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EDUCAÇÃO
TERAPÊUTICA: O QUE
A PSICANÁLISE PODE
PEDIR À EDUCAÇÃO
M . C ristina M . Kupfer
abe-se que a Educação Re-
gular é, atualmente, uma máquina de
excluir os diferentes. Mais do que isso,
as práticas pedagógicas adotadas em
nossas escolas são em realidade fabri-
cantes dessa nova categoria de crianças,
as excluídas do sistema regular de ensi-
no. Os trabalhos de M. Helena Patto
(1990) mostram isso claramente, ao de-
nunciarem o fato de que o fracasso es-
colar se produz no interior das relações
cotidianas do universo escolar. A esma-
gadora maioria de crianças não é fra-
cassada escolar porque tem problemas
de dislexia, dislalia ou mesmo porque
sofre de carência cultural. Elas se tor-
nam fracassadas escolares a partir do
modo como a escola aborda, ataca,
nega e desqualifica o degrau, a diferen-
ça social, o desencontro de linguagens
entre as crianças de extração pobre, de
um lado, e a escola comprometida com
outras extrações sociais, de outro.
Entre essas crianças, há, porém,
algumas que sofrem uma exclusão de
outra natureza. Sua diferença não está
nem em sua condição social, nem em
seu funcionamento intelectual efetiva-
mente rebaixado por determinantes ge-
néticos, funcionais ou anátomo-pato-
lógicos. São diferentes porque apresen-
tam graves distúrbios de desenvolvi-
mento e demonstram um funcionamen-
to intelectual absolutamente atípico.
Não são deficientes mentais verdadeira-
mente; podem enganar à primeira vista,
mas logo se vê que possuem algumas
qualidades intactas, algumas ilhas de
inteligência. Está-se falando das crian-
ças que alguns psicanalistas poderão
diagnosticar como psicóticas, que al-
guns neurologistas chamarão talvez de
autistas de bom rendimento. Seja qual
for o diagnóstico, porém, estarão ex-
cluídas da escola regular.
Atualmente, isto está começando a
mudar. Em alguns centros educacionais
mais avançados no mundo, e em algu-
mas escolas brasileiras, está-se falando
em readmitir essas crianças - vamos
• Psicanalista. Professora doutora do Instituto de Psicologia da USP.
Diretora geral do Lugar de Vida
dizer, com "distúrbios globais do desenvolvimento" - nas escolas
regulares. Para as crianças psicóticas, autistas ou com distúrbios
graves de socialização, a palavra de ordem, hoje, é: reintegração
escolar.
Por que e para que, é preciso perguntar. Pois a reintegração
não é, de modo algum, pacífica, óbvia, ou de fácil execução. Exige,
portanto uma discussão prévia. Será necessário fazer uma retros-
pectiva histórica do problema e examinar em seguida as propostas
que vêm sendo apresentadas hoje, bem como seus fundamentos
teóricos.
A retrospectiva histórica das relações entre psicose infantil e
escolarização permite traçar um estranho caminho, cujo ponto de
partida, no século passado, é uma prática que pode ser chamada
de Psiquiatria Educativa. O ponto de chegada - e aqui reside a
estranheza - é o oposto do de partida: aportamos na Educação
Terapêutica.
De fato, as propostas de educação da criança psicótica não
são recentes: elas datam do ano de 1800. Mais que isso, a primeira
proposta de tratamento de uma criança psicótica foi educativa.
Jean Itard era um médico, discípulo de Pinei, para quem a cri-
ança encontrada em um bosque da França - Victor - era idiota
porque havia sido abandonada, e não o contrário, como diziam
seus contemporâneos, para quem Victor havia sido abandonado
porque era idiota. "Na horda selvagem mais errante, bem como na
nação européia mais civilizada, o homem não é senão aquilo que
o fazemos ser: necessariamente criado por seus semelhantes, ele
contraiu deles seus hábitos e necessidades; suas idéias não lhe per-
tencem; ele gozou da mais bela prerrogativa de sua espécie, a sus-
cetibilidade de desenvolver seu entendimento pela força da imi-
tação e pela influência da sociedade", afirmou Itard em 1801 (1994,
p. 3). Especialista na educação de surdos-mudos, dispôs-se então a
tratar daquela criança, aplicando-lhe o que era chamado na época
de tratamento moral. Era moral porque incidia não sobre o corpo,
mas sobre as faculdades mentais.
Victor foi apontado como uma criança idiota, uma vez que
essa era a grande categoria que servia, na época, para abrigar toda
sorte de deficiências mentais. Da perspectiva histórica com a qual
estamos instrumentados, porém, Victor seria, provavelmente, diag-
nosticado como psicótico.
No que consistia esse tratamento? Consistia em educar. Por
que e para que educar crianças até então consideradas inaptas para
a vida social? Quétel e Pétel (1987) afirmam que estava em jogo
uma experiência científica. Pode-se, porém, aventar uma outra
hipótese para explicar o furor educandi de Itard. O ideal educati-
vo, no início do século XIX, já estava instalado na forma como
hoje o conhecemos. Vinha, desde o século XVII, atribuindo o con-
torno, a existência e o sentido que o discurso social designa para
a criança, como nos mostra Philippe Aries (1981). Este autor
demonstra que o novo sentimento de
infância gestado a partir do século XVII
é totalmente solidário com um novo
ideal educativo, construído de modo a
atender às exigências político-sociais de
uma burguesia nascente. Essa nova ar-
ticulação entre Infância e Educação é
forte ao ponto de levar o psicanalista
francês Guy Clastres (199D a afirmar
que o significante "educação" faz surgir
o significante criança, que havia desa-
parecido. Ou seja, o discurso social mo-
derno cria uma criança cuja consistên-
cia está no fato de ela ser submetida a
uma educação nova, que implica vigi-
lância, disciplina, segregação. Que im-
plica o surgimento da escola. Nossa cri-
ança é, por definição, escolar.
Assim, nos albores da Psiquiatria
Infantil - Jean Itard é considerado seu
iniciador -, assiste-se à tentativa de tra-
tar o jovem Victor de Aveyron ensinan-
do-o a humanizar-se.
O relato feito por Itard a respeito
desse tratamento revela que este foi um
grande fracasso. No entanto, não deixou
de destacar em Victor um aspecto fun-
damental, muito importante para nossos
propósitos: Itard afirmou a integridade
da humanidade de Victor, no dizer de
Postei e Quétel, ou, se quiserem, supôs,
sem saber o que fazer com isso, ser
Victor um sujeito, que poderia vir a res-
ponsabilizar-se por seus atos, ou que
poderia vir a falar em nome próprio.
Itard fracassou, mas nem por isso
deixou de fazer escola. "Depois dele, os
pedagogos e médicos que se dedicaram
aos deficientes conservaram, de sua ten-
tativa, apenas a apologia do adestramen-
to", afirmam Postei e Quétel (1987, p.
511). E por que, pode-se perguntar?
Provavelmente porque havia algumas
crianças que respondiam a esses esfor-
ços adestradores, e também porque se
notou, desde o princípio, que havia,
entre as crianças idiotas, algumas que
apresentavam o que alguns chamaram,
em obras publicadas na segunda metade
do século XLX, de "qualidades intactas".
Para muitos educadores, o esforço hu-
manizador de Itard cedeu lugar a esses
esforços de adestramento, que desem-
bocaram, na atualidade, em métodos e-
ducativos para crianças autistas que che-
gam ao absurdo de propor que não se
fale com elas, já que isto as perturba, e
de afirmar que o importante é ensiná-las
a atravessar a rua, fechar botões e ir ao
banheiro sem perturbar os adultos. As-
sim, o ramo educativo da Psiquiatria E-
ducativa veio desembocar nos métodos
de adestramento que conhecemos.
Bem, mas e o "lado humanizante"
do trabalho de Itard?
Este também fez escola, pelo me-
nos de modo pontual. Assistimos, no
decorrer de todo o século XIX, a algu-
mas tentativas de tratar efetivamente a-
quelas crianças deficientes que eram lo-
calizadas como diferentes, ao lado natu-
ralmente das inúmeras práticas asilares
que não passavam de esforços de con-
centrá-las em depósitos "humanos".
Dessas tentativas de tratar; registram-se
até mesmo algumas muito próximas dos
modernos ateliês ou oficinas de traba-
lho, nos quais se propunham atividades
musicais, ou então passeios e outras
ações cuja base era a suposição de que
ali estavam seres humanos. Pode-se di-
zer, talvez, que essas práticas, de mãos
dadas com a Psicanálise nascente no
início do século XX, vieram resultar nas
propostas de tratamento psicanalítico
para crianças psicóticas que surgem no
início dos anos 30^ .
A partir daí, começam a proliferar
os tratamentos, agora de toda espécie,
dirigidos a todo tipo de desadaptação
exibido pelas crianças. No final dos
anos 60, o excesso de "banhos de trata-
mento" recebeu uma crítica contunden-
te e rigorosa na pena de Maud Mannoni
(1977). Em "Educação Impossível",
Mannoni descreve com clareza o fracas-
so da Pedagogia - para todas as crian-
ças do mundo contemporâneo - o que
explica para ela o enorme contingente
de crianças com problemas os mais
variados, mas principalmente de apren-
dizagem, que aportaram nos inúmeros
centros de tratamento criados na época.
Esses centros de tratamento, na França,
eram - e não podiam deixar de ser,
dado que os problemas eram, na imen-
sa maioria, de aprendizagem - centros
médico-pedagógicos.
Mais uma vez, os dois eixos em
discussão ressurgem enodados: trata-
mento e educação nasceram juntos para
cuidar das crianças com problemas gra-
ves, e agora enlaçam-se novamente pa-
ra cuidar dos fracassados escolares. Pa-
rece não ser mesmo possível desenlaçá-
los, já que a criança moderna é por
definição escolar.
Para a criança psicótica, porém,
nada de muito sistemático em matéria
de educação foi proposto na época. A
exceção deve ser aberta para Bonneuil,
uma das poucas tentativas de propor
uma escola que, se não estava propria-
mente enodada com o tratamento, esta-
va porém comprometida com a Psi-
canálise. Mannoni escreve: "O parado-
xo de Bonneuil é que não se pratica aí
a Psicanálise (isso é concomitante à
recusa da instituição); mas tudo o que
aí se faz baseia-se rigorosamente na psi-
canálise, à qual não se recorre como
técnica de ajustamento mas, outrossim,
como subversão de um saber e de uma
praxis" (1977, p. 16).
Bonneuil não é uma escola espe-
cial, no sentido de que se dedicou a
criar métodos especiais de ensino de
crianças psicóticas. Está orientada por
um grande princípio, cujo principal
ingrediente não é o fazer pedagógico
cotidiano, mas é uma posição ética e
política em relação à participação dos
diferentes nas oportunidades sociais.
Neste ponto, Mannoni está sendo
absolutamente solidária com a prática
da inclusão social do diferente, um mo-
vimento que vem ganhando vigor a par-
tir dos anos 70 e culmina com a Decla-
ração de Salamanca, de 1994, que afir-
ma ser a educação um direito de todas
as crianças portadoras de deficiências.
Os movimentos de inclusão esco-
lar são muito provavelmente filhos legí-
timos da luta antimanicomial. Se para os
adultos esta última representou a queda
dos muros dos hospitais e o esforço de
integração na comunidade, para as cri-
anças a luta antimanicomial representou
a bandeira da integração escolar e a
guerra contra as escolas especiais, se-
gregacionistas segundo aquela corrente.
Assim assiste-se hoje à retomada
da escolarização da criança psicótica.
Inevitável, já que toda criança contem-
porânea precisa ser escolar; necessária,
já que elas possuem ilhas de inteligên-
cia que, se não desenvolvidas, atrofiam-
se; mas cuidadosa, para que a resistên-
cia natural que os professores lhes opo-
rão não termine por fechar definitiva-
mente as portas da escola para essas
2
crianças^ .
É necessário, porém, avançar um
pouco mais. O que se quer propor não
é apenas a luta política pela inclusão da
criança na escola, direito de todo cida-
dão. O que se quer não é apenas fazer
a crítica das práticas pedagógicas, que
alienam - no sentido marxista da pa-
lavra - muito mais do que ensinam. O
que se quer propor é que se tire o
máximo proveito do potencial terapêu-
tico presente em todo e qualquer ato
educativo voltado para um sujeito e não
para o adestramento de uma criança.
Neste sentido, a educação será o grande
coadjuvante do tratamento psicanalíti-
co, ou seja, é o psicanalista que irá
pedir ajuda ao educador, e não o con-
trário, como acontece atualmente.
De fato, deve-se lembrar aquilo
que Freud já mencionava: nossas me-
lhores virtudes nasceram sobre o hu-
mus de nossas piores disposições^. Esta
afirmação, que cem anos atrás repre-
sentava um golpe narcísico, já pode a-
gora ser devidamente reprocessada. Po-
de-se ler aí que a Educação - entendida
aqui em sua acepção mais ampla -
modela o húmus de nossas piores
disposições - nossas pulsões - e as
transforma em nossas "virtudes". Possui,
por isso, valor estruturante. Ao coibir,
"libera", dá forma à manifestação subje-
tiva que se torna possível.
A EDUCAÇÃO
TERAPÊUTICA
Este é o nome que está sendo da-
do a um conjunto de práticas que aliam
educação e tratamento para crianças
com graves distúrbios de desenvolvi-
mento, ou se quiserem, crianças cuja
posição na rede da linguagem, cuja
inscrição no registro simbólico apresen-
tam falhas ao ponto de ficar compro-
metida a sua constituição subjetiva, sua
relação com o outro e sua circulação no
campo social: psicóticas, autistas, sin-
drômicas, ou algumas portadoras de
deficiências para quem tais falhas sim-
bólicas acabam por se intalar.
Pode-se dizer que há três eixos em
torno dos quais gira a Educação Tera-
pêutica: a inclusão escolar, o eixo sim-
bólico e a operação educativa propria-
mente dita.
O primeiro eixo dessas práticas
solidariza-se também com Bonneuil,
com a luta antimanicomial e com a po-
lítica da inclusão escolar. A criança
psicótica precisa ir à escola. Para isso,
acredita-se ser necessária uma prepa-
ração à entrada na escola, e em seguida
uma integração "pilotada", acompanha-
da muito de perto.
Mas por que a integração em uma
escola, ou, o que dá no mesmo, a cir-
culação social, pode ser terapêutica?
Pode-se responder a esta pergunta in-
troduzindo a hipótese de que, ao dar à
criança um lugar na escola, está sendo
feita uma "atribuição imaginária de
lugar social".
Em Bonneuil, as crianças costu-
mam fazer trabalhos nas vizinhanças.
Uma delas, em seu primeiro dia de tra-
balho em uma construção, foi juntar-se
na hora do almoço aos pedreiros, ao
lado de seu acompanhante da escola.
Pondo-se a comer com as mãos, rece-
beu de um pedreiro a seguinte invecti-
va: "aqui os seres humanos comem com
garfos. Bichos, que comem com as
mãos, ficam lá longe, no canto!". O
menino aceitou o garfo que lhe deram
e passou a comer tranqüilamente com
ele. Até então, muitos em Bonneuil já
haviam tentado inúmeras vezes ensiná-
lo a comer com o garfo, inutilmente.
Um pedreiro, não "psi", como diz
Mannoni, extraiu sua eficácia do lugar
que ocupava na rede social, e dali indi-
cou claramente à criança o dela.
Tais intervenções designam um
lugar de sujeito a essas crianças, que
poderão aceitá-lo, caso queiram ou pos-
sam. Não deixam de ter, porém, um
certo caráter artificial, pois há uma es-
pécie de aposta imaginária nas capaci-
dades da criança. Embora situe um lu-
gar para essa criança, fazem-no a partir
do olhar do adulto, e por isso se pode
dizer que há ainda, nessa dimensão da
educação terapêutica, uma prevalência
do imaginário sobre o simbólico. Há
apenas uma aposta do adulto, mas essa
criança precisará juntar recursos para
responder a essa imagem que lhe estão
emprestando.
Para que essa imagem ganhe con-
sistência, a Educação Terapêutica terá
ainda de operar francamente na dimen-
são simbólica: este será seu segundo
eixo, no qual não se lança mão das
relações entre as práticas de tratamento
e as educativas, mas das relações estruturais que articulam sexua-
lidade e conhecimento, sujeito e Eu, significante e palavra.
Embora não seja possível afirmar que a Psicanálise possua
uma teoria da inteligência, Freud sempre ocupou-se de pensar
sobre o modo como um ser humano pensa, e até mesmo como se
organizam as principais estruturas responsáveis por essa atividade.
Desde 1895, no "Projeto de uma Psicologia para neurólogos", sua
preocupação voltava-se para questões da seguinte natureza: como
se inscrevem, no plano neurológico, as impressões colhidas pela
percepção, ou seja, como se marcam no cérebro as imagens e re-
presentações do mundo? Desde então, buscava uma teoria da
memória, coisa que o ocupou até 1924, quando escreveu "O Bloco
Mágico". Também no texto "A Negação", verifica-se a preocupação
de Freud com o modo como se estabelecem os juízos de atribuição
e de afirmação. Finalmente, em "O Ego e o Id", de 1923, observa
que a Psicanálise não havia abordado até então com a devida
atenção os processos conscientes, mas isto não significava que não
tivessem importância (Freud, 1973a,b,c,d).
Freud dedicou-se especialmente ao estudo do modo como se
constrói o desejo de saber. Para ele, a pulsão de saber infantil é
"atraída - e talvez despertada - pelos problemas sexuais em idade
surpreendentemente precoce e com insuspeitada intensidade", es-
creve Freud em "Três ensaios para uma teoria da sexualidade"
(1973e, p. 1207). As intermináveis perguntas das crianças, afirma
ele no texto "Uma recordação infantil de Leonardo da Vinci", de
1910, são de fato rodeios em torno da curiosidade sobre as origens,
despertada quando vêem nascer seus irmãos (Freud, 19730- Essas
investigações têm porém um só destino: são recalcadas e substituí-
das pelas investigações sobre os conhecimentos, que guardarão no
entanto as marcas de sua origem sexual. Foram essas formulações
que levaram Octave Mannoni a afirmar que a inteligência se faz
com restos da sexualidade.
Encerrado o período das investigações sexuais infantis, as cri-
anças poderão voltar a atenção para o conhecimento e a constitui-
ção de novos saberes.
Uma outra resposta à pergunta "o que quer saber uma crian-
ça" é dada por Piera Aulagnier (1967): uma criança pergunta por-
que quer saber sobre o desejo. Todo desejo de saber é desejo de
saber sobre o desejo do Outro, afirma ela.
Pode-se dizer o mesmo de um outro modo: uma criança quer
saber sobre o objeto do gozo do outro, porque goza com o objeto
do gozo do outro. Nada mais claro do que a estrutura do Édipo para
demonstrar isso, como afirma Jerusalinsky (1996): um filho deseja a
mãe porque ela é o objeto de gozo do pai. O problema é que, quan-
do envereda pelos caminhos do saber sobre esses objetos libidi-
nizados pelo outro, não pode gozar com eles, porque gozo e saber
estão irremediavelmente separados, como ensina Lacan em "Kant
com Sade" (1963). Não será por isso, porém, que um sujeito irá desi-
stir. Ao contrário, a impossibilidade de
encontrar seu objeto de gozo, perdido
para sempre já que, se goza, não sabe,
e se sabe, não goza, impulsionará uma
busca incessante de saber. Os homens
não param de produzir saber. Haverá
sempre um deslizamento assintótico,
sempre um bordejamento da questão,
nunca a sua realização.
Até aqui, o que se disse a respeito
das relações entre conhecimento e se-
xualidade refere-se ao sujeito infantil
neurótico. Nas crianças psicóticas, po-
rém, essas relações não se dão do mes-
mo modo.
As investigações sexuais podem
ocorrer de forma pontual e parcial, mas
não se dão sob a égide da castração. O
desejo, que se produz pelo efeito da
falta, também não se constitui. O psi-
cótico se põe em posição de objeto pa-
ra o gozo do outro, por isso não quer
saber sobre o objeto com o qual o outro
goza. Assim, um psicótico, a rigor, nada
deseja saber.
Aquilo que organiza a relação do
sujeito com o significante, e permite a
sua instalação, é a castração, a referên-
cia fálica. Então, o significante, enquan-
to função, não se organiza. O psicótico
aprende eventualmente palavras, já que
elas têm função instrumental. Mas não
tem à disposição significantes que o
representem, com os quais possa se
dizer, e fazer surgir o sujeito.
Para a produção do que venha a
substituir, ainda que como remendo, a
função paterna, e portanto uma insta-
lação da função significante, o tratamen-
to se faz necessário. É preciso lembrar,
porém, que significante e palavra são
faces da mesma moeda: ambos estão
estruturados pela linguagem. E para a
instalação de palavras, "recheios", ou de
um capital ideativo, como dizem os
psiquiatras, a Educação é o instaimento.
Uma Educação que leve em conta,
porém, essa articulação entre palavra e
significante, entre palavra e emergência
do sujeito. Uma Educação Terapêutica.
Que ofereça palavras e produções da
cultura, para permitir que daí advenha
algo de significante, de simbólico. Para
que um sujeito possa vir a se dizer, pre-
cisará de palavras, ou da música, ou do
gesto na dança ou no teatro.
Uma Educação tradicional, que
busque apenas a introdução de palavras,
e que pense nelas apenas em seu valor
instrumental, não é suficiente. Caso fos-
se, bastaria colocar as crianças psicóticas
em escolas, e a reversão espontânea de
seu quadro estaria garantida. Este é aliás
um erro muito freqüente entre pais e
psiquiatras: "esperemos que melhore,
vamos colocá-lo em uma escola e tudo
poderá melhorar", dizem às vezes.
Transmitir o conhecimento, desta
perspectiva, abre por exemplo uma
chance para a quebra das estereotipias,
que são emergências de fala "decaídas"
por falta de lastro significante. São ruí-
nas de antigos castelos, como diz Laz-
nick (1997). Ao contrário, dar treino é
supor que a criança precisa apenas do
valor instrumental das palavras e das
ações. Da perspectiva da psicanálise,
oferece-se o conhecimento não apenas
em sua dimensão instrumental, mas
como possibilidade de que este seja uti-
lizado para separá-lo do gozo intrusivo
do Outro. É um instrumento que cons-
trói o sujeito, e não apenas uma ferra-
menta para o Eu.
Dois exemplos de práticas orien-
tadas pela Educação Terapêutica:
1. A chamada é uma Chamada
Atualmente, a proposta educacio-
nal da Pré-Escola Terapêutica Lugar de
Vida está muito mais próxima da de
uma escola do que no início. Busca-se
com isso ir introduzindo a criança ao
universo escolar. Assim, todos os dias
faz-se a chamada.
Suzana entrou no Lugar de Vida
há um ano, e trouxe consigo um hábito
estranho: costumava desenhar em sua
própria testa um rabisco, uma cobrinha,
uma marca. Fazia também desenhos
que consistiam em bolas umas dentro
das outras, sem muita ordem. A profes-
sora^ reconheceu nesse desenho, um
dia, uma menina: a bola maior era o
rosto, e as menores os olhos, a boca.
"Uma menina!", exclamou jubilosa-
mente aquela professora. Suzana incor-
porou então essa significação, e passou
a desenhar o rosto com mais detalhes. E
incluiu, pouco mais tarde, nesse desen-
ho de menina, sua marca registrada: a
cobrinha na testa. Uma inscrição origi-
nária ganhou sua extensão no signifi-
cante "menina".
Na chamada, as crianças são con-
vidadas a "assinar" seu nome ao lado
do que já está escrito em letra de forma.
Suzana, de início, mal prestava atenção
a essa solicitação. Quando sua cobrinha
surgiu na testa do desenho, passou a
"assinar-se" com ela. Ao escrever, vai
soletrando: Su-za-na.
Vê-se com isso que a chamada
pode funcionar como uma Chamada,
isto é, como um apelo ao sujeito, como
uma oferta de produção de algo que é
mais do que um nome vindo designar
um objeto do mundo. Não se trata ape-
nas de ensinar a uma criança seu nome
e modo de escrevê-lo, esperando que
ela o utilize tão somente em sua comu-
nicação. Aqui, espera-se que o nome
represente o sujeito, e se torne um sig-
nificante, singularizando-o. Ou seja,
que o designe como único personagem
a portá-lo. A este apelo, Suzana ouviu,
assinando-se com o que, embora fora
do código, a representava, a marcava,
conferindo-lhe um mínimo de existên-
cia no mundo. Está a um passo de cur-
var-se ao código da língua, pois agora
escreve letras ao lado de seu nome^.
2. Permanências e transformações.
Fábio olhava a professora escre-
ver, embaixo da produção de Suzana, o
nome dela. Excitou-se, e chamou, com
os sons de voz pouco claros que lhe
são característicos, essa mesma profes-
sora. Em seguida, tomou da caneta que
ela segurava, bateu com a mão em seu
próprio peito, em um gesto típico de
quem quer dizer "eu", e depois fez ra-
biscos parecidos com os de uma assina-
tura abaixo, agora, de sua própria pro-
dução de desenho. Reconheceu-se.
"Um ser que pode ler sua marca, isto
basta para que ele possa se reinscrever
noutra parte além dali onde a gravou",
afirmou Lacan^. Este movimento de
Fábio vem na esteira de algumas sema-
nas de trabalho em que se falou muito
de marcas, daquilo que permanece e do
que se transforma, e do que torna
próprio o que cada criança faz.
Partiu-se da Psiquiatria Educativa,
chegou-se à Educação Terapêutica, que
é o seu inverso. A Educação não tem
mais, aqui, o fim de adaptar a criança a
um meio social, e de tornar o convívio
com ela suportável. Tem a função de
dar à criança um lugar de sujeito. De
fato, qualquer educação que se preze
deveria estar levando isso em conta. E
quando ela obtém êxito, o que ocorreu
foi justamente o enodamento de um
sujeito com a pura palavra ali veiculada,
ainda que o educador não tivesse isso
em mente. Mas para as crianças psicóti-
cas, levar isso em conta é necessário e
crucial, e é isto que a torna terapêutica.
Agora, podemos voltar a falar em
inserção escolar. Que será naturalmente
difícil, pois essas crianças carregarão as
marcas de suas falhas de inscrição no
registro simbólico. Seu tratamento não
terminou, mas já podem sentar-se, já
não se mordem com freqüência, podem
ouvir o apelo do social, e se situam, de
forma mínima, neste campo. Sua entra-
da na escola deverá, então, ser pilotada.
Um trabalho junto à escola, e ao pro-
fessor que desejar recebê-la, precisará
ser construído. •
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da Clínica, anol, n.l, p. 146-163.
LACAN, Jacques (1966). Kant com Sade. In:
Écrits. Paris, Seuil.
LAZNIK-PENOT, M.-Christine (1997). Rumo à
palavra. São Paulo, Escuta.
MANNONI, Maud (1977). Educação impossí-
vel. Rio de Janeiro, Zahar.
PATTO, M. Helena Souza (1990). A produção
do fracasso escolar: histórias de submissão
e rebeldia. São Paulo: Queiroz.
POSTEL, J. e QUÉTEL, C. (org.) (1987).
Historia de la psiquiatria. Cidade do
México, Fundo de Cultura Econômica
NOTAS
1 A respeito da história das abordagens psicanalíticas das psicoses infantis, ver LEDOUX,
Michel H. Conceptions psychanalytiques de la psychose infantile. Paris, Presses Universitaires de
France, 1984.
^ Vejam-se as conseqüências de não ter tais cuidados. Tomem-se, por exemplo, as experiên-
cias européias reportadas em um Colóquio Internacional realizado na Noruega sobre esse tema
(Integração de jovens deficientes no ensino obrigatório na Noruega, 1983). Ali se descrevem as ten-
tativas feitas no sentido de manter em classes regulares do ensino público algumas crianças autis-
tas e psicóticas: elas terminaram, depois de se verificar que as escolas acabavam criando classes
especiais, em que havia apenas uma criança -exatamente a psicótica ou a autista, com quem o con-
vívio se tornara insuportável.
3 Ver o artigo de Jean-Claude Filloux neste mesmo número.
4 As professoras, no Lugar de Vida, são na verdade psicólogas com formação psicanalítica,
já que a Educação Terapêutica exige um tipo de escuta que o professor especializado não está for-
mado para ter.
5 O caso de Suzana e seu acesso à escrita deverá ser abordado em um artigo no próximo
número desta revista
6 Citado por ALLOUCH, Jean. Letra a letra. Rio de Janeiro, Campo Matêmico, 1995, p. 11.

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CRÔNICAS DE UMA TURMA - TURMA DE 9ºANO - EASB
 

Educação terapêutica e psicanálise

  • 1. EDUCAÇÃO TERAPÊUTICA: O QUE A PSICANÁLISE PODE PEDIR À EDUCAÇÃO M . C ristina M . Kupfer abe-se que a Educação Re- gular é, atualmente, uma máquina de excluir os diferentes. Mais do que isso, as práticas pedagógicas adotadas em nossas escolas são em realidade fabri- cantes dessa nova categoria de crianças, as excluídas do sistema regular de ensi- no. Os trabalhos de M. Helena Patto (1990) mostram isso claramente, ao de- nunciarem o fato de que o fracasso es- colar se produz no interior das relações cotidianas do universo escolar. A esma- gadora maioria de crianças não é fra- cassada escolar porque tem problemas de dislexia, dislalia ou mesmo porque sofre de carência cultural. Elas se tor- nam fracassadas escolares a partir do modo como a escola aborda, ataca, nega e desqualifica o degrau, a diferen- ça social, o desencontro de linguagens entre as crianças de extração pobre, de um lado, e a escola comprometida com outras extrações sociais, de outro. Entre essas crianças, há, porém, algumas que sofrem uma exclusão de outra natureza. Sua diferença não está nem em sua condição social, nem em seu funcionamento intelectual efetiva- mente rebaixado por determinantes ge- néticos, funcionais ou anátomo-pato- lógicos. São diferentes porque apresen- tam graves distúrbios de desenvolvi- mento e demonstram um funcionamen- to intelectual absolutamente atípico. Não são deficientes mentais verdadeira- mente; podem enganar à primeira vista, mas logo se vê que possuem algumas qualidades intactas, algumas ilhas de inteligência. Está-se falando das crian- ças que alguns psicanalistas poderão diagnosticar como psicóticas, que al- guns neurologistas chamarão talvez de autistas de bom rendimento. Seja qual for o diagnóstico, porém, estarão ex- cluídas da escola regular. Atualmente, isto está começando a mudar. Em alguns centros educacionais mais avançados no mundo, e em algu- mas escolas brasileiras, está-se falando em readmitir essas crianças - vamos • Psicanalista. Professora doutora do Instituto de Psicologia da USP. Diretora geral do Lugar de Vida
  • 2. dizer, com "distúrbios globais do desenvolvimento" - nas escolas regulares. Para as crianças psicóticas, autistas ou com distúrbios graves de socialização, a palavra de ordem, hoje, é: reintegração escolar. Por que e para que, é preciso perguntar. Pois a reintegração não é, de modo algum, pacífica, óbvia, ou de fácil execução. Exige, portanto uma discussão prévia. Será necessário fazer uma retros- pectiva histórica do problema e examinar em seguida as propostas que vêm sendo apresentadas hoje, bem como seus fundamentos teóricos. A retrospectiva histórica das relações entre psicose infantil e escolarização permite traçar um estranho caminho, cujo ponto de partida, no século passado, é uma prática que pode ser chamada de Psiquiatria Educativa. O ponto de chegada - e aqui reside a estranheza - é o oposto do de partida: aportamos na Educação Terapêutica. De fato, as propostas de educação da criança psicótica não são recentes: elas datam do ano de 1800. Mais que isso, a primeira proposta de tratamento de uma criança psicótica foi educativa. Jean Itard era um médico, discípulo de Pinei, para quem a cri- ança encontrada em um bosque da França - Victor - era idiota porque havia sido abandonada, e não o contrário, como diziam seus contemporâneos, para quem Victor havia sido abandonado porque era idiota. "Na horda selvagem mais errante, bem como na nação européia mais civilizada, o homem não é senão aquilo que o fazemos ser: necessariamente criado por seus semelhantes, ele contraiu deles seus hábitos e necessidades; suas idéias não lhe per- tencem; ele gozou da mais bela prerrogativa de sua espécie, a sus- cetibilidade de desenvolver seu entendimento pela força da imi- tação e pela influência da sociedade", afirmou Itard em 1801 (1994, p. 3). Especialista na educação de surdos-mudos, dispôs-se então a tratar daquela criança, aplicando-lhe o que era chamado na época de tratamento moral. Era moral porque incidia não sobre o corpo, mas sobre as faculdades mentais. Victor foi apontado como uma criança idiota, uma vez que essa era a grande categoria que servia, na época, para abrigar toda sorte de deficiências mentais. Da perspectiva histórica com a qual estamos instrumentados, porém, Victor seria, provavelmente, diag- nosticado como psicótico. No que consistia esse tratamento? Consistia em educar. Por que e para que educar crianças até então consideradas inaptas para a vida social? Quétel e Pétel (1987) afirmam que estava em jogo uma experiência científica. Pode-se, porém, aventar uma outra hipótese para explicar o furor educandi de Itard. O ideal educati- vo, no início do século XIX, já estava instalado na forma como hoje o conhecemos. Vinha, desde o século XVII, atribuindo o con- torno, a existência e o sentido que o discurso social designa para a criança, como nos mostra Philippe Aries (1981). Este autor
  • 3. demonstra que o novo sentimento de infância gestado a partir do século XVII é totalmente solidário com um novo ideal educativo, construído de modo a atender às exigências político-sociais de uma burguesia nascente. Essa nova ar- ticulação entre Infância e Educação é forte ao ponto de levar o psicanalista francês Guy Clastres (199D a afirmar que o significante "educação" faz surgir o significante criança, que havia desa- parecido. Ou seja, o discurso social mo- derno cria uma criança cuja consistên- cia está no fato de ela ser submetida a uma educação nova, que implica vigi- lância, disciplina, segregação. Que im- plica o surgimento da escola. Nossa cri- ança é, por definição, escolar. Assim, nos albores da Psiquiatria Infantil - Jean Itard é considerado seu iniciador -, assiste-se à tentativa de tra- tar o jovem Victor de Aveyron ensinan- do-o a humanizar-se. O relato feito por Itard a respeito desse tratamento revela que este foi um grande fracasso. No entanto, não deixou de destacar em Victor um aspecto fun- damental, muito importante para nossos propósitos: Itard afirmou a integridade da humanidade de Victor, no dizer de Postei e Quétel, ou, se quiserem, supôs, sem saber o que fazer com isso, ser Victor um sujeito, que poderia vir a res- ponsabilizar-se por seus atos, ou que poderia vir a falar em nome próprio. Itard fracassou, mas nem por isso deixou de fazer escola. "Depois dele, os pedagogos e médicos que se dedicaram aos deficientes conservaram, de sua ten- tativa, apenas a apologia do adestramen- to", afirmam Postei e Quétel (1987, p. 511). E por que, pode-se perguntar? Provavelmente porque havia algumas crianças que respondiam a esses esfor- ços adestradores, e também porque se notou, desde o princípio, que havia, entre as crianças idiotas, algumas que apresentavam o que alguns chamaram, em obras publicadas na segunda metade do século XLX, de "qualidades intactas". Para muitos educadores, o esforço hu- manizador de Itard cedeu lugar a esses esforços de adestramento, que desem- bocaram, na atualidade, em métodos e- ducativos para crianças autistas que che- gam ao absurdo de propor que não se fale com elas, já que isto as perturba, e de afirmar que o importante é ensiná-las a atravessar a rua, fechar botões e ir ao banheiro sem perturbar os adultos. As- sim, o ramo educativo da Psiquiatria E- ducativa veio desembocar nos métodos de adestramento que conhecemos. Bem, mas e o "lado humanizante" do trabalho de Itard? Este também fez escola, pelo me- nos de modo pontual. Assistimos, no decorrer de todo o século XIX, a algu- mas tentativas de tratar efetivamente a- quelas crianças deficientes que eram lo- calizadas como diferentes, ao lado natu- ralmente das inúmeras práticas asilares que não passavam de esforços de con- centrá-las em depósitos "humanos". Dessas tentativas de tratar; registram-se até mesmo algumas muito próximas dos modernos ateliês ou oficinas de traba- lho, nos quais se propunham atividades musicais, ou então passeios e outras ações cuja base era a suposição de que ali estavam seres humanos. Pode-se di- zer, talvez, que essas práticas, de mãos dadas com a Psicanálise nascente no início do século XX, vieram resultar nas propostas de tratamento psicanalítico para crianças psicóticas que surgem no início dos anos 30^ . A partir daí, começam a proliferar os tratamentos, agora de toda espécie, dirigidos a todo tipo de desadaptação exibido pelas crianças. No final dos anos 60, o excesso de "banhos de trata- mento" recebeu uma crítica contunden- te e rigorosa na pena de Maud Mannoni (1977). Em "Educação Impossível", Mannoni descreve com clareza o fracas-
  • 4. so da Pedagogia - para todas as crian- ças do mundo contemporâneo - o que explica para ela o enorme contingente de crianças com problemas os mais variados, mas principalmente de apren- dizagem, que aportaram nos inúmeros centros de tratamento criados na época. Esses centros de tratamento, na França, eram - e não podiam deixar de ser, dado que os problemas eram, na imen- sa maioria, de aprendizagem - centros médico-pedagógicos. Mais uma vez, os dois eixos em discussão ressurgem enodados: trata- mento e educação nasceram juntos para cuidar das crianças com problemas gra- ves, e agora enlaçam-se novamente pa- ra cuidar dos fracassados escolares. Pa- rece não ser mesmo possível desenlaçá- los, já que a criança moderna é por definição escolar. Para a criança psicótica, porém, nada de muito sistemático em matéria de educação foi proposto na época. A exceção deve ser aberta para Bonneuil, uma das poucas tentativas de propor uma escola que, se não estava propria- mente enodada com o tratamento, esta- va porém comprometida com a Psi- canálise. Mannoni escreve: "O parado- xo de Bonneuil é que não se pratica aí a Psicanálise (isso é concomitante à recusa da instituição); mas tudo o que aí se faz baseia-se rigorosamente na psi- canálise, à qual não se recorre como técnica de ajustamento mas, outrossim, como subversão de um saber e de uma praxis" (1977, p. 16). Bonneuil não é uma escola espe- cial, no sentido de que se dedicou a criar métodos especiais de ensino de crianças psicóticas. Está orientada por um grande princípio, cujo principal ingrediente não é o fazer pedagógico cotidiano, mas é uma posição ética e política em relação à participação dos diferentes nas oportunidades sociais. Neste ponto, Mannoni está sendo absolutamente solidária com a prática da inclusão social do diferente, um mo- vimento que vem ganhando vigor a par- tir dos anos 70 e culmina com a Decla- ração de Salamanca, de 1994, que afir- ma ser a educação um direito de todas as crianças portadoras de deficiências. Os movimentos de inclusão esco- lar são muito provavelmente filhos legí- timos da luta antimanicomial. Se para os adultos esta última representou a queda dos muros dos hospitais e o esforço de integração na comunidade, para as cri- anças a luta antimanicomial representou a bandeira da integração escolar e a guerra contra as escolas especiais, se- gregacionistas segundo aquela corrente. Assim assiste-se hoje à retomada da escolarização da criança psicótica. Inevitável, já que toda criança contem- porânea precisa ser escolar; necessária, já que elas possuem ilhas de inteligên- cia que, se não desenvolvidas, atrofiam- se; mas cuidadosa, para que a resistên- cia natural que os professores lhes opo- rão não termine por fechar definitiva- mente as portas da escola para essas 2 crianças^ . É necessário, porém, avançar um pouco mais. O que se quer propor não é apenas a luta política pela inclusão da criança na escola, direito de todo cida- dão. O que se quer não é apenas fazer a crítica das práticas pedagógicas, que alienam - no sentido marxista da pa- lavra - muito mais do que ensinam. O que se quer propor é que se tire o máximo proveito do potencial terapêu- tico presente em todo e qualquer ato educativo voltado para um sujeito e não para o adestramento de uma criança. Neste sentido, a educação será o grande coadjuvante do tratamento psicanalíti- co, ou seja, é o psicanalista que irá pedir ajuda ao educador, e não o con- trário, como acontece atualmente. De fato, deve-se lembrar aquilo que Freud já mencionava: nossas me-
  • 5. lhores virtudes nasceram sobre o hu- mus de nossas piores disposições^. Esta afirmação, que cem anos atrás repre- sentava um golpe narcísico, já pode a- gora ser devidamente reprocessada. Po- de-se ler aí que a Educação - entendida aqui em sua acepção mais ampla - modela o húmus de nossas piores disposições - nossas pulsões - e as transforma em nossas "virtudes". Possui, por isso, valor estruturante. Ao coibir, "libera", dá forma à manifestação subje- tiva que se torna possível. A EDUCAÇÃO TERAPÊUTICA Este é o nome que está sendo da- do a um conjunto de práticas que aliam educação e tratamento para crianças com graves distúrbios de desenvolvi- mento, ou se quiserem, crianças cuja posição na rede da linguagem, cuja inscrição no registro simbólico apresen- tam falhas ao ponto de ficar compro- metida a sua constituição subjetiva, sua relação com o outro e sua circulação no campo social: psicóticas, autistas, sin- drômicas, ou algumas portadoras de deficiências para quem tais falhas sim- bólicas acabam por se intalar. Pode-se dizer que há três eixos em torno dos quais gira a Educação Tera- pêutica: a inclusão escolar, o eixo sim- bólico e a operação educativa propria- mente dita. O primeiro eixo dessas práticas solidariza-se também com Bonneuil, com a luta antimanicomial e com a po- lítica da inclusão escolar. A criança psicótica precisa ir à escola. Para isso, acredita-se ser necessária uma prepa- ração à entrada na escola, e em seguida uma integração "pilotada", acompanha- da muito de perto. Mas por que a integração em uma escola, ou, o que dá no mesmo, a cir- culação social, pode ser terapêutica? Pode-se responder a esta pergunta in- troduzindo a hipótese de que, ao dar à criança um lugar na escola, está sendo feita uma "atribuição imaginária de lugar social". Em Bonneuil, as crianças costu- mam fazer trabalhos nas vizinhanças. Uma delas, em seu primeiro dia de tra- balho em uma construção, foi juntar-se na hora do almoço aos pedreiros, ao lado de seu acompanhante da escola. Pondo-se a comer com as mãos, rece- beu de um pedreiro a seguinte invecti- va: "aqui os seres humanos comem com garfos. Bichos, que comem com as mãos, ficam lá longe, no canto!". O menino aceitou o garfo que lhe deram e passou a comer tranqüilamente com ele. Até então, muitos em Bonneuil já haviam tentado inúmeras vezes ensiná- lo a comer com o garfo, inutilmente. Um pedreiro, não "psi", como diz Mannoni, extraiu sua eficácia do lugar que ocupava na rede social, e dali indi- cou claramente à criança o dela. Tais intervenções designam um lugar de sujeito a essas crianças, que poderão aceitá-lo, caso queiram ou pos- sam. Não deixam de ter, porém, um certo caráter artificial, pois há uma es- pécie de aposta imaginária nas capaci- dades da criança. Embora situe um lu- gar para essa criança, fazem-no a partir do olhar do adulto, e por isso se pode dizer que há ainda, nessa dimensão da educação terapêutica, uma prevalência do imaginário sobre o simbólico. Há apenas uma aposta do adulto, mas essa criança precisará juntar recursos para responder a essa imagem que lhe estão emprestando. Para que essa imagem ganhe con- sistência, a Educação Terapêutica terá ainda de operar francamente na dimen- são simbólica: este será seu segundo eixo, no qual não se lança mão das relações entre as práticas de tratamento
  • 6. e as educativas, mas das relações estruturais que articulam sexua- lidade e conhecimento, sujeito e Eu, significante e palavra. Embora não seja possível afirmar que a Psicanálise possua uma teoria da inteligência, Freud sempre ocupou-se de pensar sobre o modo como um ser humano pensa, e até mesmo como se organizam as principais estruturas responsáveis por essa atividade. Desde 1895, no "Projeto de uma Psicologia para neurólogos", sua preocupação voltava-se para questões da seguinte natureza: como se inscrevem, no plano neurológico, as impressões colhidas pela percepção, ou seja, como se marcam no cérebro as imagens e re- presentações do mundo? Desde então, buscava uma teoria da memória, coisa que o ocupou até 1924, quando escreveu "O Bloco Mágico". Também no texto "A Negação", verifica-se a preocupação de Freud com o modo como se estabelecem os juízos de atribuição e de afirmação. Finalmente, em "O Ego e o Id", de 1923, observa que a Psicanálise não havia abordado até então com a devida atenção os processos conscientes, mas isto não significava que não tivessem importância (Freud, 1973a,b,c,d). Freud dedicou-se especialmente ao estudo do modo como se constrói o desejo de saber. Para ele, a pulsão de saber infantil é "atraída - e talvez despertada - pelos problemas sexuais em idade surpreendentemente precoce e com insuspeitada intensidade", es- creve Freud em "Três ensaios para uma teoria da sexualidade" (1973e, p. 1207). As intermináveis perguntas das crianças, afirma ele no texto "Uma recordação infantil de Leonardo da Vinci", de 1910, são de fato rodeios em torno da curiosidade sobre as origens, despertada quando vêem nascer seus irmãos (Freud, 19730- Essas investigações têm porém um só destino: são recalcadas e substituí- das pelas investigações sobre os conhecimentos, que guardarão no entanto as marcas de sua origem sexual. Foram essas formulações que levaram Octave Mannoni a afirmar que a inteligência se faz com restos da sexualidade. Encerrado o período das investigações sexuais infantis, as cri- anças poderão voltar a atenção para o conhecimento e a constitui- ção de novos saberes. Uma outra resposta à pergunta "o que quer saber uma crian- ça" é dada por Piera Aulagnier (1967): uma criança pergunta por- que quer saber sobre o desejo. Todo desejo de saber é desejo de saber sobre o desejo do Outro, afirma ela. Pode-se dizer o mesmo de um outro modo: uma criança quer saber sobre o objeto do gozo do outro, porque goza com o objeto do gozo do outro. Nada mais claro do que a estrutura do Édipo para demonstrar isso, como afirma Jerusalinsky (1996): um filho deseja a mãe porque ela é o objeto de gozo do pai. O problema é que, quan- do envereda pelos caminhos do saber sobre esses objetos libidi- nizados pelo outro, não pode gozar com eles, porque gozo e saber estão irremediavelmente separados, como ensina Lacan em "Kant com Sade" (1963). Não será por isso, porém, que um sujeito irá desi-
  • 7. stir. Ao contrário, a impossibilidade de encontrar seu objeto de gozo, perdido para sempre já que, se goza, não sabe, e se sabe, não goza, impulsionará uma busca incessante de saber. Os homens não param de produzir saber. Haverá sempre um deslizamento assintótico, sempre um bordejamento da questão, nunca a sua realização. Até aqui, o que se disse a respeito das relações entre conhecimento e se- xualidade refere-se ao sujeito infantil neurótico. Nas crianças psicóticas, po- rém, essas relações não se dão do mes- mo modo. As investigações sexuais podem ocorrer de forma pontual e parcial, mas não se dão sob a égide da castração. O desejo, que se produz pelo efeito da falta, também não se constitui. O psi- cótico se põe em posição de objeto pa- ra o gozo do outro, por isso não quer saber sobre o objeto com o qual o outro goza. Assim, um psicótico, a rigor, nada deseja saber. Aquilo que organiza a relação do sujeito com o significante, e permite a sua instalação, é a castração, a referên- cia fálica. Então, o significante, enquan- to função, não se organiza. O psicótico aprende eventualmente palavras, já que elas têm função instrumental. Mas não tem à disposição significantes que o representem, com os quais possa se dizer, e fazer surgir o sujeito. Para a produção do que venha a substituir, ainda que como remendo, a função paterna, e portanto uma insta- lação da função significante, o tratamen- to se faz necessário. É preciso lembrar, porém, que significante e palavra são faces da mesma moeda: ambos estão estruturados pela linguagem. E para a instalação de palavras, "recheios", ou de um capital ideativo, como dizem os psiquiatras, a Educação é o instaimento. Uma Educação que leve em conta, porém, essa articulação entre palavra e significante, entre palavra e emergência do sujeito. Uma Educação Terapêutica. Que ofereça palavras e produções da cultura, para permitir que daí advenha algo de significante, de simbólico. Para que um sujeito possa vir a se dizer, pre- cisará de palavras, ou da música, ou do gesto na dança ou no teatro. Uma Educação tradicional, que busque apenas a introdução de palavras, e que pense nelas apenas em seu valor instrumental, não é suficiente. Caso fos- se, bastaria colocar as crianças psicóticas em escolas, e a reversão espontânea de seu quadro estaria garantida. Este é aliás um erro muito freqüente entre pais e psiquiatras: "esperemos que melhore, vamos colocá-lo em uma escola e tudo poderá melhorar", dizem às vezes. Transmitir o conhecimento, desta perspectiva, abre por exemplo uma chance para a quebra das estereotipias, que são emergências de fala "decaídas" por falta de lastro significante. São ruí- nas de antigos castelos, como diz Laz- nick (1997). Ao contrário, dar treino é supor que a criança precisa apenas do valor instrumental das palavras e das ações. Da perspectiva da psicanálise, oferece-se o conhecimento não apenas em sua dimensão instrumental, mas como possibilidade de que este seja uti- lizado para separá-lo do gozo intrusivo do Outro. É um instrumento que cons- trói o sujeito, e não apenas uma ferra- menta para o Eu. Dois exemplos de práticas orien- tadas pela Educação Terapêutica: 1. A chamada é uma Chamada Atualmente, a proposta educacio- nal da Pré-Escola Terapêutica Lugar de Vida está muito mais próxima da de uma escola do que no início. Busca-se com isso ir introduzindo a criança ao universo escolar. Assim, todos os dias faz-se a chamada. Suzana entrou no Lugar de Vida há um ano, e trouxe consigo um hábito
  • 8. estranho: costumava desenhar em sua própria testa um rabisco, uma cobrinha, uma marca. Fazia também desenhos que consistiam em bolas umas dentro das outras, sem muita ordem. A profes- sora^ reconheceu nesse desenho, um dia, uma menina: a bola maior era o rosto, e as menores os olhos, a boca. "Uma menina!", exclamou jubilosa- mente aquela professora. Suzana incor- porou então essa significação, e passou a desenhar o rosto com mais detalhes. E incluiu, pouco mais tarde, nesse desen- ho de menina, sua marca registrada: a cobrinha na testa. Uma inscrição origi- nária ganhou sua extensão no signifi- cante "menina". Na chamada, as crianças são con- vidadas a "assinar" seu nome ao lado do que já está escrito em letra de forma. Suzana, de início, mal prestava atenção a essa solicitação. Quando sua cobrinha surgiu na testa do desenho, passou a "assinar-se" com ela. Ao escrever, vai soletrando: Su-za-na. Vê-se com isso que a chamada pode funcionar como uma Chamada, isto é, como um apelo ao sujeito, como uma oferta de produção de algo que é mais do que um nome vindo designar um objeto do mundo. Não se trata ape- nas de ensinar a uma criança seu nome e modo de escrevê-lo, esperando que ela o utilize tão somente em sua comu- nicação. Aqui, espera-se que o nome represente o sujeito, e se torne um sig- nificante, singularizando-o. Ou seja, que o designe como único personagem a portá-lo. A este apelo, Suzana ouviu, assinando-se com o que, embora fora do código, a representava, a marcava, conferindo-lhe um mínimo de existên- cia no mundo. Está a um passo de cur- var-se ao código da língua, pois agora escreve letras ao lado de seu nome^. 2. Permanências e transformações. Fábio olhava a professora escre- ver, embaixo da produção de Suzana, o nome dela. Excitou-se, e chamou, com os sons de voz pouco claros que lhe são característicos, essa mesma profes- sora. Em seguida, tomou da caneta que ela segurava, bateu com a mão em seu próprio peito, em um gesto típico de quem quer dizer "eu", e depois fez ra- biscos parecidos com os de uma assina- tura abaixo, agora, de sua própria pro- dução de desenho. Reconheceu-se. "Um ser que pode ler sua marca, isto basta para que ele possa se reinscrever noutra parte além dali onde a gravou", afirmou Lacan^. Este movimento de Fábio vem na esteira de algumas sema- nas de trabalho em que se falou muito de marcas, daquilo que permanece e do que se transforma, e do que torna próprio o que cada criança faz. Partiu-se da Psiquiatria Educativa, chegou-se à Educação Terapêutica, que é o seu inverso. A Educação não tem mais, aqui, o fim de adaptar a criança a um meio social, e de tornar o convívio com ela suportável. Tem a função de dar à criança um lugar de sujeito. De fato, qualquer educação que se preze deveria estar levando isso em conta. E quando ela obtém êxito, o que ocorreu foi justamente o enodamento de um sujeito com a pura palavra ali veiculada, ainda que o educador não tivesse isso em mente. Mas para as crianças psicóti- cas, levar isso em conta é necessário e crucial, e é isto que a torna terapêutica. Agora, podemos voltar a falar em inserção escolar. Que será naturalmente difícil, pois essas crianças carregarão as marcas de suas falhas de inscrição no registro simbólico. Seu tratamento não terminou, mas já podem sentar-se, já não se mordem com freqüência, podem ouvir o apelo do social, e se situam, de forma mínima, neste campo. Sua entra- da na escola deverá, então, ser pilotada. Um trabalho junto à escola, e ao pro- fessor que desejar recebê-la, precisará ser construído. •
  • 9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARIES, Philippe (1981). História social da cri- ança e da família. Rio de Janeiro: Zahar [19731. AULAGNIER-SPAIRANI, Piera (1967). Le désir de savoir dans son rapport à la transgres- sion. L'inconscient, n.l, janeiro-março 1967. CLASTRES, Guy (1991). A criança no adulto. In: MILLER, J. A criança no discurso analítico. Rio de Janeiro: Zahar, p. 136- 140. FREUD, S. (1973a). Projecto de una psicolo- gia para neurologos. In: Obras completas, v.l., Madrid: Biblioteca Nueva, p. 209- 276. [ 18951. FREUD, S. (1973 b). El block maravilloso. In: Obras completas, v.3, Madrid: Biblioteca Nueva, p. 2808-2811. [1924]. FREUD, S. (1973c). La negación. In: Obras completas, v.3, Madrid: Biblioteca Nueva, p. 2884-2886. [19251. FREUD, S. (1973d). El yo y el ello. In: Obras completas, v.3, Madrid: Biblioteca Nueva, p. 2701-2728. [19231. FREUD, S. (1973e). Una teoria sexual y otros ensayos. In: Obras completas, v.2, Madrid: Biblioteca Nueva, p. 1169-1237. [19051. FREUD, S. (19730. Un recuerdo infantil de Leonardo da Vinci. In: Obras completas, v.2, Madrid: Biblioteca Nueva, p. 1577- 1619. [1910]. ITARD, Jean (1994). Victor de I'Aveyron. Paris: Charlemagne, [1801]. JERUSALINSKY, Alfredo (1996). Para uma clínica psicanalítica das psicoses. Estilos da Clínica, anol, n.l, p. 146-163. LACAN, Jacques (1966). Kant com Sade. In: Écrits. Paris, Seuil. LAZNIK-PENOT, M.-Christine (1997). Rumo à palavra. São Paulo, Escuta. MANNONI, Maud (1977). Educação impossí- vel. Rio de Janeiro, Zahar. PATTO, M. Helena Souza (1990). A produção do fracasso escolar: histórias de submissão e rebeldia. São Paulo: Queiroz. POSTEL, J. e QUÉTEL, C. (org.) (1987). Historia de la psiquiatria. Cidade do México, Fundo de Cultura Econômica NOTAS 1 A respeito da história das abordagens psicanalíticas das psicoses infantis, ver LEDOUX, Michel H. Conceptions psychanalytiques de la psychose infantile. Paris, Presses Universitaires de France, 1984. ^ Vejam-se as conseqüências de não ter tais cuidados. Tomem-se, por exemplo, as experiên- cias européias reportadas em um Colóquio Internacional realizado na Noruega sobre esse tema (Integração de jovens deficientes no ensino obrigatório na Noruega, 1983). Ali se descrevem as ten- tativas feitas no sentido de manter em classes regulares do ensino público algumas crianças autis- tas e psicóticas: elas terminaram, depois de se verificar que as escolas acabavam criando classes especiais, em que havia apenas uma criança -exatamente a psicótica ou a autista, com quem o con- vívio se tornara insuportável. 3 Ver o artigo de Jean-Claude Filloux neste mesmo número. 4 As professoras, no Lugar de Vida, são na verdade psicólogas com formação psicanalítica, já que a Educação Terapêutica exige um tipo de escuta que o professor especializado não está for- mado para ter. 5 O caso de Suzana e seu acesso à escrita deverá ser abordado em um artigo no próximo número desta revista 6 Citado por ALLOUCH, Jean. Letra a letra. Rio de Janeiro, Campo Matêmico, 1995, p. 11.