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INSTITUTO SUPERIOR DE EDUCAÇÃO ANÍSIO TEIXEIRA
          FUNDAÇÃO HELENA ANTIPOFF




     O Autista na Escola Inclusiva




             Rosemary Furtado




               Ibirité – Minas Gerais
                     Março 2005
O Autista na Escola Inclusiva




       Rosemary Furtado




         Monografia apresentada na 1ª Turma do Curso de
         Pós-graduação Latu sensu Educação Especial na
         Escola Inclusiva, do Instituto Superior de Educação
         Anísio Teixeira, Fundação Helena Antipoff, da
         cidade de Ibirité, Estado de Minas Gerais, como
         exigência para a conclusão do curso, sob orientação
         da Profa. Vanêssa Tôrres de Oliveira.




       Ibirité – Minas Gerais
             Março 2005
À
Vanêssa Tôrres de Oliveira
por me transmitir conhecimento
e a importância da pesquisa e
trabalho científico.
Agradeço o apoio imensurável de
minha família e meus amigos que
compreenderam minha ausência
em diversos momentos.
ÍNDICE ANALÍTICO


INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 6

HISTÓRICO ................................................................................................................... 8
   História da Inclusão................................................................................................. 8
   História das Instituições Manicomiais ................................................................... 10
   Sujeitos de Direito e Dever ................................................................................... 13
   Estatuto da Criança e do Adolescente .................................................................. 13
   Educação Inclusiva ............................................................................................... 15
   A Questão Humanista na Inclusão........................................................................ 18
AUTISMO .................................................................................................................... 22
   Critérios Diagnósticos para F84.0 – 299.00 – Transtornos Autistas ..................... 26
   Possíveis Fatores de Autismo............................................................................... 28
   Os Tipos de Autismo............................................................................................. 29
   O Autista e a Noção de “Eu” ................................................................................. 30
   Dados Estatísticos ................................................................................................ 33
   O Desenvolvimento segundo Wallon .................................................................... 34
   Dados Biográficos ................................................................................................. 34
   A Escola de Wallon ............................................................................................... 37
   Afetividade ............................................................................................................ 37
   O Amor.................................................................................................................. 39
   A Criança Autista e o Desejo Paterno................................................................... 40
   A Fase do Espelho................................................................................................ 42
   Cognição e Linguagem ......................................................................................... 47
INCLUSÃO DO AUTISTA ................................................................................................ 52
   Inclusão e Emoção................................................................................................ 54
   Cognição e Emoção.............................................................................................. 56
   Escola ................................................................................................................... 57
   A Escola e a Construção do Sujeito...................................................................... 61
   Os Objetos em Sala .............................................................................................. 62
   O Professor........................................................................................................... 63
   As Várias Linguagens da Criança......................................................................... 64
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................. 66

ANEXO I – QUESTIONÁRIO ........................................................................................... 69
   Perguntas.............................................................................................................. 69
   Respostas ............................................................................................................. 70
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................... 73
INTRODUÇÃO




   Às vezes me pergunto: O que tanto assusta quando o tema é “criança autista e

inclusão”? Muitos professores vêem o trabalho como dom de quem com estas

crianças trabalha e dizem que não dariam conta, que não saberiam lidar com elas.


   É preciso vencer as barreiras e preconceitos instalados nas pessoas e na escola

para que seja feito um trabalho satisfatório e eficiente, sem pré-conceituar a criança

e o potencial investido nela, seja pela família ou pela escola.


   O tema aqui discutido é novo e polêmico dentro da escola e na sociedade, mas

para que possamos entender um pouco mais sobre o autismo hoje é preciso

retroceder a um tempo em que a sociedade excluía o “diferente” em favor de uma

“normalidade” imposta pelo próprio homem que o encarcerava.


   Existem, hoje, políticas de direito em favor daqueles, até então excluídos

sociedade e grupos de luta (incluindo as famílias de portadores de necessidades

especiais), que procuram o bem-estar para todos aqueles sujeitos discriminados por

não serem produtivos ou “interessantes” para o sistema capitalista dominante.
7



   O primeiro passo para que estas pessoas se caracterizarem membros atuantes

de um grupo é através da escola. É ela quem indica o caminho, que mostra o

mundo, e onde as pessoas podem participar de uma vida que transcende a restrição

e o isolamento que a patologia impôs como condição a tais crianças.


   Foi através de movimentos filosóficos em contrapartida à psiquiatria que

surgiram grupos de interesse pela causa humana (humanismo), a quem se deve

muito pela luta em favor do excluído em valorização ao tempo e a particularidade do

ser humano.


   É nessa situação de impasse que se encontra a criança autista: presa a seu

mundo de isolamento e objetos, que não se enquadra nem no mundo do Outro, nem

no seu próprio mundo.


   Sua noção de temporalidade é comprometida e, enquanto estiver atuo-centrada,

não será capaz de alcançar níveis maiores de relacionamento afetivo ou de

cognição, tornando-se alheia e desinteressada pelo mundo à sua volta.


   É preciso trabalhar a noção da criança autista consigo mesma; seu corpo com o

corpo do outro e com o “corpo” (espaço físico) da escola. É preciso compreender

seu desejo para um melhor enquadramento no ambiente educacional e,

conseqüentemente social. Tratar e acolher o autista é um constante construir e

reconstruir o sujeito pela presença efetiva e eficaz referenciada no Outro. É preciso

vencer a barreira do sujeito-objeto possibilitando seu contato com o Outro (em quem

estas crianças já não investem mais emocionalmente), o que só será possível

através da satisfação dos desejos primários, da estimulação do imaginário e da

aquisição e ampliação da linguagem.
HISTÓRICO




História da Inclusão

   Aqueles que conhecem a história do “O Corcunda de Notre Dame” de Victor

Hugo sabem que o personagem Quasímodo (“Aranha”) é um relato que delineia o

perfil da história do deficiente na Idade Média.


   No século XV, os deficientes foram isolados da sociedade por sua aparência

física nada agradável aos olhos e pela peculiaridade de seu comportamento. Nesse

período, eram apartados do convívio social e desempenhavam, no máximo, funções

secundárias – como tocar o sino da torre da catedral de Paris, atividade exercida

pelo personagem Quasímodo. Segundo Foucault, a anormalidade, por si só, fazia

pressupor o período.


   Dos séculos XVI ao XIX, os deficientes não eram tutelados pela igreja e foram

institucionalizados em asilos e albergues.


   Na Europa, constam os primeiros relatos sobre hospitais psiquiátricos que

funcionavam como presídios, sem que houvesse, entretanto, uma assistência formal

ou um programa terapêutico de cuidados planejados para os pacientes. Neste
9



período, no Brasil, o atual Instituto Benjamim Constant, no Rio de Janeiro, foi um dos

precursores da educação especial.


   No século XX, aos deficientes são atribuídos alguns direitos ainda de cunho

religioso, mas não sistematizados nos planos clínico, pedagógico ou educacional.


   Na Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 10 de dezembro de 1948, os

direitos conquistados por pais e parentes de pessoas portadoras de deficiência,

vieram se caracterizar como crítica à segregação e em busca de melhores

condições de vida social e moral.


   No Brasil, a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação), de n° 4.024 de 20 de

dezembro de 1961, decreta a primeira lei que ratifica a educação aos excepcionais,

se possível, em ambiente educacional formal, consolidada em 1978 pela

Constituição Brasileira, dando direito à gratuidade materializada, isto é, sem ônus

financeiro para a educação da criança deficiente, desde que a condição social e

econômica da família seja comprovada como deficitária ou insuficiente.


   Após dez anos, a nova constituição notifica atendimento preferencial ao

deficiente na rede regular, sendo este reforçado, em 1990, pelo Estatuto da Criança

e do Adolescente.


   A Lei Federal 7.853/89 garante a gratuidade de acesso à rede pública de ensino

regular ao aluno portador de deficiência física ou mental e prevê punição de um a

quatro anos a quem negar ou cancelar matrícula de qualquer aluno deficiente.


   A Conferência Mundial de Educação para Todos de 1990, em Jountien, na

Tailândia, formaliza a proposta de acesso universal à educação para homens e

mulheres de igual modo, assim como para grupos minoritários (camponeses,
10



refugiados, negros, índios, presos e deficientes em geral) promovendo o senso de

igualdade de direito à escolarização e estabelece a adequação de uma maior

abrangência de conteúdo informativo, visando conseqüente e significativa melhora

no ambiente educacional.


   A grande alavanca educacional inclusiva se deu em junho de 1994, quando

representantes de oitenta países se reuniram e assinaram a Declaração de

Salamanca, na Espanha, firmando compromisso no sentido de garantir a

escolarização básica, reforçando a idéia de que todas as crianças, inclusive as

portadoras de deficiência física e/ou mental, deveriam ser acolhidas, sendo este

princípio considerado como eficaz na luta contra a discriminação.


   No Brasil, a LDB 9.394/96 Art. 58 e 59, em consonância com Legislação Federal

Art. 74, determina que a educação de PNEE (Portadores de Necessidades

Educacionais Especiais) deve se dar, de preferência, na rede regular de ensino.


História das Instituições Manicomiais

   A terminologia adotada para tais instituições decorre com o contexto social e

histórico. Asile, madhouse, asylum, hospizio são alguns deles. A palavra manicômio

aparece no Século XIX para identificar o que hoje são os hospitais psiquiátricos.


   Michel Foucault, em 1961, publica “A História da Loucura” em um estudo

retrospectivo em que mescla psicologia, filosofia, história e prática clínica. Trata-se

de uma obra com o olhar ao passado sobre uma concepção presente de loucura e

sua mudança conceitual. Segundo esse estudo, na era medieval, os loucos eram

considerados como santos e caminhavam livremente pelas ruas. Com o advento do

renascimento e do humanismo, a santificação se tornou sabedoria, um reflexo da
11



insanidade social. Na idade da razão, a loucura, presente entre os filósofos da

época, separa o que é “razão” de “não razão”.


   Na cultura árabe, surge o primeiro hospício. Enquanto que na Europa, só após a

morte de Descartes (um dos principais filósofos deste período), é criado o Hospital

Général, em Paris, para os excluídos sociais, tais como: loucos, indigentes,

mendigos, homossexuais, alcoólatras e criminosos. O louco passa do estatuto de

sábio para a condição de “objeto circense” da época.


   No final desse período, a sociedade viu o encarceramento como crime bárbaro,

passando a definir os deficientes como doentes e não como criminosos. Desta

forma, a sociedade agrega os valores morais à lei. Os loucos são encaminhados a

cuidados médicos e tornam-se sujeitos de outra espécie de aprisionamento: o

medicamentoso. Sob a tutela do psiquiatra. Com o advento da Psicologia e da

Psicanálise amplia-se a noção de saúde e a loucura passa a ser assistida.


   Rever a história das instituições psiquiátricas faz-nos refletir sobre os erros do

passado e sobre a concepção histórico-social da loucura e remete-nos a avaliar

sobre as tentativas de humanização do atendimento, tanto ao doente mental quanto

ao deficiente. Como exemplo tem-se a declaração do direito fundamental de

liberdade e igualdade de direitos, descrita no Código Civil de 1916.


   A clínica do isolamento é uma instituição falida pela falta de cuidado com a

subjetividade e humanização nas relações com os pacientes. A tendência atual é a

inserção do paciente psiquiátrico no meio social, visando promover sua inclusão.


                     “Os sujeitos que sofrem psiquicamente nem sempre têm clareza sobre
                     aquilo que os faz sofrer. Geralmente não sofrem sós, ou a dois, ou a quatro
                     paredes. Os sujeitos adoecem na vida, e a vida está em toda parte,
                     estruturada em instituições.” (Paulon)
12


                      “Podemos nesta medida pensar que o corpo que adoece, sofre, goza não é
                      uma abstração de um certo ramo científico. O corpo que indica um
                      sofrimento está marcado por várias instituições: quando atinge alguns
                      desses espaços organizados para "cuidar" dele já chega marcado por uma
                      educação autoritária, por uma sexualidade moralista, por uma produção
                      econômica exploradora, por uma sociedade, enfim, que exige adaptação a
                      inúmeras instituições.” (Paulon)


   Tem-se como exemplo da realidade psiquiátrica no Brasil o filme “O Bicho de

Sete Cabeças” que retrata as instituições de isolamento moldadas por interesses

econômicos e aponta os maus-tratos realizados dentro de seus portões. O

personagem principal figura como um dependente químico que passa por diversas

clínicas, convivendo com vários tipos de pessoas que sofrem com inúmeras

patologias e problemas. Esbarra em conceitos sociais e preconceitos da família e

com a falta de informação, ficando tanto a margem da sociedade quanto da loucura.


   A negação da identidade do sujeito em nome de uma suposta reabilitação é

refletida nas estereotipias e afastamento do real. A esse estado a sociedade deu o

nome de Insanidade Mental, sendo que seu maior causador é a própria instituição,

que exclui, isola, cerceia e violenta.


   Como marco na construção da mudança deste cenário, no final da década de 70,

a partir da redemocratização e fim do militarismo, deu-se início no Brasil à luta

antimanicomial, através de denúncias de violências e maus-tratos a doentes

mentais.


   Nos anos 80, ocorreram as primeiras tentativas de implementação e melhorias

das instituições psiquiátricas, mesmo sob grande polêmica e movimentos de

resistência. Surgem movimentos individuais pela Reforma Sanitária e a pela

Reforma Psiquiátrica, culminando com o projeto de lei 3657/89.
13



                     “Navegarmos pela subjetividade em tempos de novos dilúvios requer,
                     talvez, ainda, uma sabedoria trágica, um certo amor pelo que virá, pelo que
                     a vida nos reservará. O que podemos amar no homem é ser ele transição. E
                     naufrágio...“ (Paulon)


Sujeitos de Direito e Dever

   Segundo Santos:


                     “Uma política de igualdade genuína é a que permite a articulação horizontal
                     entre as identidades discrepantes e às diferenças que se acentuam a ela. O
                     novo imperativo categórico que deve presidir uma articulação pós-moderna
                     e multicultural das políticas de igualdade e identidade é termos o direito de
                     ser igual sempre que a diferença nos inferioriza; temos o direito de ser
                     diferente sempre que a igualdade nos descaracteriza.”


   De acordo com o artigo 227 da Constituição Federal de 1988:


                     “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar a criança e ao
                     adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
                     alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
                     dignidade, ao respeito, à liberdade, à convivência familiar e comunitária,
                     além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, descriminação,
                     exploração, violência, crueldade e opressão.”


   Ainda segundo Sá:


                     “É direito incondicional a escolarização de todos os alunos nos mesmos
                     espaços educativos, transformando a escola, para que recebam as
                     diferenças individuais com adequação, aparelhamentos e capacitação
                     docente. Reconstruir uma escola exige a revisão de posturas e concepções
                     voltadas em estruturas includentes.”


Estatuto da Criança e do Adolescente

   O Estatuto da Criança e do Adolescente, de 13 de julho de 1990, promulgado

pela Lei 8069/90, determina uma nova forma de garantir os direitos da criança e do

adolescente.


   O Estatuto leva em consideração o fator humano da criança e seu processo de

crescimento, sendo ela considerada um sujeito em desenvolvimento e dependente
14



de necessidades, de cuidados por parte dos pais e da sociedade. Inclui-se aí a

União, os Estados e Municípios sobre a supervisão do Conselho Tutelar.


   É incumbência do Estado, ainda:


   Reservar parte de seus recursos, tais como impostos, à proteção da criança e do

adolescente.


   Garantir oportunidade e facilidade para que as crianças possam se desenvolver

em todos os aspectos (físico, mental, moral, espiritual e social) livre e dignamente de

forma saudável e suave.


   Protegê-las de maneira absoluta.


   O ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) valoriza e agrega a família

remetendo a ela o processo educativo/pedagógico/preventivo por ser a primeira

responsável pelo sustento e manutenção dos filhos na escola.


   Para qualquer forma de descuido seja por parte da escola, família ou sociedade

haverá punição de acordo com a lei, seja por ato ou omissão ao que lhe assegura a

constituição, quanto ao direito: de brincar, ao lazer, à prática de esportes, a

participação na vida social e familiar, a assistência da família ou sociedade, e

sobretudo direito a terem respeitados o corpo, a alma, a moral e a imagem

(identidade, valores e espaço).


   (Observação: Para fins deste estatuto, criança é todo cidadão com idade inferior

a 12 anos completos; adolescente é todo aquele entre 12 e 18 anos incompletos.)
15



   O artigo 10, inciso III assegura à futura mãe a gratuidade pelo SUS (Sistema

Único de Saúde) de exames preventivos que possam detectar anomalias no bebê e

assistência à família.


   O artigo 11, parágrafos 1º e 2º favorece a criança e ao jovem deficiente a

gratuidade e garantia de acesso a todo e qualquer serviço que tem por fim a

promoção, proteção e recuperação da saúde de maneira especial.


   Fica a cargo do poder público o fornecimentos de medicamentos ou quaisquer

outros recursos para garantir a adaptação da criança, se assim for necessário.


   À criança é garantida, como condição plena de desenvolvimento, seja qual for

seu potencial, uma escola que a valorize, iguale e respeite.


   É assegurada no artigo 57 a inclusão, mas estabelece uma garantia àqueles que

com elas estejam envolvidas, que tenham preparo para poder recebê-los, sendo que

esta lei garante efetiva fiscalização.


Educação Inclusiva

   Entende-se por Educação Inclusiva o processo pelo qual todos os Portadores de

Necessidades Especiais ou de Distúrbios de Aprendizagem, na rede regular de

ensino, em todos os seus graus possam ser atendidos por uma escolarização global

(normal) com objetivo de integrá-los à comunidade, de forma a buscar o máximo de

seu potencial como os outros colegas.


   A escola é o lugar onde, de forma ideal, o ambiente educacional torna possível a

articulação do processo educativo com o processo de socialização.
16



   Os agentes de ensino deverão ser facilitadores do processo de inserção da

criança deficiente junto ao grupo de colegas, avaliando suas necessidades e

possibilidades de forma a favorecer sua integração.


   O professor, consciente das dificuldades e limitações de tal aluno, deve estar

apto a aproximar-se deste, adequando seus objetivos pedagógicos de forma

particularizada, formando com os pais e a equipe interdisciplinar uma parceria

saudável que viabilize o processo de ensino/aprendizagem.


   Assim como se fazem necessárias adaptações no aspecto físico do ambiente

escolar de modo a facilitar e atender as necessidades dos alunos especiais, tornam-

se necessárias mudanças na forma de avaliação e investimento na formação

continuada da equipe técnica e de suporte.


   O “Princípio de Normalização”, elaborado nos anos 70, diz respeito a uma

“colocação” do portador de necessidades especiais na sala de aula comum,

acompanhado particularmente por um professor da área de educação especial com

finalidade de sustentar e promover a permanência do deficiente na classe regular

pelo máximo período de tempo possível.


   Até aqui o que se apresenta formalmente em termos de suporte ao portador de

deficiência são “políticas públicas” fragmentadas, pretendendo uma tríplice ação:


   Na Saúde: através do suporte ao tratamento medicamentoso e de reabilitação

aos portadores de déficit por patologias motoras.


   Na Assistência Social: por meio da distribuição de benefícios e recursos, mas

ainda de forma inespecífica e não particularizada.
17



   Na Educação: sendo este o fator mais desprovido de recursos essenciais a sua

efetivação, eficácia e sustentação.


   Nos anos 80, houve um movimento de pessoas portadoras de deficiência para

mudar este quadro. O aluno especial passou a ser visto como pessoa que demanda

recursos, equipamentos, técnica de abordagem e especificidade de atenção

pedagógica de acordo com sua condição física, sensorial ou mental.


   Com a LDB 9394/96, projetos referentes ao portador de deficiência surgem como

novo reflexo e nova proposta para uma educação realmente inclusiva. A proposta de

inclusão é mais abrangente porque visa a inserção e interação do aluno deficiente

junto à classe regular desde o início da sua escolarização, sem mediação de ensino

especial.


   A inclusão escolar busca mudanças de pontos de vista sobre os portadores de

deficiência revertendo qualquer forma de exclusão que possa abranger também

aquelas que possuem altas habilidades, crianças de rua ou trabalhadoras, as

nômades ou membros de minoria (étnica, religiosa ou cultural).


   Para que seja possível sua permanência na escola regular é preciso que garantir

uma educação de qualidade com currículo apropriado, conforme a Declaração de

Salamanca (1994):


                     “... o desafio que confronta a escola inclusiva é no que diz respeito ao
                     desenvolvimento de uma pedagogia centrada na criança capaz de ser bem-
                     sucedidamente educada como todas as crianças, incluindo aquelas que
                     possuem desvantagens severas (grifo meu). O mérito de tais escolas não
                     reside somente no fato de que elas sejam capazes de prover uma educação
                     de alta qualidade a toda criança. O estabelecimento de tais escolas é um
                     passo crucial no sentido de modificar atitudes discriminatórias, de criar
                     comunidades acolhedoras e de desenvolver uma sociedade inclusiva”.
18



   Na escola inclusiva os projetos pedagógicos são construídos coletivamente pelos

alunos e equipe técnico-pedagógica, através de um currículo aberto e natural capaz

de refletir e possibilitar a ampliação e expansão das experiências vividas, numa

organização branda e receptiva às mudanças que se fizerem necessárias nos

tempos e nos espaços escolares, com arranjos organizacionais e modalidades de

ensino adaptadas às necessidades dos alunos.


   São adotadas estratégias educacionais de respeito e valorização das diferenças

e do modo de se expressar de cada sujeito, dos ritmos pessoais de aprendizagem,

dos princípios e valores culturais, dos talentos e habilidades individuais.


   A denominação “necessidades especiais” vem sendo cada vez mais difundida

nos meios educacionais e acadêmicos, por tentar conter e diminuir o aspecto

negativo trazido pela denominação de pessoas “excepcionais” ou “especiais”. Tal

rótulo ignora o fato de que todo aluno é especial e toda escola é especial em sua

singularidade. A denominação é o que menos importa, o que interessa é o sujeito e

sua educação.


   A escola não pode ser um fator de homogeneização. Deve-se estar atento às

diferenças físicas e culturais encontradas nas crianças, observando-as sob a ótica

da singularidade em sua forma de avaliar e reagir ao mundo e ao outro através de

suas experiências pessoais.


A Questão Humanista na Inclusão

   Surgido nos anos 50 nos Estados Unidos e na Europa, o humanismo é um

movimento filosófico que reflete a insatisfação com os caminhos tomados pela

psicologia (que construía uma imagem de homem parcial, incompleta e desumana,
19



excludente dos valores) e, em contrapartida, à visão marxista vigente (exclusa às

ciências sociais, à biologia, à educação e à filosofia da ciência).


   O humanismo destina-se a todos os interessados no estudo e na ciência do

humor, da criatividade, dos valores humanos, da autonomia, do crescimento, da

auto-realização e do uso pleno de suas potencialidades.


   Sua principal preocupação é com a pessoa e seus valores, tal como a dignidade

em seu desenvolvimento e potencial, vendo a pessoa como sujeito desejante de

descoberta dele próprio e como um ser ligado a outras pessoas e grupos.


   A filosofia humanista pretende oferecer solução para problemas que ficaram

abandonados por muito tempo e auxilia o homem com visas a contribuir para a sua

saúde psicológica, reconhecendo seu espírito e sua necessidade de encontrar e

buscar significado para a vida. Na visão humanista, a maior responsabilidade de

cada um implica em éticas, religiosidade e legalidade.


   Um grande contingente de grupos sociais discursa e valoriza a diversidade,

estimulando a troca e a luta por direitos, tendo como base a família. Para que tais

direitos sejam reivindicados faz-se necessário que haja outras pessoas vivendo a

mesma questão, preferencialmente em etapas mais avançadas, para produzir as

bases teóricas a partir de experiências parciais e vivenciais.


   Segundo autores como Decroly (1871-1932), importa respeitar a criança como

ser total, concreto e ativo; como um ser individual e social, plenamente firmado e

situado. Makarenko (1888-1932) diz que o ser humano é diferente dos outros

animais em relação às noções de tempo e espaço, por entender a singularidade

humana, aplicando a cada situação um tratamento especial.
20



   O grande desafio da sociedade está, idealmente, em vencer as barreiras

padronizadas de viver e pensar de nossa cultura televisiva e globalizada. A inclusão

vem como fator de humanização e de crítica frente ao preconceito e respeito ao

direito do outro, não apenas de tolerância frente ao diferente.


   A forma como o professor informa e conduz o aluno, positiva ou negativamente,

pelos objetivos escolhidos pela escola ou pela sociedade, está nas mãos do

professor. Ele é um dos sujeitos que mais influência, cabendo a ele construir uma

boa impressão sobre si mesmo, seja de ordem física e/ou emocional, e sobre o

mundo, de modo que possa influir significativamente na construção da criança.


   O professor interessado em realizar seu trabalho, considerando as questões

humanitárias    tais    como   respeito,   receptividade   e   compreensão,   visa   o

amadurecimento da pessoa e precisa levar em conta os interesses do educando e

trabalhar em busca de uma boa técnica pedagógica, atentando-se para os aspectos

pessoais e humanos da educação.


   Não há como falar em Humanismo deixando de lado uma questão tão discutida

como o Existencialismo, que tem no homem o princípio fundamental de todo modo

de pensar e de proceder sem preconceitos e limitações biológicas e morais de

acordo unicamente com a existência de sua natureza (Grande Dicionário da Língua

Portuguesa, livro 7).


   O Existencialismo está centrado no homem como pessoa situada no mundo do

tema (relação pessoa-pessoa, a liberdade, a responsabilidade, a escala individual de

valores, o sentido de vida, a ansiedade, o sofrimento, a angústia e a morte) e no

processo (o enfoque das experiências humanas subjetivas e de conscientização).
21



   A ideologia de Maslow, um dos mais importantes humanistas, diz que é preciso

que todos trabalhem em prol do desenvolvimento da humanidade, para seu pleno

potencial, sem preconceito, livre, buscando uma identidade individual e coletiva,

fazendo uso da experiência construída como base do seu conhecimento.


   O homem humanista valoriza a solidão e sua sólida comunicação intuitiva tanto

quanto as conceituações abstratas, como formação do “eu” e da autonomia do

homem, conseqüente de seus atos presentes, reflexos no futuro.


   Conceitos como igualdade, desigualdade, preconceito são discussões freqüentes

dentre   os   humanistas.    Em      nossa     cultura     vem     associada      à    igreja    e

conseqüentemente ligada à diferença. Ao longo do tempo, veio a igualdade

democrática, perante a lei e, de fato, com direitos e deveres.


   Segundo Moraes:


                     “A igualdade perante a lei, a igualdade de participação política e a igualdade
                     de acesso a condições que preocupam o conjunto da humanidade, como a
                     paz, o desenvolvimento, o meio ambiente, etc.”
AUTISMO




   De acordo com Jiménez, “... autismo representa uma alteração nas diferentes

áreas evolutivas em uma idade temporária e que gera uma disfunção permanente.”


   A origem da palavra Autismo vem do grego, eaftismo, que quer dizer “fechar-se

em si mesmo”.


   Este termo é utilizado para definir um dos sintomas de esquizofrenia de

separação da realidade e aversão externa e interna, de excitação, ânsia e obsessão,

a tal ponto que gera nos portadores de tal nosologia uma descarga motora que se

caracteriza com movimentos em torno de si, utilizando-se ou não de objetos para

manter-se num estado emocional de equilibração.


   Desconhece-se toda e qualquer verdade sobre o autismo, possuindo-se somente

embasamento teórico e clínico do que ele é de fato. Há na descrição de muitos

autores, diferenças de definições, onde o discurso médico e o discurso psicanalítico

divergem em vários pontos.


   Para a psiquiatria, o autismo trata-se de um quadro de ausência de interação

social e déficit no desenvolvimento. Já para a psicanálise, o modo pelo qual a
23



resposta da criança autista é dada com relação ao Outro é refletida nas relações

com rompimento, isolamento e ausência de laço social.


    Kanner descreve o autismo como um quadro de isolamento e não interação

antes de um ano de idade e de retração emocional com prejuízos cognitivos e

possível disfunção cerebral orgânica. Segundo este autor, o quadro apresentado é

de incapacidade de estabelecer contato, atraso no desenvolvimento de linguagem,

que mesmo quando existente não funciona como comunicação (ecolalia, inversão de

pronomes), jogos e brincadeiras repetidas vezes, falta de imaginação, aparência

normal com a primeira infância não equivalente a seus pares.


    Há, porém, relatos anteriores a Kanner que retratam uma série de

comportamentos característicos do autismo, como dos meninos selvagens de

Aveyron e Kasper Hauser, os meninos lobos de Hesse e os meninos ursos da

Lituânia.


    Asperger e outros vieram redefinir o quadro até então apresentado

acrescentando: a relação de fascínio com objetos eleitos; a presença de potencial

cognitivo relativamente bom; isolamento desejante e obsessivo.


    Atualmente, o Autismo é denominado por muitos autores como ausência de

interação social no desenvolvimento e déficit da comunicação com limitações

interativas.


    O autista se comporta de forma não-verbal através de: contato visual indireto,

expressão facial, postura e gestos corporais. Sua relação com o outro é restrita e

sem interação, pois não a compreende. Sua noção de outro também é lesada tanto

em sua essência quanto aos sentimentos.
24



    No diálogo, quando existe alguma forma de comunicação, mesmo que exista

fala, esta pode ser alterada em sua qualidade sendo apresentada de forma bizarra e

repetitiva. A incapacidade de estabelecer relação social faz com que os autistas

tratem o outro com relativa indiferença, como um objeto passivo a ser substituído ou,

do contrário, apegam-se de forma exagerada a alguém.


    Com freqüência, rejeitam o toque e são sensíveis ao som, à luz, a odores fortes

e apresentam gostos restritos na alimentação. Apresentam comportamentos

bizarros, muitas vezes sendo evidentes oscilações de humor, com risadas ou choros

sem motivo aparente. Crianças autistas têm pouca noção de riscos (altura, trânsito

de automóveis, etc.). Paradoxalmente, sentem pavor sem sentido por coisas

corriqueiras. Costumam dormir mal e não se orientam bem no tempo e no espaço.


    Kaplan (1997), Newcombe (1999) e outros definem retardo mental como um

funcionamento intelectual geral abaixo da média que se origina durante o período de

desenvolvimento e está associado a prejuízo no comportamento adaptativo. Citam

que cerca de 40% das crianças autistas apresentam retardo mental e grande parte

das crianças retardadas tem sintomas comportamentais que incluem características

autísticas.


    Bebês autistas apresentam comprometimento na relação primordial com a mãe

respondendo de forma apática a qualquer estímulo tátil ou afetivo. Um olhar vago

(“não olhar nos olhos”) interfere no diálogo tônico-corporal entre a mãe e a criança.

Parecem tristonhos e demonstram pouco interesse por qualquer atividade que seria

normal para uma criança saudável da sua idade.
25



   Na sua relação com o outro, a linguagem da criança autista é responsiva ou

ecolálica, isto é, completa ou simplesmente repete a fala do outro. Por isso, são

incompetentes para compreender uma linguagem mais abstrata ou interpretativa.


   Possuem demasiada preocupação com objetos, tais como botões, estampas em

tecidos, cabelos, óculos, etc.


   Apresentam estereotipia de pensamento que se manifesta em atitudes tais como

enfileirar objetos ou guardar brinquedos de forma ordenada. Como tentativa de

garantir sua segurança, crianças autistas criam rituais de comportamento. Pequenas

mudanças nesta ritualização podem provocar um estado de sofrimento e

irritabilidade desproporcionais.


   Num quadro de autismo grave, as crianças apresentam comportamento bizarro

ou um estado catatônico, ausência de linguagem verbal autônoma, desinteresse

pelo ambiente que a circunda, restrição ou inibição da fala ou movimentos de

balanços repetitivos com o próprio corpo ou com objetos.


   Na verdade, o comportamento da criança severamente autista parece sem

objetivo. Tentativas no sentido de promover seu interesse por outra coisa, que não

aquilo que a prende, são geralmente recusadas ou ativamente repelidas, podendo

produzir graves explosões temperamentais ou tentativas de escapar à situação.


   Crianças autistas são, por vezes, diagnosticadas equivocadamente como surdas

por sua inexpressividade, ar melancólico ou olhar dispersivo. Em geral, agarram-se

em objetos colhidos de forma aleatória, aos quais não atribui nenhum significado,

simplesmente mantendo-os apertados contra a palma da mão.
26



   Segundo Bleuler apud Cuxart, o pensamento caracterizado pela necessidade de

simbolização do autista é substituído por fantasias entre o real e o ilusório. Sua

dificuldade em generalizar situações, assim como o processo de aprendizagem

tendem a um diálogo literal que mantém a fonética e a articulação das palavras sem

alteração.


Critérios Diagnósticos para F84.0 – 299.00 – Transtornos Autistas

A. Um total de seis (ou mais) itens de (1), (2) e (3), com pelo menos dois de (1), um

   de (2) e um de (3):


   (1) prejuízo qualitativo na interação social, manifestado por pelo menos dois

        dos seguintes aspectos:


        (a)   prejuízo acentuado no uso de múltiplos comportamentos não-verbais,

              tais como contato visual direto, expressão facial, posturas corporais e

              gestos para regular a interação social.


        (b)   fracasso em desenvolver relacionamentos com seus pares apropriados

              ao nível de desenvolvimento.


        (c)   falta de tentativa espontânea de compartilhar prazer, interesses ou

              realizações com outras pessoas (por ex., não mostrar, trazer ou

              apontar objetos de interesse).


        (d)   falta de reciprocidade social ou emocional.


   (2) prejuízos qualitativos na comunicação, manifestados por pelo menos um

        dos seguintes aspectos:
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        (a)   atraso ou ausência total de desenvolvimento da linguagem falada (não

              acompanhado por uma tentativa de compensar através de modos

              alternativos de comunicação, tais como gestos ou mímica).


        (b)   em indivíduos com fala adequada, acentuado prejuízo na capacidade

              de iniciar ou manter uma conversação.


        (c)   uso   estereotipado   e   repetitivo   da   linguagem   ou   linguagem

              idiossincrática.


        (d)   falta de jogos ou brincadeiras de imitação social variados e

              espontâneos apropriados ao nível de desenvolvimento.


   (3) padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses e atividades,

        manifestados por pelo menos um dos seguintes aspectos:


        (a)   preocupação insistente com um ou mais padrões estereotipados e

              restritos de interesse, anormais em intensidade ou foco.


        (b)   adesão aparentemente inflexível a rotinas ou rituais específicos e não-

              funcionais.


        (c)   maneirismos motores estereotipados e repetitivos (por ex., agitar ou

              torcer mãos ou dedos, ou movimentos complexos de todo o corpo).


        (d)   preocupação persistente com partes de objetos.


B. Atraso ou funcionamento anormal em pelo menos uma das seguintes áreas, com

   início antes dos 3 anos de idade: (1) interação social, (2) linguagem para fins de

   comunicação social, ou (3) jogos imaginativos ou simbólicos.
28



C. A perturbação não é melhor explicada por Transtorno de Rett ou Transtorno

   Desintegrativo da Infância.


Possíveis Fatores de Autismo

   Alguns dos fatores que predispõe ao surgimento do autismo são descritos como:


   ¾grande stress emocional sofrido por mães no período de gestação, no

       momento do parto ou após o nascimento da criança;


   ¾alcoolismo e drogadicção da mãe;


   ¾seqüelas de doenças, tais como: rubéola e catapora;


   ¾parto difícil ou traumático, nascimento muito rápido sem dilatação;


   ¾febre sem diagnóstico específico, seguido por quedas de pressão arterial e

       convulsão;


   ¾infecções;


   ¾anóxia (falta de oxigênio) ou toxemia (dificuldade respiratória). De acordo

       com Papalia e Olds (2000) apud Cintra, a anóxia poderá afetar as células

       nervosas do cérebro provocando danos mecânicos. Este tipo de trauma no

       nascimento ocasiona danos cerebrais irreversíveis como retardo mental,

       problemas de comportamento ou até mesmo a morte.


   ¾mães adolescentes ou primíparas com mais de 35 anos de idade;


   ¾hemorragias durante o segundo trimestre da gestação
29



    Segundo Ornitz (1977) e Newcombe apud Cintra, o estado físico e emocional da

mãe exerce influencia no desenvolvimento fetal da criança assim como o estado

físico do pai.


Os Tipos de Autismo

    Segundo Kanner, os tipos de autismo podem ser provocados por fatores

psicodinâmicos, familiares, ambientais e sociais. São classificados como:


    Autismo de Origem Genética – Há uma possível falha descoberta no

cromossomo de número 11, que apresenta uma deformação em forma de um

“braço”, mas sem comprovação efetiva. Há também a observação de uma falha no

cromossomo X.P 22 que faz supor uma preponderância a maior retardo mental

verificado por Rett. A origem é significativa dentro dos estudos sobre autismo,

principalmente pela existência de casos em gêmeos monozigóticos de quase

totalidade em oposição a gêmeos dizigóticos com autismo e a possível ocorrência de

distúrbios consangüíneos entre pais ou avós.


    Autismo de Origem Psíquica – Segundo autores como Tustin, a criança que

passa por uma gestação ou um nascimento traumáticos e que por determinada

razão não conseguiu se separar da mãe pode desenvolver uma sintomatologia

autística, caracterizada primordialmente por isolamento e indiferença.


    Autismo de Origem Neurológica – Caracterizado por mal formação congênita

que promove um alongamento da 4ª cavidade craniana, provocando uma assimetria

encefálica em relação ao eixo hemisférico. O sistema perceptivo (visão, audição,

paladar e tato) é preservado, entretanto, retardo mental e convulsões são

identificados. Em condições de stress elevado podem ocorrer alterações
30



neurobiológicas com aumento de serotonina e catecolamina, surgindo rituais e

estereotipias de forma inflexível.


    Autismo no Aspecto Físico – O autista apresenta desenvolvimento fisiológico

normal, corpo bem formado, mãos e pés pequenos e, ocasionalmente, deformidades

ocasionais nas orelhas e manchas na pele do tipo “café-com-leite”.


    Autismo no Aspecto Motor – Déficit de motricidade larga, andar desajeitado,

possuindo boa coordenação motora fina. Presença de hiperatividade e movimentos

rítmicos e repetitivos.


    Autismo no Aspecto Personalidade – Freqüente expressão agressiva, auto-

dirigida ou heterodirigida com ocasionais acessos de fúria. O isolamento e o apego a

objetos inanimados surgem como fatores de tentativas de preservação da

integridade física e emocional.


    Autismo no Aspecto Familiar – As crianças autistas são, em geral, filhas de

pais inteligentes de classe média alta com formação superior e não há diferenças

significativas em sua criação com relação a crianças normais, por isso, muitas vezes

o diagnóstico ocorre de forma tardia, surgindo apenas após o primeiro ano quando a

criança apresenta dificuldades no desenvolvimento da linguagem.


O Autista e a Noção de “Eu”

    A criança autista citada por Tustin não reconhece a mãe assim como não

reconhece a si mesma. Sua noção de identidade pessoal é comprometida no

princípio da experiência relacional e na instalação deficitária do narcisismo primário,

sem lugar no campo do Outro.
31



   Danos psíquicos fazem com que ela se desvie de coisas que geralmente

interessam a uma criança normal em desenvolvimento. Considerando perigosa e

aterrorizante qualquer coisa que não lhe seja familiar.


   Comporta-se de forma evitativa por medo de sofrer com uma separação

semelhantemente ameaçadora como a do desmame. Em condições de normalidade,

a separação afetiva da mãe contribui para o desenvolvimento emocional, fornecendo

à criança a experiência psíquica da frustração.


   A dificuldade de simbolização do autista é traduzida corporalmente em

movimentos repetitivos resultantes da privação da possibilidade de construir uma

linguagem efetiva.


   Segundo Winnicott, o autista apresenta terrores experimentados em um estado

pré-verbal,    de    pré-imagem   e,    ainda,    pré-conceitual.     São   temores    de

descontinuidade, de medo de morrer, de não pertencer, de desintegrar-se, de cair,

de explodir ou de perder a garantia de sua existência. Presos a uma forma de

funcionamento baseada na concretude do pensamento e no domínio das sensações.

O autista não tem consciência de sua humanidade nem das dos outros seres

humanos que a circundam. De fato este tipo de conduta parece significar que o

desenvolvimento emocional e cognitivo da criança sofreu uma desaceleração ou

virtualmente parou.


   Brezelton    (1969)   diz   que,    quando    as   primeiras     diferenciações   estão

prosseguindo normalmente, é possível que haja somente oscilações de consciência

da separação física da mãe, mesmo nos primeiros momentos de vida.
32



    Na criança “normal” a ruptura feita ao nascer foi devidamente cicatrizada pela

interação respondível entre mãe e bebê. Na criança autista, esta consciência traz a

dor de um processo de diferenciação de um ser humano vivo.


    Sua ligação com os objetos é feita através dos sentidos, em substituição ao

objeto primordial libidinal, isto é, a mãe que nutre ao seio.


    A medida em que o autismo se cristaliza os objetos externos, como fezes, urina

e a língua por exemplo, passam a ser instrumentos de uma manifestação patológica

sem função objetiva, servindo como meros produtores de sensação de consistência

ou de segurança. Objetos macios produzem formas reconfortantes para tranqüilizar

a criança que se encontra isolada no contato humano.


    O objeto autista, erotizado e manipulado como se fizesse parte do próprio corpo

da criança, serve como um tranqüilizador e uma referência artificial. É através dele

que a criança se comunica.


    Também, segundo Tustin, a dentição é considerada um marco de sofrimento no

desenvolvimento da criança autista. Resulta na passagem da experiência de sugar

para a experiência de morder, o que inspira o aparecimento de primitivas fantasias

de incorporação, isto é, “ataques” dirigidos ao não eu – primordialmente a mãe

biológica ou substituta – e que normalmente vem acompanhada de depressão

infantil.


    No quadro autístico, as pessoas não desenvolveram o senso de “self”, tendo

apenas uma construção egóica neurológico-mental.


    Na primeira experiência de amamentação do bebê é que as relações

interpessoais e afetivas se iniciam, sendo a sensação do seio na boca o foco para o
33



desenvolvimento da psique concomitantemente ao toque, ao olhar da mãe e a

mútua atenção. Estes são os fundamentos do núcleo do “self”. A forma como o seio

é oferecido, como ele é percebido e recebido pela criança influenciam em seu

desenvolvimento. Esta será afetada pelas respostas da criança e pela qualidade de

relações da mãe com o pai do bebê e pelas circunstâncias da infância dos próprios

pais.


   Segundo Mahler, pelas dificuldades inerentes ao processo de separação e

individuação, a criança autista denota frágil consciência de sua própria identidade,

sendo carente de empatia e imaginação. A vida fantasmática da criança autista é

empobrecida, daí a sua dificuldade de comunicação.


   Tanto para compreender o processo autístico como para promover o tratamento

e a inclusão da criança com este tipo de afecção relacional, torna-se necessário um

grande investimento da parte do cuidador na tentativa de comunicação e interação

sócio-afetiva.


Dados Estatísticos

   A incidência é de 2 a 5 casos por 10.000 indivíduos. As perspectivas de autismo

são 4 a 5 vezes maiores em meninas com retardo mental do que em meninos. No

Brasil, calcula-se que existam atualmente aproximadamente 600 mil pessoas

autistas, apesar de não haver nenhum dado formal.
34



O Desenvolvimento segundo Wallon


Dados Biográficos

   Henri Wallon (1879-1962) nasceu na França em um período de instabilidade e

insegurança política. Viveu intensa produção intelectual atuante e ética, engajado

politicamente na sua época, integrando atividades científicas e ação social.


   Formou-se em filosofia no ano de 1902, trabalhou como professor no ensino

secundário e contestou os métodos de controle disciplinar da época. Mobilizado

como médico do exército francês em 1914, dedicou-se ao atendimento dos feridos

entrando em contato com pessoas vítimas de lesões cerebrais do pós-guerra.


   Fundou em 1925 um centro de pesquisa que funcionava em conjunto com

escolas de periferia. Em 1931, trabalhou como médico de crianças com deficiências

neurológicas e distúrbios de comportamento. Presidiu a Sociedade Francesa de

Pedagogia de 1937 a 1962.


   Segundo Wallon, a criança passa por estágios de desenvolvimento como

resposta às necessidades e interesses pessoais e sociais, manifestando

organicamente expressões de afeto mutáveis de acordo com o momento social.


   Trata-se do processo através do qual o homem se desenvolve, à medida da

maturação orgânica e idade cronológica. O aspecto biológico é determinante, mas

por vezes submete-se ao aspecto social, pois o Sistema Nervoso Central (SNC) não

oferece garantia quanto o amadurecimento de habilidades específicas que

demandam treinamento e aprendizagem.
35



   O bebê, ainda não dotado de linguagem e incapaz de sobreviver sem o outro,

desencadeia reações orgânicas através de descargas motoras, sinalizando sua

necessidade de ser alimentado, limpo, abrigado, etc.


   A impulsividade motora é um ato de alívio de tensão em resposta a ações

passadas ou causadas por incômodo, angústia e ansiedade. É uma forma primitiva

de se comunicar e dizer que algo está errado.


   Com a aquisição da linguagem, seu leque de expressões se amplia e a criança

passa a manifestar seus sentimentos e pensamentos de outra forma, ou seja,

através de gestos e palavras.


   O bebê, a princípio, não se percebe como pessoa separada do outro, parece

estar fundida à mãe. A medida em que interage com ela e com o meio, desprende-

se desse vínculo de dependência e diferencia-se chegando a um estágio de

individualização.


   O corpo se forma na distinção entre espaço, corpo e ambiente. É ação integrada

ao corpo que se vê em Oposição; Sedução; Imitação.


   Oposição: busca de auto-afirmação em relação ao outro, percebida a princípio

em relação ao objeto e na luta por sua posse;


   Sedução: necessidade de aceitação do outro para sua auto-aceitação. A criança

reconhece a possibilidade de sucesso ou fracasso das emoções através do

potencial investido.


   Imitação: a pessoa admirada é incorporada. Assim, através da imitação e

assimilação das qualidades e méritos da pessoa modela-se e se projeta no outro. A
36



capacidade de interiorizar e exteriorizar possibilita que a criança se diferencie do

outro.


   Para Wallon, expulsão e incorporação são mudanças importantes para a

“formação do eu” e oposição é um bom meio de se construir a “diferenciação do eu”.


   A criança se importa em identificar que lugar ocupa no núcleo familiar e qual o

grau de importância representa para os pais. Quer ser objeto desejado e faz uso da

linguagem para representar seu desejo.


   A criança quer ser tudo aquilo que a mãe desejar e assim leva ao longo da vida

sua busca pelo “desejo do outro” ou “desejo que o outro deseja”.


   Em seus estudos, Wallon separou o desenvolvimento infantil em etapas, onde:


   ¾A criança aos 3 anos se relaciona com o mundo de forma específica: seu

         desejo é pelo objeto. O conceito de “meu” confunde-se com o de “eu”, como

         se estivesse tomando para si sua personalidade (Estágio da Personalidade).

         Desenvolve as funções simbólica e de linguagem (Estágio de Tensão Motora

         e Estágio Projetivo).


   ¾A criança aos 6 anos, evolui intelectualmente em interesses interpessoais e

         sociais, buscando o conhecimento do mundo. (Estágio Categorial).


   ¾A criança aos 11 anos, passa por mudanças do seu corpo e lapidação da

         personalidade. Este estado de mudança faz com que ela reflita sobre si como

         persona, num eterno conflito de questionamento e emoções em busca pelo

         par ideal.
37



      Todos estes estágios são construídos em movimentos dialéticos de ir e vir, entre

ação e interação com o ambiente em fases de maior oscilação da criança no seu

aspecto afetivo e cognitivo.


A Escola de Wallon

      Fazendo uso da psicologia e da genética, a escola walloniana qualifica e objetiva

métodos pedagógicos visando obter sucesso no processo utilizado.


      Wallon diz que é preciso enxergar a criança como um todo (físico, emocional e

cognitivo) para melhor entender sua conduta. Isso se dá forma análoga a uma

proposição matemática, em que fala de “ações + postura = estado íntimo” e “postura

inconstante + estado mental + musculatura tônica = estado constante”.


      A pedagogia de Wallon não valoriza a intelectualidade. O “meio” pelo qual a

pessoa desenvolve o intelecto ocorrerá através da compreensão e incorporação do

Eu.


      O que acontece na escola é a elevação ao máximo de separação e

confrontamento entre o Eu e o outro. A criança toma posse destas distinções através

da linguagem.


      A eficácia da mente está em um bom ordenamento das palavras que valorizam

todo o real expressado no sujeito, sendo este objeto de estudo.


Afetividade

      O autismo afeta áreas como comunicação, linguagem, interação social e

imaginação além da capacidade de interpretar expressões faciais e emoções das

outras pessoas tais como tristeza, raiva, alegria, entre outras.
38



    O objetivo do isolamento autístico é diminuir as emoções e manter o sujeito em

seu mundo interior de emoções acanhadas. Apesar de ocorrer de forma superficial

em sua maneira de se relacionar com o mundo, o isolamento também ocorre de

forma incondicional somente nos casos mais graves.


    Segundo Baron apud Polaino, emoções como medo, alegria, tristeza são

situacionais, pois as observamos nos outros e as atribuímos a uma situação real.

Emoções como surpresa e perplexidades são atribuídas a uma essência ou uma

possibilidade que nada tem de real, que vem a ser a cognição sócio-emocional do

autista.


    A expressão facial é um meio pelo qual falamos de nossas emoções e nos

comunicamos com os outros. Através da percepção das emoções é possível abordar

a criança autista numa tentativa de estabelecer um vínculo comunicacional, seja

através de sensações visuais, táteis ou auditivas.


    As crianças normais reconhecem as emoções dos outros devido a mecanismo

inatos e lhes permite desenvolver relações de afetividade.


    Ao longo do desenvolvimento da criança autista, os aspectos característicos da

patologia da linguagem, como ecolalia e estereotipia, são instrumentos precários

que têm como fim canalizar sua melhor relação com as emoções, em sua maioria

frustradas, por causa da dificuldade inerente ao autista em decifrá-las. Em outras

palavras: o fracasso do autista em lidar com as emoções se deve a uma deficiência

crônica para o desenvolvimento das relações com o outro.


    Em contrapartida, quanto mais perceber as emoções, melhor será sua

capacidade de interação social.
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   As perturbações autísticas são expressas em sentimentos de:


   Hipotonia: queda da excitação afetiva e aumento de sentimentos melancólicos.


   Atimia: ausência de sentimentos.


   Apatia: perda da capacidade de experimentar emoções e sentimentos.


   Estupor Emocional: inibição de curta duração causada por traumas seguido de

escurecimento da realidade.


   Destimia: desequilíbrio afetivo que oscila entre depressão e excitabilidade.


   Habilidade Afetiva: não estabelecida afetiva e internamente.


   Inconsistência Emocional: perda do controle emocional sob forma de pranto ou

riso excessivo.


   Neotimia: não aceitação de novos sentimentos que são vividos de forma

angustiante.


O Amor

   O amor é o sentimento através do qual o sujeito age sobre a sua subjetividade. É

a interação com o outro agindo para além dos cuidados básicos. Segundo Freire é

“a verdadeira dimensão de cura a ser reclamada....


   É a renovação sem propriedade do outro. É carinho, atenção e compaixão. É

colocar o ser, o saber e o poder de forma correta, íntegra, ética. É ver a criança

autista como pessoa com suas particularidades e não como coisa.
40



   O amor é forma divina do desejo e não um meio de satisfazer o sujeito. É através

do amor que a criança amadurece e se torna sujeito desejante pelo outro. É através

do amor que podemos trabalhar com nossos alunos.


A Criança Autista e o Desejo Paterno

   Crianças autistas ou vítimas de algum distúrbio bio-psico-fisiológico provocam

uma ferida narcísica e fogem ao desejo e à imagem construída idealmente pelos

pais.


   A criança se constitui primeiramente no desejo da mãe que lhe confere, desde o

ventre, um nome, um significado e, na medida em que as relações de afeto se

estabelecem, o sujeito vai conquistando na relação com o Outro sua individualidade

e autonomia, reconhecendo-o e fazendo-se conhecer através da linguagem.


   O desenvolvimento global da criança vai além do real do corpo e alcança o

simbólico ao ser olhado, tocado, cuidado, nomeado e afetado pela mãe que investe

na criança como objeto de amor e cria com ela um vínculo de dependência afetiva

fundamental para o estabelecimento de sua imagem narcísica.


   A criança com patologia manifesta aponta um furo no desejo dos pais

transportando-o do lugar ideal a um campo desconhecido.


   Margareth Mahler teoriza a respeito da substituição do vínculo simbiótico entre a

mãe e o bebê neonato, essencial à sua sobrevivência no primeiro estágio da vida

extra-uterina, por uma espécie de “simbiose social” à medida do desenvolvimento da

criança.
41



   A libido do bebê se transfere de um estágio de narcisismo fetal para um

narcisismo corporal primário, estágio no qual a representação do corpo materno

desempenha importante papel. Segundo a autora, nas psicoses infantis precoces

tanto quanto no autismo, graves distorções do relacionamento da díade mãe-filho

parecem constituir a causa essencial de uma alienação da realidade por parte do

ego.


   No autismo ocorre uma retração do sujeito que recusa contato com o mundo

exterior e pode ser concebido como o efeito de um fracasso radical na instalação da

imagem do próprio corpo. Por conseqüência, caracteriza-se na criança autista,

desde os primeiros contatos, uma inaptidão em estabelecer relações afetivo-

corporais e simbólicas com as pessoas desde o início da vida.


   Crianças autistas são “prematuros psicológicos” se considerarmos que sua

tomada de consciência da separação do objeto ocorreu antes que suas capacidades

de integração fossem suficientes neuro-fisiologicamente. São particularmente

inclinadas à separação oral traumática. A natureza depressiva dos pais e sua

rejeição pelo estado da criança tornam mais difícil a emersão do autista do estado

de choque e afastamento em que se encontra. Uma vez desencadeado o estado de

autismo patológico tende a auto-perturbar-se e auto-agravar-se acabando por tornar-

se quase irreversível.


   De acordo com a teoria lacaniana, pais com dificuldades de ordem simbólica

vêm o bebê real em seu desnudamento. A ausência de dimensão simbólica e

imaginária dessa imagem real deixa o filho sem imagem no próprio corpo, tornando

problemática    sua      vivência   de   unidade   corporal,   bloqueando   a   possível

reversibilidade da libido do próprio corpo para a libido do objeto.
42


A Fase do Espelho

   A construção da imagem do corpo como unidade é feita através da experiência

da identidade quando a criança se descobre como um Eu. Esta estrutura que a

criança reconhece é, a princípio, parcial. É o que Lacan chama de fantasia de um

corpo parcial feita através do espelho. A função do espelho é de amenizar a

angústia das partes e integrá-las num todo.


    Ocorre na criança, quando está em fase de organização do esquema corporal,

sua fundamentação no corpo como algo passível de descoberta. Mas esta

descoberta também gera confusão entre a noção do que é o Eu e do que é o outro.


    Subitamente, a criança é levada a descobrir que o outro presente no espelho não

é o outro real e sim uma imagem, passando a distinguir a pessoa real da imagem. A

criança passa a ter consciência de sua imagem no espelho, de que aquela imagem

é ela própria, recuperando a noção de totalidade do corpo agregando numa

estrutura única, subjetiva e identitária.


    A busca de sua identidade, sustentada no imaginário é devida ao fato visível da

óptica. Reconhecemos o mundo através da imagem; fatos objetivos que antes não

eram amadurecidos o suficiente e depois passam a ser.


    O espelho simboliza e antecede a formação do Eu. É com ele que a criança se

imagina, se recria e cria novamente através da observação do outro, na busca de

sua identidade.


    A criança que vem ao mundo é fruto do desejo dos pais, seja por prazer ou

desejo de um ou dos dois. Tais motivos continuam a influenciar sua vida como
43



“sujeito” dentro da linguagem causada pelo desejo do outro. “A linguagem é

permeada pelo desejo e o desejo é inconcebível sem a Linguagem”. (Fink).


   Ao estudarmos em Freud a brincadeira do Fort-da, deparamo-nos com a noção

de investimento libidinal. É nos movimentos de presença-ausência da mãe, objeto

primeiro de amor, que a criança estabelece a noção de Eu, distinto de não-Eu,

simbolizado no jogo de perder e achar.


   A base dessas observações está, na teoria lacaniana, sedimentada em um

estágio fundamental do desenvolvimento: o Estágio do Espelho.


   Pode-se situar o autismo em um lugar psíquico aquém da alienação, como uma

recusa de estabelecer um vínculo narcísico com a mãe, primitivo e primordial,

impossibilitando a dinâmica simbólica especular. Não haverá ausência se ainda não

tiver havido presença. O bebê autista, apesar de ter sido gerado e criado por sua

mãe e não apresentar nenhum distúrbio orgânico, não olha para ela, não sorri nem

vocaliza e nunca a chama num momento de aflição.


   O “não olhar” entre uma mãe e seu filho e o fato de a mãe não se dar conta

disto, constitui um dos principais sinais, no começo da vida, que permitem formular a

hipótese de um autismo.


   A partir do segundo ano de vida, mesmo que o “não olhar” não culmine numa

síndrome autista característica – com estereotipias e auto-mutilações – este tipo de

vínculo fragilizado em sua origem aponta para uma grande dificuldade na relação

especular com o Outro. Se não houver intervenção efetiva, seja por parte dos pais,

da família, etc., nesse momento do desenvolvimento, a fase do espelho não se
44



constituirá convenientemente e, conseqüentemente, não ocorrerá a instalação da

relação simbólica fundamental.


    Como desdobramento desta falta primitiva ocorrerá o fracasso da construção da

imagem integrada do corpo e da constituição do Eu, pois a ausência de uma

imagem do corpo especular, bloqueia a transposição do narcisismo primário para o

narcisismo secundário e a criança se encerra em seu próprio corpo na “solidão

autística”.


                    “A dor faz parte da imagem do corpo, como lugar sensível onde o sujeito
                    pode conter seu eu, ou mesmo seu corpo, pois, para nós, o corpo é ao
                    mesmo tempo uma parte inconsciente do eu e o lugar de onde o sujeito
                    pode dizer: eu” (Dolto).


    A “Imagem do Corpo” ou como define Dolto “imagem inconsciente do corpo” é o

que se diz da formação da identidade através do outro definido como “IMAGE”. Num

jogo de palavras e fonemas feito pela autora, o “I” representa identidade; o “MA” a

primeira sílaba dita quando começamos a falar e o “GE” atribuído à terra, à base ou

ainda ao corpo que remete a “JE” ou “EU”.


    A “imagem inconsciente do corpo” desaparece à medida em que o sujeito se

identifica e se relaciona com a linguagem como o sujeito reflexo através do espelho.

A imagem do corpo pode se revelar sob a forma de sonho ou através de desenhos.

Na representação gráfica através do desenho, a criança se retrata e se define como

imagem inconsciente do corpo.


    Francis Tustin aponta algumas características do autismo infantil primitivo

citando:


    ¾Manifestações Corpóreas Características
45



  • Geralmente são crianças que gozam de excelente saúde desde o
     nascimento, podendo a eventual incidência das doenças características da

     infância ser encarada como sinal de progresso.


  • Pode haver uma história de ataques de choro e raiva desde a primeira
     infância.


  • Apresentam corpos rígidos que não respondem à solicitações externas.
     Não se adaptam a uma posição confortável quando postas no colo.


  • São graciosas, ágeis e geralmente destras.


  • Fazem girar objetos habilmente.


  • Tocam levemente os objetos que manipulam.


  • Podem denotar hipossensibilidade dos dedos das mãos e dos pés


  • Apresentam hipersensibilidade dos órgãos dos sentidos.


  • Objetos mecânicos invariavelmente as fascina.

¾Relações Objetais e Ambiente


  • Parecem avessas a toda e qualquer forma de contato com os outros.


  • A criança é inorientada, desligada das pessoas, desinteressada do que
     acontece a sua volta, distante e esquecida no ambiente.


  • O ambiente familiar é caracterizado em geral por altos padrões educativos
     e intelectuais.
46



  • Baixa incidência familiar de doença mental.


  • Perseveração no uso de objetos autísticos. Tendem a dividir o objeto se as
     assusta e depois procuram juntar os pedaços afim de torná-los novamente

     manejável.


  • Do ponto de vista da criança, a mãe parece ter-se fechado ao contato por
     três motivos:

     1º – porque a criança afastou-se dela;

     2º – por ser a mãe uma pessoa remota e distante por natureza;

     3º – por estar a mãe deprimida ou preocupada.


¾Linguagem, Fase do Espelho e Psiquismo


  • Evitam olhar as pessoas.

  • Denotam inibição do pensamento.

  • Revelam ausência virtual de vida fantasmática.

  • Podem não falar ou ser ecolálicas.

  • Não possuem a noção de uso do “sim”, “não” e “eu”.

  • Afirmam-se pela linguagem da repetição.

  • Apresentam potencial intelectual alto ou superior.

  • Denotam marcada capacidade para reconhecer padrão e forma.

  • Retiram-se precocemente da arena da vida.
47



      • Cessam o desenvolvimento lógico.

      • Funcionam com base em uma dicotomia entre um ego prematuro e o
          objeto externo.


      • Denotam persistência e excesso dos processos de envolvimento
          (extrusivo e intrusivo) em sua forma de lidar com a experiência traumática

          da separação.


      • Parecem estar absorvidas por si mesmas, isto é, vivem na convicção
          delirante de que estão “embrulhadas em seu próprio corpo” e no corpo dos

          outros, experimentados como prolongamentos do seu próprio corpo.


Cognição e Linguagem

   Uma criança normal aprende nos primeiros anos de vida a comer, andar, falar,

brincar. Ocorre também desta forma com a criança autista durante o primeiro ano de

vida, até que ela comece a apresentar os sintomas de impedimento da relação com

o próximo, quando começa a dispersar o olhar, a não responder quando solicitada,

e, tampouco, a se interessar pelo outro.


   O autismo pode ser detectado antes dos três anos de idade pelo prejuízo na

interação social, um não uso de brincadeiras de forma simbólica e um não

desenvolvimento totalmente natural.


   No que diz respeito ao atraso no desenvolvimento, considera-se importante a

teoria do desenvolvimento de Piaget que estabelece quatro estágios, pelos quais, o

indivíduo teria que passar: Estágio Sensório-motor (0 a 18 meses); Estágio Pré-
48



operatório (18 meses a 7 anos); Estágio Operatório Concreto (7 a 12 anos); Estágio

Operatório Final (12 anos ou mais).


   Segundo Piaget, a seqüência dos estágios é invariável, isto é, todas as crianças

atravessam os estágios na mesma ordem estabelecida. Cada estágio pelo qual a

criança passa é necessário para as próximas construções do estágio seguinte,

desde que se façam adequadamente. As diferenças em termos da velocidade com a

qual cada criança atravessa tais estágios também devem ser observadas. Assim,

algumas crianças atingem determinado estágio mais cedo do que outras.


   No caso da criança autista, ocorre um atraso no desenvolvimento da lateralidade

manual, uma incapacidade em apontar para objetos, simplesmente por não poder

desejar o que não é compreendido. Uma criança que não é capaz de compartilhar

com o outro um objeto de seu interesse ou de sequer apontar para solicitá-lo

(comunicação pré-verbal), não adquire uma base adequada para a aquisição da

linguagem e, conseqüentemente, não constrói um vínculo natural com a

comunicação. A criança que não é capaz de ler ou compreender, tecendo uma rede

de vocabulário consistente e plena de sentido, fica prejudicada em sua comunicação

e expressão.


   Segundo Wing apud Jiménez, o educador deve ter sempre em mente o nível de

compreensão da criança e afim de adaptar sua própria linguagem, adequando-a e

modificando-a de forma progressiva, falando de forma clara e lenta para melhor

apreensão do significado da palavra, quando esta estiver interessada.


   O autista com freqüência se fecha em um “casulo”. Isto se dá como defesa para

envolver e imobilizar a parte danificada da personalidade que diz respeito à

capacidade de compreensão. O pensamento concreto e a incapacidade de fazer as
49



abstrações necessárias causa restrições para o autista, criando uma barreira entre

emoção e cognição. Ele evita a comunicação, seja através da linguagem verbal ou

manifesta através de jogos, desenhos ou modelagem. Tal comunicação apresenta-

se escassa e, freqüentemente, nem existe, pois ele se comunica de forma limitada e

anormal.


   Ao educador cabe a tarefa de pelo menos tentar trazer o autista para dentro da

órbita da comunicação humana.


   Segundo Angel apud Jiménez a criança autista possui uma variedade enorme de

linguagem, mas sempre encontra dificuldade de compreensão.


   O mesmo autor cita que:


                     “As pessoas autistas têm dificuldade de integração dos canais sensoriais e
                     uma dificuldade de integração de informação dos distintos canais sensoriais
                     que serve para abstrair as regularidades do meio através da linguagem.”


   Em se tratando de aprendizagem, o autista dificilmente apontará para um objeto

ou dirá algo. Quando a linguagem é ausente, basta tentar entender ou criar uma

forma de se comunicar e de brincar juntos, criando relações entre ele e o objeto, de

acordo com o seu desenvolvimento. O ideal é que se comece a trabalhar com a

criança desde os seus primeiros anos de vida, logo que o diagnóstico for confirmado.


   Quando existente, sua fala é concreta e utilizada em forma de ecolalia, ocorrida

por um defeito na cognição e pela sua incapacidade de se colocar no lugar do outro,

estabelecendo um diálogo em que esta inversão lingüística inevitavelmente

aconteça.
50



                       “Em pessoas autistas se davam e se dão, menos dificuldades na recepção
                       pura e simples dos estímulos, e se davam e se dão menos dificuldades de
                       coordenação motora, portanto é importante levar em conta que para que
                       possam adquirir um mundo de significados será necessário superar a
                       limitação que impõe o efeito de ter canais sensoriais distintos. É dizer que o
                       mundo dos sentidos foram mundos separados, não relacionados entre si,
                       não seria possível adquirir significados já que não são informações que
                       implicam na capacidade de associar e de transferir a informação”.
                       (Jiménez).


   Há uma capacidade em crianças autistas de ordenar, classificar usando da

música e não da linguagem (vale lembrar que as estruturas usadas por um e outro

no cérebro são distintas).


   A criança, incapaz de produzir linguagem, associa ao brincar uma significação.

Discursar sobre ela é refazer o que a incomoda, tomando posse e dando ao

brinquedo uma conotação de realidade através do qual se comunica de forma

primitiva. No caso da criança autista, o fato de não atribuir significado ao brincar,

dificulta a comunicação e expressão, ficando ela sujeitada ao Outro discursivo que

brinca.


   Segundo Jiménez, o que deve ser trabalhado no contato terapêutico com

crianças autistas é:


   ¾linguagem comunicacional (percepção, compreensão e o gestual);


   ¾linguagem verbal (oral e gráfica);


   ¾a adequação do uso da linguagem no sentido de evitar ou corrigir as

          manifestações costumeiras (ecolalia, mutismo, inversão pronominal);


   ¾linguagem postural (gestos, mímicas, expressões e posturas corporais);


   ¾a interrelação entre pessoas e a relação entre pessoa e objeto;
51



¾a capacidade imitativa;


¾a formação de conceitos;


¾estimulação da memória;


¾a capacidade de classificar, ordenar e generalizar;


¾a cognição geral (verbal, auditiva e a resposta a elas);


¾o controle corporal (esfíncteres anal e uretral);


¾a coordenação visomotora;


¾o comportamento espacial;


¾o domínio das áreas da vida doméstica.
INCLUSÃO DO AUTISTA




   Definição de Psicopatologia: “entende-se por Psi + Patologia onde se estuda

causas e natureza das doenças mentais. Psic de origem grega significa alma e

patologia dor, Pato também no grego Pathos doença, paixão, sentimento.” (Cunha,

1997 apud Moreira).


   A compreensão do que é patologia e como ela interfere na vida destas pessoas

com o meio, vem ligada a conceitos e pré-conceitos, históricos e culturais, pelos

quais precisamos trabalhar na tentativa de humanizar o mundo, a sociedade e a

escola em que vivemos.


   A escola, muitas vezes, recusa e reclusa tanto quanto a sociedade, pois é um

reflexo da mesma e a Inclusão do diferente vem como fator gerador de atrito em

nossa sociedade, pois implica em mudanças de concepção do sujeito e demanda

reflexão sobre valores que obstruem o ambiente educacional e o comodismo de

quem se encontra nele. A relação igualdade, desigualdade e preconceito estão

latentes em todo momento no ambiente educacional.


   Vencer o preconceito e o rótulo dado ao autista é um grande passo a ser tomado

para vencer bloqueio da escola em se tratando de crianças autistas. Vemos cada
53



vez maior o número de autista na escola e fora de instituições e próximos à família,

integrado ao contexto social.


   Por que incluir crianças Autistas ?


                     “... existem também aqueles que necessitam de cuidados especiais para a
                     alimentação, o vestuário, a higiene pessoal e outros hábitos ou atividades
                     rotineiras. Em tais casos, essas pessoas necessitam desenvolver
                     habilidades, funções e aprendizados específicos. Algumas dessas
                     necessidades podem ser temporárias ou permanentes, dependendo da
                     situação ou dos circunstancias das quais se originam” (Sá/2002).


   Inclusão é a única forma do quadro apresentado ser amenizado e modificado. É

pela interação com a vida e pelo uso mais espontâneo de suas próprias capacidades

inatas. Quando o acidente psíquico de uma perda aparentemente irrecuperável

ocorreu pela primeira vez, essas reações autistas foram necessárias, mas com o

passar dos anos eles se tornam obstáculo.


   O autista é um sujeito em falta, por isso são mais sensíveis à aceitação do outro.

Para uma pessoa normal, o crescimento é um estado de independência. Já para o

autista, que é um sujeito centrado em si, esta independência representa a perda do

espelho. A escola entra como lugar de descoberta do Eu, de busca do que é bom e

agrada a criança.


   A criança autista tem uma incapacidade inata de responder às emoções e lidar

com suas necessidades, por isso o atraso na aquisição de elementos.


   Segundo Garcia Polaino, os autistas estão incapacitados para expressar através

de gestos, o que permite inferir que dispõe de certa capacidade para organizar e

expressar desejos ou idéias de forma não verbal.
54



   O Autista é, também, um sujeito aquém do seu desenvolvimento. Em suas

necessidades básicas, ele é sujeito à influência de diversos agentes, tais como a

maneira de ver, sentir, reagir, própria daqueles que o rodeiam desde os primeiros

anos de vida.


   Já o autista, em idade adulta, quando a comunicação é precária entre ele e

outras pessoas, seu núcleo interno ou EU imperfeita pela não descoberta de uma

outra forma de criar e interagir com o mundo que o cerca.


   É certo que crianças normais que hoje convivem com crianças autistas, seja qual

for a necessidade está preparada para uma sociedade de fato inclusiva. As crianças

autistas são vistas, aos olhos da sociedade, como “coitadinhas”. O que uma criança

“normal” que convive em ambiente inclusivo aprende é que, tanto quanto elas, as

outras crianças também são sujeitas de desejo.


Inclusão e Emoção

   Como diz Maslow, é preciso conduzir e reduzir a distância entre as aspirações

humanas e suas limitações, isto é, entre o que o homem é efetivamente, o que ele

gostaria de ser e o que poderá ser, como realidade e com potencialidade. Só assim,

recairemos na questão da Inclusão de forma mais humana.


   A frustração do não saber do professor e o pré-conceito o impelem a “escolher” a

experiência do aluno e a sua como professor.


   O conflito entre o real e o ideal só faz causar mais desgosto e contentamento,

isto muitas das vezes pode ser devido ao erro educacional com relação ao que é do

que não é relevante àquela criança, naquele momento.
55



   Tumulto emocional e hiperatividade são conflitos constantes em sala de aula,

deixa qualquer professor sem reação, além de nunca virem sozinhos e sim

associados a outros destemperos emocionais (raiva, medo) ainda provam as crises.


   É necessário que o professor se valha de informações e só por meio destas é

que podemos controlar as emoções, nossas e das crianças e reduzir a tensão entre

ambos e podendo, de forma mais objetiva, interferir e intervir positivamente.


   É preciso trabalhar com nosso sofrimento de não sabermos ao certo que

caminho tomar diante da apatia do aluno como também com o estado de sofrimento

que ele se encontra.


   O professor tem de se adequar ao aluno e o acolher quase que maternalmente

justamente por ele ver o estado de sofrimento da criança autista sem que se perca

para tentar instruir sobre as necessidades dele. É o professor que se angustia perde

tal capacidade e traz danos tanto para si quanto para a criança. É preciso também

cuidado ao formular ou falar algo para estas crianças.


   É através do afeto que podemos transformar o professor e, conseqüentemente, o

aluno, pois ele se projeta na figura do professor e dá uma nova forma à relação. Mas

é necessário que ele se perceba fora do outro e não se prenda exclusivamente ao

aspecto sentimental.


   Já nas crianças normais, este desenvolvimento ocorre entre 3 e 4 anos, onde

elas conseguem formular certas soluções às emoções a elas associadas, levadas

pelo desejo. Dos 5 aos 6 anos, conseguem identificar as crenças como fatores que

causaram certas emoções.
56



   A capacidade de simular, imaginar e descrever a realidade é o caminho pelo qual

as crianças se dispõem a entender a opinião e crença dos outros tal como seu

estado emocional, sem precisar desejar o mesmo.


   Assim, a aptidão em moldar internamente suas atitudes faz com que ela ganhe

lugar de destaque em relação a sua facilidade de compreender melhor as emoções

do que a criança autista.


   É preciso que haja, para um desenvolvimento das condições psicológicas, a

“consciência do próprio eu”, “capacidade para simular ou simbolizar”, “capacidade

para distinguir entre ficção e realidade”.


   Para os autistas sua dificuldade em relação a outro se dá pela incapacidade de

fazer repreensões internas das emoções, não compreendem as emoções dos

outros.


Cognição e Emoção

   Segundo Angel apud Jiménez, o que realmente é relevante à educação é a

questão da inflexibilidade cognitiva e emocional e sua necessidade de ordenar e

estruturar o mundo. Isto ocorre por meios externos artificiais e pouco flexíveis por

falta de linguagem e interação, tanto em competência quanto a motivação.


   É preciso correr na busca de desenvolver ao máximo as capacidades do sujeito

autista. Desenvolver sua potencialidade é também uma forma de amenizar seu

sofrimento, onde o autista, que agora está em busca de maturação social e

emocional possa trabalhar sua aceitação pelo grupo.
57



   Quanto mais cognitiva for à emoção maior difícil detectá-las nas crianças autistas

e compreender o real do mundo, compreender e manipular através da mente suas

atitudes com respeito às informações é inato (Leslie apud Polaino), abrir o mundo do

autista para estas percepções pela convivência com crianças “normais”.


   Ao invés de tentar compensar nossos alunos pelo que achamos que eles

possam estar necessitando, limitamo-nos a um entendimento superficial de suas

práticas e esquecemos de começar a usar as capacidades que possuem. Para isso,

eles precisam sentir que acreditamos em sua capacidade de fazê-lo, a própria

natureza e sua capacidade de resposta, bem como as circunstâncias externas

durante seu crescimento, terão desempenhado seu papel.


Escola

   O trabalho com criança autista é, com certeza, um dos grandes desafios da

escola por se tratar de alterações da linguagem e das emoções. Seu

acompanhamento vai além do escolar e o uso freqüente de medicamento pesa no

trabalho com a escola.


   Às vezes o autista apresenta uma série de modificações no medicamento e este

processo de experimento psiquiátrico causa angústia e ansiedade, tanto na família

quanto na escola, por não se saber o efeito daquele medicamento para aquela

criança e o reflexo no ambiente educacional causado.


   A criança autista é melhor quando sobre medicação específica; principalmente

quando há alguma patologia associada, fator de dificuldade em qualquer intervenção

feita com esta criança, seja psicológica, pedagógica ou familiar.
58



   Temos que levar a realidade sintomatológica para o trabalho pedagógico como

transtorno de linguagem, do pensamento, e das relações sociais e afetivas,

perceptivas e de atenção, da inteligência e motricidade além da personalidade e

conduta (Jimenez).


   É preciso que a escola fique atenta à conduta destas crianças em relação à outra

criança. O parecer da escola é muito importante posto que a criança. Passa boa

parte do tempo e das suas relações dentro dela.


   A escola é o melhor caminho para um desenvolvimento social sadio de acordo

com sua potencialidade educacional e emocional para lidar com atitudes e

atividades da vida acadêmica e principalmente fora dela de forma contínua.


   O trabalho deverá ser definido também em individual, em dupla ou coletivamente

de acordo com o potencial do aluno ou do grupo e a capacidade de sucesso da

atividade.


   O trabalho individual focaliza a aprendizagem da criança, o que é importante,

mas alguns momentos há que se trabalhar em grupo por ser com ele a criança que

ela si identifica e assume um papel e sendo maior a diversidade dentro dele, maior

será o modelo de relacionamento social e isto favorece ao desenvolvimento de sua

“persona”.


   O trabalho não segue regra específica, posto que se trata de uma clientela plural

em seu desenvolvimento, mas sim a partir de uma observação para saber o que

fazer, a que ter em mente o autista a ser trabalhado e não o quadro nosológico

apresentado.
59



   Há uma pré-disposição à regressão da criança e o trabalho deve oscilar entre um

constante ir e vir. É de fundamental importância valorizar suas habilidades, se assim

podemos dizer de sua capacidade de ajudar em atividades rotineiras e de relacionar

objetivos. São geralmente ótimos ajudantes em sala e muito organizados.


   Por ter uma noção difusa da realidade, temos que buscar limites, significação e

ordem, tentando estabelecer rotina e maneira especifica para tentar alcançar algum

objetivo e dar significação aos comportamentos sociais para que possam ser

entendidos, pois estamos biologicamente pré-dispostos a isso, desde com

estimulação apropriada. A fala é usada para compreensão dos sentimentos, e a

criança autista muitas das vezes não a compreende.


   As tarefas devem ser coerentes e estabelecer início, meio e fim dentro de um

espaço temporal previsto (do tipo antes do recreio, saber onde estão sendo

guardados seus objetos escolares para facilitar seu acesso e manuseio, bem como

aquele CD que ela gosta de ouvir enquanto faz as atividades em sala).


   Quando a escola for participar de eventos externos, o ideal é que seja

conversado com antecedência e, se possível, mostrar fitas de vídeo mostrando o

local e o tempo preciso de retorno como (antes do recreio). Se tudo for feito de uma

forma estruturada, há menos riscos da ocorrência de algum problema.


   Quando a escola estiver se preparando para uma visita ao museu, mercado,

excursões, praça ou qualquer atividade que fuja da rotina é preciso uma conversa

prévia e específica.


   Visões compartilhadas quase nunca coincidem. Daí a dificuldade de se saber

como trabalhar na escola com o autista. Em principio, trabalhamos com instinto e a
60



vontade de acertar, usamos da paciência e do respeito para com o ser humano a ser

trabalhado, e, acima de tudo, com a vontade de buscar mais e saber mais a respeito

destes pares misteriosos que nos cercam.


   Temos dúvida quanto ao caminho adequado a seguir, mas é evidente que a

posição de professores e profissionais que antes trabalharam com a criança seja de

suma importância. Ter a humildade de saber que pouco se sabe e muito há para

aprender em se tratando de um sujeito tão particular quanto o autista é um bom

caminho para a escola poder elaborar um material eficiente de trabalho.


   Muitas das vezes o currículo comum é adequado à criança autista. Em outras

situações, teremos que adaptá-lo à realidade da criança. Quem nos dirá o caminho a

ser seguido é a própria criança e suas necessidades de desenvolvimento e

capacidade apesar de muito se pensa ao contrário.


                      “Os enfoques pragmáticos e os sistemas de signos têm que ser adaptados a
                      autista com uma esperança de comunicação desta criança”. (Jiménez).


   Os objetivos devem ser estabelecidos, conteúdo e metodologia a ser utilizada

devem ser de acordo com cada caso particular, trabalhados em função da redução

de conduta inadequada e do desenvolvendo da função atrasada (linguagem,

cuidados pessoais).


   Quanto mais cedo for a intervenção da escola maior as chances de sucesso e

melhor poderá evoluir o trabalho psicopedagógico no seu desenvolvimento, tanto

pedagógico quanto de interação.
61



A Escola e a Construção do Sujeito

   A escola, para satisfazer a sua demanda de trabalho precisa unificar trabalhos

pedagógicos como a reconstrução do Eu que este sujeito deixou se perder em

algum momento de sua vida.


   A escola precisa seguir ao constante destruir e construir do sujeito em relação ao

outro, o meio do qual ela está incluída engloba as relações com os outros, objetos e

os meios de aquisição do conhecimento dentro de uma cultura.


   É na escola que a criança põe em prática as condutas disponíveis e tira novos

meios para poder agir em sociedade. Esta ação, a principio, sobre a intervenção

através da linguagem para retornar ao social.


   Mas para que um trabalho com autista seja satisfatório, é preciso que,

possamos, em um primeiro momento, somente receber estas crianças dentro da

escola para tentar familiarizá-la com o ambiente e com aqueles sujeitos que ali estão

inseridos para depois trabalharmos a noção que ela tem dela e do outro e quando

ela se separa deste outro.


   Daí em diante precisa, a escola, trabalhar o corpo e como ela lida com seu corpo

em movimento, em contato com o outro corpo e com seu cuidado com o corpo.


   Vimos com freqüência a presença de crianças grandes em processo de

alfabetização, justamente por estarem elas, anteriormente, neste conflito dela com o

mundo, com seus sentimentos, com o corpo.


   Dentro da “Teoria da Motivação Humana” de Maslow, as aquisições de estágios

superiores do desenvolvimento, só poderão ocorrer, mediante satisfação secundária
62



de outros, no topo da pirâmide estão às necessidades físicas ou fisiológicas

seguidas das necessidades de afeto e segurança e aceitação pelo outro. A pessoa

em dificuldade em tais necessidades básicas está centrada em sua segurança

pessoal e, portando em um estado de “motivação da deficiência”.


   A educação não deve se limitar ao ensino de conteúdo e engloba o espaço que a

ele o sujeito está isento. O corpo da sala, espaço, precisa de maior mobilidade e

acesso e de uma forma lógica organizada para manuseio o espaço (tempo), também

para duração das atividades e o momento oportuno para sua realização.


   O buraco negro pode ser restaurado por atividades cognitivas e atividades

criativas com o mundo exterior para estimular o crescimento e a busca por uma

restauração de sua capacidade psíquica através de uma experiência. Tais

experiências servem para que o autista se separe e elabore o mundo para, a partir

daí, possam começar a relacionar com as outras pessoas.


Os Objetos em Sala

   Meltzer apud Tafuri, o pensamento da criança autista é atraído de forma

desordenada pela percepção dos objetos, as qualidades visuais, à audição dos

sons, a experiência corporal com os objetos, o paladar dos alimentos e nos objetos

em si e na voz. Atenção e postura são o que nos permitirá aproximação física com a

criança pelo toque, olhar que não são tão toleráveis.


   Segundo Lecourt e apud Tafuri, o espelho sonoro antecede o espelho visual e

relação entre emissão sonora e a exigência de amor, a expressão de cinismo e o

reconhecimento do outro, ainda segundo Langer apud Tafuri linguagem e o corpo

caminham juntos, a criança não só ouve sons como os experimenta no próprio
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O Autista na Escola Inclusiva

  • 1. INSTITUTO SUPERIOR DE EDUCAÇÃO ANÍSIO TEIXEIRA FUNDAÇÃO HELENA ANTIPOFF O Autista na Escola Inclusiva Rosemary Furtado Ibirité – Minas Gerais Março 2005
  • 2. O Autista na Escola Inclusiva Rosemary Furtado Monografia apresentada na 1ª Turma do Curso de Pós-graduação Latu sensu Educação Especial na Escola Inclusiva, do Instituto Superior de Educação Anísio Teixeira, Fundação Helena Antipoff, da cidade de Ibirité, Estado de Minas Gerais, como exigência para a conclusão do curso, sob orientação da Profa. Vanêssa Tôrres de Oliveira. Ibirité – Minas Gerais Março 2005
  • 3. À Vanêssa Tôrres de Oliveira por me transmitir conhecimento e a importância da pesquisa e trabalho científico.
  • 4. Agradeço o apoio imensurável de minha família e meus amigos que compreenderam minha ausência em diversos momentos.
  • 5. ÍNDICE ANALÍTICO INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 6 HISTÓRICO ................................................................................................................... 8 História da Inclusão................................................................................................. 8 História das Instituições Manicomiais ................................................................... 10 Sujeitos de Direito e Dever ................................................................................... 13 Estatuto da Criança e do Adolescente .................................................................. 13 Educação Inclusiva ............................................................................................... 15 A Questão Humanista na Inclusão........................................................................ 18 AUTISMO .................................................................................................................... 22 Critérios Diagnósticos para F84.0 – 299.00 – Transtornos Autistas ..................... 26 Possíveis Fatores de Autismo............................................................................... 28 Os Tipos de Autismo............................................................................................. 29 O Autista e a Noção de “Eu” ................................................................................. 30 Dados Estatísticos ................................................................................................ 33 O Desenvolvimento segundo Wallon .................................................................... 34 Dados Biográficos ................................................................................................. 34 A Escola de Wallon ............................................................................................... 37 Afetividade ............................................................................................................ 37 O Amor.................................................................................................................. 39 A Criança Autista e o Desejo Paterno................................................................... 40 A Fase do Espelho................................................................................................ 42 Cognição e Linguagem ......................................................................................... 47 INCLUSÃO DO AUTISTA ................................................................................................ 52 Inclusão e Emoção................................................................................................ 54 Cognição e Emoção.............................................................................................. 56 Escola ................................................................................................................... 57 A Escola e a Construção do Sujeito...................................................................... 61 Os Objetos em Sala .............................................................................................. 62 O Professor........................................................................................................... 63 As Várias Linguagens da Criança......................................................................... 64 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................. 66 ANEXO I – QUESTIONÁRIO ........................................................................................... 69 Perguntas.............................................................................................................. 69 Respostas ............................................................................................................. 70 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................... 73
  • 6. INTRODUÇÃO Às vezes me pergunto: O que tanto assusta quando o tema é “criança autista e inclusão”? Muitos professores vêem o trabalho como dom de quem com estas crianças trabalha e dizem que não dariam conta, que não saberiam lidar com elas. É preciso vencer as barreiras e preconceitos instalados nas pessoas e na escola para que seja feito um trabalho satisfatório e eficiente, sem pré-conceituar a criança e o potencial investido nela, seja pela família ou pela escola. O tema aqui discutido é novo e polêmico dentro da escola e na sociedade, mas para que possamos entender um pouco mais sobre o autismo hoje é preciso retroceder a um tempo em que a sociedade excluía o “diferente” em favor de uma “normalidade” imposta pelo próprio homem que o encarcerava. Existem, hoje, políticas de direito em favor daqueles, até então excluídos sociedade e grupos de luta (incluindo as famílias de portadores de necessidades especiais), que procuram o bem-estar para todos aqueles sujeitos discriminados por não serem produtivos ou “interessantes” para o sistema capitalista dominante.
  • 7. 7 O primeiro passo para que estas pessoas se caracterizarem membros atuantes de um grupo é através da escola. É ela quem indica o caminho, que mostra o mundo, e onde as pessoas podem participar de uma vida que transcende a restrição e o isolamento que a patologia impôs como condição a tais crianças. Foi através de movimentos filosóficos em contrapartida à psiquiatria que surgiram grupos de interesse pela causa humana (humanismo), a quem se deve muito pela luta em favor do excluído em valorização ao tempo e a particularidade do ser humano. É nessa situação de impasse que se encontra a criança autista: presa a seu mundo de isolamento e objetos, que não se enquadra nem no mundo do Outro, nem no seu próprio mundo. Sua noção de temporalidade é comprometida e, enquanto estiver atuo-centrada, não será capaz de alcançar níveis maiores de relacionamento afetivo ou de cognição, tornando-se alheia e desinteressada pelo mundo à sua volta. É preciso trabalhar a noção da criança autista consigo mesma; seu corpo com o corpo do outro e com o “corpo” (espaço físico) da escola. É preciso compreender seu desejo para um melhor enquadramento no ambiente educacional e, conseqüentemente social. Tratar e acolher o autista é um constante construir e reconstruir o sujeito pela presença efetiva e eficaz referenciada no Outro. É preciso vencer a barreira do sujeito-objeto possibilitando seu contato com o Outro (em quem estas crianças já não investem mais emocionalmente), o que só será possível através da satisfação dos desejos primários, da estimulação do imaginário e da aquisição e ampliação da linguagem.
  • 8. HISTÓRICO História da Inclusão Aqueles que conhecem a história do “O Corcunda de Notre Dame” de Victor Hugo sabem que o personagem Quasímodo (“Aranha”) é um relato que delineia o perfil da história do deficiente na Idade Média. No século XV, os deficientes foram isolados da sociedade por sua aparência física nada agradável aos olhos e pela peculiaridade de seu comportamento. Nesse período, eram apartados do convívio social e desempenhavam, no máximo, funções secundárias – como tocar o sino da torre da catedral de Paris, atividade exercida pelo personagem Quasímodo. Segundo Foucault, a anormalidade, por si só, fazia pressupor o período. Dos séculos XVI ao XIX, os deficientes não eram tutelados pela igreja e foram institucionalizados em asilos e albergues. Na Europa, constam os primeiros relatos sobre hospitais psiquiátricos que funcionavam como presídios, sem que houvesse, entretanto, uma assistência formal ou um programa terapêutico de cuidados planejados para os pacientes. Neste
  • 9. 9 período, no Brasil, o atual Instituto Benjamim Constant, no Rio de Janeiro, foi um dos precursores da educação especial. No século XX, aos deficientes são atribuídos alguns direitos ainda de cunho religioso, mas não sistematizados nos planos clínico, pedagógico ou educacional. Na Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 10 de dezembro de 1948, os direitos conquistados por pais e parentes de pessoas portadoras de deficiência, vieram se caracterizar como crítica à segregação e em busca de melhores condições de vida social e moral. No Brasil, a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação), de n° 4.024 de 20 de dezembro de 1961, decreta a primeira lei que ratifica a educação aos excepcionais, se possível, em ambiente educacional formal, consolidada em 1978 pela Constituição Brasileira, dando direito à gratuidade materializada, isto é, sem ônus financeiro para a educação da criança deficiente, desde que a condição social e econômica da família seja comprovada como deficitária ou insuficiente. Após dez anos, a nova constituição notifica atendimento preferencial ao deficiente na rede regular, sendo este reforçado, em 1990, pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. A Lei Federal 7.853/89 garante a gratuidade de acesso à rede pública de ensino regular ao aluno portador de deficiência física ou mental e prevê punição de um a quatro anos a quem negar ou cancelar matrícula de qualquer aluno deficiente. A Conferência Mundial de Educação para Todos de 1990, em Jountien, na Tailândia, formaliza a proposta de acesso universal à educação para homens e mulheres de igual modo, assim como para grupos minoritários (camponeses,
  • 10. 10 refugiados, negros, índios, presos e deficientes em geral) promovendo o senso de igualdade de direito à escolarização e estabelece a adequação de uma maior abrangência de conteúdo informativo, visando conseqüente e significativa melhora no ambiente educacional. A grande alavanca educacional inclusiva se deu em junho de 1994, quando representantes de oitenta países se reuniram e assinaram a Declaração de Salamanca, na Espanha, firmando compromisso no sentido de garantir a escolarização básica, reforçando a idéia de que todas as crianças, inclusive as portadoras de deficiência física e/ou mental, deveriam ser acolhidas, sendo este princípio considerado como eficaz na luta contra a discriminação. No Brasil, a LDB 9.394/96 Art. 58 e 59, em consonância com Legislação Federal Art. 74, determina que a educação de PNEE (Portadores de Necessidades Educacionais Especiais) deve se dar, de preferência, na rede regular de ensino. História das Instituições Manicomiais A terminologia adotada para tais instituições decorre com o contexto social e histórico. Asile, madhouse, asylum, hospizio são alguns deles. A palavra manicômio aparece no Século XIX para identificar o que hoje são os hospitais psiquiátricos. Michel Foucault, em 1961, publica “A História da Loucura” em um estudo retrospectivo em que mescla psicologia, filosofia, história e prática clínica. Trata-se de uma obra com o olhar ao passado sobre uma concepção presente de loucura e sua mudança conceitual. Segundo esse estudo, na era medieval, os loucos eram considerados como santos e caminhavam livremente pelas ruas. Com o advento do renascimento e do humanismo, a santificação se tornou sabedoria, um reflexo da
  • 11. 11 insanidade social. Na idade da razão, a loucura, presente entre os filósofos da época, separa o que é “razão” de “não razão”. Na cultura árabe, surge o primeiro hospício. Enquanto que na Europa, só após a morte de Descartes (um dos principais filósofos deste período), é criado o Hospital Général, em Paris, para os excluídos sociais, tais como: loucos, indigentes, mendigos, homossexuais, alcoólatras e criminosos. O louco passa do estatuto de sábio para a condição de “objeto circense” da época. No final desse período, a sociedade viu o encarceramento como crime bárbaro, passando a definir os deficientes como doentes e não como criminosos. Desta forma, a sociedade agrega os valores morais à lei. Os loucos são encaminhados a cuidados médicos e tornam-se sujeitos de outra espécie de aprisionamento: o medicamentoso. Sob a tutela do psiquiatra. Com o advento da Psicologia e da Psicanálise amplia-se a noção de saúde e a loucura passa a ser assistida. Rever a história das instituições psiquiátricas faz-nos refletir sobre os erros do passado e sobre a concepção histórico-social da loucura e remete-nos a avaliar sobre as tentativas de humanização do atendimento, tanto ao doente mental quanto ao deficiente. Como exemplo tem-se a declaração do direito fundamental de liberdade e igualdade de direitos, descrita no Código Civil de 1916. A clínica do isolamento é uma instituição falida pela falta de cuidado com a subjetividade e humanização nas relações com os pacientes. A tendência atual é a inserção do paciente psiquiátrico no meio social, visando promover sua inclusão. “Os sujeitos que sofrem psiquicamente nem sempre têm clareza sobre aquilo que os faz sofrer. Geralmente não sofrem sós, ou a dois, ou a quatro paredes. Os sujeitos adoecem na vida, e a vida está em toda parte, estruturada em instituições.” (Paulon)
  • 12. 12 “Podemos nesta medida pensar que o corpo que adoece, sofre, goza não é uma abstração de um certo ramo científico. O corpo que indica um sofrimento está marcado por várias instituições: quando atinge alguns desses espaços organizados para "cuidar" dele já chega marcado por uma educação autoritária, por uma sexualidade moralista, por uma produção econômica exploradora, por uma sociedade, enfim, que exige adaptação a inúmeras instituições.” (Paulon) Tem-se como exemplo da realidade psiquiátrica no Brasil o filme “O Bicho de Sete Cabeças” que retrata as instituições de isolamento moldadas por interesses econômicos e aponta os maus-tratos realizados dentro de seus portões. O personagem principal figura como um dependente químico que passa por diversas clínicas, convivendo com vários tipos de pessoas que sofrem com inúmeras patologias e problemas. Esbarra em conceitos sociais e preconceitos da família e com a falta de informação, ficando tanto a margem da sociedade quanto da loucura. A negação da identidade do sujeito em nome de uma suposta reabilitação é refletida nas estereotipias e afastamento do real. A esse estado a sociedade deu o nome de Insanidade Mental, sendo que seu maior causador é a própria instituição, que exclui, isola, cerceia e violenta. Como marco na construção da mudança deste cenário, no final da década de 70, a partir da redemocratização e fim do militarismo, deu-se início no Brasil à luta antimanicomial, através de denúncias de violências e maus-tratos a doentes mentais. Nos anos 80, ocorreram as primeiras tentativas de implementação e melhorias das instituições psiquiátricas, mesmo sob grande polêmica e movimentos de resistência. Surgem movimentos individuais pela Reforma Sanitária e a pela Reforma Psiquiátrica, culminando com o projeto de lei 3657/89.
  • 13. 13 “Navegarmos pela subjetividade em tempos de novos dilúvios requer, talvez, ainda, uma sabedoria trágica, um certo amor pelo que virá, pelo que a vida nos reservará. O que podemos amar no homem é ser ele transição. E naufrágio...“ (Paulon) Sujeitos de Direito e Dever Segundo Santos: “Uma política de igualdade genuína é a que permite a articulação horizontal entre as identidades discrepantes e às diferenças que se acentuam a ela. O novo imperativo categórico que deve presidir uma articulação pós-moderna e multicultural das políticas de igualdade e identidade é termos o direito de ser igual sempre que a diferença nos inferioriza; temos o direito de ser diferente sempre que a igualdade nos descaracteriza.” De acordo com o artigo 227 da Constituição Federal de 1988: “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar a criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade, à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, descriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.” Ainda segundo Sá: “É direito incondicional a escolarização de todos os alunos nos mesmos espaços educativos, transformando a escola, para que recebam as diferenças individuais com adequação, aparelhamentos e capacitação docente. Reconstruir uma escola exige a revisão de posturas e concepções voltadas em estruturas includentes.” Estatuto da Criança e do Adolescente O Estatuto da Criança e do Adolescente, de 13 de julho de 1990, promulgado pela Lei 8069/90, determina uma nova forma de garantir os direitos da criança e do adolescente. O Estatuto leva em consideração o fator humano da criança e seu processo de crescimento, sendo ela considerada um sujeito em desenvolvimento e dependente
  • 14. 14 de necessidades, de cuidados por parte dos pais e da sociedade. Inclui-se aí a União, os Estados e Municípios sobre a supervisão do Conselho Tutelar. É incumbência do Estado, ainda: Reservar parte de seus recursos, tais como impostos, à proteção da criança e do adolescente. Garantir oportunidade e facilidade para que as crianças possam se desenvolver em todos os aspectos (físico, mental, moral, espiritual e social) livre e dignamente de forma saudável e suave. Protegê-las de maneira absoluta. O ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) valoriza e agrega a família remetendo a ela o processo educativo/pedagógico/preventivo por ser a primeira responsável pelo sustento e manutenção dos filhos na escola. Para qualquer forma de descuido seja por parte da escola, família ou sociedade haverá punição de acordo com a lei, seja por ato ou omissão ao que lhe assegura a constituição, quanto ao direito: de brincar, ao lazer, à prática de esportes, a participação na vida social e familiar, a assistência da família ou sociedade, e sobretudo direito a terem respeitados o corpo, a alma, a moral e a imagem (identidade, valores e espaço). (Observação: Para fins deste estatuto, criança é todo cidadão com idade inferior a 12 anos completos; adolescente é todo aquele entre 12 e 18 anos incompletos.)
  • 15. 15 O artigo 10, inciso III assegura à futura mãe a gratuidade pelo SUS (Sistema Único de Saúde) de exames preventivos que possam detectar anomalias no bebê e assistência à família. O artigo 11, parágrafos 1º e 2º favorece a criança e ao jovem deficiente a gratuidade e garantia de acesso a todo e qualquer serviço que tem por fim a promoção, proteção e recuperação da saúde de maneira especial. Fica a cargo do poder público o fornecimentos de medicamentos ou quaisquer outros recursos para garantir a adaptação da criança, se assim for necessário. À criança é garantida, como condição plena de desenvolvimento, seja qual for seu potencial, uma escola que a valorize, iguale e respeite. É assegurada no artigo 57 a inclusão, mas estabelece uma garantia àqueles que com elas estejam envolvidas, que tenham preparo para poder recebê-los, sendo que esta lei garante efetiva fiscalização. Educação Inclusiva Entende-se por Educação Inclusiva o processo pelo qual todos os Portadores de Necessidades Especiais ou de Distúrbios de Aprendizagem, na rede regular de ensino, em todos os seus graus possam ser atendidos por uma escolarização global (normal) com objetivo de integrá-los à comunidade, de forma a buscar o máximo de seu potencial como os outros colegas. A escola é o lugar onde, de forma ideal, o ambiente educacional torna possível a articulação do processo educativo com o processo de socialização.
  • 16. 16 Os agentes de ensino deverão ser facilitadores do processo de inserção da criança deficiente junto ao grupo de colegas, avaliando suas necessidades e possibilidades de forma a favorecer sua integração. O professor, consciente das dificuldades e limitações de tal aluno, deve estar apto a aproximar-se deste, adequando seus objetivos pedagógicos de forma particularizada, formando com os pais e a equipe interdisciplinar uma parceria saudável que viabilize o processo de ensino/aprendizagem. Assim como se fazem necessárias adaptações no aspecto físico do ambiente escolar de modo a facilitar e atender as necessidades dos alunos especiais, tornam- se necessárias mudanças na forma de avaliação e investimento na formação continuada da equipe técnica e de suporte. O “Princípio de Normalização”, elaborado nos anos 70, diz respeito a uma “colocação” do portador de necessidades especiais na sala de aula comum, acompanhado particularmente por um professor da área de educação especial com finalidade de sustentar e promover a permanência do deficiente na classe regular pelo máximo período de tempo possível. Até aqui o que se apresenta formalmente em termos de suporte ao portador de deficiência são “políticas públicas” fragmentadas, pretendendo uma tríplice ação: Na Saúde: através do suporte ao tratamento medicamentoso e de reabilitação aos portadores de déficit por patologias motoras. Na Assistência Social: por meio da distribuição de benefícios e recursos, mas ainda de forma inespecífica e não particularizada.
  • 17. 17 Na Educação: sendo este o fator mais desprovido de recursos essenciais a sua efetivação, eficácia e sustentação. Nos anos 80, houve um movimento de pessoas portadoras de deficiência para mudar este quadro. O aluno especial passou a ser visto como pessoa que demanda recursos, equipamentos, técnica de abordagem e especificidade de atenção pedagógica de acordo com sua condição física, sensorial ou mental. Com a LDB 9394/96, projetos referentes ao portador de deficiência surgem como novo reflexo e nova proposta para uma educação realmente inclusiva. A proposta de inclusão é mais abrangente porque visa a inserção e interação do aluno deficiente junto à classe regular desde o início da sua escolarização, sem mediação de ensino especial. A inclusão escolar busca mudanças de pontos de vista sobre os portadores de deficiência revertendo qualquer forma de exclusão que possa abranger também aquelas que possuem altas habilidades, crianças de rua ou trabalhadoras, as nômades ou membros de minoria (étnica, religiosa ou cultural). Para que seja possível sua permanência na escola regular é preciso que garantir uma educação de qualidade com currículo apropriado, conforme a Declaração de Salamanca (1994): “... o desafio que confronta a escola inclusiva é no que diz respeito ao desenvolvimento de uma pedagogia centrada na criança capaz de ser bem- sucedidamente educada como todas as crianças, incluindo aquelas que possuem desvantagens severas (grifo meu). O mérito de tais escolas não reside somente no fato de que elas sejam capazes de prover uma educação de alta qualidade a toda criança. O estabelecimento de tais escolas é um passo crucial no sentido de modificar atitudes discriminatórias, de criar comunidades acolhedoras e de desenvolver uma sociedade inclusiva”.
  • 18. 18 Na escola inclusiva os projetos pedagógicos são construídos coletivamente pelos alunos e equipe técnico-pedagógica, através de um currículo aberto e natural capaz de refletir e possibilitar a ampliação e expansão das experiências vividas, numa organização branda e receptiva às mudanças que se fizerem necessárias nos tempos e nos espaços escolares, com arranjos organizacionais e modalidades de ensino adaptadas às necessidades dos alunos. São adotadas estratégias educacionais de respeito e valorização das diferenças e do modo de se expressar de cada sujeito, dos ritmos pessoais de aprendizagem, dos princípios e valores culturais, dos talentos e habilidades individuais. A denominação “necessidades especiais” vem sendo cada vez mais difundida nos meios educacionais e acadêmicos, por tentar conter e diminuir o aspecto negativo trazido pela denominação de pessoas “excepcionais” ou “especiais”. Tal rótulo ignora o fato de que todo aluno é especial e toda escola é especial em sua singularidade. A denominação é o que menos importa, o que interessa é o sujeito e sua educação. A escola não pode ser um fator de homogeneização. Deve-se estar atento às diferenças físicas e culturais encontradas nas crianças, observando-as sob a ótica da singularidade em sua forma de avaliar e reagir ao mundo e ao outro através de suas experiências pessoais. A Questão Humanista na Inclusão Surgido nos anos 50 nos Estados Unidos e na Europa, o humanismo é um movimento filosófico que reflete a insatisfação com os caminhos tomados pela psicologia (que construía uma imagem de homem parcial, incompleta e desumana,
  • 19. 19 excludente dos valores) e, em contrapartida, à visão marxista vigente (exclusa às ciências sociais, à biologia, à educação e à filosofia da ciência). O humanismo destina-se a todos os interessados no estudo e na ciência do humor, da criatividade, dos valores humanos, da autonomia, do crescimento, da auto-realização e do uso pleno de suas potencialidades. Sua principal preocupação é com a pessoa e seus valores, tal como a dignidade em seu desenvolvimento e potencial, vendo a pessoa como sujeito desejante de descoberta dele próprio e como um ser ligado a outras pessoas e grupos. A filosofia humanista pretende oferecer solução para problemas que ficaram abandonados por muito tempo e auxilia o homem com visas a contribuir para a sua saúde psicológica, reconhecendo seu espírito e sua necessidade de encontrar e buscar significado para a vida. Na visão humanista, a maior responsabilidade de cada um implica em éticas, religiosidade e legalidade. Um grande contingente de grupos sociais discursa e valoriza a diversidade, estimulando a troca e a luta por direitos, tendo como base a família. Para que tais direitos sejam reivindicados faz-se necessário que haja outras pessoas vivendo a mesma questão, preferencialmente em etapas mais avançadas, para produzir as bases teóricas a partir de experiências parciais e vivenciais. Segundo autores como Decroly (1871-1932), importa respeitar a criança como ser total, concreto e ativo; como um ser individual e social, plenamente firmado e situado. Makarenko (1888-1932) diz que o ser humano é diferente dos outros animais em relação às noções de tempo e espaço, por entender a singularidade humana, aplicando a cada situação um tratamento especial.
  • 20. 20 O grande desafio da sociedade está, idealmente, em vencer as barreiras padronizadas de viver e pensar de nossa cultura televisiva e globalizada. A inclusão vem como fator de humanização e de crítica frente ao preconceito e respeito ao direito do outro, não apenas de tolerância frente ao diferente. A forma como o professor informa e conduz o aluno, positiva ou negativamente, pelos objetivos escolhidos pela escola ou pela sociedade, está nas mãos do professor. Ele é um dos sujeitos que mais influência, cabendo a ele construir uma boa impressão sobre si mesmo, seja de ordem física e/ou emocional, e sobre o mundo, de modo que possa influir significativamente na construção da criança. O professor interessado em realizar seu trabalho, considerando as questões humanitárias tais como respeito, receptividade e compreensão, visa o amadurecimento da pessoa e precisa levar em conta os interesses do educando e trabalhar em busca de uma boa técnica pedagógica, atentando-se para os aspectos pessoais e humanos da educação. Não há como falar em Humanismo deixando de lado uma questão tão discutida como o Existencialismo, que tem no homem o princípio fundamental de todo modo de pensar e de proceder sem preconceitos e limitações biológicas e morais de acordo unicamente com a existência de sua natureza (Grande Dicionário da Língua Portuguesa, livro 7). O Existencialismo está centrado no homem como pessoa situada no mundo do tema (relação pessoa-pessoa, a liberdade, a responsabilidade, a escala individual de valores, o sentido de vida, a ansiedade, o sofrimento, a angústia e a morte) e no processo (o enfoque das experiências humanas subjetivas e de conscientização).
  • 21. 21 A ideologia de Maslow, um dos mais importantes humanistas, diz que é preciso que todos trabalhem em prol do desenvolvimento da humanidade, para seu pleno potencial, sem preconceito, livre, buscando uma identidade individual e coletiva, fazendo uso da experiência construída como base do seu conhecimento. O homem humanista valoriza a solidão e sua sólida comunicação intuitiva tanto quanto as conceituações abstratas, como formação do “eu” e da autonomia do homem, conseqüente de seus atos presentes, reflexos no futuro. Conceitos como igualdade, desigualdade, preconceito são discussões freqüentes dentre os humanistas. Em nossa cultura vem associada à igreja e conseqüentemente ligada à diferença. Ao longo do tempo, veio a igualdade democrática, perante a lei e, de fato, com direitos e deveres. Segundo Moraes: “A igualdade perante a lei, a igualdade de participação política e a igualdade de acesso a condições que preocupam o conjunto da humanidade, como a paz, o desenvolvimento, o meio ambiente, etc.”
  • 22. AUTISMO De acordo com Jiménez, “... autismo representa uma alteração nas diferentes áreas evolutivas em uma idade temporária e que gera uma disfunção permanente.” A origem da palavra Autismo vem do grego, eaftismo, que quer dizer “fechar-se em si mesmo”. Este termo é utilizado para definir um dos sintomas de esquizofrenia de separação da realidade e aversão externa e interna, de excitação, ânsia e obsessão, a tal ponto que gera nos portadores de tal nosologia uma descarga motora que se caracteriza com movimentos em torno de si, utilizando-se ou não de objetos para manter-se num estado emocional de equilibração. Desconhece-se toda e qualquer verdade sobre o autismo, possuindo-se somente embasamento teórico e clínico do que ele é de fato. Há na descrição de muitos autores, diferenças de definições, onde o discurso médico e o discurso psicanalítico divergem em vários pontos. Para a psiquiatria, o autismo trata-se de um quadro de ausência de interação social e déficit no desenvolvimento. Já para a psicanálise, o modo pelo qual a
  • 23. 23 resposta da criança autista é dada com relação ao Outro é refletida nas relações com rompimento, isolamento e ausência de laço social. Kanner descreve o autismo como um quadro de isolamento e não interação antes de um ano de idade e de retração emocional com prejuízos cognitivos e possível disfunção cerebral orgânica. Segundo este autor, o quadro apresentado é de incapacidade de estabelecer contato, atraso no desenvolvimento de linguagem, que mesmo quando existente não funciona como comunicação (ecolalia, inversão de pronomes), jogos e brincadeiras repetidas vezes, falta de imaginação, aparência normal com a primeira infância não equivalente a seus pares. Há, porém, relatos anteriores a Kanner que retratam uma série de comportamentos característicos do autismo, como dos meninos selvagens de Aveyron e Kasper Hauser, os meninos lobos de Hesse e os meninos ursos da Lituânia. Asperger e outros vieram redefinir o quadro até então apresentado acrescentando: a relação de fascínio com objetos eleitos; a presença de potencial cognitivo relativamente bom; isolamento desejante e obsessivo. Atualmente, o Autismo é denominado por muitos autores como ausência de interação social no desenvolvimento e déficit da comunicação com limitações interativas. O autista se comporta de forma não-verbal através de: contato visual indireto, expressão facial, postura e gestos corporais. Sua relação com o outro é restrita e sem interação, pois não a compreende. Sua noção de outro também é lesada tanto em sua essência quanto aos sentimentos.
  • 24. 24 No diálogo, quando existe alguma forma de comunicação, mesmo que exista fala, esta pode ser alterada em sua qualidade sendo apresentada de forma bizarra e repetitiva. A incapacidade de estabelecer relação social faz com que os autistas tratem o outro com relativa indiferença, como um objeto passivo a ser substituído ou, do contrário, apegam-se de forma exagerada a alguém. Com freqüência, rejeitam o toque e são sensíveis ao som, à luz, a odores fortes e apresentam gostos restritos na alimentação. Apresentam comportamentos bizarros, muitas vezes sendo evidentes oscilações de humor, com risadas ou choros sem motivo aparente. Crianças autistas têm pouca noção de riscos (altura, trânsito de automóveis, etc.). Paradoxalmente, sentem pavor sem sentido por coisas corriqueiras. Costumam dormir mal e não se orientam bem no tempo e no espaço. Kaplan (1997), Newcombe (1999) e outros definem retardo mental como um funcionamento intelectual geral abaixo da média que se origina durante o período de desenvolvimento e está associado a prejuízo no comportamento adaptativo. Citam que cerca de 40% das crianças autistas apresentam retardo mental e grande parte das crianças retardadas tem sintomas comportamentais que incluem características autísticas. Bebês autistas apresentam comprometimento na relação primordial com a mãe respondendo de forma apática a qualquer estímulo tátil ou afetivo. Um olhar vago (“não olhar nos olhos”) interfere no diálogo tônico-corporal entre a mãe e a criança. Parecem tristonhos e demonstram pouco interesse por qualquer atividade que seria normal para uma criança saudável da sua idade.
  • 25. 25 Na sua relação com o outro, a linguagem da criança autista é responsiva ou ecolálica, isto é, completa ou simplesmente repete a fala do outro. Por isso, são incompetentes para compreender uma linguagem mais abstrata ou interpretativa. Possuem demasiada preocupação com objetos, tais como botões, estampas em tecidos, cabelos, óculos, etc. Apresentam estereotipia de pensamento que se manifesta em atitudes tais como enfileirar objetos ou guardar brinquedos de forma ordenada. Como tentativa de garantir sua segurança, crianças autistas criam rituais de comportamento. Pequenas mudanças nesta ritualização podem provocar um estado de sofrimento e irritabilidade desproporcionais. Num quadro de autismo grave, as crianças apresentam comportamento bizarro ou um estado catatônico, ausência de linguagem verbal autônoma, desinteresse pelo ambiente que a circunda, restrição ou inibição da fala ou movimentos de balanços repetitivos com o próprio corpo ou com objetos. Na verdade, o comportamento da criança severamente autista parece sem objetivo. Tentativas no sentido de promover seu interesse por outra coisa, que não aquilo que a prende, são geralmente recusadas ou ativamente repelidas, podendo produzir graves explosões temperamentais ou tentativas de escapar à situação. Crianças autistas são, por vezes, diagnosticadas equivocadamente como surdas por sua inexpressividade, ar melancólico ou olhar dispersivo. Em geral, agarram-se em objetos colhidos de forma aleatória, aos quais não atribui nenhum significado, simplesmente mantendo-os apertados contra a palma da mão.
  • 26. 26 Segundo Bleuler apud Cuxart, o pensamento caracterizado pela necessidade de simbolização do autista é substituído por fantasias entre o real e o ilusório. Sua dificuldade em generalizar situações, assim como o processo de aprendizagem tendem a um diálogo literal que mantém a fonética e a articulação das palavras sem alteração. Critérios Diagnósticos para F84.0 – 299.00 – Transtornos Autistas A. Um total de seis (ou mais) itens de (1), (2) e (3), com pelo menos dois de (1), um de (2) e um de (3): (1) prejuízo qualitativo na interação social, manifestado por pelo menos dois dos seguintes aspectos: (a) prejuízo acentuado no uso de múltiplos comportamentos não-verbais, tais como contato visual direto, expressão facial, posturas corporais e gestos para regular a interação social. (b) fracasso em desenvolver relacionamentos com seus pares apropriados ao nível de desenvolvimento. (c) falta de tentativa espontânea de compartilhar prazer, interesses ou realizações com outras pessoas (por ex., não mostrar, trazer ou apontar objetos de interesse). (d) falta de reciprocidade social ou emocional. (2) prejuízos qualitativos na comunicação, manifestados por pelo menos um dos seguintes aspectos:
  • 27. 27 (a) atraso ou ausência total de desenvolvimento da linguagem falada (não acompanhado por uma tentativa de compensar através de modos alternativos de comunicação, tais como gestos ou mímica). (b) em indivíduos com fala adequada, acentuado prejuízo na capacidade de iniciar ou manter uma conversação. (c) uso estereotipado e repetitivo da linguagem ou linguagem idiossincrática. (d) falta de jogos ou brincadeiras de imitação social variados e espontâneos apropriados ao nível de desenvolvimento. (3) padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses e atividades, manifestados por pelo menos um dos seguintes aspectos: (a) preocupação insistente com um ou mais padrões estereotipados e restritos de interesse, anormais em intensidade ou foco. (b) adesão aparentemente inflexível a rotinas ou rituais específicos e não- funcionais. (c) maneirismos motores estereotipados e repetitivos (por ex., agitar ou torcer mãos ou dedos, ou movimentos complexos de todo o corpo). (d) preocupação persistente com partes de objetos. B. Atraso ou funcionamento anormal em pelo menos uma das seguintes áreas, com início antes dos 3 anos de idade: (1) interação social, (2) linguagem para fins de comunicação social, ou (3) jogos imaginativos ou simbólicos.
  • 28. 28 C. A perturbação não é melhor explicada por Transtorno de Rett ou Transtorno Desintegrativo da Infância. Possíveis Fatores de Autismo Alguns dos fatores que predispõe ao surgimento do autismo são descritos como: ¾grande stress emocional sofrido por mães no período de gestação, no momento do parto ou após o nascimento da criança; ¾alcoolismo e drogadicção da mãe; ¾seqüelas de doenças, tais como: rubéola e catapora; ¾parto difícil ou traumático, nascimento muito rápido sem dilatação; ¾febre sem diagnóstico específico, seguido por quedas de pressão arterial e convulsão; ¾infecções; ¾anóxia (falta de oxigênio) ou toxemia (dificuldade respiratória). De acordo com Papalia e Olds (2000) apud Cintra, a anóxia poderá afetar as células nervosas do cérebro provocando danos mecânicos. Este tipo de trauma no nascimento ocasiona danos cerebrais irreversíveis como retardo mental, problemas de comportamento ou até mesmo a morte. ¾mães adolescentes ou primíparas com mais de 35 anos de idade; ¾hemorragias durante o segundo trimestre da gestação
  • 29. 29 Segundo Ornitz (1977) e Newcombe apud Cintra, o estado físico e emocional da mãe exerce influencia no desenvolvimento fetal da criança assim como o estado físico do pai. Os Tipos de Autismo Segundo Kanner, os tipos de autismo podem ser provocados por fatores psicodinâmicos, familiares, ambientais e sociais. São classificados como: Autismo de Origem Genética – Há uma possível falha descoberta no cromossomo de número 11, que apresenta uma deformação em forma de um “braço”, mas sem comprovação efetiva. Há também a observação de uma falha no cromossomo X.P 22 que faz supor uma preponderância a maior retardo mental verificado por Rett. A origem é significativa dentro dos estudos sobre autismo, principalmente pela existência de casos em gêmeos monozigóticos de quase totalidade em oposição a gêmeos dizigóticos com autismo e a possível ocorrência de distúrbios consangüíneos entre pais ou avós. Autismo de Origem Psíquica – Segundo autores como Tustin, a criança que passa por uma gestação ou um nascimento traumáticos e que por determinada razão não conseguiu se separar da mãe pode desenvolver uma sintomatologia autística, caracterizada primordialmente por isolamento e indiferença. Autismo de Origem Neurológica – Caracterizado por mal formação congênita que promove um alongamento da 4ª cavidade craniana, provocando uma assimetria encefálica em relação ao eixo hemisférico. O sistema perceptivo (visão, audição, paladar e tato) é preservado, entretanto, retardo mental e convulsões são identificados. Em condições de stress elevado podem ocorrer alterações
  • 30. 30 neurobiológicas com aumento de serotonina e catecolamina, surgindo rituais e estereotipias de forma inflexível. Autismo no Aspecto Físico – O autista apresenta desenvolvimento fisiológico normal, corpo bem formado, mãos e pés pequenos e, ocasionalmente, deformidades ocasionais nas orelhas e manchas na pele do tipo “café-com-leite”. Autismo no Aspecto Motor – Déficit de motricidade larga, andar desajeitado, possuindo boa coordenação motora fina. Presença de hiperatividade e movimentos rítmicos e repetitivos. Autismo no Aspecto Personalidade – Freqüente expressão agressiva, auto- dirigida ou heterodirigida com ocasionais acessos de fúria. O isolamento e o apego a objetos inanimados surgem como fatores de tentativas de preservação da integridade física e emocional. Autismo no Aspecto Familiar – As crianças autistas são, em geral, filhas de pais inteligentes de classe média alta com formação superior e não há diferenças significativas em sua criação com relação a crianças normais, por isso, muitas vezes o diagnóstico ocorre de forma tardia, surgindo apenas após o primeiro ano quando a criança apresenta dificuldades no desenvolvimento da linguagem. O Autista e a Noção de “Eu” A criança autista citada por Tustin não reconhece a mãe assim como não reconhece a si mesma. Sua noção de identidade pessoal é comprometida no princípio da experiência relacional e na instalação deficitária do narcisismo primário, sem lugar no campo do Outro.
  • 31. 31 Danos psíquicos fazem com que ela se desvie de coisas que geralmente interessam a uma criança normal em desenvolvimento. Considerando perigosa e aterrorizante qualquer coisa que não lhe seja familiar. Comporta-se de forma evitativa por medo de sofrer com uma separação semelhantemente ameaçadora como a do desmame. Em condições de normalidade, a separação afetiva da mãe contribui para o desenvolvimento emocional, fornecendo à criança a experiência psíquica da frustração. A dificuldade de simbolização do autista é traduzida corporalmente em movimentos repetitivos resultantes da privação da possibilidade de construir uma linguagem efetiva. Segundo Winnicott, o autista apresenta terrores experimentados em um estado pré-verbal, de pré-imagem e, ainda, pré-conceitual. São temores de descontinuidade, de medo de morrer, de não pertencer, de desintegrar-se, de cair, de explodir ou de perder a garantia de sua existência. Presos a uma forma de funcionamento baseada na concretude do pensamento e no domínio das sensações. O autista não tem consciência de sua humanidade nem das dos outros seres humanos que a circundam. De fato este tipo de conduta parece significar que o desenvolvimento emocional e cognitivo da criança sofreu uma desaceleração ou virtualmente parou. Brezelton (1969) diz que, quando as primeiras diferenciações estão prosseguindo normalmente, é possível que haja somente oscilações de consciência da separação física da mãe, mesmo nos primeiros momentos de vida.
  • 32. 32 Na criança “normal” a ruptura feita ao nascer foi devidamente cicatrizada pela interação respondível entre mãe e bebê. Na criança autista, esta consciência traz a dor de um processo de diferenciação de um ser humano vivo. Sua ligação com os objetos é feita através dos sentidos, em substituição ao objeto primordial libidinal, isto é, a mãe que nutre ao seio. A medida em que o autismo se cristaliza os objetos externos, como fezes, urina e a língua por exemplo, passam a ser instrumentos de uma manifestação patológica sem função objetiva, servindo como meros produtores de sensação de consistência ou de segurança. Objetos macios produzem formas reconfortantes para tranqüilizar a criança que se encontra isolada no contato humano. O objeto autista, erotizado e manipulado como se fizesse parte do próprio corpo da criança, serve como um tranqüilizador e uma referência artificial. É através dele que a criança se comunica. Também, segundo Tustin, a dentição é considerada um marco de sofrimento no desenvolvimento da criança autista. Resulta na passagem da experiência de sugar para a experiência de morder, o que inspira o aparecimento de primitivas fantasias de incorporação, isto é, “ataques” dirigidos ao não eu – primordialmente a mãe biológica ou substituta – e que normalmente vem acompanhada de depressão infantil. No quadro autístico, as pessoas não desenvolveram o senso de “self”, tendo apenas uma construção egóica neurológico-mental. Na primeira experiência de amamentação do bebê é que as relações interpessoais e afetivas se iniciam, sendo a sensação do seio na boca o foco para o
  • 33. 33 desenvolvimento da psique concomitantemente ao toque, ao olhar da mãe e a mútua atenção. Estes são os fundamentos do núcleo do “self”. A forma como o seio é oferecido, como ele é percebido e recebido pela criança influenciam em seu desenvolvimento. Esta será afetada pelas respostas da criança e pela qualidade de relações da mãe com o pai do bebê e pelas circunstâncias da infância dos próprios pais. Segundo Mahler, pelas dificuldades inerentes ao processo de separação e individuação, a criança autista denota frágil consciência de sua própria identidade, sendo carente de empatia e imaginação. A vida fantasmática da criança autista é empobrecida, daí a sua dificuldade de comunicação. Tanto para compreender o processo autístico como para promover o tratamento e a inclusão da criança com este tipo de afecção relacional, torna-se necessário um grande investimento da parte do cuidador na tentativa de comunicação e interação sócio-afetiva. Dados Estatísticos A incidência é de 2 a 5 casos por 10.000 indivíduos. As perspectivas de autismo são 4 a 5 vezes maiores em meninas com retardo mental do que em meninos. No Brasil, calcula-se que existam atualmente aproximadamente 600 mil pessoas autistas, apesar de não haver nenhum dado formal.
  • 34. 34 O Desenvolvimento segundo Wallon Dados Biográficos Henri Wallon (1879-1962) nasceu na França em um período de instabilidade e insegurança política. Viveu intensa produção intelectual atuante e ética, engajado politicamente na sua época, integrando atividades científicas e ação social. Formou-se em filosofia no ano de 1902, trabalhou como professor no ensino secundário e contestou os métodos de controle disciplinar da época. Mobilizado como médico do exército francês em 1914, dedicou-se ao atendimento dos feridos entrando em contato com pessoas vítimas de lesões cerebrais do pós-guerra. Fundou em 1925 um centro de pesquisa que funcionava em conjunto com escolas de periferia. Em 1931, trabalhou como médico de crianças com deficiências neurológicas e distúrbios de comportamento. Presidiu a Sociedade Francesa de Pedagogia de 1937 a 1962. Segundo Wallon, a criança passa por estágios de desenvolvimento como resposta às necessidades e interesses pessoais e sociais, manifestando organicamente expressões de afeto mutáveis de acordo com o momento social. Trata-se do processo através do qual o homem se desenvolve, à medida da maturação orgânica e idade cronológica. O aspecto biológico é determinante, mas por vezes submete-se ao aspecto social, pois o Sistema Nervoso Central (SNC) não oferece garantia quanto o amadurecimento de habilidades específicas que demandam treinamento e aprendizagem.
  • 35. 35 O bebê, ainda não dotado de linguagem e incapaz de sobreviver sem o outro, desencadeia reações orgânicas através de descargas motoras, sinalizando sua necessidade de ser alimentado, limpo, abrigado, etc. A impulsividade motora é um ato de alívio de tensão em resposta a ações passadas ou causadas por incômodo, angústia e ansiedade. É uma forma primitiva de se comunicar e dizer que algo está errado. Com a aquisição da linguagem, seu leque de expressões se amplia e a criança passa a manifestar seus sentimentos e pensamentos de outra forma, ou seja, através de gestos e palavras. O bebê, a princípio, não se percebe como pessoa separada do outro, parece estar fundida à mãe. A medida em que interage com ela e com o meio, desprende- se desse vínculo de dependência e diferencia-se chegando a um estágio de individualização. O corpo se forma na distinção entre espaço, corpo e ambiente. É ação integrada ao corpo que se vê em Oposição; Sedução; Imitação. Oposição: busca de auto-afirmação em relação ao outro, percebida a princípio em relação ao objeto e na luta por sua posse; Sedução: necessidade de aceitação do outro para sua auto-aceitação. A criança reconhece a possibilidade de sucesso ou fracasso das emoções através do potencial investido. Imitação: a pessoa admirada é incorporada. Assim, através da imitação e assimilação das qualidades e méritos da pessoa modela-se e se projeta no outro. A
  • 36. 36 capacidade de interiorizar e exteriorizar possibilita que a criança se diferencie do outro. Para Wallon, expulsão e incorporação são mudanças importantes para a “formação do eu” e oposição é um bom meio de se construir a “diferenciação do eu”. A criança se importa em identificar que lugar ocupa no núcleo familiar e qual o grau de importância representa para os pais. Quer ser objeto desejado e faz uso da linguagem para representar seu desejo. A criança quer ser tudo aquilo que a mãe desejar e assim leva ao longo da vida sua busca pelo “desejo do outro” ou “desejo que o outro deseja”. Em seus estudos, Wallon separou o desenvolvimento infantil em etapas, onde: ¾A criança aos 3 anos se relaciona com o mundo de forma específica: seu desejo é pelo objeto. O conceito de “meu” confunde-se com o de “eu”, como se estivesse tomando para si sua personalidade (Estágio da Personalidade). Desenvolve as funções simbólica e de linguagem (Estágio de Tensão Motora e Estágio Projetivo). ¾A criança aos 6 anos, evolui intelectualmente em interesses interpessoais e sociais, buscando o conhecimento do mundo. (Estágio Categorial). ¾A criança aos 11 anos, passa por mudanças do seu corpo e lapidação da personalidade. Este estado de mudança faz com que ela reflita sobre si como persona, num eterno conflito de questionamento e emoções em busca pelo par ideal.
  • 37. 37 Todos estes estágios são construídos em movimentos dialéticos de ir e vir, entre ação e interação com o ambiente em fases de maior oscilação da criança no seu aspecto afetivo e cognitivo. A Escola de Wallon Fazendo uso da psicologia e da genética, a escola walloniana qualifica e objetiva métodos pedagógicos visando obter sucesso no processo utilizado. Wallon diz que é preciso enxergar a criança como um todo (físico, emocional e cognitivo) para melhor entender sua conduta. Isso se dá forma análoga a uma proposição matemática, em que fala de “ações + postura = estado íntimo” e “postura inconstante + estado mental + musculatura tônica = estado constante”. A pedagogia de Wallon não valoriza a intelectualidade. O “meio” pelo qual a pessoa desenvolve o intelecto ocorrerá através da compreensão e incorporação do Eu. O que acontece na escola é a elevação ao máximo de separação e confrontamento entre o Eu e o outro. A criança toma posse destas distinções através da linguagem. A eficácia da mente está em um bom ordenamento das palavras que valorizam todo o real expressado no sujeito, sendo este objeto de estudo. Afetividade O autismo afeta áreas como comunicação, linguagem, interação social e imaginação além da capacidade de interpretar expressões faciais e emoções das outras pessoas tais como tristeza, raiva, alegria, entre outras.
  • 38. 38 O objetivo do isolamento autístico é diminuir as emoções e manter o sujeito em seu mundo interior de emoções acanhadas. Apesar de ocorrer de forma superficial em sua maneira de se relacionar com o mundo, o isolamento também ocorre de forma incondicional somente nos casos mais graves. Segundo Baron apud Polaino, emoções como medo, alegria, tristeza são situacionais, pois as observamos nos outros e as atribuímos a uma situação real. Emoções como surpresa e perplexidades são atribuídas a uma essência ou uma possibilidade que nada tem de real, que vem a ser a cognição sócio-emocional do autista. A expressão facial é um meio pelo qual falamos de nossas emoções e nos comunicamos com os outros. Através da percepção das emoções é possível abordar a criança autista numa tentativa de estabelecer um vínculo comunicacional, seja através de sensações visuais, táteis ou auditivas. As crianças normais reconhecem as emoções dos outros devido a mecanismo inatos e lhes permite desenvolver relações de afetividade. Ao longo do desenvolvimento da criança autista, os aspectos característicos da patologia da linguagem, como ecolalia e estereotipia, são instrumentos precários que têm como fim canalizar sua melhor relação com as emoções, em sua maioria frustradas, por causa da dificuldade inerente ao autista em decifrá-las. Em outras palavras: o fracasso do autista em lidar com as emoções se deve a uma deficiência crônica para o desenvolvimento das relações com o outro. Em contrapartida, quanto mais perceber as emoções, melhor será sua capacidade de interação social.
  • 39. 39 As perturbações autísticas são expressas em sentimentos de: Hipotonia: queda da excitação afetiva e aumento de sentimentos melancólicos. Atimia: ausência de sentimentos. Apatia: perda da capacidade de experimentar emoções e sentimentos. Estupor Emocional: inibição de curta duração causada por traumas seguido de escurecimento da realidade. Destimia: desequilíbrio afetivo que oscila entre depressão e excitabilidade. Habilidade Afetiva: não estabelecida afetiva e internamente. Inconsistência Emocional: perda do controle emocional sob forma de pranto ou riso excessivo. Neotimia: não aceitação de novos sentimentos que são vividos de forma angustiante. O Amor O amor é o sentimento através do qual o sujeito age sobre a sua subjetividade. É a interação com o outro agindo para além dos cuidados básicos. Segundo Freire é “a verdadeira dimensão de cura a ser reclamada.... É a renovação sem propriedade do outro. É carinho, atenção e compaixão. É colocar o ser, o saber e o poder de forma correta, íntegra, ética. É ver a criança autista como pessoa com suas particularidades e não como coisa.
  • 40. 40 O amor é forma divina do desejo e não um meio de satisfazer o sujeito. É através do amor que a criança amadurece e se torna sujeito desejante pelo outro. É através do amor que podemos trabalhar com nossos alunos. A Criança Autista e o Desejo Paterno Crianças autistas ou vítimas de algum distúrbio bio-psico-fisiológico provocam uma ferida narcísica e fogem ao desejo e à imagem construída idealmente pelos pais. A criança se constitui primeiramente no desejo da mãe que lhe confere, desde o ventre, um nome, um significado e, na medida em que as relações de afeto se estabelecem, o sujeito vai conquistando na relação com o Outro sua individualidade e autonomia, reconhecendo-o e fazendo-se conhecer através da linguagem. O desenvolvimento global da criança vai além do real do corpo e alcança o simbólico ao ser olhado, tocado, cuidado, nomeado e afetado pela mãe que investe na criança como objeto de amor e cria com ela um vínculo de dependência afetiva fundamental para o estabelecimento de sua imagem narcísica. A criança com patologia manifesta aponta um furo no desejo dos pais transportando-o do lugar ideal a um campo desconhecido. Margareth Mahler teoriza a respeito da substituição do vínculo simbiótico entre a mãe e o bebê neonato, essencial à sua sobrevivência no primeiro estágio da vida extra-uterina, por uma espécie de “simbiose social” à medida do desenvolvimento da criança.
  • 41. 41 A libido do bebê se transfere de um estágio de narcisismo fetal para um narcisismo corporal primário, estágio no qual a representação do corpo materno desempenha importante papel. Segundo a autora, nas psicoses infantis precoces tanto quanto no autismo, graves distorções do relacionamento da díade mãe-filho parecem constituir a causa essencial de uma alienação da realidade por parte do ego. No autismo ocorre uma retração do sujeito que recusa contato com o mundo exterior e pode ser concebido como o efeito de um fracasso radical na instalação da imagem do próprio corpo. Por conseqüência, caracteriza-se na criança autista, desde os primeiros contatos, uma inaptidão em estabelecer relações afetivo- corporais e simbólicas com as pessoas desde o início da vida. Crianças autistas são “prematuros psicológicos” se considerarmos que sua tomada de consciência da separação do objeto ocorreu antes que suas capacidades de integração fossem suficientes neuro-fisiologicamente. São particularmente inclinadas à separação oral traumática. A natureza depressiva dos pais e sua rejeição pelo estado da criança tornam mais difícil a emersão do autista do estado de choque e afastamento em que se encontra. Uma vez desencadeado o estado de autismo patológico tende a auto-perturbar-se e auto-agravar-se acabando por tornar- se quase irreversível. De acordo com a teoria lacaniana, pais com dificuldades de ordem simbólica vêm o bebê real em seu desnudamento. A ausência de dimensão simbólica e imaginária dessa imagem real deixa o filho sem imagem no próprio corpo, tornando problemática sua vivência de unidade corporal, bloqueando a possível reversibilidade da libido do próprio corpo para a libido do objeto.
  • 42. 42 A Fase do Espelho A construção da imagem do corpo como unidade é feita através da experiência da identidade quando a criança se descobre como um Eu. Esta estrutura que a criança reconhece é, a princípio, parcial. É o que Lacan chama de fantasia de um corpo parcial feita através do espelho. A função do espelho é de amenizar a angústia das partes e integrá-las num todo. Ocorre na criança, quando está em fase de organização do esquema corporal, sua fundamentação no corpo como algo passível de descoberta. Mas esta descoberta também gera confusão entre a noção do que é o Eu e do que é o outro. Subitamente, a criança é levada a descobrir que o outro presente no espelho não é o outro real e sim uma imagem, passando a distinguir a pessoa real da imagem. A criança passa a ter consciência de sua imagem no espelho, de que aquela imagem é ela própria, recuperando a noção de totalidade do corpo agregando numa estrutura única, subjetiva e identitária. A busca de sua identidade, sustentada no imaginário é devida ao fato visível da óptica. Reconhecemos o mundo através da imagem; fatos objetivos que antes não eram amadurecidos o suficiente e depois passam a ser. O espelho simboliza e antecede a formação do Eu. É com ele que a criança se imagina, se recria e cria novamente através da observação do outro, na busca de sua identidade. A criança que vem ao mundo é fruto do desejo dos pais, seja por prazer ou desejo de um ou dos dois. Tais motivos continuam a influenciar sua vida como
  • 43. 43 “sujeito” dentro da linguagem causada pelo desejo do outro. “A linguagem é permeada pelo desejo e o desejo é inconcebível sem a Linguagem”. (Fink). Ao estudarmos em Freud a brincadeira do Fort-da, deparamo-nos com a noção de investimento libidinal. É nos movimentos de presença-ausência da mãe, objeto primeiro de amor, que a criança estabelece a noção de Eu, distinto de não-Eu, simbolizado no jogo de perder e achar. A base dessas observações está, na teoria lacaniana, sedimentada em um estágio fundamental do desenvolvimento: o Estágio do Espelho. Pode-se situar o autismo em um lugar psíquico aquém da alienação, como uma recusa de estabelecer um vínculo narcísico com a mãe, primitivo e primordial, impossibilitando a dinâmica simbólica especular. Não haverá ausência se ainda não tiver havido presença. O bebê autista, apesar de ter sido gerado e criado por sua mãe e não apresentar nenhum distúrbio orgânico, não olha para ela, não sorri nem vocaliza e nunca a chama num momento de aflição. O “não olhar” entre uma mãe e seu filho e o fato de a mãe não se dar conta disto, constitui um dos principais sinais, no começo da vida, que permitem formular a hipótese de um autismo. A partir do segundo ano de vida, mesmo que o “não olhar” não culmine numa síndrome autista característica – com estereotipias e auto-mutilações – este tipo de vínculo fragilizado em sua origem aponta para uma grande dificuldade na relação especular com o Outro. Se não houver intervenção efetiva, seja por parte dos pais, da família, etc., nesse momento do desenvolvimento, a fase do espelho não se
  • 44. 44 constituirá convenientemente e, conseqüentemente, não ocorrerá a instalação da relação simbólica fundamental. Como desdobramento desta falta primitiva ocorrerá o fracasso da construção da imagem integrada do corpo e da constituição do Eu, pois a ausência de uma imagem do corpo especular, bloqueia a transposição do narcisismo primário para o narcisismo secundário e a criança se encerra em seu próprio corpo na “solidão autística”. “A dor faz parte da imagem do corpo, como lugar sensível onde o sujeito pode conter seu eu, ou mesmo seu corpo, pois, para nós, o corpo é ao mesmo tempo uma parte inconsciente do eu e o lugar de onde o sujeito pode dizer: eu” (Dolto). A “Imagem do Corpo” ou como define Dolto “imagem inconsciente do corpo” é o que se diz da formação da identidade através do outro definido como “IMAGE”. Num jogo de palavras e fonemas feito pela autora, o “I” representa identidade; o “MA” a primeira sílaba dita quando começamos a falar e o “GE” atribuído à terra, à base ou ainda ao corpo que remete a “JE” ou “EU”. A “imagem inconsciente do corpo” desaparece à medida em que o sujeito se identifica e se relaciona com a linguagem como o sujeito reflexo através do espelho. A imagem do corpo pode se revelar sob a forma de sonho ou através de desenhos. Na representação gráfica através do desenho, a criança se retrata e se define como imagem inconsciente do corpo. Francis Tustin aponta algumas características do autismo infantil primitivo citando: ¾Manifestações Corpóreas Características
  • 45. 45 • Geralmente são crianças que gozam de excelente saúde desde o nascimento, podendo a eventual incidência das doenças características da infância ser encarada como sinal de progresso. • Pode haver uma história de ataques de choro e raiva desde a primeira infância. • Apresentam corpos rígidos que não respondem à solicitações externas. Não se adaptam a uma posição confortável quando postas no colo. • São graciosas, ágeis e geralmente destras. • Fazem girar objetos habilmente. • Tocam levemente os objetos que manipulam. • Podem denotar hipossensibilidade dos dedos das mãos e dos pés • Apresentam hipersensibilidade dos órgãos dos sentidos. • Objetos mecânicos invariavelmente as fascina. ¾Relações Objetais e Ambiente • Parecem avessas a toda e qualquer forma de contato com os outros. • A criança é inorientada, desligada das pessoas, desinteressada do que acontece a sua volta, distante e esquecida no ambiente. • O ambiente familiar é caracterizado em geral por altos padrões educativos e intelectuais.
  • 46. 46 • Baixa incidência familiar de doença mental. • Perseveração no uso de objetos autísticos. Tendem a dividir o objeto se as assusta e depois procuram juntar os pedaços afim de torná-los novamente manejável. • Do ponto de vista da criança, a mãe parece ter-se fechado ao contato por três motivos: 1º – porque a criança afastou-se dela; 2º – por ser a mãe uma pessoa remota e distante por natureza; 3º – por estar a mãe deprimida ou preocupada. ¾Linguagem, Fase do Espelho e Psiquismo • Evitam olhar as pessoas. • Denotam inibição do pensamento. • Revelam ausência virtual de vida fantasmática. • Podem não falar ou ser ecolálicas. • Não possuem a noção de uso do “sim”, “não” e “eu”. • Afirmam-se pela linguagem da repetição. • Apresentam potencial intelectual alto ou superior. • Denotam marcada capacidade para reconhecer padrão e forma. • Retiram-se precocemente da arena da vida.
  • 47. 47 • Cessam o desenvolvimento lógico. • Funcionam com base em uma dicotomia entre um ego prematuro e o objeto externo. • Denotam persistência e excesso dos processos de envolvimento (extrusivo e intrusivo) em sua forma de lidar com a experiência traumática da separação. • Parecem estar absorvidas por si mesmas, isto é, vivem na convicção delirante de que estão “embrulhadas em seu próprio corpo” e no corpo dos outros, experimentados como prolongamentos do seu próprio corpo. Cognição e Linguagem Uma criança normal aprende nos primeiros anos de vida a comer, andar, falar, brincar. Ocorre também desta forma com a criança autista durante o primeiro ano de vida, até que ela comece a apresentar os sintomas de impedimento da relação com o próximo, quando começa a dispersar o olhar, a não responder quando solicitada, e, tampouco, a se interessar pelo outro. O autismo pode ser detectado antes dos três anos de idade pelo prejuízo na interação social, um não uso de brincadeiras de forma simbólica e um não desenvolvimento totalmente natural. No que diz respeito ao atraso no desenvolvimento, considera-se importante a teoria do desenvolvimento de Piaget que estabelece quatro estágios, pelos quais, o indivíduo teria que passar: Estágio Sensório-motor (0 a 18 meses); Estágio Pré-
  • 48. 48 operatório (18 meses a 7 anos); Estágio Operatório Concreto (7 a 12 anos); Estágio Operatório Final (12 anos ou mais). Segundo Piaget, a seqüência dos estágios é invariável, isto é, todas as crianças atravessam os estágios na mesma ordem estabelecida. Cada estágio pelo qual a criança passa é necessário para as próximas construções do estágio seguinte, desde que se façam adequadamente. As diferenças em termos da velocidade com a qual cada criança atravessa tais estágios também devem ser observadas. Assim, algumas crianças atingem determinado estágio mais cedo do que outras. No caso da criança autista, ocorre um atraso no desenvolvimento da lateralidade manual, uma incapacidade em apontar para objetos, simplesmente por não poder desejar o que não é compreendido. Uma criança que não é capaz de compartilhar com o outro um objeto de seu interesse ou de sequer apontar para solicitá-lo (comunicação pré-verbal), não adquire uma base adequada para a aquisição da linguagem e, conseqüentemente, não constrói um vínculo natural com a comunicação. A criança que não é capaz de ler ou compreender, tecendo uma rede de vocabulário consistente e plena de sentido, fica prejudicada em sua comunicação e expressão. Segundo Wing apud Jiménez, o educador deve ter sempre em mente o nível de compreensão da criança e afim de adaptar sua própria linguagem, adequando-a e modificando-a de forma progressiva, falando de forma clara e lenta para melhor apreensão do significado da palavra, quando esta estiver interessada. O autista com freqüência se fecha em um “casulo”. Isto se dá como defesa para envolver e imobilizar a parte danificada da personalidade que diz respeito à capacidade de compreensão. O pensamento concreto e a incapacidade de fazer as
  • 49. 49 abstrações necessárias causa restrições para o autista, criando uma barreira entre emoção e cognição. Ele evita a comunicação, seja através da linguagem verbal ou manifesta através de jogos, desenhos ou modelagem. Tal comunicação apresenta- se escassa e, freqüentemente, nem existe, pois ele se comunica de forma limitada e anormal. Ao educador cabe a tarefa de pelo menos tentar trazer o autista para dentro da órbita da comunicação humana. Segundo Angel apud Jiménez a criança autista possui uma variedade enorme de linguagem, mas sempre encontra dificuldade de compreensão. O mesmo autor cita que: “As pessoas autistas têm dificuldade de integração dos canais sensoriais e uma dificuldade de integração de informação dos distintos canais sensoriais que serve para abstrair as regularidades do meio através da linguagem.” Em se tratando de aprendizagem, o autista dificilmente apontará para um objeto ou dirá algo. Quando a linguagem é ausente, basta tentar entender ou criar uma forma de se comunicar e de brincar juntos, criando relações entre ele e o objeto, de acordo com o seu desenvolvimento. O ideal é que se comece a trabalhar com a criança desde os seus primeiros anos de vida, logo que o diagnóstico for confirmado. Quando existente, sua fala é concreta e utilizada em forma de ecolalia, ocorrida por um defeito na cognição e pela sua incapacidade de se colocar no lugar do outro, estabelecendo um diálogo em que esta inversão lingüística inevitavelmente aconteça.
  • 50. 50 “Em pessoas autistas se davam e se dão, menos dificuldades na recepção pura e simples dos estímulos, e se davam e se dão menos dificuldades de coordenação motora, portanto é importante levar em conta que para que possam adquirir um mundo de significados será necessário superar a limitação que impõe o efeito de ter canais sensoriais distintos. É dizer que o mundo dos sentidos foram mundos separados, não relacionados entre si, não seria possível adquirir significados já que não são informações que implicam na capacidade de associar e de transferir a informação”. (Jiménez). Há uma capacidade em crianças autistas de ordenar, classificar usando da música e não da linguagem (vale lembrar que as estruturas usadas por um e outro no cérebro são distintas). A criança, incapaz de produzir linguagem, associa ao brincar uma significação. Discursar sobre ela é refazer o que a incomoda, tomando posse e dando ao brinquedo uma conotação de realidade através do qual se comunica de forma primitiva. No caso da criança autista, o fato de não atribuir significado ao brincar, dificulta a comunicação e expressão, ficando ela sujeitada ao Outro discursivo que brinca. Segundo Jiménez, o que deve ser trabalhado no contato terapêutico com crianças autistas é: ¾linguagem comunicacional (percepção, compreensão e o gestual); ¾linguagem verbal (oral e gráfica); ¾a adequação do uso da linguagem no sentido de evitar ou corrigir as manifestações costumeiras (ecolalia, mutismo, inversão pronominal); ¾linguagem postural (gestos, mímicas, expressões e posturas corporais); ¾a interrelação entre pessoas e a relação entre pessoa e objeto;
  • 51. 51 ¾a capacidade imitativa; ¾a formação de conceitos; ¾estimulação da memória; ¾a capacidade de classificar, ordenar e generalizar; ¾a cognição geral (verbal, auditiva e a resposta a elas); ¾o controle corporal (esfíncteres anal e uretral); ¾a coordenação visomotora; ¾o comportamento espacial; ¾o domínio das áreas da vida doméstica.
  • 52. INCLUSÃO DO AUTISTA Definição de Psicopatologia: “entende-se por Psi + Patologia onde se estuda causas e natureza das doenças mentais. Psic de origem grega significa alma e patologia dor, Pato também no grego Pathos doença, paixão, sentimento.” (Cunha, 1997 apud Moreira). A compreensão do que é patologia e como ela interfere na vida destas pessoas com o meio, vem ligada a conceitos e pré-conceitos, históricos e culturais, pelos quais precisamos trabalhar na tentativa de humanizar o mundo, a sociedade e a escola em que vivemos. A escola, muitas vezes, recusa e reclusa tanto quanto a sociedade, pois é um reflexo da mesma e a Inclusão do diferente vem como fator gerador de atrito em nossa sociedade, pois implica em mudanças de concepção do sujeito e demanda reflexão sobre valores que obstruem o ambiente educacional e o comodismo de quem se encontra nele. A relação igualdade, desigualdade e preconceito estão latentes em todo momento no ambiente educacional. Vencer o preconceito e o rótulo dado ao autista é um grande passo a ser tomado para vencer bloqueio da escola em se tratando de crianças autistas. Vemos cada
  • 53. 53 vez maior o número de autista na escola e fora de instituições e próximos à família, integrado ao contexto social. Por que incluir crianças Autistas ? “... existem também aqueles que necessitam de cuidados especiais para a alimentação, o vestuário, a higiene pessoal e outros hábitos ou atividades rotineiras. Em tais casos, essas pessoas necessitam desenvolver habilidades, funções e aprendizados específicos. Algumas dessas necessidades podem ser temporárias ou permanentes, dependendo da situação ou dos circunstancias das quais se originam” (Sá/2002). Inclusão é a única forma do quadro apresentado ser amenizado e modificado. É pela interação com a vida e pelo uso mais espontâneo de suas próprias capacidades inatas. Quando o acidente psíquico de uma perda aparentemente irrecuperável ocorreu pela primeira vez, essas reações autistas foram necessárias, mas com o passar dos anos eles se tornam obstáculo. O autista é um sujeito em falta, por isso são mais sensíveis à aceitação do outro. Para uma pessoa normal, o crescimento é um estado de independência. Já para o autista, que é um sujeito centrado em si, esta independência representa a perda do espelho. A escola entra como lugar de descoberta do Eu, de busca do que é bom e agrada a criança. A criança autista tem uma incapacidade inata de responder às emoções e lidar com suas necessidades, por isso o atraso na aquisição de elementos. Segundo Garcia Polaino, os autistas estão incapacitados para expressar através de gestos, o que permite inferir que dispõe de certa capacidade para organizar e expressar desejos ou idéias de forma não verbal.
  • 54. 54 O Autista é, também, um sujeito aquém do seu desenvolvimento. Em suas necessidades básicas, ele é sujeito à influência de diversos agentes, tais como a maneira de ver, sentir, reagir, própria daqueles que o rodeiam desde os primeiros anos de vida. Já o autista, em idade adulta, quando a comunicação é precária entre ele e outras pessoas, seu núcleo interno ou EU imperfeita pela não descoberta de uma outra forma de criar e interagir com o mundo que o cerca. É certo que crianças normais que hoje convivem com crianças autistas, seja qual for a necessidade está preparada para uma sociedade de fato inclusiva. As crianças autistas são vistas, aos olhos da sociedade, como “coitadinhas”. O que uma criança “normal” que convive em ambiente inclusivo aprende é que, tanto quanto elas, as outras crianças também são sujeitas de desejo. Inclusão e Emoção Como diz Maslow, é preciso conduzir e reduzir a distância entre as aspirações humanas e suas limitações, isto é, entre o que o homem é efetivamente, o que ele gostaria de ser e o que poderá ser, como realidade e com potencialidade. Só assim, recairemos na questão da Inclusão de forma mais humana. A frustração do não saber do professor e o pré-conceito o impelem a “escolher” a experiência do aluno e a sua como professor. O conflito entre o real e o ideal só faz causar mais desgosto e contentamento, isto muitas das vezes pode ser devido ao erro educacional com relação ao que é do que não é relevante àquela criança, naquele momento.
  • 55. 55 Tumulto emocional e hiperatividade são conflitos constantes em sala de aula, deixa qualquer professor sem reação, além de nunca virem sozinhos e sim associados a outros destemperos emocionais (raiva, medo) ainda provam as crises. É necessário que o professor se valha de informações e só por meio destas é que podemos controlar as emoções, nossas e das crianças e reduzir a tensão entre ambos e podendo, de forma mais objetiva, interferir e intervir positivamente. É preciso trabalhar com nosso sofrimento de não sabermos ao certo que caminho tomar diante da apatia do aluno como também com o estado de sofrimento que ele se encontra. O professor tem de se adequar ao aluno e o acolher quase que maternalmente justamente por ele ver o estado de sofrimento da criança autista sem que se perca para tentar instruir sobre as necessidades dele. É o professor que se angustia perde tal capacidade e traz danos tanto para si quanto para a criança. É preciso também cuidado ao formular ou falar algo para estas crianças. É através do afeto que podemos transformar o professor e, conseqüentemente, o aluno, pois ele se projeta na figura do professor e dá uma nova forma à relação. Mas é necessário que ele se perceba fora do outro e não se prenda exclusivamente ao aspecto sentimental. Já nas crianças normais, este desenvolvimento ocorre entre 3 e 4 anos, onde elas conseguem formular certas soluções às emoções a elas associadas, levadas pelo desejo. Dos 5 aos 6 anos, conseguem identificar as crenças como fatores que causaram certas emoções.
  • 56. 56 A capacidade de simular, imaginar e descrever a realidade é o caminho pelo qual as crianças se dispõem a entender a opinião e crença dos outros tal como seu estado emocional, sem precisar desejar o mesmo. Assim, a aptidão em moldar internamente suas atitudes faz com que ela ganhe lugar de destaque em relação a sua facilidade de compreender melhor as emoções do que a criança autista. É preciso que haja, para um desenvolvimento das condições psicológicas, a “consciência do próprio eu”, “capacidade para simular ou simbolizar”, “capacidade para distinguir entre ficção e realidade”. Para os autistas sua dificuldade em relação a outro se dá pela incapacidade de fazer repreensões internas das emoções, não compreendem as emoções dos outros. Cognição e Emoção Segundo Angel apud Jiménez, o que realmente é relevante à educação é a questão da inflexibilidade cognitiva e emocional e sua necessidade de ordenar e estruturar o mundo. Isto ocorre por meios externos artificiais e pouco flexíveis por falta de linguagem e interação, tanto em competência quanto a motivação. É preciso correr na busca de desenvolver ao máximo as capacidades do sujeito autista. Desenvolver sua potencialidade é também uma forma de amenizar seu sofrimento, onde o autista, que agora está em busca de maturação social e emocional possa trabalhar sua aceitação pelo grupo.
  • 57. 57 Quanto mais cognitiva for à emoção maior difícil detectá-las nas crianças autistas e compreender o real do mundo, compreender e manipular através da mente suas atitudes com respeito às informações é inato (Leslie apud Polaino), abrir o mundo do autista para estas percepções pela convivência com crianças “normais”. Ao invés de tentar compensar nossos alunos pelo que achamos que eles possam estar necessitando, limitamo-nos a um entendimento superficial de suas práticas e esquecemos de começar a usar as capacidades que possuem. Para isso, eles precisam sentir que acreditamos em sua capacidade de fazê-lo, a própria natureza e sua capacidade de resposta, bem como as circunstâncias externas durante seu crescimento, terão desempenhado seu papel. Escola O trabalho com criança autista é, com certeza, um dos grandes desafios da escola por se tratar de alterações da linguagem e das emoções. Seu acompanhamento vai além do escolar e o uso freqüente de medicamento pesa no trabalho com a escola. Às vezes o autista apresenta uma série de modificações no medicamento e este processo de experimento psiquiátrico causa angústia e ansiedade, tanto na família quanto na escola, por não se saber o efeito daquele medicamento para aquela criança e o reflexo no ambiente educacional causado. A criança autista é melhor quando sobre medicação específica; principalmente quando há alguma patologia associada, fator de dificuldade em qualquer intervenção feita com esta criança, seja psicológica, pedagógica ou familiar.
  • 58. 58 Temos que levar a realidade sintomatológica para o trabalho pedagógico como transtorno de linguagem, do pensamento, e das relações sociais e afetivas, perceptivas e de atenção, da inteligência e motricidade além da personalidade e conduta (Jimenez). É preciso que a escola fique atenta à conduta destas crianças em relação à outra criança. O parecer da escola é muito importante posto que a criança. Passa boa parte do tempo e das suas relações dentro dela. A escola é o melhor caminho para um desenvolvimento social sadio de acordo com sua potencialidade educacional e emocional para lidar com atitudes e atividades da vida acadêmica e principalmente fora dela de forma contínua. O trabalho deverá ser definido também em individual, em dupla ou coletivamente de acordo com o potencial do aluno ou do grupo e a capacidade de sucesso da atividade. O trabalho individual focaliza a aprendizagem da criança, o que é importante, mas alguns momentos há que se trabalhar em grupo por ser com ele a criança que ela si identifica e assume um papel e sendo maior a diversidade dentro dele, maior será o modelo de relacionamento social e isto favorece ao desenvolvimento de sua “persona”. O trabalho não segue regra específica, posto que se trata de uma clientela plural em seu desenvolvimento, mas sim a partir de uma observação para saber o que fazer, a que ter em mente o autista a ser trabalhado e não o quadro nosológico apresentado.
  • 59. 59 Há uma pré-disposição à regressão da criança e o trabalho deve oscilar entre um constante ir e vir. É de fundamental importância valorizar suas habilidades, se assim podemos dizer de sua capacidade de ajudar em atividades rotineiras e de relacionar objetivos. São geralmente ótimos ajudantes em sala e muito organizados. Por ter uma noção difusa da realidade, temos que buscar limites, significação e ordem, tentando estabelecer rotina e maneira especifica para tentar alcançar algum objetivo e dar significação aos comportamentos sociais para que possam ser entendidos, pois estamos biologicamente pré-dispostos a isso, desde com estimulação apropriada. A fala é usada para compreensão dos sentimentos, e a criança autista muitas das vezes não a compreende. As tarefas devem ser coerentes e estabelecer início, meio e fim dentro de um espaço temporal previsto (do tipo antes do recreio, saber onde estão sendo guardados seus objetos escolares para facilitar seu acesso e manuseio, bem como aquele CD que ela gosta de ouvir enquanto faz as atividades em sala). Quando a escola for participar de eventos externos, o ideal é que seja conversado com antecedência e, se possível, mostrar fitas de vídeo mostrando o local e o tempo preciso de retorno como (antes do recreio). Se tudo for feito de uma forma estruturada, há menos riscos da ocorrência de algum problema. Quando a escola estiver se preparando para uma visita ao museu, mercado, excursões, praça ou qualquer atividade que fuja da rotina é preciso uma conversa prévia e específica. Visões compartilhadas quase nunca coincidem. Daí a dificuldade de se saber como trabalhar na escola com o autista. Em principio, trabalhamos com instinto e a
  • 60. 60 vontade de acertar, usamos da paciência e do respeito para com o ser humano a ser trabalhado, e, acima de tudo, com a vontade de buscar mais e saber mais a respeito destes pares misteriosos que nos cercam. Temos dúvida quanto ao caminho adequado a seguir, mas é evidente que a posição de professores e profissionais que antes trabalharam com a criança seja de suma importância. Ter a humildade de saber que pouco se sabe e muito há para aprender em se tratando de um sujeito tão particular quanto o autista é um bom caminho para a escola poder elaborar um material eficiente de trabalho. Muitas das vezes o currículo comum é adequado à criança autista. Em outras situações, teremos que adaptá-lo à realidade da criança. Quem nos dirá o caminho a ser seguido é a própria criança e suas necessidades de desenvolvimento e capacidade apesar de muito se pensa ao contrário. “Os enfoques pragmáticos e os sistemas de signos têm que ser adaptados a autista com uma esperança de comunicação desta criança”. (Jiménez). Os objetivos devem ser estabelecidos, conteúdo e metodologia a ser utilizada devem ser de acordo com cada caso particular, trabalhados em função da redução de conduta inadequada e do desenvolvendo da função atrasada (linguagem, cuidados pessoais). Quanto mais cedo for a intervenção da escola maior as chances de sucesso e melhor poderá evoluir o trabalho psicopedagógico no seu desenvolvimento, tanto pedagógico quanto de interação.
  • 61. 61 A Escola e a Construção do Sujeito A escola, para satisfazer a sua demanda de trabalho precisa unificar trabalhos pedagógicos como a reconstrução do Eu que este sujeito deixou se perder em algum momento de sua vida. A escola precisa seguir ao constante destruir e construir do sujeito em relação ao outro, o meio do qual ela está incluída engloba as relações com os outros, objetos e os meios de aquisição do conhecimento dentro de uma cultura. É na escola que a criança põe em prática as condutas disponíveis e tira novos meios para poder agir em sociedade. Esta ação, a principio, sobre a intervenção através da linguagem para retornar ao social. Mas para que um trabalho com autista seja satisfatório, é preciso que, possamos, em um primeiro momento, somente receber estas crianças dentro da escola para tentar familiarizá-la com o ambiente e com aqueles sujeitos que ali estão inseridos para depois trabalharmos a noção que ela tem dela e do outro e quando ela se separa deste outro. Daí em diante precisa, a escola, trabalhar o corpo e como ela lida com seu corpo em movimento, em contato com o outro corpo e com seu cuidado com o corpo. Vimos com freqüência a presença de crianças grandes em processo de alfabetização, justamente por estarem elas, anteriormente, neste conflito dela com o mundo, com seus sentimentos, com o corpo. Dentro da “Teoria da Motivação Humana” de Maslow, as aquisições de estágios superiores do desenvolvimento, só poderão ocorrer, mediante satisfação secundária
  • 62. 62 de outros, no topo da pirâmide estão às necessidades físicas ou fisiológicas seguidas das necessidades de afeto e segurança e aceitação pelo outro. A pessoa em dificuldade em tais necessidades básicas está centrada em sua segurança pessoal e, portando em um estado de “motivação da deficiência”. A educação não deve se limitar ao ensino de conteúdo e engloba o espaço que a ele o sujeito está isento. O corpo da sala, espaço, precisa de maior mobilidade e acesso e de uma forma lógica organizada para manuseio o espaço (tempo), também para duração das atividades e o momento oportuno para sua realização. O buraco negro pode ser restaurado por atividades cognitivas e atividades criativas com o mundo exterior para estimular o crescimento e a busca por uma restauração de sua capacidade psíquica através de uma experiência. Tais experiências servem para que o autista se separe e elabore o mundo para, a partir daí, possam começar a relacionar com as outras pessoas. Os Objetos em Sala Meltzer apud Tafuri, o pensamento da criança autista é atraído de forma desordenada pela percepção dos objetos, as qualidades visuais, à audição dos sons, a experiência corporal com os objetos, o paladar dos alimentos e nos objetos em si e na voz. Atenção e postura são o que nos permitirá aproximação física com a criança pelo toque, olhar que não são tão toleráveis. Segundo Lecourt e apud Tafuri, o espelho sonoro antecede o espelho visual e relação entre emissão sonora e a exigência de amor, a expressão de cinismo e o reconhecimento do outro, ainda segundo Langer apud Tafuri linguagem e o corpo caminham juntos, a criança não só ouve sons como os experimenta no próprio