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Mirela Berger – Emile Durkheim 1
As formas Elementares da Vida Religiosa
Émile Durkheim – 1912
- Antepenúltimo livro de Durkheim (ele morre em 1917 - em 15/11).
- É considerado tanto por antropólogos quanto por sociólogos como o
melhor entre os 3 grandes livros de Durkheim (os outros dois são sua tese
de doutorado A divisão do trabalho social (1893) e o Suicídio (1897)). Eu
particularmente não deixaria de fora o livro As regras do método
sociológico (1895).
- O livro As formas Elementares da Vida Religiosa é curioso e
instigante e eu resolvi inseri-lo no programa por 4 motivos centrais: 1)
porque ele está na fronteira entre sociologia e antropologia, mostrando
como estas duas ciências podem dialogar, 2) porque os três grandes autores
de ruptura com a teoria evolucionista do século XIX são Émile Durkheim,
Bronislaw Malinowski e Franz Boas, 3) Porque Durkheim inaugura com
este livro uma linha muito importante e atuante até hoje que é a sociologia
da religião, 4) Porque sem este livro, certamente os trabalhos de Claude
Lévi-Strauss não existiriam.
- Há uma tendência de se desvalorizar alguns autores centrais do
século XIX, entre eles Durkheim e mesmo Charles Darwin, os
evolucionistas sociais, tais como Tylor, Morgan, Frazer, Karl Marx e
Sigmund Freud, mas embora estes autores tenham algumas teorias
polêmicas, eles foram, sem dúvida nenhuma, os pilares sobre os quais a
biologia, a economia, a psicologia, a sociologia e a antropologia se
fundaram e são o que são hoje. Estas pessoas não se tornaram autores
clássicos á toa e devem ser resgatados.
- objetivo central do livro é elaborar uma teoria geral da religião,
com base na análise das instituições religiosas mais simples e mais
primitivas. Durkheim insiste aqui na sua idéia, que já vimos em todas as
suas outras obras, de que é possível apreender a essência de um fenômeno
social observando suas formas mais elementares.
- Volto a chamar a atenção de vocês para o fato de que o rigor
metodológico de Durkheim deveria servir de inspiração para todos nós.
Durkheim sempre trabalha do mesmo modo, como eu já comentei com
vocês quando analisamos a obra O suicídio. O próprio índice é revelador
disto:
• Ele inicia sempre fazendo uma revisão bibliográfica de tudo que foi
escrito sobre o tema: isto Mostra erudição: conhecimento
espantoso dos temas que analisa,
inúmeras citações sobre ele, científicas ou não
Fundamenta cientificamente o que ele diz
• Ele formula novas hipóteses e concepções, analisando os dados
empíricos e retomando em seguida a discussão teórica do problema, de
modo a construir de modo sociológico um problema de investigação.
Mirela Berger – Emile Durkheim 2
• Ele testa uma por uma suas próprias hipóteses e concepções. Faz
isto com todos os tópicos do livro, de modo circular e erudito.
• Preocupa-se com a construção de conceitos gerais, porque para ele,
se os conceitos nascem da análise da realidade social em seu conjunto, não
tem como não serem gerais.
• Procura despir-se de pré-noções e só formular concepções gerais
depois de ter feito um rigoroso exame dos dados. Procura assim romper
tanto com o apriorismo (raciocínio por hipóteses, sem considerar os fatos
reais) quanto com o empirismo (que pelo contrário, trata-se de um sistema
filosófico que nega a existência de axiomas como princípios de análise,
partindo sempre da experiência e da observação da rotina).
• Ele procura encontrar uma saída para isso pela ciência e não pela
filosofia, tentando unir categorias determinadas a priori com as categorias
produzidas socialmente (exatamente como Lévi-Strauss vai fazer).
- Há 3 grandes eixos de análise no livro: 1) descrição e análise
detalhada do sistema de clãs e totemismo de certas tribos australianas; 2)
tentativa de compreensão da natureza da religião e de sua importância para
a vida social; 3) Passos iniciais da construção de uma teoria do
conhecimento, quando ele vai proceder uma interpretação sociológica das
formas de pensamento humano.
Parte I - Descrição e análise detalhada do sistema de clãs e totemismo
de certas tribos australianas
Introdução e capítulo 1
- No primeiro parágrafo ele diz, já colocando o problema que o inspira:
"Neste livro, propomo-nos estudar a religião mais primitiva e mais
simples que se conheça atualmente, analisá-la e tentar explicá-la.
Dizemos de um sistema religioso que é o mais primitivo que nos é dado
observar quando preenche ás duas condições seguintes: em primeiro lugar, é
preciso que se encontre em sociedade cuja organização não seja
ultrapassada por nenhuma outra em simplicidade, além disso, é preciso que
seja possível explicá-lo sem' fazer interferir nenhum elemento tomado de
religião anterior.
Esforçar-nos-emos para descrever a economia desse sistema com a
exatidão e a fidelidade que aí aplicaria etnógrafo ou historiador. Mas a
nossa tarefa não se limitará a isso. Os problemas que a sociologia se coloca
são diferentes daqueles da história ou da etnografia. Ela não procura
Mas é claro que é impossível levar este rigor metodológico ás últimas
conseqüências, pois há todo um conjunto de pressupostos que orienta sua análise,
até porque ele já está escrevendo no final de sua vida, então já tem suas
conclusões. A distinção entre sagrado e profano, por exemplo, só aparece no final
do livro 1, mas obviamente já estava presente desde o início
Mirela Berger – Emile Durkheim 3
conhecer as formas antigas da civilização apenas no intuito de conhecê-las
ou de reconstruí-las. Mas, como toda ciência positiva, antes de
Mirela Berger – Emile Durkheim 4
tudo ela tem como objetivo explicar uma realidade atual, próxima de
nós, por conseguinte, capaz de tocar nossas idéias e nossos atos: essa
realidade é o Homem e, mais especialmente, o Homem de hoje, porque
outro não há que estejamos mais interessados em conhecer bem. Portanto, a
religião antiguíssima de que vamos tratar aqui não será estudada apenas
pelo prazer de contar as extravagâncias e as singularidades que encerra. Se
a tomamos como objeto da nossa pesquisa, é porque nos pareceu mais apta
que qualquer outra para fazer compreender a natureza religiosa do Homem,
ou seja, a nos revelar um aspecto essencial e permanente da
hurnanidade."'(Durkheim, 1912:29).
- Esta citação um tanto quanto longa nos permite perceber quatro
pontos importantes que fazem a singularidade de Durkheim.
1) o primeiro refere-se a necessidade de se estudar a religião mais
simples e primitiva que se conheça atualmente. Durkheim dirá que isso é
necessário para se compreender a essência da religião. A idéia é que nas
religiões mais avançadas como, por exemplo, o cristianismo, a religião
aparece como um amálgama de crenças e ritos muitas vezes emprestados de
diversas religiões, tornando desta forma muito difícil a apreensão do que é
característico da religião.
A expressão "religião mais simples e primitiva" nos lembra o
evolucionismo, mas o sentido á ela empregado por Durkheim é diferente:
trata-se de olhar para estas religiões porque elas são mais simples do ponto
de vista da sua organização, e assim, mais passíveis de retratarem as
necessidades básicas e gerais da humanidade que aparecem confusas nas
religiões mais atuais.
2) A forma como ele coloca a questão já nos leva a um outro ponto,
que é a importância que Durkheim vê em delimitar o campo específico da
sociologia. Não podemos esquecer que é no século XIX que a sociologia
começa a ser pensada como uma ciência social e positiva, e Durkheim é um
dos percursores desta emergência da sociologia enquanto ciência. É o
momento muito específico de constituição de um saber que ainda que
inspirado pelo modelo das ciências naturais, não se confunde com ele.
Antes mesmo do livro As Formas, Durkheim dizia que "Ela [a Sociologia]
tem um objeto claramente definido e um método para estudá-lo. O objeto
são os fatos sociais, o método é a experimentação e a observação indutiva,
em outras palavras, o método comparativo." (Rodrigues, 1981:19).
3) A ênfase da sociologia enquanto ciência positiva nos leva á dois
outros pontos: Durkheim afasta-se do caminho traçado pelos evolucionistas
na medida em que se propõe olhar para "uma realidade próxima de
Mirela Berger – Emile Durkheim 5
nós [que é o Homem]", mas fazê-lo procurando conhecer o Homem como ele é
hoje. O Homem primitivo não é mais o objeto de análise, como ocorre com os
evolucionistas, mas sim instrumento de conhecimento de uma realidade mais
geral que é a religião.
O primitivo, para Durkheim, é menos um objeto da pesquisa e mais
um caminho metodológico para se chegar ao que verdadeiramente interessa
a Durkheim, que é o papel da religião.
Aqui reside, ao meu ver, o ponto central desta obra de Durkheim, que
é a compreensão da religião enquanto um aspecto "essencial e
permanente da humanidade". Vemos aqui a procura por leis gerais, tão
caras para marcarem o caráter objetivo e científico desta ciência que
começa a ser constituída. Muito semelhante á teoria positivista: o geral
garante o caráter de científico, de positivo.
A orientação seguida por Durkheim não caminha no sentido de
descobrir e ressaltar a especificidade de cada sistema religioso (como é o
caso de Franz Boas), e sim, na premissa contrária: ele acredita que a
religião seja uma característica GERAL da sociedade humana, ou seja,
que está na base da constituição do homem enquanto tal.
É, portanto, possível (e desejável) empreender uma TEORIA GERAL
da religião: "Se, com efeito, é útil saber em que consiste esta ou aquela
religião particular, mais importante ainda é pesquisar o que vem a ser a
religião em geral ( ... ) Já que todas as religiões são comparáveis, já que
são todas espécies do mesmo gênero, necessariamente há elementos
essenciais que lhes são comuns ( ... ) Na base de todos os sistemas de
crenças e de todos os cultos deve, necessariamente, haver certo número
de representações fundamentais e de atitudes rituais que, apesar da
diversidade das formas que umas e outras puderam assumir, apresentem,
por toda parte, o mesmo. significado objetivo e também, por toda a parte,
exerçam as mesmas funções. São estes elementos permanentes que
constituem o que existe de eterno e de humano na religião, formam todo o
conteúdo objetivo da idéia que se exprime quando se fala da religião em
geral. Como, pois, chegar a atingi-los." (Durkheim, 1912:33).
4) É justamente esta noção de que existe um certo número de
representações fundamentais que são próprias do pensamento e do
comportamento humano que vão orientar as críticas que Durkheim dirige
aos outros teóricos que se debruçaram sobre a religião.
Durkheim procura afastar-se das teorias anteriores sobre a religião, que
ao seu ver, dissolvem o seu próprio objeto - a religião - ao pretendê-lo
como ilusão coletiva ou como uma das formas possíveis de pensamento
pré-cientifico. Embora algumas de suas críticas aos pensadores anteriores
não possuam uma fundamentação muito sólida, Durkheim inova ao
pretender explicar de fato as religiões, e principalmente por fazê-lo
calcado na eficácia simbólica e social destas crenças: "( ... ) postulado
essencial da sociologia é que
Mirela Berger – Emile Durkheim 6
uma instituição humana não poderia repousar sobre o erro ou a mentira,
sem isso ela não conseguiria durar. Se não tivesse por base a natureza das coisas,
encontraria nas coisas resistências que não conseguiria vencer. Portanto, quando
enfrentamos o estudo das religiões primitivas já temos a certeza de que se
prendem ao real e que o exprimem; veremos este princípio voltar continuamente
no decorrer das análises e das discussões que se seguirão, e o que condenaremos
nas escolas das aqui vamos nos afastar é precisamente tê-lo ignorado( ... ) sob o
símbolo, é preciso saber atingir a realidade que representa e que lhe dá sua
significação verdadeira. Os ritos mais bárbaros e mais extravagantes, os mitos
mais bárbaros traduzem alguma necessidade humana, algum aspecto da vida,
quer individual, quer social. As razões que o fiel dá a si próprio para justificá-las
podem ser, e são realmente falsas, as razões verdadeiras existem, não obstante,
cabe á ciência descobri-las.
Não há, pois, religiões que sejam falsas. Todas são verdadeiras á
sua maneira: todas respondem, ainda que de maneiras diferentes, a
determinadas condições da vida humana ( ... ) Portanto, se nos voltamos
para as religiões primitivas não é com a intenção de depreciar a religião em
geral, porque estas religiões não são menos respeitáveis que as outras. Elas
respondem as mesmas necessidades, desempenham o mesmo papel,
dependem das mesmas causas; portanto, podem perfeitamente servir para
manifestar a natureza da vida religiosa e, por conseguinte, para resolver o
problema que desejamos tratar." (Idem, pg.31).
- Ele deixa claro inúmeras vezes que a religião não é um delírio.
- Para Durkheim, ao contrário de Tylor, as religiões não podem ser
consideradas fontes de engano que serão superadas pela ciência, ele afirma,
na conclusão do livro As Formas Elementares da Vida Religiosa que a
verdadeira função da religião é nos ajudar a viver melhor. Além do mais,
para ele as religiões são obras da sociedade e a expressam, estando assim
na base de qualquer pensamento, inclusive o científico: “Estabelecemos
ao longo dela [da obra] que as categorias fundamentais do pensamento e,
por conseguinte, da ciência, têm origens religiosas (...) as regras da
moral e do direito foram por muito tempo indistintas das prescrições
rituais. Pode-se portanto dizer que quase todas as instituições nasceram da
religião (...) Se a religião engendrou tudo o que há de essencial na
sociedade, é que a idéia da sociedade é a alma da religião”.
- O que está em. jogo aqui e que ficará claro no decorrer da obra,
principalmente quando ele fala dos "churinga", é a ênfase na noção de
representação. Vale á pena nos determos um pouco sobre este tema
importantíssimo da obra de Durkheim, mesmo que para isso tenhamos que
citar um trecho do capítulo IV, onde ele discute a origem das crenças
totêmicas. Ele diz: "Eis no que consiste realmente um totem: é
simplesmente a força material sobre a qual se REPRESENTAM para a
imaginação, através de toda sorte de fatos heterogêneos, essa substância
imaterial, essa energia difusa, único objeto do culto ( ... ) E assim o
universo, tal como o totemismo o concebe, é atravessado, animado por certo
Mirela Berger – Emile Durkheim 7
número de forças que a imaginação REPRESENTA sobre a forma de
princípios tomados de empréstimo, com poucas exceções, ao reino animal e
ao reino vegetal." (Idem, pg.240).
Vemos que Durkheim opera ao nível do simbolismo, e neste ponto,
questiono a distinção comummente feita nos cursos, que diz que Durkheim
trabalha com a base social do simbolismo, enquanto que L.Strauss trabalha
com o fundamento simbólico da vida social. Com certeza, Durkheim
enfatiza a base
Mirela Berger – Emile Durkheim 8
SOCIAL da vida simbólica, mas acredito que o contrário também é verdadeiro:
Durkheim diz que a sociedade desperta em nós algo de sagrado, e nesta medida,
aponta para a dimensão simbólica da vida social(2).
De toda forma, vemos que neste ponto da obra de Durkheim já
podemos apontar para uma incipiente noção de estrutura elementar, que
L.Strauss retomará em seus trabalhos. Certamente, L. Strauss trabalhará de
forma diferente com esta questão, mas o que procuro apontar aqui é que é
em Durkheim que estão muitas das concepções que posteriormente servirão
com base da teoria Levistraussiana.
Aliás, a influência que Durkheim exerce sobre outros autores é
invejável. Não será sentida apenas por L. Strauss: quando Durkheim refere-
se á representações e atitudes que em toda parte exercem as mesmas
funções, lembramo-nos de quem? De Malinowski.
Isto ficar ainda mais visível quando Durkheim diz que o estudo que
ele empreende é "um modo de retomar, mas em condições diferentes, o
velho problema da origem das religiões". Ele prossegue dizendo: "É claro
que, se por origem entendemos um primeiro começo absoluto, a questão
nada tem de científica e deve ser resolutamente afastada. Não existe um
momento radical em que a religião tenha começado a existir e não se trata
de encontrar um meio que permita que nos transportemos até ali pelo
pensamento. Como toda instituição humana, a religião não começa em
parte alguma ( ... ) O problema que nos colocamos é bem outro
o que queremos é encontrar um
meio de discernir as causas, sempre
presentes de que dependem as formas
mais essenciais do pensamento e da
prática religiosa." (Idem, pg.36).
Mirela Berger – Emile Durkheim 9
Aqui, o debate que está sendo travado é com o evolucionismo, que
acreditava ser possível encontrar entre os primitivos, que estariam num
estágio inferior ao da civilização, a origem (em termos temporais) do
fenômeno religioso. Mas embora Durkheim tenha como interlocutor o
evolucionismo, o problema da origem está recolocado para Dur'kheim em
termos da busca do que é fundamental, básico e permanente no conjunto
das religiões. Coloca-se aqui o problema da NATUREZA do fenômeno
religioso, natureza esta que possui Razão, causa e função específicas.
- Até aqui procurei pinçar alguns pontos importantes que Durkheim
enfatiza na primeira parte do texto dedicada ao "Objeto da Pesquisa". De
forma resumida, quase esquemática, são eles: 1) necessidade de descobrir a
essência da religião; 2) delimitação do campo da sociologia em oposição á
etnografia e a história. A sociologia enquanto ciência positiva está
interessada na procura de leis gerais; 3) Crítica ao evolucionismo, primeiro
no sentido de que a Religião passa a ser OBJETO de estudo e o Homem
primitivo apenas instrumento que servira para revelar aspectos essenciais da
religião (agora o Homem primitivo não é mais o objeto de estudo, como
ocorria com os evolucionistas); e segundo, porque Durkheim recolocará o
problema da origem das religiões buscando não sua gênese evolutiva, mas
sim os significados e funções á que elas respondem; 4) Certeza de que se
pode construir uma teoria geral da religião; 5) Idéia incipiente de estrutura;
6) base para as discussões entre ação e representação, presentes no decorrer
de toda obra.
II) Tentativa de compreensão da natureza da religião e de sua
importância para a vida social
Na segunda parte do texto, Durkheim vai enfatizar três outros pontos
cruciais: 1) A Religião como um aspecto constitutivo do espírito humano e
existência de categorias básicas do entendimento que nasceram da religião;
2) Religião como coisa eminentemente social; 3) polêmica entre o
apriorismo e o empiricismo e, principalmente, como a teoria do
conhecimento que Durkheim se propõe desenvolver pode unificar de forma
satisfatória estas duas correntes.
Vamos a eles.
Durkheim enfatiza que a pesquisa por ele empreendida não interessa
apenas aos estudos sobre a religião, mas está na base de uma teoria de
conhecimento. Ele diz que o fenômeno religioso ultrapassa o círculo das
idéias propriamente religiosas, tocando assim em problemas de ordem mais
geral, comummente apenas debatidos por filósofos: "Sabemos, desde há
muito tempo, que os primeiros sistemas de representação que o homem
produzir no mundo e de si mesmo são de origem religiosa. Não há religião
que não seja, ao mesmo tempo, a cosmologia e a especulação sobre o
divino. Se a filosofia e as ciências nasceram da religião é porque a própria
religião fazia às vezes de ciência e de filosofia. Mas o que foi menos
observado é que ela não se limitou a enriquecer, com certo número de
idéias, um espírito previamente formado; ela contribuiu para formá-lo. Os
Homens não lhe deveram apenas grande parte da matéria dos seus
Mirela Berger – Emile Durkheim 10
conhecimentos, mas a forma pela qual estes conhecimentos foram
elaborados." (Idem, pg.38).
Mirela Berger – Emile Durkheim 11
- o que Durkheim coloca aqui de forma magistral é que a
religião não é apenas o reflexo de uma visão de mundo, e sim, o
elemento essencial desta apreensão, recorte e classificação do real.
-Durkheim chama a atenção para o fato de que nosso
pensamento tem como base certas categorias do entendimento: "Na
raiz dos nossos julgamentos existe um certo número de noções
essenciais que dominam toda nossa vida intelectual; é as que os
filósofos, desde Aristóteles, denominam categorias do intelecto:
noções de tempo, de espaço, de gênero,( ... ) etc. Elas correspondem
às propriedades mais essenciais das coisas. São como que molduras
sólidas que engastam o pensamento que parecem não poder
desvencilhar- se delas sem se destruir; pois não parece que podemos
pensar objetos que não estejam no tempo ou no espaço
(...) Ora, quando analisamos metodicamente as crenças religiosas
primitivas, encontramos, naturalmente, as principais destas categorias.
Nasceram na religião e da religião; são produtos do pensamento
religioso."
(Idem, ibidem).
Em seguida, Dukheim continua a tecer sua tese central, e não só
isso, a expõe de forma clara: "A conclusão geral deste livro é que a
RELIGIÃO é coisa eminentemente social. As representações
religiosas são representações coletivas; os ritos são maneiras de
agir que surgem unicamente no seio dos grupos reunidos e que se
destinam a suscitar, a manter, ou a refazer certos estados mentais
destes grupos. Mas então, se as categorias são de origem religiosa,
devem participar da natureza comum á todos os fatos religiosos:
também elas seriam coisas sociais, produto do pensamento coletivo"
(Idem, ibidem).
- O que Durkheim procura mostrar é que estas categorias
básicas de apreensão do real tem por base pontos de referências
que não são produzidos individualmente, muito pelo contrário, são
sociais e coletivos, porque tomados da vida social. Ele afirma que a
organização do tempo e do espaço (categorias de entendimento
essenciais ao funcionamento da vida social) são reflexos e produtos da
organização da sociedade: é pelo fato de que a sociedade existe que é
possível pensar as categorias de tempo e espaço, que nada mais são do
que classificações sociais.
- pg 74: Outro ponto central que ao contrário dos evolucionistas,
que focavam mais na magia, considerada mais individual do que
coletiva, Durkheim foca na religião e a associa à idéia de igreja, mais
coletiva. Ele diz que a religião é coletiva porque a crença é coletiva,
Mirela Berger – Emile Durkheim 12
chamando atenção para as dimensões SOCIAIS do fenômeno
religioso.
- Um aspecto importantíssimo é que Durkheim percebe a religião
como um SISTEMA, ou seja, um todo formado por partes. Ele chega
á esta idéia estabelecendo a relação entre a crença e o rito:
- pg 68: “Os fenômenos religiosos ordenam-se naturalmente em
duas categorias fundamentais: as crenças e os ritos. As primeiras são
estados de opinião, consistem em representações; e os segundos, são
modos de ação determinados”
↓
Há aqui um problema que Durkheim não resolve, pois ele se
contradiz: num momento, ele diz que só se pode definir o rito depois
de ter definido a crença → o rito pela crença.
Mas não é isso que ele faz, na obra toda ele explica a crença pelo
rito, afirmando várias vezes que a experiência religiosa só pode nascer
do rito.
- A constatação da religião enquanto um sistema está presa á uma
outra idéia fundamental, a de que as crenças religiosas requerem uma
classificação. Portanto, o sistema de crenças é antes de mais nada
um sistema classificatório cuja dicotomia básica é a distinção
entre SAGRADO E PROFANO.
- PG 72: “O aspecto característico do fenômeno religioso é o fato
de que ele pressupõe uma divisão bipartida do universo conhecido em
dois gêneros que compreendem tudo o que existe, mas que se excluem
radicalmente. As coisas sagradas são aquelas que os interditos
protegem e isolam; as coisas profanas aquelas as quais os interditos se
aplicam e que devem permanecer à distância das primeiras”
- Tendo definido o que é a religião de modo geral ele vai então
analisar o que seria a religião mais elementar, que para ele é o
totemismo.
- Ele começa tudo de novo: testa os elementos do que ele entende
por religião, tenta confirmar a hipótese por dados e teorias. Para
confirmar, ele procura no totemismo os elementos que ele considera
básicos na religião e concentra-se nas crenças e na distinção entre
sagrado e profano.
- pg 96/97 ele começa a esboçar as noções de culto e depois de
Mana.
Mirela Berger – Emile Durkheim 13
As Crenças propriamente Totêmicas – caps. I, II, III (pg 139
a 297)
- Começa fazendo uma crítica sutil á Morgan, pois ao contrário
dele, não acredita que o parentesco seja consaguíneo. As pessoas
consideram-se parentes:
140: “os indivíduos que compõem o clã consideram-se unidos
por laços de parentesco, mas que o é de natureza muito especial. Este
parentesco não vem do fato de manterem entre si relações definidas de
consaguinidade, são parentes pelo simples fato de terem igual nome
(...) e se dizemos que se vêem como membros de uma mesma família
é porque reconhecem, uns para com os outros, deveres idênticos aos
que sempre couberam aos parentes: deveres de assistência, de
vingança, de luto, obrigação de não casar entre si”.
- pg 139: TOTEM como Nome
↓ Emblema
Existe um SISTEMA por trás: é o sistema totêmico que
importa.
- o significado tem um significante (que em muitas vezes, é o
corpo). Este significado define o grupo e quais são os seus membros.
- Para ele, a religião totêmica está presa á organização social, o
totemismo está casado com a organização social. Por isso que é tão
importante o nome do clã.
-pg 159:onde está realmente o sagrado? O sagrado está em vários
lugares, mas principalmente nos churinga. O importante não é o
homem, o animal ou a planta, mas sim a representação deles num
objeto diverso deles
“Estes fatos provam que se o australiano é tão fortemente
inclinado a figurar o seu totem, não é para ter sobre seus olhos um
retrato que renove perpetuamente a sua sensação; mas é
simplesmente porque sente a necessidade de representar tal idéia por
meio de um sistema material, exterior, seja qual for, aliás, este sinal”.
- O totem é uma representação: é a manifestação material de
uma imagem mental.
- Onde Durkheim peca é na explicação do porque estas plantas
e/ou estes animais, só Lévi-Strauss consegue explicar isto, através das
estruturas mentais inconscientes.
- Ele começa a retomar a noção de mana, enquanto uma força
sagrada que se deposita em homens, palavras e plantas.
-240/241: “Eis no que consiste realmente um totem: é
simplesmente a força material sobre a qual se representam para a
imaginação, através de toda a espécie de seres heterogêneos, essa
Mirela Berger – Emile Durkheim 14
substância imaterial, esta energia difusa, único objeto de culto (...) E
assim o universo, tal como o totemismo o concebe, é atravessado,
animado por um certo número de forças que a imaginação representa
sob a forma de princípios tomados de empréstimo, com poucas
exceções, ao reino animal e ao reino vegetal: elas são tantas quantos
são os clãs das tribos e cada uma delas circula através de determinadas
categorias de coisas das quais consistem a essência e o princípio
vital”.
A origem das crenças totêmicas
- começa um outro lado da análise a partir da pg 269.
- A pergunta que ele quer responder é Qual a natureza da experiência
que leva á noção de sagrado como força?
- Mauss também trabalhará com isso.
- A experiência religiosa é na verdade a EXPERIÊNCIA SOCIAL. É a
exaltação coletiva que permeia a realização do rito.
- Esta experiência social está fora
acima dos indivíduos
dentro
- Assim como a consciência coletiva, a exaltação coletiva é uma espécie
particular da soma das exaltações.
- Esta idéia de que o social é ao mesmo tempo algo exterior e interior ao
indivíduo permeia toda obra de Durkheim, desde As regras do método
sociológico (1895).
- Percepção de uma coletividade que transcende o homem: A sociedade
desperta em nós algo de sagrado
-

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  • 1. Mirela Berger – Emile Durkheim 1 As formas Elementares da Vida Religiosa Émile Durkheim – 1912 - Antepenúltimo livro de Durkheim (ele morre em 1917 - em 15/11). - É considerado tanto por antropólogos quanto por sociólogos como o melhor entre os 3 grandes livros de Durkheim (os outros dois são sua tese de doutorado A divisão do trabalho social (1893) e o Suicídio (1897)). Eu particularmente não deixaria de fora o livro As regras do método sociológico (1895). - O livro As formas Elementares da Vida Religiosa é curioso e instigante e eu resolvi inseri-lo no programa por 4 motivos centrais: 1) porque ele está na fronteira entre sociologia e antropologia, mostrando como estas duas ciências podem dialogar, 2) porque os três grandes autores de ruptura com a teoria evolucionista do século XIX são Émile Durkheim, Bronislaw Malinowski e Franz Boas, 3) Porque Durkheim inaugura com este livro uma linha muito importante e atuante até hoje que é a sociologia da religião, 4) Porque sem este livro, certamente os trabalhos de Claude Lévi-Strauss não existiriam. - Há uma tendência de se desvalorizar alguns autores centrais do século XIX, entre eles Durkheim e mesmo Charles Darwin, os evolucionistas sociais, tais como Tylor, Morgan, Frazer, Karl Marx e Sigmund Freud, mas embora estes autores tenham algumas teorias polêmicas, eles foram, sem dúvida nenhuma, os pilares sobre os quais a biologia, a economia, a psicologia, a sociologia e a antropologia se fundaram e são o que são hoje. Estas pessoas não se tornaram autores clássicos á toa e devem ser resgatados. - objetivo central do livro é elaborar uma teoria geral da religião, com base na análise das instituições religiosas mais simples e mais primitivas. Durkheim insiste aqui na sua idéia, que já vimos em todas as suas outras obras, de que é possível apreender a essência de um fenômeno social observando suas formas mais elementares. - Volto a chamar a atenção de vocês para o fato de que o rigor metodológico de Durkheim deveria servir de inspiração para todos nós. Durkheim sempre trabalha do mesmo modo, como eu já comentei com vocês quando analisamos a obra O suicídio. O próprio índice é revelador disto: • Ele inicia sempre fazendo uma revisão bibliográfica de tudo que foi escrito sobre o tema: isto Mostra erudição: conhecimento espantoso dos temas que analisa, inúmeras citações sobre ele, científicas ou não Fundamenta cientificamente o que ele diz • Ele formula novas hipóteses e concepções, analisando os dados empíricos e retomando em seguida a discussão teórica do problema, de modo a construir de modo sociológico um problema de investigação.
  • 2. Mirela Berger – Emile Durkheim 2 • Ele testa uma por uma suas próprias hipóteses e concepções. Faz isto com todos os tópicos do livro, de modo circular e erudito. • Preocupa-se com a construção de conceitos gerais, porque para ele, se os conceitos nascem da análise da realidade social em seu conjunto, não tem como não serem gerais. • Procura despir-se de pré-noções e só formular concepções gerais depois de ter feito um rigoroso exame dos dados. Procura assim romper tanto com o apriorismo (raciocínio por hipóteses, sem considerar os fatos reais) quanto com o empirismo (que pelo contrário, trata-se de um sistema filosófico que nega a existência de axiomas como princípios de análise, partindo sempre da experiência e da observação da rotina). • Ele procura encontrar uma saída para isso pela ciência e não pela filosofia, tentando unir categorias determinadas a priori com as categorias produzidas socialmente (exatamente como Lévi-Strauss vai fazer). - Há 3 grandes eixos de análise no livro: 1) descrição e análise detalhada do sistema de clãs e totemismo de certas tribos australianas; 2) tentativa de compreensão da natureza da religião e de sua importância para a vida social; 3) Passos iniciais da construção de uma teoria do conhecimento, quando ele vai proceder uma interpretação sociológica das formas de pensamento humano. Parte I - Descrição e análise detalhada do sistema de clãs e totemismo de certas tribos australianas Introdução e capítulo 1 - No primeiro parágrafo ele diz, já colocando o problema que o inspira: "Neste livro, propomo-nos estudar a religião mais primitiva e mais simples que se conheça atualmente, analisá-la e tentar explicá-la. Dizemos de um sistema religioso que é o mais primitivo que nos é dado observar quando preenche ás duas condições seguintes: em primeiro lugar, é preciso que se encontre em sociedade cuja organização não seja ultrapassada por nenhuma outra em simplicidade, além disso, é preciso que seja possível explicá-lo sem' fazer interferir nenhum elemento tomado de religião anterior. Esforçar-nos-emos para descrever a economia desse sistema com a exatidão e a fidelidade que aí aplicaria etnógrafo ou historiador. Mas a nossa tarefa não se limitará a isso. Os problemas que a sociologia se coloca são diferentes daqueles da história ou da etnografia. Ela não procura Mas é claro que é impossível levar este rigor metodológico ás últimas conseqüências, pois há todo um conjunto de pressupostos que orienta sua análise, até porque ele já está escrevendo no final de sua vida, então já tem suas conclusões. A distinção entre sagrado e profano, por exemplo, só aparece no final do livro 1, mas obviamente já estava presente desde o início
  • 3. Mirela Berger – Emile Durkheim 3 conhecer as formas antigas da civilização apenas no intuito de conhecê-las ou de reconstruí-las. Mas, como toda ciência positiva, antes de
  • 4. Mirela Berger – Emile Durkheim 4 tudo ela tem como objetivo explicar uma realidade atual, próxima de nós, por conseguinte, capaz de tocar nossas idéias e nossos atos: essa realidade é o Homem e, mais especialmente, o Homem de hoje, porque outro não há que estejamos mais interessados em conhecer bem. Portanto, a religião antiguíssima de que vamos tratar aqui não será estudada apenas pelo prazer de contar as extravagâncias e as singularidades que encerra. Se a tomamos como objeto da nossa pesquisa, é porque nos pareceu mais apta que qualquer outra para fazer compreender a natureza religiosa do Homem, ou seja, a nos revelar um aspecto essencial e permanente da hurnanidade."'(Durkheim, 1912:29). - Esta citação um tanto quanto longa nos permite perceber quatro pontos importantes que fazem a singularidade de Durkheim. 1) o primeiro refere-se a necessidade de se estudar a religião mais simples e primitiva que se conheça atualmente. Durkheim dirá que isso é necessário para se compreender a essência da religião. A idéia é que nas religiões mais avançadas como, por exemplo, o cristianismo, a religião aparece como um amálgama de crenças e ritos muitas vezes emprestados de diversas religiões, tornando desta forma muito difícil a apreensão do que é característico da religião. A expressão "religião mais simples e primitiva" nos lembra o evolucionismo, mas o sentido á ela empregado por Durkheim é diferente: trata-se de olhar para estas religiões porque elas são mais simples do ponto de vista da sua organização, e assim, mais passíveis de retratarem as necessidades básicas e gerais da humanidade que aparecem confusas nas religiões mais atuais. 2) A forma como ele coloca a questão já nos leva a um outro ponto, que é a importância que Durkheim vê em delimitar o campo específico da sociologia. Não podemos esquecer que é no século XIX que a sociologia começa a ser pensada como uma ciência social e positiva, e Durkheim é um dos percursores desta emergência da sociologia enquanto ciência. É o momento muito específico de constituição de um saber que ainda que inspirado pelo modelo das ciências naturais, não se confunde com ele. Antes mesmo do livro As Formas, Durkheim dizia que "Ela [a Sociologia] tem um objeto claramente definido e um método para estudá-lo. O objeto são os fatos sociais, o método é a experimentação e a observação indutiva, em outras palavras, o método comparativo." (Rodrigues, 1981:19). 3) A ênfase da sociologia enquanto ciência positiva nos leva á dois outros pontos: Durkheim afasta-se do caminho traçado pelos evolucionistas na medida em que se propõe olhar para "uma realidade próxima de
  • 5. Mirela Berger – Emile Durkheim 5 nós [que é o Homem]", mas fazê-lo procurando conhecer o Homem como ele é hoje. O Homem primitivo não é mais o objeto de análise, como ocorre com os evolucionistas, mas sim instrumento de conhecimento de uma realidade mais geral que é a religião. O primitivo, para Durkheim, é menos um objeto da pesquisa e mais um caminho metodológico para se chegar ao que verdadeiramente interessa a Durkheim, que é o papel da religião. Aqui reside, ao meu ver, o ponto central desta obra de Durkheim, que é a compreensão da religião enquanto um aspecto "essencial e permanente da humanidade". Vemos aqui a procura por leis gerais, tão caras para marcarem o caráter objetivo e científico desta ciência que começa a ser constituída. Muito semelhante á teoria positivista: o geral garante o caráter de científico, de positivo. A orientação seguida por Durkheim não caminha no sentido de descobrir e ressaltar a especificidade de cada sistema religioso (como é o caso de Franz Boas), e sim, na premissa contrária: ele acredita que a religião seja uma característica GERAL da sociedade humana, ou seja, que está na base da constituição do homem enquanto tal. É, portanto, possível (e desejável) empreender uma TEORIA GERAL da religião: "Se, com efeito, é útil saber em que consiste esta ou aquela religião particular, mais importante ainda é pesquisar o que vem a ser a religião em geral ( ... ) Já que todas as religiões são comparáveis, já que são todas espécies do mesmo gênero, necessariamente há elementos essenciais que lhes são comuns ( ... ) Na base de todos os sistemas de crenças e de todos os cultos deve, necessariamente, haver certo número de representações fundamentais e de atitudes rituais que, apesar da diversidade das formas que umas e outras puderam assumir, apresentem, por toda parte, o mesmo. significado objetivo e também, por toda a parte, exerçam as mesmas funções. São estes elementos permanentes que constituem o que existe de eterno e de humano na religião, formam todo o conteúdo objetivo da idéia que se exprime quando se fala da religião em geral. Como, pois, chegar a atingi-los." (Durkheim, 1912:33). 4) É justamente esta noção de que existe um certo número de representações fundamentais que são próprias do pensamento e do comportamento humano que vão orientar as críticas que Durkheim dirige aos outros teóricos que se debruçaram sobre a religião. Durkheim procura afastar-se das teorias anteriores sobre a religião, que ao seu ver, dissolvem o seu próprio objeto - a religião - ao pretendê-lo como ilusão coletiva ou como uma das formas possíveis de pensamento pré-cientifico. Embora algumas de suas críticas aos pensadores anteriores não possuam uma fundamentação muito sólida, Durkheim inova ao pretender explicar de fato as religiões, e principalmente por fazê-lo calcado na eficácia simbólica e social destas crenças: "( ... ) postulado essencial da sociologia é que
  • 6. Mirela Berger – Emile Durkheim 6 uma instituição humana não poderia repousar sobre o erro ou a mentira, sem isso ela não conseguiria durar. Se não tivesse por base a natureza das coisas, encontraria nas coisas resistências que não conseguiria vencer. Portanto, quando enfrentamos o estudo das religiões primitivas já temos a certeza de que se prendem ao real e que o exprimem; veremos este princípio voltar continuamente no decorrer das análises e das discussões que se seguirão, e o que condenaremos nas escolas das aqui vamos nos afastar é precisamente tê-lo ignorado( ... ) sob o símbolo, é preciso saber atingir a realidade que representa e que lhe dá sua significação verdadeira. Os ritos mais bárbaros e mais extravagantes, os mitos mais bárbaros traduzem alguma necessidade humana, algum aspecto da vida, quer individual, quer social. As razões que o fiel dá a si próprio para justificá-las podem ser, e são realmente falsas, as razões verdadeiras existem, não obstante, cabe á ciência descobri-las. Não há, pois, religiões que sejam falsas. Todas são verdadeiras á sua maneira: todas respondem, ainda que de maneiras diferentes, a determinadas condições da vida humana ( ... ) Portanto, se nos voltamos para as religiões primitivas não é com a intenção de depreciar a religião em geral, porque estas religiões não são menos respeitáveis que as outras. Elas respondem as mesmas necessidades, desempenham o mesmo papel, dependem das mesmas causas; portanto, podem perfeitamente servir para manifestar a natureza da vida religiosa e, por conseguinte, para resolver o problema que desejamos tratar." (Idem, pg.31). - Ele deixa claro inúmeras vezes que a religião não é um delírio. - Para Durkheim, ao contrário de Tylor, as religiões não podem ser consideradas fontes de engano que serão superadas pela ciência, ele afirma, na conclusão do livro As Formas Elementares da Vida Religiosa que a verdadeira função da religião é nos ajudar a viver melhor. Além do mais, para ele as religiões são obras da sociedade e a expressam, estando assim na base de qualquer pensamento, inclusive o científico: “Estabelecemos ao longo dela [da obra] que as categorias fundamentais do pensamento e, por conseguinte, da ciência, têm origens religiosas (...) as regras da moral e do direito foram por muito tempo indistintas das prescrições rituais. Pode-se portanto dizer que quase todas as instituições nasceram da religião (...) Se a religião engendrou tudo o que há de essencial na sociedade, é que a idéia da sociedade é a alma da religião”. - O que está em. jogo aqui e que ficará claro no decorrer da obra, principalmente quando ele fala dos "churinga", é a ênfase na noção de representação. Vale á pena nos determos um pouco sobre este tema importantíssimo da obra de Durkheim, mesmo que para isso tenhamos que citar um trecho do capítulo IV, onde ele discute a origem das crenças totêmicas. Ele diz: "Eis no que consiste realmente um totem: é simplesmente a força material sobre a qual se REPRESENTAM para a imaginação, através de toda sorte de fatos heterogêneos, essa substância imaterial, essa energia difusa, único objeto do culto ( ... ) E assim o universo, tal como o totemismo o concebe, é atravessado, animado por certo
  • 7. Mirela Berger – Emile Durkheim 7 número de forças que a imaginação REPRESENTA sobre a forma de princípios tomados de empréstimo, com poucas exceções, ao reino animal e ao reino vegetal." (Idem, pg.240). Vemos que Durkheim opera ao nível do simbolismo, e neste ponto, questiono a distinção comummente feita nos cursos, que diz que Durkheim trabalha com a base social do simbolismo, enquanto que L.Strauss trabalha com o fundamento simbólico da vida social. Com certeza, Durkheim enfatiza a base
  • 8. Mirela Berger – Emile Durkheim 8 SOCIAL da vida simbólica, mas acredito que o contrário também é verdadeiro: Durkheim diz que a sociedade desperta em nós algo de sagrado, e nesta medida, aponta para a dimensão simbólica da vida social(2). De toda forma, vemos que neste ponto da obra de Durkheim já podemos apontar para uma incipiente noção de estrutura elementar, que L.Strauss retomará em seus trabalhos. Certamente, L. Strauss trabalhará de forma diferente com esta questão, mas o que procuro apontar aqui é que é em Durkheim que estão muitas das concepções que posteriormente servirão com base da teoria Levistraussiana. Aliás, a influência que Durkheim exerce sobre outros autores é invejável. Não será sentida apenas por L. Strauss: quando Durkheim refere- se á representações e atitudes que em toda parte exercem as mesmas funções, lembramo-nos de quem? De Malinowski. Isto ficar ainda mais visível quando Durkheim diz que o estudo que ele empreende é "um modo de retomar, mas em condições diferentes, o velho problema da origem das religiões". Ele prossegue dizendo: "É claro que, se por origem entendemos um primeiro começo absoluto, a questão nada tem de científica e deve ser resolutamente afastada. Não existe um momento radical em que a religião tenha começado a existir e não se trata de encontrar um meio que permita que nos transportemos até ali pelo pensamento. Como toda instituição humana, a religião não começa em parte alguma ( ... ) O problema que nos colocamos é bem outro o que queremos é encontrar um meio de discernir as causas, sempre presentes de que dependem as formas mais essenciais do pensamento e da prática religiosa." (Idem, pg.36).
  • 9. Mirela Berger – Emile Durkheim 9 Aqui, o debate que está sendo travado é com o evolucionismo, que acreditava ser possível encontrar entre os primitivos, que estariam num estágio inferior ao da civilização, a origem (em termos temporais) do fenômeno religioso. Mas embora Durkheim tenha como interlocutor o evolucionismo, o problema da origem está recolocado para Dur'kheim em termos da busca do que é fundamental, básico e permanente no conjunto das religiões. Coloca-se aqui o problema da NATUREZA do fenômeno religioso, natureza esta que possui Razão, causa e função específicas. - Até aqui procurei pinçar alguns pontos importantes que Durkheim enfatiza na primeira parte do texto dedicada ao "Objeto da Pesquisa". De forma resumida, quase esquemática, são eles: 1) necessidade de descobrir a essência da religião; 2) delimitação do campo da sociologia em oposição á etnografia e a história. A sociologia enquanto ciência positiva está interessada na procura de leis gerais; 3) Crítica ao evolucionismo, primeiro no sentido de que a Religião passa a ser OBJETO de estudo e o Homem primitivo apenas instrumento que servira para revelar aspectos essenciais da religião (agora o Homem primitivo não é mais o objeto de estudo, como ocorria com os evolucionistas); e segundo, porque Durkheim recolocará o problema da origem das religiões buscando não sua gênese evolutiva, mas sim os significados e funções á que elas respondem; 4) Certeza de que se pode construir uma teoria geral da religião; 5) Idéia incipiente de estrutura; 6) base para as discussões entre ação e representação, presentes no decorrer de toda obra. II) Tentativa de compreensão da natureza da religião e de sua importância para a vida social Na segunda parte do texto, Durkheim vai enfatizar três outros pontos cruciais: 1) A Religião como um aspecto constitutivo do espírito humano e existência de categorias básicas do entendimento que nasceram da religião; 2) Religião como coisa eminentemente social; 3) polêmica entre o apriorismo e o empiricismo e, principalmente, como a teoria do conhecimento que Durkheim se propõe desenvolver pode unificar de forma satisfatória estas duas correntes. Vamos a eles. Durkheim enfatiza que a pesquisa por ele empreendida não interessa apenas aos estudos sobre a religião, mas está na base de uma teoria de conhecimento. Ele diz que o fenômeno religioso ultrapassa o círculo das idéias propriamente religiosas, tocando assim em problemas de ordem mais geral, comummente apenas debatidos por filósofos: "Sabemos, desde há muito tempo, que os primeiros sistemas de representação que o homem produzir no mundo e de si mesmo são de origem religiosa. Não há religião que não seja, ao mesmo tempo, a cosmologia e a especulação sobre o divino. Se a filosofia e as ciências nasceram da religião é porque a própria religião fazia às vezes de ciência e de filosofia. Mas o que foi menos observado é que ela não se limitou a enriquecer, com certo número de idéias, um espírito previamente formado; ela contribuiu para formá-lo. Os Homens não lhe deveram apenas grande parte da matéria dos seus
  • 10. Mirela Berger – Emile Durkheim 10 conhecimentos, mas a forma pela qual estes conhecimentos foram elaborados." (Idem, pg.38).
  • 11. Mirela Berger – Emile Durkheim 11 - o que Durkheim coloca aqui de forma magistral é que a religião não é apenas o reflexo de uma visão de mundo, e sim, o elemento essencial desta apreensão, recorte e classificação do real. -Durkheim chama a atenção para o fato de que nosso pensamento tem como base certas categorias do entendimento: "Na raiz dos nossos julgamentos existe um certo número de noções essenciais que dominam toda nossa vida intelectual; é as que os filósofos, desde Aristóteles, denominam categorias do intelecto: noções de tempo, de espaço, de gênero,( ... ) etc. Elas correspondem às propriedades mais essenciais das coisas. São como que molduras sólidas que engastam o pensamento que parecem não poder desvencilhar- se delas sem se destruir; pois não parece que podemos pensar objetos que não estejam no tempo ou no espaço (...) Ora, quando analisamos metodicamente as crenças religiosas primitivas, encontramos, naturalmente, as principais destas categorias. Nasceram na religião e da religião; são produtos do pensamento religioso." (Idem, ibidem). Em seguida, Dukheim continua a tecer sua tese central, e não só isso, a expõe de forma clara: "A conclusão geral deste livro é que a RELIGIÃO é coisa eminentemente social. As representações religiosas são representações coletivas; os ritos são maneiras de agir que surgem unicamente no seio dos grupos reunidos e que se destinam a suscitar, a manter, ou a refazer certos estados mentais destes grupos. Mas então, se as categorias são de origem religiosa, devem participar da natureza comum á todos os fatos religiosos: também elas seriam coisas sociais, produto do pensamento coletivo" (Idem, ibidem). - O que Durkheim procura mostrar é que estas categorias básicas de apreensão do real tem por base pontos de referências que não são produzidos individualmente, muito pelo contrário, são sociais e coletivos, porque tomados da vida social. Ele afirma que a organização do tempo e do espaço (categorias de entendimento essenciais ao funcionamento da vida social) são reflexos e produtos da organização da sociedade: é pelo fato de que a sociedade existe que é possível pensar as categorias de tempo e espaço, que nada mais são do que classificações sociais. - pg 74: Outro ponto central que ao contrário dos evolucionistas, que focavam mais na magia, considerada mais individual do que coletiva, Durkheim foca na religião e a associa à idéia de igreja, mais coletiva. Ele diz que a religião é coletiva porque a crença é coletiva,
  • 12. Mirela Berger – Emile Durkheim 12 chamando atenção para as dimensões SOCIAIS do fenômeno religioso. - Um aspecto importantíssimo é que Durkheim percebe a religião como um SISTEMA, ou seja, um todo formado por partes. Ele chega á esta idéia estabelecendo a relação entre a crença e o rito: - pg 68: “Os fenômenos religiosos ordenam-se naturalmente em duas categorias fundamentais: as crenças e os ritos. As primeiras são estados de opinião, consistem em representações; e os segundos, são modos de ação determinados” ↓ Há aqui um problema que Durkheim não resolve, pois ele se contradiz: num momento, ele diz que só se pode definir o rito depois de ter definido a crença → o rito pela crença. Mas não é isso que ele faz, na obra toda ele explica a crença pelo rito, afirmando várias vezes que a experiência religiosa só pode nascer do rito. - A constatação da religião enquanto um sistema está presa á uma outra idéia fundamental, a de que as crenças religiosas requerem uma classificação. Portanto, o sistema de crenças é antes de mais nada um sistema classificatório cuja dicotomia básica é a distinção entre SAGRADO E PROFANO. - PG 72: “O aspecto característico do fenômeno religioso é o fato de que ele pressupõe uma divisão bipartida do universo conhecido em dois gêneros que compreendem tudo o que existe, mas que se excluem radicalmente. As coisas sagradas são aquelas que os interditos protegem e isolam; as coisas profanas aquelas as quais os interditos se aplicam e que devem permanecer à distância das primeiras” - Tendo definido o que é a religião de modo geral ele vai então analisar o que seria a religião mais elementar, que para ele é o totemismo. - Ele começa tudo de novo: testa os elementos do que ele entende por religião, tenta confirmar a hipótese por dados e teorias. Para confirmar, ele procura no totemismo os elementos que ele considera básicos na religião e concentra-se nas crenças e na distinção entre sagrado e profano. - pg 96/97 ele começa a esboçar as noções de culto e depois de Mana.
  • 13. Mirela Berger – Emile Durkheim 13 As Crenças propriamente Totêmicas – caps. I, II, III (pg 139 a 297) - Começa fazendo uma crítica sutil á Morgan, pois ao contrário dele, não acredita que o parentesco seja consaguíneo. As pessoas consideram-se parentes: 140: “os indivíduos que compõem o clã consideram-se unidos por laços de parentesco, mas que o é de natureza muito especial. Este parentesco não vem do fato de manterem entre si relações definidas de consaguinidade, são parentes pelo simples fato de terem igual nome (...) e se dizemos que se vêem como membros de uma mesma família é porque reconhecem, uns para com os outros, deveres idênticos aos que sempre couberam aos parentes: deveres de assistência, de vingança, de luto, obrigação de não casar entre si”. - pg 139: TOTEM como Nome ↓ Emblema Existe um SISTEMA por trás: é o sistema totêmico que importa. - o significado tem um significante (que em muitas vezes, é o corpo). Este significado define o grupo e quais são os seus membros. - Para ele, a religião totêmica está presa á organização social, o totemismo está casado com a organização social. Por isso que é tão importante o nome do clã. -pg 159:onde está realmente o sagrado? O sagrado está em vários lugares, mas principalmente nos churinga. O importante não é o homem, o animal ou a planta, mas sim a representação deles num objeto diverso deles “Estes fatos provam que se o australiano é tão fortemente inclinado a figurar o seu totem, não é para ter sobre seus olhos um retrato que renove perpetuamente a sua sensação; mas é simplesmente porque sente a necessidade de representar tal idéia por meio de um sistema material, exterior, seja qual for, aliás, este sinal”. - O totem é uma representação: é a manifestação material de uma imagem mental. - Onde Durkheim peca é na explicação do porque estas plantas e/ou estes animais, só Lévi-Strauss consegue explicar isto, através das estruturas mentais inconscientes. - Ele começa a retomar a noção de mana, enquanto uma força sagrada que se deposita em homens, palavras e plantas. -240/241: “Eis no que consiste realmente um totem: é simplesmente a força material sobre a qual se representam para a imaginação, através de toda a espécie de seres heterogêneos, essa
  • 14. Mirela Berger – Emile Durkheim 14 substância imaterial, esta energia difusa, único objeto de culto (...) E assim o universo, tal como o totemismo o concebe, é atravessado, animado por um certo número de forças que a imaginação representa sob a forma de princípios tomados de empréstimo, com poucas exceções, ao reino animal e ao reino vegetal: elas são tantas quantos são os clãs das tribos e cada uma delas circula através de determinadas categorias de coisas das quais consistem a essência e o princípio vital”. A origem das crenças totêmicas - começa um outro lado da análise a partir da pg 269. - A pergunta que ele quer responder é Qual a natureza da experiência que leva á noção de sagrado como força? - Mauss também trabalhará com isso. - A experiência religiosa é na verdade a EXPERIÊNCIA SOCIAL. É a exaltação coletiva que permeia a realização do rito. - Esta experiência social está fora acima dos indivíduos dentro - Assim como a consciência coletiva, a exaltação coletiva é uma espécie particular da soma das exaltações. - Esta idéia de que o social é ao mesmo tempo algo exterior e interior ao indivíduo permeia toda obra de Durkheim, desde As regras do método sociológico (1895). - Percepção de uma coletividade que transcende o homem: A sociedade desperta em nós algo de sagrado -