um
ginásio, geralmente com o nome do doador. Outro exemplo seria a deixa de alguma herança
a alguém com a obrigação de cuidar de determinada pessoa ou de algum animal.
         A principal característica do encargo é a sua obrigatoriedade, podendo, inclusive, o
seu cumprimento ser exigido por meio da ação cominatória, a teor do art. 553 do CC.
         O terceiro porventura beneficiado também poderá exigir o cumprimento do encargo
(também o instituidor), mas não poderá ingressar com ação revocatória (revogando a
liberalidade), pois esse tipo de ação é privativa do instituidor. O Ministério Público, caso
haja relevância na liberalidade, também poderia ingressar com ação revocatória, porém só
após a morte do instituidor.
         O encargo difere da condição suspensiva porque esta impede a aquisição do direito,
enquanto aquele não suspende a aquisição nem o exercício do direito.        Perceba         a
distinção: para a condição emprega-se a partícula se; para o encargo emprega-se a
expressão para que ou com a obrigação de.
         Difere também da condição resolutiva porque não conduz, por si só à revogação do
ato. O instituidor do benefício poderá ou não propor ação revocatória, cuja sentença não
terá efeito retroativo.
         O encargo ilícito ou impossível, salvo se constituir o motivo determinante da
liberalidade, considera-se não escrito (art. 137).
         Assim, por exemplo, se a doação de um imóvel é feita para que o donatário nele
mantenha casa de prostituição (atividade ilícita), sendo este o motivo determinante da
liberalidade, todo o negócio jurídico será invalidade.



         DOS DEFEITOS DO NEGÓCIO JURÍDICO
         Introdução – Já vimos que a declaração de vontade é elemento estrutural ou
requisito de existência do negócio jurídico.
Após a análise da existência, temos que perscrutar acerca da validade do negócio jurídico.
Assim, para ser válido é necessário que a vontade manifestada (requisito de existência)
seja livre e espontânea.
Inicialmente, vamos analisar, dentro do contexto da validade, as hipóteses em que a
vontade se manifesta com algum vício que torne o negócio jurídico anulável. O CC/2002
menciona e regula seis defeitos: erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão (vícios de
consentimento) e fraude contra credores (vício social)1.
         Por fim, ressalte-se que o prazo decadencial para pleitear-se a anulação do negócio
jurídico eivado pelos vícios suso mencionados é de quatro anos, a teor do art. 178, II, do
CC/2002.
         Vejamos, portanto, cada um dos vícios de per si.



        DO ERRO OU IGNORÂNCIA
        O erro consiste em uma falsa representação da realidade, sendo que nesta
modalidade o agente se engana só. Quando o agente é induzido em erro pelo outro
contratante o por terceiro, temos a figura do dolo.
        Diante disso, perceba que poucas são as ações anulatórias ajuizadas com base no
erro, porque se torna difícil penetrar do âmago, no íntimo do autor para descobrir o que se
passou em sua mente no momento da celebração do negócio. O dolo, por outro lado, se torna
mais fácil, pois o induzimento foi exteriorizado, ou seja, pode ser comprovado e auferido
objetivamente.
        Erro é a ideia falsa da realidade; ignorância é o completo desconhecimento da
realidade. Num e noutro caso, o agente é levado a praticar o ato ou a realizar o negócio que
não celebraria por certo, ou que praticaria em circunstâncias diversas, se estivesse
devidamente esclarecido. O CC/2002 equiparou as duas expressões, conduzido às mesmas
consequências, ou seja, à anulabilidade.

       Espécies – diversas são as modalidades de erro. Umas levam à anulabilidade, outras
não, sendo irrelevantes, acidentais, portanto. A mais importante distinção é a que divide,
portanto, o erro em substancial e acidental.




1 Lembrem-se que hoje em dia o vício social da simulação torna o ato jurídico nulo e não mais anulável.
Erro substancial e erro acidental – como dito, não é qualquer espécie de erro que
torna anulável o negócio jurídico. Para tanto deve ser substancial, escusável e real.
        Erro substancial é aquele que recai sobre circunstâncias e aspectos relevantes do
negócio. Deve ser a causa determinante, ou seja, se fosse conhecida a realidade o negócio
não seria celebrado.
        Acidental, por sua vez, é o erro que se refere a circunstâncias de somenos
importância e que não acarretam prejuízo efetivo. Assim, mesmo conhecida a realidade, o
negócio se realizaria.
        Pelo CC/2002 temos a dicção do art. 143 quando expressamente aduz que “o erro
de cálculo apenas autoriza a retificação da declaração da vontade”. Como exemplo temos
quando a parte fixa o preço final da venda com base na quantia unitária e computa, de
forma inexata, o preço global. Temos aí o erro de cálculo que, por ser acidental, não invalida
o negócio, simplesmente permite a sua retificação
        Não deixou o legislador conceitos vagos sobre a definição do erro substancial. Ao
contrário, enunciou-os no art. 139, verbis:
        “Art. 139. o erro é substancial quando:
        I – interessa à natureza do negócio, ao objeto principal da declaração, ou a alguma
das qualidade a ele essenciais;
        II – concerne à identidade ou à qualidade essencial da pessoa a quem se refira a
declaração de vontade, desde que tenha influído nesta de modo relevante;
        III – sendo de direito e não implicando recusa à aplicação da lei, for o motivo único
ou principal do negócio jurídico”
        Assim, temos:
        a) erro sobre a natureza do negócio (error in negotio) – é aquele em que uma das
partes manifesta a sua vontade pretendendo e supondo celebrar determinado negócio
jurídico e, na verdade, realiza outro diferente. (Ex: quer alugar e escreve vender; quer
vender e a outra parte entende que houve doação, etc)
        b) erro sobre o objeto principal da declaração (error in corpore) – é aquele que
incide sobre a identidade do objeto. A manifestação da vontade recai sobre objeto diverso
daquele que o agente tinha em mente. (Ex: o adquirente que pensa estar adquirindo um
imóvel muito valorizado, pois localizado na Rua X, quando descobre que trata-se de um
imóvel desvalorizado, na periferia, na rua de mesmo nome; a pessoa que adquire um quadro
de um aprendiz, pensando tratar-se de um pintor famoso; a pessoa que se propõe a alugar
sua casa na cidade e o outro contratante entende tratar-se de sua casa de praia, etc).
        c) erro sobre alguma das qualidades essenciais do objeto principal (error in
substantia ou error in qualitate) – ocorre quando o motivo determinante do negócio é a
suposição de que o objeto possui uma determinada qualidade que, posteriormente, verifica
não existir. Veja que o erro não recai sobre a identidade do objeto, que é o mesmo que se
encontrava no pensamento do agente, mas aquele objeto não possui as qualidades que este
reputava essenciais e que influíram na decisão de realizar o negócio. (Ex: os famosos
candelabros prateados que o agente adquire pensando ser de prata; a pessoa que adquire
um quadro por alto preço, pensando tratar-se de um original quando , em verdade, é mera
cópia; o agente que compra um relógio dourado pensando tratar-se de relógio de ouro, etc).
        d) erro quanto à identidade ou à qualidade da pessoa a quem se refere a
declaração da vontade (error in persona) – são aqueles negócios intuitu personae, sendo
tanto da identidade quanto das qualidades da pessoa. (Ex: doação ou testamento a pessoa
que supõe ter salvo a sua vida; casamento de uma jovem de boa formação com um indivíduo
que se sabe depois ser um desclassificado, etc)
        OBS – para ser invalidante é necessário que o erro tenha influído na declaração da
vontade de modo relevante (art. 139, II)
OBS2 – pelo art. 142 o erro de indicação da pessoa ou da coisa a que se referir a
declaração da vontade não viciará o negócio se puder identificar a coisa ou a pessoa
cogitada. (Ex: o doador beneficia seu sobrinho Antônio quando na realidade não possui
nenhum sobrinho, mas sim um primo de nome Antônio; ou a doação de um quadro, quando na
verdade é uma escultura, etc).
        e) erro de direito (error juris) – é o falso conhecimento ou a ignorância da norma
jurídica aplicável à situação concreta, desde que seja o motivo único ou principal do negócio
jurídico e não implique recusa à aplicação da lei (art. 139, III). (Ex: pessoa que contrata
importação de determinada mercadoria ignorando existir lei que proíba tal importação.
Assim, como tal ignorância foi a causa determinante do ato, pode ser alegada para anular o
contrato, sem com isso se pretender que a lei seja descumprida).

        Erro substancial e vício redibitório – embora a teoria dos vícios redibitórios ou
vícios ocultos (artigos 441 a 446) se assente na existência de um erro e guarde
semelhanças com a teoria do erro quanto às qualidades essenciais do objeto, os dois
institutos não se confundem.
        O vício redibitório é erro objetivo sobre a coisa que contém um defeito oculto. O
seu fundamento é a obrigação que a lei impõe a todo alienante, nos contratos comutativos,
de garantir ao adquirente o uso da coisa. Uma vez existente o defeito são cabíveis as
chamadas ações edilícias (redibitória e quanti minoris ou estimatória), sendo decadencial e
exíguo o prazo para a propositura da ação (regra geral, 30 dias tratando-se de bens móveis,
um ano de imóvel).
        O erro quanto às qualidades essenciais do objeto é subjetivo, ou seja, reside na
manifestação da vontade do agente. Dá ensejo à anulação anulatória, como já vimos, com
prazo decadencial de 04 anos. Assim, se alguém adquire um relógio que não funciona, em
virtude da inexistência de uma peça interna é vício redibitório, porém se o mesmo relógio
parecia ser de ouro, mas não é trata-se de vício redibitório.
        Perceba, por fim, que no vício redibitório o objeto não possui as mesmas
características que seus similares,uma vez que está com um vício, enquanto que no erro
essencial todos os objetos possuem as mesmas características, porém a mesma não foi
assimilada pelo adquirente.

        Erro escusável – é o erro justificável, ou seja, inevitável. Por ser inevitável, a lei me
escusa, me perdoa. Assim, erro escusável = erro inevitável.
        Pelo art. 138 percebe-se de forma cristalina que para pleitear-se a anulação do
negócio jurídico deverá o erro ser escusável, pois somente é anulável o erro “que poderia
ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio”.
        Assim, adota o Código o padrão do homem médio para a aferição da escusabilidade,
entendendo alguns doutrinadores que dependendo do caso, pode ainda analisar o caso
concreto, considerando as condições pessoais de quem alega o erro, apesar d disposição
legal.
        Permissa venia, entendo que hoje em dia, a teor do art. 138 a aferição da
escusabilidade se dá pelo padrão do homem médio e não mais diante do caso concreto. Mas
segundo Carlos Roberto Gonçalves “muito provavelmente, malgrado a adoção do padrão
abstrato do homem médio pelo novo estatuto civil, sob a justificativa de proteger melhor o
terceiro de boa-fé, a jurisprudência continuará aplicando o critério objetivo, que permite
ao juiz fazer justiça no caso concreto”.
Erro real – o erro, para fins de anulação de negócio jurídico, não basta que seja
substancial e escusável. Deverá ser também real, ou seja, tangível, palpável, importando
efetivo prejuízo para o interessado.
        Assim, o erro de fabricação de um determinado veículo é substancial e real, pois se
o adquirente tivesse conhecimento da realidade não o teria comprado. Por outro lado, se o
erro dissesse respeito à cor do veículo (preto em vez de azul-escuro, v.g), não seria real,
pois seria irrelevante para a fixação do preço, não tornando o negócio anulável.

       O falso motivo – o novo CC/2002 substituiu a “falsa causa” por “falso motivo”.
Assim, “o falso motivo só vicia a declaração de vontade quando expresso como razão
determinante”. Assim, o motivo do negócio, ou seja, as razões psicológicas que levam a
pessoa a realizá-lo, não precisa ser mencionado pelas partes.
       Ora, os motivos, as razões subjetivas, interiores, são consideradas sem relevância
para o direito. Em uma compra e venda por exemplo, pouco importa o motivo pelo qual o
comprador resolveu adquirir o produto, são estranhos ao direito e não precisam ser
mencionados.
       Agora, o motivo quando expresso como razão determinante poderá viciar o negócio
caso seja falso. Muito comum em certas liberalidades que o doador faça inserir o motivo
pelo qual o mesmo está realizando prefalada doação (filiação, parentesco, salvou a vida,
etc). Nestes casos, se os motivos alegados se revelam posteriormente falsos o contrato
poderá ser anulado.

        Transmissão errônea da vontade – o CC/2002 equipara o erro à transmissão
defeituosa da vontade, no art. 141 quando diz: “a transmissão errônea da vontade por meios
interpostos é anulável nos mesmo casos em que o é a declaração direta”.
        É quando o declarante se de mensageiro ou núncio ou por meio de comunicação
(telex, fax, e-mail, etc) e a transmissão da vontade, nesses casos, não se faz com
fidelidade, estabelecendo-se uma divergência entre o querido e o que foi transmitido
erroneamente (mensagem truncada), caracterizando o vício que propicia a anulação do
negócio.
        É bem verdade que a referida anulabilidade só se apresenta se a diferença emitida
e a comunicada seja derivada do mero acaso ou de algum equívoco, não incidindo quando o
intermediário intencionalmente comunica á outra parte uma declaração diversa da que lhe
foi confiada.
        Se a vontade foi mal transmitida pelo mensageiro há de se apurar se não houve
culpa in eligendo ou mesmo in vigilando do emitente das declarações. Se a resposta for
afirmativa, não pode tal erro infirmar o ato por ser inescusável.

        Convalescimento do erro – Dispõe o art. 144: “o erro não prejudica a validade do
negócio jurídico quando a pessoa, a quem a manifestação de vontade se dirige, se oferecer
para executá-la na conformidade da vontade real do manifestante”.
        Temos portanto a hipótese do princípio da conservação dos atos e negócios
jurídicos, segundo a qual não haverá nulidade sem prejuízo.
        Vejamos o seguinte exemplo: João pensa que comprou o lote 2 da quadra A, quando,
em verdade, adquiriu o lote 2 da quadra B. Pelo que já vimos, trata-se de erro substancial,
mas antes de anular o negócio o vendedor entrega-lhe o lote 2 da quadra A, não havendo
assim qualquer dano a João.
        Interesse negativo – questão tormentosa e não muito discutida na doutrina e
jurisprudência, diz respeito ao denominado interesse negativo.
Imagine a situação em que o vendedor é surpreendido por uma ação anulatória, por
sua vez, julgada procedente, com os consectários da sucumbência, sem que tenha
concorrido para o erro do comprador.
       Ora, perceba que tal situação se configura injusta, máxime já tenha dado
destinação ao numerário recebido. Segundo Venosa, “a anulação por erro redunda em
situação toda especial, ou seja, a responsabilidade é exatamente daquele que pede a
anulação do negócio, já que é o único responsável por sua má destinação”.
       Seria extremamente injusto que o contratante que não errou, nem concorreu para o
erro do outro, arcasse com duplo prejuízo. Ou seja, a anulação do negócio jurídico e a
absorção do prejuízo pelas importâncias pagas a serem devolvidas ou pagas, além da
sucumbência. Devem os juízes atentar para essa importante particularidade ao decretar a
anulação do negócio por erro.



        DO DOLO
        Dolo é o artifício ou expediente astucioso, empregado para induzir alguém à prática
de uma ato que o prejudica e aproveita ao autor do dolo ou a terceiro. Consiste em
sugestões ou manobras maliciosamente levadas a efeito por uma parte, a fim de conseguir
da outra uma emissão de vontade que lhe traga proveito ou a terceiro.
        A diferença entre o dolo e o erro é que este é espontâneo, no sentido de que a
vítima se engana só, enquanto que o dolo é provocado intencionalmente pela outra parte ou
por terceiro, fazendo com que aquele também se equivoque.
        Frise-se que o dolo civil não se confunde com o dolo criminal (intenção de praticar o
feto que se sabe contrário à lei). Dolo civil tem sentido bem mais amplo, pois é todo
artifício empregado para enganar alguém.
        Já salientamos que muito mais fácil é provar o dolo, uma vez que o mesmo se
exterioriza. Enquanto que o erro é de natureza subjetiva e se torna impossível penetrar no
íntimo do autor para descobrir o que realmente se passou em sua mente no momento da
declaração da vontade.
        O dolo também se distingue da simulação, pois nesta a vítima é lesada sem mesmo
participar do negócio simulado. As partes fingem uma simulação visando fraudar a lei ou
prejudicar terceiros. No caso do dolo a vítima participa diretamente do negócio, mas
somente a outra conhece a maquinação e age de má-fé.

       Espécies de dolo – existem várias espécies de dolo, as quais podemos destacar:

        a) Dolo principal e dolo acidental – é a classificação mais importante. Pela leitura
do art. 145 podemos concluir que “são os negócios jurídicos anulados por dolo, quando este
for a sua causa”.
        Configura-se o dolo principal quando o negócio é realizado somente porque houve o
induzimento malicioso de uma das partes, ou seja, sem a manobra maliciosa a avença não
teria se concretizado.
        Acidental é aquele “quando, a seu despeito, o negócio seria realizado, embora por
outro modo”. São, pois, as condições do negócio. Este seria realizado independentemente da
malícia empregada pela outra parte ou pelo terceiro, porém em condições favoráveis ao
agente. Por isso, o dolo acidental não vicia o negócio e só obriga à satisfação em perdas e
danos (art. 146)
        Veja o exemplo: Pedro adquire por R$ 100.000,00 um imóvel que somente vale R$
50.000,00, em virtude da conduta dolosa do vendedor. Trata-se, portanto, de dolo
acidental, pois a pessoa realizaria o negócio, sendo o dolo presente apenas no valor cobrado.
Em se tratando de dolo eventual, existe apenas ato ilícito que não permite, portanto,
postular a invalidação do contrato, mas tão somente exigir a reparação do prejuízo
experimentado, no caso, a diferença do R$ 50.000,00.

        b) dolus bonus e dolus malus – dolus bonus é o dolo tolerável, destituído de
gravidade suficiente para viciar a manifestação da vontade. É comum no comércio em geral,
onde os comerciantes exageram nas qualidades de seus produtos, na tentativa de vendê-los.
No Direito do Consumidor é o denominado puffing (meros exageros). Não torna anulável o
negócio jurídico porque de certa maneira as pessoas já contam com ele e não se deixam
envolver, a menos que não possuam a diligência do homem médio
        É bem verdade que somente um homem com credulidade infantil se porá a adquirir
tudo o que lhe é oferecido apenas porque o vendedor apregoa enfaticamente seu produto.
Frise-se que em tais situações falta o requisito da gravidade.
        Em outro diapasão, o dolus bonus pode se dar quando existe um fim lícito, elogiável
e nobre, por exemplo, quando se induz alguém a tomar remédio que se recusa ingerir, porém
que lhe seja indispensável.
        Dolus malus é aquele revestido de gravidade, exercido com o fito de realmente
ludibriar e prejudicar. Essa modalidade é que se distingue entre dolo principal e dolo
acidental. Só o dolus malus (enquanto essencial) vicia o consentimento e acarreta a anulação
do negócio jurídico. A lei, por sua vez, não dita normas para distinguir o dolo tolerado
daquele que inquina de anulabilidade o negócio, cabendo ao juiz, diante do caso concreto,
decidir se o contratante excedeu ou não o limite do razoável.

        c) Dolo comissivo ou positivo e dolo omissivo ou negativo – o procedimento doloso
pode dar-se através de uma ação (comportamentos maliciosos) ou através de omissões.
        Para tanto, dispõe o art. 147 do CC/2002 que “nos negócios jurídicos bilaterais, o
silêncio intencional de uma das partes a respeito de fato ou qualidade que a outra parte
haja ignorado, constitui omissão dolosa, provando-se que sem ela o negócio não se teria
celebrado”
        O dolo omissivo esteia-se no princípio da boa-fé que deve nortear todos os negócios
jurídicos (art. 422). Em diversas passagens o Código pune aquele que agiu dolosamente,
como por exemplo o art. 180 que pune o menor que oculta dolosamente a sua idade ou o art.
766 que acarreta a perda do direito de recebimento do seguro ao estipulante de seguro de
vida que oculta dolosamente ser portador de doença grave quando da estipulação.

        d) dolo de terceiro – o dolo pode ser proveniente do outro contratante ou de
terceiro estranho ao negócio. Veja a disposição do art. 148:
        “Art. 148. Pode também ser anulado o negócio jurídico por dolo de terceiro, se a
parte a quem aproveite dele tivesse ou devesse ter conhecimento; em caso contrário, ainda
que subsista o negócio jurídico, o terceiro responderá por todas as perdas e danos da parte
a quem ludibriou”.
        Assim, o dolo de terceiro somente enseja a sua anulação se a parte a quem
aproveite o negócio dele tivesse ou devesse ter conhecimento. Se o beneficiado pelo dolo
de terceiro não adverte a outra parte está tacitamente aderindo ao expediente astucioso.
        Um exemplo: Pedro deseja vender seu relógio a João que, é ludibriado por Marcos
aduzindo que o relógio é de ouro, tendo Pedro tudo escutado, porém nada feito mesmo
sabendo que o relógio não era de ouro. O negócio torna-se anulável por erro de terceiro,
pois o vendedor sabia e se beneficiou do engodo. Se o vendedor não sabia do dolo praticado
pelo terceiro, este responderá pelas perdas e danos, não podendo o negócio ser anulado.
e) dolo do representante – a distinção agora e baseada na coerência está em que o
representante do negócio não pode ser considerado terceiro, pois atua em nome do
representado. Assim, quando atua no limite de seus poderes considera-se o ato praticado
pelo próprio representado. Ora, se o representante, nesta situação induz em dolo a outra
parte o negócio poderá ser anulado.
No art. 149 o Código ainda distingue o dolo do representante legal e o dolo do
representante convencional. Enquanto que no primeiro caso o ato é anulável até o benefício
que o representado teve, no segundo o representante e representado responderão
solidariamente em relação às perdas e danos.

        f) dolo bilateral – o dolo de ambas as partes é disciplinado no art. 150, ou seja,
quando ambas as partes procederem com dolo, nenhuma pode alegá-lo para anular o negócio
ou reclamar indenização.
É a regra de que ninguém pode valer-se de sua própria torpeza ou nemo auditur propriam
turpitudinem allegans.
        Nessa situação, a doutrina tem entendido a compensação até mesmo do dolo
principal com o dolo acidental, pois é certo que ambas procederam com dolo, não havendo
boa-fé a defender.

        g) dolo de aproveitamento – essa espécie de dolo constitui na verdade o elemento
subjetivo de outro defeito do negócio jurídico que é o estado de perigo, conforme veremos
adiante.



        DA COAÇÃO
        Coação é toda ameaça ou pressão exercida sobre um indivíduo para forçá-lo, contra
a sua vontade, a praticar um ato ou realizar um negócio. O que caracteriza é o emprego da
violência psicológica para viciar a vontade.
        A coação é vício maior do que o dolo, pois impede a livre manifestação da vontade,
enquanto que o dolo incide tão somente sobre a inteligência da vítima.
        Espécies – A coação pode ser dividida em coação absoluta ou física ( vis absoluta) ou
coação relativa ou psicológica (vis compulsiva).
        Na coação absoluta inocorre qualquer consentimento ou manifestação da vontade,
sendo que a vantagem pretendida pelo coator se dá através do emprego de força física.
Ora, como já vimos, neste caso não há manifestação da vontade não se caracterizando,
portanto, em vício de consentimento (lembre-se que antes de analisarmos os requisitos de
validade, analisamos os requisitos de existência.     Assim, não havendo manifestação da
vontade, o ato é inexistente, não se cogitando perscrutar acerca da suposta anulabilidade
do mesmo.
        Exemplo é a colocação da impressão digital do analfabeto no contrato à força. Fácil
perceber que no contrato não houve sequer a manifestação da vontade, sendo o mesmo
inexistente.
        Já na coação relativa (vis compulsiva) deixa-se uma opção ou escolha à vítima], pois
ela ou pratica o ato exigido pelo coator ou corre o risco de sofrer as consequências da
ameaça por ele feita. E o exemplo característico é o do assaltante que com arma em punho
declara: “a bolsa ou a vida”.
        Outra distinção seria a coação principal e a coação acidental, tratada da mesma
forma como no dolo. Assim, somente a coação principal seria causa de anulabilidade, pois se
daria como causa determinante do negócio. Já na coação acidental, esta influenciaria
apenas nas condições da avenca, ou seja, sem ela o negócio assim mesmo se realizaria, mas
em condições menos desfavoráveis à vítima. A coação acidental somente obriga ao
ressarcimento do prejuízo, enquanto que a principal constituiria causa de anulação do
negócio jurídico.

        Requisitos da coação – dispõe, com efeito, o art. 151:
        “Art. 151. A coação, para viciar a declaração da vontade, há de ser tal que incuta ao
paciente temor de dano iminente e considerável à sua pessoa, à sua família, ou a seus bens.
Parágrafo único. Se disse respeito a pessoa não pertencente à família do paciente, o juiz,
com base nas circunstâncias, decidirá se houve coação”
Assim, a coação:
        a) deve ser a causa determinante do ato – ou seja, deve haver uma relação de
causalidade entre a coação e o ato extorquido, sendo certo que o negócio deve ter sido
realizado somente por ter havido grave ameaça ou violência que, por sua vez, provocou na
vítima fundado receio de dano à sua pessoa, ou à sua família, ou a seus bens.
        Incumbe à parte que pretende a anulação do negócio jurídico o ônus de provar o
nexo de causa e efeito entre a violência e a anuência.
        b) deve ser grave – a coação para viciar a manifestação da vontade deve ser de tal
intensidade que efetivamente incuta na vítima um fundado temor de dano ao bem que ele
considera relevante.
        Para avaliar prefalado dano segue-se o critério concreto e não o padrão do homem
médio, ou seja, o de avaliar em cada caso as condições particulares ou pessoais da vítima,
nos termos do art. 152: “No apreciar a coação, ter-se-ão em conta o sexo, a idade, a
condição, a saúde, o temperamento do paciente e todas as demais circunstâncias que
possam influir na gravidade dela”.
        Assim, um ato incapaz de abalar um homem pode ser suficiente para atemorizar
uma mulher ou uma pessoa idosa.
        O simples temor reverencial, como dito no art. 153, não se considera coação. Desta
forma, o receio de desgostar os pais ou as pessoas a quem se deve obediência e respeito
(superiores hierárquicos) não se constitui em medida suficiente e bastante para anular o
negócio jurídico.
        Note que o Código aduz em “simples” temor reverencial. Assim, no casamento
quando há graves ameaças de castigo à filha obrigando-a a casar ou quando o superior faz
graves ameaças ao comportamento do empregado, existe coação, podendo tais situações
ser anuladas, uma vez que houve nos exemplos grave ameaça ou violência.
        c) deve ser injusta – a coação deve ainda ser ilícita, contrária ao direito ou abusiva.
Diz o art. 153 que “não se considera coação o exercício normal de um direito”. Assim, a
ameaça feita pelo credor de protestar o título de crédito vencido ou executar o mesmo, ou
o pedido de abertura de inquérito, a intimidação feita pelo homem a uma mulher de propor
ação de investigação de paternidade, etc, não se constituem coação por se tratarem de
situações lícitas.
        Porém se o credor se utiliza se um meio normal, mas para obter vantagens ilícitas,
haverá coação. Exemplo: o credor que ameaça executar um cheque de uma devedora, caso
ela não se case com ele. Neste caso, constitui coação, independente de ter havido culpa na
conduta da vítima.
        d) deve dizer respeito a dano atual ou iminente – o mal é iminente sempre que a
vítima não possua meios para furtar-se ao dano. Assim, a existência de dilatado intervalo
entre a ameaça e o desfecho do ato extorquido permite à vítima ilidir-lhe os efeitos ,
socorrendo-se de outras pessoas. Isto porque o mal somente é iminente quando a vítima não
tenha meios para furtar-se ao danos, quer com os próprios recursos, quer mediante auxílio
de outrem, ou da autoridade pública.
e) deve constituir ameaça de prejuízo à pessoa ou a bens da vítima ou a pessoas de
sua família – a intimidação à pessoa pode dar-se sob diversas formas, como sofrimentos
físicos, cárcere privado, tortura, etc. Pode dar-se também ameaça ao dano patrimonial
como incêndio, depredação, greve, etc.
        O termo família utilizado no art. 151 tem hoje uma acepção ampla, compreendendo
não só a resultante de casamento, com a proveniente de união estável. Também
compreendem os adotivos, os afins, além, é claro, dos consanguíneos. O Código, inclusive,
ampliou o conceito permitindo que outras pessoas que não as da família, pudessem ser
enquadradas na coação, como os amigos, vizinhos, etc, dependendo sempre do caso
concreto.

        Coação exercida por terceiro – Está prevista no art. 154, pois “vicia o negócio
jurídico a coação exercida por terceiro, se dela tivesse ou devesse ter conhecimento a
parte a que aproveite, e esta responderá solidariamente com aquele por perdas e danos”.
Perceba que, a teor do art. 155, o negócio jurídico subsistirá se a coação decorrer de ato
de terceiro, sem que a parte a que aproveite dela tivesse ou devesse ter conhecimento,
respondendo o autor pelas perdas e danos.



        DO ESTADO DE PERIGO
        O Código Civil de 2002 apresenta, como inovação, dois institutos que não estavam
previstos no Código Civil de 1916: o estado de perigo e a lesão.
Constitui o estado de perigo a situação de extrema necessidade que conduz uma pessoa a
celebrar negócio jurídico em que assume prestação desproporcional e excessiva.
        “Art. 156. Configura-se o estado de perigo quando alguém, premido da necessidade
de salvar-se, ou a pessoa de sua família, de grave dano conhecido pela outra parte, assume
obrigação excessivamente onerosa.
        Parágrafo único. Tratando-se de pessoa não pertencente à família do declarante, o
juiz decidirá segundo as circunstâncias”
        Exemplos corriqueiros do estado de perigo são os náufragos quando prometem a
outrem enorme recompensa por seu salvamento, ou aquele que assaltado por bandidos e
deixado em local ermo promete recompensa vultuosa a aquele que o ajuda, ou , por fim, o pai
que em caso de seqüestro, realiza maus negócios para levantar a quantia do resgate, etc.
        Exemplo muito comum hoje em dia é, também, o do médico ou da clínica que cobra
quantia exorbitante, obrigando inclusive a deixar cheque assinado do valor cobrado para
poder salvar a vida de um familiar.
A anulabilidade do negócio jurídico por estado de perigo encontra sua justificativa nos
preceitos de probidade e boa-fé que devem nortear todos os negócios jurídicos, a teor do
art. 422 do CC/2002.

         Elementos do estado de perigo – pelo art. 156 observamos os elementos
estruturais do estado de perigo. São eles:
         a) uma situação de necessidade – o agente deve estar premido de necessidade para
salvar-se ou a pessoa de sua família. Assim, é requisito sine qua non a necessidade como
título justificativo ou constitutivo da pretensão anulatória.
         b) iminência de dano atual e grave – o perigo de dano deve ser atual, iminente, capaz
de transmitir o receio de que se não for afastado as conseqüências temidas fatalmente
advirão.
A gravidade do dano é, pois, elemento integrante do conceito de estado de perigo, devendo
ser avaliada objetivamente pelo juiz.
c) nexo de causalidade entre a declaração e o perigo de grave dano – a vontade deve
apresentar-se distorcida em conseqüência do perigo de dano, devendo haver certo nexo,
pois a declaração entende-se oriunda do perigo de grave dano.
        d) Incidência da ameaça de dano sobre a pessoa do próprio declarante ou de sua
família – da mesma forma da coação, o elemento família deve ser interpretado da forma
mais ampla possível, podendo até mesmo ocorre o desvirtuamento da vontade do declarante
em se tratando de pessoa não pertencente à família, como é o caso do namorado, amigo
íntimo, noivo, etc, cabendo ao juiz decidir de acordo com o caso concreto.
        e) conhecimento do perigo pela outra parte – no estado de perigo existe, como
regra, um aproveitamento da situação para a obtenção da vantagem indevida. Assim, se o
que prestou o serviço não sabia do perigo, deve presumir-se que agiu de boa-fé, fazendo-se
apenas a redução do excesso contido na proposta onerosa, não se anulando o negócio.
        f) Assunção de obrigação excessivamente onerosa – é mister que as condições
sejam significativamente desproporcionais, não se tratando do princípio da onerosidade
excessiva adotada pela teoria da imprevisão, pois este é em decorrência de fato
extraordinário e imprevisível.
Desta forma, o objetivo do estado de perigo é afastar a proteção a um contrato abusivo
entabulado em condições de dificuldade ou necessidade do declarante.



        DA LESÃO
        O novo Código reintroduz, de forma explícita, o instituto da lesão como modalidade
de defeito do negócio jurídico, no art. 157 e seus dois parágrafos.
        Lesão é o prejuízo resultante da enorme desproporção existente entre as
prestações de um contrato, no momento de sua celebração, determinada pela premente
necessidade ou inexperiência de uma das partes.
        A lesão se diferencia do estado de perigo de forma bastante sutil. Diversos
doutrinadores sugerem a fusão dos dois institutos em um só, inclusive durante a tramitação
do Projeto do novo Código duas emendas foram neste sentido.
        Porém, o próprio relatório da Comissão Revisora assim conclui: “o estado de perigo
ocorre quando alguém se encontra em perigo e, por isso, assume obrigação excessivamente
onerosa. A lesão ocorre quando não há estado de perigo, por necessidade de salvar-se; a
‘premente necessidade’ é, por exemplo, a de obter recursos. Por outro lado, admitindo o §
2° do art. 157 a suplementação da contraprestação, isso indica que ela só ocorre em
contratos comutativos, em que a prestação é um dar (e não um fazer). A lesão ocorre
quando há usura real. Não há lesão, ao contrário do que ocorre com o estado de perigo, que
vicie a simples oferta. Ademais, na lesão não é preciso que a outra parte saiba da
necessidade ou da inexperiência; a lesão é objetiva. Já no estado de perigo é preciso que a
parte beneficiada saiba que a obrigação foi assumida pela parte contrária para que esta se
salve de grave dano; o estado de perigo é subjetivo.”
        A ausência do instituto no Código de 1916 foi justificada por Beviláqüa em que a
parte prejudicada teria outros meios para resguardar seus direitos, como o erro, dolo,
coação, simulação e fraude. Bem verdade é que o instituto não se amoldava com os
princípios liberais do CC/1916.
        A lesão passou a existir na Lei n° 1.521/51 que define os crimes contra a economia
popular, em seu art. 4°. Assim, constitui crime a usura pecuniária ou real, ou seja, aquela
que visa “obter, ou estipular, em qualquer contrato, abusando da premente necessidade,
inexperiência ou leviandade de outra parte, lucro patrimonial que exceda o quinto do valor
corrente ou justo da prestação feita ou prometida”
Posteriormente, o CDC veio disciplinar a lesão em diversos de seus artigos, vindo a
atender aos reclamos da doutrina. Hoje, na forma como está disciplinada do CC/2002, a
lesão pode ser alegada por qualquer das partes contratantes e não apenas pelo vendedor.

        Elementos da lesão – a lesão está composta de dois elementos: o objetivo,
consistente da manifesta desproporção entre as prestações recíprocas e o subjetivo,
caracterizado pela inexperiência ou premente necessidade do lesado.
        Assim, caberá ao juiz, diante do caso concreto (diferente da dicção da lesão
prevista na Lei dos Crimes contra a Economia Popular) averiguar o tamanho da
desproporção, sendo que o momento para se averiguar a desproporção é o da celebração do
negócio.



        DA FRAUDE CONTRA CREDORES
        A fraude contra credores está inserida no novo Código Civil no rol dos defeitos do
negócio jurídico, mas não como vício de consentimento e sim como vício social. Isto porque a
fraude contra credores não conduz a um descompasso entre o íntimo querer do agente e a
sua declaração. Mas é exteriorizada com a intenção de prejudicar terceiros, por esta razão
é considerada como vício social.
        A simulação, que hoje em dia é causa de nulidade e não de anulabilidade do negócio
jurídico, também está inserida no rol dos vícios sociais.
        A natureza jurídica do instituto assenta-se na garantia dos credores à satisfação
do débito, tendo em vista o patrimônio do devedor. Assim, o patrimônio do devedor
constitui a garantia do cumprimento de suas obrigações. Se ele o desfalca maliciosa e
substancialmente, a ponto de não mais garantir o pagamento de suas dívidas, tornando-se
insolvente, configura-se a fraude contra credores. Esta situação só se caracteriza,
portanto, se o devedor se tornar insolvente ou na sua iminência, pois se o seu patrimônio
basta com sobra para cumprir com suas obrigações, não há que se cogitar em fraude contra
credores, ampla será a sua liberdade para dispor de seus bens.
        Fraude contra credores é, portanto, todo ato praticado pelo devedor, suscetível de
diminuir ou onerar seu patrimônio, reduzindo ou eliminando a garantia que este representa
para pagamento de suas dívidas, praticado por devedor insolvente, ou por ele reduzido à
insolvência.

        Elementos constitutivos – dois são os elementos que compõem a fraude contra
credores: um elemento objetivo (eventus damni), ou seja, a própria insolvência que constitui
o ato prejudicial ao credor; e o subjetivo ( consilium fraudis), que é a própria má-fé do
devedor, consciência de prejudicar terceiros.
        Ao tratar da fraude, o legislador teve de optar entre proteger o interesse dos
credores ou o do adquirente de boa-fé. Por isso o consilium fraudis (a não ser em
determinadas exceções) deve ser provado, pois o credor somente logrará invalidar a
alienação se provar a má-fé do adquirente.
        O art. 159 presume a má-fé do adquirente quando a insolvência do alienante for
notória, ou houver motivo para ser conhecida do outro contratante. A notoriedade da
insolvência pode ser evidenciada por diversos atos como, por exemplo, a existência de
protesto ou execuções contra o alienante, etc.
        Destacamos algumas situações em que o consilium fraudis pode ser presumido:
        a) pela clandestinidade do ato;
        b) pela continuação dos bens alienados na posse do devedor quando deveriam os
            mesmos ter sido passados para terceiros;
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1268 apostila -_direito_civil_-_parte_geral

  • 1. DIREITO CIVIL Prof.: Alexander Perazo VISÃO GERAL DO NOVO CÓDIGO CIVIL DE 2002 Lei n° 10.406, de 10.01.02 – O Código Civil é a constituição do homem comum, pois estabelece regras de conduta entre todos os seres humanos, mesmo antes de nascer (resguarda os direitos do nascituro) até depois de sua morte. O CC/2002 foi apresentado em 1972, convertido em Projeto de Lei em 1975 e engavetado, com certa prudência, à espera da nova Constituição. Orientações da elaboração do novo Código a) preservar, sempre que possível, o CC/1916 b) criar um novo Código e não simplesmente revisar o de 1916 c) inclusão de valores essenciais como a eticidade, a socialidade e a operabilidade d) aproveitamento dos trabalhos de revisão do Código Civil no que tange ao Direito das Obrigações em 1940 e em 1965. e) firmar não uma unificação do Direito Privado, mas sim do Direito das Obrigações, inclusive com a inclusão de mais um Livro na Parte Especial intitulado Direito de Empresa Os três princípios fundamentais Eticidade – foi inserido no Código a participação de valores éticos. Assim, o art.. 113 e o 422, que tratam da boa-fé Socialidade – foi retirado o caráter individualista do Código, com a inclusão da função social do contrato (art. 421) e adoção da interpretação mais benéfica ao aderente (art. 423) Operabilidade – procurou-se solucionar antigas discussões doutrinárias como a distinção entre prescrição e decadência, associação (sem fins econômicos) e sociedade (com objetivo de lucro) Direito público e privado – Direito público é o destinado a disciplinar os interesses gerais da coletividade. A relação é entre o Estado e o particular ou entre dois Estados, sendo sempre de subordinação. Direito privado, por sua vez, é aquele que regula as relações entre os homens. A relação é entre indivíduos, sendo sempre de coordenação. LEI DE INTRODUÇÃO AO CÓDIGO CIVIL A Lei de Introdução ao Código Civil é um conjunto de normas sobre normas, pois disciplina as próprias normas jurídicas, determinando o seu modo de aplicação e entendimento, no tempo e no espaço Fontes do direito – A lei é o objeto da LICC e a principal fonte do direito. Pelo art. 4º da LICC, podemos antever que são fontes do direito: a lei, a analogia, o costume e os princípios gerais do direito. A jurisprudência é colocada como fonte meramente intelectual ou informativa (não formal) do direito.
  • 2. LEI – a palavra lei é empregada em duas acepções: em um sentido amplo, como sinônimo de norma jurídica, compreende toda regra geral de conduta, emanada por autoridade competente; em sentido estrito, refere-se, tão somente, a norma jurídica elaborada pelo Poder Legislativo por meio de processo adequado. Possui como características a generalidade, a imperatividade e a permanência. Vigência da lei – a vigência é uma qualidade temporal da norma, designa a existência específica da norma em determinada época. Segundo a LICC em seu art. 1º, salvo disposição em contrário, a lei começa a vigorar em todo o país quarenta e cinco dias depois de oficialmente publicada. O intervalo entre a data de sua publicação e a sua entrada em vigor denomina-se vacatio legis. OBS – Se durante a vacatio legis ocorrer nova publicação de seu texto, para correção de erros materiais ou falha de ortografia, o prazo da obrigatoriedade começará a correr a partir da nova publicação (art. 1º, § 3º). Se a lei já entrou em vigor, tais correções são consideradas lei nova, tornando-se obrigatória após o decurso da vacatio. OBS 2 – decretos e regulamentos tornam-se obrigatórios a partir de sua publicação. Revogação da lei – cessa a vigência de uma lei com a sua revogação, sendo certo que uma lei, em regra, tem caráter permanente. Assim, mantém-se a lei em vigor até ser revogada por outra lei. A revogação parcial denomina-se derrogação, enquanto que a revogação total é chamada de ab-rogação. Uma lei revogada não adquire vigência com a revogação da lei que a revogou (repristinação). Interpretação da lei – interpretar é descobrir o sentido e o alcance da norma jurídica. Todas as lei estão sujeitas a interpretação, não se aplicando o brocardo jurídico in claris cessat intepretatio (na clareza dispensa-se a interpretação). Quanto à origem, os métodos de interpretação podem ser autêntico, jurisprudencial e doutrinário; quanto aos meios, a interpretação pode ser gramatical, lógica, sistemática, histórica e sociológica (teleológica) Gramatical – consiste no exame do texto normativo sob o ponto de vista linguístico; Lógica – procura-se apurar o sentido e a finalidade da norma Sistemática – parte do pressuposto que uma lei não existe isoladamente, devendo ser interpretada em conjunto com outras; Histórica – investiga-se os antecedentes da norma a fim de descobrir o seu exato significado. Teleológica – tem por objetivo adaptar o sentido ou a finalidade da norma às novas exigências sociais, com claro abandono do individualismo. Conflito de leis no tempo – em regra, as leis são irretroativas. Assim, salvo disposição em contrário, aplica-se a lei nova aos fatos pendentes e aos fatos futuros. Quanto aos fatos pendentes, é possível que o legislador crie “disposições transitórias”. Aduz o art. 6º da LICC que a lei não prejudicará o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada. Eficácia da lei no espaço – a norma jurídica tem aplicação dentro do território nacional (princípio da territorialidade). Ocorre, porém, que em determinadas situações,
  • 3. surge a necessidade de aplicação de outras leis dentro do território nacional (princípio da extraterritorialidade). Assim, pelo sistema da extraterritorialidade a norma jurídica aplica-se em território de outro Estado, segundo princípios e convenções internacionais. Com efeito, dispõe o art. 7º da LICC que a lei do país em que for domiciliada a pessoa determina as regras sobre o começo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de família
  • 4. DIREITO CIVIL – PARTE GERAL PESSOA NATURAL O conceito de personalidade está umbilicalmente ligado ao conceito de pessoa. Todo aquele que nasce com vida torna-se uma pessoa, ou seja, adquire personalidade. Esta é, portanto, atributo do ser humano, sendo a aptidão genérica para adquirir direitos e contrair obrigações. Assim, afirmar que o homem possui personalidade é o mesmo que dizer que ele tem capacidade para ser titular de direitos. Todas as pessoas ao nascer adquirem a capacidade de direitos ou de gozo. Por outro lado, nem todas as pessoas possuem a capacidade de exercício ou de fato, que é a aptidão para exercer, por si só, os atos da vida civil. Por faltarem a certas pessoas alguns requisitos materiais, como maioridade, saúde, desenvolvimento mental, etc, a lei, no intuito de protegê-las, malgrado não lhes negue a capacidade de adquirir direitos, sonega-lhes o de se autodeterminarem, exigindo a participação de outras pessoas, que as representa ou assiste. Capacidade também não se confunde com legitimação, sendo esta a aptidão para a prática de determinados atos jurídicos específicos. Assim, por exemplo, o ascendente genericamente capaz, não estará legitimado para a venda de seus bens a outros descendentes, sem o consentimento dos demais (art. 496, CC/2002). Sujeitos da Relação Jurídica O novo Código Civil, no Livro I da Parte Geral, dispõe sobre as pessoas como sujeitos de direitos. As relações jurídicas são todas as relações da vida social regulada pelo Direito (fatos jurídicos), sempre somente o homem o sujeito destas relações jurídicas. Os animais, portanto, não são considerados sujeitos de direitos, embora mereçam proteção. A ordem jurídica reconhece duas espécies de pessoas: a pessoa física (natural, o próprio ser humano) e a pessoa jurídica (agrupamento de pessoas físicas, com o intuito de alcançar fins comuns), também denominada de pessoa moral ou pessoa coletiva. Note-se que no direito brasileiro não existe incapacidade de direito, pois, como dito, todas as pessoas se tornam, ao nascer, capazes de adquirir direitos (art. 1º do CC/2002). Existe, outrossim, incapacidade de fato ou de exercícios, decorrente do reconhecimento da inexistência, em uma pessoa, dos requisitos indispensáveis ao exercício dos seus direitos. A incapacidade de fato pode ser suprida pelos institutos da representação ou da assistência, conforme o caso (absoluta ou relativamente capazes). Desta forma, a incapacidade absoluta acarreta a proibição total do exercício por sí só do direito. O negócio somente pode ser praticado pelo representante do incapaz. O art. 3º do CC/2002 nos fornece as três hipóteses de incapacidade: “Art. 3º. São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil: I – os menores de dezesseis anos II – os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática deses atos III – os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade”
  • 5. OBS – Frise-se que se a pessoa, ainda que por causa transitória, não puder exprimir a sua vontade, mas acaba exprimindo-a, o ato é nulo (art. 3º, III). Por sua vez, se a pessoa, ainda que por causa transitória, não exprimiu a vontade, o ato é inexistente, por faltar a própria declaração da vontade Por sua vez, a incapacidade pode ser somente relativa, ocasião em que o incapaz poderá praticar atos da vida civil, desde que devidamente assistido por seu representante. O art. 4º, por sua vez, traduz a incapacidade relativa: “Art. 4º. São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os exercer: I – os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos II – os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido III – os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo IV – os pródigos Parágrafo único. A capacidade dos índios será regulada por legislação especial” A incapacidade (de exercício, lembre-se), por seu turno, cessa com a maioridade, ou seja, no primeiro momento do dia em que o indivíduo completa dezoito anos, ou nos casos de emancipação previstos no p.u. do art. 5º do CC/2002; “Art. 5º. (...) Parágrafo único. Cessará, para os menores, a incapacidade: I – pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante instrumento público, independentemente de homologação judicial, ou por sentença do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver dezesseis anos completos; II – pelo casamento III – pelo exercício de emprego público efetivo IV – pela colação de grau em curso de ensino superior; V – pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de emprego, desde que, em função deles, o menor com dezesseis anos completos tenha economia própria” Pelo exposto, podemos concluir que a emancipação pode ser voluntária, judicial ou legal. A emancipação voluntária é concedida pelos pais, se o menor tiver dezesseis anos completos (ou por um deles na falta do outro), mas não pode servir de excludente de responsabilidade dos pais em relação aos seus filhos (objetiva, diga-se) e tampouco para exonerar-se do dever de alimentar. A emancipação judicial é aquela do menor sob tutela que já completou dezesseis anos, dependendo de sentença e ouvido o tutor. Por derradeiro, a emancipação legal está presente nos demais incisos do parágrafo único do art. 5º. DIREITOS DA PERSONALIDADE O Código Civil dedicou um capítulo específico aos direitos de personalidade, pois, segundo Miguel Reale “tratando-se de matéria de per si complexa ede significação ética
  • 6. essencial, foi preferido o enunciado de poucas normas dotadas de rigor e clareza, cujos objetivos permitirão os naturais desenvolvimentos da doutrina e da jurisprudência”. Assim, os direitos de personalidade são direitos subjetivos que possuem como objeto os bens e valores essenciais da pessoa humana, em seu aspecto físico, moral e intelectual. São direitos inalienáveis, que se encontram fora do comércio e que merecem, sobremaneira, a proteção legal. Segundo o art. 11 do Código Civil “os direitos da personalidade são instransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o ser exercício sofrer limitação voluntária. Podemos destacar as seguintes características: a) Instransmissibilidade e irrenunciabilidade – não podem seus titulares dispor dos direitos de personalidade, transferindo-se a terceiros, renunciando o seu uso ou simplesmente os abandonando, pois nascem e se extinguem com a própria pessoa. Por óbvio que ninguém pode desfrutar em nome de outrem bens como a vida, a honra, a liberdade, etc. Alguns atributos da personalidade admitem a cessão de seu uso, como por exemplo, a imagem que pode ser explorada comercialmente, mediante retribuição. Permite-se também a cessão gratuita de órgãos do corpo humano para fins terapêuticos. Assim a indisponibilidade dos direitos da personalidade e tida como relativa. b) Abolutismo – o caráter absoluto do direito da personalidade deve-se ao fato de o mesmo ser oponível erga omnes c) Não-limitação – o rol dos direitos da personalidade existente no Código Civil é meramente exemplificativo (numerus apertus), pois é impossível imaginar-se um rol exaustivo dos direitos da personalidade. Desta forma, são direitos da personalidade o direito a alimentos, ao meio ambiente saudável, à velhice digna, ao culto religioso, à liberdade de pensamento, etc. d) Imprescritibilidade – os direitos da personalidade não se extinguem pelo decurso do tempo. Malgrado o dano moral consista na lesão a um interesse que visa a satisfação de um bem jurídico extrapatrimonial contido nos direitos da personalidade, a pretensão à reparação civil está sujeita aos prazos prescricionais, por ter caráter patrimonial. e) Impenhorabilidade – se os direitos da personalidade são indisponíveis, logicamente tornam-se impenhoráveis. Frise-se que os reflexos patrimoniais dos direitos da personalidade podem ser penhorados f) Vitaliciedade – os direitos da personalidade são inatos, sou seja, são adquiridos no momento da concepção e acompanham a pessoa por toda a sua vida até sua morte. Aliás, mesmo após a morte de uma pessoa alguns direitos são resguardados, como o respeito ao morto, sua honra ou memória, etc. O Código Civil disciplina os direitos da personalidade com os atos de disposição do próprio corpo (arts. 13 e 1), o direito à não-submissão a tratamento médico de risco (art. 15), o direito ao nome e ao pseudônimo (arts. 16 a 19), a proteção à palavra e à imagem (art. 20) e a proteção à intimidade (art. 21). No art. 52, preceitua que “aplica-se às pessoas jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos da personalidade.” PESSOA JURÍDICA A pessoa jurídica, por sua vez, consiste num conjunto de pessoas ou bens, dotado de personalidade jurídica própria e constituído na forma da lei, para a consecução de fins comuns. A sua principal característica é a de que atuam na vida jurídica com personalidade diversa da dos indivíduos que a compõem.
  • 7. A formação da pessoa jurídica exige uma pluralidade de pessoas ou de bens e uma finalidade específica (elementos de ordem material), bem como um ato constitutivo e respectivo registro no órgão competente (elemento formal), ou Registro Civil das Pessoas Jurídicas (sociedade simples) ou na Junta Comercial (sociedade empresária). Natureza jurídica – atualmente, duas teorias explicam a existência da pessoa jurídica: teorias da ficção (ficção legal ou ficção doutrinária) e teoria das realidade (orgânica, jurídica e técnica). São espécies de pessoa jurídica: Pessoa jurídica de direito público Externo (art. 42) Países estrangeiros Organismos internacionais Interno (art. 41) União Estados Municípios Distrito Federal Territórios Autarquias, inclusive as associações públicas demais entidades de caráter público criadas por lei Pessoa jurídica de direito privado associações sociedades fundações organizações religiosas partidos políticos Neste ponto, faz-se mister os seguintes conceitos: Associações – são pessoas jurídicas de direito privado constituídas de pessoas que reúnem os seus esforços para a realização de fins não econômicos. Nesse sentido, reza o art. 53 que “Constituem-se as associações pela união de pessoas que se organizem para fins não econômicos”. Assim o traço característicos das associações está no fato de elas não visarem ao lucro. Sociedades – Celebram contratos de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados. As sociedades podem ser simples ou empresárias; as primeiras são constituídas, em geral, por profissionais que atuam em uma mesma área ou por prestadores de serviços técnicos (clínicas médicas, escritórios de advocacia, etc), possuindo fins econômicos; as segundas, por sua vez, possuem em seu objeto o exercício de atividade própria de empresário. Fundações – constituem um acervo de bens que recebe personalidade jurídica para a realização de fins determinados, de interesse público, de modo permanente e estável. Nos dizeres de Clóvis Beviláqua “consistem em complexos de bens (universitates bonorum) dedicados à consecução de certos fins e, para esse efeito, dotados de personalidade”. Sua existência decorre da vontade de uma pessoa, o instituidor, e seus fins, de natureza moral, religiosa, cultural ou assistencial, são imutáveis. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA O ordenamento jurídico confere às pessoas jurídicas personalidade distinta da de seus membros. Eis a razão de ser da pessoa jurídica. Porém, o que fazer quando a
  • 8. existência da pessoa moral serve como instrumento para a prática de fraudes e abusos de direitos contra credores, acarretando-lhes prejuízos? A reação a esses abusos ocorreu em diversos países, dando origem, através dos estudos do Prof. Rubens Requião em nosso país, à teoria da desconsideração da personalidade jurídica (disregard doctrine). Assim, permite-se ao juiz que, em casos de fraude e de má-fé, desconsidere o princípio de que as pessoas jurídicas possuem existência distinta de seus sócios, para atingir e vincular os bens particulares dos sócios à satisfação das dívidas da sociedade, erguendo-se o véu da personalidade jurídica. Atenção, trata-se apenas e rigorosamente, de suspensão episódica da personalidade da pessoa jurídica não desfazendo seu ato constitutivo, nem invalidando a sua existência, apenas possibilitando que certas e determinadas relações obrigacionais possam ser estendidas aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica. Desta forma, em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial será possível, em tese, desconsiderara a personalidade jurídica DOMICÍLIO O domicílio da pessoa natural foi definido pelo Código como sendo o lugar onde ela, de modo definitivo, estabelece a sua residência o centro principal de sua atividade. Do conceito supra, subsume-se duas ideias: a de morada e o centro de atividade; a primeira, pertinente à família, ao lar, ao ponto onde o homem se recolhe para a sua vida íntima; a segunda, relativa à vida externa, às relações sociais. O domicílio pode ser ainda voluntário ou necessário ou legal. Este último são exemplos o incapaz, o servidor público, o militar, o marítimo e o preso. Já a pessoa jurídica de direito privado não possui residência, mas sede ou estabelecimento. Trata-se de um domicílio especial que pode ser livremente escolhido no seu estatuto ou atos constitutivos. BENS Os bens são coisas que, por serem úteis e raras, são suscetíveis de apropriação e contêm valor econômico. Somente interessam ao direito coisas suscetíveis de apropriação exclusiva pelo homem. As que existem em abundância no universo, como o ar atmosférico e a água dos oceanos, por exemplo, deixam de ser bens em sentido jurídico. O patrimônio, por outro lado, é o complexo das relações jurídicas de uma pessoa que tem valor econômico. O patrimônio e a herança constituem coisas universais (ou universalidades) e como tais subsistem, embora não constem de objetos materiais. Entende-se que o patrimônio é composto por todo o ativo e por todo o passivo de um indivíduo, de modo que se pode encontrar pessoa que tenha um patrimônio negativo, como é o caso do insolvente. CLASSIFICAÇÃO DOS BENS Os bens podem ser: Corpóreos e incorpóreos – corpóreos são os bens físicos, com existência material; incorpóreos são os bens com existência abstrata, porém com valor econômico (direito autoral, crédito, etc).
  • 9. Móveis e imóveis – imóveis são aqueles que não podem ser transportados de um lugar para o outro sem deterioração ou perda. Podem ser ainda imóveis por natureza, imóveis por acessão ou por disposição legal (art 80 – direitos reais sobre imóveis e as ações que os asseguram e o direito à sucessão aberta); Bens móveis, por sua vez, são aqueles que podem ser transportados de um lugar para o outro. São móveis por disposição legal as energias, os direitos reais sobre objetos móveis e as ações correspondentes e os direitos pessoais de caráter patrimonial e suas respectivas ações. Fungíveis e consumíveis – são consumíveis aqueles móveis que se destroem assim que vão sendo usados; são fungíveis aqueles móveis que podem ser substituídos por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade. Divisíveis e indivisíveis – divisíveis são aqueles que podem ser divididos sem perderem o seu valor; os indivisíveis, por sua vez, podem ser por natureza, por determinação legal ou por vontade das partes. Singulares e coletivos – singulares são os bens individualizados; coletivos são bens agregados num todo (uma biblioteca). Principais e acessórios – principais são aqueles que não dependem de mais nenhum outro bem para a sua existência; acessórios são aqueles que se consideram decorrentes de outros. Os acessórios podem ser: produtos (utilidades que se retiram das coisas, diminuindo-lhe a quantidade, porque não se reproduzem periodicamente, como as pedras, os metais, etc); frutos (são as utilidades que uma coisa periodicamente produz, nascendo e renascendo da coisa, sem acarretar a sua extinção); pertenças (que não se constituindo parte integrante da coisa, se destina, de modo duradouro ao uso, ao serviço ou ao aformoseamento do bem). Atenção: As pertenças são acessórios que não seguem o principal. Bens públicos – são os bens do domínio nacional, pertencentes à União, aos Estados ou aos Municípios. Se dividem em: a) bens de uso comum (inalienáveis): aquele pertencentes ao Poder Público que podem ser utilizados por todos do povo (ruas, praias, parques) b) uso especial (inalienáveis): aqueles pertencentes ao Poder Público para a administração e prestação de serviços (prédios de prefeituras, escolas, fóruns, etc); c) dominiais ou dominicais (alienáveis): são os que compõem o patrimônio da União, Estados e Municípios como objeto de direito pessoal ou real dessas pessoas de direito público interno. OBS – os bens públicos (todos) não estão sujeitos a usucapião. (são imprescritíveis) DOS FATOS JURÍDICOS O novo Código Civil abandonou a expressão ato jurídico pela designação escorreita e específica de negócios jurídicos, porque em verdade somente este é rico em conteúdo e justifica uma pormenorizada regulamentação. Manteve a noção de fatos jurídicos, abrangendo, como veremos, os fato jurídicos em geral, ou seja, os fatos jurídicos em sentido amplo e suas espécies.
  • 10. Fatos jurídicos são, na definição de Savigny os acontecimentos em virtude dos quais as relações de direitos nascem e se extinguem, ou seja, todos os acontecimentos suscetíveis de produzir alguma aquisição, modificação ou extinção de direitos. (Teixeira de Freitas). Perceba que a expressão fatos jurídicos engloba todos aqueles eventos provindos da atividade humana de decorrentes de fatos naturais, desde que tenham influência na órbita do direito. Assim, nem todo acontecimento constitui um fato jurídico, sendo alguns simplesmente denominados de fatos por não possuírem relevância para o direito. Aduz Caio Mário da Silva Pereira que “a chuva que cai é um fato, que ocorre e continua a ocorrer, dentro da normal indiferença da vida jurídica. O que não quer dizer que, algumas vezes, este mesmo fato não repercuta no campo do direito, para estabelecer ou alterar relações jurídicas. Outros se passam no domínio das ações humanas, também indiferentes ao direito: o indivíduo veste-se, alimenta-se, sai de casa, e a v ida jurídica se mostra alheia a estas ações, a não ser quando a locomoção, a alimentação, o vestuário provoquem a atenção do ordenamento legal”. Conclui-se, portanto, que todo fato, para ser considerado jurídico, deve passar por um juízo de valoração. Fato jurídico em sentido amplo é todo acontecimento da vida que o ordenamento jurídico considera relevante no campo do direito. Pode ser o simples evento natural como o fato do animal ou a conduta humana, havendo para tanto a correspondência entre o fato e a norma a ser seguida. Classificação – os fatos jurídicos em sentido amplo podem ser classificados em: a) fatos naturais (ou fatos jurídicos stricto sensu); b) fatos humanos ou atos jurídicos. Os fatos naturais, por sua vez, podem ser: a) ordinários, como o nascimento, a morte, a maioridade, etc; b) extraordinários que seria o caso fortuito e a força maior. Os fatos humanos, atos jurídicos, i.é, as ações humanas que criam, modificam, transferem ou extinguem direitos, por sua vez, podem ser: a) lícitos; b) ilícitos. Lícitos são os atos humanos a que a lei defere os efeitos almejados pelo agente. Praticados em conformidade com o ordenamento jurídico, produzem efeitos jurídicos voluntários, queridos pelo agente. No âmbito Cível existe o amplo terreno da licitude, ou seja, tudo o que a lei não proíbe torna-se lícito. Ilícitos são os atos jurídicos praticados em desconformidade com o prescrito no ordenamento jurídico. Em vez de direitos, criam deveres e obrigações. Importante é que hoje em dia, admite-se que os atos ilícitos integrem a categoria dos atos jurídicos por definição do art. 186 e pelos efeitos que produzem, gerando a obrigação de reparar o dano, a teor do art. 927. Os atos lícitos ainda se dividem em: a) ato jurídico em sentido estrito ou atos meramente lícitos; b) negócios jurídicos e c) ato-fato jurídico. Nos dois primeiros exige-se a manifestação da vontade. No negócio jurídico a ação humana visa diretamente a alcançar um fim prático permitido na lei, razão por que exige-se uma vontade qualificada, sem vícios. São os contratos e as declarações unilaterais de vontade. Nos atos meramente lícitos o efeito da manifestação da vontade já está predeterminado na lei, como ocorre com a notificação que constitui em mora o devedor, o reconhecimento de um filho, a tradição, não havendo por isso qualquer dose de escolha da categoria jurídica. Perceba que a ação humana se baseia não numa vontade qualificada, mas em simples intenção como quando alguém fisga um peixe, dele se tornando proprietário graças ao instituto da ocupação. No ato-fato jurídico ressalta-se a consequência do ato, o fato resultante, sem se levar em consideração a vontade de praticá-lo. O efeito do ato, muitas vezes, não é buscado nem imaginado pelo agente, mas decorre de uma conduta e é sancionado pela lei,
  • 11. como é o caso de uma pessoa que acha casualmente um tesouro, tornando-se, mesmo sem querer proprietário de sua metade, por força do art. 1.264, mesmo que essa pessoa seja um absolutamente incapaz, por exemplo. A expressão atos-fatos jurídicos foi divulgada por Pontes de Miranda referindo-se a essas situações em que a lei encara os fatos sem levar em consideração a vontade, a intenção ou a consciência do agente. Por essa razão é válido o contrato de compra e venda de um bombom por uma criança absolutamente incapaz, por exemplo, ou um louco que achando um tesouro se tornará proprietário de sua metade, independentemente de sua vontade ou de sua incapacidade. NEGÓCIO JURÍDICO – a expressão negócio jurídico não é empregada no Código Civil no sentido comum de operação ou transação comercial, mas sim como uma das espécies em que se subdividem os atos jurídicos lícitos. Todos os doutrinadores são unânimes ao afirmar que a expressão negócio jurídico surgiu com o BGB (Código Civil Alemão), contudo no CC/1916, Beviláqüa ainda optou pela orientação francesa com a concepção pelo ato jurídico. Somente no CC/2002 houve a adoção explícita da teoria do negócio jurídico. Segundo Francisco Amaral “negócio jurídico deve-se entender a declaração da vontade privada destinada a produzir efeitos que o agente pretende e o direito reconhece. Tais efeitos são a constituição, modificação ou extinção de relações jurídicas, de modo vinculante, obrigatório para as partes intervenientes”. Assim, o negócio jurídico é meio de realização da autonomia privada, sendo o contrato o seu principal símbolo. É bem verdade que a autonomia privada já não mais possui o mesmo caráter individualista que norteou o CC/1916. O novo Código possui escorreita orientação social, cujos princípios foram traçados pela CF/88, principalmente no que tange à função social da propriedade e ao respeito e dignidade da pessoa humana (adotando o CC/2002 o princípio da função social dos contratos). Fácil é dita percepção quando estudamos o art. 421 ou o 422, ambos do CC/2002, que diversas vezes comentamos em sala de aula. Finalidade negocial – como dito, no negócio jurídico a manifestação da vontade possui finalidade negocial que abrange a aquisição, conservação, modificação ou extinção de direitos. Assim, vejamos: Aquisição de direitos – ocorre a aquisição de direitos com a sua incorporação ao patrimônio do titular. Pode ser originária ou derivada. Originária ocorre quando não existe qualquer interferência do anterior titular. Ocorre na ocupação de coisa sem dono, na usucapião, na avulsão, etc. Derivada ocorre a devida transferência de um direito a uma outra pessoa. Perceba que nesse caso o direito é adquirido com todas as qualidades ou defeitos do título anterior, pois ninguém pode transferir mais direitos do que possui (nemo plus juris ad alterum transfere potest quam ipse habet). A aquisição de direitos pode ser ainda a título gratuito (quando só o adquirente aufere vantagens, como a sucessão) ou oneroso (quando se exige do adquirente uma contraprestação, como na compra e venda). Quanto à sua extensão pode a aquisição de direitos se dar a título singular, que ocorre no tocante a determinados bens, ou a título universal, quando o adquirente sucede o seu antecessor na totalidade de seus direitos. A aquisição de direitos a título singular, por
  • 12. sua vez, pode ser por ato inter vivos ou causa mortis a depender do momento de ocorrência de seus efeitos. Os direitos ainda se diferem entre atuais e futuros. Atuais são os completamente adquiridos, futuros os cuja aquisição não se acabou de operar. Assim, atual é o direito subjetivo já formado e incorporado ao patrimônio de seu titular, podendo se por ele livremente exercido. Direito futuro é o que ainda não se constituiu. Dentre os futuros ainda separamos os já deferidos dos não deferidos Direito deferido é aquele cuja aquisição depende somente do arbítrio do sujeito, ou seja, ainda não se incorporaram ao patrimônio do adquirente porque ele ainda não quis, mas poderão incorporar-se a qualquer momento, pois depende exclusivamente de seu arbítrio. É o que sucede com o direito de propriedade, v.g., quando a sua aquisição depende tão somente do registro do título aquisitivo. Direito não deferido são direitos futuros que se subordinam a fatos ou condições falíveis, ou seja, são aqueles que não se incorporara e talvez nem se incorporem ao patrimônio do adquirente por razões que são alheias a sua vontade. A eficácia de uma doação já realizada pode depender de um fato futuro falível, como um casamento do donatário, por exemplo. Algumas vezes, é bem verdade que o direito se forma de forma gradativa. Assim, haveria uma fase preliminar em que há apenas uma esperança ou possibilidade de que esse direito venha a ser adquirido, a situação é de expectativa de direito. Trata-se de mera esperança de vir a adquirir um direito. Frise-se como exemplo a mera possibilidade que têm os filhos de suceder a seus pais quando estes morrerem. Quando encontra-se ultrapassada a fase preliminar e o direito se acha inicial e parcialmente formado, surge o direito eventual, ou seja, já existe um interesse ainda que embrionário ou incompleto. É pois um direito já concebido, mas ainda não nascido, pois falta-lhe um elemento básico, sendo mais do que uma expectativa de fato. Como exemplo podemos citar a aceitação de uma proposta de compra e venda ou o exercício do direito de preferência. OBS: Sílvio Rodrigues coloca o exemplo acima como direito eventual e não expectativa de direito, pois, segundo ele, os herdeiros, se tudo ocorrer como esperado, receberão a herança. Na terceira situação de avanço para a concretização do direito encontramos o direito condicional, pois este já se encontra plenamente constituído, porém sua eficácia (guarde bem o termo) depende do implemento da condição estipulada, de um evento futuro e incerto. O art. 130 do CC/2002 emprega a expressão direito eventual no sentido genérico do termo, abrangendo o direito condicional, quando aduz que “ao titular de direito eventual, nos casos de condição suspensiva ou resolutiva, é permitido praticar os atos destinados a conservá-lo”. Conservação de direitos – para resguardar ou conservar seus direitos o titular, às vezes, necessita tomar certas medidas preventivas ou repressivas. As medidas de caráter preventivo visam garantir o direito contra futura violação. Podem ser de natureza extrajudicial (garantias pessoais ou reais) e judiciais (arresto, sequestro, caução, busca e apreensão, etc) As medidas de caráter repressivo visam restaurar o direito violado. A pretensão é deduzida em juízo por meio da ação, pois a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito. A defesa privada ou autotutela só é admitida excepcionalmente, pois pode conduzir a excessos. É prevista na legítima defesa, no exercício regular de um direito, no estado de necessidade, na proteção possessória, etc.
  • 13. Modificação de direitos – os direitos subjetivos nem sempre conservam as características iniciais e permanecem inalterados durante sua existência. Podem sofrer mutações quanto ao seu objeto, quanto às pessoas, pois a manifestação da vontade com finalidade negocial pode objetivar a aquisição, conservação e também a modificação de direitos. A modificação dos direitos pode ser objetiva ou subjetiva. É objetiva quando diz respeito ao seu objeto; será subjetiva quando concerne à pessoa do seu titular, podendo dar-se inter vivos ou causa mortis. Certos direitos, por serem personalíssimos, constituídos intuitu personae, são insuscetíveis e modificação subjetiva, como sucede com os direitos de família puros. Extinção de direitos – o direito pode extinguir-se quando houver: o perecimento do objeto, alienação, renúncia, abandono, falecimento do titular de direito personalíssimo, prescrição, decadência, confusão, implemento de condição resolutiva, escoamento de prazo, perempção e desapropriação. Nem todas as causas apontadas podem ser consideradas negócio jurídico, pois muitas delas decorrem da lei e de fatos alheios à vontade das partes, como o perecimento do objeto provocado por um raio e a desapropriação. PRESSUPOSTOS DE EXISTÊNCIA DO NEGÓCIO JURÍDICO – os pressupostos de existência do negócio jurídico são os seus elementos estruturais. Optamos pelos seguintes: declaração de vontade, a finalidade negocial e a idoneidade do objeto. Assim, faltando qualquer desses requisitos, o negócio jurídico inexiste. Declaração de vontade – a vontade é pressuposto básico de todo negócio jurídico e é imprescindível que se exteriorize. A vontade interna, como a reserva mental, é indiferente para o direito, pois não houve a sua exteriorização. A vontade é um elemento de caráter subjetivo, que se revela através da declaração. Esta, portanto, e não aquela, constitui requisito de existência do negócio jurídico. Assim, pelo princípio da obrigatoriedade dos contratos, a vontade uma vez manifestada, obriga o contratante (pacta sunt servanda), significando que o contrato faz lei entre as partes não podendo, em tese, ser modificado pelo Judiciário. Em oposição a este princípio, temos a lei contratos ou da onerosidade excessiva, baseada na teoria da imprevisão que autoriza o recurso ao Judiciário para se pleitear a sua revisão. A manifestação da vontade pode ser expressa, tácita ou presumida. Expressa é a que se realiza por meio da palavra, falada ou escrita, e de gestos, sinais ou mímicas, sempre de modo explícito, possibilitando o imediato conhecimento do agente. Tácita é a declaração da vontade que se revela pelo comportamento do agente, pois comumente se deduz de uma pessoa a sua intenção. É a pessoa que não diz se aceita a doação de um carro, mas passa a usá-lo como se fosse seu. Frise-se que nos contratos a manifestação da vontade somente pode ser tácita quando a lei não exigir que seja expressa. Presumida é quando a declaração não é realizada pelo agente, mas a lei deduz, passado certo lapso de tempo, que ela foi emitida. Como exemplo temos as presunções de pagamento previstas nos arts. 322, 323 e 324, ou entendendo-se que, findo o prazo sem manifestação, terá o mesmo declarado sua vontade de forma presumida.
  • 14. A manifestação tácita da presumida diferem-se porque esta será sempre estabelecida em lei, enquanto que aquela será deduzida do comportamento do agente. As presunções legais são juris tantum, ou seja, admitem prova em contrário. O silêncio como manifestação da vontade – em regra o provérbio “quem cala consente” não se aplica ao direito, pois o silêncio nada significa, por constituir total ausência de manifestação de vontade e, como tal, não produzir efeitos. Todavia, em situações excepcionais, o silêncio poderá possuir algum significado. Assim, o art. 111 aduz que “o silêncio importa anuência, quando as circunstâncias e os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de vontade expressa.” Portanto, o silêncio pode ser interpretado como manifestação tácita de vontade quando a lei conferir a ele tal efeito, cabendo ao juiz examinar caso a caso, para verificar se o silêncio traduz ou não a manifestação da vontade. Reserva mental – ocorre reserva mental quando um dos declarantes oculta a sua verdadeira intenção, ou seja, quando não quer um efeito jurídico que declara querer. Tem por objetivo enganar o outro contratante, mas se este não sabe da reserva, o ato subsiste e produz os efeitos que o declarante não desejava. Assim, a reserva, isto é, o que se passa na cabeça do declarante, é um indiferente para o mundo jurídico e irrelevante no que se refere à validade e eficácia do negócio jurídico Pelo art. 110 percebe-se que a manifestação de vontade subsiste ainda que o seu autor haja feito a reserva mental de não querer o que manifestou, salvo se dela o destinatário tinha conhecimento”. Finalidade negocial – a finalidade negocial é o propósito de adquirir, conservar, modificar ou extinguir direitos. Sem essa intenção, a manifestação de vontade não caracteriza um negócio jurídico, podendo ser, dependendo do caso, um ato jurídico em sentido estrito. A existência de um negócio jurídico, portanto, consiste no exercício da autonomia privada. Há um poder de escolha da categoria jurídica. Permite-se que a vontade negocial proponha, dentre as espécies, variaçoes quanto a intensidade de cada uma. Idoneidade do objeto – Imagine se a intenção das partes é celebrar um contrato de mútuo. Diante de tal desiderato, é impossível que o objeto seja infungível, pois é da essência do contrato de mútuo que o mesmo recaia sobre um bem fungível. Para a constituição de uma hipoteca, é necessário que o bem seja imóvel, ou se trate de um navio ou de um avião. Os demais bens serão inidôneos para a celebração de tal negócio. Desta forma, o objeto jurídico deve ser idôneo, isto é, deve apresentar os requisitos ou qualidades que a lei exige para que o negócio produza os efeitos desejados. REQUISITOS DE VALIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO – para que o negócio jurídico produza efeitos, possibilitando a aquisição, modificação, conservação e extinção de direitos, deve preencher certos requisitos, apresentados como os de sua validade. Assim, são requisitos, de caráter geral, de validade do negócio jurídico: a) agente capaz; b) objeto lícito; c) forma prescrita ou não defesa em lei.
  • 15. Os requisitos podem ser específicos a determinados negócio como, por exemplo, a res, pretius et consensus na compra e venda. Capacidade do agente – a capacidade do agente (condição subjetiva) é a aptidão para intervir em negócios jurídicos como declarante ou declaratário. Trata-se da capacidade de fato ou de exercício, necessária para que uma pessoa possa exercer, por si só, os atos da vida civil. Pelo novo CC/2002 a capacidade plena é adquirida pelo indivíduo ao completar 18 anos de idade ou com a emancipação (art. 5º). A incapacidade, por sua vez, é a restrição legal ao exercício da vida civil e pode ser de duas espécies: absoluta e relativa. A incapacidade absoluta acarreta a proibição total do exercício, por si só, do direito, sob pena de nulidade (art. 166, I) A incapacidade relativa acarreta a anulabilidade do ato, salvo em hipóteses especiais (arts. 228, 666, 1.860, etc). Perceba que a declaração de vontade é elemento necessário à existência do negócio jurídico, enquanto a capacidade é requisito necessário à sua validade e eficácia, bem como ao poder de disposição do agente. Objeto lícito, possível, determinado ou determinável – a validade do negócio jurídico requer ainda objeto lícito, possível e determinado ou determinável (condição objetiva). Objeto lícito é aquele que não atenta contra a lei, a moral ou os bons costumes. Quando o negócio jurídico é imoral, os tribunais por vezes aplicam o princípio do direito de que ninguém pode valer-se de sua própria torpeza, nemo auditur propiam turpitudinem allegans, ou então o brocardo in pari causa turpitudinis cessat repetitio, em que se ambas as partes no contrato, agem com torpeza, não pode qualquer delas pedir a devolução do que pagou. O objeto deve, também, ser possível, pois quando impossível o negócio jurídico é nulo. A impossibilidade do objeto pode ser física ou jurídica. Impossibilidade física é a que emana de lei física ou naturais. A obrigação de colocar toda a água do oceano em um copo d’água, por exemplo. A impossibilidade deve ser absoluta, pois em se tratando de relativa, ou seja, aquela que atinge somente o devedor mas não outras pessoas, não constitui obstáculo ao negócio jurídico. A impossibilidade jurídica ocorre quando o ordenamento jurídico proíbe, expressamente, negócios a respeito de determinado bem, como os pacta corvina (herança de pessoa viva) ou a alienação de bens fora do comércio. Por fim, deve o objeto do negócio jurídico ser determinado (ou ao menos determinável). Admite-se, contudo, a venda de coisa incerta, indicada ao menos pelo gênero e qualidade (art. 243) ou a venda alternativa, cuja indeterminação cessa com a escolha ou concentração (art. 252). Forma – o terceiro requisito de validade do negócio jurídico é a forma que é o meio de revelação da vontade. Existem dois sistemas no que tange à prova como requisito de validade do negócio jurídico: o consensualismo, da liberdade das formas e o formalismo, ou de forma obrigatória. No direito brasileiro a forma é, em regra, livre. As partes podem celebrar o contrato por escrito, público ou particular, ou verbalmente, a não ser nos casos em que a lei, para dar maior segurança e seriedade ao negócio, exija a forma escrita, pública ou particular.
  • 16. REQUISITOS DE EFICÁCIA DO NEGÓCIO JURÍDICO – além dos elementos estruturais e essenciais, que constituem requisitos de existência e validade do negócio jurídico, pode este conter outros elementos meramente acidentais, introduzidos facultativamente pela vontade das partes, não necessários à sua existência. Uma vez convencionados (desde que não ofendam a ordem pública) possuem o mesmo valor dos elementos estruturais e essenciais, pois passam a integrá-lo de forma indissociável. São a condição, o termo e o encargo. CONDIÇÃO – Condição é o acontecimento futuro e incerto de que depende a eficácia do negócio jurídico. Da sua ocorrência depende o nascimento ou a extinção de um direito. Seu conceito encontra-se, hoje, no art 122 do CC. Perceba que a lei refere-se a condição é aquela que derive exclusivamente da vontade das partes, afastando as condições impostas por lei (condiciones juris). Elementos da condição – os elementos da condição são: a voluntariedade; a futuridade e a incerteza. Quanto à voluntariedade as partes devem querer e determinar o evento, pois se a eficácia do negócio jurídico for determinada por lei, não haverá condição, mas conditio juris. Quanto à futuridade perceba que em se tratando de fato passado ou presente, ainda que ignorado, não se considera condição. Veja o exemplo: prometo determinada quantia se meu bilhete tiver sido premiado no sorteio de ontem (não existe condição, pois ou o bilhete já foi premiado e a obrigação é pura e simples, ou o bilhete não o foi e a declaração é ineficaz). São as erroneamente denominadas condições impróprias. Quanto à incerteza o evento pode, objetivamente, realizar-se ou não. Exemplo: pagarei a dívida se tiver lucro na colheita. Assim, se o fato for futuro, mas certo, como a morte por exemplo, não teremos condição, mas sim termo. Negócios jurídicos que não admitem condição – as condições são admitidas em atos de natureza patrimonial, regra geral, com algumas exceções, como na aceitação e renúncia de herança, mas não podem integrar os de caráter patrimonial pessoal, como os direitos de família puros e os direito personalíssimos. Assim, não admitem condição, por exemplo, o casamento, o reconhecimento de filhos, a adoção, a emancipação, etc. Os atos que não admitem condição são chamados de atos puros. São eles: a) os negócios jurídicos que, por sua função, inadmitem incerteza; b) os atos jurídicos em sentido estrito c) os atos jurídicos de família d) os atos referentes ao exercício de direitos personalíssimos Classificação das condições Quanto à licitude – lícitas e ilícitas (art. 122 – todas as condições não contrárias à lei, à ordem pública ou aos bons costumes são lícitas). Ilícitas são, por exemplo, a cláusula de alguém mudar de religião, ou de matar alguém, ou entregar-se à prostituição. O CC nos artigos 122 e 123 proíbe expressamente as condições que privarem de todo efeito o negócio jurídico (perplexas), as que o sujeitarem ao puro arbítrio de uma das partes (meramente potestativas), as física ou juridicamente impossíveis e as incompreensíveis ou contraditórias.
  • 17. Quanto à possibilidade – possíveis e impossíveis (art. 124 – têm-se por inexistentes as condições impossíveis, quando resolutivas, e as de não fazer coisa impossível). No exemplo clássico: dar-te-ei R$ 100,00 se tocares o céu com o dedo. Repito: se a condição for resolutiva, ter-se-á como inexistente, somente a condição e não o negócio jurídico. Assim, se digo “o comodato se dará até o dia em que tocares o céu com o dedo”, o contrato de empréstimo será válido e a condição tida como inexistente, por impossível. Temos também as condições juridicamente impossíveis, ou seja, aquela que esbarra em condição expressa do ordenamento jurídico como, v.g., a condição estabelecida em adotar pessoa da mesma idade (impossível por força do art. 1.619 do CC/2002). As condições de não fazer coisa impossível são inexistentes porque não prejudicam o negócio, por falta de seriedade. Ora, se é impossível a condição, é porque não posso fazê- la. Diversa é a solução do Código quando as condições impossíveis são suspensivas, pois: Art. 123. Invalidam os negócios jurídicos que lhes são subordinados: I – as condições física ou juridicamente impossíveis, quando suspensivas; II - As condições ilícitas, ou e fazer coisa ilícita; III – as condições incompreensíveis ou contraditórias. Assim, quando a condição é suspensiva a eficácia do contrao está a ela subordinada. Se o evento é impossível, o negócio jamis alcançará a necessária eficácia. Quanto à fonte de onde promanam – casuais, potestativas e mistas. Casuais são aquelas que dependem do acaso, do fortuito, de fato totalmente alheio à vontade das partes. No exemplo, entregarei a você a quantia de R$ 1.000,00, se chover amanhã, a cláusula é casual Potestativas são aquelas que decorrem da vontade ou do poder de uma das partes, que pode provocar ou impedir a sua ocorrência. AS condições potestativas dividem-se em puramente potestativas e potestativas simples. As puramente potestativas são consideradas ilícitas pelo Código que inclui entre as condições defesas aquelas que se sujeitem ao puro arbítrio de uma das partes (art. 122). É a denominada cláusula si voluero (se me aprouver). As simplesmente potestativas são válidas porque não depende somente do arbítrio da vontade de uma das partes, mas também de algum acontecimento ou circunstância externa que escapa ao seu controle. Por exemplo: ganharás um carro se fores a Roma. Ora, o fato de ir a Roma não depende somente da vontade das partes, mas também da obtenção de tempo e de dinheiro (principalmente). São exemplos de condições simplesmente potestativas os artigos 420, 505, 509 e o 513, por exemplo. Mistas são condições que dependem simultaneamente da vontade das partes e da vontade de um terceiro. Exemplos: dar-te-ei um dinheiro se casares com determinadas pessoa ou se constituíres sociedade com fulano de tal. Quanto ao modo de atuação – a condição, sob esta lente, pode ser suspensiva ou resolutiva. Suspensiva é aquela que impede que o ato produza efeitos até a realização do evento futuro e incerto Resolutiva é aquela que resolve o direito transferido pelo negócio, ocorrido o evento futuro e incerto.
  • 18. Por fim, as condições ainda podem ser consideradas sob três estados: pendentes (quando ainda não ocorreu), verificada a ocorrência dá-se o implemento e não realizada ocorre a frustração. TERMO – termo o dia ou o momento em que começa ou se extingue a eficácia do negócio jurídico, podendo ter como unidade de medida a hora, o dia, o mês ou o ano. Termo convencional é, portanto, a cláusula contratual que subordina a eficácia do negócio jurídico a evento futuro e certo. Assim, aduz o art. 131 que o termo inicial suspende o exercício, mas não a aquisição do direito. Ora, o termo não suspende a aquisição do direito por ser evento futuro, mas dotado de certeza. Difere da condição, que subordina, como vimos, a eficácia do negócio a evento futuro e incerto (que pode nem acontecer). Assim, o titular do direito a termo pode, com maior razão, exercer sobre ele atos conservatórios. Pode ocorrer a conjugação da condição e do termo no mesmo negócio jurídico. Assim, v.g., “dou-te um consultório se te formares em medicina até os 25 anos”. Determinados negócios não admitem termo, como a aceitação ou renúncia de herança, a adoção, a emancipação, etc. Espécies – Termo convencional é inserido no contrato pela vontade das partes; Termo de direito é o que decorre da lei; Termo de graça é a dilação de prazo concedida ao devedor. Pode o termo, apesar de certo, não existir data certa, como no exemplo: determinado bem passará a pertencer a tal pessoa a partir da morte do proprietário (perceba que a morte é certa, porém a data incerta). Assim, pode o termo ainda ser dividido em certo e incerto. Existe também o termo inicial ou suspensivo (dies a quo) e final ou resolutivo (dies ad quem). Pode um contrato de locação ser celebrado para ter vigência a partir de determinada data (termo inicial) ou ser estipulado com prazo certo de término (termo final). Relembre-se que o termo inicial suspende o exercício, mas não a aquisição do direito. ENCARGO OU MODO – o encargo pode ser definido como uma determinação que, imposta pelo autor da liberalidade, a esta adere, restringindo-a. Trata-se de cláusula acessória às liberalidades (doação, testamento, etc), pela qual se impõe uma obrigação ao beneficiário. Não pode ser aposta em negócio a título oneroso, pois equivaleria a uma contraprestação. São exemplos de encargo as doações de terrenos feitas a um determinado município com a obrigação (com o encargo) de ali ser construída uma creche, ou uma escola, ou um ginásio, geralmente com o nome do doador. Outro exemplo seria a deixa de alguma herança a alguém com a obrigação de cuidar de determinada pessoa ou de algum animal. A principal característica do encargo é a sua obrigatoriedade, podendo, inclusive, o seu cumprimento ser exigido por meio da ação cominatória, a teor do art. 553 do CC. O terceiro porventura beneficiado também poderá exigir o cumprimento do encargo (também o instituidor), mas não poderá ingressar com ação revocatória (revogando a liberalidade), pois esse tipo de ação é privativa do instituidor. O Ministério Público, caso haja relevância na liberalidade, também poderia ingressar com ação revocatória, porém só após a morte do instituidor. O encargo difere da condição suspensiva porque esta impede a aquisição do direito, enquanto aquele não suspende a aquisição nem o exercício do direito. Perceba a
  • 19. distinção: para a condição emprega-se a partícula se; para o encargo emprega-se a expressão para que ou com a obrigação de. Difere também da condição resolutiva porque não conduz, por si só à revogação do ato. O instituidor do benefício poderá ou não propor ação revocatória, cuja sentença não terá efeito retroativo. O encargo ilícito ou impossível, salvo se constituir o motivo determinante da liberalidade, considera-se não escrito (art. 137). Assim, por exemplo, se a doação de um imóvel é feita para que o donatário nele mantenha casa de prostituição (atividade ilícita), sendo este o motivo determinante da liberalidade, todo o negócio jurídico será invalidade. DOS DEFEITOS DO NEGÓCIO JURÍDICO Introdução – Já vimos que a declaração de vontade é elemento estrutural ou requisito de existência do negócio jurídico. Após a análise da existência, temos que perscrutar acerca da validade do negócio jurídico. Assim, para ser válido é necessário que a vontade manifestada (requisito de existência) seja livre e espontânea. Inicialmente, vamos analisar, dentro do contexto da validade, as hipóteses em que a vontade se manifesta com algum vício que torne o negócio jurídico anulável. O CC/2002 menciona e regula seis defeitos: erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão (vícios de consentimento) e fraude contra credores (vício social)1. Por fim, ressalte-se que o prazo decadencial para pleitear-se a anulação do negócio jurídico eivado pelos vícios suso mencionados é de quatro anos, a teor do art. 178, II, do CC/2002. Vejamos, portanto, cada um dos vícios de per si. DO ERRO OU IGNORÂNCIA O erro consiste em uma falsa representação da realidade, sendo que nesta modalidade o agente se engana só. Quando o agente é induzido em erro pelo outro contratante o por terceiro, temos a figura do dolo. Diante disso, perceba que poucas são as ações anulatórias ajuizadas com base no erro, porque se torna difícil penetrar do âmago, no íntimo do autor para descobrir o que se passou em sua mente no momento da celebração do negócio. O dolo, por outro lado, se torna mais fácil, pois o induzimento foi exteriorizado, ou seja, pode ser comprovado e auferido objetivamente. Erro é a ideia falsa da realidade; ignorância é o completo desconhecimento da realidade. Num e noutro caso, o agente é levado a praticar o ato ou a realizar o negócio que não celebraria por certo, ou que praticaria em circunstâncias diversas, se estivesse devidamente esclarecido. O CC/2002 equiparou as duas expressões, conduzido às mesmas consequências, ou seja, à anulabilidade. Espécies – diversas são as modalidades de erro. Umas levam à anulabilidade, outras não, sendo irrelevantes, acidentais, portanto. A mais importante distinção é a que divide, portanto, o erro em substancial e acidental. 1 Lembrem-se que hoje em dia o vício social da simulação torna o ato jurídico nulo e não mais anulável.
  • 20. Erro substancial e erro acidental – como dito, não é qualquer espécie de erro que torna anulável o negócio jurídico. Para tanto deve ser substancial, escusável e real. Erro substancial é aquele que recai sobre circunstâncias e aspectos relevantes do negócio. Deve ser a causa determinante, ou seja, se fosse conhecida a realidade o negócio não seria celebrado. Acidental, por sua vez, é o erro que se refere a circunstâncias de somenos importância e que não acarretam prejuízo efetivo. Assim, mesmo conhecida a realidade, o negócio se realizaria. Pelo CC/2002 temos a dicção do art. 143 quando expressamente aduz que “o erro de cálculo apenas autoriza a retificação da declaração da vontade”. Como exemplo temos quando a parte fixa o preço final da venda com base na quantia unitária e computa, de forma inexata, o preço global. Temos aí o erro de cálculo que, por ser acidental, não invalida o negócio, simplesmente permite a sua retificação Não deixou o legislador conceitos vagos sobre a definição do erro substancial. Ao contrário, enunciou-os no art. 139, verbis: “Art. 139. o erro é substancial quando: I – interessa à natureza do negócio, ao objeto principal da declaração, ou a alguma das qualidade a ele essenciais; II – concerne à identidade ou à qualidade essencial da pessoa a quem se refira a declaração de vontade, desde que tenha influído nesta de modo relevante; III – sendo de direito e não implicando recusa à aplicação da lei, for o motivo único ou principal do negócio jurídico” Assim, temos: a) erro sobre a natureza do negócio (error in negotio) – é aquele em que uma das partes manifesta a sua vontade pretendendo e supondo celebrar determinado negócio jurídico e, na verdade, realiza outro diferente. (Ex: quer alugar e escreve vender; quer vender e a outra parte entende que houve doação, etc) b) erro sobre o objeto principal da declaração (error in corpore) – é aquele que incide sobre a identidade do objeto. A manifestação da vontade recai sobre objeto diverso daquele que o agente tinha em mente. (Ex: o adquirente que pensa estar adquirindo um imóvel muito valorizado, pois localizado na Rua X, quando descobre que trata-se de um imóvel desvalorizado, na periferia, na rua de mesmo nome; a pessoa que adquire um quadro de um aprendiz, pensando tratar-se de um pintor famoso; a pessoa que se propõe a alugar sua casa na cidade e o outro contratante entende tratar-se de sua casa de praia, etc). c) erro sobre alguma das qualidades essenciais do objeto principal (error in substantia ou error in qualitate) – ocorre quando o motivo determinante do negócio é a suposição de que o objeto possui uma determinada qualidade que, posteriormente, verifica não existir. Veja que o erro não recai sobre a identidade do objeto, que é o mesmo que se encontrava no pensamento do agente, mas aquele objeto não possui as qualidades que este reputava essenciais e que influíram na decisão de realizar o negócio. (Ex: os famosos candelabros prateados que o agente adquire pensando ser de prata; a pessoa que adquire um quadro por alto preço, pensando tratar-se de um original quando , em verdade, é mera cópia; o agente que compra um relógio dourado pensando tratar-se de relógio de ouro, etc). d) erro quanto à identidade ou à qualidade da pessoa a quem se refere a declaração da vontade (error in persona) – são aqueles negócios intuitu personae, sendo tanto da identidade quanto das qualidades da pessoa. (Ex: doação ou testamento a pessoa que supõe ter salvo a sua vida; casamento de uma jovem de boa formação com um indivíduo que se sabe depois ser um desclassificado, etc) OBS – para ser invalidante é necessário que o erro tenha influído na declaração da vontade de modo relevante (art. 139, II)
  • 21. OBS2 – pelo art. 142 o erro de indicação da pessoa ou da coisa a que se referir a declaração da vontade não viciará o negócio se puder identificar a coisa ou a pessoa cogitada. (Ex: o doador beneficia seu sobrinho Antônio quando na realidade não possui nenhum sobrinho, mas sim um primo de nome Antônio; ou a doação de um quadro, quando na verdade é uma escultura, etc). e) erro de direito (error juris) – é o falso conhecimento ou a ignorância da norma jurídica aplicável à situação concreta, desde que seja o motivo único ou principal do negócio jurídico e não implique recusa à aplicação da lei (art. 139, III). (Ex: pessoa que contrata importação de determinada mercadoria ignorando existir lei que proíba tal importação. Assim, como tal ignorância foi a causa determinante do ato, pode ser alegada para anular o contrato, sem com isso se pretender que a lei seja descumprida). Erro substancial e vício redibitório – embora a teoria dos vícios redibitórios ou vícios ocultos (artigos 441 a 446) se assente na existência de um erro e guarde semelhanças com a teoria do erro quanto às qualidades essenciais do objeto, os dois institutos não se confundem. O vício redibitório é erro objetivo sobre a coisa que contém um defeito oculto. O seu fundamento é a obrigação que a lei impõe a todo alienante, nos contratos comutativos, de garantir ao adquirente o uso da coisa. Uma vez existente o defeito são cabíveis as chamadas ações edilícias (redibitória e quanti minoris ou estimatória), sendo decadencial e exíguo o prazo para a propositura da ação (regra geral, 30 dias tratando-se de bens móveis, um ano de imóvel). O erro quanto às qualidades essenciais do objeto é subjetivo, ou seja, reside na manifestação da vontade do agente. Dá ensejo à anulação anulatória, como já vimos, com prazo decadencial de 04 anos. Assim, se alguém adquire um relógio que não funciona, em virtude da inexistência de uma peça interna é vício redibitório, porém se o mesmo relógio parecia ser de ouro, mas não é trata-se de vício redibitório. Perceba, por fim, que no vício redibitório o objeto não possui as mesmas características que seus similares,uma vez que está com um vício, enquanto que no erro essencial todos os objetos possuem as mesmas características, porém a mesma não foi assimilada pelo adquirente. Erro escusável – é o erro justificável, ou seja, inevitável. Por ser inevitável, a lei me escusa, me perdoa. Assim, erro escusável = erro inevitável. Pelo art. 138 percebe-se de forma cristalina que para pleitear-se a anulação do negócio jurídico deverá o erro ser escusável, pois somente é anulável o erro “que poderia ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio”. Assim, adota o Código o padrão do homem médio para a aferição da escusabilidade, entendendo alguns doutrinadores que dependendo do caso, pode ainda analisar o caso concreto, considerando as condições pessoais de quem alega o erro, apesar d disposição legal. Permissa venia, entendo que hoje em dia, a teor do art. 138 a aferição da escusabilidade se dá pelo padrão do homem médio e não mais diante do caso concreto. Mas segundo Carlos Roberto Gonçalves “muito provavelmente, malgrado a adoção do padrão abstrato do homem médio pelo novo estatuto civil, sob a justificativa de proteger melhor o terceiro de boa-fé, a jurisprudência continuará aplicando o critério objetivo, que permite ao juiz fazer justiça no caso concreto”.
  • 22. Erro real – o erro, para fins de anulação de negócio jurídico, não basta que seja substancial e escusável. Deverá ser também real, ou seja, tangível, palpável, importando efetivo prejuízo para o interessado. Assim, o erro de fabricação de um determinado veículo é substancial e real, pois se o adquirente tivesse conhecimento da realidade não o teria comprado. Por outro lado, se o erro dissesse respeito à cor do veículo (preto em vez de azul-escuro, v.g), não seria real, pois seria irrelevante para a fixação do preço, não tornando o negócio anulável. O falso motivo – o novo CC/2002 substituiu a “falsa causa” por “falso motivo”. Assim, “o falso motivo só vicia a declaração de vontade quando expresso como razão determinante”. Assim, o motivo do negócio, ou seja, as razões psicológicas que levam a pessoa a realizá-lo, não precisa ser mencionado pelas partes. Ora, os motivos, as razões subjetivas, interiores, são consideradas sem relevância para o direito. Em uma compra e venda por exemplo, pouco importa o motivo pelo qual o comprador resolveu adquirir o produto, são estranhos ao direito e não precisam ser mencionados. Agora, o motivo quando expresso como razão determinante poderá viciar o negócio caso seja falso. Muito comum em certas liberalidades que o doador faça inserir o motivo pelo qual o mesmo está realizando prefalada doação (filiação, parentesco, salvou a vida, etc). Nestes casos, se os motivos alegados se revelam posteriormente falsos o contrato poderá ser anulado. Transmissão errônea da vontade – o CC/2002 equipara o erro à transmissão defeituosa da vontade, no art. 141 quando diz: “a transmissão errônea da vontade por meios interpostos é anulável nos mesmo casos em que o é a declaração direta”. É quando o declarante se de mensageiro ou núncio ou por meio de comunicação (telex, fax, e-mail, etc) e a transmissão da vontade, nesses casos, não se faz com fidelidade, estabelecendo-se uma divergência entre o querido e o que foi transmitido erroneamente (mensagem truncada), caracterizando o vício que propicia a anulação do negócio. É bem verdade que a referida anulabilidade só se apresenta se a diferença emitida e a comunicada seja derivada do mero acaso ou de algum equívoco, não incidindo quando o intermediário intencionalmente comunica á outra parte uma declaração diversa da que lhe foi confiada. Se a vontade foi mal transmitida pelo mensageiro há de se apurar se não houve culpa in eligendo ou mesmo in vigilando do emitente das declarações. Se a resposta for afirmativa, não pode tal erro infirmar o ato por ser inescusável. Convalescimento do erro – Dispõe o art. 144: “o erro não prejudica a validade do negócio jurídico quando a pessoa, a quem a manifestação de vontade se dirige, se oferecer para executá-la na conformidade da vontade real do manifestante”. Temos portanto a hipótese do princípio da conservação dos atos e negócios jurídicos, segundo a qual não haverá nulidade sem prejuízo. Vejamos o seguinte exemplo: João pensa que comprou o lote 2 da quadra A, quando, em verdade, adquiriu o lote 2 da quadra B. Pelo que já vimos, trata-se de erro substancial, mas antes de anular o negócio o vendedor entrega-lhe o lote 2 da quadra A, não havendo assim qualquer dano a João. Interesse negativo – questão tormentosa e não muito discutida na doutrina e jurisprudência, diz respeito ao denominado interesse negativo.
  • 23. Imagine a situação em que o vendedor é surpreendido por uma ação anulatória, por sua vez, julgada procedente, com os consectários da sucumbência, sem que tenha concorrido para o erro do comprador. Ora, perceba que tal situação se configura injusta, máxime já tenha dado destinação ao numerário recebido. Segundo Venosa, “a anulação por erro redunda em situação toda especial, ou seja, a responsabilidade é exatamente daquele que pede a anulação do negócio, já que é o único responsável por sua má destinação”. Seria extremamente injusto que o contratante que não errou, nem concorreu para o erro do outro, arcasse com duplo prejuízo. Ou seja, a anulação do negócio jurídico e a absorção do prejuízo pelas importâncias pagas a serem devolvidas ou pagas, além da sucumbência. Devem os juízes atentar para essa importante particularidade ao decretar a anulação do negócio por erro. DO DOLO Dolo é o artifício ou expediente astucioso, empregado para induzir alguém à prática de uma ato que o prejudica e aproveita ao autor do dolo ou a terceiro. Consiste em sugestões ou manobras maliciosamente levadas a efeito por uma parte, a fim de conseguir da outra uma emissão de vontade que lhe traga proveito ou a terceiro. A diferença entre o dolo e o erro é que este é espontâneo, no sentido de que a vítima se engana só, enquanto que o dolo é provocado intencionalmente pela outra parte ou por terceiro, fazendo com que aquele também se equivoque. Frise-se que o dolo civil não se confunde com o dolo criminal (intenção de praticar o feto que se sabe contrário à lei). Dolo civil tem sentido bem mais amplo, pois é todo artifício empregado para enganar alguém. Já salientamos que muito mais fácil é provar o dolo, uma vez que o mesmo se exterioriza. Enquanto que o erro é de natureza subjetiva e se torna impossível penetrar no íntimo do autor para descobrir o que realmente se passou em sua mente no momento da declaração da vontade. O dolo também se distingue da simulação, pois nesta a vítima é lesada sem mesmo participar do negócio simulado. As partes fingem uma simulação visando fraudar a lei ou prejudicar terceiros. No caso do dolo a vítima participa diretamente do negócio, mas somente a outra conhece a maquinação e age de má-fé. Espécies de dolo – existem várias espécies de dolo, as quais podemos destacar: a) Dolo principal e dolo acidental – é a classificação mais importante. Pela leitura do art. 145 podemos concluir que “são os negócios jurídicos anulados por dolo, quando este for a sua causa”. Configura-se o dolo principal quando o negócio é realizado somente porque houve o induzimento malicioso de uma das partes, ou seja, sem a manobra maliciosa a avença não teria se concretizado. Acidental é aquele “quando, a seu despeito, o negócio seria realizado, embora por outro modo”. São, pois, as condições do negócio. Este seria realizado independentemente da malícia empregada pela outra parte ou pelo terceiro, porém em condições favoráveis ao agente. Por isso, o dolo acidental não vicia o negócio e só obriga à satisfação em perdas e danos (art. 146) Veja o exemplo: Pedro adquire por R$ 100.000,00 um imóvel que somente vale R$ 50.000,00, em virtude da conduta dolosa do vendedor. Trata-se, portanto, de dolo acidental, pois a pessoa realizaria o negócio, sendo o dolo presente apenas no valor cobrado.
  • 24. Em se tratando de dolo eventual, existe apenas ato ilícito que não permite, portanto, postular a invalidação do contrato, mas tão somente exigir a reparação do prejuízo experimentado, no caso, a diferença do R$ 50.000,00. b) dolus bonus e dolus malus – dolus bonus é o dolo tolerável, destituído de gravidade suficiente para viciar a manifestação da vontade. É comum no comércio em geral, onde os comerciantes exageram nas qualidades de seus produtos, na tentativa de vendê-los. No Direito do Consumidor é o denominado puffing (meros exageros). Não torna anulável o negócio jurídico porque de certa maneira as pessoas já contam com ele e não se deixam envolver, a menos que não possuam a diligência do homem médio É bem verdade que somente um homem com credulidade infantil se porá a adquirir tudo o que lhe é oferecido apenas porque o vendedor apregoa enfaticamente seu produto. Frise-se que em tais situações falta o requisito da gravidade. Em outro diapasão, o dolus bonus pode se dar quando existe um fim lícito, elogiável e nobre, por exemplo, quando se induz alguém a tomar remédio que se recusa ingerir, porém que lhe seja indispensável. Dolus malus é aquele revestido de gravidade, exercido com o fito de realmente ludibriar e prejudicar. Essa modalidade é que se distingue entre dolo principal e dolo acidental. Só o dolus malus (enquanto essencial) vicia o consentimento e acarreta a anulação do negócio jurídico. A lei, por sua vez, não dita normas para distinguir o dolo tolerado daquele que inquina de anulabilidade o negócio, cabendo ao juiz, diante do caso concreto, decidir se o contratante excedeu ou não o limite do razoável. c) Dolo comissivo ou positivo e dolo omissivo ou negativo – o procedimento doloso pode dar-se através de uma ação (comportamentos maliciosos) ou através de omissões. Para tanto, dispõe o art. 147 do CC/2002 que “nos negócios jurídicos bilaterais, o silêncio intencional de uma das partes a respeito de fato ou qualidade que a outra parte haja ignorado, constitui omissão dolosa, provando-se que sem ela o negócio não se teria celebrado” O dolo omissivo esteia-se no princípio da boa-fé que deve nortear todos os negócios jurídicos (art. 422). Em diversas passagens o Código pune aquele que agiu dolosamente, como por exemplo o art. 180 que pune o menor que oculta dolosamente a sua idade ou o art. 766 que acarreta a perda do direito de recebimento do seguro ao estipulante de seguro de vida que oculta dolosamente ser portador de doença grave quando da estipulação. d) dolo de terceiro – o dolo pode ser proveniente do outro contratante ou de terceiro estranho ao negócio. Veja a disposição do art. 148: “Art. 148. Pode também ser anulado o negócio jurídico por dolo de terceiro, se a parte a quem aproveite dele tivesse ou devesse ter conhecimento; em caso contrário, ainda que subsista o negócio jurídico, o terceiro responderá por todas as perdas e danos da parte a quem ludibriou”. Assim, o dolo de terceiro somente enseja a sua anulação se a parte a quem aproveite o negócio dele tivesse ou devesse ter conhecimento. Se o beneficiado pelo dolo de terceiro não adverte a outra parte está tacitamente aderindo ao expediente astucioso. Um exemplo: Pedro deseja vender seu relógio a João que, é ludibriado por Marcos aduzindo que o relógio é de ouro, tendo Pedro tudo escutado, porém nada feito mesmo sabendo que o relógio não era de ouro. O negócio torna-se anulável por erro de terceiro, pois o vendedor sabia e se beneficiou do engodo. Se o vendedor não sabia do dolo praticado pelo terceiro, este responderá pelas perdas e danos, não podendo o negócio ser anulado.
  • 25. e) dolo do representante – a distinção agora e baseada na coerência está em que o representante do negócio não pode ser considerado terceiro, pois atua em nome do representado. Assim, quando atua no limite de seus poderes considera-se o ato praticado pelo próprio representado. Ora, se o representante, nesta situação induz em dolo a outra parte o negócio poderá ser anulado. No art. 149 o Código ainda distingue o dolo do representante legal e o dolo do representante convencional. Enquanto que no primeiro caso o ato é anulável até o benefício que o representado teve, no segundo o representante e representado responderão solidariamente em relação às perdas e danos. f) dolo bilateral – o dolo de ambas as partes é disciplinado no art. 150, ou seja, quando ambas as partes procederem com dolo, nenhuma pode alegá-lo para anular o negócio ou reclamar indenização. É a regra de que ninguém pode valer-se de sua própria torpeza ou nemo auditur propriam turpitudinem allegans. Nessa situação, a doutrina tem entendido a compensação até mesmo do dolo principal com o dolo acidental, pois é certo que ambas procederam com dolo, não havendo boa-fé a defender. g) dolo de aproveitamento – essa espécie de dolo constitui na verdade o elemento subjetivo de outro defeito do negócio jurídico que é o estado de perigo, conforme veremos adiante. DA COAÇÃO Coação é toda ameaça ou pressão exercida sobre um indivíduo para forçá-lo, contra a sua vontade, a praticar um ato ou realizar um negócio. O que caracteriza é o emprego da violência psicológica para viciar a vontade. A coação é vício maior do que o dolo, pois impede a livre manifestação da vontade, enquanto que o dolo incide tão somente sobre a inteligência da vítima. Espécies – A coação pode ser dividida em coação absoluta ou física ( vis absoluta) ou coação relativa ou psicológica (vis compulsiva). Na coação absoluta inocorre qualquer consentimento ou manifestação da vontade, sendo que a vantagem pretendida pelo coator se dá através do emprego de força física. Ora, como já vimos, neste caso não há manifestação da vontade não se caracterizando, portanto, em vício de consentimento (lembre-se que antes de analisarmos os requisitos de validade, analisamos os requisitos de existência. Assim, não havendo manifestação da vontade, o ato é inexistente, não se cogitando perscrutar acerca da suposta anulabilidade do mesmo. Exemplo é a colocação da impressão digital do analfabeto no contrato à força. Fácil perceber que no contrato não houve sequer a manifestação da vontade, sendo o mesmo inexistente. Já na coação relativa (vis compulsiva) deixa-se uma opção ou escolha à vítima], pois ela ou pratica o ato exigido pelo coator ou corre o risco de sofrer as consequências da ameaça por ele feita. E o exemplo característico é o do assaltante que com arma em punho declara: “a bolsa ou a vida”. Outra distinção seria a coação principal e a coação acidental, tratada da mesma forma como no dolo. Assim, somente a coação principal seria causa de anulabilidade, pois se daria como causa determinante do negócio. Já na coação acidental, esta influenciaria apenas nas condições da avenca, ou seja, sem ela o negócio assim mesmo se realizaria, mas
  • 26. em condições menos desfavoráveis à vítima. A coação acidental somente obriga ao ressarcimento do prejuízo, enquanto que a principal constituiria causa de anulação do negócio jurídico. Requisitos da coação – dispõe, com efeito, o art. 151: “Art. 151. A coação, para viciar a declaração da vontade, há de ser tal que incuta ao paciente temor de dano iminente e considerável à sua pessoa, à sua família, ou a seus bens. Parágrafo único. Se disse respeito a pessoa não pertencente à família do paciente, o juiz, com base nas circunstâncias, decidirá se houve coação” Assim, a coação: a) deve ser a causa determinante do ato – ou seja, deve haver uma relação de causalidade entre a coação e o ato extorquido, sendo certo que o negócio deve ter sido realizado somente por ter havido grave ameaça ou violência que, por sua vez, provocou na vítima fundado receio de dano à sua pessoa, ou à sua família, ou a seus bens. Incumbe à parte que pretende a anulação do negócio jurídico o ônus de provar o nexo de causa e efeito entre a violência e a anuência. b) deve ser grave – a coação para viciar a manifestação da vontade deve ser de tal intensidade que efetivamente incuta na vítima um fundado temor de dano ao bem que ele considera relevante. Para avaliar prefalado dano segue-se o critério concreto e não o padrão do homem médio, ou seja, o de avaliar em cada caso as condições particulares ou pessoais da vítima, nos termos do art. 152: “No apreciar a coação, ter-se-ão em conta o sexo, a idade, a condição, a saúde, o temperamento do paciente e todas as demais circunstâncias que possam influir na gravidade dela”. Assim, um ato incapaz de abalar um homem pode ser suficiente para atemorizar uma mulher ou uma pessoa idosa. O simples temor reverencial, como dito no art. 153, não se considera coação. Desta forma, o receio de desgostar os pais ou as pessoas a quem se deve obediência e respeito (superiores hierárquicos) não se constitui em medida suficiente e bastante para anular o negócio jurídico. Note que o Código aduz em “simples” temor reverencial. Assim, no casamento quando há graves ameaças de castigo à filha obrigando-a a casar ou quando o superior faz graves ameaças ao comportamento do empregado, existe coação, podendo tais situações ser anuladas, uma vez que houve nos exemplos grave ameaça ou violência. c) deve ser injusta – a coação deve ainda ser ilícita, contrária ao direito ou abusiva. Diz o art. 153 que “não se considera coação o exercício normal de um direito”. Assim, a ameaça feita pelo credor de protestar o título de crédito vencido ou executar o mesmo, ou o pedido de abertura de inquérito, a intimidação feita pelo homem a uma mulher de propor ação de investigação de paternidade, etc, não se constituem coação por se tratarem de situações lícitas. Porém se o credor se utiliza se um meio normal, mas para obter vantagens ilícitas, haverá coação. Exemplo: o credor que ameaça executar um cheque de uma devedora, caso ela não se case com ele. Neste caso, constitui coação, independente de ter havido culpa na conduta da vítima. d) deve dizer respeito a dano atual ou iminente – o mal é iminente sempre que a vítima não possua meios para furtar-se ao dano. Assim, a existência de dilatado intervalo entre a ameaça e o desfecho do ato extorquido permite à vítima ilidir-lhe os efeitos , socorrendo-se de outras pessoas. Isto porque o mal somente é iminente quando a vítima não tenha meios para furtar-se ao danos, quer com os próprios recursos, quer mediante auxílio de outrem, ou da autoridade pública.
  • 27. e) deve constituir ameaça de prejuízo à pessoa ou a bens da vítima ou a pessoas de sua família – a intimidação à pessoa pode dar-se sob diversas formas, como sofrimentos físicos, cárcere privado, tortura, etc. Pode dar-se também ameaça ao dano patrimonial como incêndio, depredação, greve, etc. O termo família utilizado no art. 151 tem hoje uma acepção ampla, compreendendo não só a resultante de casamento, com a proveniente de união estável. Também compreendem os adotivos, os afins, além, é claro, dos consanguíneos. O Código, inclusive, ampliou o conceito permitindo que outras pessoas que não as da família, pudessem ser enquadradas na coação, como os amigos, vizinhos, etc, dependendo sempre do caso concreto. Coação exercida por terceiro – Está prevista no art. 154, pois “vicia o negócio jurídico a coação exercida por terceiro, se dela tivesse ou devesse ter conhecimento a parte a que aproveite, e esta responderá solidariamente com aquele por perdas e danos”. Perceba que, a teor do art. 155, o negócio jurídico subsistirá se a coação decorrer de ato de terceiro, sem que a parte a que aproveite dela tivesse ou devesse ter conhecimento, respondendo o autor pelas perdas e danos. DO ESTADO DE PERIGO O Código Civil de 2002 apresenta, como inovação, dois institutos que não estavam previstos no Código Civil de 1916: o estado de perigo e a lesão. Constitui o estado de perigo a situação de extrema necessidade que conduz uma pessoa a celebrar negócio jurídico em que assume prestação desproporcional e excessiva. “Art. 156. Configura-se o estado de perigo quando alguém, premido da necessidade de salvar-se, ou a pessoa de sua família, de grave dano conhecido pela outra parte, assume obrigação excessivamente onerosa. Parágrafo único. Tratando-se de pessoa não pertencente à família do declarante, o juiz decidirá segundo as circunstâncias” Exemplos corriqueiros do estado de perigo são os náufragos quando prometem a outrem enorme recompensa por seu salvamento, ou aquele que assaltado por bandidos e deixado em local ermo promete recompensa vultuosa a aquele que o ajuda, ou , por fim, o pai que em caso de seqüestro, realiza maus negócios para levantar a quantia do resgate, etc. Exemplo muito comum hoje em dia é, também, o do médico ou da clínica que cobra quantia exorbitante, obrigando inclusive a deixar cheque assinado do valor cobrado para poder salvar a vida de um familiar. A anulabilidade do negócio jurídico por estado de perigo encontra sua justificativa nos preceitos de probidade e boa-fé que devem nortear todos os negócios jurídicos, a teor do art. 422 do CC/2002. Elementos do estado de perigo – pelo art. 156 observamos os elementos estruturais do estado de perigo. São eles: a) uma situação de necessidade – o agente deve estar premido de necessidade para salvar-se ou a pessoa de sua família. Assim, é requisito sine qua non a necessidade como título justificativo ou constitutivo da pretensão anulatória. b) iminência de dano atual e grave – o perigo de dano deve ser atual, iminente, capaz de transmitir o receio de que se não for afastado as conseqüências temidas fatalmente advirão. A gravidade do dano é, pois, elemento integrante do conceito de estado de perigo, devendo ser avaliada objetivamente pelo juiz.
  • 28. c) nexo de causalidade entre a declaração e o perigo de grave dano – a vontade deve apresentar-se distorcida em conseqüência do perigo de dano, devendo haver certo nexo, pois a declaração entende-se oriunda do perigo de grave dano. d) Incidência da ameaça de dano sobre a pessoa do próprio declarante ou de sua família – da mesma forma da coação, o elemento família deve ser interpretado da forma mais ampla possível, podendo até mesmo ocorre o desvirtuamento da vontade do declarante em se tratando de pessoa não pertencente à família, como é o caso do namorado, amigo íntimo, noivo, etc, cabendo ao juiz decidir de acordo com o caso concreto. e) conhecimento do perigo pela outra parte – no estado de perigo existe, como regra, um aproveitamento da situação para a obtenção da vantagem indevida. Assim, se o que prestou o serviço não sabia do perigo, deve presumir-se que agiu de boa-fé, fazendo-se apenas a redução do excesso contido na proposta onerosa, não se anulando o negócio. f) Assunção de obrigação excessivamente onerosa – é mister que as condições sejam significativamente desproporcionais, não se tratando do princípio da onerosidade excessiva adotada pela teoria da imprevisão, pois este é em decorrência de fato extraordinário e imprevisível. Desta forma, o objetivo do estado de perigo é afastar a proteção a um contrato abusivo entabulado em condições de dificuldade ou necessidade do declarante. DA LESÃO O novo Código reintroduz, de forma explícita, o instituto da lesão como modalidade de defeito do negócio jurídico, no art. 157 e seus dois parágrafos. Lesão é o prejuízo resultante da enorme desproporção existente entre as prestações de um contrato, no momento de sua celebração, determinada pela premente necessidade ou inexperiência de uma das partes. A lesão se diferencia do estado de perigo de forma bastante sutil. Diversos doutrinadores sugerem a fusão dos dois institutos em um só, inclusive durante a tramitação do Projeto do novo Código duas emendas foram neste sentido. Porém, o próprio relatório da Comissão Revisora assim conclui: “o estado de perigo ocorre quando alguém se encontra em perigo e, por isso, assume obrigação excessivamente onerosa. A lesão ocorre quando não há estado de perigo, por necessidade de salvar-se; a ‘premente necessidade’ é, por exemplo, a de obter recursos. Por outro lado, admitindo o § 2° do art. 157 a suplementação da contraprestação, isso indica que ela só ocorre em contratos comutativos, em que a prestação é um dar (e não um fazer). A lesão ocorre quando há usura real. Não há lesão, ao contrário do que ocorre com o estado de perigo, que vicie a simples oferta. Ademais, na lesão não é preciso que a outra parte saiba da necessidade ou da inexperiência; a lesão é objetiva. Já no estado de perigo é preciso que a parte beneficiada saiba que a obrigação foi assumida pela parte contrária para que esta se salve de grave dano; o estado de perigo é subjetivo.” A ausência do instituto no Código de 1916 foi justificada por Beviláqüa em que a parte prejudicada teria outros meios para resguardar seus direitos, como o erro, dolo, coação, simulação e fraude. Bem verdade é que o instituto não se amoldava com os princípios liberais do CC/1916. A lesão passou a existir na Lei n° 1.521/51 que define os crimes contra a economia popular, em seu art. 4°. Assim, constitui crime a usura pecuniária ou real, ou seja, aquela que visa “obter, ou estipular, em qualquer contrato, abusando da premente necessidade, inexperiência ou leviandade de outra parte, lucro patrimonial que exceda o quinto do valor corrente ou justo da prestação feita ou prometida”
  • 29. Posteriormente, o CDC veio disciplinar a lesão em diversos de seus artigos, vindo a atender aos reclamos da doutrina. Hoje, na forma como está disciplinada do CC/2002, a lesão pode ser alegada por qualquer das partes contratantes e não apenas pelo vendedor. Elementos da lesão – a lesão está composta de dois elementos: o objetivo, consistente da manifesta desproporção entre as prestações recíprocas e o subjetivo, caracterizado pela inexperiência ou premente necessidade do lesado. Assim, caberá ao juiz, diante do caso concreto (diferente da dicção da lesão prevista na Lei dos Crimes contra a Economia Popular) averiguar o tamanho da desproporção, sendo que o momento para se averiguar a desproporção é o da celebração do negócio. DA FRAUDE CONTRA CREDORES A fraude contra credores está inserida no novo Código Civil no rol dos defeitos do negócio jurídico, mas não como vício de consentimento e sim como vício social. Isto porque a fraude contra credores não conduz a um descompasso entre o íntimo querer do agente e a sua declaração. Mas é exteriorizada com a intenção de prejudicar terceiros, por esta razão é considerada como vício social. A simulação, que hoje em dia é causa de nulidade e não de anulabilidade do negócio jurídico, também está inserida no rol dos vícios sociais. A natureza jurídica do instituto assenta-se na garantia dos credores à satisfação do débito, tendo em vista o patrimônio do devedor. Assim, o patrimônio do devedor constitui a garantia do cumprimento de suas obrigações. Se ele o desfalca maliciosa e substancialmente, a ponto de não mais garantir o pagamento de suas dívidas, tornando-se insolvente, configura-se a fraude contra credores. Esta situação só se caracteriza, portanto, se o devedor se tornar insolvente ou na sua iminência, pois se o seu patrimônio basta com sobra para cumprir com suas obrigações, não há que se cogitar em fraude contra credores, ampla será a sua liberdade para dispor de seus bens. Fraude contra credores é, portanto, todo ato praticado pelo devedor, suscetível de diminuir ou onerar seu patrimônio, reduzindo ou eliminando a garantia que este representa para pagamento de suas dívidas, praticado por devedor insolvente, ou por ele reduzido à insolvência. Elementos constitutivos – dois são os elementos que compõem a fraude contra credores: um elemento objetivo (eventus damni), ou seja, a própria insolvência que constitui o ato prejudicial ao credor; e o subjetivo ( consilium fraudis), que é a própria má-fé do devedor, consciência de prejudicar terceiros. Ao tratar da fraude, o legislador teve de optar entre proteger o interesse dos credores ou o do adquirente de boa-fé. Por isso o consilium fraudis (a não ser em determinadas exceções) deve ser provado, pois o credor somente logrará invalidar a alienação se provar a má-fé do adquirente. O art. 159 presume a má-fé do adquirente quando a insolvência do alienante for notória, ou houver motivo para ser conhecida do outro contratante. A notoriedade da insolvência pode ser evidenciada por diversos atos como, por exemplo, a existência de protesto ou execuções contra o alienante, etc. Destacamos algumas situações em que o consilium fraudis pode ser presumido: a) pela clandestinidade do ato; b) pela continuação dos bens alienados na posse do devedor quando deveriam os mesmos ter sido passados para terceiros;