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Processo Indenização Morte Médico
1. Acompanhamento Processual - 1º Grau
Dados do Processo
Numero 001.2008.007809-6
Descriao Ação de Indenização
Vara Sétima Vara da Fazenda Pública
Juiz José Viana Ulisses Filho
Data 21/09/2009 17:00
Fase Registro e Publicação de Sentença
Texto PROCESSO Nº 001.2008.007809-6
AUTOR: MARIA TEREZA GUIMARÃES LIMA E OUTROS.
RÉU: ESTADO DE PERNAMBUCO
SENTENÇA
Vistos, etc.
MARIA TEREZA GUIMARÃES LIMA, brasileira, divorciada,
psicóloga,
residente e domiciliada nesta comarca, MARIA ANITA SANTOS DE
ESCOBAR, brasileira,
casada, psicóloga, residente e domiciliada na comarca de Camaragibe,
EDUARDO
HENRIQUE SANTOS DE ESCOBAR, brasileiro, casado, estudante,
residente e domiciliado
na comarca de Camaragibe, JAYME SANTOS DE ESCOBAR,
brasileiro, solteiro, estudante,
residente e domiciliado na comarca de Camaragibe, ANA LUIZA
SANTOS DE ESCOBAR,
brasileira, casada, estudante, residente e domiciliada na comarca de
Camaragibe, propuseram
perante esta vara AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS
E MATERIAIS,
contra o ESTADO DE PERNAMBUCO, pessoa jurídica de direito
público interno com sede e
domicilio nesta comarca, aduzindo, em resumo, que no dia 17.12.05 foi
assassinado por um
menor fugitivo da FUNDAC, órgão estadual encarregado da reeducação
de menores
infratores, em um semáforo existente no cruzamento da Av. Domingos
2. Ferreira com a rua
Thomé Gibson, no bairro de Boa-Viagem, nesta cidade, o Dr. Antonio
Carlos Escobar,
conceituado médico psiquiatra, que na ocasião circulava em seu
automóvel na companhia da
primeira autora, sua companheira, crime este ocorrido em decorrência
da omissão do estado
réu, que não cumpriu com o seu dever constitucional de garantir a
segurança dos seus
cidadãos, além de permitir que menor fugitivo de estabelecimento
estatal encarregado da
guarda de menores infratores, efetivasse assaltos à mão armada em
movimentada via pública
de importante bairro da capital, resultando a omissão do estado de
Pernambuco em ter
causado aos autores danos de natureza material, pelo fato do médico ser
o provedor da sua
família, além do dano de natureza moral decorrente da sua morte, razão
por que pugnam pela
condenação do réu no ressarcimento dos danos mencionados.
Foram acostados à inicial os documentos de fls. 22 "usque" 117.
Regularmente citado, o estado réu respondeu à ação, aduzindo as
preliminares,
primeiramente a de inépcia da inicial pela ausência de causa de pedir no
que pertine aos danos
materiais.
Como segunda preliminar, aduz que a ação também padece de
inépcia, pelo fato de
se verificar a ausência de silogismo entre os fatos e o pedido, na medida
em que o ato ilícito
apontado teve por causadora a FUNDAC, autarquia estadual que não se
confunde com o
Estado de Pernambuco.
Por fim, ainda em preliminar, alega a ilegitimidade do Estado de
Pernambuco para
figurar no pólo passivo da ação.
No mérito, alega a ausência de nexo causal, considerando que não se
encontra
demonstrado que o dano e o ressarcimento reclamados teve por causa
qualquer atuação
comissiva ou omissiva do estado demandado ou de qualquer dos seus
agentes, pugnando, ao
final, pelo acolhimento das preliminares e extinção do processo, ou
alternativamente na
hipótese do julgamento do mérito, pela improcedência do pedido, ou a
improcedência dos
danos materiais e procedência de danos morais em valores moderados,
ou que seja rejeitado o
pedido de pensão até a data em que a vitima completaria 75 anos de
idade, fixando-a até o
momento em que os filhos completem 24 anos de idade, vindo apenas a
beneficiar a filha Ana
3. Luiza Escobar.
Não foram acostados documentos à contestação.
Réplica dos autores acostada às fls. 146/158, rebatendo uma a uma as
preliminares
argüidas pelo réu.
Com vista ao M.P. alegou o órgão ausência de interesse a justificar a
sua atuação na
presente demanda.
Eis, em síntese bastante apertada, o relatório.
DECISUM.
Cuida-se de ação ordinária de indenização por danos morais e
materiais proposta
pelos autores contra o estado de Pernambuco, em decorrência do
assassinato do médico
Antonio Carlos Escobar por menor fugitivo da FUNDAC.
Inicialmente, examinemos as preliminares aduzidas pelo estado
demandado.
Com efeito, as preliminares em questão não merecem prosperar.
No que tange aos danos materiais, apesar de não especificado o valor
das despesas de
funeral, não torna a demanda inepta, na medida em que tal verba é
tutelada pela legislação
substantiva pátria, quando se tratar de fato certo como na presente
hipótese, podendo apenas
ser discutida a modicidade da verba, inocorrendo justa causa para o
indeferimento da inicial.
Destarte, temos por afastada a primeira preliminar.
A segunda preliminar não tem fundamento e se confunde com a
terceira, haja vista
que não existe qualquer incoerência lógica entre os fatos alegados e o
pedido dos autores.
Sem embargo, apesar da existência de Fundação Pública estadual
responsável pela
guarda de menores infratores, no caso a FUNDAC, nada obsta o
ingresso da ação contra o
estado de Pernambuco, entidade pública que tem o dever constitucional
de garantir a
segurança dos seus cidadãos.
Dessa forma, temos por improcedentes a segunda e a terceira
preliminares argüidas,
pela ausência de fundamento legal.
Agora analisemos o meritum causae.
A primeira questão que se coloca é com relação à interpretação do §
6º do artigo 37
da Constituição da República que dispõe sobre a responsabilidade
objetiva do estado. Essa
responsabilidade só existe com relação a atos comissivos, ou também
abrange os atos
omissivos? Melhor dizendo, em se comprovando o ato omissivo da falta
do serviço, a
4. responsabilidade do estado é objetiva ou subjetiva? Temos para nós que
tal discussão se
encontra superada no âmbito do Supremo Tribunal Federal, que
sufragou a tese doutrinária
capitaneada pelos publicistas Hely Lopes Meireles e Yusef Said Cahali
de que pela dicção
constitucional, a responsabilidade estatal por atos comissivo ou
omissivo é objetiva,
prescindindo de que a atuação do estado ou dos seus agentes se dê com
imprudência,
negligência ou imperícia que são os elementos subjetivos da culpa.
Superadas as divergências doutrinárias, pela postura assumida pelo
STF, consoante
anteriormente demonstrado, cumpre-nos perquirir a propósito, na
hipótese sub examine, da
existência de nexo causal que venha a estabelecer um vinculo jurídico
entre o crime que
vitimou o médico Antonio Carlos Escobar, e a omissão do estado de
Pernambuco, em garantir
a segurança dos seus cidadãos, notadamente quando vida humana é
ceifada por menor
foragido de entidade que tem o dever constitucional e legal de promover
a proteção e
reintegração social e familiar de menores infratores ou em situação de
risco.
Sem dúvidas, é de conhecimento público e notório que o menor
responsável pela
morte do médico, na ocasião do crime, era fugitivo da FUNDAC, fato
este divulgado pelos
meios de comunicação escritos e falados de todo o país, em face da
repercussão do crime, sem
merecer qualquer contestação por parte do estado de Pernambuco.
Sabe-se que o menor em questão foi várias vezes apreendido pelo
órgão estatal
referido, empreendendo todas as vezes fugas do local da custódia,
denotando a omissão do
estado de Pernambuco, em cumprir o pacto constitucional que adotou a
doutrina da proteção
integral da criança e do adolescente.
Com certeza, se na hipótese o estado de Pernambuco tivesse
cumprido o seu dever de
proteger e assistir ao menor em situação irregular, cumprindo com
diligência as diretrizes que
emanam do Estatuto da Criança e do Adolescente, o crime não teria
ocorrido, e a vida de
respeitável cidadão e pai de família não seria ceifada de forma tão banal.
Com efeito, estamos diante de um claro exemplo do que se
convencionou denominar
de falta de serviço, ou, para a doutrina francesa faute du service, que não
dispensa a existência
de um nexo de causalidade vinculando a ação omissiva do poder
público, no caso o desleixo e
5. a negligência do estado de Pernambuco em permitir que menor que
deveria estar sob os seus
cuidados e proteção estivesse assaltando em sinais de trânsito de vias
públicas bastante
movimentadas, e o dano causado a terceiros, no caso os familiares e
amigos da vitima que
ficaram privados do seu provimento e da sua existência.
Indubitavelmente, a teoria adotada pelo direito brasileiro com relação
ao nexo de
causalidade é a do dano direto e imediato, devendo se levar em
consideração, a depender de
circunstâncias especificas como na hipótese sub occulis, o dano indireto
ou remoto
notadamente quando não haja concausa sucessiva.
Esse entendimento deflui de recente posicionamento do Supremo
Tribunal Federal,
no Recurso Extraordinário nº 409.203-4 Rio Grande do Sul, em que foi
voto vencido o
eminente ministro Carlos Velloso, relator do processo, que
acompanhava várias precedentes
da Corte Máxima de Justiça, entendendo só admissível o nexo de
causalidade quando o dano
é efeito necessário de uma causa. Entrementes, prevaleceu o voto de
vista do Ministro
Joaquim Barbosa, decisão esta que mereceu a seguinte ementa:
"Responsabilidade civil do
estado. Art. 37, § 6º da Constituição Federal. Faute du service public
caracterizada. Estupro
cometido por presidiário, fugitivo contumaz, não submetido à regressão
de regime prisional
como manda a lei. Configuração do nexo de causalidade. Recurso
extraordinário desprovido.
Impõe-se a responsabilização do Estado quando um condenado
submetido a regime
prisional aberto pratica, em sete ocasiões, falta grave de evasão, sem que
as autoridades
responsáveis pela execução da pena lhe apliquem a medida de regressão
do regime prisional
aplicável à espécie. Tal omissão do Estado, constituiu na espécie, o fator
determinante que
propiciou ao infrator a oportunidade para praticar o crime de estupro
contra menor de 12
anos de idade, justamente no período em que deveria estar recolhido à
prisão.
Está configurado o nexo de causalidade, uma vez que se a lei de
execução penal
tivesse sido corretamente aplicada, o condenado dificilmente teria
continuado a cumprir a
pena nas mesmas condições (regime aberto), e, por conseguinte, não
teria tido a
oportunidade de evadir-se pela oitava vez e cometer o bárbaro crime de
estupro.
6. Recurso extraordinário desprovido."
Dessa forma, não nos é dificultoso concluir, mutatis mutandis, que o
atual
posicionamento da Suprema Corte, permite-nos inferir que, na hipótese
dos autos, se o estado
de Pernambuco, através do órgão competente, tivesse aplicado
corretamente o Estatuto da
Criança e do Adolescente, o menor autor da infração estaria internado
sob a tutela estatal, e
não teria a oportunidade de cometer o ato infracional que ceifou a vida
do médico Antonio
Carlos Escobar, configurado destarte o nexo de causalidade.
Posto desta forma, caracterizado o nexo causal que obriga o estado
de Pernambuco a
ressarcir danos advindos da falta de serviço, passemos a examinar
especificamente a
existência dos alegados danos moral e material, delimitando a
responsabilidade do estado
demandado, bem como identificando os beneficiários da indenização.
Iniciemos, examinando primeiramente os danos materiais.
Conforme dito anteriormente, as despesas de funeral são devidas
quando se trata da
existência de fato certo, como comprovado nos autos, cabendo-nos, no
momento, discutir o
valor da verba.
Entendemos que a quantia de R$ 10.000,00 (dez mil reais) pedida
pelos autores é
elevada, considerando inexistir nos autos qualquer indicação da
existência das despesas. Em
ocasiões como tal deve o magistrado sopesar os gastos levando em
consideração as regras da
experiência comum observando o que ordinariamente acontece, fixando
valor que seja
razoável e compatível com a situação econômico–financeira da vitima e
dos seus familiares.
Desta forma, entendemos razoável que o valor das despesas de
funeral seja fixado na
quantia de R$ 7.000,00 (sete mil reais).
No que concerne ao pedido de pensão, algumas considerações
esboçadas na peça de
resistência pelo estado demandado devem ser levadas a termo. Com
efeito, não temos dúvidas
em concordar com os argumentos de que com relação aos filhos da
vitima Maria Anita,
Eduardo Henrique e Jayme Santos, são todos de maior idade e casados,
à exceção do último,
sendo os documentos acostados aos autos insuficientes para comprovar
a alegada dependência
material do de cujus.
Contudo, dúvidas não persistem com relação à dependência material
da companheira
e filha do falecido médico, respectivamente sra. Maria Tereza
7. Guimarães Lima e Ana Luíza
Escobar, esta última na época dos fatos solteira e com idade inferior aos
24 anos, no sentido
de que as mesmas fazem jus ao requerido pensionamento.
No tocante à referida filha, a mesma deve perceber a pensão a ser
arbitrada por este
juízo, a partir da data da morte do pai, até data em que completou a
idade de 24 (vinte e
quatro) anos, considerando tratar-se de estudante.
Entendemos razoável, que os valores das pensões ora arbitradas, seja
correspondente
a sete salários mínimos vigentes no país, o que corresponde atualmente à
quantia de R$
3.255,00 (três mil, duzentos e cinqüenta e cinco reais).
Os autores requereram que a duração da pensão fosse até a data em
que a vitima
completasse setenta e cinco anos de idade. Entretanto, pesquisa recente
procedida pelos
órgãos de previdência social do nosso país concluiu que a idade média
do brasileiro, para fins
previdenciários é de 72,6 (setenta e dois anos de idade e seis meses).
Destarte, a pensão deve ser paga à beneficiária Maria Tereza, do dia
do falecimento
da vitima, até a data em que esta completaria a idade de setenta e dois
anos e seis meses.
Agora examinemos os danos morais.
Indubitavelmente, conforme a digressão anteriormente realizada, não
nos é
dificultoso inferir que na hipótese ora submissa, o estado de
Pernambuco deve ressarcir os
autores em razão das seqüelas deixadas entre estes que eram do convívio
familiar do médico
assassinado, companheira e filhos que de uma hora para outra, em
decorrência da má
prestação de um serviço público, foram privados do convívio de tão
importante figura,
devendo os mesmos serem reparados no que tange as suas aflições,
angustias e desequilíbrios
causados no bem estar da família, elementos estes que devem ser
dimensionados
proporcionalmente à extensão do dano (gravidade da lesão), o grau de
culpa do lesante e a
capacidade econômica do mesmo no sentido de que se obtenha uma
compensação porquanto
comprovada a dor, os vexames e o sofrimento experimentados até o
presente momento,
indenização esta que não trará a vitima de volta ao nosso mundo, mas
que provavelmente
compensará os espíritos, no sentido de que se estará realizando a
esperada justiça.
Posto isto, julgo procedente, em parte, o pedido dos autores, para
condenar o estado
8. de Pernambuco ao pagamento de danos materiais no valor de R$
7.000,00 (sete mil reais)
referente ao luto da família, e pensão em favor da companheira Maria
Tereza Guimarães Lima
e da filha Ana Luiza Santos de Escobar na quantia mensal de R$
3.255,00 (três mil duzentos e
cinqüenta e cinco reais) que deve corresponder ao valor de sete salários
mínimos, cujo termo
a quo e ad quem se encontram anteriormente estabelecidos.
Condeno ainda o estado de Pernambuco, a ressarcir os autores em
danos morais, em
quantia que arbitro no valor de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais).
As condenações ora fixadas devem ser retroativas à data do evento,
incidindo juros de
mora e correção monetária.
Condeno o réu e o autor em termos proporcionais e pro rata, uma vez
que houve
sucumbência recíproca, no pagamento das custas processuais e
honorários advocatícios que
arbitro em 10% (dez por cento) do valor integral da indenização
devidamente corrigido.
P.R.I.
Recife, 21 de setembro de 2009.
José Viana Ulisses Filho
Juiz de Direito da 7ª Vara da Fazenda Pública